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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS – UFMG

GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA

DOUGLAS HENRIQUE MIRANDA SANTOS

RESENHA: LONGITUDE: A VERDADEIRA HISTÓRIA DO GÊNIO SOLITÁRIO


QUE RESOLVEU O MAIOR PROBLEMA CIENTÍFICO DE SEU TEMPO

BELO HORIZONTE
2023/1
O livro “Longitude”, de Dava Sobel, foi publicado pela primeira vez em 1995 nos
Estados Unidos, pela Walker & Company, e sua tradução brasileira foi publicada
pela primeira vez em 1999, pela editora Records. Em um primeiro momento a autora
conta a história da busca por uma ferramenta que auxiliasse na determinação da
longitude. Não saber determina-la foi um problema que ficou latente para a
humanidade, principalmente com a expansão europeia ao redor do globo e,
curiosamente, foi alvo inclusive de concursos estatais europeus, tal era a
necessidade do desenvolvimento dessa tecnologia.

Em outro momento. Sobel perpassa pelos atores que compuseram essa


busca, de astrônomos a cientistas, que estavam envolvidos com a criação de novos
métodos de medição do tempo, até John Harrison, o relojoeiro inglês que tornaram
essa medição possível com a criação dos primeiros cronômetros marítimos. Ela
também destaca o reconhecimento que Harrison teve pelo seu trabalho no
parlamento britânico e suas consequências para o contexto global.

Em síntese, para além de dar um ótimo contexto cientifico, a autora descreve


muito bem o contexto histórico para a criação dessa tecnologia, mostrando como ela
estava articulada às questões políticas e econômicas da época. A autora também dá
outras perspectivas da busca global por determinar a longitude, mas elas são menos
evidentes no livro. Isso facilmente se justifica pelo expansionismo europeu ter se
tornado o mais voraz da humanidade, soterrando culturas, dizimando povos e
apagando saberes.

Aliás, as consequências do trabalho de Harrison também são exploradas na obra.


Elas contribuíram para o expansionismo europeu, garantindo sua hegemonia
política, econômica e social ao redor do mundo. A invenção do cronômetro marítimo
por Harrison forneceu uma maneira confiável e precisa de medir o tempo no mar, o
que permitiu aos marinheiros determinar sua longitude e navegar com maior
precisão. Essa tecnologia inovadora trouxe benefícios imediatos para o comércio e a
exploração, permitindo uma navegação mais eficiente e confiável e abriu novas rotas
comerciais e mercados. Também teve importantes implicações militares, pois
permitiu que os navios coordenassem seus movimentos, se engajassem em
operações de longo alcance e projetassem poder com mais eficiência.
Durante a leitura do livro dois autores externos se mostram eficientes para
crítica de seu conteúdo. O primeiro e Yves Lacoste. É praticamente impossível ler o
livro sem pensar em como as ideias de sua obra, “A geografia – Isso serve, antes de
mais nada para a guerra”, se aplicam de forma contundente ao contexto do
desenvolvimento da latitude. Logo nas primeiras páginas do livro ele diz do livro ele
diz:

A geografia é, de início, um saber estratégico estreitamente ligado a


um conjunto de práticas políticas e militares e são tais práticas que
exigem o conjunto articulado de informações extremamente
variadas[...] (Lacoste, Pag.9)

Mais tarde ele ainda apela: “a articulação dos conhecimentos relativos ao espaço,
que é a geografia, é um saber estratégico, um poder”. Logo em seguida localiza a
geografia como agente político:

Se a geografia serve, em princípio, para fazer a guerra e para exercer


o poder, ela não serve só para isso: suas funções ideológicas e
políticas, pareçam ou não, são consideráveis (Lacoste, Pag.10)

As ligações da obra de Lacoste com a história demonstrada no livro de Sobes


são extremamente prazerosas de serem apreciadas e imaginadas. Ora, não haveria
tal interesse do parlamento britânico em fomentar o desenvolvimento de tecnologias
que pudessem fazer a medição da longitude se, de fato, a geografia não surgisse
como agente político, como é defendido na obra de Lacoste. No limite, ainda
podemos considerar que os britânicos estavam desenvolvendo a tecnologia, em
primeiro lugar, para fazer a guerra, seja ela no campo econômico, político ou militar.

Outro geografo que surge durante a leitura de Longitude é Milton Santos.


Principalmente para relacionar progresso humano com o impacto da ciência e da
tecnologia na sociedade. Se, por um lado, Sobel explora o contexto histórico e os
avanços científicos que levaram à invenção do cronômetro marítimo e seu papel na
transformação global da navegação, comércio e guerra, por outro, Milton enfatiza o
papel da tecnologia e da globalização econômica na formação das sociedades
contemporâneas e defende a colaboração e o compartilhamento do conhecimento
na descoberta científica.

Nessa perspectiva é intrigante pensar o que teria acontecido caso outros povos
tivessem assumido o papel hegemônico que a Europa obteve com as grandes
navegações. Igualmente assustador é pensar como toda essa tecnologia teria sido
construída caso não houvesse a passagem do conhecimento cientifico e sua
progressão de saberes mais básicos para saberes mais complexos, corroborando
para a ideia de uma ciência globalmente mais colaborativa.

Ademais, o livro de Sobel pode ser considerado um estudo muito rico do tema do
qual ela se debruça. A linguagem é acessível, o que torna a leitura prazerosa, mas
nem por isso menos potente, constituindo uma bibliografia muito interessante para
leitura por pesquisadores e estudantes da área das geociências.

Referências:

LACOSTE, Yves. A geografia – isso serve, em primeiro lugar para fazer guerra.
Tradução Maria Cecília França – Campinas, SP: Papirus, 1988.

SOBEL, Dava. Longitude: A Verdadeira História do Gênio Solitário que Resolveu o


Maior Problema Científico de Seu Tempo. Tradução de Ruy Jungmann. São Paulo:
Companhia de Bolso, 2011.

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