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net/publication/310827210
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presente) View project
Performance evaluation of patch repairs on historic concrete structures (PEPS) View project
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Resumo
O Edifício Vilanova Artigas, patrimônio da arquitetura moderna brasileira, passou recentemente por
extensa obra de reparos. Após um ano do término da obra, é oportuno analisar criticamente o
processo de intervenção. Este trabalho relata e analisa o processo de especificação técnica e
recuperação das empenas de concreto armado aparente e da cobertura do edifício confrontando-o
com os atuais conceitos de conservação e de restauro. Os principais desafios encontrados foram a
falta de estudo detalhado das condições existentes, desconhecimento do comportamento de alguns
materiais nas condições existentes, dificuldade de controle dos atributos cromáticos da argamassa de
reparo e falta de rigor nos procedimentos e cronologia de execução dos serviços. Concluiu-se que
tais intervenções requerem, necessariamente, o reconhecimento, por parte dos seus responsáveis,
do valor cultural do bem e da especificidade da obra e também requerem a adoção de metodologia
que priorize os princípios da conservação e do restauro.
Abstract
The Vilanova Artigas building, icon of the brazilian modern architecture, recently underwent a
comprehensive repair campaign. One year after completion of the intervention, it seems appropriate to
critically review the entire process. This paper reports and analyzes the process of technical
specifications and the repair works on the blind exposed reinforced concrete façades and the roofing
system of the building, collating them to the current fundamentals of conservation and restoration. The
main challenges are related to lack of a detailed study about existing conditions, lack of knowledge of
the behaviour of some materials in the existing conditions, difficulty in controlling chromatic attributes
of patch repairs and lack of rigor in execution and chronology of repair campaign. In conclusion, such
interventions demands, necessarily, that those responsible for the project recognize the cultural value
of the building and adopt a methodology that prioritizes the conservation and restoration principles.
Figura 1: à Esquerda, vista externa do Edifício Vilanova Artigas, fachada principal (fachada sudoeste)
(Nelson Kon, 2010). À direita, vista para o saguão interno com destaque para a cobertura (Marcos
Santos, 2015).
Neste trabalho, serão abordadas as etapas do processo para a realização das intervenções,
como a contratação, a especificação técnica, a execução e os desafios atuais, com o
objetivo de avaliar de forma crítica suas participações nos resultados, para que sejam
aprimorados em futuras intervenções.
O escoamento das águas pluviais se dá pela própria viga-laje, que funciona como uma
grande calha coletora. Os módulos da cobertura foram projetados e executados com
inclinação aproximada de 0,5% em direção aos ralos e condutores de descida, localizados
junto aos pilares internos. Originalmente, a impermeabilização utilizada era composta por
uma membrana moldada in loco, resultado da aplicação de um composto elastomérico
disposto em sucessivas camadas diretamente sobre a laje regularizada, dispensando
qualquer proteção mecânica. Conhecido pelas marcas comerciais Neoprene e Hypalon, era
considerado um sistema bastante avançado para a época.
No entanto, a ausência de registros organizados sobre a cobertura em seus primeiros vinte
anos de serviço impede a realização de uma análise conclusiva sobre a execução da obra e
as intervenções ocorridas posteriormente. Dessa forma, não é possível confirmar a
execução de contraflechas na estrutura da cobertura durante sua construção. Por outro
lado, apesar das limitações técnicas de execução e a ausência de controle de qualidade
quanto à aplicação de um sistema de impermeabilização nos anos de 1960, há indícios de
que essa primeira impermeabilização foi bem executada e atingiu uma vida útil aproximada
de 10 anos (que atenderia atualmente as expectativas de vida útil para esse sistema de
impermeabilização).
O primeiro registro de falha do sistema da cobertura data de junho de 1980, quando o então
diretor da FAUUSP, Prof. Ariosto Mila, solicitou uma vistoria na estrutura do edifício em
decorrência de deformações nas paredes divisórias das salas de aula, causadas pelo
deslocamento das vigas da cobertura. Em registros fotográficos daquela época, embora de
forma discreta, já era possível identificar manchas de eflorescências de carbonato de cálcio
na face inferior da laje de cobertura, o que sugeria falha do sistema de impermeabilização.
Com o passar do tempo houve o agravamento da situação conforme ilustra a Figura 3.
Figura 3: Vista interna da cobertura com detalhe para as eflorescências de carbonato de cálcio,
formadas pela infiltração da água de chuva (Cláudia Oliveira, 2007 e Laís Flores, 2009).
Foram envidados inúmeros esforços para sanar a infiltração de água pela cobertura,
primeiramente com a aplicação de novas camadas de impermeabilização, sem a remoção
da impermeabilização antiga. Ao mesmo tempo, fazia-se necessária a correção da
inclinação da laje por meio de camadas de regularização, devido à deformação lenta do
concreto, de modo a permitir o pleno escoamento das águas pluviais. Esta prática resultou
numa sobrecarga não prevista na estrutura o que, provavelmente, agravou ainda mais a
deformação das vigas. Em 1994, na primeira inspeção técnica conhecida dessa estrutura,
foi identificada a existência de até quatro camadas de impermeabilização e de
regularização, com espessura média final de 22 cm de revestimento. Nessa mesma
inspeção, também foi constatado o acúmulo de água nos caixões-perdidos, comprovando a
ineficiência da impermeabilização aplicada sobre as diversas camadas de regularização da
laje.
No interior do edifício, a degradação generalizada das armaduras e do concreto era visível.
Na época, era possível observar a formação de estalactites e até mesmo, em alguns casos,
depósitos de carbonato de cálcio na superfície de paredes divisórias e no piso dos estúdios.
Além disso, em alguns pontos já havia desplacamentos de concreto, ocasionados pela
corrosão das armaduras.
Este cenário desolador levou a tentativas experimentais com o objetivo de resolver os
problemas de escoamento de água e estanqueidade da cobertura. Após alguns testes, a
solução adotada consistiu na remoção das camadas de regularização e demolição da laje
estrutural, seguida de sua reconstrução com 1% de inclinação para o escoamento das
águas de chuva. Esta intervenção bastante invasiva, iniciada em 1996 e proposta por Bruna
(1995), eliminou a necessidade de uma espessa camada de regularização para o
escoamento das águas pluviais, resolvendo os problemas relacionados à sobrecarga da
estrutura e ao acúmulo de água na laje. Por outro lado, ao elevar o nível da laje, essa
intervenção facilitou a entrada de água pluvial, por respingo, pelas aberturas zenitais da
cobertura. Em alguns locais, o nível da laje ficou acima da cota dessas aberturas zenitais,
havendo a necessidade da construção de contenções para a água ao redor dos mesmos.
No entanto, por envolver métodos bastante específicos, incluindo a necessidade de
escoramento da estrutura durante o procedimento de demolição e reconstrução da laje,
essa intervenção era muito onerosa e foi contratada por etapas ao longo dos anos. Ao final
de 2002, apenas metade da cobertura havia sido reformada e, naquele momento, os
recursos financeiros tornaram-se insuficientes para a continuidade desse procedimento.
A degradação das áreas sem tratamento progrediu rapidamente o que levou, em 2005, à
contratação de um novo trabalho técnico que deveria conter o diagnóstico da atual situação
da cobertura e propor soluções para os reparos necessários. Neste trabalho, desenvolvido
pela PhDesign e cujos resultados estão consubstanciados em Helene et al, 2006, foram
realizadas, além de inspeção visual, extração de testemunhos para ensaios laboratoriais,
medida do recobrimento das armaduras e da frente de carbonatação do concreto da
cobertura, além de ensaios de potencial de corrosão das armaduras. O diagnóstico
evidenciou, como esperado, falhas na impermeabilização nos trechos reformados em 1996,
profundidade de carbonatação entre 5 e 25 mm ultrapassando a espessura de cobrimento
das armaduras, corrosão das armaduras essencialmente na face das vigas invertidas e na
face inferior da laje de cobertura (Figura 4).
Como resultado, foram apresentadas especificações técnicas para a recuperação estrutural
das vigas da cobertura, para a proteção das juntas de dilatação, incluindo a proteção dos
topos de viga com rufo metálico, e três alternativas para o sistema de impermeabilização
(manta de poli (cloreto de vinila) (PVC), silicato de sódio e poliureia).
Figura 4: Vista superior da cobertura com detalhe a degradação do concreto das vigas invertidas e
vigas e corrosão das armaduras (Cláudia Oliveira, 2004).
Figura 5: Vista superior da cobertura após a intervenção de recuperação estrutural das vigas e
instalação dos rufos de proteção de topo nas mesmas (Cláudia Oliveira).
Em 2010, o estado de conservação das empenas foi avaliado pela PhD Engenharia em um
Relatório Técnico contratado pela FAUUSP. Sem manutenção regular e sistema de proteção
ou de monitoramento das condições de deterioração dos materiais, as empenas
apresentavam manchas de eflorescência e de hidróxidos de ferro em suas superfícies, além
de fissuras e desplacamentos do concreto, evidenciando a corrosão de sua armadura. Essa
inspeção daria início ao processo de intervenção que durou de 2012 a 2015.
Execução
A partir dos relatórios técnicos (Helene et al, 2013-2015) elaborados pela equipe da
empresa consultora que acompanhou a obra e pela empresa executora dos serviços, foi
possível obter informações detalhadas sobre o processo de execução.
Figura 10: À esquerda, vista da fachada durante a limpeza por hidrojateamento; à direita, empena de
concreto após os serviços de escarificação (Rodrigo Vergili, 2013).
Diante de tal resultado, em uma segunda etapa, foi experimentado outro procedimento para
a confecção das amostras, então preparadas sobre tabuleiro horizontal de madeira com
subdivisões feitas com sarrafos de madeira para separá-las, com os mesmos materiais
usados para as amostras aprovadas anteriormente, porém com diferentes dosagens dos
componentes da argamassa, do pigmento e do cimento branco. Parte das amostras ficou
sob o sol e parte ficou na sombra, o que não acarretou diferenças na aparência das
amostras. Porém, após um mês de trabalho de aplicação dessa argamassa nas empenas,
os resultados ainda foram considerados insatisfatórios.
Em uma terceira etapa uma nova dosagem de argamassa foi confeccionada, com os
mesmos materiais. Esse novo traço foi aplicado, simultaneamente, em molde de madeira e
em lacuna a ser preenchida na própria fachada. Após a cura, os resultados de cor foram
diferentes: aparentemente, a cor da argamassa do molde era menos luminosa do que a cor
da argamassa aplicada na empena. Além disso, ao longo das aplicações, outros fatores não
registrados influenciaram o resultado final, evidenciando que muitos reparos tinham
coloração menos luminosa do que a coloração das superfícies originais de concreto
aparente, conforme pode ser visto na Figura 11, à esquerda. A despeito das alterações de
aparência, houve a decisão de dar continuidade de execução dos reparos considerando que
a integração desses ao concreto seria feita em etapa posterior, mediante a aplicação de um
tratamento superficial.
Na quarta etapa, voltada aos ajustes da cromaticidade dos reparos, os agentes envolvidos
decidiram pela aplicação de tratamento superficial sobre o reparo, composto por Cimento
Portland Cimpor CPII F-32, rejunte de cor branca, rejunte de cor caramelo e adesivo acrílico.
Essa composição foi aplicada com trincha sobre todos os reparos de todas as empenas
(Figura 11, à direita).
Figura 11: À esquerda, empena sudeste durante execução da obra em 2014 (L. Ferreti). À direita,
edifício Vilanova Artigas em 2016, após a conclusão da obra. (A.P.A. Gonçalves).
Além das dificuldades em alcançar a cromaticidade ideal, foram detectadas outras não
conformidades na aplicação da argamassa estrutural que podem trazer consequências
técnicas e estéticas no futuro, como a aplicação de camadas de argamassa com espessura
superior à estipulada pelo fabricante, sem considerar o intervalo de 24 horas entre as
aplicações sobrepostas e ainda a utilização de adesivos acrílicos, que não constavam das
especificações porque a argamassa já possui, em sua composição, componente que
garante a adesividade ao substrato. Ainda foram constatadas nos relatórios de
acompanhamento da obra inversões na ordem de execução das tarefas, caso da aplicação
do hidrofugante antes do tratamento superficial - para ajuste de cromaticidade - que deveria
precedê-la.
Análise
O primeiro fato a ser considerado na análise deste processo é seu contexto administrativo. A
falta de critérios que priorizassem a preservação do significado histórico do edifício na
contratação dos serviços que resultaram na obra de 2012-2015, acarretaram uma sucessão
de falhas metodológicas no processo quando visto sob a ótica do restauro. É preciso
ressaltar que este mesmo processo poderia ser considerado válido e até bem-sucedido caso
o objeto de intervenção não possuísse valor histórico e, principalmente, estético-
arquitetônico. No caso do Edifício Vilanova Artigas, as decisões administrativas sobre o
edifício deveriam seguir as recomendações atuais da teoria de restauro evidenciadas no
Documento de Madrid (2014). Quando um plano de conservação é posto em prática,
conforme recomendação desse documento, ele guia as decisões tomadas sobre o edifício
utilizando diretrizes desenvolvidas com base em um entendimento claro daquilo que é
necessário preservar. Diretrizes desenvolvidas com base nessa metodologia teriam, por
exemplo, indicado aos responsáveis pelo Edifício Vilanova Artigas a necessidade do
desenvolvimento de um projeto de restauro sob a orientação de profissionais
especializados.
A segunda questão que deve ser analisada diz respeito ao desenvolvimento das soluções
adotadas. A proposta desenvolvida e, eventualmente, executada não foi baseada em
levantamento detalhado das condições existentes e complementado por análises científicas.
As soluções apresentadas também não foram detalhadas em pranchas de projeto executivo,
foram somente descritas em memorial. Embora os órgãos de preservação municipal e
estadual admitam o projeto de restauração mais simplificado para aprovação, o manual de
elaboração de projetos do Instituto do Programa Monumenta” (Brasil, 2005) determina três
etapas para projetos de intervenção. Esse documento, amplamente adotado no Brasil como
referência de metodologia para projetos de restauro, define as seguintes etapas:
identificação e conhecimento do bem; diagnóstico, com o mapeamento de danos, estado de
conservação, ensaios e testes; e a proposta de intervenção contendo o estudo preliminar,
projeto básico e projeto executivo com conteúdos detalhados de estudos técnicos e
diagnósticos. Suas premissas coincidem com as da Carta de Veneza de 1964 (ICOMOS,
1965) e do Documento de Madrid na sua segunda edição (ICOMOS, 2014) de mínima
intervenção, compatibilidade de características físicas, químicas, mecânicas e aspectos de
cor e textura dos materiais, reversibilidade, autenticidade histórica e estética e garantia de
preservação da autenticidade dos processos construtivos, evitando o uso de técnicas que
sejam incompatíveis e descaracterizem o sistema existente. O Manual ainda ressalta a
importância da interdisciplinaridade da equipe de projeto. A adoção de metodologia
apropriada para o desenvolvimento do projeto de intervenção, a exemplo do manual já
descrito, subsidiaria a caracterização, diagnóstico e investigação de melhores soluções para
atender questões de conservação do patrimônio. Além disso, teriam sido evitados conflitos,
atrasos, refazimentos de tarefas e desperdício de material na obra.
Cobertura
Levando em consideração o histórico de intervenções para solucionar a estanqueidade da
cobertura, a solução adotada tem o mérito de ser menos invasiva e baseada em maior
investigação técnica, pois houve o cuidado de produzir protótipos para avaliar diferentes
métodos de impermeabilização antes da obra se iniciar. Apesar da poliureia não ter sido
uma das técnicas testadas, esse processo revelou diversos problemas em relação às
outras, levando à escolha da poliureia por exclusão. Outro ponto interessante é que o
sistema aplicado é semelhante ao original, pois dispensa proteção mecânica e é constituído
por uma membrana moldada in loco. Sua aplicação, feita de maneira a recobrir
completamente as vigas e lajes da cobertura, também é semelhante ao sistema original de
impermeabilização.
No entanto, como mencionado anteriormente, a falta de detalhamento do projeto acarretou
diversos problemas que podem ser observados atualmente na cobertura. Um desses
problemas é a falta de regularização do nível e dimensões de abertura dos ralos,
contribuindo para o empoçamento de água da chuva e dificuldade de encaixe das grelhas.
Além disso, a falta de estudo aprofundado sobre o detalhamento das novas claraboias levou
à instalação de um material sem comprovação de sua resistência e durabilidade.
Desenvolvido durante a obra, o detalhe de fixação da claraboia acabou gerando
agravamento da ocorrência de respingos no interior do edifício e a necessidade de
instalação de um novo elemento, um barrado em tela cuja durabilidade também é
desconhecida.
Ainda que a parte superior da cobertura não seja visível aos usuários, teria sido prudente
analisar os possíveis impactos das soluções adotadas sobre o significado cultural do
edifício, conforme recomendação do artigo 5 do Documento de Madrid na sua segunda
edição (ICOMOS, 2014). Destaca-se aqui a mudança de cor da cobertura que assumiu um
tom de cinza esverdeado devido à exposição da poliureia à radiação UV. Quanto à
substituição das claraboias, priorizou-se a retomada da qualidade da luz natural em
detrimento da preservação do material sem aprofundada análise técnica. Além disso, a
substituição das luminárias internas feita ao final da obra tampouco passou por análise de
seu impacto na leitura dos ambientes internos, afetando especialmente nos estúdios (Figura
12).
Figura 12: À esquerda, vista do saguão interno. À direita, vista dos estúdios com destaque para as
luminárias (Renata Campiotto, 2016).
Empenas
Sobre a intervenção nas empenas de concreto armado aparente das fachadas, ressalta-se
que, embora os mecanismos de degradação em concretos históricos, como a corrosão de
armaduras, se assemelhem ao que se observa em concretos em geral, a abordagem do
projeto de intervenção deve ser outra. Em sua tese, Heinemann (2012) enfatiza que os
procedimentos a serem propostos para obras de conservação de concretos históricos
priorizem a investigação histórica de intervenções e o uso de análises científicas para
conhecer as causas dos danos e as propriedades do material, preferencialmente por meio
de técnicas não destrutivas, medidas que reafirmam as instruções do manual de projeto do
Instituto do Programa Monumenta (Brasil, 2005).
As diretrizes necessárias para desenvolvimento de projeto e especificações coincidem com
o enfoque em desempenho para intervenção em estruturas de concreto apresentada por
Matthews (2007). A partir de resultados concretos no CONREPNET (Rede europeia voltada
ao segmento dos reparos em estruturas de concreto com base na análise de desempenho -
Thematic network on performance-based remediation of reinforced concrete structures), o
autor cita dois tipos de abordagens: a prescritiva, para especificação de produtos e
procedimentos, que são indicados por possuírem as características requeridas ou por
conterem mescla de ingredientes que alcançam valores compatíveis com parâmetros
mensuráveis especificados, e a abordagem baseada no desempenho, que avalia a
habilidade de atendimento às funções e intenções descritas na fase de projeto. No caso de
intervenção em edifício de valor histórico-cultural, existem exigências específicas que vão
além do atendimento aos parâmetros técnicos tradicionais.
Quanto à argamassa de reparo aplicada às fachadas, é necessário considerar que quando a
escolha de projeto recai sobre a aplicação de argamassa de reparo estrutural, Heinemann
(2012) afirma que um dos desafios é a avaliação do comportamento de dois materiais
diferentes trabalhando juntos, o concreto original e a argamassa estrutural. Sua tese elenca
as condições a serem contempladas em projeto de conservação de edifícios que
apresentem superfícies de elementos de concreto armado aparente: atendimento a
requisitos técnicos e arquitetônicos considerando a compatibilidade entre os requisitos de
resistência mecânica, deformação, propriedades físico-químicas, durabilidade além dos
atributos estéticos. No que se refere à compatibilização dos dois materiais, o
desconhecimento, como por exemplo, da resistência à compressão, do módulo de
elasticidade, da porosidade e do percentual de absorção de água do concreto pode impactar
negativamente na durabilidade dos reparos e também resultar no surgimento de novos focos
de corrosão no concreto, como já indicado por pesquisadores e profissionais especializadas
na área (Tilly; Jacobs, 2007; Gonçalves, 2011; Grantham, 2011; Ribeiro et al, 2013)
No âmbito do restauro, é mais frequente optar-se pelo desenvolvimento de uma argamassa
específica para o substrato a ser reparado, justamente para se garantir a compatibilidade
entre o material novo e o original. O primeiro passo para o desenvolvimento dessa
argamassa é a caracterização das propriedades físico-químicas e da composição do
concreto original. Segundo Odgers (2012), a identificação do tipo de cimento, agregados e
aditivos é necessária inclusive para a compatibilização estética do reparo, pois estes
materiais são determinantes da cor do concreto original. Assim, Odgers (2012) recomenda
que a formulação da argamassa de reparo comece a partir da dosagem e composição do
concreto original, e que esta fórmula original seja adaptada com aditivos para se aproximar
ao máximo das características atuais do concreto original e para garantir desempenho
adequado. No entanto, fatos observados durante a obra de intervenção do Edifício Vilanova
Artigas se contrapõem a essas recomendações. As tentativas de simular a estética do
concreto original nessa obra não consideraram sua composição, o que torna a tarefa quase
impossível. Além disso, a modificação de uma argamassa de reparo industrializada com
adição em grande quantidade de outros ingredientes mina a justificativa de sua
especificação, pois ao modificar sua composição não é mais possível garantir seu
desempenho original conforme atestado pelo fabricante.
Ainda é preciso considerar que a própria metodologia de compatibilização estética adotada
era equivocada para este edifício, pois partia da premissa que a mesma argamassa de
reparo seria aplicada em todas as lacunas. No entanto, o que se observa é que as
superfícies das fachadas apresentam cinco faixas, identificáveis visualmente, cada uma com
características próprias que resultam possivelmente de variações dos materiais (cimento,
areia, pedra), da fôrma e dos procedimentos de lançamento, adensamento e cura do
concreto de cada etapa de concretagem. Assim, os atributos da cor são considerados
homogêneos dentro de cada faixa, e heterogêneos entre as faixas, concluindo-se que não
existe apenas uma cor de concreto que represente todas ou apenas uma das empenas.
Portanto, as investigações e propostas deveriam ser feitas por trechos a serem tratados,
dentro de faixas de predominância de aparência de áreas vizinhas do concreto a ser
reparado, o que teria resultado em uma paleta de argamassas com composições diferentes.
Outra questão importante a ser analisada é a falta de testes de argamassa de reparo e de
limpeza para o concreto das empenas antes do início das obras. No início do relatório de
2010 da PhD Engenharia (Helene et al, 2010), foi admitida a dificuldade de atingir cor e
textura similar à do concreto existente na argamassa de reparo, justificada pela extensa
área a ser restaurada. Embora na especificação das intervenções para as empenas de
concreto tenham sido descritos os cuidados com os materiais envolvidos e procedimentos,
teria sido prudente que as especificações finais viessem após a execução de um teste
piloto, a exemplo do que foi feito em um módulo da cobertura para a renovação de sua
impermeabilização. Previa-se que após algum tempo as ações ambientais tratariam de
tornar as diferenças estéticas entre argamassa de reparo e concreto original imperceptíveis,
o que não ocorreu até a presente data. Essas diferenças, provavelmente, tornar-se-ão cada
vez mais visíveis, pois o tratamento superficial aplicado sobre os reparos, ao final da obra,
fez com que essas áreas assumissem uma textura muito mais lisa e menos porosa do que o
concreto original, o que dificulta a deposição de particulados sólidos e agentes biológicos
geralmente responsáveis pelo escurecimento de fachadas.
Além disso, durante a obra as condições de preparo e aplicação da argamassa em amostras
foram muito diversas das condições de aplicação nas fachadas. As amostras foram
realizadas em superfície horizontal e os reparos das empenas estão na vertical. Os
tratamentos superficiais das duas superfícies são diferentes: enquanto na amostra é
possível que tenha sido mais trabalhada, no local das lacunas das empenas este tratamento
pode ser diferente ao dedicado às amostras. Outra diferença pode residir na falta de
exatidão na medição dos componentes da dosagem.
A falta de rigor nos procedimentos e cronologia de execução propostas pelas especificações
pode ser responsável por resultados indesejados, prejudicando o desempenho dos reparos.
Desafios Atuais
O grande desafio que o Edifício Vilanova Artigas enfrenta é a falta de reconhecimento por
parte das autoridades responsáveis pela sua conservação da necessidade de se empregar
metodologias condizentes com a importância cultural deste edifício. Além disso, é preciso
colocar em prática medidas preventivas de manutenção para todos os sistemas que
constituem o edifício, mas principalmente para aqueles mais vulneráveis e de maior valor
cultural, como a cobertura e as empenas. As principais questões referentes a esses
sistemas são: manter a cobertura o mais estanque possível e minimizar o processo de
degradação das grandes superfícies de concreto armado aparente das fachadas.
Com objetivo de enfrentar tais desafios, iniciou-se a elaboração da primeira fase do Plano
de Gestão de Conservação do Edifício, respaldado pelo Programa Keeping It Modern da
Getty Foundation, que tem se concentrado nas seguintes tarefas:
1. Levantamento de documentação gráfica, fotográfica e documental do edifício, de forma a
estudar os espaços e suas transformações ao longo do tempo. Juntamente com a descrição
e documentação do edifício em sua configuração atual, esta pesquisa irá subsidiar a
identificação dos elementos a serem preservados devido a sua importância cultural. Esta
será a primeira etapa para a elaboração de diretrizes para futuras intervenções no edifício.
2. Monitoramento do sistema de impermeabilização, a partir da análise sobre a eficácia da
última intervenção, informando a necessidade de campanhas futuras de manutenção do
sistema de impermeabilização com o objetivo de prevenir danos maiores à estrutura de
concreto armado. Este monitoramento será complementado pela identificação dos vários
elementos que compõem o sistema da cobertura e de suas interfaces.
3. Caracterização do concreto original através de petrografia, ultrassom, esclerometria e
resistividade. Determinação do estado de conservação com inspeções visuais e
mapeamento do potencial de corrosão. Além disso, o levantamento de dados pluviométricos
e de crescimento de poluentes desde sua inauguração completará as informações sobre o
contexto a que as empenas estão expostas.
O desenvolvimento de um plano de conservação para o Edifício Vilanova Artigas e sua
efetiva implantação contribuirão para que as futuras intervenções no edifício sejam mais
bem conduzidas. O plano de conservação deverá proporcionar melhoria na capacidade de
planejamento, tornando as prioridades de ação mais claras. Além disso, as diretrizes do
plano proporcionarão transparência no processo de tomada de decisões.
A pesquisa que está sendo desenvolvida sobre o sistema de cobertura do edifício contribuirá
para o enfrentamento das questões que afetam atualmente a conservação desse elemento.
Menos de um ano após o término da obra, já se observam indícios de ruptura da membrana,
como goteiras na parte interna. Este problema está, provavelmente, associado à falta de
controle na qualidade de aplicação da poliureia durante a obra. Além disso, a especificação
previa manutenção constante da cobertura, o que não está ocorrendo. A pesquisa irá
estabelecer um manual de conservação para o sistema da cobertura com os procedimentos
adequados para lidar com esses problemas, além de recomendar inspeções preventivas
para evitar o agravamento destas questões.
O estudo que está sendo feito sobre as empenas possibilitará o desenvolvimento de
melhores soluções para a preservação deste elemento. Nas empenas, o grande desafio é a
propagação da corrosão da armadura, já detectada em inspeções visuais recentes. A partir
do trabalho que está sendo elaborado, será possível entender melhor os fatores que
influenciam este mecanismo de degradação. Isso possibilitará a proposição de soluções
mais eficazes voltadas para a causa da degradação. Além disso, os resultados também irão
contribuir para a formulação de argamassas de reparo e métodos de aplicação para futuras
obras de intervenção, mais apropriados para a preservação do significado cultural do
edifício. Também será necessário avaliar o desempenho da argamassa de reparo aplicada e
estudar possíveis soluções para minimizar seu impacto estético nas empenas.
Conclusão
A análise realizada revela a importância da adoção de uma metodologia que priorize a
preservação do significado cultural do patrimônio sem prejuízo da qualidade e durabilidade
dos reparos a serem realizados. Além disso, fica claro que a adoção dessa premissa deve
permear o processo desde a investigação das manifestações patológicas até a execução do
serviço especificado. Quanto à avaliação dos resultados obtidos na obra de 2012-2015
conclui-se que o resultado insatisfatório da intervenção nas empenas é consequência da
adoção da abordagem prescritiva e da falta de reconhecimento da necessidade de um
projeto completo desenvolvido conforme as metodologias e teorias atuais de restauro de
patrimônio. Já a execução da reforma da cobertura foi antecedida por análise que
possibilitou o aprofundamento nas discussões sobre a melhor solução a ser aplicada. Assim
mesmo, o método empregado ainda não está consolidado e induz a dúvidas e incertezas
quanto à sua durabilidade e manutenção.
Conclui-se que uma intervenção de reparos em edifício com importante significado cultural
necessita da adoção de certas premissas para ser bem-sucedida. Primeiro, é preciso que os
responsáveis pela sua preservação reconheçam sua importância e a especificidade da obra
de intervenção. Segundo, a elaboração de projeto detalhado baseado em análise
aprofundada do problema e do edifício, seguindo metodologia de restauro contemporânea é
imprescindível. Por fim, a execução da obra deve ser feita por equipe altamente capacitada,
com elaboração de amostras antes da execução de cada item, cautela e rigor na execução
do serviço e controle da qualidade na execução da obra.
Agradecimentos
Os autores agradecem a Getty Foundation pelo apoio à pesquisa.
Referências bibliográficas
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