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CONTROLE DE

QUALIDADE E
GERENCIAMENTO
LABORATORIAL
Legislação aplicada à
gestão laboratorial
Ana Daniela Coutinho Vieira

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Descrever o papel da RDC n° 302/2005 na gestão laboratorial.


>> Reconhecer as etapas legais necessárias para o licenciamento de um labo-
ratório de análises clínicas.
>> Listar normas de biossegurança que devem ser cumpridas na rotina labo-
ratorial.

Introdução
A gestão laboratorial é embasada em uma série de documentos legais e de pu-
blicações técnicas que visam uniformizar e otimizar os serviços prestados nesse
segmento. Essas recomendações devem ser aplicadas desde o momento da im-
plementação do laboratório e durante todo o desenvolvimento de suas atividades.
Neste capítulo, vamos discutir as principais legislações envolvidas na atividade
de laboratórios clínicos e de seus postos de coleta, com grande destaque para
a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) n° 302, de 13 de outubro de 2005. Além
disso, vamos descrever os requisitos e estágios necessários para a legalização
de um laboratório clínico e as principais orientações de biossegurança para seu
funcionamento.
2 Legislação aplicada à gestão laboratorial

Regulamento técnico para laboratórios


clínicos
Para que um laboratório atue no Brasil, é necessário que esteja de acordo
com as regulamentações sanitárias nacionais e regionais, que visam garantir
a uniformidade dos serviços prestados no setor. Por isso, em outubro de
2005, a Diretoria Colegiada da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sani-
tária) aprovou e publicou o Regulamento Técnico para funcionamento de
Laboratórios Clínicos por meio da RDC nº 302. Esse documento dispõe sobre
o funcionamento de qualquer laboratório de análises clínicas, de patologia
clínica e de citologia e seus postos de coleta, e nele são abordados todos os
principais aspectos relacionados à organização, à estruturação e aos pro-
cessos de um laboratório (BRASIL, 2005). A partir da data de sua publicação,
os laboratórios em atuação tiveram 180 dias para se adequarem às normas
e às prerrogativas do regulamento.

As Secretarias de Saúde Municipais, Estaduais e do Distrito Fe-


deral podem adotar normas complementares à RDC nº 302/2005,
ou seja, adicionais, de acordo com seu entendimento em relação às necessidades
sanitárias locais.

A referida RDC é a principal base teórica e legal para a fiscalização dos


laboratórios públicos ou privados no Brasil e, portanto, também é a principal
fonte a ser consultada antes de iniciar a implantação ou a adequação de
um estabelecimento. Também serve de fundamento, juntamente a outras
diretrizes, para a estruturação de programas da qualidade.
O documento é estruturado em cinco tópicos principais, que serão abor-
dados mais detalhadamente ao decorrer deste capítulo. Vejamos.

1. Condições gerais: inclui organização, recursos humanos, infraestrutura,


equipamentos e instrumentos laboratoriais, produtos para diagnóstico
de uso in vitro, descarte de resíduos e rejeitos, biossegurança, limpeza,
desinfecção e esterilização.
2. Processos operacionais: separando-os por fase pré-analítica, fase
analítica e fase pós-analítica.
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3. Registros: documentos que necessitam de armazenamento e seus


respectivos prazos.
4. Garantia da qualidade: medidas pelas quais o laboratório deve garantir
a qualidade dos exames prestados.
5. Controle da qualidade: compreende o controle da qualidade interno
e externo.

Inicialmente, a RDC nº 302/2005 dispõe que, para funcionarem, os la-


boratórios deverão possuir alguns documentos e cadastros básicos, como
o alvará sanitário, um documento expedido pelos órgãos de autoridade
sanitária direcionado para aquele estabelecimento, nas esferas municipal,
estadual ou do Distrito Federal. Esse é o principal atestado relacionado à
execução de atividades que estejam sob o regime da vigilância sanitária, e sua
concessão está diretamente ligada ao atendimento às normas apresentadas
na RDC nº 302/2005 e aos possíveis requisitos adicionais locais. Além disso,
é importante salientar que o alvará sanitário deve ser renovado anualmente,
a partir de uma fiscalização por profissionais competentes do órgão sanitário
responsável (BRASIL, 2005).
Além do alvará sanitário, o laboratório e seus postos de coleta deverão
estar inscritos no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES),
independentemente de estarem vinculados a contratos de prestação de
serviços pelo Sistema Único de Saúde (SUS), e deverão apresentar um pro-
fissional registrado como responsável técnico, de acordo com os seguintes
requisitos (BRASIL, 2005):

„„ deverá ser um profissional legalmente habilitado para tal função


(p. ex., biomédicos, bioquímicos e médicos patologistas);
„„ deverá estar registrado em seu respectivo conselho de classe regional
(Conselho Regional de Biomedicina, Conselho Regional de Farmácia,
etc.);
„„ poderá assumir a responsabilidade por, no máximo, dois laboratórios
clínicos ou dois postos de coleta, ou um laboratório clínico e um posto
de coleta;
„„ em caso de impedimento do responsável técnico (p. ex.: devido a
licença ou afastamento), o laboratório e os postos de coleta deverão
contar com outro profissional legalmente habilitado para substituí-lo.
4 Legislação aplicada à gestão laboratorial

Cada posto de coleta deverá possuir vínculo de subordinação com


apenas um laboratório clínico, ou seja, o posto de coleta pertence
à esfera administrativa de um laboratório-matriz e é vedada a prestação de
serviços para diferentes laboratórios (diferentes empresas). Isso também se
aplica aos laboratórios da esfera pública, com definição da hierarquia pelo
gestor responsável. Da mesma forma, as atividades de coletas externas, por
meio de unidades móveis ou coletas domiciliares e empresariais, deverão estar
vinculadas a um laboratório clínico (BRASIL, 2005).

Nesse documento, também consta que é responsabilidade do Responsá-


vel técnico, juntamente à direção do laboratório, o planejamento, a imple-
mentação e a garantia da qualidade dos processos, incluindo a gestão de
equipes técnicas e de recursos necessários para a execução de seus ofícios
(equipamentos, reagentes, insumos e técnicas), a supervisão técnica das
atividades, a proteção dos dados dos pacientes e a rastreabilidade de todos
os processos. Sugere-se que o atendimento a esses requisitos seja descrito
e registrado em um documento interno, como um manual de funcionamento
ou manual do laboratório, em que devem ser especificadas as formas como
o laboratório atende a essas condições (BRASIL, 2005).

A proteção de dados dos pacientes é um assunto cada vez mais


abordado na gestão dos laboratórios clínicos, sobretudo devido
à aprovação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, que dispõe sobre a
proteção dos dados pessoais e o direito fundamental à liberdade e à privacidade
de todo indivíduo, em qualquer esfera (pública, privada, física ou jurídica) que
tenha acesso a esses dados.

Com relação à gestão de recursos humanos, é determinado que a con-


tratação de funcionários deverá ser feita após exames médicos, de acordo
com o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), e deverá
atender aos requisitos da Norma Regulamentadora (NR) nº 7, aprovada pela
Portaria nº 3.214, de 8 de junho de 1978, do Ministério do Trabalho e Em-
prego, e pela Lei nº 6.514, de 22 de dezembro de 1977 (ou suas substitutas).
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Além disso, cabe ao laboratório gerir e arquivar documentos referentes a


vacinações obrigatórias dos funcionários e aos treinamentos de formação
continuada e qualificações, de acordo com as funções desempenhadas por
esses profissionais (BRASIL, 2005).
Quanto aos equipamentos e instrumentos utilizados no laboratório clínico
e em seus postos de coleta, entende-se que, além de serem suficientes para
as demandas e complexidades do laboratório, devem estar registrados junto a
Anvisa, assim como reagentes, insumos e saneantes (BRASIL, 2005). O registro
e a liberação de uso desses equipamentos devem seguir as recomendações
da RDC nº 27, de 21 de junho de 2011, que dispõe sobre os procedimentos para
certificação compulsória dos equipamentos sob regime de vigilância sanitária.
Além disso, devem ser mantidos registros de calibrações e de manutenções
(preventivas ou corretivas), bem como orientações sobre seu funcionamento
em língua portuguesa, em manuais ou documentos orientativos internos.
Também se determina que haja registro de verificação de temperatura dos
equipamentos que funcionam sob temperaturas controladas, como geladeiras
e estufas (BRASIL, 2005).
Os reagentes que são preparados ou aliquotados no próprio laboratório
devem possuir uma identificação indicando o nome do produto, sua concen-
tração, data da preparação, data de validade, condições de armazenamento,
riscos potenciais e número de lote e responsável pelo preparo, quando apli-
cáveis. Também a rastreabilidade deve ser aplicada aos reagentes e insumos
utilizados no laboratório, através por meio dos registros de compra e de
abertura de lotes (BRASIL, 2005).
Vale destacar que a água utilizada em processos laboratoriais também
é considerada um reagente, sendo, inclusive, denominada “água reagente”.
Portanto, cabe ao laboratório garantir sua pureza. Segundo o CLSI (Clinical
Laboratory Standards Institute), são consideradas três classificações da água,
conforme listado a seguir (MILLER, 2006).

„„ Tipo I: engloba o maior grau de pureza, tanto físico-químico como


microbiológico, sendo ideal para utilização em equipamentos e pro-
cessos analíticos.
„„ Tipo II: engloba água de pureza físico-química, mas que tolere a pre-
sença microbiológica, como em processos com posterior autoclavagem,
por exemplo.
„„ Tipo III: com menor grau de pureza, não recomendada para processos
analíticos.
6 Legislação aplicada à gestão laboratorial

Ainda, podem existir águas com níveis de pureza mais elevados, utilizadas
especialmente para alguns equipamentos e metodologias, como na croma-
tografia líquida de alta eficiência (ou HPLC).
Além disso, devem ser mantidos registros de preparo e verificação da
qualidade dos insumos preparados. Para metodologias in house (desen-
volvidas localmente), devem ser documentadas as etapas do processo,
as especificações para aprovação de insumos, de reagentes, de equipamentos
e de instrumentos utilizados, e os critérios e sistema de validação da meto-
dologia. Nesses casos, deve ser indicado, no laudo, que o método utilizado
é preparado e validado pelo próprio laboratório (BRASIL, 2005).

Os reagentes e insumos utilizados em laboratórios clínicos devem


ser usados de acordo com as recomendações e as indicações do
fabricante, sendo proibida sua utilização ou revalidação após o vencimento
(BRASIL, 2005).

Processos operacionais segundo a RDC nº 302/2005


Tradicionalmente, os processos laboratoriais são segmentados em três eta-
pas, pré-analítica, analítica e pós-analítica, e, na RDC nº 302/2005, não é
diferente. Nesse documento, as recomendações para a fase pré-analítica
envolvem, sobretudo, orientações para cadastro de pacientes e para manejo
de amostras, podendo ser complementadas pelos documentos internos do
laboratório, como manuais de coleta e de atendimento.
Em resumo, pontua-se que o cadastro de pacientes deverá prover algumas
informações mínimas como (BRASIL, 2005):

„„ número de identificação do paciente no sistema laboratorial (número


interno, gerado pelo laboratório);
„„ nome, idade, sexo e procedência do paciente;
„„ telefone e/ou endereço do paciente;
„„ nome do solicitante, exames solicitados e tipo de amostra;
„„ data e hora do atendimento, horário da coleta (quando aplicável) e
data prevista para a entrega do laudo;
„„ quando aplicáveis, sinalização de urgência e informações adicionais,
como medicamentos em uso, tempo de jejum, observações clínicas, etc.
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Em casos de pacientes menores de idade ou incapacitados, também


deverão ser informados nome e contato do responsável. Preferencial-
mente, o paciente deve apresentar um documento de identificação, mas, para
pacientes em internação ou em atendimento de urgência, podem ser utilizados
os prontuários médicos como fonte de dados de identificação.

Novamente, é essencial que o laboratório preze pela rastreabilidade de


processos e possua mecanismos de acompanhamento da amostra desde o
momento de seu recebimento ou coleta, com registro do funcionário respon-
sável pela coleta e/ou recebimento. Além disso, após o cadastro, o paciente
deverá receber um comprovante de atendimento com o número do registro,
seu nome, sua data de atendimento, a data prevista de entrega do laudo,
a relação dos exames solicitados e os dados para contato com o laboratório
(BRASIL, 2005).
Determina-se, também, que o paciente receba informações sobre coleta e
preparo das amostras em linguagem acessível, de forma verbal e/ou escrita.
Ademais, internamente, o laboratório deve manter protocolos escritos sobre
os critérios de aceitação ou rejeição das amostras, bem como sobre realização
de análises em amostras com restrição (BRASIL, 2005).
Então, assim que as amostras são coletadas ou recebidas, devem ser ime-
diatamente identificadas e encaminhadas para a próxima etapa de triagem,
encaminhamento ou processamento, de acordo com as instruções escritas de
transporte de amostras (prazo, condições de temperatura, especificidades de
conservação e manipulação). É importante que, no momento do transporte,
sejam respeitadas as indicações de biossegurança e que a estabilidade
da amostra seja preservada. Também se recomenda que o transporte seja
realizado em recipientes isotérmicos (caso necessário), higienizáveis e im-
permeáveis, com identificação de “Espécimes para diagnóstico”, símbolo de
risco biológico e identificações do laboratório responsável de forma visível.
Caso haja terceirização dos serviços de transporte, essa associação deverá
ser formalizada por contrato (BRASIL, 2005).
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É permitido que os laboratórios clínicos tenham laboratórios de


apoio para a realização de exames de forma terceirizada. Nesses
casos, deve haver um cadastrado atualizado de todos os laboratórios de apoio,
seus respectivos contratos de prestação de serviços e meios de avaliação da
qualidade desses laboratórios. Além disso, os laudos emitidos pelos laboratórios
de apoio devem permanecer arquivados e disponíveis pelo prazo de cinco anos
(BRASIL, 2005).

Já na fase analítica, as recomendações iniciam com a necessidade de


formalização escrita de todos os processos analíticos realizados no labo-
ratório e nos postos de coleta. Esse requisito pode ser atendido por meio
de documentos de procedimentos operacionais padrão (POPs) e bulas dos
fabricantes, desde que utilizem referências com embasamentos científicos
válidos. Ainda, o laboratório deve manter uma lista atualizada com todos os
exames realizados localmente, em outras unidades do mesmo laboratório,
terceirizados e realizados remotamente (TLRs, testes laboratoriais remotos)
(BRASIL, 2005).
Todos os TLRs e testes rápidos devem estar vinculados a um laboratório
clínico, posto de coleta ou serviço de saúde pública, e o responsável técnico
pelo laboratório também será responsável por esses testes e pelos respectivos
laudos, que deverão conter observações quanto a suas limitações diagnós-
ticas. Da mesma forma, o laboratório deve prover instruções e educação
continuada aos usuários responsáveis pela execução dos TLR, bem como
documentos com as orientações para as fases pré-analíticas, analíticas e
pós-analíticas desses procedimentos (BRASIL, 2005).
Também devem estar definidos e documentados (p. ex., por meio de um
POP), os protocolos emergenciais e de liberação de resultados em emergên-
cias, os limites críticos de resultados e as decisões a serem tomadas nesses
casos, e o fluxo de comunicação com pacientes ou médicos quando há a
necessidade de comunicação (BRASIL, 2005).

Os valores críticos são limites que, quando atingidos em um resul-


tado de exame laboratorial, relacionam-se com tomada de decisões
imediatas, muitas vezes decorrentes de situações que colocam em risco a vida
dos pacientes. Por isso, uma rápida comunicação ao médico ou responsável
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pelo paciente deve ser feita e registrada pelo laboratório. Uma lista de valores
críticos é disponibilizada no site do Programa Nacional de Controle de Qualidade
e pode ser incorporada e complementada pelos laboratórios.

Além do controle da água reagente com mecanismos de obtenção de


pureza em grau compatível com as atividades exercidas e com ferramentas de
controle de qualidade dessa água, os laboratórios clínicos devem monitorar
os processos da fase analítica por meio de ferramentas de controle interno
e externo da qualidade (BRASIL, 2005).
Por sua vez, na fase pós-analítica, as recomendações focam a liberação
de resultados. Os laudos são os documentos utilizados pelos laboratórios
para a formalização da entrega dos resultados e deverão obedecer a alguns
critérios mínimos, como (BRASIL, 2005):

„„ identificação, endereço, telefone e número do registro no conselho


de classe profissional do laboratório;
„„ identificação e número de registro no conselho de classe profissional
do responsável técnico pelo laboratório;
„„ identificação e número de registro no conselho de classe do profis-
sional que realizou a liberação do exame;
„„ nome e registro de identificação do paciente;
„„ data da coleta da amostra e data da emissão do laudo;
„„ nome do exame, tipo de amostra e método analítico utilizado;
„„ resultado do exame e sua respectiva unidade de medida (quando
aplicável);
„„ valores de referência, limitação metodológicas, dados para interpreta-
ção do exame e quaisquer outras observações que sejam pertinentes,
como aceite de amostra com restrição.

Caso o laboratório opte pela transcrição dos resultados gerados pelo


laboratório de apoio, deverá garantir que não haja qualquer alteração que
possa comprometer a fidedignidade dos resultados ou a interpretação do
exame. Na necessidade de retificação de algum dado de laudo já emitido,
é necessária a emissão de um novo laudo com a indicação clara da retificação
(BRASIL, 2005), como, por exemplo, em uma observação: “Este laudo substitui o
anterior emitido no dia 23/08/2020 às 19h43min, devido à alteração no campo
‘resultado’, conforme prevê a RDC Nº. 302/2005 da Anvisa”.
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Além disso, o laboratório deve apresentar instruções escritas para o


protocolo e critérios de liberação dos laudos, e estes deverão ser legíveis,
sem qualquer tipo de rasuras, e escritos em língua portuguesa. Por fim,
os dados brutos das análises realizadas devem ser arquivados por, pelo menos,
cinco anos, de forma recuperável e de fácil rastreabilidade, com registro de
qualquer alteração e preservação dos dados originais (BRASIL, 2005).

Garantia e controle da qualidade


Para assegurar a segurança e a confiabilidade dos exames realizados, a RDC
nº. 302/2005 prevê que os laboratórios realizem ensaios de controle de qua-
lidade interno (CIQ) e externo (CEQ), e que mantenham documentado e atua-
lizado um documento com a lista de analitos verificados por esses ensaios,
a frequência com que serão realizados e os parâmetros de aceitabilidade ou
rejeição dos resultados, além dos registros de resultados e suas avaliações
(BRASIL, 2005).
O CIQ pode ser realizado por meio de amostras controle comerciais ou
de fontes alternativas previamente descritas na literatura. Já o CEQ deve
ocorrer por meio da participação em programas de ensaios de proficiência e,
para os exames não contemplados por esses programas, por meio de formas
alternativas relatadas em literatura científica. As amostras utilizadas nesses
ensaios devem ser analisadas como se fossem amostras de pacientes, visando
avaliar os processos que realmente são efetuados na rotina. É importante
que toda inadequação nesses ensaios seja investigada e que as decisões
decorrentes sejam documentadas (BRASIL, 2005).

Legislações complementares
Além da NR nº 7 da Portaria nº 3.214/1978, que dispõe sobre o PCMSO, e da
Lei nº 6514/1977, sobre as Leis do Trabalho, já citadas anteriormente, outras
legislações complementares são utilizadas na fiscalização e na gestão dos
laboratórios clínicos e são indicadas pela RDC nº 302/2005.
A RDC nº 50, de 21 de fevereiro de 2002, da Anvisa, destaca-se como a
resolução recomendada para a adequação de estrutura física dos laboratórios
clínicos e seus postos de coleta, dispondo de informações que vão desde
as dimensões mínimas para os setores e estabelecimentos, aos materiais
permitidos na construção e no revestimento e aos requisitos de ventilação
e iluminação, entre outras determinações (BRASIL, 2002).
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Além disso, o Decreto nº 49.974-A, de 21 de janeiro de 1961, e a Portaria


nº 2.325, de 8 de dezembro de 2003, deliberam sobre a necessidade de efetu-
ação e de registro das doenças pertencentes à Lista Nacional de Notificação
Compulsória, que é constantemente atualizada de acordo com o surgimento
de novas doenças ou atualizações científicas que indiquem a necessidade
de adição (BRASIL, 1961).
Já a RDC nº 306, de 7 de dezembro de 2004, instrui sobre o desenvolvimento
do Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde da Anvisa, que
aborda todas as recomendações para manejo, segregação, acondicionamento,
transporte e tratamento dos resíduos gerados pelos laboratórios e demais
estabelecimentos de saúde (BRASIL, 2004).
Ainda, a execução de alguns tipos de exames pode envolver legislações
próprias, como é o caso dos testes para detecção de anticorpos anti-HIV, que,
segundo a RDC nº 302/2005, devem seguir (BRASIL, 2005):

„„ a Portaria nº 59, de 28 de janeiro de 2003, do Ministério da Saúde, que


define as atribuições dos laboratórios de cada esfera no diagnóstico
laboratorial da infecção pelo HIV, bem como as recomendações para
programas de controle da qualidade analítica nesses procedimentos;
„„ a Portaria nº 34, de 28 de julho de 2005, da Secretaria de Vigilância
Sanitária do Ministério da Saúde, que regulamenta o uso de testes
rápidos no diagnóstico dessa infecção em situações especiais;
„„ e a Portaria nº 151, de 14 de outubro de 2009, do Ministério da Saúde, que
define os requisitos dos laudos laboratoriais dos exames de detecção
dos anticorpos anti-HIV.

Além das legislações federais, normas estaduais e municipais também


podem complementar a regulamentação do funcionamento de laboratórios
clínicos, como é o caso da Portaria da Secretaria de Estado da Saúde do
Espírito Santo nº 407, de 2 de maio de 2002, que, além de complementações
às determinações já conhecidas da RDC nº 302/2005, dispõe sobre campanhas
publicitárias, identificação dos estabelecimentos, indicação de exames,
notificações compulsórias, estrutura físico-funcional, biossegurança e li-
cenciamentos (CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DO ESPÍRITO SANTO, 2002).
12 Legislação aplicada à gestão laboratorial

Abertura de laboratórios de análises


clínicas
Uma série de etapas são necessárias até que um laboratório esteja pronto
e habilitado para o funcionamento. Inicialmente, o local escolhido para a
instalação do laboratório deve ser avaliado por meio de uma consulta pública
de viabilidade junto à prefeitura local. Essa etapa visa determinar se o local
escolhido é compatível com as atividades que serão desenvolvidas e se há
algum impedimento para tal desenvolvimento. Essa etapa precede o registro
da empresa junto à prefeitura do município, que fornecerá o Alvará de Fun-
cionamento do laboratório, após o registro e a fiscalização perante o corpo
de bombeiros militar, que avaliará a adequação da estrutura da empresa em
relação às normas de proteção contra incêndio.
O memorial descritivo do projeto arquitetônico, juntamente aos projetos
elétricos, de água e esgoto, fornece as informações necessárias para a avalia-
ção da adequação da atividade a ser exercida na estrutura projetada para o
laboratório e pode ser solicitado tanto pela prefeitura quanto pela secretaria
de vigilância sanitária, que concederá o Alvará Sanitário do laboratório.
Para a obtenção desse alvará, também são necessários os registros no CNES
e no Conselho Profissional Regional, que fornecerá a Certidão de Responsa-
bilidade Técnica do profissional registrado como tal. Também é necessária
a solicitação de vistoria técnica de um fiscal sanitário. Alguns desses proce-
dimentos são realizados novamente para a renovação de documentos, caso
dos alvarás de funcionamento e sanitário, que possuem validade de um ano.
Simultaneamente, devem ser realizados procedimentos de registro da
empresa, visando sua oficialização perante os órgãos competentes. Deve ser
realizado o registro na Junta Comercial do estado, na Secretaria da Receita
Federal para a obtenção de Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica, na Secre-
taria Estadual da Fazenda e na Caixa Econômica Federal para a utilização dos
sistemas de FGTS e INSS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e Instituto
Nacional do Seguro Social).

Biossegurança laboratorial
Em um laboratório clínico e em seus postos de coleta, o contato com possíveis
agentes biológicos é inerente às atividades exercidas. Entretanto, medidas
de redução de riscos podem, e devem, ser realizadas para possibilitar o
melhor nível de biossegurança para todos os profissionais envolvidos nesse
Legislação aplicada à gestão laboratorial 13

segmento. Por isso, normas e recomendações devem ser aplicadas e revisadas


frequentemente nos laboratórios.
Segundo a RDC nº 302/2005, as normas de biossegurança devem ser
disponibilizadas para os funcionários de forma escrita e atualizada, com
inclusão de, no mínimo, estes itens (BRASIL, 2005):

„„ normas e condutas de segurança biológica, química, física, ocupacional


e ambiental;
„„ instruções de uso para os equipamentos de proteção individual e
coletiva;
„„ procedimentos a serem seguidos em casos de acidentes;
„„ orientações sobre manuseio e transporte de materiais e amostras
biológicas.

Além disso, sob responsabilidade do responsável técnico, devem ser


indicados os níveis de biossegurança de cada área do laboratório, de acordo
com os microrganismos manipulados e os equipamentos utilizados.
Ainda no âmbito legal, a NR nº 32, de 11 de novembro de 2005, do Ministério
do Trabalho e Emprego, que dispõe sobre a segurança e a saúde no trabalho
em serviços de saúde, é uma referência na indicação de medidas e condutas
relacionadas à garantia da segurança dos profissionais que lidam com ati-
vidades laboratoriais (ESCOLA NACIONAL DA INSPEÇÃO DO TRABALHO, 2005).
Comumente, os laboratórios clínicos disponibilizam as orientações re-
ferentes à biossegurança por meio de um documento específico, como um
manual de biossegurança, e adicionalmente, por meio de treinamentos e de
materiais educativos voltados para as boas práticas laboratoriais. Entre as
recomendações básicas desse âmbito estão as listadas a seguir.

„„ Utilização de EPIs e EPCs: os equipamentos de proteção individual (EPIs)


protegem o manipulador de contato com possíveis agentes infecciosos
ou outros agentes prejudiciais durante a manipulação das amostras
biológicas e podem ser descartáveis (luvas, toucas, máscaras) ou
reutilizáveis e higienizáveis (jalecos, óculos de proteção, protetor
facial). Já os equipamentos de proteção coletiva (EPCs) são utilizados
de forma coletiva, como o próprio nome revela, e têm, como principais
exemplos, a cabine de segurança biológica, o chuveiro de emergência
e o lava-olhos. Esses materiais devem ser disponibilizados pelo labo-
ratório e em quantidades adequadas para a realização das atividades
e para a quantidade de funcionários.
14 Legislação aplicada à gestão laboratorial

„„ Lavagem e higienização das mãos: deve ser frequente e realizada


corretamente com água e sabão de forma a eliminar qualquer possível
contaminante. Quando não for possível realizar a lavagem das mãos,
pode ser realizada a higienização com materiais de assepsia, como o
álcool 70%.
„„ Vestimenta e cuidados pessoais: em ambientes laboratoriais, reco-
menda-se o uso de roupas compridas, preferencialmente de cores
claras e sapatos fechados. Além disso, alguns cuidados pessoais, como
cabelos presos e unhas curtas, são indicados. A utilização de ador-
nos, como joias e acessórios não essenciais, deve ser reprimida, pois
aumenta a chance de contaminação e de transferência de agentes
biológicos.
„„ Atitudes: devem ser evitadas quaisquer atitudes que favoreçam a
contaminação ou aumentem a chance de exposição a riscos de forma
desnecessária, como comer e beber dentro do ambiente do laboratório.
Essas atividades devem ser realizadas em local próprio, como na copa
para funcionários.
„„ Cuidados com manipulação de amostras e materiais: deve-se tomar
cuidado com a manipulação de amostras biológicas a fim de evitar
contaminações microbiológicas, principalmente pela formação de
aerossóis. Também se deve ter cuidado com o descarte de materiais,
especialmente os perfurocortantes, que devem ser descartados em
superfícies rígidas apropriadas para essa finalidade e com o menor
nível de manipulação possível.

Além dessas, todas as recomendações que forem necessárias para a


manutenção da biossegurança laboratorial devem constar nos documentos
internos e devem ser fortemente seguidas por todos os profissionais que
atuam na área.

Referências
BRASIL. Decreto nº 49.974-a, de 21 de janeiro de 1961. Regulamenta, sob a denominação
de Código Nacional de Saúde, a Lei nº 2.312, de 3 de setembro de 1954, de Normas
Gerais Sôbre Defesa e Proteção da Saúde. Diário Oficial da União, Brasília, 22 jan. 1961.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Atos/decretos/1961/D49974A.
html#textoimpressao. Acesso em: 26 jan. 2021.
BRASIL. Resolução nº 302, de 13 de outubro de 2005. Dispõe sobre Regulamento Téc-
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14 out. 2005. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2005/
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Legislação aplicada à gestão laboratorial 15

BRASIL. Resolução–RDC nº 50, de 21 de fevereiro de 2002. Dispõe sobre o Regula-


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22 fev. 2002. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2002/
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BRASIL. Resolução–RDC nº 306, de 7 de dezembro de 2004. Dispõe sobre o Regulamento
Técnico para o gerenciamento de resíduos de serviços de saúde. Diário Oficial da
União, Brasília, 7 dez. 2004. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/
anvisa/2004/res0306_07_12_2004.html. Acesso em: 26 jan. 2021.
CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DO ESPÍRITO SANTO. Portaria nº 407. 02 de maio de
2002. Aprova NORMA TÉCNICA que trata das condições de funcionamento dos Labo-
ratórios de Análises e Pesquisas Clínicas, Patologia Clínica e Congêneres, dos Postos
de Coleta Descentralizados aos mesmos vinculados, regulamenta os procedimentos
de coleta de material humano realizados nos domicílios dos cidadãos, disciplina o
transporte de material humano e dá outras providências. 2015. Disponível em: https://
www.crfes.org.br/wp-content/uploads/2015/01/farmaceutico_leis_estaduais_porta-
rias_407.pdf. Acesso em: 26 jan. 2021.
ESCOLA NACIONAL DA INSPEÇÃO DO TRABALHO. NR 32: segurança e saúde no trabalho
em serviços de saúde. 2020. Disponível em: https://enit.trabalho.gov.br/portal/images/
Arquivos_SST/SST_NR/NR-32.pdf. Acesso em: 26 jan. 2021.
MILLER, W. G. (org.). Preparation and testing of reagent water in the clinical laboratory.
4th ed. Wayne: CLSI, 2006.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA CLÍNICA. Recomendações da Sociedade Brasileira
de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML): boas práticas em laboratório
clínico. Barueri: Manole, 2015.

Leituras recomendadas
BRASIL. Lei nº 6.514, de 22 de dezembro de 1977. Altera o Capítulo V do Título II da Con-
solidação das Leis do Trabalho, relativo a segurança e medicina do trabalho e dá outras
providências. Diário Oficial da União, Brasília, 23 dez. 1977. Disponível em: http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6514.htm#:~:text=Altera%20o%20Cap%C3%ADtulo%20
V%20do,trabalho%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias. Acesso em:
26 jan. 2021.
BRASIL. Norma Regulamentadora Nº 7 (NR-7). 2020. Disponível em: https://sit.trabalho.
gov.br/portal/index.php/ctpp-nrs/nr-7?view=default. Acesso em: 26 jan. 2021.
BRASIL. Portaria nº 34, de 28 de julho de 2005. Regulamenta o uso de testes rápidos
para diagnóstico da infecção pelo HIV em situações especiais. Disponível em: http://
bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/svs/2005/prt0034_28_07_2005.html. Acesso em:
26 jan. 2021.
BRASIL. Portaria nº 59, de 28 de janeiro de 2003. Diário Oficial da União, Brasília,
7 dez. 2004. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2003/
prt0059_28_01_2003.html. Acesso em: 26 jan. 2021.
BRASIL. Portaria nº 2.325, de 8 de dezembro de 2003. Define a relação de doenças de
notificação compulsória para todo território nacional. Diário Oficial da União, Brasília,
9 dez. 2003. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2003/
prt2325_08_12_2003.html. Acesso em: 26 jan. 2021.
16 Legislação aplicada à gestão laboratorial

BRASIL. Resolução–RDC nº 27, de 21 de junho de 2011. Dispõe sobre os procedimentos


para certificação compulsória dos equipamentos sob regime de Vigilância Sanitária.
Diário Oficial da União, Brasília, 28 jun. 2011. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.
br/bvs/saudelegis/anvisa/2011/res0027_21_06_2011.html. Acesso em: 26 jan. 2021.

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