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Nossa dúvida é uma baseada na história da atividade de pesquisa espacial no País. Lendo
livros ou textos que tratam dos órgãos de pesquisa científica, como o próprio sítio do Centro
Tecnológico da Aeronáutica na Internet, parece que a atividade de pesquisa no campo espacial
teve início na década de 60 e prosseguiu aos trancos e barrancos até os dias de hoje, centrando-
se, é claro, naquela entidade e na sua congênere civil, o Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (INPE).
Logotipos das entidades que hoje se dedicam à pesquisa espacial hoje em dia –
Centro Tecnológico da Aeronáutica (CTA), Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (INPE), Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE) e a Agência Espacial
Brasileira (AEB), coordenadora das atividades.
Mas seria essa toda a verdade? É fato que o atual estágio de desenvolvimento de pesquisa
espacial é resultado exclusivo de uma aliança entre o INPE – responsável pelo desenvolvimento
dos instrumentos de pesquisa, inclusive o Brasilsat – e o CTA, encarregado da pesquisa e
desenvolvimento técnico dos veículos lançadores, os foguetes, sob a coordenação da Agência
Espacial Brasileira, de origem mais recente.
Mas, se hoje esses são os únicos órgãos por trás dos resultados alcançados isso nem
sempre foi assim. De fato, a atual situação, onde há uma complicada aliança entre um órgão civil
(INPE) com um militar (CTA), cada um deles responsável por uma etapa do processo de
pesquisa, é talvez única no mundo, mesmo dando bons resultados aparentes. E se chegou a essa
situação através de diversos percalços – houve muitas pedras no meio do caminho. Muito
conhecidos são os efeitos da “reforma” administrativa do Governo Collor, que teve fortes
impactos tanto no financiamento como na formação de pesquisadores, deixando seqüelas até os
dias de hoje. Mais tarde, o governo Fernando Henrique tomou a decisão de colocar todo o
programa sob o controle civil, da Agência Espacial Brasileira, sem remover o CTA da equação
(o que seria impossível), mas fazendo o máximo para desvincular o programa espacial de um
possível uso militar do mesmo. Tudo implicando em problemas, exacerbados pelos sucessivos
fracassos dos lançamentos do VLS.
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Recursos (em milhões de dólares de 1997), com a marcante queda do Governo
Collor. Fonte: COSTA FILHO, Edmilson. Política Espacial Brasileira. Rio de
Janeiro : Editora Revan, 2002. p. 151.
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de desculpas para futuros cortes. Afinal, em um país carente de recursos financeiros, a tentação
de pessoas de visão curta é de interromper um programa de pesquisas, “aplicando melhor” o
dinheiro, em atividades “mais importantes” – não importa que isso implique em perdas a longo
prazo. Como colocou um autor: “Ao contrário do que se poderia supor, tais conquistas [do
programa espacial brasileiro] não fruto de um programa espacial bem concebido e executado
pelo governo. Elas resultaram da pertinácia de indivíduos que exerceram liderança no INPE e em
equipes de engenharia do Centro Técnico Espacial e da EMBRATEL” Fonte: CARLEIAL, A. B.
O Brasil no Espaço Cósmico. Revista Ciência Hoje, v. 14 n. 84. Citado em COSTA FILHO.
Observamos que a Embratel, sintomaticamente, foi privatizada para o capital externo sem
previsão de manter seus desembolsos para a área de pesquisa., estando agora afastada do
programa espacial brasileiro.
Em nossa opinião, cortes, como os que já aconteceram, são um risco real e cremos que o
conhecimento do que já foi feito no passado pode servir de exemplo de como não se deve
conduzir um programa de desenvolvimento de foguetes, seja para pesquisa, seja para uso militar.
Primórdios
A primeira fase da história dos foguetes brasileiros acompanha a história mundial desse
tipo de artefato, que está associado à história bélica – como muitas das novas tecnologias
desenvolvidas ao longo dos anos. Desde as primeiras armas de fogo, os atiradores devem ter
observado que, se a bala ia para um lado, a arma ia para o outro (o coice) e isso certamente deve
ter indicado o caminho para a produção dos primeiros foguetes. Giovanni da Fontana escreveu já
em 1418, apenas 90 anos depois do aparecimento da primeira referência escrita sobre armas de
fogo, o Bellicorum Instrumentorum Liber (livro sobre artefatos bélicos), obra que já trás
ilustrações do que podem ser foguetes, inclusive um inegável carro de propulsão a jato. Os
aspectos de uso civil dos artefatos pirotécnicos (como os foguetes eram chamados), logo se
desenvolverem, ligados à diversão, como nos fogos de artifício. Mesmo nos primórdios da
história dos foguetes, há referências a artefatos de grande complexidade, como foguetes de
múltiplos estágios, com motores auxiliares (boosters) e com variadas cargas úteis, algumas delas
até com primitivos pára-quedas, mostrando o desenvolvimento teórico do assunto. O uso de
foguetes como armas era uma conclusão lógica a se chegar e há referências claras a eles no
século XVI.
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Carro de propulsão a jato, do livro de Giovanni de Fontana, Bellicorum
Instrumentorum Liber, séc. XV.
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Uso de foguetes contra cidades, 1598.
Contudo, os primeiros artefatos pirotécnicos não foram desenvolvidos até o limite de suas
possibilidades. O seu uso militar não foi difundido, pois a generalização da pólvora negra
granulada, em substituição ao polvorim, permitiu a criação de canhões mais eficientes, pelo
menos em relação aos foguetes mais primitivos, de forma que eles desapareceram de uso militar
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aos poucos, ficando restritos ao seu uso em entretenimento e na comunicação, atividades onde
não havia necessidade de uma performance extrema, como seria no campo militar.
No final do século XVIII o interesse dos europeus voltou-se novamente para os foguetes.
Isso devido ao seu amplo uso em um país que era visto como atrasado por eles – a Índia. Na
última década daquele século as tropas da Companhia das Índias Orientais inglesa estavam
engajadas em combater governantes locais e quase todos eles usavam foguetes, destacando-se os
príncipes de Mysore – Haidar Ali e seu filho Tipoo Sahib. Estes dispunham de foguetes mais
modernos do que os conhecidos na Europa, além do fato de que os usavam em grandes números:
o primeiro governante citado tinha tropas de 2.000 fogueteiros, enquanto o segundo elevou o
número para 5.000 (de uma força total de 48 mil homens, mostrando o forte papel dos
fogueteiros na formação da artilharia de Tipoo Sahib).
Com todas essas vantagens, não é de se estranhar que os artefatos hindus tivessem
causado uma certa impressão, tendo diversos exemplares sido enviados para o então o museu da
Artilharia Real em Woolwich, que fora criado em 1778 pelo Capitão William Congreve, da
Artilharia Real. Estes exemplares, talvez junto com os relatos dos veteranos das batalhas da
Índia, serviram para que o filho de Congreve, William Jr., baseasse sua proposta de criação de
uma “nova” arma de guerra na Europa, os “foguetes a Congreve”.
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Copenhagem em 1807, quando o efeito incendiário e moral dos foguetes foi considerado terrível
pelos próprios dinamarqueses.
Daí em diante, o foguete foi ganhando reconhecimento mundial, através das diversas
batalhas onde os ingleses usaram-no, como a Campanha da Península, onde espanhóis e
portugueses o viram em ação (um exemplo é a batalha de Bidossoa), no Báltico, onde Danzig foi
cercada por tropas armadas com foguetes (1813) e na famosa Batalha das Nações, em Leipzig
(1813), quando um esquadrão de artilharia a cavalo inglesa que estava equipada com foguetes
destacou-se sob as ordens do rei sueco, fazendo com que toda uma brigada de infantaria francesa
(2.500 homens) entrasse em pânico e se rendesse.
Primórdios no Brasil
No Brasil, a história dos foguetes de guerra foi precoce. O Almirante Sidney Smith,
aquele que tinha usado os artefatos pela primeira vez na expedição contra Boulogne, interessava-
se por novidades militares inglesas. Assim, em sua estadia no Rio de Janeiro, ele tentou fazer
adotar aqui a arma de Congreve, organizando em 1809, uma demonstração na Quinta da Boa
Vista, na presença de Sua Alteza, o Príncipe Regente, D. João VI. Infelizmente, o projétil se
comportou da forma errática que era comum aos artefatos primitivos e, em vez de se dirigir para
a Praia Grande, fez um giro de 180º, explodindo nos jardins do Palácio Real. Sidney Smith
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ofereceu fazer um novo teste, mas o Príncipe não quis saber da nova – e aparentemente
incontrolável – arma.
De qualquer forma, essa primeira experiência não levou a um sucesso que justificasse a
adoção da nova arma, apesar de o francês De Montgéry mencionar que em 1825 o Brasil
adquirira foguetes a Congreve. Dois anos depois, segundo o Coronel Moreira Bento, teria
ocorrido o primeiro uso de foguetes militares, quando o capitão alemão Siegner, um veterano de
Waterloo, supostamente tentara usar das novas armas em Bagé, ferindo-se mortalmente na
tentativa falhada. Estes artefatos certamente eram de fabricação local, já que no mesmo ano de
1827, o embaixador brasileiro em Londres escrevia ao Ministro da Guerra que não tinha podido
comprar os foguetes com o inventor, pois este detinha a patente do sistema e a legação não
dispunha do valor de 5.000 libras pedido por Willian Congreve para a venda do "segredo".
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Foguetes de Congreve, em diversos calibres e alguns dos seus acessórios, inclusive
um pára-quedas para iluminação, a ser disparado por foguete.
Certamente a grande redução que o Exército sofreu nos primeiros anos da Regência,
quando teve seu efetivo cortado em mais de 85%, com um correspondente corte no orçamento,
implicou uma paralisação de qualquer atividade de pesquisa, desenvolvimento e até
aperfeiçoamento das Forças Armadas. Neste "período negro" para as forças armadas, complicado
ainda mais pelas muitas revoltas internas, dificilmente poderíamos esperar que os poucos
recursos existentes fossem gastos com armas novas e que não tinham o seu valor reconhecido –
especialmente considerando que elementos fundamentais, como as fortificações costeiras,
tiveram que ser abandonados por falta de recursos para mantê-las. Desta forma, não existem
menções quanto ao uso de foguetes de guerra no país, apesar de se saber que as reconhecidas
vantagens das armas não passaram ignoradas. Os artefatos foram usados pelos ingleses contra os
argentinos em uma ação que certamente foi de conhecimento de oficiais brasileiros e, na
bibliografia, existem passagens sobre o uso de “foguetes de ar” (fogos de artifício) contra a
cavalaria farroupilha, função na qual eles certamente teriam um grande efeito, considerando a
formação e treinamento das milícias gaúchas. A manutenção do antigo Laboratório Pirotécnico
do Morro do Castelo também significa que a capacidade instalada de fabricação de artefatos de
iluminação e comunicação se manteve. Isso significa que a distribuição destes para as tropas em
operação deve ter continuado, tal como vinha sendo feita desde pelo menos o século XVIII.
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Ingleses disparam foguetes a congreve contra posições argentinas em San Lorenzo,
no rio da Prata, 1846.
A década de 1850 veria uma mudança nessa situação, assim como veria a introdução em
larga escala tanto dos já conhecidos foguetes a Congreve como de uma nova arma – o foguete de
Halle.
Em 1843, William Halle começou a estudar de forma prática a questão dos foguetes e
pensou em aperfeiçoar a idéia de Congreve, dispensando a massa inerte da haste estabilizadora.
Foguetes sem haste, estabilizados por aletas, já eram conhecidos havia muito tempo – alguns
deles foram ilustrados no livro A grande arte de artilharia, de Casimir Simienowicz, publicado
pela primeira vez em 1650. Entretanto, Halle procurou um novo método de assegurar uma
trajetória regular para os artefatos, adaptando a idéia das armas raiadas – da estabilização
giroscópica pela rotação do projétil. A rotação seria obtida pelo do escape direcionado de gases,
feito através de pequenos “eventos”, o que hoje em dia se chama de “tubeira”, ou seja, furos
colocados radialmente ao evento principal do motor e com um pequeno ângulo, de forma a fazer
o foguete girar com a saída dos gases da queima do propelente.
Na sua campanha de vendas, o filho do inventor passou pelo Rio de Janeiro, vindo dos
EUA, e conseguiu vender alguns foguetes para o governo. Não sabemos se foi por isso que estes
artefatos foram conhecidos como “foguetes americanos” ou, o que consideramos mais provável,
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que Halle Jr. certamente mencionou a sua compra e uso pelo exército norte-americano como uma
forma de propaganda. O fato é que a colocação do foguete como “americano” (junto com as
denominações foguetes tangenciais, foguetes de rotação ou foguetes sem cauda) é constante nos
documentos brasileiros, o que é curioso, já que Halle era inglês.
Seja qual for a opinião dos estrangeiros sobre o Brasil nos anos da década de 1850, o fato
é que as Forças Armadas estavam se modernizando rapidamente e isso teria uma influência sobre
a história da tecnologia militar no país.
FIM DA 1ª PARTE.
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Foguetes no Brasil
do foguete CONGREVE ao VLS – 2ª parte
A última grande revolta do período que se seguiu à abdicação de Pedro I foi a Praiera, em
1848. A partir daquele momento, pode-se dizer que se chegou a uma acomodação entre os
diversos grupos internos existentes. A partir de então, as Forças Armadas puderam parar de atuar
no papel de “bombeiros”, apagando os focos de rebelião que a situação pós-regência tinha
criado.
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Capa de Manual de armas portáteis do Exército datado de 1855 (a sua redação foi
coordenada pelo ministro da Guerra, o Marques de Caxias). Este é um dos
pri meiros manuais militares efetivamente brasileiros, redigidos dentro do
programa de modernização dos anos de 1850.
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Gravura mostrando os três tipos de artefatos pirotécnicos tradicionais: fogos de
artifícios ou de sinais, foguete "a Congreve” (na verdade, de Boxer), de cauda
central - adotado na Inglaterra em 1854 (e) no Brasil em 1867 - e de Halle, do
primeiro modelo, de 1844
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Batalha de Monte Caseros, mostrando um piquete do 2o Regimento de Cavalaria,
unidade sob o comando do Coronel Luís Osório. A campanha de 1852 seria um
marco no desenvolvimento bélico brasileiro, pois nela se testaram as armas que
seriam usadas pelas forças brasileiras nos anos seguintes, inclusive os foguetes.
Entretanto, as condições nas quais se deu o combate, com a Infantaria brasileira logo
avançando além das baterias de Artilharia, não permitiu que a nova arma tivesse um papel
destacado – ou assim se depreende da leitura dos relatórios da batalha. Apesar disso, o interesse
foi suficiente para atiçar o interesse das autoridades do Exército, de forma que o sempre
engenhoso Capanema veio ao socorro do artefato, conseguindo fabricar uma pequena quantidade
de foguetes de Halle por volta de 1852, como coloca um ofício da Comissão de Melhoramentos
sobre uma proposta de venda de foguetes sem cauda, oferecidos pelo Cônsul brasileiro na
Prússia, um tal de Sturz. Diz o ofício:
"Os foguetes sem cauda, denominados tangenciais, já nos são muito conhecidos, e o
capitão Capanema os fabricou a mais de um ano, e ainda conserva alguns para novas
experiências. Talvez o que trata o Cônsul sejam [sic] da mesma espécie. O que é certo
é que tais foguetes sem cauda têm merecido aprovação".
Esta opinião favorável, junto a outras que reconheciam as vantagens dos foguetes no
Brasil, levaram à fabricação de um certo número de foguetes a Congreve, conforme se pode
constatar na seguinte passagem do relatório do Ministro da Guerra de 1853:
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A eficácia dos foguetes de Congreve, principalmente contra massas de cavalaria, a
falta de estradas por onde possa ser conduzida a artilharia de campanha, e mesmo de
montanha, aconselharam o fabrico daquela arma. Alguns centos já se têm feito, e
depois da paz apenas se fazem os necessários para exercícios, e por experiências
continuadas se procura melhorar sua qualidade".
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Fotografia da estativa de foguetes austríacos, fabricada no Brasil e que hoje se
encontra no Museu do Arsenal General Câmara (RS), exemplar único no País e
extremamente raro no resto do mundo. Foto gentilmente cedida pelo coronel José
Renato Andr ade, diretor do Arsenal.
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Desenho do projétil de Halle, em escala, de autoria de João Q. Krause baseado em
exemplar existente no Museu Histórico Nacional. Embaixo, reconstituição
hipotética de como seria o artefato carregado. A espoleta de tempo era de madeira,
com uma composição de queima lenta no centro. Entre a ogiva e o corpo do motor
colocava-se uma pequena camada de argila, para impedir a “degola” do foguete
após a queima de todo o propelente.
"É muito notável, e permita V. Ex. a que tenhamos algum orgulho da circunstância de
ter o resultado dos foguetes correspondido as previdências dos cálculos a que
procedemos, entrando nas fórmulas que estabelecemos como argumentos, a forma do
foguete, a relação do volume pela superfície, direção dos orifícios, e densidade dos
mistos; o que nos falta ainda é um meio de determinar a força propulsora dos mistos
deduzida de seus elementos para o que já temos dados valiosos".
Ainda assim, os problemas não foram superados – nem de alcance, nem de precisão –,
pois o sistema original de Halle sofria de uma falha inerente: a tendência que ocorria em alguns
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casos de o projétil oscilar violentamente na parte posterior depois da queima de todo o
propelente. Tanto é assim que o Manual do Aprendiz Artilheiro coloca: "P[ergunta]: Os Foguetes
de rotação são empregados com vantagem na guerra? R[esposta]: Não; por causa da sua má
direção. É por isso que estão entre nós abandonados".
De qualquer forma, quando a Guerra do Paraguai estourou, o Brasil estava pronto para
equipar suas forças com os artefatos pirotécnicos mais modernos, chegando a fornecer, durante o
conflito, cerca de 10.000 projéteis de diferentes tipos e calibres para as forças em operações.
Esses números tornaram o Brasil em um dos grandes usuários mundiais desse tipo de arma,
sendo que todos eles eram fabricados localmente – e certamente apreciados, pois suas condições
de uso eram particularmente adequadas ao teatro de operações. O pequeno peso dos lançadores e
dos projéteis permitiam o seu fácil transporte em um país sem estradas, tanto é que foram
utilizados em diversas operações de desembarque. Além disso, o rastro de fogo e fumaça do
projétil em vôo era impressionante, não deixando de marcar os observadores que o viam, como
nesta singela descrição do voluntário da Pátria Francisco Pereira da Silva Barbosa, do 1o
Batalhão de Voluntários da Pátria (Rio de Janeiro), no combate de São Borja (10 de junho de
1865), quando a unidade teve que enfrentar o fogo dos foguetes Paraguaios:
Novamente, não há muitos relatos brasileiros sobre o uso dos foguetes em Combate na
Guerra, apesar deles terem tido um papel importante e de terem sido empregados por ambos os
lados no conflito. Contudo, o seu uso novamente gerou um interesse tal que geraram a produção
de um grande número de textos técnicos no Exército sobre eles, inclusive o detalhado “Guia do
Fogueteiro de Guerra”, um manual para os artilheiros tratando de todos os artefatos existentes,
apesar do Exército, a partir de 1868, ter se dedicado apenas a um modelo, com uma estativa
(lançador) e palamenta específica, desenvolvidas no Brasil em 1872.
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O Período do pós-guerra viria a marcar, contudo, uma retração nas atividades fabris desse
ramo da artilharia e do material bélico. A introdução dos novos canhões Krupp 80 mm, em 1872,
com precisão e alcance maiores que os foguetes podiam ter, tornava esses projéteis menos
atrativos como arma, especialmente se considerarmos a necessidade de economia causada pelas
dívidas incorridas pelo País durante o conflito com o Paraguai.
Apesar disso, é necessário apontar que, mesmo nessas circunstâncias, o Exército tentou se
manter adiantado do ponto de vista da pesquisa e desenvolvimento tecnológico. Em 1870, o
tenente da Guarda Nacional, Carlos Martins apresentou ao Exército uma proposta de um tipo
inteiramente novo de foguete. Este seria disparado de um canhão, passando o seu motor a
funcionar no ápice de sua trajetória balística, aumentando em muito o alcance da arma –
exatamente como uma granada assistida por foguetes dos dias de hoje!
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De 1876 em diante, os foguetes de guerra praticamente desaparecem dos documentos
oficiais brasileiros, permanecendo apenas os de sinalização, ainda fabricados pelo Exército na
década de 1930, pois eram um dos poucos meios de sinalização a longa distância eficiente, numa
época em que os aparelhos rádios não eram leves o suficiente para acompanharem as tropas na
linha de frente.
Soldado sérvio com foguetes de sinalização, durante operações nos Balcãs, 1917, 1a
Guerra Mundial.
Nesse período os foguetes sofreram uma retração em todo o mundo, já que as massas
compactas de infantes e cavalarianos que tinham marcado o campo de batalha desde a
Antigüidade estavam desaparecendo por causa das novas armas, além de a imprecisão dos
foguetes torná-los inadequados para a nova situação tática, o que fez com que seu uso fosse
sendo cada vez mais restrito. Nos exércitos europeus que ainda usavam este tipo de arma, elas
ficaram limitadas às guerras coloniais, nas quais a leveza do sistema ainda justificava o emprego
dos artefatos (de Halle aperfeiçoados, o tipo que foi dominante na segunda metade do século
XIX). Mas mesmo isso acabou na década de 1890 – os ingleses ainda os usavam no Benin e na
Nigéria em 1897 e no Egito em 1898. No Brasil, há menções ainda no início do século, em 1905,
sobre a existência de foguetes de cauda central e lateral em depósito, mas estes estavam entrando
na “terceira classe” do arsenal, ou seja, na lista de material inservível, sendo estes marcos do fim
dessa interessante fase da história da tecnologia.
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Uso de foguetes pelos ingleses em operações coloniais no norte da África, 1868.
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Apesar dos pesares, na Primeira Guerra Mundial, quando os artefatos pirotécnicos
poderiam ser considerados como armas ideais contra os Zepelins alemães, a tecnologia tinha se
perdido. Goddard, por exemplo, partiu do zero para desenvolver uma série de foguetes lançados
por um homem a pé (semelhantes a um lança rojão, uma bazuca), mas estes ficaram apenas no
estágio experimental. Os franceses, que tiveram um uso prático de foguetes em combates aéreos
contra balões, tiveram que “reinventar a pólvora”, lançando foguetes de desempenho inferior ao
inventados por Congreve, cem anos antes. Os alemães usaram uma variante do foguete lança-
retinidas, usando um artefato com um arpéu e um cabo de aço por sobre as trincheiras, puxando
o conjunto por meio de um guincho e removendo obstáculos de arame farpado – nada de
tecnicamente brilhante, contudo.
FIM DA 2ª PARTE
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Foguetes no Brasil
do foguete CONGREVE ao VLS – 3ª parte
O período entre guerras vai ver uma retomada no interesse nos foguetes – agora não mais
restrito ao seu aspecto militar. O conhecimento científico estava se acumulando e sabia-se,
naquele momento, que a viagem pelo vácuo necessitaria de um foguete como aparelho propulsor,
como nas propostas do russo Kibalchich (1881) ou do alemão Ganswindt, que já falava em
“velocidade de escape”, ou seja, um aparelho de reação capaz de deixar a terra e se dirigir para o
espaço sideral – isso em 1891.
1
Esnault-Pelterie o autor do termo “astronáutica”.
Do ponto de vista militar, antes mesmo do nazismo ter chegado ao poder, o Reichwehr, o
exército alemão tinha criado um departamento para o estudo de artefatos balísticos especiais, sob
a direção do coronel Karl Becker. Este acompanhava com interesse as atividades da Verein fur
Raumschiffart (Associação das Viagens Espaciais) alemã e o pessoal da Associação, incluindo
Wernher Von Braun, foi convidado pelo coronel Becker a fazer seus experimentos em um campo
de provas militares (Kummersdorf). Surge daí o interesse alemão na tecnologia de foguetes, não
mais voltados para a pesquisa espacial, mas sim para usos bélicos.
2
Von Braun (segundo, da direita) e outros jovens pesquisadores alemães.
Durante a Segunda O uso dos mísseis V-2 e outras armas “inteligentes” semelhantes,
assim como os velhos foguetes ressuscitados, como os rojões usados nas bazucas e nos lança-
foguetes russos Katyusha, fizeram com que a atenção dos militares do mundo se voltassem para
as possibilidades dos motores a foguete.
Míssil V2
O Brasil, que tinha praticamente abandonado o assunto, a não ser uma pequena
fabricação de foguetes de sinalização, não poderia deixar de perceber a importância do assunto,
mesmo porque as forças armadas brasileiras utilizaram de diversas formas de foguetes na
Segunda Guerra, indo desde os pequenos artefatos de 60 mm das bazucas M1 e M9 distribuídas à
FEB (nada menos do que 585 delas foram usadas pelos pracinhas na Itália) até as bombas
foguetes maiores, empregadas nos lançadores de bombas de profundidade dos contratorpedeiros
da Marinha (no lançador Hedgehog).
3
Bazuka (Lança-Rojão) M1, do tipo usado pela FEB na Campanha da Itália 1944/45.
É natural, portanto, que houvesse um interesse pelo assunto, mesmo que fosse apenas
considerando a procura pelo país de um papel mais importante nas relações internacionais.
Apesar disso, são muito pouco conhecidos os programas de pesquisa aeroespacial no Brasil,
especialmente os mais antigos. O pioneiro, ao contrário do que poderia parecer no que é
colocado na bibliografia disponível, não foi o programa da Aeronáutica. A pesquisa começou no
Exército, na Escola Técnica do Exército (ETE), atual IME.
Em 1949, a ETE recebeu um professor francês, o Dr. Edmund Brun, para lecionar a
disciplina Autopropulsão a jato no curso de engenharia industrial e armamentos. Na escola o
professor Brun encontrou diversos alunos entusiasmados, que adotaram como projeto de fim de
curso a idéia de produção de um foguete.
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Prédio do Instituto Militar de Engenharia no Rio de Janeiro.
No ano seguinte, 1950, a ETE avançou ainda mais, com a proposta de se desenvolver o
primeiro foguete de combustível líquido do Brasil. Infelizmente, este projeto não chegou a sair
do papel e não podemos deixar de imaginar se tivesse saído, pois seria uma escolha bem
diferente da que foi seguida até o momento e um ponto importante no desenvolvimento técnicos
de foguetes, pois combustíveis líquidos tem um rendimento melhor e são mais apropriados para
foguetes de pesquisa espacial que os de combustível sólido, esses melhores em aplicações
militares.
5
Lançador múltiplo de foguetes M180R, tecnologia desenvolvida no Exército e
repassado para a Avibrás. Acervo do Museu Militar Conde de Linhares.
Este programa do Exército, apesar de ser muito pouco conhecido, teve seus momentos de
glória. A maior parte dos autores coloca que a origem do atual programa espacial brasileiro
estaria nos atos presidenciais de 1961, que criarão as raízes dessa pesquisa, basicamente na
Aeronáutica. Entretanto, por outro lado, outros pesquisadores, que conhecem a atividade do
IME, colocam como a data marcante da entrada do Brasil no campo de pesquisas aeroespaciais o
lançamento de um foguete de dois estágios da Escola Técnica do Exército em 19 de fevereiro de
1957, com o alcance de 30 quilômetros, com a curiosidade que a plataforma de lançamento deste
era um reparo de canhão de 88 mm antiaéreo, reaproveitado.
No ano seguinte se projetou um outro foguete ainda mais marcante, que infelizmente não
foi lançado, apesar de seus componentes terem sido testados estaticamente. Este era o Sonda I
(EB), apelidado de Gato Félix, capaz de realizar pesquisas espaciais, pois o seu teto de operação
(o apogeu) previsto era de 120 quilômetros, com uma carga útil de 30 kg. Para efeitos de
comparação, o Sonda I da Aeronáutica, além de ser basicamente importado, só tinha uma carga
útil de 4 kg e um apogeu de 64 km – e seu primeiro lançamento se deu somente anos depois, em
1965.
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Foguete experimental X-20, desenvolvido pelo pessoal do Exército e hoje acervo do
Museu Militar Conde de Linhares.
Outro programa de pesquisas pouco conhecido foi o da Marinha. Esta, nos primeiros anos
da década de 1960 (1964-66), desenvolveu uma série de pequenos foguetes, da série SOMMA
(Sondagem Meteorológica da Marinha), usando motores da mesma fábrica de canhões da
Marinha (também eram empregados pela ETE) em diâmetros bem conhecidos : 57, 81,5 e 127
mm, os mesmos de tubos de material bélico lá produzidos. Os foguetes da Marinha (SOMMA-1,
SOMMA-2 e SOMMA-3), assim como o do programa independente da Aeronáutica (que
produziu o SOMFA – Sondagem Meteorológica para a Força Aérea – dentro de um programa
iniciado por proposta do então Ten.-Cel. Aviador Oswaldo Balloussier, em 1955) não tinham o
mesmo desenvolvimento técnico dos artefatos desenvolvidos pela ETE, já que destinavam-se
exclusivamente a levar uma carga de 5 kg de partículas metálicas, para medição de velocidade
dos ventos por radar.
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Figura de comparação entre os tamanhos dos artefatos de pesquisa atmosférica da
Marinha (SOMMA) e da Aeronáutica (SOMFA).
Miniatura de viatura lança foguetes desenvolvida pelo IME entre 1964 e 1968 e
testada na Marambaia. Nem todos os artefatos e veículos desenvolvidos no Brasil
sobreviveram até os dias de hoje, como é o caso desse lançador de foguetes de 81
mm, adaptado em um carro M-8. A função dos Museus é tentar recuperar essas
informações de todas as formas possíveis. Para isso, o uso de miniaturas
detalhadas como essa são uma ferramenta fundamental. Miniatura de autoria de
Expedito Carlos Stephani Bastos.
9
O novo ASTROS AV-300 - TM – Míssil Tático da Avibrás.
FIM
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