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RESUMO
O Arquivo Histórico do Museu Aeroespacial possui um vasto acervo de imagens institucionais que
retratam o cotidiano das Forças Armadas com os seguintes assuntos: solenidades militares, visitas
presidenciais, aeronaves, acidentes aéreos, eventos sociais, vistas aéreas das cidades do Estado do
Rio de Janeiro e de diversas capitais brasileiras. Uma das modalidades desenvolvidas para realizar
esses registros foi a aerofotogrametria. Esta técnica utiliza-se de cálculos matemáticos, cartográficos
e topográficos aplicados sob a fotografia aérea com a finalidade de extrair a forma, as dimensões e a
posição precisa nela contidos. As fotos que foram realizadas com o objetivo de formação de
observadores militares e de registrar as áreas onde seriam construídas pistas de pouso tornaram-se
fontes de pesquisa para o entendimento do desenvolvimento urbano das paisagens brasileiras.
Nesse artigo temos como objetivo apresentar o arquivo iconográfico da Escola de Aviação Militar, da
Escola de Aeronáutica Militar, da Escola de Aviação do Exército e da Escola de Aeronáutica, entre os
anos de 1928 até 1951; contextualizar a produção das imagens desta coleção com o
desenvolvimento da aerofotogrametria no seio da aviação militar brasileira e, apresentar como o
Arquivo Histórico do Museu Aeroespacial, embasado na teoria arquivística, se propõe a organizar
estas imagens.
Nosso trabalho tem como objetivo maior a apresentação desse acervo como
disponível e importante para a pesquisa e estudo em diversas áreas do conhecimento. Além
disso, temos como outras metas as seguintes: traçar o histórico do sítio como instituição de
ensino; tratar do uso histórico da fotografia aérea como prática militar; compreender como o
conjunto de imagens aéreas pode ser organizado pelo Arquivo Histórico do Museu
Aeroespacial; apresentar como se faz a leitura das inscrições obrigatórias neste tipo de
imagem, e realizar uma comparação entre duas imagens, a fim de observar as modificações
na área ocupada por tais instituições.
Nos anos 30, após o fim da Missão Francesa, aconteceram grandes mudanças na
arquitetura da EAvM. Primeiro devido a entrada de Getulio Vargas no poder. Depois por ter
sido palco de um dos ataques e realizados pelo levante comunista de 1935 (LAVENÉRE-
WANDERLEY, 1975, p.109).
Porém, por ter uma dirigibilidade complicada, a missão sobre os aeróstatos era
considerada precária. O avião aumentou as possibilidades, e impulsionou as fotos aéreas,
ao permitir que fossem extraídas vistas de qualquer ponto em seu raio de ação e permitindo
recobrimentos precisos (ESCOLA DE AERONÁUTICA, 1949, p.01).
Para o uso das forças aéreas as fotografias dividiam-se três: panorâmicas em que o
eixo ótico fica inclinado com relação ao terreno e a linha do horizonte aparente ou visível é
observada na foto; obliquas em que o eixo está inclinado em relação ao terreno, mas a linha
do horizonte aparente ou visível não aparece na fotografia; e verticais em que o eixo ótico
formando um ângulo de aproximadamente 90° com o terreno.
1Para saber mais, ver: Dias, Fabiana Costa. Museu Aeroespacial: na trilha do seu acervo. Dissertação
(mestrado) – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Programa de Pós-Graduação
Gestão de Documentos de Arquivo, 2007.
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A partir desta iniciativa, em 1933, mais nove foram identificadas até a efetiva criação
do Museu Aeroespacial, em 1973. Destas, destacamos a portaria número 237, publicada em
dezembro de 1943, na qual Pedro Salgado Filho, ex-ministro da Aeronáutica, designou José
Garcia de Souza para reunir todo o material da Escola de Aeronáutica para fazer parte do
acervo do futuro Museu da Aeronáutica. Esta foi a primeira iniciativa realizada após a
criação da Força Aérea Brasileira (1941) e uma das que tornou o Arquivo Histórico do
Museu Aeroespacial (AHMA) com características bem específicas. Isso se deu devido ao
papel e influência de José Garcia de Souza teve a frente das escolhas dos documentos que
iriam formar o acervo do AHMA.
José Garcia de Souza além de ter sido nomeado pelo Salgado Filho, também
publicava livros sobre a história da Aeronáutica e aviação civil. O conjunto de sua obra sobre
esta temática o levou a receber o título de primeiro historiador da Aeronáutica do Brasil.
Devido as suas pesquisas para suas publicações, o autor realizava buscas por fontes
históricas que seriam utilizadas para seus textos e ao mesmo tempo iriam constituir o futuro
acervo do Museu da Aeronáutica. Portanto, o acervo do AHMA foi constituído por uma
lógica própria, ele antes de ser arquivo, desejou ser a memória e a história da aeronáutica.
2 Ibid., p.39
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capacitação realizadas para o funcionamento do museu. Do mesmo modo,
estamos utilizando o conceito de arquivos em museus, relacionando-o aos
arquivos ou fundos adquiridos pela instituição no âmbito de sua missão de
formação de coleções e complementação de conjuntos documentais, que
servirão de fonte de pesquisa, tendo como objetivo o cumprimento da
missão institucional (HANNESCH, 2013, p.109).
Como foi mencionado na seção anterior, o AHMA foi uma junção de arquivos de
museus e arquivos em museus. A partir do diagnóstico, iniciado em 2005, está sendo
possível identificar os itens que foram doados e por quem foram doados. Essa atividade é
3 Outro fator que contribuiu para o recebimento de documentos foi a ausência de uma política de
recebimento e descarte de acervos.
4 Para saber mais ver: GONDAR, Jô. Cinco proposições sobre a memória. Morpheus: revista de
Como o AHMA está inserido dentro de um contexto de museu, que tem uma lógica
de organização por coleções é interessante sabermos a definição do conceito de coleção.
Segundo Oliveira, a coleção “implica na reunião intencional de documentos sem a marca da
produção natural e sem a explicação da relação orgânica entre os documentos e entre as
atividades que os geraram. A coleção pode ser inclusive temática, e o seu próprio tema
pode ser uma pessoa ou família” (OLIVEIRA, 2012, p.31). A coleção difere basicamente dos
arquivos por duas questões fundamentais: por ser formada por uma reunião intencional e
por não ter relação orgânica.
5A partir da elaboração deste artigo foi observado que além dos documentos institucionais do Museu
Aeroespacial, os documentos institucionais produzidos pelas organizações militares da FAB e, que se
encontram no acervo do AHMA, devem ser avaliados se serão considerados como arquivos em
museus ou arquivos de museus.
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para refazer as relações orgânicas (vínculo arquivístico) entre os documentos, neste caso
dos álbuns. Assim, o trabalho do diagnóstico não se finaliza na identificação das peças
documentais, ele vai além, será uma tentativa de refazer os possíveis conjuntos
arquivísticos. Como exemplo disso, vamos usar os resultados do projeto Arquivos em
Museus: o caso do Museu Aeroespacial. Este projeto identificou 515 álbuns e desse
conjunto vinte álbuns fotográficos foram produzidos, entre os anos de 1928 e 1951, pela
Escola de Aviação Militar, Escola Aeronáutica Militar, Escola de Aeronáutica do Exército e
da Escola de Aeronáutica, compondo 3592 imagens inéditas.
Destacamos esse conjunto de vinte álbuns fotográficos por terem sido produzidos
pelas Escolas de Aviação, que ao longo de um período de vinte e três anos mudaram quatro
vezes de nome e veio a formar a Escola de Aeronáutica pertencente a Força Aérea
Brasileira. As mudanças no nome da instituição, por mais que posso parecer um detalhe,
impactam no momento de se pensar em uma possível organização desse acervo. Cada
escola possuía uma organização interna, atividades e funções para a produção das
imagens, isto é, o contexto de criação, o que deve ser considerado na hora de se pensar o
arranjo. O arranjo é a representação de como os conjuntos arquivísticos são organizados na
sua fase permanente, ou seja, não serão eliminados e sim mantidos de maneira permanente
pelas instituições de guarda.
Dessa forma, o diagnóstico tem uma função de ir além da identificação item a item
dos documentos. Como os álbuns estavam organizados formando uma “coleção de álbuns
fotográficos”, como já foi mencionado, o olhar do arquivista responsável teria que apontar a
existência de uma possível ou não relação orgânica entre os álbuns para poder avaliar se
poderia formar um arquivo6. A relação orgânica foi revelada7 entre os vinte álbuns através de
um exame detalhado das legendas das imagens, o que mostrou a existência de quatro
escolas de aviação, ou seja, quatro arquivos institucionais distintos, como no exemplo do
álbum 0259:
instituições produtoras dos álbuns e a apresentação de uma sequência numérica nas imagens e nos
álbuns.
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Escola de Aeronáutica:
17.06.1941 – 17.06.1941
O trabalho de fotografia das imagens aéreas era executado pela Seção Foto e as
imagens de acidentes com aeronaves era função da Seção de Estatística. Ainda não foi
possível saber se uma dessas seções eram os responsáveis pelas imagens terrestres.
Também foi localizado somente os manuais das atividades e das competências da Seção
Fotos.
Fonte: AHMA
Fonte: AHMA
8 Ibid., p.46
[...] Tal numeração deve seguir uma ordem crescente, partindo de Oeste
para Este e de Norte para Sul. Todo negativo isolado, assim como o
primeiro negativo de um recobrimento, comporta inscrição completa [...]
Posto o negativo em disposição de exame, a extremidade voltada para o
observador é que deve receber a inscrição. Faz-se a marcação, portanto,
sobre o lado da gelatina, e, na parte inferior do negativo (em geral o lado da
sombra). A inscrição pode ser feita com tinta nakin se o negativo é claro, ou
por meio de um estilete, riscando-se fortemente a gelatina, se o negativo é
escuro. Os números e letras devem ser escritos da esquerda para a direita
e invertidos para que possam sair direitos na inversão produzida pela
copiagem (MINISTÉRIO DA GUERRA, 1939, p.124).
A partir dos aspectos observados, podemos refletir sobre uma possível organização
dos álbuns. Para isso precisamos considerar o princípio da arquivística que é o respeito aos
fundos, segundo Duchein (1986) “consiste em manter agrupados, sem misturá-los a outros,
arquivos provenientes de uma administração, de uma instituição ou de uma pessoa física ou
jurídica: é o que se chama de fundo de arquivo dessa administração, instituição ou pessoa”
(DUCHEIN, 1986, p.14). Este princípio já foi respeitado à medida que os álbuns que foram
9 Placa significa que era de vidro e o filme era de nitrato. As placas e filmes poderiam ter o formato de
13x18 cm, podendo ser terrestre (t), de acidentes (a), reprodução (r) e identificação pessoal (i) e 18x
24 cm também podendo ser podendo ser terrestre (T), de acidentes (A), reprodução (R) e
identificação pessoal (I). Observamos que o que distingue a placa ou filme de 13x18 cm do 18x 24 cm
é a letra minúscula t,a r, i da maiúscula T, A, R, I (MINISTÉRIO DA GUERRA, 1939, p. 124, 125).
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identificados e os pertencentes aos mesmos produtores, que revelaram relação orgânica,
foram colocados como representativos de um conjunto de documentos (arquivo).
O próximo passo é saber como lidar com a questão de os álbuns terem imagens que
representam as quatro escolas aéreas de aviação que o Brasil teve. Para ajudar nessa
questão foi feita uma pesquisa para saber se a Seção Fotos, que produzia as imagens que
estão nos álbuns, existia em todas as escolas de aviação. Foram localizados nos manuais
da Escola de Aviação Militar (1919-1938), Escola de Aeronáutica Militar (1938-1940) e da
Escola de Aeronáutica (1941-1960), a Seção Fotos, responsável pela produção das
imagens dos álbuns. Em todos os manuais destas escolas a Seção Fotos possuiu as
mesmas funções e atividades. Ficando apenas com o período de 1940 a 1941, referente a
Escola de Aviação do Exército sem informação sobre esta Seção. A partir disso, podemos
considerar que as competências da Seção de Fotos parecem ter sido mantidas entre os
anos de 1919 e 1960, mesmo com a mudança do nome das escolas de aviação. Como
propor a organização desses álbuns, considerar o último produtor, a Escola de Aeronáutica
ou cada escola individualmente?
Sobre isto Duchein (1986) sugeriu que “o fundo do organismo extinto deve, sempre,
ser considerado como fundo distinto daquele do organismo que o recolheu, salvo se a
mistura dos dois fundos for de tal maneira intricada que sua identificação, um em relação ao
outro, seja impossível” (DUCHEIN, 1982, p. 23). Portanto, os vinte álbuns fotográficos
representam quatro fundos: Escola de Aviação Militar (1919-1938), Escola de Aeronáutica
Militar (1938-1940), Escola de Aviação do Exército (1940-1941) e a Escola de Aeronáutica
(1941-1960). Juntamente ao posicionamento de Duchein (1986), o contexto de criação, a
organicidade e o princípio do respeito aos fundos foram essenciais para alcançar esta
compreensão.
Nisso as fotografias nos podem ser úteis. São muitas as imagens advindas das
instruções que podem nos ajudar a mapear as transformações arquitetônicas e paisagísticas
que ocorreram. Entre 1920 e 1940, segundo os Relatórios do Ministério da Guerra e outros
documentos, foram muitas as transformações ocorridas, porém, como poderemos ver na
tabela e no texto abaixo, o crescimento do estabelecimento parece estar ligado diretamente
a importância que a aviação passa a adquirir, principalmente durante os anos de Getúlio
Vargas.
Fonte: AHMA
Por isso, a Escola viveu um grande boom de construções. Muitos prédios foram
construídos e preocupou-se em criar uma uniformidade na arquitetura das construções. Em
outubro de 1944 o Ministro Salgado Filho, realizando um discurso de ruptura com o
passado, afirmava que:
Fonte: AHMA
Salgado Filho convidou a plateia a observar uma imagem na busca das mudanças
ocorridas no espaço em questão. E realmente se observarmos de forma minuciosa às
fotografias aéreas, apesar de serem diferenciadas, pois a primeira de 1934 é vertical e a
segunda obliqua, notaremos que o número de construções da segunda é muito maior.
10 O Parque de Material Aeronáutico dos Afonsos, foi criado em 1933 com o nome de Parque Central
de Aviação. Seu objetivo era realizar a manutenção das aeronaves de instrução da Escola de
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Outra característica que diferencia as imagens é a quantidade de árvores e
vegetação entre as edificações. Além disso, as ruas e alamedas já estão bem mais
definidas. Poderíamos então, afirmar que o segundo momento tem uma maior preocupação
em relação à organização dos espaços.
7. CONSIDERAÇÕES PARCIAIS
Este artigo teve como proposta apresentar os arquivos fotográficos das escolas de
aviação, tanto do Exército Brasileiro quanto da Força Aérea Brasileira, que funcionaram no
Campo dos Afonsos e que faziam parte da instrução que orientava aos alunos sobre as
técnicas da fotografia aérea. Essa proposta vai ao encontro do desejo do Museu
Aeroespacial em possibilitar o acesso a fontes de pesquisa que revelaram as
transformações nos principais centros urbanísticos do Brasil até áreas mais remotas.
Aviação Militar e as aeronaves usadas pelo 1° Regimento de Aviação, também localizado no Campo
dos Afonsos.
REFERÊNCIAS
______. Noções de Fotografia Aérea. Rio de Janeiro: Imprensa Técnica do S.T.Ae, 1939.