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Direitos Autorais

Título original: Loving the Marquess


Landing a Lord series book 1
Copyright © 2013 by Saozinha Medeiros
Copyright da tradução©2023 Leabhar Books Editora Ltda.
 
Tradução: Vanessa Rodrigues Thiago
Revisão: Michele Noce Camilo
Diagramação e Capa: Labellaluna Web®
 
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autorização por escrito do proprietário dos direitos autorais.

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Dedicatória
 
 
 
 
 
PARA NEIL, COM TODO O MEU AMOR.  
Agradecimentos
 
Um muito obrigada à Aida Amaral, Maureen Frew e Maria Medeiros
por toda a contribuição de vocês neste livro. Um agradecimento especial vai
para Maaike van der Leeden por me encorajar quando a insegurança tentava
aparecer.
E obrigada à minha família, pelo amor e suporte sempre.
 
Capítulo 1

Kent, 1806
UMA BATIDA à porta no meio da noite nunca trazia boas notícias.
Lançando um olhar ansioso para a cama acolhedora em que estava prestes a
se afundar, Louisa Evans amarrou a faixa de seu roupão. Deixando de lado
o cansaço que a arrastava, desceu correndo.
Esperava encontrar um de seus vizinhos quando abrisse a porta, mas
ficou surpresa que ao em vez disso, se deparou com um estranho. Um
homem muito alto com cabelo escuro estava caído de olhos fechados contra
o batente da porta. Ela estremeceu quando o ar frio do outono atravessou
sua camisola e roupão.
— Posso ajudá-lo? — perguntou ela.
Quando não obteve resposta, ela se perguntou se ele estava bêbado e, de
alguma forma, teria tropeçado em seu chalé. Colocou a mão no braço dele
para chamar sua atenção e repetiu a pergunta.
Os olhos dele se abriram, prendendo-a em um olhar escuro e penetrante.
— Preciso de ajuda… — conseguiu dizer antes de fechar os olhos
novamente.
Ele balançou um pouco e começou a deslizar pelo batente da porta.
Movendo-se instintivamente, Louisa colocou o ombro debaixo do braço
dele no mesmo instante, firmando-o enquanto o homem desabava. Ele era
muito maior do que ela e, por um segundo, pensou que iria desmaiar com
ele.
Ela endireitou-se e olhou atordoada para baixo, onde ele estava sentado,
encostado no batente. Hesitando apenas por um momento, inclinou-se sobre
ele para cheirar seu hálito e detectou um leve toque de álcool. Levou a mão
à testa dele e ficou alarmada ao descobrir que estava com febre.
Outra rajada do ar noturno, estranhamente frio no início de setembro, a
fez tremer de verdade agora. Ela teria que mover o estranho para dentro e
fechar a porta. Não sabia o que havia de errado com ele, mas com aquela
febre, ele não poderia se dar ao luxo de pegar um resfriado. Não era forte o
suficiente, no entanto, para carregá-lo para dentro sozinha.
Com a decisão tomada, ela correu para cima e bateu à porta de seu
irmão. Quando ele não respondeu, ela entrou no quarto e o sacudiu para
acordá-lo.
— Qual é o problema? — murmurou ele, seus olhos ainda fechados.
— Preciso da sua ajuda. Há um homem lá embaixo que está doente. Ele
caiu na nossa porta.
John acordou sobressaltado com a menção do estranho. Aos dezoito
anos, era sete anos mais novo que ela, mas desde a morte do pai, ele decidiu
que era seu dever proteger a família.
Vestiu-se rapidamente e a seguiu escada abaixo até onde o homem
estava sentado, ainda apoiado na porta.
— Quem é ele?
Louisa balançou a cabeça.
— Eu não sei, mas está doente e o frio pode não ser bom para ele.
Ajude-me a trazê-lo para dentro para que eu possa fechar a porta.
Conseguiram despertar o homem o suficiente para ajudá-lo a ficar de
pé, sustentando o peso dele entre os dois. Estava instável e seu progresso
era lento, mas por insistência dela, conseguiram levá-lo ao seu quarto, ainda
quente do fogo recém-apagado. Ele caiu na cama dela com um gemido.
— Vou cuidar do conforto dele — disse ela a John. — Vi um cavalo lá
fora que deve pertencer ao nosso convidado. O animal precisa de cuidados.
John endireitou os ombros e sabia que ele ia insistir para que ela
cuidasse do cavalo. Interrompeu-o antes que ele pudesse protestar contra a
impropriedade da situação:
— Você realmente acredita que este homem está em condições de me
fazer algum mal?
O irmão hesitou, mas estava claro que o estranho havia perdido a
consciência. Resmungando algo baixinho sobre irmãs mandonas, ele virou-
se e saiu para cuidar do cavalo.
Louisa ocupou-se em reacender o fogo na pequena lareira antes de se
virar para olhar o homem deitado em sua cama. Apesar de suas garantias ao
irmão, estava nervosa. Cuidara do pai durante sua longa doença, mas cuidar
daquele homem não era a mesma coisa.
Ela aproximou-se da cama e o olhou, e seu coração acelerou quando
percebeu o quão bonito ele era. Seu cabelo era castanho escuro, quase preto,
emoldurando um rosto que sem dúvida fazia muitos outros corações
baterem mais rápido também. Apesar da febre, ele estava muito pálido, a
pele esticada sobre as maçãs salientes do rosto e um maxilar forte que já
mostrava uma sombra de barba por fazer.
Ela engoliu em seco quando seu olhar percorreu o corpo dele. Ele estava
dormindo, mas sua presença enchia o quarto. Balançou a cabeça para
clarear as ideias e virou-se, dizendo a si mesma enquanto ia até o lavatório e
despejava a água da jarra na bacia, que cuidar daquele homem não seria
diferente de como cuidava de seu pai. Concentrando-se na tarefa familiar,
colocou o recipiente na mesa de cabeceira, mergulhou um pano na água e
torceu-o. Suas mãos não estavam muito firmes enquanto lavava o rosto
dele, esperando que a água fria lhe trouxesse um pouco de conforto. Seus
movimentos eram rápidos, mas diminuíram quando ele gemeu. Seus olhos
se abriram e ela congelou quando seu olhar negro e inescrutável capturou e
prendeu o dela.
Ela estava caindo em espiral, se afogando em piscinas gêmeas de
escuridão. O calor no quarto pareceu aumentar quando um rubor se
espalhou por seu corpo. Os segundos passaram, parecendo se estender em
minutos.
Sem outro som, os olhos do estranho se fecharam novamente. Ela
inspirou uma respiração trêmula e sacudiu a paralisia que havia tomado
conta dela. Ela não podia, no entanto, livrar-se de sua sensação de
desconforto.
Suas mãos ainda tremiam quando ela largou o pano úmido na bacia.
Deixando de lado sua apreensão, ela moveu-se para os pés da cama para
tirar as botas dele. Hesitou apenas por um momento antes de colocar uma
mão no calcanhar do couro preto moldado na perna direita dele e a outra no
joelho. Um choque de consciência surgiu com o contato e ela recuou. Seu
olhar voou para o rosto do estranho e deu um suspiro de alívio quando viu
que ainda estava dormindo. Ela teria morrido de vergonha se ele tivesse
visto sua reação tola ao tocá-lo.
Tirou as botas dele antes de voltar sua atenção para tirar o casaco, mas
ela sabia que sua bravura não iria tão longe. Os lençóis já estavam virados
para baixo e foram necessários apenas alguns puxões para libertar as pernas
dele completamente. Concentrando-se nos cobertores e não em sua forma,
ela o cobriu antes de soltar a respiração que estava segurando. A maior
parte dele estava agora escondida da vista, mas ela achou impossível
ignorar a sensação aguda de consciência provocada pelo conhecimento de
que um homem muito atraente agora dormia em sua cama.
Tentando ignorar os pensamentos menos castos que surgiam
espontaneamente em sua mente, Louisa pegou um cobertor para si mesma
no baú ao pé de sua cama e acomodou-se em uma poltrona para esperar.
Quando John voltou, depois de cuidar do cavalo do convidado inesperado,
ele tentou insistir em tomar o lugar dela, mas se a condição do estranho
piorasse, John não saberia o que fazer. Ele a ajudou a tirar o casaco do
homem e afrouxar sua gravata antes de retornar ao próprio quarto, mas só
depois de extrair a promessa dela de ir buscá-lo assim que o homem
acordasse.
Foi uma noite longa. O sono do estranho era inquieto e interrompido, a
princípio, por frequentes ataques em que ele se debatia e palavras
murmuradas que eram indecifráveis. Eventualmente, ele caía em um sono
profundo e ela conseguia fechar os olhos e descansar um pouco. Tinha
acabado de adormecer quando um gemido baixo a acordou. Ela lutou para
se levantar de sua posição apertada na poltrona ao lado da cama, e seu
cobertor deslizou para o chão.
— Papai? Precisa de alguma coisa? — perguntou ela, desorientada
depois de ser arrancada do meio de um sonho estranho.
Mas o homem deitado na cama, sua cama, não era seu pai. Ela ficou
confusa por um momento e então as memórias voltaram. Depois de um ano
de saúde debilitada, seu pai finalmente sucumbiu à morte seis meses antes.
Ela recostou-se na poltrona e examinou o estranho mais de perto na luz
fraca da manhã. Não tinha sonhado com ele, afinal.
O fogo havia se extinguido há muito tempo e ela estremeceu com o ar
frio da manhã. Pegou o cobertor de onde havia caído, enrolou-o nos ombros
e deu alguns passos até a cama. Inclinando-se para frente, colocou a mão na
testa do homem e deu um suspiro de alívio quando descobriu que sua
temperatura estava normal.
Ela olhou para a janela onde os primeiros raios de luz da manhã já
estavam rastejando no horizonte e suspirou suavemente. Quanta coisa para
uma boa noite de descanso, ela pensou enquanto começava a esticar as
torções de seus músculos nodosos.

A CABEÇA DE Nicholas Manning o estava matando, mas ele estava


acostumado com isso. Levantou a mão para esfregar as têmporas, esperando
acalmar a dor. Incapaz de se conter, seus pensamentos voltaram para aquela
época, alguns anos atrás, antes da morte de seus pais. Eles eram felizes, o
amor ainda evidente mesmo depois de mais de trinta anos de casamento,
mas então seu pai começou a reclamar de dores de cabeça e sua saúde
começou a se deteriorar rapidamente. Nicholas passou a maior parte do
tempo em Londres, longe do Solar Overlea, mas presenciou o humor
estranho do pai e o aumento da irritação em várias ocasiões. Tinha
testemunhado como o pai havia afastado todos que o amavam antes do
acidente que tirou a própria vida e a da esposa.
Também se lembrava de como seu irmão mais velho havia desenvolvido
a mesma doença misteriosa no ano anterior. Uma doença que o levou à
morte.
Seu pai tinha sessenta anos quando começou a reclamar de dores de
cabeça. As crises do irmão começaram muito antes, aos trinta e dois, e a
doença progrediu mais rapidamente. Nicholas tinha apenas vinte e oito, mas
não podia mais ignorar o fato de que agora mostrava sinais de sofrer da
mesma doença.
Afastando seus pensamentos sombrios, abriu os olhos e logo os apertou
por causa da luz brilhante que entrava pela janela. Começou a se sentar, mas
congelou quando viu o ambiente desconhecido.
Imagens vagas foram filtradas de volta a sua mente, a maioria delas
mostrando uma mulher de cabelo loiro e olhos cinza pairando sobre seu
corpo. Ele franziu a testa, tentando se lembrar do que havia acontecido na
noite anterior, mas sua memória o iludia.
Examinou o quarto ao seu redor. Onde estava? Não era sua casa em
Londres. Lembrou-se de ter recebido uma carta da avó no dia anterior.
Embora não fosse incomum, as cartas de sua avó eram raras o suficiente
para deixá-lo cauteloso, já que ela nunca o incomodava com boas notícias.
Fechou os olhos e se concentrou na memória. Ao chegar em casa na
tarde anterior, um lacaio lhe entregou a carta. Lembrou-se de se perguntar
que más notícias estava prestes a ler enquanto se dirigia ao escritório e
jogava a missiva sobre a mesa. Serviu-se de um conhaque antes de pegar a
carta novamente e quebrar o selo.
E era isso. Por mais que tentasse, não conseguia se lembrar do que a avó
havia escrito. Nem conseguia se lembrar de nada depois disso. Deve ter lido
a carta. Ele sempre o fazia. Aprendera há muito tempo que não havia
sentido em adiar más notícias.
Abriu os olhos ao som da porta se abrindo e viu uma mulher parada.
Seria ela a mulher que se lembrava pairando sobre ele na noite anterior? Ela
era mais jovem do que ele pensava – ainda não tinha vinte anos, se seu
palpite estivesse correto. Seu longo cabelo loiro, despenteado do sono, caia
sobre seus ombros.
Ele franziu a testa. Passara a noite com ela? Ele deveria estar realmente
maluco, porque não costumava brincar com garotas que mal tinham saído
da sala de aula.
Ela estava esfregando o sono dos olhos quando entrou. Quando seu
olhar encontrou o dele, ela congelou. Seus olhos azuis estavam arregalados
de choque. Então, para sua surpresa, ela abriu a boca e gritou.
Bem, isso era diferente. Já tinha feito muitas mulheres gritarem em sua
época, mas geralmente era de prazer.
Capítulo 2

LOUISA TINHA acabado de colocar a mesa do café da manhã quando


ouviu o grito. Havia muito o que explicar à irmã, com calma, o que havia
acontecido na noite anterior. Catherine já estava acordada. Provavelmente
havia ido ao quarto e visto o homem dormindo na cama de Louisa.
Sua irmã irrompeu pela porta da sala de jantar momentos depois.
— Louisa — disse Catherine, sua voz urgente quando ela parou
abruptamente. — Tem um homem no seu quarto. Na sua cama!
A angústia era genuína e Louisa tentou manter a voz calma.
— Sente-se.
Catherine seguiu as ordens de Louisa e sentou-se à mesa da sala de
jantar, sua confusão era clara.
— Você não está surpresa. — Pareceu levar alguns segundos para que
essa percepção fosse absorvida. — Por que você não está surpresa?
A porta se abriu novamente e ambas se viraram para ver o irmão parado
na porta. Ele estava descalço, vestindo apenas calça, com uma pistola na
mão.
— O que aconteceu? — perguntou ele, olhando ansiosamente para as
duas. — Ele tentou machucar vocês?
O olhar perplexo de Catherine foi de John para Louisa, depois voltou.
— Alguém vai me dizer o que está acontecendo? Quem é aquele
homem e por que ele está na cama de Louisa?
— Calma, os dois. — Virando-se para o irmão, Louisa apontou para a
arma. — Diga-me que não entrou no meu quarto com essa coisa.
— Com licença — disse John, sua voz gotejando de aborrecimento. —
Há um homem estranho na casa, um que você insistiu em vigiar a noite toda
sem nenhuma ajuda minha, então carreguei a pistola para se caso
precisássemos. Ao ouvir uma de minhas irmãs gritar, não sei por que pensei
em investigar. Quando não encontrei nenhuma de vocês no quarto, vim
procurá-las.
Louisa fez uma careta, imaginando a cena.
— Bem, você pode guardar a arma agora enquanto eu explico tudo para
Catherine. Ela foi surpreendida.
Com um olhar de despedida para ela, John saiu da sala. Louisa virou-se
para encarar a irmã, que a encarava com os olhos arregalados de
curiosidade.
— Quem é ele?
Louisa puxou a cadeira em frente à irmã e sentou-se.
— Não sei. Ele bateu à nossa porta depois que todos já haviam ido para
a cama. Estava doente e pediu nossa ajuda.
— Por que não me acordou no lugar do John?
— Ele desmaiou, Catherine. Eu precisava da força de John para me
ajudar a levá-lo até meu quarto. E antes que você me pergunte — ela
continuou, vendo a pergunta nos olhos da irmã —, nós o levamos para lá
porque eu tinha acabado de apagar o fogo. Já era tarde e meu quarto era o
único cômodo que ainda estava quente.
Enquanto sua irmã estava apaziguada, Louisa podia dizer que ela ainda
estava irritada por ter sido deixada de fora da agitação da noite.
— Quanto tempo ele vai ficar aqui?
— O tempo que for necessário.
— Mas como podemos arcar com isso? Mal há comida suficiente para
nós e ele não parece o tipo de pessoa que come pouco.
— Vamos administrar. Nós sempre conseguimos — disse Louisa,
levantando-se. Ela foi em direção à cozinha para pegar o café da manhã. —
Além disso, podemos arcar com um pouco de caldo para ele até que esteja
melhor. Ele se revirou a maior parte da noite e eu não tenho ideia de quando
ele vai acordar.
— Oh, ele está acordado agora.
Louisa virou-se com o comentário casual.
— O quê? — perguntou ela, tentando ignorar a sensação de agitação em
seu estômago que a notícia de Catherine havia provocado.
— Ele está acordado — disse Catherine. — O que tem para o café da
manhã?
Seu misterioso convidado estava acordado. Ela deveria ir vê-lo,
descobrir quem ele era e como estava se sentindo. Depois das visitas de
Catherine e John ao quarto dela naquela manhã, ele provavelmente pensou
que havia entrado em uma casa cheia de bandidos.
Ela foi para a porta.
— Louisa?
— O quê?
Um sorriso conhecedor tocou os lábios de Catherine.
— Não importa — disse ela, com uma diversão evidente em seu tom. —
Você tem coisas mais importantes para cuidar do que o café da manhã. Ou
devo dizer, coisas mais bonitas?
Louisa deixou a irmã sem se dar ao trabalho de responder e foi até o
quarto. Aos dezessete anos, Catherine estava na idade em que seus
pensamentos muitas vezes se voltavam para um futuro marido. Com a
escassez de solteiros elegíveis na vila e o conhecimento de que nunca
teriam uma temporada adequada em Londres, ela tendia a se agarrar a cada
novo rosto como candidato ao afeto dela ou de sua irmã.
Quando Louisa chegou ao seu quarto, hesitou apenas brevemente antes
de deixar de lado seu nervosismo e entrar. Ela fechou a porta suavemente
atrás de si e virou-se para encarar o homem deitado em sua cama. Sua
respiração congelou. Ela não estava mais certa de que ele era tão inofensivo
quanto queria que seu irmão acreditasse. Pelo contrário, o homem em sua
cama parecia grande demais para seu pequeno quarto e mais do que um
pouco perigoso.
Estava encostado casualmente na cabeceira da cama, os braços cruzados
na frente de um peito largo e as pernas cruzadas nos tornozelos. Ele havia
ajeitado suas roupas, que se moldavam amorosamente ao seu corpo, mas a
gravata pendia frouxa em volta do pescoço, revelando um vislumbre
tentador de pele na base de sua garganta. O cabelo castanho escuro estava
despenteado por causa de seu sono inquieto, uma mecha caía sobre a testa,
mas foram os olhos que mais a impressionaram. Escuros, ilegíveis e
treinados, fixos nela.
Ela tentou falar, romper o silêncio pesado que pairava entre eles, mas
estava cativa daquele olhar. Misericordiosamente, ele a soltou quando
arrastou os olhos por sua figura. Ela tornou-se extremamente consciente de
seu vestido de casa fora de moda.
— Como está nesta manhã? — ela finalmente conseguiu perguntar com
uma voz que esperava não revelar o quanto ele a perturbava.
— Não tenho certeza. Por que não me conta?
— Não parece ter sofrido nenhum dano visível.
A boca dele se curvou.
— Isso é bom, sabe o que houve?
Louisa balançou a cabeça, confusa com a diversão óbvia dele.
— Não tive nada a ver com isso.
As palavras dela pareciam ter um efeito estranho nele. Seu olhar viajou
sobre ela novamente, mais completamente desta vez e o calor saltou para as
bochechas dela. Então, para sua surpresa, ele curvou um dedo e sussurrou
“venha aqui” em um tom que enviou-lhe um arrepio na espinha.
— Desculpe-me?
— Venha aqui. Eu preciso de você.
A preocupação superou seu desconforto. Ele parecia muito melhor do
que na noite anterior, mas poderia ter ferimentos que não eram óbvios aos
olhos. Ela não o examinou tão de perto depois que seu irmão tirou o casaco
e os deixou sozinhos. Correu para o lado dele e, antes que ela percebesse
sua intenção, ele agarrou sua mão e a jogou em seu colo. Ela congelou,
atordoada, e seus olhos se encontraram.
— Por que não refresca minha memória sobre a noite passada? Parece
que estou perdendo alguns detalhes.
Como se estivesse em câmera lenta, sua cabeça se inclinou e desceu em
direção a ela. A surpresa a manteve imóvel quando a boca dele tocou a dela,
os lábios tocando suavemente os dela. Ela abriu a boca para protestar, mas a
língua dele se intrometeu e toda sua razão fugiu.
Ela havia tido um pretendente no passado, quando seu pai ainda era
saudável, e eles trocaram alguns beijos, mas aqueles não eram nada perto
deste. Ela deveria ter ficado chocada com a intimidade da língua dele se
movendo contra a dela, explorando sua boca. Em vez disso, ela se viu
afundando contra ele e deleitando-se com a sensação de seus braços fortes
ao redor dela. Ela moveu sua própria língua ao longo da dele e o gemido de
resposta dele fez com que algo novo se agitasse dentro dela.
A boca dele deixou a dela para viajar por sua bochecha, descendo ao
longo da garganta, fazendo com que ondas de sensações a percorressem. A
sensação da mão dele em seu seio foi um alívio bem-vindo, acalmando a
necessidade dolorosa dentro dela enquanto atiçavam suas chamas mais
altas. Ela agarrou os ombros dele e se mexeu para lhe dar melhor acesso.
Quando a outra mão dele percorreu o comprimento da perna dela,
alcançando a pele nua acima de suas meias, no entanto, ela voltou à
realidade. O que diabos ela estava fazendo? Empurrou o peito dele e saiu da
cama quando seu aperto se afrouxou, envergonhada por ter se abandonado
tão facilmente.
Com as bochechas em chamas e lutando para controlar a respiração, ela
desafiou o homem em sua cama com o olhar. A respiração dele estava tão
irregular quanto a dela e ele parecia ainda mais perigoso do que quando
Louisa entrou no quarto.
— Certamente não iria me afastar depois da noite passada. — Seu tom
era curto, seu aborrecimento claro.
Confusa, Louisa só conseguia encará-lo. Então a compreensão surgiu.
— Você não se lembra do que aconteceu ontem à noite?
Era isso, claro. Agora o comportamento dele fazia sentido. Sem se
lembrar do que havia acontecido, saltou para a única conclusão lógica de
porque ele estaria na cama de uma mulher. Ela, infelizmente, não tinha essa
desculpa para seu próprio comportamento.
Muito consciente de sua reação vergonhosa, apressou-se em explicar:
— Veio à nossa casa tarde da noite ontem. Estava doente, incapaz de
ficar de pé e com febre. Meu irmão e eu achamos melhor trazê-lo para cá,
onde poderia descansar. Eu temia que você levasse algum tempo para se
recuperar, mas agora vejo que não precisava ter me preocupado.
Ela percebeu que estava balbuciando e parou de falar. O olhar dele
estava fixo nela e ela teve que resistir ao desejo de fugir.
— Bem, então — disse ele depois de um tempo —, eu lhe agradeço,
mas agora seguirei meu caminho. — Ele balançou as pernas para o lado da
cama.
— Não — disse Louisa, correndo para colocar uma mão restritiva em
seu ombro. O olhar dele se moveu da mão dela, voltando ao seu rosto e um
canto da boca dele se curvou para cima.
Lendo claramente os pensamentos dele, ela deixou cair a mão e deu um
passo para trás. Ela pode ter permitido que ele a beijasse uma vez, mas
tinha sido pega de surpresa. Não haveria repetição da performance, um fato
que ele faria bem em perceber.
— Estava muito doente ontem à noite. Precisa comer algo para recobrar
suas forças. Vou trazer-lhe uma bandeja.
Olhou-a em silêncio. Ela tentou imaginar o que ele estava pensando,
mas sua expressão estava fechada. Ela estava prestes a sair para buscar o
café da manhã quando ele finalmente disse:
— Parece que interpretei mal a situação e por isso peço-lhe desculpas.
Ele levantou-se e Louisa prendeu a respiração, procurando sinais de
fraqueza ou fadiga. Não havia nenhum dos dois.
— Suspeito que não estava em condições ontem à noite para me
apresentar formalmente. Sou o Marquês de Overlea, ao seu dispor — disse
ele com uma breve reverência.
Ela pôde sentir a cor sumindo de seu rosto. Ficou muito quieta, tentando
acalmar seu coração, que agora estava acelerado por um motivo diferente.
Ela não se incomodou em retribuir a reverência quando respondeu. Em
vez disso, endireitou a coluna e o olhou diretamente nos olhos.
— Eu sou Louisa Evans, milorde — disse ela, satisfeita que sua voz
estava calma. — Acredito que já conheceu meu irmão, John, e minha irmã,
Catherine.
O marquês reconheceu o nome e ela pôde ver que isso o fez parar. Ele
se recuperou imediatamente, mas não havia dúvida de que sabia o que sua
família havia feito.
— Não fomos apresentados formalmente, mas sim, tive o prazer.
Ela ficou impressionada como ele conseguia manter os modos tão
calmos depois de ser abordado primeiro por uma mulher que gritou e depois
por um louco com uma pistola. Principalmente porque agora ele sabia a
identidade da família que o acolhera. No entanto, lá estava ele, calmamente
encarando-a como se sua família não tivesse arruinado a dela
completamente.
— Eu soube da morte de seu pai e gostaria de apresentar minhas
condolências.
Ela podia dizer que suas palavras eram sinceras. Os pais dele morreram
dois anos antes em um acidente de carruagem e então ele perdeu seu único
irmão no ano anterior após uma doença misteriosa. Além da avó, ele agora
estava sozinho. Eles compartilharam um breve e inesperado momento de
comiseração silenciosa.
— Voltarei em alguns minutos — disse Louisa antes de virar-se para
sair.
— Não há necessidade. Eu me juntarei a você lá embaixo em breve.
Ela estava prestes a protestar, mas quando olhou de volta para ele, pôde
ver em sua expressão que ele não toleraria nenhum argumento.

ELA FOI embora. Nicholas afundou-se na cama e embalou a cabeça nas


mãos. Maldita dor de cabeça. Ele quase caiu em desgraça na frente dela,
mas de alguma forma conseguiu não vacilar enquanto estava de pé.
Ela estava certa em insistir que ele comesse alguma coisa antes de sair.
Cada dor de cabeça que ele suportava tirava mais dele do que a anterior.
Esta até então, tinha sido a pior. Nunca havia perdido a consciência antes.
Ele teve uma imagem repentina do irmão em agonia, deitado em seu leito
de morte, mas afastou-a de sua mente. Ainda estava vivo e se recusava a
ceder ao desespero. Iria aproveitar o tempo que restava, fossem dias, meses
ou anos.
Em vez disso, voltou seus pensamentos para Louisa Evans e
experimentou uma pontada incomum de arrependimento. Já era ruim o
suficiente ter desmaiado na presença dela, uma imagem que ele não se
permitiria contemplar, mas lembrar como ele a tinha tomado e levantado
sua saia era demais. Especialmente depois do que seu tio já havia feito com
a família dela.
Teria que fazer as pazes com ela. Agradecer adequadamente por ter
cuidado dele e por ter sido tão compreensiva sobre seu erro de julgamento.
Qualquer outra mulher lhe teria dado um tapa na cara. Ele não conseguia
imaginar por que ela não tinha feito isso.
De suas memórias desconexas da noite, sabia que ela usava o cabelo
loiro solto sobre os ombros. Estava preso agora, mas alguns cachos
escaparam durante o beijo. Ele se lembrou da incerteza nos olhos grandes e
cinzentos dela quando entrou no quarto. Aqueles mesmos olhos
escureceram de desejo quando ele a beijou. A lembrança da resposta dela
fez com que seu corpo se contraísse novamente.
Ela era obviamente uma mulher apaixonada, mas ele podia dizer pelo
beijo que também era inocente. Não se aproveitaria dela. Sua família já
havia feito mal o bastante.
Levantou-se novamente, mais devagar desta vez, e ficou aliviado ao
descobrir que seu momento de fraqueza havia passado. Com um pouco de
sorte, sua força aguentaria.
 
Capítulo 3

LOUISA CAMINHAVA pelo corredor, suas pernas ameaçando ceder a cada


passo antes de se apoiar na parede.
Nicholas Manning, o novo Marquês de Overlea, estava em sua casa.
Os Manning foram os responsáveis pela situação decrescente de sua
família. Ela se lembrou claramente, como se tivesse acabado de acontecer.
Como Henry Manning, o tio do marquês, se aproveitou de seu pai em um
momento de fraqueza.
Ela tinha oito anos quando sua mãe, que não se recuperara totalmente
após o parto muito difícil de John, morreu ao dar à luz a Catherine um ano
depois. O pai se trancou no quarto por uma semana inteira após o funeral,
enquanto um vizinho ficou cuidando deles. No final daquela semana,
incapaz de suportar a perda da companhia de seu único pai, Louisa foi até
ele. Como nunca abria a porta do quarto quando batiam, ela criou coragem
para entrar sem bater. Ela o encontrou dormindo em uma poltrona, a barba
crescida, o cabelo despenteado e um copo vazio equilibrado precariamente
em um joelho. Ela o acordou, esperando seu abraço habitual. Em vez disso,
ele ordenou que saísse do quarto. Ela saiu, chocada por ele ter gritado com
ela. Seu pai nunca gritava. Pior, no entanto, foi o fato de ele ter levantado a
mão como se estivesse prestes a bater nela.
Ela correu para o quarto, jogou-se na cama e chorou. Em pouco tempo,
o pai foi até ela, pegou-a em seus braços e prometeu cuidar deles. E que
nunca mais beberia.
Ele manteve a promessa até a noite, anos depois, em que Henry
Manning o encontrou na vila. Ela se lembrava vividamente da vergonha no
rosto de seu pai quando ele mais tarde contou o que aconteceu. Começaram
a discutir sobre sua mãe e Manning o levou para a taverna e pediu uma
rodada de bebidas. Não querendo insultá-lo, seu pai decidiu que não havia
mal algum em tomar uma bebida. Fazia quase dez anos desde a morte da
mãe e ele não havia tocado em uma única gota em todo esse tempo. Mas
um drinque virou dois, depois três, até que finalmente ele perdeu a conta.
Louisa lembrou-se de como Henry Manning o levara para casa, nem um
pouco alterado por ter passado horas bebendo com o pai dela. Ficou com
raiva do comportamento presunçoso dele naquela noite. Essa raiva se
transformou em desespero no dia seguinte, quando ele chegou para dizer
que eles tinham uma semana para recolher seus pertences antes que ele
tomasse posse da casa e das terras deles. Ele apresentou a nota promissória
que seu pai assinara na noite anterior e, envergonhado, o pai confessou o
que havia feito. Ele permitiu que Manning o convencesse a participar de um
jogo de cartas que estava em pleno andamento em uma mesa adjacente.
Perdendo constantemente, ele se tornou cada vez mais imprudente a cada
bebida até perder tudo. Ele se comportou como um jovem imaturo
desperdiçando sua herança recém-adquirida.
Mudaram de sua mansão uma semana depois, levando apenas o que
podiam para caber no chalé muito menor que Manning havia permitido que
eles mantivessem na fronteira do que já havia sido sua propriedade.
— Qual é o problema?
A voz de John trouxe Louisa de volta ao presente. Ela podia ver a
preocupação no rosto do irmão e brevemente considerou não contar-lhe o
que havia descoberto. Ela rapidamente descartou a ideia porque sabia que
ele descobriria em breve.
— Nosso convidado — disse ela, olhando rapidamente para a porta
fechada do quarto. Ela baixou a voz para que Overlea não os ouvisse. — Eu
sei quem ele é.
— E…? — perguntou John quando ela fez uma pausa.
Não havia nada a ser feito, a não ser contar a ele diretamente.
— O novo Marquês de Overlea.
John praguejou e dirigiu-se ao quarto dela. Ela se jogou em seu caminho
para detê-lo.
— O que está planejando fazer?
— Expulsar aquele porco pelas orelhas, como ele merece.
— Baixe sua voz. Ele vai ouvi-lo.
— Essa era minha intenção — disse ele, sua voz agora mais alta.
Jogando seu peso contra ele, ela empurrou o irmão de volta para seu
quarto. Uma vez lá, ela fechou a porta e encostou-se nela, impedindo a
saída dele. Ela ficou surpresa por ele ter permitido que ela o impedisse, mas
sua surpresa se transformou em preocupação quando ele caminhou até sua
mesa lateral e pegou a pistola carregada que ali estava.
— Não vai expulsá-lo. Ele pode ficar gravemente ferido se sofrer uma
queda.
— Eu não me importo. Eu sou o chefe da família agora. Papai nunca
permitiu um Manning nesta casa enquanto estava vivo, e nada mudou agora
que ele se foi. — Ele deu um passo em direção a ela. — Afaste-se da porta,
Louisa.
Ela estava determinada a não deixar que o irmão continuasse com
aquilo.
— Sou a mais velha aqui — disse ela. — Eu administro esta casa há
anos e continuarei a fazê-lo. Não vou jogar um homem ferido na rua.
— Pena que os Manning não tenham tais escrúpulos.
— Overlea não é nenhum perigo para nós em sua condição atual. E de
qualquer forma, ele não pode ser culpado por algo que o tio fez anos atrás,
assim como você não pode ser culpado pelo comportamento de papai na
noite em que jogou fora nossa casa.
Um rubor de raiva subiu pelo rosto dele, mas ela sabia que tinha feito
seu ponto. Enquanto seu irmão nunca soubesse sobre o que havia
acontecido entre ela e o marquês em seu quarto, ele não confrontaria
Overlea.
O café da manhã foi tenso. Louisa continuou esperando que o irmão
dissesse algo áspero ao marquês e não conseguia relaxar. Ele a surpreendeu
segurando a língua, mas o mais surpreendente foi o silêncio de Catherine.
Pelos olhares que lançara na direção de Overlea, ficou claro que sua irmã
estava curiosa sobre o convidado, mas parecia determinada a permanecer
fiel ao decreto do pai de que todos os Manning fossem tratados como
inimigos.
Louisa tentou preencher o silêncio com conversa fiada, mas desistiu
depois de algumas tentativas. A conversa empolada foi quase pior do que o
silêncio. Overlea sentou-se ao lado dela e sua presença tornou-se difícil
para ela se concentrar em qualquer outra coisa. Ela se pegou observando as
mãos dele enquanto segurava os talheres e seus pensamentos voltaram para
a sensação daquelas mesmas mãos em seu seio e no alto de sua coxa.
Corando, ela forçou os olhos para longe e tentou mantê-los em seu prato
ainda cheio.
Overlea encarou o silêncio deles com calma, comportando-se como se
nada estivesse fora do comum. Quando chegou lá embaixo, Louisa ficou
muito envergonhada pelo fato de que ele logo descobriria o quão longe eles
haviam caído. Mesmo a mais pobre das famílias gentis tinha pelo menos um
empregado, e ela não tinha dúvidas de que esta era a primeira vez que ele
pisava em uma casa que não tinha nenhum. Percebeu sua surpresa quando
notou a ausência de servos, mas ele rapidamente disfarçou. Se tinha algum
desdém pela maneira simples como eles viviam, não demonstrou.
— Gostaria de um pouco mais, milorde? — perguntou ela quando notou
que o prato dele estava vazio.
Ela começou a se levantar para cuidar dele, mas a mão de Overlea em
seu braço a deteve. Ele a soltou imediatamente, mas ela ainda podia sentir o
toque dos dedos dele. Ela não perdeu a carranca de John ou a expressão
interessada de Catherine.
— Já fui um cargo pesado demais para você.
Seus pensamentos voaram de volta para o incidente no andar de cima e
ela se perguntou se ele estava se lembrando também.
— Seu cavalo — disse ela alto demais.
Ele levantou uma sobrancelha com a mudança abrupta de assunto e
houve um pesado momento de silêncio antes que Overlea respondesse:
— Ele deve saber o caminho de casa, já que não é muito longe. Claro,
isso significaria que eu teria que incomodar mais e perguntar se você
conhece outro meio de transporte.
— Ah, ele ainda está aqui — disse Louisa. — Não precisa se preocupar;
ele está no celeiro lá atrás. John cuidou dele ontem à noite.
Overlea inclinou a cabeça e levantou-se.
— Vou vê-lo agora, então.
Ele deu um passo, tropeçou e alcançou o encosto da cadeira para se
equilibrar. Seus olhos se fecharam brevemente e uma careta de dor cintilou
em seu rosto. Louisa correu para o lado dele e apoiou o braço em suas
costas. Ela devolveu a carranca que John lhe dera antes de voltar sua
atenção para Overlea.
— Gostaria que eu o ajudasse a subir para descansar?
Ele se enrijeceu e se afastou dela.
— Está tudo bem. Foi apenas uma breve pontada. Não precisa se
preocupar.
Com isso ele virou-se e saiu.
Louisa virou-se imediatamente para John.
— Qual é o seu problema?
— Não deveria estar cuidando dele. O novo marquês tem fama de
libertino.
— Como pode dizer isso? — Ela ficou surpresa com a teimosia do
irmão. — Ele claramente ainda está sofrendo de qualquer doença que o
levou ao colapso e você está preocupado com a reputação dele?
Suas mãos estavam cerradas em punhos.
— Não, Louisa, a minha preocupação é com a sua reputação.
Louisa voltou para sua cadeira, desviando o olhar para que seu irmão
não visse que sua observação havia atingido o alvo. Ele estava certo. Tanto
a reputação de Catherine quanto a dela estavam em risco, mas que outra
escolha eles tinham? Ela não poderia mandar Overlea embora, não até que
ele estivesse bem o suficiente para viajar. Depois de vê-lo tropeçar, ela não
achava que seria naquele dia.
Suspirando, ela estendeu a mão por cima da mesa, pegou a mão de John
e apertou-a suavemente.
— Suas preocupações são válidas, não vou negar, mas não podemos
expulsá-lo de casa sendo que ele está doente. Certamente você enxerga isso.
John puxou a mão da dela.
— Não sou completamente insensível, mas não gosto de tê-lo aqui. —
Ele inclinou-se para frente com os cotovelos sobre a mesa e os ombros
caídos. — Papai saberia o que fazer.
— Papai concordaria comigo — disse ela. Ela virou-se para incluir
Catherine na conversa. — Não quero que nenhum de vocês se preocupe.
Minha reputação sobreviverá enquanto vocês dois estiverem aqui.
Ela não pensaria no beijo que ela e Overlea haviam compartilhado no
andar de cima. Tinha sido um erro e nunca mais aconteceria.
— Eu ainda não gosto disso — murmurou John.
Louisa deixou o comentário passar.
— Os dois têm coisas para fazer. — Ela levantou-se e começou a limpar
a mesa. Uma rápida olhada no relógio lhe dissera que já eram oito horas. —
Você vai se atrasar para suas aulas, John. — Ambos sabiam o quanto o
reverendo Harnick não gostava de atrasos.
Ficou observando o irmão enquanto ele terminava o último de seus ovos
e, sem outra palavra, saiu de casa. Ele tinha dezoito anos e já deveria ter ido
para a universidade. Eles poderiam não ter como pagar, mas o reverendo
Harnick garantiu-lhes que John poderia estudar com uma bolsa de estudos.
Após a morte do pai, no entanto, John relutava em deixar Louisa e
Catherine sozinhas e, por enquanto, continuava seus estudos sob a tutela do
reverendo.
— E você — disse ela, virando-se para Catherine —, há costuras a
serem feitas.
Catherine torceu o nariz em desgosto.
— Alguém vai sentir falta do marquês enquanto ele estiver aqui.
Louisa estava tão descentralizada desde a chegada dele que não
ocorreu-lhe que a avó de Overlea poderia estar esperando por ele. Todos na
área sabiam que ele estivera em Londres nos últimos meses. O fato de ele
estar ali agora só poderia significar que ele estava a caminho de sua casa de
campo, não muito longe de sua casa. E mesmo que a avó não estivesse
esperando por ele, outra pessoa saberia de seus movimentos e se perguntaria
onde ele estava.
— Talvez devêssemos enviar uma nota — continuou Catherine.
— Sim, claro — disse Louisa. — Vou falar com Lorde Overlea sobre
isso, mas por enquanto, vá.
Louisa sentou-se pesadamente depois que a irmã saiu da sala de jantar.
Por que ela não pensou na avó de Overlea? Precisaria saber onde ele estava.
O que havia de errado com ela?
Mas ela sabia exatamente o que havia de errado. Era ele. Nicholas
Manning, o novo Marquês de Overlea, confundira seu pensamento. A
deixara confusa. Aquele beijo no quarto fora uma prova clara disso. Ela
nunca deveria ter permitido isso, muito menos permitido que fosse tão
longe. Teria que ter posto um fim às liberdades dele imediatamente se fosse
qualquer outra pessoa, mas Overlea causava um efeito estranho nela. Um
que ela não gostava.

O TOQUE SUAVE do relógio da sala de estar interrompeu a concentração


de Louisa. Ela ergueu os olhos da costura em seu colo para ver que já era
meio-dia. Catherine há muito abandonara as costuras para ir trabalhar no
jardim. Era seu lugar favorito e, agora que o outono estava chegando e a
temporada de jardinagem estava chegando ao fim, ela passava a maior parte
de seu tempo livre por lá.
Louisa olhou para o vestido de manhã em que estava trabalhando,
admirando a musselina verde-clara. Desde a doença do pai, ela sustentava a
família costurando. Não ganhava o suficiente para extras, mas pelo menos
as necessidades eram supridas. Ela não havia mencionado isso para nenhum
de seus irmãos, mas a maior parte da costura que ela fazia era para a família
que havia sido a responsável pela situação diminuída deles. O vestido ao
qual ela estava adicionando o acabamento final era para a prima de Overlea,
Mary Manning.
Ela não sabia ao certo por que a família permitia que Louisa fizesse
alguns de seus vestidos. Certamente tinham dinheiro suficiente para pagar
somente as melhores modistas de Londres. Enquanto faziam exatamente
isso para a maioria das roupas de Mary Manning, a tia de Overlea gostava
que Louisa fizesse alguns dos vestidos do dia a dia de sua filha. Louisa
tentou se convencer de que Elizabeth Manning fazia isso para compensar de
alguma forma como seu marido havia arruinado a família Evans e fazia o
possível para ignorar a vozinha que sussurrava que a mulher mais velha não
tinha tais motivos. Em vez disso, pensava que ela gostava de ostentar sua
posição de superioridade sobre a família de Louisa. No final, a motivação
de Elizabeth Manning não importava, já que Louisa dependia muito da
renda que sua costura trazia.
Incapaz de resistir, ela levantou-se e segurou o vestido contra ela.
Fechando os olhos, ela girou uma vez, imaginando como seria ter um
vestido assim novamente em vez dos maçantes e úteis que ela normalmente
usava.
Ela abriu os olhos e suspirou profundamente. Estava sendo frívola,
esperando por coisas que nunca poderiam acontecer.
— Essa cor combina com você, senhorita Evans.
Louisa virou-se e viu Overlea de pé na porta da sala de estar, um ombro
apoiado casualmente contra o batente. Seu olhar varreu sobre ela e o calor
subiu para suas bochechas. Ela começou a levar a mão ao cabelo,
consciente dos tentáculos que haviam escapado de seus grampos, mas parou
de repente.
— Obrigada — agradeceu.
Para ter tempo de recuperar a compostura, dobrou o vestido com
cuidado e o colocou no sofá ao lado da cesta de costura antes de encarar
Overlea novamente.
Ele parecia estar estudando-a.
— Está acontecendo algo? — perguntou ele finalmente.
Louisa pensou que, além do fato de ela ter sido pega se exibindo como
uma colegial boba, com um vestido que não era e nunca poderia ser dela,
qual poderia ser o problema?
— Não, nada, milorde. Não precisa se preocupar comigo. Mas e o
senhor? Como está se sentindo?
Com suas palavras, a mandíbula dele se apertou e uma máscara desceu
sobre suas feições. O calor e a preocupação que ela vira em seus olhos
apenas momentos antes tinham ido embora.
— Estou bem.
Ele entrou na sala e foi até a janela, de costas para ela.
Ela não estava convencida de que ele estava dizendo a verdade.
— Há algo que eu possa fazer pelo senhor?
— Obrigado, mas não. — Ele virou-se para ela, com as mãos cruzadas
atrás das costas. — Decidi voltar para casa. Há assuntos lá que exigem
minha atenção.
— Quando?
— Agora. Depois que eu me despedir de você.
Ela só conseguiu encará-lo por alguns segundos. O marquês tropeçara
depois do café da manhã, provando a todos que não estava completamente
recuperado, e agora pretendia voltar para casa? Certamente até ele poderia
ver que tal ação seria temerária.
— Tem certeza de que está se sentindo bem? Só esta manhã…
— Sim — disse ele, uma ponta de impaciência em seu tom. — Estou
ciente do que aconteceu esta manhã. Não foi nada.
— Mas…
— Certamente não tenho que me explicar para você.
Suas palavras a atingiram como um tapa, parando-a. O homem que
estava diante dela agora não era a mesma pessoa com quem ela
compartilhara o café da manhã. Ele certamente não era a pessoa que tinha
entendido a dor de ter perdido um pai. O homem que ela começara a gostar.
Não, aquele homem era um estranho.
Ela sentiu a perda daquele homem mais profundamente do que gostaria
de admitir. Ficou claro que ela estava agindo tolamente. Afinal, ele era um
Manning, mas apesar de seu comportamento frio, ela não podia permitir que
ele fosse embora.
— Não, claro que não, milorde. Não me deve explicações, mas talvez
possa esperar até que John volte. Eu o espero no meio da tarde. Ele pode
cavalgar com o senhor.
Ela não achava isso possível, mas ele pareceu ficar ainda mais rígido.
— Isso não será necessário — disse ele, suas palavras cortadas.
Louisa não conseguia entender sua raiva, nem conseguia entender o
maldito orgulho masculino que se recusava a mostrar qualquer sinal de
fraqueza. Certamente ele percebera que ela estava apenas preocupada com a
segurança dele, mas se Overlea insistisse que estava bem, ela não seria
capaz de impedi-lo de partir. A Mansão Overlea não estava longe a cavalo e
ela só podia esperar que a força dele aguentasse até chegar lá.
— Estou em dívida com você, senhorita Evans. — Ele fez uma pausa
breve. Quando continuou, sua voz havia perdido o tom cortante. — Se
houver alguma coisa que eu possa fazer por você ou sua família, é só me
pedir.
Agora foi a vez dela de se enrijecer. Por mais desagradável que fosse o
pensamento, eles poderiam um dia ter que contar com a caridade de
estranhos, mas ela também tinha seu orgulho, e duvidava que algum dia
estivessem tão desesperados a ponto de aceitar a caridade dos Manning.
— Obrigada — agradeceu.
Ele a olhou por vários segundos. Seus olhos escuros pareciam ver
através dela e Louisa não pôde deixar de pensar que ele sabia o que ela
estava pensando. Finalmente, desviou o olhar e enfiou a mão no bolso do
casaco para retirar uma pequena caixa dourada da qual tirou um cartão de
visita.
— Por favor, aceite isso — disse ele, entregando-lhe o cartão. —
Escrevi meu endereço na cidade no verso. Não sei quanto tempo vou ficar
no campo. Se mudar de ideia… — Ela começou a protestar, mas ele falou
sobre sua objeção: — Se mudar de ideia, sinta-se à vontade para entrar em
contato comigo.
Ela olhou para o cartão, uma suspeita se formando.
— Não vou aceitar nenhum pagamento por ontem à noite.
— Não, claro que não. — Ele correu para tranquilizá-la. — Mas você
pode muito bem ter salvado minha vida. — Seus lábios se torceram
ligeiramente com isso. — No mínimo, sua hospitalidade me salvou de uma
noite fria e desconfortável na beira da estrada. Espero que você nunca
precise da minha ajuda, mas quero que saiba que a oferta está de pé.
Ela assentiu.
— Obrigada — agradeceu, pegando o cartão e colocando-o em uma
mesa lateral.
Houve um silêncio breve e constrangedor no qual ela não conseguiu
pensar em mais nada para dizer. Já havia expressado sua preocupação com a
segurança dele e ele a ignorara. Uma expressão estranha cruzou o rosto dele
e, por um momento, ela pensou que ele estava prestes a dizer algo mais.
Ele pegou levemente na mão dela e curvou-se sobre ela. O choque de
sua mão nua sobre a dela enviou um arrepio alarmante por sua espinha. Ele
a olhou profundamente em seus olhos e uma sensação de vibração começou
na boca do estômago. Sua respiração ficou presa e seus pensamentos
voltaram para o beijo que estava tentando tanto esquecer. Quando ele soltou
sua mão, ela a deixou cair na lateral de seu corpo, ignorando a tentação de
verificar se o toque dele havia queimado sua pele.
— Tenha um bom dia, Srta. Evans — disse ele suavemente.
Então caminhou até a porta da frente, abriu-a e foi embora. Louisa
olhou para o espaço onde ele estivera, tentando dissipar a sensação de perda
que ameaçava dominá-la. Sabia que estava sendo boba. Ele nem estivera ali
um dia inteiro. Como a casa podia parecer tão vazia agora que ele havia ido
embora?
Voltou para a janela da sala de estar e observou-o enquanto atravessava
o pátio e caminhava, com as costas retas e o passo firme, até onde ele
amarrara seu cavalo em uma árvore. Dissera a si mesma que queria ter
certeza de que ele não tropeçaria novamente, mas sabia que estava
mentindo. Provavelmente era melhor que Overlea estivesse partindo. O
marquês tinha um fascínio inegável, uma qualidade que sem dúvida atraía
muitas mulheres para ele. Um ao qual estava claro que ela não era imune.
Ela o viu colocar um pé no estribo e balançar nas costas do cavalo. Ela
não percebeu que estava prendendo a respiração até que ela a soltou quando
ele não caiu imediatamente. Seu olhar o seguiu até que ele não estivesse
mais à vista.
Então balançou a cabeça para limpar seus pensamentos. Ela não tinha
tempo para isso. Tinha que terminar o vestido de Mary Manning. Deixou a
cortina cair de volta no lugar e estava prestes a se afastar da janela quando
um movimento na estrada chamou sua atenção. Prendendo a respiração, ela
esperou, perguntando-se se Overlea tinha percebido que não estava apto a
fazer esta última etapa de sua jornada sozinho e estaria voltando.
Ela soltou um longo suspiro, no entanto, quando percebeu que não era o
marquês voltando, mas seu primo, Edward Manning, em um coche. O
senhorio deles.
Seria um dia para os Manning.
Ela saiu, preferindo encontrá-lo lá. Ao contrário de seu primo, Edward
Manning não estava doente e ela não tinha intenção de deixá-lo entrar em
sua casa. O veículo parou no final da pista e ela viu o cocheiro descer e
correr para abrir a porta. Edward Manning desceu cautelosamente.
Tendo estado tão recentemente na companhia de Overlea, Louisa não
pôde deixar de notar as diferenças entre os dois homens. Pelo que ela se
lembrava, ambos tinham a mesma idade, mas não poderiam ser mais
diferentes do que se não houvesse laços de sangue entre eles.
Overlea tinha pelo menos um metro e oitenta de altura, cabelo escuro e
olhos quase negros. Ele era magro, mas surpreendentemente musculoso,
como não pôde deixar de notar quando se pressionou contra ele naquela
manhã.
Edward Manning tinha uma compleição semelhante à de seu primo, mas
era mais baixo e parecia mais delicado. Ela sabia que a largura dos ombros
de Overlea era natural, mas suspeitava que a de Edward Manning fosse
devido a algum enchimento. Seu cabelo era de um castanho arenoso e seus
olhos de um azul gélido que poderia cortar uma pessoa. Um desconforto
instalou-se na boca de seu estômago enquanto aqueles olhos agora focavam
nela.
Ele foi até a passarela, pegou na mão dela e se curvou.
— Espero que esteja bem, Srta. Evans — disse ele, apertando a mão
dela antes de soltá-la. Um estremecimento de desgosto a percorreu. — Já
faz um tempo que queria falar com você, mas os negócios me mantiveram
em Londres.
Ela podia muito bem imaginar o que eram aqueles negócios. Sem
dúvida estivera na cidade, jogando fora o dinheiro que arrancava de seus
inquilinos em vícios variados.
— Obrigada, eu estou bem — disse ela, tentando manter aquele tom de
civilidade que ela achava cada vez mais difícil de manter depois que seu pai
adoecera e teve que assumir todos os negócios com Edward Manning. O
interesse dele por ela era evidente desde o início, e os últimos meses sem
suas visitas foram um alívio. Ela não conseguia imaginar por que ele
precisava falar com ela agora, e esperava que sua visita não durasse muito.
Ele passou a língua nos lábios e olhou por cima do ombro dela antes de
voltar o olhar para ela.
— Seu irmão está em casa?
Ela não conseguia entender por que ele havia perguntado isso. Ele
nunca tinha lidado com John antes.
— Não, ele está estudando com o reverendo Harnick.
— Bom, bom. — Ele limpou a garganta antes de continuar e um leve
sorriso brincou em seus lábios. — Seu pai se foi há meio ano, não foi?
Imagino que isso signifique que você já esteja fora do luto profundo. — Ele
deu um passo para mais perto dela. — Tenho certeza de que apreciará que
temos assuntos importantes para discutir. Talvez se pudéssemos entrar?
Seu pedido foi inesperado. Manning sabia como estavam as coisas entre
suas duas famílias. Ele sabia que não era bem-vindo na casa dela e nunca
teria sugerido tal coisa quando seu pai ainda estava vivo.
— Tenho certeza de que não temos nada para discutir que levaria tanto
tempo — disse ela.
— Ah, mas está errada sobre isso, minha querida. Estou aqui para
discutir seu aluguel.
Um calafrio a percorreu.
— Aluguel? — repetiu ela, esperando que ele estivesse brincando. O
olhar no rosto dele dizia o contrário.
— Pois sim. Certamente entende que não posso permitir que você e sua
família continuem morando aqui sem pagar aluguel.
— Mas meu pai tinha um acordo com o seu.
— Sim, mas esse acordo era entre os dois. Nenhum deles está conosco
hoje. Eu já fui mais do que generoso esperando tanto tempo antes de me
aproximar de você. Além disso — continuou ele, sua voz suave, mas seus
olhos ainda frios —, tenho certeza de que seu orgulho se recusa à noção de
tal caridade. Esta é a maior casa de campo da propriedade e há outros que
demonstraram interesse por ela. Certamente você entende minha posição.
Embora ele tentasse infundir em suas palavras um certo lamento, Louisa
podia dizer que ele não sentia nenhum.
— Quanto? — perguntou ela, forçando as palavras para além do nó
alojado em sua garganta.
Ele disse uma quantia e ela sentiu um caroço descendo pela garganta até
se estabelecer firmemente em seu estômago. Eles nunca seriam capazes de
gerenciar a despesa adicional. Do jeito que estava, ela mal ganhava dinheiro
suficiente com sua costura para alimentá-los, o que ele sem dúvida sabia.
— Sr. Manning — começou ela, tentando não revelar sua crescente
sensação de pânico —, eu temo que essa quantia esteja além de nossas
possibilidades no momento.
Ele estalou a língua com isso.
— Que pena — disse ele, balançando a cabeça. — Gostei de tê-la e a
sua família como vizinhos.
Ele virou-se para ir embora.
Louisa empalideceu. Certamente ele não pretendia expulsá-los,
pretendia?
— Espere — disse ela, sua mente correndo por uma solução.
Ele girou lentamente com uma sobrancelha levantada.
— Sim?
— Talvez possamos chegar a outro acordo — disse ela, rezando para
que ele fosse razoável. — Um que seria mutuamente agradável para nós
dois.
— Vá em frente — disse ele com um sorriso começando a se formar.
— Tenho alguma habilidade como costureira. Talvez eu possa oferecer
meus serviços à sua irmã em troca de qualquer aluguel. Ela está me
pagando agora, mas não precisaria mais. E eu ficaria feliz em assumir ainda
mais trabalho.
O aborrecimento cintilou em seu rosto.
— Mary já tem vestidos mais do que suficientes — disse ele
bruscamente. Então pareceu se controlar, pois quando continuou, sua voz
havia se suavizado novamente. — Não, temo que não consigo pensar em
nenhuma solução. — Ele pareceu pensativo por um momento, então seus
olhos se iluminaram. — A não ser que…
— O quê? — perguntou ela, ansiosa para agarrar qualquer maneira de
sair daquela situação.
Um olhar de preocupação exagerada cruzou o rosto dele.
— Seria uma pena que fosse embora. Sei que não tem outra família para
cuidar de vocês neste momento difícil. — A preocupação deixou seu rosto
para ser substituído por um sorriso triunfante. — Para onde iriam?
Os primórdios da raiva começaram a se agitar dentro dela. Aquele
miserável, mentiroso e enganador. Ele estava gostando de sua miséria.
Obviamente tinha algo em mente, então ela permaneceu em silêncio,
sabendo que seria imprudente irritá-lo. Só esperava que ele se cansasse de
seu jogo logo e revelasse suas intenções.
Ela não precisou esperar muito.
— Talvez haja algo que você possa fazer por mim. — Seu olhar se
moveu sobre ela, demorando-se em seus seios. Quando ele ergueu os olhos
para ela novamente, sua intensidade penetrante fez com que o sangue dela
congelasse. — Eu sempre fui muito curioso sobre você, Srta. Evans. Tenho
a sensação de que está escondendo mais sob esse exterior inocente do que
os outros acreditam.
Ela não disse nada.
Ele deu um passo para mais perto, mas ela se manteve firme. Ele não a
veria se encolher.
— Certamente podemos descobrir — disse ele.
— Acho que não.
Ele a encarou atentamente por um momento antes de dar um passo para
trás.
— Claro que não — disse ele. — Bem, talvez sua irmã tenha uma
opinião diferente. Afinal, ela não é mais uma criança. E tenho certeza de
que estaria muito ansiosa para ajudar a evitar que sua família fosse expulsa
de casa sem um xelim em seu nome.
Isso nunca vai acontecer, Louisa jurou silenciosamente. Não permitiria
que ele se aproximasse de Catherine com sua proposta lasciva.
Ela tentou uma última vez apelar para qualquer resquício de decência
que ele pudesse possuir, sabendo o tempo todo que seria inútil.
— Por favor — disse ela, tentando mascarar seu desespero —, sua
família já não tirou o suficiente de nós? Você não pode nos deixar em paz?
Seu olhar frio cintilou sobre ela mais uma vez.
— Estarei de volta na sexta-feira. Ou você terá o aluguel ou terá que
pensar em outra maneira de me pagar. Bom dia.
Ele caminhou em direção a sua carruagem sem olhar para trás.
Enojada, ela correu para dentro de casa e fechou a porta atrás de si.
Apoiando-se nela, fechou os olhos e engoliu em seco, tentando, sem
sucesso, conseguir um pouco de calma. Ela nunca seria capaz de resolver
esse novo dilema se entrasse em pânico.
Era segunda-feira. Ela ainda tinha quatro dias para encontrar uma
solução, mas por mais que tentasse, não conseguia pensar em uma saída
para a situação deles.
Precisava se sentar. Ela respirou fundo algumas vezes para se estabilizar
antes de ir para a sala de estar. Chegando lá, seu olhar caiu sobre o cartão de
visita sobre a mesa lateral.
 
Capítulo 4

UM ENXURRADA de atividades começou quando Nicholas entrou no pátio


aberto do Solar Overlea. Um cavalariço correu para cuidar de seu cavalo,
enquanto o jardineiro-chefe se esgueirou para avisar aos funcionários que o
marquês havia retornado. Em poucos minutos, todos os servos da
propriedade estariam sabendo. Ele sorriu ironicamente. Sua chegada nunca
tinha chamado tanta atenção antes de ele herdar o título. Quando seu pai e
irmão estavam vivos, ele era livre para ir e vir como quisesse. Havia
perdido tal liberdade.
Ele desmontou e entregou as rédeas ao cavalariço, que fez uma
reverência e levou o animal embora. Ele virou-se para a mansão onde o
mordomo estava esperando pacientemente junto à porta aberta.
Sommers fez uma reverência quando Nicholas se aproximou.
— Lady Overlea está a sua espera, milorde.
Nicholas sabia que isso significava que sua avó queria vê-lo o mais
rápido possível. Havia desistido de tentar lembrar o que havia na carta dela.
Ele conseguia se lembrar de quebrar o selo dela, mas não tinha memória de
lê-la. A carta só podia ser uma intimação ou notícia de que ela estava
doente. Nada mais o teria levado a voltar para casa em Kent a cavalo
enquanto estava nas garras de uma de suas malditas dores de cabeça.
— A vovó está bem?
— Sim, milorde, como sempre.
É claro. Sua avó sempre foi forte como um boi. Ela havia sobrevivido
ao marido, aos dois filhos e a um de seus netos. Provavelmente sobreviveria
a ele também. Isso significava que a avó o havia convocado, mas por quê?
Ela não o teria chamado para tratar de negócios imobiliários. Deixara esse
lado das coisas para ele, que nunca negligenciou seus deveres. Estava
tramando algo. Algo que ele não iria gostar. Ele só desejava que pudesse se
lembrar do que era para que pudesse encontrá-la no mesmo terreno.
— Harrison chegou esta manhã. — Continuou o mordomo. — Ele ficou
surpreso ao descobrir que você ainda não tinha chegado.
Ele fez uma careta internamente. Não conseguia se lembrar dos detalhes
em torno de sua partida da cidade, mas parecia que a chegada de seu valete
tinha a casa inteira entretendo visões de mais um marquês morto. Ele só
esperava que não tivessem dito nada a sua avó que a deixasse preocupada.
Olhou para suas roupas que estavam bem amarrotadas e empoeiradas.
Deveria subir e se trocar primeiro antes de vê-la, mas naquele momento
tudo o que ele queria era terminar essa reunião o mais rápido possível.
— Eu sabia que a vovó não estaria acordada quando eu chegasse, então
decidi me hospedar em uma pousada em vez de vir aqui diretamente —
disse ele como desculpa. Não era uma boa, mas Sommers nunca ousaria
questioná-lo. — Vou vê-la agora.
— Muito bem, milorde — disse Sommers com uma ligeira reverência.
— Ela está em sua sala de estar.
Nicholas dirigiu-se à escada, mas parou e voltou-se para o mordomo.
— Mais uma coisa, Sommers, se lembra da família Evans? Eles tinham
a propriedade vizinha a esta antes que meu tio a adquirisse.
— Certamente, milorde — disse Sommers, escondendo o desdém que
Nicholas sabia que ele tinha pelo que seu tio havia feito. Ele descobriu que
a maioria dos servos se sentia da mesma maneira depois de ouvir Sommers
falando sobre isso uma vez, anos antes, com a governanta.
— Se uma mensagem chegar deles, gostaria de ser notificado
imediatamente.
— Seria esta tarde, milorde?
— Não — disse Nicholas, franzindo a testa ligeiramente. — Não sei
quando isso vai acontecer, ou mesmo se vai acontecer.
— Sim, milorde.
Com isso, Nicholas voltou para as escadas e subiu dois degraus de cada
vez para o segundo andar e seguiu para a ala leste onde sua avó tinha seus
aposentos. Ele ficou do lado de fora da porta por um tempo, tentando uma
última vez lembrar o que ela havia escrito na carta. Quase podia ver as
palavras na página, mas quanto mais se concentrava, mais evasiva a
memória se tornava.
Afastando sua frustração, Nicholas bateu duas vezes à porta da sala de
sua avó. Ela respondeu imediatamente, mandando-o entrar. Ele a encontrou
reclinada em uma espreguiçadeira com os olhos fechados. Contra o
vermelho profundo da espreguiçadeira, seu cabelo branco como a neve e a
pele pálida se destacavam grandemente.
Ele poderia ter se chutado por não ter lembrado que sua avó descansava
à tarde. Deveria ter esperado para vê-la. Embora ela nunca admitisse, a
morte de seus pais, seguidas tão de perto pela de seu irmão, haviam cobrado
seu preço.
Ela parecia tão pequena e frágil, que Nicholas sentiu uma súbita onda de
amor por ela. Além de seus primos, com quem nunca foi próximo, ela era
sua única parente viva.
Ela abriu os olhos e olhou para ele.
— Vejo que recebeu minha carta — disse ela, colocando-se em uma
posição sentada. Dispensou o braço que ele estendeu para ajudá-la. —
Achei que chamaria sua atenção.
— Vovó — disse ele, inclinando-se para beijar a bochecha dela antes de
se sentar em frente a ela em uma cadeira ridiculamente ornamentada que ele
não tinha certeza se aguentaria seu peso. — Espero não ter perturbado o seu
descanso.
Ela franziu a testa para ele.
— Não está furioso comigo? — Ela olhou para ele de perto. — O que
está tramando?
— Devo ficar com raiva da senhora?
— Furioso. A menos que… — Seus olhos se iluminaram. — A menos
que você já tenha notícias para mim. — Ela inclinou-se para frente e
segurou a mão dele. — Quem é ela?
— Quem é quem?
A marquesa viúva jogou a mão para trás, exasperada.
— Não brinque comigo, Nicholas. Com quem você vai se casar?
Surpresa não poderia começar a descrever sua reação à pergunta dela.
Ele poderia ter esquecido o que ela escrevera na carta, mas não teria
esquecido um noivado. Seus lapsos de memória não estavam tão longe
assim. Preocupado, ele foi sentar-se ao lado dela na espreguiçadeira. Vovó
era velha, sim, mas ela nunca tinha sofrido de delírios antes. Ele sabia que
algumas pessoas eram propensas a eles à medida que envelheciam, mas de
alguma forma, nunca pensou que sua avó, forte e mentalmente aguda, seria
uma delas.
— O que faz a senhora pensar que eu vou me casar? — perguntou em
seu tom gentil.
Ela se enrijeceu.
— Não me trate como uma velha.
Ele sorriu e ela deu um tapa no braço dele.
— Eu o proíbo de me dizer isso. — Ela franziu a testa novamente. —
Recebeu minha carta?
Ele não tinha certeza de como a proteger. Não queria mentir para ela,
mas também não queria que se preocupasse. Ela não precisava saber ainda
que ele havia começado a ter dores de cabeça ou que elas estavam
começando a afetar sua memória.
— Sua carta?
Ela suspirou com resignação.
— Sinto sua falta, mas se não veio por causa da minha carta, então por
que está aqui?
— Talvez eu só quisesse passar algum tempo com minha avó favorita.
— Eu sou sua única avó. E não vai querer ter nada comigo em breve.
Isso era o que ele estava esperando. Ele levantou-se e a encarou,
preparando-se para o pior.
— O que a senhora fez, vovó?
— Eu providenciei um anúncio para aparecer nos jornais amanhã de
manhã sobre o baile que vou dar aqui no final do mês.
Sua confusão se aprofundou.
— A maioria das pessoas envia convites para anunciar um baile.
Ela não reagiu ao sarcasmo em seu tom.
— Enviei convites, mas queria que todos soubessem de nossa boa
notícia antes disso.
O pavor subiu por sua espinha.
— Notícia?
— Sim, a notícia de suas núpcias iminentes.
— Minhas o quê?
Ela realmente tinha enlouquecido. Estava fadado a acontecer na idade
dela, mas que acontecesse de uma maneira tão pública era mais do que
embaraçoso.
— Por favor, vovó, diga que não fez isso.
A marquesa viúva manteve-se firme.
— Eu fiz.
Sua mente começou a se acelerar. Ele caminhou até a porta, as mãos
penteando o cabelo. Ele lançou um olhar para o relógio na lareira. Era quase
uma hora.
— Se eu sair agora, talvez consiga chegar à Londres antes que eles
sejam impressos. — Presumindo, é claro, que não sofresse uma recaída. Sua
dor de cabeça estava apenas um pouco melhor, mas ele se sentia mais firme
em seus pés. Ele não tinha ideia de como um jornal funcionava, mas
precisava tentar impedir que aquele anúncio fosse divulgado.
— Vai ficar aqui — disse a avó em um tom firme.
Nicholas girou para encará-la.
— Posso ser velha, Nicholas, mas não perdi o juízo. O item de amanhã
não é exatamente um anúncio. Apenas providenciei para que soubessem
que você planeja anunciar seu noivado neste baile. Vai parecer mais como
uma fofoca.
Essa admissão estava longe de aliviar um pouco de sua preocupação.
— Certamente a senhora não espera que eu fabrique uma noiva antes
disso — disse ele, exasperado por sua intromissão. Ela estava tentando
convencê-lo a se casar desde a morte de seu irmão, mas isso estava indo
longe demais.
— Sei que o Conde de Raymond consentiria em um casamento entre
você e a filha mais velha dele. E Lady Strathmore tem insinuado
amplamente que a filha preferiria um casamento com você. Minha
preferência seria que se casasse com sua prima Mary, como seu irmão tinha
planejado fazer, para consertar a rixa entre as duas famílias. No entanto, não
posso forçá-lo a fazer isso.
— Que amável de sua parte — disse Nicholas, incapaz de afastar o
aborrecimento em sua voz.
A avó continuou como se ele não tivesse dito nada.
— Tenho certeza de que as especulações serão abundantes. Sugiro que
resolva quem será sua noiva em breve.
Nicholas só podia olhar para ela, incrédulo. A memória do que estava
naquela carta maldita voltou para ele enquanto ela falava. Como ele poderia
ter esquecido o anúncio de um casamento iminente? O seu casamento.
Claro, a avó o levou a acreditar que ela logo faria um anúncio formal. Ela
também se esqueceu de mencionar que já havia colocado seu plano em
ação.
— Não serei forçado a me casar com alguém que não posso tolerar, e
definitivamente não me casarei com minha prima. James era o mártir desta
família, não eu.
Ele ignorou a pontada de culpa que o atingiu quando viu a tristeza que
atravessou o rosto dela com a menção de seu irmão mais velho. Fazia
apenas um ano desde a morte dele.
— Odeio mencionar isso, mas a senhora deve estar ciente de que não
levei uma vida de monge e que não raramente há fofocas ligadas ao meu
nome. Certamente sabe que a especulação de alguém com quem pretendo
me casar dificilmente seria suficiente para forçar minha mão.
A avó suspirou profundamente.
— Nicholas — disse ela, seu tom agora apaziguador —, por favor,
entenda. Sempre desejei que encontrasse alguém especial. Alguém que
poderia amar como seu avô e eu nos amávamos e como seus pais se
amavam. Eu não queria fazer isso.
— Então por que fez?
— Tem vinte e oito anos. É hora de se estabelecer e gerar um herdeiro.
Vinte e oito não era uma idade avançada, mas ele sabia que sua avó
estava pensando nas mortes inesperadas de seu pai e irmão.
— Já temos um herdeiro se algo acontecer comigo.
A marquesa viúva fez uma careta.
— Edward é meu neto e eu o amo, mas seu primo nunca seria um bom
marquês.
— Nisso nós concordamos, mas não vou permitir que a senhora me
force a isso. — Ele virou-se e caminhou em direção à porta. — Voltarei à
Londres amanhã.
Ele estava prestes a sair quando as palavras da avó o detiveram.
— Eu lhe contei meus planos com antecedência desta vez, Nicholas. Se
não cumprir agora, não haverá aviso na próxima vez. A primeira vez que
ouvir será um anúncio formal que incluirá o nome da noiva.
— Entendo — disse ele rigidamente, virando-se para encará-la. —
Suponho que eu deveria estar grato à senhora por ter me permitido alguma
escolha no assunto.
— Nicholas…
Ele não ficou para ouvir mais. Abriu a porta e saiu, fechando-a
ruidosamente atrás de si. Uma raiva rápida e ardente substituiu a
preocupação que ele sentiu por sua avó ao entrar em sua sala de estar. Ele
não podia acreditar que ela realmente havia tentado chantageá-lo para se
casar.
Não queria nada mais do que dirigir-se aos estábulos e descarregar um
pouco de sua raiva. Ele precisava clarear a cabeça e pensar em uma maneira
de dissuadir a avó de seu atual curso de ação. Em vez disso, ele virou-se e
foi para a biblioteca. Não serviria a nenhum propósito ignorar o fato de que
sua maldita cabeça ainda doía. Conseguiu cavalgar vindo do chalé dos
Evans porque foi cuidadoso, mas não estava em estado de espírito no
momento para tanta cautela.
Desabou na poltrona diante da lareira. Ainda não estava frio o suficiente
para acender o fogo durante o dia, então em vez disso, olhou para a lareira
vazia. Seus lábios se torceram com uma ironia divertida quando ele
comentou como a falta de calor parecia uma metáfora adequada para sua
própria vida. Ele não conseguia se lembrar da última vez que se sentira
genuinamente vivo. Oh, ele fizera um belo show enquanto estava na cidade,
mas sua frivolidade estava apenas na superfície. Com todas as mortes que
cercaram sua família, suas novas e nunca esperadas responsabilidades, e
agora a ameaça de uma morte semelhante pairando sobre sua própria
cabeça, ele estava tão frio e sem vida por dentro quanto as cinzas escuras na
lareira diante dele.
Ele decidira recentemente que nunca poderia arriscar a se casar. Ficou
claro que alguma doença estava atingindo os homens da família e ele não
queria passar essa doença para seus próprios filhos. Perguntou-se se a avó
suspeitava que ele havia tomado tal decisão. Nunca havia discutido
casamento com ela até então, mas era astuta o suficiente para adivinhar seus
pensamentos sobre o assunto. Ele se perguntou se ela o libertaria de seus
esquemas de casá-lo se ele lhe dissesse que estava começando a mostrar
sinais da mesma doença que matara seu pai e irmão.
Não podia arriscar ter filhos. Houve mulheres, sim, mas ele sempre
tivera o cuidado de não gerar filhos bastardos. Estava grato agora por essa
cautela.
No entanto, a avó estava certa sobre Edward. Ele não poderia herdar.
Era egoísta e irresponsável, características que sem dúvida herdara do pai,
mas floresceram sob o carinho de sua tia. E só piorava a cada ano que
passava.
Não, ele tinha que tomar medidas para evitar que seu primo se tornasse
o próximo Marquês de Overlea, e tinha que agir antes que sua própria
doença o deixasse incapacitado. Seu orgulho recusava o que ele sabia que
tinha que ser feito, mas não podia mais se dar ao luxo de adiar.
Seus pensamentos se voltaram para a bela Louisa Evans e o beijo que
eles haviam compartilhado naquela manhã e, por um momento insano, ele
se perguntou se deveria considerar pedir a mão dela. Mas então se lembrou
de como ela ficara rígida quando pensou que ele estava oferecendo sua
caridade. Se estava decidida a recusar qualquer ajuda ou agradecimento por
ter cuidado dele na noite anterior, certamente nunca aceitaria uma proposta
de casamento.
Além disso, ele sabia que estava sendo ridículo. Um beijo não
significava que eles eram compatíveis. Tudo bem, tinha sido um beijo
muito bom, cheio de paixão e a promessa de delícias por vir.
Balançou a cabeça para limpar tais pensamentos. Dado o que ele
precisaria fazer para obter um herdeiro, provavelmente era melhor se casar
com alguém por quem ele não estivesse tão atraído. Ele se perguntou se
alguma das damas que a avó havia mencionado concordaria com o tipo de
arranjo que ele tinha em mente.

LOUISA NÃO tinha mais para onde apelar. Tentara sem sucesso encontrar
mais costura para fazer ou pensar em alguma outra maneira de pagar a
Edward Manning o aluguel que ele exigia. Sua alternativa sugerida era
muito repulsiva para contemplar, muito menos aceitar, e ela não permitiria
que ele se aproximasse de Catherine com sua proposta vil.
Em um momento de frustração, ela quase contou ao irmão sobre a visita
do senhorio. A tentação de ter alguém com quem compartilhar esse fardo
era grande. Ela sabia, porém, que John não seria capaz de ajudar, e era
ousado o suficiente para fazer algo tolo como desafiar Edward para um
duelo pela proposta que havia feito. Ela não podia permitir que isso
acontecesse.
Ela parou o cavalo que havia emprestado de um vizinho no final do
caminho e olhou para os jardins bem cuidados que se estendiam diante da
Mansão Overlea. Sua antiga casa, embora respeitável em tamanho, não era
tão grande quanto a casa diante dela agora: três andares de altura, duas alas
se estendendo nas laterais e um pórtico impressionante que se elevava até a
linha do telhado, tudo em uma linda pedra colorida em tons de mel. Louisa
só podia olhar para ela com admiração, com o conhecimento se
solidificando de que aquela casa estava completamente fora de sua
profundidade.
Pedir a ajuda de Overlea tinha sido o único caminho que enxergou.
Conseguiu manter a calma durante o passeio, mas agora que estava ali, seu
coração acelerou. Respirou fundo em uma vã tentativa de acalmar os nervos
antes de iniciar o caminho até a frente da casa. Quando ela desmontou, um
cavalariço já vinha em sua direção. Ela sorriu enquanto lhe entregava as
rédeas.
De costas retas, fingindo uma confiança que estava longe de sentir, ela
virou-se e continuou subindo a pequena escada até a entrada principal.
Parou no topo e alisou a saia azul escura de seu traje de montaria. O estilo
estava desatualizado há mais de alguns anos, mas não fazia sentido ter um
traje mais moderno quando nem sequer possuíam um cavalo.
Ela respirou fundo novamente antes de levantar a aldrava de latão
pesada e deixá-la cair. A porta foi aberta imediatamente por um lacaio. Ele
a olhou e depois olhou para além dela. Louisa pôde vê-lo se enrijecer
quando percebeu que ela estava desacompanhada. Ela só podia imaginar o
que ele deveria estar pensando.
— Estou aqui para ver o Lorde Overlea.
O lacaio não se deu ao trabalho de esconder sua desaprovação.
— O marquês não está.
Ele realmente ia fechar a porta na cara dela. Por puro desespero, Louisa
entrou pela porta. Ele teria que removê-la fisicamente se quisesse que fosse
embora.
— Poderia, por favor, dizer a ele que Louisa Evans está aqui para vê-lo?
Ela ficou surpresa quando o comportamento dele mudou quase que
instantaneamente. Ele abriu mais a porta e deu um passo para trás para
permitir que ela entrasse, todo solicito agora.
— Claro, senhorita Evans.
Ele a levou para a sala de estar e recuou, fechando a porta atrás dele.
Louisa respirou trêmula. Cruzara a primeira barreira, ganhando entrada,
mas seus nervos ainda estavam instáveis. A parte mais difícil estava por vir.
Se pedisse ajuda a Overlea, não tinha certeza se ele a ajudaria. Afinal,
Edward Manning era seu primo e, dada a reputação do marquês, talvez não
visse nada de errado com o arranjo que Edward havia proposto. Afinal, era
muito comum homens de seu nível terem amantes.
Ela se perguntou se Overlea tinha uma amante e descobriu que a ideia a
incomodava mais do que gostaria de admitir.
Sua mente estava tão sobrecarregada por causa de seu próximo encontro
com Overlea que mal percebeu o ambiente elegante. Sentou-se na beira de
um sofá de cor creme e precisou de todo o seu foco para não ficar inquieta.
Conforme os minutos passavam, ela se viu ficando cada vez mais ansiosa.
Estava esperando um quarto de hora inteiro antes de ocorrer-lhe que
Overlea poderia se recusar a vê-la.
Ela esperou mais um quarto de hora antes de decidir procurar o lacaio.
Ela tinha acabado de chegar à porta da sala de estar quando ela se abriu.
Assustada, deu um passo para trás.
Achara o marquês de Overlea um homem bonito antes, mas da última
vez que o viu, suas roupas estavam amarrotadas de uma noite de
reviravoltas e uma barba escura cobria sua mandíbula. Ele parecia acessível
então. Agora, barbeado e impecavelmente vestido, ele a deixou sem fôlego.
Usava um casaco verde-escuro que se estendia pelos ombros que agora
pareciam mais largos, um colete em um tom mais claro da mesma cor e
calça de pele de gamo que se moldava às coxas musculosas e desapareciam
em botas que ela suspeitava serem as mesmas das quais ela se lembrava de
ter retirado dele. Ela estava agudamente consciente, como nunca antes, da
diferença em suas posições.
Que Overlea havia ficado surpreso ao vê-la era evidente, principalmente
porque estava sozinha. Ele não podia saber, então, que sua reputação já
estava à beira de ser arruinada. Que ela poderia muito bem se encontrar sem
alternativa a não ser aceitar a proposta de Edward se ele se recusasse a
ajudá-la.
— Senhorita Evans — disse ele, inclinando a cabeça.
Ela ouviu seu cumprimento, mas se viu incapaz de falar por um
momento.
— Por favor — disse ele, indicando o sofá que ela havia abandonado
—, fique à vontade.
Ela sentou-se e observou enquanto ele se acomodava em uma cadeira
em frente a ela.
— Eu a convidaria para um chá, mas sinto que não é uma visita social.
— Não — disse ela, antes de ficar em silêncio novamente.
Agora que estava ali, não sabia como começar. Como ela poderia contar
a ele o que seu primo havia proposto?
— Parece bem hoje, milorde — disse ela em uma tentativa de deter a
inevitável conversa desconfortável. — Suponho que sua doença já tenha
passado.
— Sim — disse ele.
Sua postura era rígida e estava claro que ele não queria discutir isso. Ela
não tinha alternativa a não ser ir direto ao motivo de sua visita.
— Sei que o senhor não esperava me ver tão cedo.
— Não esperava vê-la de jeito nenhum. — Ele moveu-se para frente em
sua cadeira com uma leve carranca, puxando os cantos da boca e continuou:
— Desculpe-me por ser direto, mas o que poderia ter acontecido nos
últimos dois dias para trazê-la até aqui? Me deixou com a impressão de que
não desejava ter mais contato comigo ou com minha família.
Ela resistiu ao desejo de se contorcer sob seu olhar atento.
— Deve ser muito sério para vir até aqui sem um acompanhante. Pensei
que estaria com seu irmão ou outra companhia.
— Meu irmão e minha irmã não podem saber que vim vê-lo.
Suas sobrancelhas se ergueram com isso. Ele recostou-se na cadeira sem
tirar os olhos dela.
— Recebi a visita de alguém de sua família.
— Mary? — perguntou ele, sua confusão evidente.
Ela balançou a cabeça.
— Não, seu primo, Edward Manning.
Ele franziu a testa.
— Por que isso a traria aqui? Não é inquilina dele?
— Não exatamente. — Ela hesitou por um momento antes de continuar:
— Quanto o senhor sabe sobre o que aconteceu entre meu pai e seu tio?
— Pouca coisa — respondeu Overlea, suas feições fechadas.
Ela estava grata por ter sido poupada de ter que retransmitir os detalhes
do que havia acontecido anos atrás.
— Depois… bem, depois do que aconteceu, nos mudamos de nossa
antiga casa para onde estamos morando agora. Suponho que depois de tudo
que ele nos tirou, seu tio decidiu nos mostrar um pouco de misericórdia. —
Não conseguiu esconder a nota de amargura em sua voz. — A casa é uma
das maiores da propriedade. Lembro-me de meu pai estar preocupado com
o aluguel pois não tinha mais a renda da propriedade, mas seu tio nos
permitiu morar lá sem ter que pagar.
— E agora?
Por sua quietude quase antinatural, ficou claro que ele suspeitava do que
ela estava prestes a dizer.
— Seu primo me informou que devemos começar a pagar o aluguel
imediatamente.
— E não pode pagar por ele.
— Não — disse ela, sua voz pouco acima de um sussurro.
Passaram-se vários segundos antes de Overlea dizer:
— Por que está aqui, Srta. Evans? Sei que não está aqui por caridade. A
senhorita gostaria que eu falasse com Edward? Convencê-lo a dar-lhe mais
tempo? Ou talvez continuar permitindo que permaneçam na casa nas
mesmas condições de quando seu pai estava vivo? Se for esse o caso,
infelizmente terei que decepcioná-la. Não tenho muita influência sobre as
ações de meu primo.
Ela teria que contar tudo a ele. O assunto já era desconfortável, mas o
beijo que ela e Overlea trocaram naquela manhã depois que ele acordou em
seu quarto o tornou ainda mais. Manter o silêncio, no entanto, poderia ter
consequências graves. Principalmente para Catherine.
— Há algo mais — disse ela, seu embaraço supremo. Incapaz de
abordar o assunto ainda, ela levantou-se e caminhou até a janela. Olhou
para os jardins perfeitamente cuidados por um minuto inteiro antes de
respirar fundo e virar-se para encará-lo novamente. Overlea levantou-se,
mas não disse nada, dando o tempo que ela precisava. Estava grata por isso.
— Seu primo me ofereceu uma alternativa para pagar o aluguel. Uma que
envolveria o uso de uma moeda de um tipo diferente, muito mais intragável.
Levou apenas um momento para ele entender o que ela queria dizer. Ele
fez uma careta e praguejou baixinho, mas ela continuou antes que ele
pudesse dizer qualquer coisa.
— John e Catherine não sabem nada sobre isso e não deverão saber
nunca. John é cabeça quente o suficiente para fazer algo tolo. E Catherine…
— Sua voz falhou. — Ele se ofereceu para abordá-la diretamente e fazer a
mesma oferta caso eu recusasse.
— Certamente ela nunca concordaria com uma coisa dessas. Não se
você falar com ela primeiro e lhe der seu apoio.
— Mamãe morreu no parto durante o nascimento de Catherine. Uma
parte dela acredita ser responsável pela série de eventos que nos levaram até
onde estamos hoje. Que papai nunca teria caído na armadilha de seu tio se
ela nunca tivesse nascido e mamãe não tivesse morrido. Papai nunca teria
começado a beber, nunca teria jogado fora a propriedade e nossa casa. Claro
— acrescentou ela, apressando-se a tranquilizá-lo para que ele não pensasse
que ela compartilhava dessa crença —, Catherine não é culpada pelas ações
de nosso pai, mas ela pode aceitar a oferta de seu primo como forma de
expiação para tudo o que aconteceu.
Os olhos escuros dele se fixaram nela pelo que pareceu uma eternidade.
Ela se contorceu, incompreensível e visivelmente sendo o único alvo
daquele olhar inescrutável. Finalmente, ele disse:
— Acredito que posso ajudá-la.
Um intenso alívio tomou conta dela e teve que fechar os olhos por um
instante. Ela começou a agradecer-lhe, mas as palavras dele a detiveram.
— Pode querer ouvir minhas condições primeiro.
Foi como se um dedo gelado de pavor percorresse sua espinha. Ela
havia cometido um erro ao ir até ele? Seria possível que ele fosse tão
desprezível quanto o primo?
— Talvez você devesse se sentar para isso.
Ela se enrijeceu.
— Está tudo bem. Estou confortável aqui.
Ela lançou um olhar apressado para a porta, imaginando suas chances
de escapar, mas percebeu que estava sendo tola. Este homem havia passado
uma quantidade considerável de tempo sob o teto dela e teve várias
oportunidades de fazer avanços indesejados. Além do beijo que deram
quando ele acordou e confundiu o relacionamento deles, uma ação pela qual
ele se desculpou mais tarde, ele foi cauteloso em suas atenções.
No entanto, estremeceu quando ele se aproximou dela. Seus
movimentos eram suaves, quase predatórios. Não havia indícios da cautela
com que ele agira naquela outra ocasião.
Ele parou a poucos metros dela. Ela não conseguia distinguir que
pensamentos espreitavam por trás de seu olhar escuro e intenso, mas sentiu
que ele estava chegando a uma decisão. Não teve que esperar muito para ele
lhe contar qual era.
— Precisa da minha ajuda e estou disposto a ajudá-la, mas tenho algo a
lhe pedir primeiro. Sem o seu acordo, temo ser incapaz de ajudá-la.
Louisa não podia acreditar no que estava ouvindo. Ele estava prestes a
fazer a mesma oferta que Edward tinha feito. Ficou desapontada. Por
alguma razão, ela esperava mais dele.
Ele ficou em silêncio por um momento, como se estivesse escolhendo
suas palavras cuidadosamente. Quando ele finalmente falou, eram as
últimas que ela esperava ouvir.
— Preciso de uma esposa.
 
Capítulo 5

ELE A CHOCOU. Não precisava ver a cor sumir do rosto dela para saber
que uma proposta de casamento era a última coisa que Louisa Evans
esperava ou queria dele.
Maldito seja seu primo Edward por ser um bastardo sem escrúpulos, e
maldito seja ele por usar as circunstâncias angustiantes da Srta. Evans em
seu benefício próprio. Ele sabia que aos olhos dela ele era um pouco melhor
que seu primo. Assim que tomasse conhecimento dos termos completos de
seu casamento, essa opinião se solidificaria, mas por enquanto seria melhor
manter esses termos para si mesmo. Só precisava que ela aceitasse sua
proposta. Ele lidaria com o assunto de seus herdeiros mais tarde.
— Precisa de minha proteção e eu preciso de uma marquesa. É a
solução perfeita.
Ela olhou para ele como se tivessem crescido duas cabeças. Não era
uma expressão que ele estava acostumado a ver. Embora estivesse ciente da
animosidade justificada que a família dela sempre manteve em relação à
dele, sentiu a dor em seu orgulho masculino. Qualquer outra mulher teria
aceitado sua oferta de casamento, e não apenas por seu título. Por outro
lado, agora era perseguido implacavelmente desde que havia se tornado o
Marquês de Overlea, e ele nunca quis uma companhia feminina.
Ele poderia ter escolhido entre várias mulheres, mas por alguma razão
Louisa Evans era a que ele queria. Não era só porque ela era atraente,
embora fosse, com sua figura esguia, seu longo cabelo loiro claro, agora
preso, seus olhos grandes e cinzas e aquela boca carnuda. Uma boca
destinada a beijar, como ele havia descoberto.
Estava atraído por ela, mais do que deveria pelo tipo de união que tinha
em mente. No entanto, essa atração não era a razão pela qual ele a queria
como sua esposa. Na verdade, ele tinha certeza de que seria um grande
inconveniente. Não, ele a pediu em casamento porque Louisa Evans era
uma mulher inteligente e prática. Ela era uma lufada de ar fresco depois de
todas as mulheres sorridentes e preocupadas com o casamento de Londres.
O mais importante, porém, era o fato de que ela também era uma mulher
desesperada. Alguém que ele tinha certeza de que acabaria concordando
com seus termos.
Louisa permaneceu em silêncio e ele observou o jogo de emoções que
cruzou o rosto dela. O choque se desvaneceu rápido o suficiente, apenas
para ser substituído por confusão e incerteza. Então ela afastou-se dele
novamente, suas costas retas.
Ele esperou pacientemente. Sabia qual seria a resposta. Ela não tinha
outra escolha.
Finalmente ela virou-se de queixo erguido. Nicholas sentiu alívio e, para
ser honesto, uma sensação de admiração. Não haveria histrionismo ali,
nenhuma súplica. Ela lidaria com ele claramente.
— Por que eu?
— Por que não?
A tranquilidade dele a fez parar.
— Nós dois sabemos que você é a presa da temporada. Qualquer mulher
concordaria em ser sua esposa, a maioria delas, sem dúvida, mais adequada
para os deveres que tal posição implica do que eu. Então — ela continuou
após uma breve pausa —, vou lhe perguntar novamente: por que eu?
— Não consigo pensar em ninguém mais adequado para ser minha
marquesa — disse ele, feliz por poder ser honesto com ela nesse ponto.
Seus olhos se estreitaram enquanto ela olhava para ele atentamente.
— Está escondendo alguma coisa.
Uma pontada rápida de culpa o atingiu, mas ele rapidamente a suprimiu.
Não tinha escolha. Ambas as mãos já haviam sido negociadas.
— Tornar-se minha marquesa é a única maneira de garantir que você
estará a salvo dos caprichos de meu primo. — Ele podia vê-la pesando suas
palavras e aproveitou sua vantagem para continuar: — E claro que eu
percebo suas responsabilidades para com sua família e estou disposto a
sustentá-los. Eles irão morar aqui, conosco. Catherine terá uma temporada
em Londres e John…?
— John gostaria de estudar em Oxford.
Nicholas sorriu.
— Então ele irá.
Ele pôde ver a indecisão desaparecendo dos olhos dela.
— Muito bem, eu aceito sua proposta.
Ela estava se esforçando tanto para ser corajosa, mas Nicholas podia
dizer que ela estava se sentindo oprimida. A vida lhe tinha dado mais do
que sua cota de dificuldades. Ele estava disposto a aliviá-la de pelo menos
alguns desses fardos. Ela não iria agradecer-lhe quando soubesse de tudo,
mas por enquanto ele poderia ajudá-la.
A força de seu desejo de cuidar dela o pegou desprevenido.
— Cumprimente a si mesma — disse ele, esforçando-se por leviandade.
— Está prestes a se tornar a Marquesa de Overlea. Mulheres de todos os
lugares vão odiá-la à primeira vista.
O fantasma de um sorriso tocou seus lábios antes que ela ficasse sóbria.
— Sua tia não ficará satisfeita quando souber disso.
Ele franziu a testa.
— Por que ela se importaria?
— Não havia um entendimento de que seu irmão deveria se casar com a
Mary? O noivado nunca foi formalizado e eu assumi…
Ele não conseguiu esconder sua pontada de aborrecimento com as
palavras dela, e a voz dela sumiu ao perceber isso. Primeiro, a avó havia
sugerido que ele se casasse com sua prima e agora, Louisa Evans, uma
estranha aos meandros da dinâmica da família Manning, estava insinuando
a mesma coisa. Isso o fez se perguntar quantos outros também supunham
que ele se casaria a prima.
— Eu não sou meu irmão.
— Mas certamente as razões pelas quais tal união foi proposta em
primeiro lugar ainda existem.
— Meu irmão estava disposto a se sacrificar pela paz em nossa família,
mas como você sabe, eu não fui criado como herdeiro. Não sou tão nobre.
Ela inclinou a cabeça e olhou para ele com uma expressão estranha no
rosto.
— Não tenho tanta certeza disso.
Seu comentário o agradou mais do que deveria. Era uma pena que ele
não merecesse.
— Acredito que vamos nos dar muito bem juntos — disse ele. — Há
alguns assuntos que preciso atender antes que possamos discutir os detalhes
de nosso acordo. Posso visitá-la amanhã à tarde?
Ela inclinou a cabeça. Virando-se, ela foi em direção à saída da sala.
— Acredite ou não — disse ele, sua voz fazendo com que os passos
dela vacilassem —, eu não tinha pensado em propor até vê-la aqui.
Ela não se virou para encará-lo.
— Se não fosse por seu primo, eu não precisaria estar aqui. E eu não
teria aceitado.
E então ela foi embora.
QUANDO LOUISA terminou de arrumar a mesa para o jantar, não
conseguiu evitar que o olhar se movesse para a cadeira mais próxima da
porta, onde Overlea se sentara na manhã em que tomara café com eles. Ela
achou impossível acreditar que tinha sido apenas dois dias atrás. Tanta coisa
havia mudado em tão pouco tempo.
Ainda achava quase impossível acreditar que Overlea a havia pedido em
casamento e que ela realmente aceitara. Claro, dada a alternativa
apresentada por Edward Manning, o casamento com o marquês era a
melhor opção. A única opção. E se casar com Overlea garantiria o futuro de
Catherine e John. John não precisaria esperar para ver se conseguiria uma
bolsa de estudos para estudar em Oxford. E com o apoio de Overlea, tinha
certeza de que Catherine seria considerada um bom partido. Ela seria capaz
de escolher um marido de qualquer número de candidatos.
Ela não ignorava a ironia de sua situação. Um Manning havia tirado
quase tudo de sua família, deixando-lhes apenas a dignidade. Então o filho
daquele homem ameaçou tirar até isso deles. Parecia estranhamente
apropriado, então, que outro Manning devolvesse tudo o que haviam
perdido.
De alguma forma ela teria que convencer John disso. Não estava
ansiosa para lhe contar suas novidades. Sabia que Catherine concordaria
com sua decisão assim que superasse a surpresa inicial. Sua irmã não tinha
memória de como a vida deles tinha sido, então a perda de tudo que eles
tiveram uma vez não foi tão devastadora para ela. John, embora apenas um
ano mais velho, parecia se lembrar com muita clareza.
Louisa olhou ao redor da sala de jantar pequena com seus móveis
simples. Logo eles iriam embora dali, do chalé para o qual haviam sido
exilados tantos anos atrás e que agora era o lar deles. No dia seguinte,
quando Overlea chegasse para discutir os detalhes do casamento, ela
descobriria quanto tempo levaria até que as circunstâncias mudassem
novamente. Desta vez, porém, seria para melhor. Tinha que manter essa
crença.
Ela afastou a suspeita de que Overlea estaria escondendo algo dela. Para
sua própria paz de espírito, era melhor não perder tempo se preocupando
com o que poderia ser antes da hora.
Dando-se uma sacudida mental, ela se trouxe de volta para a tarefa em
mãos. Catherine logo estaria lá embaixo e John voltaria de suas aulas. Ela
teve tempo suficiente para limpar tudo antes do jantar. Ela estava
começando a subir as escadas quando John irrompeu pela porta da frente.
— Louisa — chamou ele, parando seu progresso. — Preciso falar com
você e Catherine.
— Isso pode esperar até o jantar?
A expressão no rosto dele a fez parar. Ele parecia culpado e
determinado, e isso a deixou desconfortável.
— Precisamos conversar — disse ele. Seu olhar foi para o topo da
escada. — Bom, Catherine está aqui. Podemos resolver isso de uma vez.
A inquietação a percorreu. De alguma forma, seu irmão deveria ter
descoberto sobre sua visita ao Solar Overlea. Ou isso ou ele ficara sabendo
da proposta de Edward. Nenhuma das alternativas era um bom presságio.
— Deixe-me explicar — começou ela, mas John a cortou.
— Não vai me dissuadir desta vez, Louisa. Minha decisão está decidida
e já falei com o reverendo Harnick.
Ela olhou para Catherine, que agora estava parada em silêncio ao lado
dela, mas ficou claro que ela também não tinha ideia do que seu irmão
queria discutir.
— Eu disse ao reverendo Harnick que não vou me candidatar a uma
bolsa de estudos em Oxford, mas espero, em vez disso, encontrar uma
maneira de nos apoiar. Ele conhece algumas famílias que acredita que
estariam dispostas a me contratar para ensinar latim e grego aos seus filhos.
Se ela ainda tinha dúvidas sobre a decisão de aceitar a proposta de
Overlea, elas se foram naquele momento. Ela esperava adiar contar aos
irmãos sobre sua decisão até que ela falasse com Overlea novamente e eles
acertassem os detalhes, mas o tempo não era mais um luxo.
— Isso não será necessário.
— Será sim — interrompeu John. — Eu sou o homem desta família
agora e é hora de começar a agir como tal.
— Ouça-me, John…
— Já cansei de ouvi-la. Eu deveria ter feito isso há muito tempo, mas
deixei você me convencer de que papai ficaria chateado se eu desistisse dos
meus estudos. — Ele foi até a porta e voltou, seu corpo jovem cheio de uma
energia vibrante. Passou a mão pelo cabelo loiro e disse: — Provavelmente
estava certa sobre isso, mas você se sacrificou por muito tempo, Louisa.
Agora é a minha vez de cuidar da família.
Louisa colocou a mão no braço do irmão.
— Eu não me importo — disse ela. — Não pode desistir dos seus
estudos. Sei o quanto ir para Oxford significa para você.
— Acho que todos aqui sabem que isso nunca vai acontecer. Como
poderia deixar vocês duas aqui, sozinhas, sem nenhuma renda? Que tipo de
homem isso faria de mim?
A desolação nos olhos dele fortaleceu ainda mais sua determinação.
— John está certo — disse Catherine. — Não podemos permitir que
você continue assumindo a responsabilidade exclusiva de cuidar da família.
Certamente posso encontrar uma posição como acompanhante de uma dama
ou governanta.
— Não. — A veemência em seu tom surpreendeu os irmãos. — Vou me
casar e meu futuro marido me garantiu que o futuro de vocês estará seguro.
Suas palavras caíram no cômodo com uma finalidade ensurdecedora.
Foi Catherine quem encontrou sua voz primeiro.
— Quem?
— O Marquês de Overlea.
Se ela não estivesse tão preocupada com a reação do irmão, a expressão
em seu rosto teria sido cômica. Ela sabia, no entanto, que isso não era
motivo de riso.
— O que está dizendo? Como isso pode ter acontecido?
Louisa sabia que, acima de tudo, John nunca deveria saber da proposta
de Edward Manning, nem de sua visita a Overlea naquela tarde. Seus
irmãos nunca acreditariam que suas núpcias iminentes seriam o resultado de
um casamento de amor, e ela não tinha dúvidas de que John não aceitaria o
casamento se pensasse que ela estaria se sacrificando por eles. Ela teria que
dar a eles o suficiente da verdade para satisfazer a descrença.
— Overlea decidiu que está na idade de se casar e garantir o futuro de
seu título. Ele propôs e eu aceitei.
O irmão praguejou e ela se encolheu com a veemência dele.
— A decisão já foi tomada — continuou ela. — Ele estará aqui amanhã
para discutirmos os detalhes.
A carranca de John aprofundou-se.
— Não concordo.
— Não exijo sua aprovação. Tenho idade suficiente para me casar com
quem eu quiser.
— Você se entregaria a um Manning? — Seu desgosto era palpável. —
Eles roubaram tudo da nossa família. Eles são a razão pela qual tivemos que
viver na miséria por anos.
Louisa balançou a cabeça.
— O marquês não tem culpa, nem seu pai ou irmão. Foi o tio dele quem
enganou o papai.
John balançou a cabeça, sua raiva só aumentando quanto mais ela
tentava fazê-lo enxergar seus motivos.
— Não importa. Ele é um Manning e eles são todos iguais.
— Lorde Overlea está nos salvando, John. Depois do nosso casamento,
nunca mais vamos precisar de nada.
— Já fiz planos para cuidar de nós. É minha responsabilidade, não sua.
Louisa queria gritar de frustração, sabendo que seu irmão nunca
entenderia o motivo para esse assunto. Catherine permaneceu em silêncio
durante a conversa, mas não foi difícil ler seus pensamentos pela expressão
em seu rosto. Culpa e esperança. Claramente, ela podia ver que as
vantagens de sua irmã de se casar com o Marquês de Overlea seriam
abundantes. Ignorando o irmão por um momento, ela agarrou as mãos de
Catherine.
— Vai ficar tudo bem. Eu quero fazer isso. Ainda temos que acertar os
detalhes, mas o marquês prometeu que você terá uma temporada. Apenas
imagine! Você vai ser uma estrela. Terá a possibilidade de escolher qualquer
homem que desejar.
— E você, Louisa? Também pode escolher qualquer homem.
Louisa balançou a cabeça.
— Tenho vinte e cinco anos, velha demais para uma temporada. E todos
nós sabemos que sem um dote e o patrocínio de alguém eu nunca
conseguiria um casamento.
Catherine estava prestes a protestar, mas Louisa a impediu:
— Overlea não é desinteressante — disse ela, tentando ignorar o calor
que ela podia sentir rastejando em seu rosto. — Não acho que o casamento
com ele seria uma grande dificuldade.
John se irritou com suas palavras, mas ela o ignorou. Pretendia que suas
garantias deixassem seu irmão e irmã à vontade, mas quando as disse,
percebeu que eram verdade. Ela se lembrou novamente do beijo que ela e o
Overlea tinham compartilhado e seu rubor se aprofundou. E, além do fato
de ser um homem muito atraente, ele havia demonstrado grande bondade
para com ela e sua família.
Ela se aproximou dele pedindo ajuda e sua resposta superou em muito
suas expectativas. Em vez de apenas garantir que a família continuasse a ter
um teto sobre suas cabeças, ele decidiu fornecer a ela os meios para garantir
o futuro de todos. Era verdade que seu relacionamento com Overlea seria
prático, mas a maioria dos casamentos começava dessa maneira.
O casamento iminente também lhe daria o que ela mais queria: a própria
família. Há muito tempo ela havia desistido de esperar que um dia fosse se
casar e ter filhos, mas agora esse sonho estava ao seu alcance.
Ela acreditava que ela e Overlea se dariam bem, apesar da dúvida de
que ele não tinha sido completamente honesto com ela. O que quer que ele
estivesse escondendo, ela lidaria com isso mais tarde. Por enquanto, ela
tinha que sustentar John e Catherine.
Ela voltou-se para o irmão.
— O marquês pode garantir sua entrada em qualquer universidade que
desejar. Já falei com ele e ele vai providenciar para que você possa
frequentar Oxford.
John não disse nada, mas seus braços estavam cruzados e sua expressão
rebelde. No entanto, Louisa não deixou de notar o breve lampejo de desejo
que cruzou o rosto dele com suas palavras. Ah, sim, ela definitivamente
estava fazendo a coisa certa.
Ela voltou-se para a irmã.
— Já coloquei a mesa e o jantar deve estar pronto. Poderia cuidar disso
enquanto falo com John a sós por um momento?
Catherine lançou um olhar duvidoso na direção de John, mas deu de
ombros e foi para a cozinha com um suave “boa sorte” destinado apenas aos
ouvidos de Louisa. Quando ela se afastou, Louisa levou John para a sala de
estar e fechou a porta.
— Você já adiou seus estudos por causa do falecimento de papai e,
como apontou, não quer nos deixar sozinhas. Agora não há nada que o
impeça de continuar com sua educação.
— O preço é muito alto.
— Tenho idade suficiente para saber o que estou fazendo e você sabe
que sempre fui uma boa juíza de caráter. Se eu tivesse alguma reserva,
nunca teria aceitado a proposta de Overlea.
— Não pode estar falando sério. Mal conhece o homem.
Ela tentou uma abordagem diferente:
— Não pensou em Catherine?
— O que ela tem a ver com isso?
— Sabe a culpa que ela carrega. Ela sempre se culpou pela morte de
mamãe.
— Catherine é uma criança. Papai é o único culpado pelas próprias
ações. Ele não tinha que beber até cair e jogar fora nossa casa e a
propriedade.
— Quanto tempo acha que levará até que ela se jogue nos braços de
algum homem que ela acredita que irá nos salvar? Ela tem dezessete anos e
eu vi o jeito que alguns dos homens da vila olham para ela.
A cor sumiu do rosto do irmão e ele cerrou os punhos.
— Vou matar qualquer um que tentar tirar vantagem dela.
— Este não é o melhor curso de ação, o que eu escolhi é o único. Assim
que tivermos a proteção de Overlea, a culpa de Catherine diminuirá.
— E você? Como suas ações são diferentes do que teme que ela possa
fazer?
Ela não podia acreditar o quão teimoso o irmão estava sendo.
— Overlea não está se aproveitando de mim. Não sou tola, John. Ele
precisa de uma esposa e um herdeiro e, por qualquer motivo, ele se decidiu
por mim. A nossa união será respeitável e não será diferente dos arranjos
matrimoniais que muitas vezes são feitos entre as famílias.
— Ainda não aprovo — disse John.
Louisa suspirou. Estava claro que o irmão estava determinado a não se
deixar influenciar.
— Vai dar tudo certo. Overlea nos visitará amanhã para discutirmos os
detalhes do contrato de casamento. Você pode agir como acompanhante
quando ele o fizer e ver por si mesmo que as intenções dele são honrosas.
Louisa fez uma oração silenciosa para que o irmão não percebesse sua
suspeita de que Overlea estava escondendo algo importante deles.
Capítulo 6

A MANHÃ parecia se arrastar para sempre. No café da manhã, Louisa


achou quase impossível comer, mas de alguma forma conseguiu engolir
alguns pedaços de torrada enquanto Catherine tagarelava sobre nada em
particular e seu irmão estava olhando carrancudo para ela sentado do outro
lado da mesa. Ficou aliviada quando ele saiu para estudar, mas ele prometeu
estar em casa naquela tarde para a visita de Overlea. Ela sabia que John
esperava que Overlea mudasse de ideia, mas estava confiante de que não.
Ele estaria lá.
Catherine não ficou surpresa ao saber que não estaria presente durante a
discussão do contrato de casamento, e Louisa ficou aliviada quando ela
anunciou que estava saindo para visitar um de seus vizinhos. Se forçara
quase ao ponto de ruptura a ouvir a conversa habitual da irmã sobre plantas
e seus planos para o jardim na próxima primavera. Embora tentasse se
comportar como de costume, ela tinha certeza de que Catherine poderia
dizer que sua mente estava na próxima visita de Overlea.
Passava de uma da tarde quando ouviu vozes masculinas do lado de
fora. Ela gemeu quando reconheceu que pertenciam ao seu irmão e ao
marquês. Deixou cair a costura que deixara empilhar de volta na cesta e
levantou-se apressada, esperando interceptar a conversa antes que John
dissesse algo que ofendesse o marquês.
A porta da frente se abriu e ela ficou aliviada ao ver Overlea seguindo
seu irmão para dentro de casa. Ficou claro que John não estava feliz por ele
estar lá, mas pelo menos não tentou mandá-lo embora. Seu olhar fixou-se
no de Overlea e por um momento ela quase se esqueceu de respirar. O
conhecimento de que aquele homem seria realmente seu marido a atingiu
com uma força renovada.
— Milorde — disse ela, baixando o olhar e mergulhando em uma breve
reverência.
Ele levantou uma sobrancelha em um comentário silencioso com a
mudança em seu comportamento antes de inclinar a cabeça em
reconhecimento. Ela não tinha visto o companheiro dele até ele se virar para
o homem ao seu lado.
— Este é meu advogado, Sr. Stephens. Achei melhor incluí-lo em nossa
discussão, já que ele vai redigir o acordo de casamento.
— Não vamos assinar nada até que alguém dê uma olhada — disse
John. Não falou que acreditava que o marquês estava tentando tirar
vantagem de Louisa, mas a implicação estava lá.
— John… — começou ela.
— Tudo bem — falou Overlea. — Eu não esperaria nada menos que
isso. É preciso ser minucioso quando se trata de tais coisas.
— Especialmente quando se está lidando com um Manning — disse
John.
Louisa olhou para o irmão, envergonhada por sua grosseria, mas o
marquês não reconheceu o insulto.
Ela cumprimentou o Sr. Stephens antes de voltar-se para Overlea.
— Infelizmente não temos um escritório. O senhor se importaria de
esperar na sala de estar enquanto falo com meu irmão por um momento?
Ela pensou ter detectado uma pitada de diversão nos olhos de Overlea,
mas foi tão rápido que ela ficou se perguntando se tinha imaginado.
Observou os dois homens entrarem na sala de estar antes de se virar para
caminhar pelo corredor. Ela não teve que dizer ao irmão para segui-la.
Ela tentou manter o aborrecimento em sua voz quando ela o encarou.
— Sei que isso é difícil, mas tem que me prometer parar de ser rude
com Overlea. Ele não nos mostrou nada além de bondade.
A expressão do irmão, já amotinada, ficou mais sombria.
— Não se engane, John, vou me casar com ele. Todo o nosso futuro
depende da generosidade dele. Faria bem em pensar nisso da próxima vez
que tentar antagonizá-lo.
John permaneceu em silêncio e tudo o que ela pôde fazer quando se
juntaram aos dois homens na sala de estar foi esperar que ele se abstivesse
de fazer mais comentários negativos.
Overlea estava conversando com seu advogado, mas pararam e se
levantaram quando ela e o irmão entraram na sala. Ela não perdeu o olhar
avaliador que Overlea lançou sobre sua roupa marrom e monótona, e se
pegou desejando ter cedido ao impulso de ter colocado o vestido que ele a
pegara admirando na última vez em que estivera lá. Ainda não o havia
entregado à Srta. Manning e a tentação de vesti-lo para a reunião daquele
dia foi grande, especialmente desde que ele comentara como a cor
combinava com ela.
Hesitou por um momento, perturbada ao ver que o advogado de Overlea
havia escolhido sentar-se na poltrona da sala enquanto Overlea sentava-se
em uma ponta do sofá. Ela se recuperou rapidamente e, esperando que ele
não tivesse notado, sentou-se do outro lado. Ela o observou de cílios
abaixados enquanto ele voltava a se sentar.
Apesar do fato de que havia um espaço respeitável entre eles, ela estava
muito ciente do quão perto ele estava. Ela imaginou que quase podia sentir
o calor irradiando do corpo dele. Esperava que ele não pudesse notar que
ela estava uma pilha de nervos. Por outro lado, ele parecia estar levando a
situação na mais completa tranquilidade. Se ele tinha alguma dúvida sobre
o fato de que iria se casar com uma estranha ou se ele havia sido afetado
pela presença dela, não demonstrou. Se eles fossem lidar um com o outro
em um casamento, ela teria que superar seu nervosismo perto dele. Afinal,
não era como se isso fosse um encontro de amor. Ela não tinha dúvidas de
que Overlea esperava que lidasse com ele de maneira direta.
Enquanto o advogado tirava os papéis de seu caso e os examinava, ela
aproveitou a demora para examiná-lo novamente. Não viu nenhum sinal da
fraqueza que ele exibira quando apareceu em sua porta, e ela se perguntou
novamente o que poderia ter causado sua doença. Seu olhar viajou de volta
para o rosto dele, onde ela viu que ele estava observando seu escrutínio com
uma sobrancelha levantada. Ela desviou o olhar novamente, amaldiçoando
sua pele clara enquanto o calor percorria suas bochechas.
Fixou o olhar no Sr. Stephens, que lhe entregou um pequeno maço de
papéis. A reunião não demorou tanto quanto ela esperava. Overlea deve ter
se encontrado com seu advogado logo depois que ele falara com ela, porque
os detalhes que haviam discutido – uma temporada para Catherine e
provisões para a educação de John – já estavam inclusos. Ele também havia
dado a Catherine um dote muito generoso, que garantiria que ela fizesse um
casamento excelente.
— É muita coisa — disse ela, encontrando o olhar do marquês pela
primeira vez desde que a reunião começara.
Ele deu de ombros.
— É o que se espera para um membro da minha família e assim que nos
casarmos, sua irmã se tornará parte dela. Não vou fugir da minha
responsabilidade para com ela.
Logicamente, ela sabia que ele estava certo, mas estava começando a
sentir como se estivesse se aproveitando dele. É verdade que ela estava
prometendo tentar fornecer a ele a única coisa que ele mais queria, um
herdeiro, mas isso era algo que ele poderia ter obtido de qualquer número
de mulheres. Mulheres que realmente trariam bens próprios para o
casamento.
— Quando o evento feliz acontecerá? — perguntou John.
Ele estava tão quieto que ela quase se esqueceu de sua presença. Ele
estava encostado em uma parede, mas cada linha de seu corpo estava tensa,
como se estivesse pronto para atacar a qualquer momento.
Ela olhou para Overlea, desconhecendo o protocolo de casamento após
a morte de um dos pais.
— Papai morreu há seis meses. Devemos esperar até que um ano se
passe?
Ele balançou sua cabeça.
— Seis meses são suficientes se mantivermos a cerimônia privada.
Louisa pensou que teria mais tempo para se ajustar à ideia de seu
casamento iminente, esperando que nesse meio tempo pudesse conhecer
melhor seu futuro marido. Era um grande eufemismo dizer que ele a
perturbava e a deixava se sentindo desequilibrada.
Ela percebeu que estava mordendo o lábio inferior quando viu que o
olhar de Overlea havia se fixado em sua boca. Parou, preocupada que ele
desaprovasse o gesto nervoso. Os olhos dele encontraram os dela e ela
corou quando viu o calor refletido em suas profundezas. Desta vez foi ele
quem desviou o olhar primeiro.
— Imagino que um casamento levará algum tempo para ser organizado
— disse ela, tentando ordenar seus pensamentos dispersos.
— A vovó está planejando um baile para o final do mês. Ela espera
anunciar nosso noivado nessa ocasião.
O pânico a atravessou com o pensamento, pois ela não tinha certeza se
estava pronta para o mundo inteiro saber sobre o noivado tão cedo. Havia
também o fato de que ela não tinha nada para vestir em tal evento.
— Tão cedo?
— Os convites já foram enviados. — Houve um lampejo de algo nos
olhos dele enquanto falava, mas ela não conseguiu definir. — Não adianta
esperar. Achei que poderíamos ter uma pequena cerimônia pela manhã. Só
para a família, é claro. E em vez de apresentá-la como minha noiva durante
o baile da vovó, será apresentada como minha esposa.
— O quê?
Louisa e seu irmão falaram ao mesmo tempo. Sua voz tinha uma pitada
de pânico, enquanto a de seu irmão estava baixa de raiva. John afastou-se
da parede e olhou para Overlea.
— Isso está fora de questão. Se casarem-se tão cedo, todos nós sabemos
o que as pessoas vão dizer, principalmente se souberem que passou a noite
aqui recentemente.
Louisa nem havia considerado esse aspecto da situação, mas seu irmão
levantara um bom ponto.
A expressão de Overlea era quase de tédio.
— Não conduzo meus negócios com base no medo do que os outros
possam dizer.
— Essa é uma escolha interessante de palavras. — Seu irmão cuspiu as
palavras.
Os pensamentos de Louisa foram para o beijo que ela e Overlea
compartilharam na manhã da estadia dele. Ela se perguntou se ele estava
pensando na mesma coisa, mas não teve coragem de olhar para ele.
Overlea levantou-se, seus movimentos lentos, e aproximou-se de John.
Ela temia que seu irmão tivesse ido longe demais.
— Faz um desserviço à sua irmã se acredita que as ações dela naquela
noite não foram nada circunspectas.
Sua declaração a assustou. Era por isso que John estava tão bravo? Ele
acreditava que ela e Overlea já haviam se comportado de forma
inadequada? Por mais que o beijo que eles compartilharam estivesse fora
dos limites do decoro, surpreendeu-a que seu irmão acreditasse que muito
mais do que isso poderia ter acontecido.
— Conheço sua reputação — disse John.
— Mas parece que não conhece sua irmã.
John estava prestes a responder, mas Louisa não podia mais ficar ali
sentada, ouvindo a discussão dos dois.
— Já chega, John.
Overlea deu um passo para trás quando se levantou e foi até o irmão
dela.
— Três semanas, Louisa. Sabe o que as pessoas vão dizer.
— O que acha que aconteceu naquela noite?
— Tento não pensar sobre isso.
Ela estava magoada por ele pensar tão pouco dela, mas tentou não
demonstrar.
— As pessoas vão falar não importa quanto tempo demore nosso
noivado. Depois de um tempo, os rumores vão cessar e elas vão encontrar
outra coisa para fofocar.
— Eu não gosto disso. Por que a pressa?
Ela lançou a Overlea um olhar suplicante que ele decifrou corretamente.
Ele voltou para o sofá e virou-se para falar com seu advogado. Louisa
encarou o irmão novamente e quando ela falou sua voz era baixa:
— Edward Manning me informou que está pensando em alugar esta
casa para outra pessoa. Se ele fizer isso, para onde iremos? Então seríamos
alvo de fofocas também. Pior, seríamos objeto da piedade de todos. Sei que
iria odiar isso.
Os olhos dele se arregalaram brevemente por causa da surpresa antes de
se estreitarem novamente. Ele apertou as mãos nas laterais de seu corpo.
— Estava planejando esconder essa informação de mim.
Ficou claro que ele não havia gostado do fato de que ela pensou apenas
em protegê-lo da preocupação com o futuro deles.
— Isso não importa mais — disse ela.
John desviou o olhar dela e ficou em silêncio pelo que pareceu uma
eternidade antes de finalmente dizer:
— Preciso sair daqui. Não suporto ouvi-la falar sobre se vender para um
Manning.
Louisa não tentou impedi-lo. Ela só podia esperar que ele logo se
ajustasse ao caminho que suas vidas deveriam tomar agora. Não se
permitiria pensar no que poderia acontecer se ele não o fizesse.
Quando virou-se para encarar seus convidados, o Sr. Stephens já estava
juntando a papelada. Overlea aproximou-se dela.
— Acredito que cobrimos tudo o que precisa ser incluído no acordo de
casamento. O Sr. Stephens redigirá o acordo o mais rápido possível e
receberá uma cópia. É claro que deverá ter alguém para revisar o contrato
para garantir que tudo esteja em ordem.
Louisa assentiu.
— O reverendo Harnick é o tutor de John e Catherine. Aos vinte e cinco
não preciso de um, mas tenho certeza de que ele saberá de um advogado
que possa agir em meu nome.
— Que bom — disse ele. — Talvez isso alivie um pouco a mente de seu
irmão.
Ela tinha que admitir que ele estava certo. Tudo estava acontecendo
muito rápido. Sentiu como se sua vida estivesse girando fora de controle. O
aparecimento de um estranho misterioso precisando de ajuda, seguido de
perto pela proposta indecente de Edward Manning que a forçara a pedir
ajuda a Overlea. E agora parecia que eles iriam se casar, e muito mais cedo
do que ela esperava.
Oprimida, ela afundou-se no sofá. Overlea se encarregou de ver seu
advogado sair antes de voltar para falar com ela em particular. Ele se
abaixou ao lado dela.
— Vai ficar bem, Srta. Evans?
Ela deu uma risadinha, uma que ela temia que logo se transformasse em
histeria se ela não controlasse suas emoções.
— Tudo está acontecendo muito rápido. Temo que esteja fora do meu
controle.
Ele sorriu e estendeu as mãos para segurar as dela.
— Vai se sair bem — falou ele, apertando-as suavemente. — É uma
mulher prática e cheia de recursos. Não teria proposto se não acreditasse
que daria uma bela marquesa.
Louisa franziu o cenho ante suas palavras nada românticas. Prática e
engenhosa. Bem, supôs que poderia ter sido muito pior. Ela olhou para
baixo onde os polegares dele estavam desenhando pequenos círculos nas
costas de suas mãos. As sensações causadas por aquele pequeno movimento
a fizeram perceber intensamente que estava sozinha na casa com ele. De
repente, tudo o que conseguia pensar era em como aquelas mesmas mãos
seguraram seus seios e começaram a acariciar a parte interna de suas coxas.
Sua respiração engatou com o desejo inesperado que a percorreu.
— Eu não sei o que devo fazer agora — disse ela, puxando suavemente
as mãos unidas até que ele as soltou.
— Tenho alguns negócios inacabados em Londres que devo atender.
Espero voltar em duas semanas.
— Como devo me preparar para um casamento?
— Não se preocupe. A vovó já está planejando o baile e depois de sair
daqui vou falar com o reverendo Harnick. — Ele fez uma breve pausa antes
de continuar: — Seu irmão está certo. Vão começar a falar, mas acho que
seremos capazes de enfrentar a tempestade juntos.
Ela sufocou um suspiro quando um pensamento lhe ocorreu.
— Qual é o problema?
— Vou precisar de um vestido… ah, e Catherine e John também
precisam de roupas novas. Vou ter que comprar material.
— Senhorita Evans… Louisa.
Ela parou e olhou para ele. Estava inclinado na direção dela, seu olhar
mantendo o dela cativo. O uso do nome dela acrescentou uma intimidade à
conversa que não existia antes.
— Vou falar com a vovó esta noite. Partirei na primeira hora da manhã,
então infelizmente não poderei apresentá-la pessoalmente, mas tenho
certeza de que ela enviará uma mensagem sobre quando poderá visitá-la. —
Um canto de sua boca se curvou. — Ela havia perdido a esperança de que
eu fosse me casar um dia e está ansiosa para conhecê-la. Irá ajudá-la a fazer
todos os arranjos. A vovó pode mover montanhas sozinha se lhe der
vontade.
Houve uma torção triste nos lábios dela quando ele pronunciou essa
última declaração, o que deixou Louisa pensando que ele muitas vezes
estivera do lado oposto dessa vontade.
— Sua avó ficou terrivelmente chocada com a notícia?
— Ela ficou surpresa quando mencionei seu nome, sim.
— Ela desaprova? Não é nenhum segredo que não levarei nada para o
casamento. Tenho certeza de que ela deseja que faça uma união mais
vantajosa.
— Ela não escondeu o fato de que quer que eu me case, mas sabe que
seria melhor para todas as partes envolvidas se eu escolhesse minha própria
noiva. Não concordaria?
Ele olhou para ela diretamente enquanto falava, e ela reconheceu a
verdade de suas palavras. Ela não conseguia imaginar tentar forçar aquele
homem a se casar contra sua vontade. Na verdade, ela achava que
provavelmente seria impossível forçá-lo a fazer qualquer coisa que ele não
quisesse.
Havia mais uma preocupação que tinha que discutir com Overlea antes
que ele partisse.
— Seu primo espera uma resposta em breve à sua… proposta. — A
palavra deixou um gosto amargo em sua boca. — Podemos nos ver
expulsos antes que volte, ou pior. Ele pode abordar Catherine diretamente.
A mandíbula de Overlea se apertou.
— Vou lidar com meu primo. Ele não vai chegar perto de você ou de
sua família.
— Obrigada, milorde — agradeceu ela, com grande alívio.
Sentindo que a reunião estava no fim, ela levantou-se e caminhou com
Overlea até a porta da frente. Virou-se para ele e descobriu que estava sem
palavras. A próxima vez que ela o visse, estariam a poucos dias de se
casarem. Ela imaginou que Overlea estaria pensando a mesma coisa.
Seu olhar encontrou o dele e ela se sentiu sendo puxada para ele.
— Senhorita Evans?
— Sim, milorde?
— Talvez devêssemos acabar com as formalidades. Meu nome é
Nicholas.
Ela recusou a intimidade.
— Talvez… eu possa chamá-lo de Overlea.
Ele balançou a cabeça.
— Não fui criado para ser o próximo marquês. Overlea era meu pai e
depois meu irmão, não eu. Eu preferiria que não fosse lembrado deles toda
vez que dissesse meu nome.
Expressado nesses termos, seu pedido não parecia incomum.
— Muito bem, milorde… Nicholas.
Ele sorriu, um sorriso malicioso e persuasivo que serviu como prova de
sua reputação de patife.
— Isso não foi tão ruim agora, foi, Louisa?
De pé tão perto dele, atraída por seu olhar conhecedor e sorriso
malicioso, ela corria o risco de perder seu distanciamento. O casamento
deles não era por amor, mas neste momento esse fato não importava para
ela. A cabeça dele abaixou e por um momento ela pensou que ele iria beijá-
la novamente. A boca pairou sobre a dela e ela fechou os olhos, esperando.
Abruptamente, ele deu um passo para trás e a decepção a varreu. Respirou
fundo, trêmula, e tentou ignorar seus nervos em frangalhos. Quando o
olhou, sua máscara de distanciamento frio estava firmemente no lugar
novamente.
— Vejo-a em duas semanas — disse ele.
Ela o observou ir embora. Desta vez não havia medo pela segurança
dele. Qualquer que fosse a fraqueza que o tenha dominado naquela outra
noite, ela claramente não existia mais.

NICHOLAS AMALDIÇOOU a si mesmo enquanto se afastava da casa de sua


futura esposa. Meu Deus, ele quase a beijou. Novamente. E depois fugiu de
sua presença como um jovem apaixonado e inexperiente. A última coisa
que ele poderia fazer, no entanto, era envolver-se romanticamente com
Louisa Evans. O futuro do marquesado dependia disso.
Não sabia o que tinha acontecido com ele. Pretendia apenas preencher
um pouco da formalidade fria que havia entre eles. Afinal, não seria bom
que ela o chamasse de “milorde” no casamento. No entanto, ele olhou para
aqueles olhos cinza dela e se esqueceu de suas intenções. Talvez estivesse
perdendo a cabeça.
Tentou se livrar de seus sentimentos incertos em torno de Louisa Evans
e se concentrar na reunião iminente. Era hora de lidar com Edward e se viu
ansioso pelo encontro.
Enquanto cavalgava em direção à mansão do primo, tentou se lembrar
da última visita. Fazia vários anos, havia sido quando seu tio ainda estava
vivo - ele havia morrido antes dos pais de Nicholas. Embora seu pai e tio
fossem gêmeos, eles nunca foram próximos. O tio passou a vida inteira
sabendo que o irmão se tornaria o Marquês de Overlea porque nascera dez
minutos antes. Em vez da proximidade que os gêmeos muitas vezes
compartilham, não havia nada além de acidez entre eles. Sendo ele próprio
um segundo filho, Nicholas sabia muito bem como todos preferiam o mais
velho. Ele estava feliz por não ter todos os seus movimentos monitorados e
nunca cobiçara as responsabilidades extras que vinham com o cargo. Seu
tio, no entanto, sentiu de forma diferente e sua amargura ao longo da vida
foi passada para Edward.
Seu irmão, James, havia concordado em se casar com sua prima Mary
em um esforço para consertar a fenda e unir os dois ramos da família.
Quando ele morreu, Nicholas tornou-se o novo Marquês de Overlea. Ele
andava evitando o assunto do casamento a todo custo, mas como o noivado
de seu irmão nunca havia sido formalizado, ele suspeitava que sua tia e
primos estavam com a impressão de que ele iria intervir e se casar com a
prima. Com certeza haveria uma cena quando soubessem que ele se casaria
com outra. Normalmente ele evitava aquele lado da família e todo o seu
drama, mas hoje estava ansioso para informar Edward sobre seu casamento
iminente.
Quando chegou, o mordomo o conduziu até a sala de visitas onde
Nicholas esperava que sua tia e primos o deixassem esperando. Ele ficou
surpreso, portanto, quando a tia apareceu em poucos minutos.
— Nicholas! — exclamou ela. — Não esperávamos vê-lo aqui hoje.
Ele retornou uma curta reverência, mais do que um pouco surpreso com
sua recepção efusiva.
Edward tinha herdado sua coloração da mãe. Elizabeth Manning tinha
os mesmos olhos azul-gelo e cabelo castanho claro, mas o dela estava agora
com grandes mechas grisalhas. Ele quase podia ver as engrenagens girando
atrás daqueles olhos enquanto ela pesava as várias possibilidades para sua
visita. No entanto, a tia teria que esperar. Ele queria ver o olhar no rosto de
Edward quando fizesse seu anúncio.
— Meus primos estão em casa? — perguntou ele. — Há uma notícia
que desejo compartilhar com eles.
Ele se divertiu com o brilho nos olhos da tia. Claramente ela tinha
decidido que ele planejava propor à Mary.
— Claro — disse ela com um sorriso brilhante.
Ele esperou enquanto ela tocava para o chá e pedia que seus primos se
juntassem a eles. Sua maneira era excessivamente amigável, algo que
sempre o irritou, mesmo quando criança, quando ele percebeu a rapidez
com que essa fachada podia – e ia – mudar.
Seus primos não o fizeram esperar muito. Edward o cumprimentou com
um curto “Overlea”, o nome soando quase como uma maldição. Mary
estava logo atrás dele. Ela encontrou seus olhos apenas brevemente antes de
fazer uma reverência e se juntar à mãe no sofá.
Nicholas se perguntou como alguém poderia imaginar que ele gostaria
de se casar com Mary. Sim, ela era bonita, tendo herdado o cabelo escuro
do pai e os olhos azul-claros da mãe. Também herdou as melhores
características de ambos os pais, mas era sua personalidade que o fazia
estremecer. Ou melhor, a falta dela.
— Tenho uma ótima notícia que gostaria de compartilhar.
Edward parecia entediado. Mary sentou-se imóvel, os olhos baixos. A
tia, no entanto, não se preocupou em esconder sua expectativa.
— Vou me casar — disse ele. — Acredito que todos conhecem a minha
intenção.
— Oh, Nicholas. — Começou a tia.
— O nome dela é Louisa Evans.
Houve um momento de silêncio atordoado. Seus olhos estavam em
Edward quando ele compartilhou a notícia e viu a forma como a mandíbula
de seu primo se apertou. Achou interessante que a postura rígida de Mary
tenha relaxado quase que imediatamente. Parecia que ela também não
desejava uma união entre eles. A tia passou a desejar-lhes boa sorte, mas
não conseguiu esconder sua raiva. Ela se desculpou e escoltou uma Mary
silenciosa para fora da sala.
Nicholas prestou pouca atenção nelas. Seus olhos estavam fixos
firmemente em Edward, que sabiamente escolhera permanecer em silêncio.
Nicholas percebeu que ele estava se perguntando se Louisa havia contado a
ele sobre sua proposta.
— Acredito que já conhece minha noiva — disse ele.
— Claro que eu a conheço — respondeu Edward, sem se preocupar em
mascarar o aborrecimento. — Ela mora na área desde que nasceu e faz
algumas costuras para minha irmã.
— É verdade. E há o fato de que esta costumava ser a casa da família
dela.
Edward zombou:
— Foi um jogo de cartas justo. Se o pai dela não podia perder, nunca
deveria ter jogado. Eles são afortunados por papai ter permitido que
morassem em sua casa de campo sem pagar aluguel. Ele não precisava ser
tão generoso.
Nicholas levantou uma sobrancelha.
— Pode parar de fingir. Eu sei que ele fez isso apenas por insistência do
meu pai.
Edward deu de ombros, mas não disse nada.
— E quais são suas intenções em relação à família Evans?
Edward hesitou apenas por um momento antes de responder:
— Meu pai fez uma promessa e eu a cumpri.
— E agora que Joseph Evans se foi?
Nicholas pôde ver a ponta de apreensão que cruzara o rosto do primo,
embora Edward fizesse o possível para escondê-la.
— Não havia entendimento de que o resto da família poderia ficar lá
para sempre sem pagar aluguel. Esperei muito generosamente até que o
período de luto deles terminasse, mas as coisas mudam.
Nicholas deu um passo em direção ao primo, permitindo que a rédea
apertada que estava segurando sobre seu temperamento escorregasse. Os
cantos de sua boca se curvaram em um sorriso sombrio com o flash de
medo nos olhos de Edward.
— Eu sei sobre sua proposta a minha futura esposa.
Ele não ficou surpreso quando Edward tentou mentir.
— Não sei o que está querendo dizer. O que ela lhe disse?
Nicholas deu mais um passo à frente e ficou satisfeito quando o primo
deu outro para trás.
— Vou me casar com Louisa Evans muito em breve. Ela está sob minha
proteção agora. Não deve se aproximar dela ou de qualquer membro de sua
família nunca mais. Fui claro?
Edward gaguejou brevemente antes de permitir que sua própria raiva
aparecesse.
— Não me controla. Pode ter o título, mas não tem o direito de me dizer
o que posso e o que não posso fazer. Se a encantadora senhorita Evans ou a
irmã dela decidir…
Uma raiva pura e não adulterada bombeou nas veias de Nicholas. Suas
mãos dispararam e ele agarrou o primo pela garganta. Ele abaixou a cabeça
para que seu rosto ficasse a apenas alguns centímetros do de seu primo.
— Não se engane — disse ele, sua voz baixa com a ameaça —, se olhar
para Louisa ou para a irmã dela novamente, será a última coisa que fará.
Ele atirou Edward para longe com desgosto e viu o homem agarrar a
garganta, tossindo.
— Vai se arrepender por ter me ameaçado — disse Edward entre
ataques de chiado.
Nicholas poupou ao homem apenas um olhar breve e desdenhoso antes
de sair do cômodo e da casa, seus punhos ainda cerrados em uma fúria
impotente. Ele desejava esmagá-los no rosto presunçoso e superior de
Edward; esmurrar o homem que estava a um centímetro de distância. A
única coisa que o deteve foi o conhecimento de que isso decepcionaria sua
avó. Se Edward ousasse olhar para Louisa novamente, porém, nem isso o
impediria.
 
Capítulo 7

HAVIAM SE passado dois dias desde que Louisa tinha ido ao Solar
Overlea para pedir a ajuda do marquês. A última coisa que esperava que
resultasse daquele encontro era uma proposta de casamento. Estava
desesperada, mas de alguma forma conseguiu controlar seus nervos. Agora,
no entanto, a tarefa se mostrava quase impossível. Catherine, por outro
lado, estava cheia de expectativa.
Ela dirigiu um sorriso trêmulo à irmã antes de descer da carruagem que
a avó de Nicholas enviara para buscá-las. O mordomo as conduziu para
dentro imediatamente, ordenando-lhes para que esperassem na sala
enquanto ele notificava a marquesa viúva da chegada delas.
Tiveram que esperar alguns minutos antes que a avó de Nicholas
entrasse na sala. Ela era mais baixa do que Louisa e seu corpo esguio e
cabelo branco como a neve deveriam dar-lhe um ar de fragilidade. Em vez
disso, no entanto, a mulher mais velha possuía um ar inconfundível de
autoridade que fez Louisa se sentir completamente fora de lugar.
Ela e Catherine levantaram-se para cumprimentá-la.
— Peço desculpas por deixá-las esperando — disse Lady Overlea
depois que ela acionou o chá. — Eu estava na estufa cuidando das rosas e
Sommers não sabia onde me encontrar.
O interesse de Catherine foi imediatamente despertado, e estava quase
brilhando de excitação quando disse:
— Eu também adoro jardinagem. Li sobre estufas, mas nunca vi uma.
— Não devemos nos impor — disse Louisa, temendo que a avó de
Nicholas ficasse irritada com a exuberância de Catherine.
— Não é nenhuma imposição — disse a mulher mais velha. — Sou
muito orgulhosa da estufa de Overlea e gostaria de levá-las lá. Infelizmente
não teremos tempo hoje. Talvez em uma próxima visita.
— Vou esperar por isso — disse Catherine. — Vi alguns de seus jardins
no caminho e gostaria de dar uma olhada mais de perto. Observei que tem
algumas plantas que nunca vi antes.
— Descobriu meu amor secreto — disse Lady Overlea, seu sorriso largo
e caloroso. — Acho que vai gostar de explorar as plantas na estufa. Muitas
vieram de climas muito mais quentes e devem ser trazidas para dentro de
casa antes do inverno.
O sorriso de Catherine se alargou e Louisa começou a relaxar. Ela
congelou, no entanto, quando Lady Overlea voltou sua atenção para ela. O
peso da leitura da mulher mais velha era quase uma coisa palpável.
— Fiquei muito triste ao saber da morte de seu pai, senhorita Evans.
Um nó subiu em sua garganta com as palavras da outra mulher,
principalmente porque era óbvio que ela estava sendo sincera.
— Obrigada, milady — agradeceu ela. — E já que em breve seremos
uma família, pode me chamar de Louisa e minha irmã de Catherine.
A avó de Nicholas esperou vários segundos antes de perguntar:
— Como meu neto veio a propor-lhe casamento? Eu nem sabia que ele
a tinha conhecido. — Uma ruga vincou sua testa.
A mente de Louisa ficou em branco e ela se esforçou para organizar
seus pensamentos dispersos. Não havia lhe ocorrido que Nicholas não teria
contado à avó como eles se conheceram. Ele deveria estar tentando poupá-
la de se preocupar com sua saúde. Ela teria que chegar o mais perto possível
da verdade sem revelar os detalhes da proposta de seu outro neto.
— Na verdade, nos conhecemos há pouco tempo. Ele passou por nossa
casa no início desta semana enquanto voltava de Londres e parou para
expressar suas condolências pela morte de nosso pai. — Ela ignorou o olhar
curioso que Catherine dirigiu a ela e continuou: — Eu mesma fiquei
surpresa quando ele me propôs casamento dois dias atrás.
Lady Overlea assentiu como se a explicação fizesse todo o sentido e
sorriu, a diversão iluminando suas feições.
— Esse é o Nicholas, incapaz de passar por uma bela jovem sem parar
para falar com ela.
Louisa corou com o elogio.
O humor da marquesa viúva mudou, tornando-se sombrio.
— Tenho uma confissão a fazer. Receio não ter deixado meu neto com
muita escolha. Era hora de ele se casar e eu forcei a questão.
Sua revelação surpreendeu Louisa. Ela não podia imaginar Nicholas
sendo forçado a fazer qualquer coisa contra sua vontade.
— Serei franca, meu neto provavelmente não lhe contou, mas a linha
Overlea está em perigo. Se Nicholas não produzir um herdeiro, o título irá
para seu primo. Não estranhe, amo todos os meus netos, mas a noção de
Edward como o próximo Marquês de Overlea… — Ela fechou os olhos
brevemente. — Bem, vamos apenas dizer que é importante que Nicholas
tenha um filho para garantir a linhagem.
Louisa quase podia sentir o peso dessa responsabilidade sendo
transferida diretamente para seus ombros.
— Não posso garantir um filho ao marquês, mas cumprirei meu dever
— disse ela, incapaz de conter o rubor.
Lady Overlea deu um tapinha no braço de Louisa.
— Isso é tudo o que podemos lhe pedir. Agora — disse ela, levantando-
se —, temos um casamento para planejar e um guarda-roupa para garantir.
Já mandei um recado para Londres e a modista estará aqui amanhã. Por
favor, venham comigo. Não temos tempo a perder.
A PRIMEIRA AÇÃO de Nicholas ao chegar a sua casa em Londres foi avisar
Richard Harding, o Conde de Kerrick, de que estava na cidade novamente.
Quando ele chegou mais tarde naquela tarde, Nicholas liderou o caminho
para seu escritório.
— É um pouco cedo para beber, não acha? — Kerrick perguntou
quando Nicholas foi até o aparador e serviu dois conhaques.
— Foi uma visita interessante — Nicholas disse enquanto entregava ao
amigo uma das bebidas.
— Certamente foi curta, mesmo para você. Espero que tenha
esclarecido toda essa bobagem sobre se casar. O que sua avó tinha a dizer
sobre isso?
Nicholas esperou até que Kerrick levasse o copo aos lábios para
responder:
— Cumprimente-me — disse Nicholas. — Vou me casar.
Ele sorriu quando o amigo se engasgou com a bebida. Deus sabia que
não havia muito o que achar divertido sobre toda aquela situação.
— Droga — disse Kerrick quando recuperou a compostura. — Isso não
foi engraçado.
— Eu não estava brincando.
Horrorizado, Kerrick olhou para ele.
— Puta merda.
— Sim, bem, espero que não seja tão ruim assim.
Espantado, Kerrick balançou a cabeça.
— Não consigo acreditar que a velha senhora o enganou. Sua tia deve
estar nas nuvens.
Nicholas fez uma careta.
— Não vou me casar com minha prima.
— Bom — disse Kerrick —, tenho que lhe dizer que nunca fui louco
por esse lado de sua família. Edward é uma criatura vil, e Mary é muito
mansa e sem sal para você.
Nicholas não poderia concordar mais plenamente.
— Dizer que ficaram descontentes quando dei a notícia a eles seria um
grande eufemismo. — Um pequeno sorriso de satisfação tocou seus lábios
quando ele se lembrou da cena.
Kerrick riu.
— Transformou o anúncio em um evento.
— Sim, foi muito divertido.
Ele não se incomodou em contar ao amigo sobre a proposta que Edward
fizera a Louisa. Esse assunto havia sido resolvido e seu primo seria um tolo
por não prestar atenção ao seu aviso no futuro.
— Então me diga, quem é essa mulher afortunada? É uma das muitas
que andam atrás de você desde que seu irmão faleceu?
— Não — disse Nicholas. — É uma vizinha em Kent.
— Sério? — As sobrancelhas de Kerrick se ergueram enquanto ele
especulava sobre a importância dessa revelação. — Você tem guardado
segredos de mim?
— Eu gostaria que fosse algo bem interessante — respondeu Nicholas.
— Você não conhece a família.
Bebeu o restante de seu conhaque. Teve algum tempo agora para
considerar essa discussão com Kerrick, mas não conseguiu pensar em uma
maneira de facilitar isso.
O amigo percebeu sua mudança de humor imediatamente.
— Por que está aqui, Nicholas? Não é um bom presságio para o seu
casamento iminente se você sentir a necessidade de escapar da presença
dela logo após o noivado.
Kerrick estava buscando leveza, mas Nicholas não estava com humor
para brincadeiras.
— Voltei à cidade para obter uma licença especial. A cerimônia
acontecerá no final do mês.
Kerrick assobiou.
— Ela está grávida?
Nicholas estremeceu com a pergunta.
— Não, graças a Deus.
Ele caminhou até sua mesa e então virou-se para se apoiar nela.
— Você pode querer se sentar.
Kerrick levantou uma sobrancelha, mas fez exatamente o que lhe foi
sugerido.
— Eu preciso de um favor.
— E você o terá — respondeu Kerrick sem hesitar.
— Você ainda não ouviu o que estou precisando.
— Não importa. Tudo o que você precisar, menos assassinato, e mesmo
assim iria depender de quem você quer que eu mate, você o terá.
Nicholas sorriu. Ele sabia que poderia contar com Kerrick para fazer
praticamente qualquer coisa que pedisse, mas o que iria pedir a ele agora…
Nicholas sabia que no final ele concordaria, mas também sabia que Kerrick
tentaria convencê-lo a desistir de seu plano.
— Tive uma crise a caminho de casa.
— Quão ruim?
— Muito. Eu desmaiei. Quando acordei, não conseguia me lembrar
onde estava ou por que estava indo ver a vovó.
Kerrick permaneceu em silêncio por um momento, absorvendo a
importância da notícia. Nicholas estava feliz por ele não ter lhe oferecido
palavras banais de simpatia. Com esta última crise, ele não podia mais
negar que havia herdado a condição que levara à morte de seu pai e de seu
irmão.
— Você estava na estrada na hora?
Nicholas assentiu.
— Felizmente, vi uma casa de campo quando minha tontura piorou e
consegui procurar abrigo antes de perder a consciência.
— Você poderia ter ficado na estrada por horas.
— Sim, isso teria sido muito inconveniente. E você apreciará a poesia
da situação. Acabei na porta da mulher com quem estou prestes a me casar.
— Estou tendo muita dificuldade em imaginar você caindo prostrado
aos pés de uma mulher, depois se virando e pedindo para que ela se case
com você. — Kerrick balançou a cabeça com a imagem. Seu
comportamento tornou-se sombrio, porém continuou: — Sei que não quer
que eu fale sobre isso, mas certamente pode encontrar alguém que possa
ajudá-lo com esta doença.
Nicholas balançou a cabeça. Este era um assunto em que odiava ter que
pensar.
— Tanto meu pai quanto meu irmão consultaram todos os melhores
médicos e ninguém sabe que doença é essa. Aparentemente, nunca viram
nada parecido. A única coisa que sabem, e mesmo isso foi um palpite
depois que meu irmão adoeceu, é que a condição é hereditária.
— O que precisa que eu faça? — Kerrick perguntou depois de um
tempo em silêncio.
— Antes de continuar, preciso que você prometa que vai me ouvir.
— Está começando a me deixar nervoso. Apenas me diga do que
precisa.
Nicholas assentiu e afastou-se da mesa. Ele deu a volta, puxou a cadeira
e afundou-se nela pesadamente.
— Overlea precisa de um herdeiro.
— Eu presumo que é por isso que você está se casando.
— Em parte. Minha crise recente da doença, no entanto, me fez
perceber uma coisa. Eu não posso arriscar ter um filho.
Kerrick estava claramente confuso com suas palavras.
— Se não pretende ter filhos, então por que está se casando? Você já
tem um herdeiro.
— Não — disse ele, seu tom enfático —, Edward não pode herdar.
Kerrick inclinou-se para frente.
— Não está fazendo sentido. Posso ver por que você não quer que
Manning se torne o próximo marquês, mas a única maneira de evitar isso é
ter seu próprio filho homem.
Nicholas balançou a cabeça.
— Não exatamente. É minha esposa que produzirá o herdeiro. Todos
precisam apenas presumir que a criança é minha.
Kerrick recostou-se, atordoado.
— Faria isso?
— Não tenho outra escolha.
— Sim, Nicholas, você tem. Você está falando bobagem. Realmente
quer que sua esposa passe o filho de outra pessoa como seu? Quando nem
mesmo é certo que você passaria sua doença para seus filhos.
Nicholas riu um som amargo.
— Este não é um risco que estou disposto a correr. E o pai não seria
qualquer um. Seria alguém da minha escolha. Alguém com linhagem
impecável.
Nicholas soube no momento em que Kerrick entendeu o que ele estava
querendo dizer. Sua expressão mudou de confusão para incredulidade,
depois raiva. Ele levantou-se abruptamente, foi até a mesa e inclinou-se
sobre ele, seu rosto a poucos centímetros do de Nicholas.
— Você é insano. Sua futura esposa sabe que planeja prostituí-la para
outro homem? Para mim?
As palavras foram calculadas para fazê-lo se encolher e atingiram seu
alvo. Ele teve o cuidado de não pensar em qual seria a reação de Louisa
Evans. Ao contrário de Kerrick, no entanto, ela não teria escolha depois de
assinar o contrato de casamento, prometendo lhe dar um herdeiro.
— Tenha cuidado com o que fala.
— O inferno que terei — disse Kerrick, empurrando-se para longe da
mesa.
Nicholas estava esperando a descrença. Ele até sabia que Kerrick ficaria
zangado. O que ele não esperava era o lampejo de desgosto que ele viu no
rosto do amigo. Ele não disse nada enquanto Kerrick passeava pelo
cômodo. Por um momento, Nicholas pensou que ia sair correndo pela porta,
mas em vez disso, ele virou-se abruptamente e voltou para a mesa.
— Não vou fazer isso — disse ele, sua boca em uma linha sombria.
Nicholas já esperava sua recusa, mas tinha certeza de que poderia fazer
Kerrick enxergar a razão.
— Então vou encontrar outra pessoa.
A mandíbula de Kerrick se apertou.
— Quem?
Nicholas deu de ombros, fingindo uma indiferença casual que estava
longe de sentir.
— Tenho certeza de que há muitos homens que ficariam felizes em
fazer esse favor, mas eu estava querendo que fosse alguém que eu sabia que
poderia contar para manter a boca fechada, mas… — Ele deu de ombros
novamente enquanto permitia que sua voz sumisse.
— Não faça isso, Nicholas. Pense no escândalo se a notícia vazasse
— Não importa. Você sabe que haverá rumores de qualquer maneira
depois que Louisa e eu nos casarmos tão rapidamente, mas sua posição
como marquesa servirá como um bom amortecedor contra essas conversas.
— Ele apoiou os braços na mesa e inclinou-se para frente. — Meu herdeiro
sobreviverá a esses rumores. Dificilmente seria o primeiro bastardo a
assumir um título. Overlea, no entanto, não sobreviveria a Edward como
marquês. Ele levaria a propriedade ao chão. E você já ouviu os rumores que
estão circulando pela cidade sobre ele. Pelo que soube recentemente, ouso
dizer que a maioria deles é verdadeira.
Kerrick afundou-se na cadeira novamente e enterrou a cabeça nas mãos.
Passou-se quase um minuto inteiro antes que ele olhasse para cima.
— Tem tão pouca consideração por esta mulher com quem vai se casar?
Pelo que me disse, ela pode ter salvado sua vida. Você provavelmente não
teria sobrevivido a uma noite na estrada, não nas condições em que estava.
— Ela não vai ficar feliz. Na verdade, espero que fique furiosa, mas ela
é uma mulher prática. Vai fazer o que precisa ser feito. E quando eu morrer,
ela agradecerá todos os dias por nunca ter que ver seu próprio filho e netos
sucumbirem à mesma doença. A vovó já perdeu um filho e um neto para
essa doença. Em breve, ela terá perdido dois de seus quatro netos. Louisa
Evans não terá que sofrer o mesmo destino. Melhor ela me achar um
bastardo agora do que sofrer o que minha avó sofreu.
Kerrick se acalmou durante o discurso. Sem pensar de forma
consciente, Nicholas levantou-se em algum momento. Ele nunca havia
falado tão apaixonadamente sobre o que estava por vir. Sempre evitara o
assunto de sua eventual morte.
Ele virou-se e foi até a janela, tentando controlar suas emoções.
Nenhum dos dois disse nada pelo que pareceu muito tempo, os dois
homens travados em uma batalha silenciosa de vontades, nenhum dos dois
querendo admitir que poderiam estar errados. Kerrick aproximou-se de
Nicholas e colocou a mão em seu ombro.
— Não posso fazer promessas — disse ele —, mas voltarei com você
para Kent.
Nicholas fechou os olhos com alívio. Tudo ia sair como ele esperava.
 
Capítulo 8

FINALMENTE A manhã do casamento chegou e Louisa ficou surpresa com


a calma que se apoderou dela. Ficou impressionada no início com todos os
detalhes da cerimônia, mas assim como ele havia prometido, a avó de
Nicholas cuidou de tudo.
Lady Overlea já havia providenciado para que a maioria dos pertences
pessoais da família Evans fosse transferida para a mansão. John tinha
estado taciturno e calado durante as últimas semanas, mas não protestou, e
Louisa ficou grata por isso. Naquela noite, seu irmão e irmã dormiriam em
seus novos quartos na Mansão Overlea. Ela sabia que pelo menos Catherine
estava muito animada com a perspectiva.
Ela, por outro lado, passaria a noite ali com seu novo marido. Antes de
sair, Nicholas havia informado a avó que queria privacidade depois do baile
daquela noite, e como alguns dos convidados passariam a noite na mansão
antes de partir no dia seguinte, foi decidido que só conseguiriam essa
privacidade retirando-se para o Chalé Evans. Um grupo de criados estava lá
agora, preparando a casa para sua noite de lua de mel com seu novo marido.
Ela se esquivou dos pensamentos da noite de núpcias iminente.
Esperava ver Overlea em algum momento durante a última semana, mas ele
mandou avisar que havia se atrasado na cidade. Uma parte dela esperava
saber que ele havia mudado de ideia e que não haveria casamento. Porém,
ficou aliviada quando ele lhe enviou uma segunda nota pedindo desculpas
pelo atraso, mas prometendo chegar na noite anterior.
Estava agora na frente de seu espelho enquanto a criada que Lady
Overlea tinha enviado esvoaçava sobre ela, ajustando as dobras de seu
vestido de noiva e acrescentando um colar de pérolas e brincos. Louisa só
conseguia olhar com admiração para seu reflexo, mal capaz de reconhecer a
mulher elegante no espelho. Como o casamento seria um pequeno evento
familiar, escolheram um vestido branco simples. Louisa temia que, com sua
pele e cabelos claros, ela parecesse pálida e sem cor, mas o tecido de seda
tinha um tom rosado sutil que realçava suas bochechas e complementava
seus olhos cinzentos. Algumas mechas de seu cabelo normalmente liso
haviam sido cortadas e agora encaracoladas ao redor de seu rosto, e flores
que ela não conhecia haviam sido tecidas em seu cabelo. Louisa sabia que
Lady Overlea e Catherine tinham gostado de colhê-las das flores que
cresciam na estufa do Solar Overlea.
Uma batida abreviada na porta foi seu único aviso antes de Catherine
irromper no cômodo com um floreio excitado. Louisa só podia olhar
maravilhada enquanto sua irmã girava na frente dela, exibindo seu vestido
rosa pálido e o penteado elaborado para cima. Ela dispensou a criada e
cumprimentou a irmã com um abraço.
Catherine recuou com uma risada e olhou para ela.
— Está linda, Louisa — disse ela com um suspiro.
Louisa sorriu. Ela não tinha dúvidas, mas ver Catherine tão feliz e
animada com o futuro reafirmou que ela estava fazendo a coisa certa. Não
seria capaz de fingir a excitação que a irmã estava sentindo, mas pelo
menos acalmou seus nervos. Se ao menos pudesse falar com Nicholas mais
uma vez antes do casamento. Parecia muito tempo desde que o tinha visto
pela última vez.
— Falei com John e o avisei para não fazer cara feia hoje — disse
Catherine.
— Tenho certeza de que assim que todos souberem que Overlea se
casou com alguém que ele mal conhece e que está tão abaixo dele, as
línguas começarão a falar imediatamente. O que é uma carranca ou duas de
um parente que desaprova depois disso?
Louisa procurou leviandade, mas na verdade tentou não pensar no baile
que seria realizado mais tarde naquela noite. Lady Overlea explicou que
todos pensavam que Nicholas iria anunciar seu noivado naquela noite. A
notícia de que ele já havia se casado seria uma surpresa.
— Sim, bem, eu disse ao John que nunca mais falaria com ele se ele
arruinasse seu casamento.
A veemência da irmã a surpreendeu.
— Não se preocupe — disse Catherine —, eu provavelmente não
duraria mais do que alguns dias sem falar com ele. No entanto, não quero
que ele saiba disso.
Louisa não pôde deixar de rir. Em algum momento nas últimas três
semanas, sua irmã assumira o papel de defensora de seu casamento
iminente. Ela sabia que Catherine estava ansiosa por sua temporada que
seria na próxima primavera e esperava ter um casamento semelhante em um
futuro não muito distante.
— Estou tentando não pensar em John — admitiu Louisa. — Ele tem
estado tão quieto nas últimas semanas que raramente fala comigo.
— Ele a ama, mas acha que falhou conosco. Justamente quando decidiu
que sacrificaria seus estudos pelo bem-estar da família, você arrancou isso
dele com seu próprio sacrifício. Seu orgulho está um pouco ferido.
Louisa só conseguia olhar para a irmã com espanto.
— Quando é que você cresceu e se tornou tão sábia?
Catherine sorriu carinhosamente para ela.
— Tive uma professora muito boa.
Louisa enxugou as lágrimas que brotaram de seus olhos com as palavras
da irmã, o que fez Catherine franzir a testa para ela.
— Não deve haver choro — disse ela, acenando com um dedo na frente
de Louisa em uma advertência simulada. — Hoje é um dia só de felicidade.
Louisa respirou fundo e deu a irmã um sorriso fraco.
— Farei o meu melhor.
Outra batida soou na porta e seu batimento cardíaco acelerou. Era tolice,
mas ela se perguntou se Overlea tinha ido vê-la. Ficou desapontada quando
a criada entrou e anunciou que a carruagem estava pronta para levá-las à
capela.
— Meu irmão está pronto? — perguntou ela.
— Ele já foi e me pediu para avisar que as encontrará lá.
Louisa assentiu e voltou-se para Catherine.
— Está pronta?
A pressa de sua irmã em liderar o caminho foi resposta suficiente.
A viagem até a capela foi abençoadamente silenciosa. Normalmente
Catherine gostava de preencher qualquer silêncio com conversa, mas deve
ter sentido a necessidade de silêncio de Louisa. Quando a carruagem parou,
no entanto, Catherine estendeu a mão por cima do assento e apertou a mão
da irmã.
— Vai ficar tudo bem.
Louisa sorriu, aliviada por poder sentar-se e permitir que alguém a
confortasse. Ficou claro que ela não precisava mais se preocupar com a
irmã.
Um lacaio abriu a porta da carruagem e estendeu a mão para ajudar
primeiro Catherine, depois Louisa, a descer. Era um dia de outono perfeito.
O ar estava fresco, mas não muito frio. As folhas estavam começando a
mudar de cor e não pôde deixar de notar que ela também estava mudando.
Sua antiga vida estava desaparecendo, logo seria substituída por uma nova.
Só esperava não ter que passar por um inverno estéril e metafórico antes
que isso acontecesse.
Olhou para a capela. Era uma igreja rural pequena, um fato pelo qual
estava grata. Dada a sua posição na sociedade, o Marquês de Overlea
poderia ter insistido para que se casassem em uma catedral de Londres,
diante de sabe lá Deus quantos convidados.
— Além de seu irmão, todos já estão lá dentro, milady — disse o lacaio.
Louisa então viu John. Ele estava esperando ao lado da capela e estava
indo encontrá-la. Esta foi a primeira vez que ela o via vestido em trajes
formais, e isso o fez parecer mais velho do que seus dezoito anos. Ele parou
quando estava a poucos metros de distância.
— Se está determinada a fazer isso, então eu gostaria de entregá-la.
Um profundo alívio a percorreu e ela diminuiu a distância entre eles
para abraçá-lo. Uma sensação de paz se instalou dentro dela. Tudo ia ficar
bem agora.
O pequeno grupo seguiu o lacaio até a capela. Louisa e John esperaram
no vestíbulo enquanto Catherine era conduzida ao seu lugar. A expressão de
John era intensa enquanto examinava suas feições, e ela sabia que o irmão
estava procurando por qualquer sinal de dúvida. Ela sorriu para ele e pegou
seu braço.
A música começou e juntos eles entraram na área principal da capela e
começaram a andar pelo corredor. Overlea foi fiel à sua palavra e o
casamento foi pequeno. Como esperado, apenas sua família e sua avó
estavam presentes. Ela não reconheceu o homem que estava ao seu lado,
mas deu-lhe apenas uma olhada rápida antes que sua atenção se voltasse
para o futuro marido. O olhar escuro dele travou com o dela e ela podia ver
a aprovação em seus olhos.
Ela deve ter feito um pequeno som porque seu irmão virou a cabeça
para olhá-la, suas sobrancelhas levantadas em questão. Sabendo que ele não
gostaria de nada mais do que levá-la até a capela, ela balançou a cabeça em
um movimento pequeno e abreviado e voltou sua atenção para o homem
que a esperava no final do corredor. Ela não tinha certeza, mas pensou ter
detectado uma pitada de alívio na expressão dele. Parecia que não era a
única que achava que o outro poderia ter mudado de ideia sobre o
casamento.
A caminhada pelo corredor foi curta e antes que ela percebesse, seu
irmão colocou sua mão na de Overlea. Em voz baixa, John o advertiu para
cuidar dela antes de se retirar para seu assento. Nicholas apertou a mão dela
para tranquilizá-la e ela não conseguiu deter o sorriso que brotou em seus
lábios.
Louisa tentou manter sua atenção no reverendo, mas Overlea atraia seus
olhos e atenção como um ímã. Apesar dos preparativos das últimas
semanas, ainda achava difícil acreditar que estava realmente ali, e que
estavam prestes a se casar. Ele era mais bonito do que qualquer homem
tinha o direito de ser e podia ter qualquer mulher que quisesse. Com seu
cabelo preto e olhos escuros, exalava uma sugestão intrigante de perigo.
Havia um toque provocativo no homem que era quase impossível de
resistir.
Antes que ela percebesse, eles já estavam casados.
Overlea inclinou-se para beijá-la. Não foi um beijo longo, apenas o leve
roçar de seus lábios contra os dela, mas serviu como aviso de que seu futuro
e o de seus irmãos estavam agora sob sua guarda. Atordoada, ela
permaneceu em silêncio enquanto Overlea colocava a mão em seu braço e
conduzia o caminho para fora da capela. O pequeno grupo de testemunhas
se reuniu do lado de fora, onde Lady Overlea a envolveu em um abraço
surpreendentemente firme e a acolheu na família. Overlea poupou um
momento para apresentá-la ao seu bom amigo, o Conde de Kerrick, antes de
acompanhá-la até a carruagem. Não pôde deixar de se perguntar sobre a
pressa dele.
Ele a ajudou a entrar antes de a seguir e tomar o assento à sua frente. No
pequeno espaço, ela estava muito consciente de como o marido parecia
preencher toda a carruagem. De como seu cheiro e suas longas pernas
pareciam ocupar todo o espaço disponível. Ela recostou-se no assento,
fechou os olhos e se concentrou em sua respiração em uma tentativa de
conter os nervos que ameaçavam vir à tona agora que estavam sozinhos.
Era difícil respirar fundo por causa do aperto de seu espartilho, mas a roupa
de baixo fazia maravilhas para acentuar seus seios.
Abriu os olhos novamente quando a carruagem começou a se mover.
Nicholas estava olhando pela janela da carruagem, mas ao sentir seu olhar,
voltou sua atenção para ela.
— Como é ser a nova Marquesa de Overlea?
Ela franziu a testa.
— Não me casei contigo pelo seu título.
— É verdade — disse ele, sua voz sem emoção —, mas tenho certeza
de que lhe será de grande consolo.
Algo estava diferente nele, mas ela não sabia dizer o quê.
— Eu não tinha certeza se iria voltar — disse ela depois de uma breve
pausa.
— Eu tinha pouca escolha no assunto.
— É o Marquês de Overlea. Poderia ter feito o que quisesse.
Os lábios dele se torceram tristemente com as palavras dela.
— Há algumas coisas que estão além do meu alcance.
— Tais como?
Estava curiosa sobre o que havia causado seu humor estranho. Ele ficou
em silêncio por um bom tempo e ela não achou que fosse responder, então
ficou surpresa quando ele finalmente disse:
— Minha doença.
Ele iria contar-lhe o que tinha acontecido naquela noite? E seu fraseado
fez soar como se não fosse algo que estava no passado.
— Está se sentindo mal, milorde?
— Nicholas, lembra?
Ela passou a língua nos lábios.
— Sim, claro, mas não respondeu à minha pergunta.
Ele deu de ombros. Ela esperava que estivesse prestes a confiar nela,
mas então a carruagem começou a desacelerar.
— Estamos quase chegando. — Houve uma mudança sutil em seu
comportamento e ela soube que não voltariam ao assunto de sua saúde. —
Minha avó disse-lhe o que esperar hoje?
Ela assentiu. Como haveria um baile mais tarde naquela noite,
dispensariam o tradicional café da manhã nupcial. Em vez disso, ela iria
para seu novo quarto, onde a mesma criada que a ajudou a se vestir antes
estaria esperando para ajudá-la a trocar o vestido de noiva. Mais tarde
naquela noite, depois que os convidados chegassem para o baile, ela e seu
novo marido entrariam juntos e ela seria formalmente apresentada como a
nova Marquesa de Overlea. Os convites foram enviados às famílias que
moravam a poucas horas do Solar Overlea, que incluía aquelas que tinham
casas na cidade de Londres. Parecia que ao ouvir o boato de que Overlea
anunciaria seu noivado naquele baile, várias famílias retornaram à cidade
apenas para que pudessem participar do evento.
— Este será seu primeiro baile?
Ela assentiu, tentando não pensar em todos os olhares que logo estariam
sobre ela. Quando falhou, cobriu seu rosto com as mãos. — Todos
sussurrarão a meu respeito.
Ouviu-o se mover e então ele estava ao seu lado quando puxou suas
mãos e inclinou seu rosto em sua direção.
— Eles podem pensar o que quiserem, mas ninguém ousará insultá-la e
se arriscar a desagradar a vovó e a mim.
Ela suspirou. — Depois desta noite, todos saberão que nossa união não
é um casamento de amor. Suponho que não importa. Esses arranjos são
feitos o tempo todo.
Ele inclinou a cabeça e a olhou, uma leve carranca marcando sua testa.
— Isso lhe era importante? Casar-se por amor? Achei que fosse mais
prática do que desejar tal bobagem.
Ela corou sob seu escrutínio intenso. — A maioria das mulheres espera
isso. Podem não dizer, mas o desejo está lá.
Sua voz baixou quando ele fez sua próxima pergunta: — Se arrepende
de ter concordado em se casar comigo?
Ele parecia realmente querer saber. Ela pensou nas últimas três
semanas. Nas dúvidas que teve e na luta interna que se seguiu quando disse
a si mesma que estava sendo prática e fazendo a coisa certa para sua
família. Ela se lembrou de sua inquietação à medida que os dias passavam e
Nicholas não retornava de Londres. A preocupação dela sobre se ele havia
mudado de ideia e seu alívio intenso quando recebeu sua carta dizendo que
voltaria um dia antes do casamento. Na época, disse a si mesma que só
estava preocupada por causa da incerteza em torno do que aconteceria com
sua família se ele cancelasse o casamento, mas então pensou no choque de
consciência que experimentara quando o viu novamente naquele dia,
esperando por ela no final do corredor. E havia também a atração inegável
entre eles agora.
— Não, não me arrependo.
Ele pareceu aliviado com a afirmação dela. Ela prendeu a respiração e
soltou quando o marquês abaixou a cabeça.
— Estou feliz — disse ele antes de seus lábios encontrarem os dela.
Foi o mero roçar de seus lábios, não diferente do beijo que deram no
final da cerimônia de casamento, mas um choque de consciência percorreu
o corpo dela com o contato. Ele se afastou para olhá-la e o próprio ar
pareceu engrossar ao redor deles.
A carruagem parou, interrompendo o momento de intimidade e
Nicholas desviou o olhar.
Permaneceram em silêncio quando um lacaio a ajudou a descer da
carruagem e Nicholas a escoltou até o pequeno lance de escadas que levava
à Mansão Overlea. Ela hesitou quando Sommers abriu a porta e viu que os
funcionários estavam esperando, alinhados em duas longas filas ao longo do
corredor. Já havia conhecido muitos deles nas últimas semanas, mas não
pôde deixar de se sentir constrangida quando foi formalmente apresentada
como Lady Overlea. Ela havia passado as últimas três semanas cercada
pelos preparativos para o casamento daquele dia e o baile que se seguiria
naquela noite. Durante esse tempo, tentou não pensar em seu futuro papel
como Marquesa de Overlea, mas não podia mais ignorar o quanto sua vida
mudaria. A realidade era esmagadora.
Conseguiu dizer algumas palavras a equipe, embora não pudesse dizer
depois quais foram, antes que Nicholas os dispensasse. Esperava que ele
mandasse sua nova criada acompanhá-la até seus aposentos e ficou surpresa
quando ele mesmo a acompanhou. Ocorreu-lhe então que ele poderia ter a
intenção de consumar o casamento imediatamente, e o pensamento a fez
tropeçar nas escadas. Ele estendeu a mão para firmá-la, sua mão quente na
parte inferior de suas costas, causando-lhe um arrepio de consciência. Se
Nicholas percebeu, não disse nada, mas retirou a mão quando chegaram ao
patamar.
Ela já conhecia o caminho para seus aposentos, que eram contíguos aos
de Nicholas, precedidos pelos corredores. A cada passo, ela ficava mais
consciente da presença muito masculina dele ao seu lado. O silêncio que se
estendia entre eles ameaçava sufocá-la e só ficava mais opressivo a cada
passo. Desesperada por algo para romper aquela quietude, seus
pensamentos se fixaram no único rosto infeliz que ela não pôde deixar de
notar após sua chegada à mansão.
— Seu valete não gosta de mim — disse ela.
Nicholas parou e ela virou-se para olhá-lo. Ele estava franzindo a testa,
mas seu rosto se clareou antes de dizer:
— Harrison é assim com todo mundo.
Ele começou a andar novamente e ela teve que se apressar para alcançá-
lo.
— Então por que o contratou? Certamente iria preferir alguém que não
fosse tão… — Ela procurou a palavra certa para descrevê-lo e finalmente se
decidiu, dizendo: — Azedo.
Nicholas deu de ombros.
— Eu não o contratei. Ele era o valete do meu pai e James o usou
também quando assumiu o título. Não tive coragem de deixá-lo ir quando
me tornei marquês. Ele foi leal a eles e tenho dúvidas de que seria capaz de
encontrar outra posição. Apenas ignore-o, a negatividade dele não é
pessoal.
Louisa não tinha tanta certeza sobre isso, mas ela tentou ignorar seu
desconforto. Finalmente chegaram ao seu quarto e houve outro momento de
silêncio constrangedor quando Nicholas virou-se para olhar para ela.
Ele falou primeiro:
— Vou me despedir de você agora. Tenho certeza de que a vovó cuidou
para que seu quarto esteja satisfatório.
Ela olhou para ele.
— Você não vai entrar?
Sua expressão estava fechada e ela não podia dizer no que ele estava
pensando. Isso a deixou se sentindo em clara desvantagem.
Ele levantou uma mão, roçando as costas de seus dedos contra a
bochecha dela.
— Parece cansada.
Ela engoliu em seco antes de responder:
— Dormi muito pouco ontem à noite.
Ele deixou cair a mão e deu um passo para trás, e ela sentiu
profundamente a ausência de seu toque.
— Então deveria descansar antes da celebração desta noite.
Ela só pôde assentir em resposta antes de entrar em seu quarto.

NICHOLAS FOI para o escritório e afundou-se pesadamente na cadeira de


carvalho atrás de sua mesa. Inclinou-se para trás e olhou para o teto,
lembrando-se novamente da maneira como Louisa o olhou na carruagem.
Por um momento, se permitiu acreditar que ela estava com ele porque
queria estar lá e não porque a família dela precisava de sua proteção. Ela
ficara surpresa quando percebeu que ele não iria se juntar a ela em seu
quarto, mas não tão surpresa quanto ele estava pela força de seu desejo de
fazer amor com ela. Era verdade que havia maneiras de evitar a gravidez,
mas não podia se arriscar a ser pai e transmitir sua doença para um filho.
Não, seria melhor para todos os envolvidos se ficasse longe de sua
esposa. O deles nunca poderia ser um casamento de verdade.
Sentiu-se atraído por Louisa desde o início, mas naquele dia, ao vê-la
caminhar pelo corredor, não mais envolta em cores monótonas, ficou
novamente impressionado com sua beleza. Não se arrependia de tê-la
escolhido como sua marquesa, mas agora percebia o quão perigosa seria
para sua paz de espírito. Precisava que Kerrick concordasse com seu plano
e, com alguma sorte, ela conceberia um filho em sua primeira gravidez.
Odiava o pensamento de sua esposa e seu bom amigo juntos. Eles só
foram apresentados brevemente após a cerimônia de casamento e ele já não
queria nada mais do que mandar Kerrick embora. Nunca pensou em se
casar, mas sempre presumiu que um dia isso aconteceria. Nunca teria
imaginado, porém, que teria que se afastar e entregar sua esposa a outro
homem.
Levantou-se e foi até o pequeno armário onde sabia que seu irmão
guardava uma garrafa de conhaque e despejou uma pequena quantidade em
um copo. Ainda era cedo, mas ele precisava de forças extras para aguentar
as horas até as comemorações daquela noite.
Ele virou-se quando a porta se abriu. Sua avó olhou para o copo com
óbvia desaprovação. Colocou a bebida na mesa antes de voltar-se para ela.
— Você escolheu bem — falou ela. — Quase valeu a bronca que recebi
da minha nora.
A boca de Nicholas se torceu em desgosto.
— Não posso acreditar que todos pensaram que eu me casaria com a
Mary. Nunca desenvolvi o gosto pelo auto sacrifício.
Uma expressão estranha cruzou o rosto da avó. Por um momento de
pânico, ele pensou que ela suspeitava do que ele planejava fazer, mas
rapidamente descartou o pensamento. A avó nunca aprovaria e ela não
perderia tempo em expressar isso a ele.
— Ela vai ser uma boa esposa e marquesa — disse ela. — E talvez, de
alguma forma, isso compense o que Henry fez com aquela família.
Ele esperava que a avó nunca soubesse sobre a proposta mais recente de
Edward para Louisa. Seus punhos se fecharam só de pensar nisso, mas ele
se forçou a relaxar. Uma mudança de assunto estava definitivamente em
ordem.
— A casa de Evans estará pronta para esta noite?
— É claro. Não consigo imaginar por que você gostaria de passar a
noite lá. Seus quartos aqui seriam infinitamente mais confortáveis.
Sim, mas junto com esse conforto vinha uma equipe que notaria que o
marquês e sua nova marquesa não haviam passado a noite de núpcias
juntos. Ele também sabia que não estaria com disposição para continuar
com a pretensão da felicidade de recém-casados com os poucos convidados
que passariam a noite e partiriam para casa na manhã seguinte.
Ele deu de ombros, esperando que o movimento parecesse casual.
— Achei que um pouco de privacidade seria bom. Tenho certeza de que
a senhora entende.
A avó sorriu e ele sentiu uma pontada de culpa por enganá-la.

NICHOLAS ESPERAVA por ela na base da escada, mas desta vez Louisa
estava preparada para a força de sua reação a ele. Estava vestido de preto, a
cor sombria contra sua camisa e gravata branca. Seu cabelo castanho
escuro, um pouco comprido, parecia se misturar com o preto de seu fraque.
Ela não tinha notado o leve tom bronzeado na pele dele antes, mas contra a
gravata branca como a neve, era a prova de que ele gostava de ficar ao ar
livre. Já sabia que ele gostava de cavalgar. Era realmente um dos homens
mais bonitos que já conhecera.
Quando chegou ao pé da escada, Nicholas estendeu o braço e ela o
pegou. Já esperava o frisson de consciência que passou por ela.
Ele lhe deu um sorriso, mas ela notou que o sorriso dele não alcançou
seus olhos.
— Serei a inveja de todos os homens daqui.
Ela sabia que seu vestido complementava sua cor clara. O vestido de
seda azul, com seu corpete baixo e saia que fluía sobre seu corpo esguio,
brilhava a cada passo que ela dava. Ela nunca tinha visto um tecido como
aquele e era de longe o vestido mais bonito que já tivera.
— E eu, sem dúvida, serei objeto de muito ressentimento das mulheres
solteiras presentes que esperavam atrair a sua atenção.
Nicholas riu de suas palavras, e ela ficou feliz em ver que um pouco de
calor havia voltado para seu rosto.
— Só ficarei mais nervosa se demorarmos mais — continuou ela.
— Vai se sair bem. Pode se confortar com o fato de que a vovó lhe deu
seu selo de aprovação.
— Ela tem sido muito gentil comigo — disse, embora a verdade fosse
que “gentil” era um grande eufemismo. A marquesa viúva de Overlea a
recebera de braços abertos na família. Se não fosse por sua ajuda e tutela
durante as últimas três semanas, Louisa temia estar escondida em seus
aposentos agora.
Nicholas liderou o caminho até o salão de baile. Quando entraram, um
silêncio caiu sobre o local e todos os olhares se voltaram para eles. A
especulação pairava no ar enquanto todos tentavam dar uma boa olhada
nela. Depois do que pareceu uma eternidade, Sommers os anunciou. As
palavras “O Marquês e a Marquesa de Overlea” caíram no salão com a
força de um tiro de canhão. Houve um momento de silêncio suspenso,
depois uma cacofonia de sussurros, suspiros e pessoas avançando,
esperando por uma apresentação. Era demais, mas Nicholas teve apenas que
levantar a mão e o silêncio pairou mais uma vez.
Ele a puxou para mais perto dele.
— Estamos muito felizes que todos vocês puderam vir celebrar o dia
mais feliz de nossas vidas. Todos terão a oportunidade de conhecer minha
adorável esposa, mas primeiro devo implorar sua indulgência, pois prometi
a ela uma dança antes que a roubem de mim.
Juntos, eles foram para o centro do salão e Nicholas virou-se para ela.
Com borboletas se agitando dentro dela, ela entrou nos braços dele e tentou
desviar a atenção de que todas as pessoas no salão estavam olhando para
ela. Era a primeira vez que dançava valsa em público desde que aprendera a
dança com o mestre de dança que Lady Overlea havia contratado, e ela fez
uma oração silenciosa para que não tropeçasse. Logo ficou claro para ela,
no entanto, que Nicholas não era um novato na dança. Ele teve o cuidado de
manter uma distância adequada entre os dois enquanto deslizava com ela
pelo salão de baile, mas Louisa não pôde deixar de estar ciente do quão
perto seus corpos estavam. Ela se lembrou, novamente, daquele primeiro
beijo que lhe dera, quando a puxou para a cama e como ela se afastou
exatamente quando o beijo ameaçou se tornar algo mais. Esta noite, no
entanto, ela não iria impedi-lo.
Curiosa se ele estava pensando a mesma coisa, olhou nos olhos dele e
ficou desapontada ao ver que o calor havia desaparecido novamente. Ele
havia perguntado se ela se arrependera de ter concordado em se casarem,
mas agora não podia deixar de se perguntar se era ele quem estava
pensando duas vezes.
A música terminou e Nicholas curvou-se sobre a mão dela, dando um
beijo suave em suas costas. Consciente de que todos os observavam, ela
sorriu e tentou convencer a si mesma e ao público de que não havia nada de
errado.

O CONDE de Kerrick parou ao lado, conversando com alguns amigos em


comum dele e de Nicholas. Todos ficaram chocados ao saber do casamento
apressado do marquês e muitos tentaram arrancar dele os detalhes de seu
namoro. Todos assumiram que a futura esposa estava comprometida e que
Overlea não tinha escolha a não ser se casar com ela. Kerrick sabia, mas
nunca revelaria a verdadeira razão por trás do casamento.
Fazia quase três semanas desde que Nicholas lhe apresentara sua
proposta chocante, mas ainda não conseguia acreditar que seu amigo estava
falando sério. Em circunstâncias normais, Nicholas não era o tipo de
homem que ficaria parado e permitiria que outro homem se deitasse com
sua esposa.
Ele estava apenas parcialmente ouvindo a conversa ao seu redor
enquanto observava o casal recém-casado dançar. Alguns outros se
juntaram a eles na valsa, mas a maioria estava ocupada com suas
especulações. Ele olhou para um grupo de mulheres mais velhas, algumas
das quais esperavam atrair Nicholas como um prêmio para suas próprias
filhas. O desdém delas pela nova marquesa era evidente. Quando a avó de
Nicholas juntou-se a elas, no entanto, suas expressões mudaram. Poderiam
desaprovar a esposa de Nicholas, mas nunca demonstrariam tal
desaprovação ao marquês ou a sua família.
As últimas notas da música tocaram e a maioria dos homens em seu
pequeno grupo se separaram para reivindicar suas parceiras para a próxima
dança, uma quadrilha. Kerrick optou por manter sua atenção no casal
recém-casado. Sabia que ninguém questionaria seu interesse. Como o
amigo mais próximo do noivo, eles assumiriam que ele estaria horrorizado
com a ideia de seu amigo ter sido enganado e forçado a se casar.
Kerrick estava circulando pela pista de dança, tentando ver para onde os
convidados de honra tinham ido, quando a próxima dança começou. Ao
passar pela mesa de refrescos, no entanto, sua atenção foi capturada por
uma mulher que parecia estar discutindo com um jovem. Suas vozes eram
baixas e eles estavam parcialmente escondidos atrás de uma coluna, então a
conversa não havia sido notada por aqueles ao redor deles. Kerrick ficou
horrorizado com o quão arrogante o homem estava tratando a mulher.
Ele abandonou sua busca para encontrar Nicholas e contornou a coluna.
A dupla parou de discutir e virou-se para olhar para ele. A mulher tinha
uma notável semelhança com a noiva. Ele só os conhecera brevemente mais
cedo, mas o casal discutindo parecia ser os irmãos da noiva.
A mulher, Catherine Evans se ele se lembrava corretamente, estava
claramente envergonhada por ter sido pega em um comportamento tão
impróprio, mas seu irmão não demonstrou nenhum sinal de remorso.
Kerrick virou-se para a garota, que era tão bonita quanto sua irmã mais
velha. O cabelo louro-claro encaracolado em volta de seu rosto, sua pele
cremosa como seda e seus olhos… Deus do céu, ele nunca tinha visto olhos
com um tom de azul tão vibrante. Como não percebera isso naquela manhã?
— Posso ajudá-la? — perguntou ele.
O jovem respondeu por ela:
— Obrigado por sua preocupação, mas minha irmã e eu estávamos
apenas tendo um pequeno desentendimento.
Kerrick tinha duas irmãs e ainda se lembrava de como alguns de seus
desentendimentos haviam alcançado proporções quase épicas.
— Se eu notei a conversa de vocês, outros também podem ter notado.
Vocês provavelmente deveriam ir para algum lugar mais privado se
planejam continuá-la.
Ele curvou-se brevemente antes de recuar. Não pôde deixar de pensar
que era uma pena que a senhorita Evans fosse tão jovem. Ainda que não
totalmente, se ele não estivesse enganado.
 
Capítulo 9

O RESTO da noite voou como um sonho para Louisa. Além dos membros
da família, ela não conhecia nenhum dos convidados, a maioria dos quais
eram membros da alta sociedade que viajaram para o Solar Overlea para o
que pensavam ser um baile para anunciar o noivado de Nicholas. Lady
Overlea tomou Louisa sob sua asa e a apresentou a todos. À medida que as
horas passavam, sua cabeça começou a doer pelo esforço de tentar lembrar
os nomes de todas as pessoas que estava conhecendo.
Louisa teve apenas vislumbres de seu marido depois da dança. Ela
dançou com muitos dos homens no baile, mas Nicholas não dançou com
nenhuma das mulheres. Não foi a única a notar esse fato.
Não lhe escaparam os olhares que algumas das mulheres lançavam em
sua direção. As piores eram aquelas que não se incomodavam em serem
discretas ao examinarem sua barriga. Ela sabia que haveria especulações
sobre a razão por trás da pressa de seu casamento, mas ninguém lhe disse
nada diretamente. Ela teria que fingir não notar. Quando nenhum bebê
aparecesse antes do nono mês de casamento, qualquer um que achasse que
ela já estaria grávida saberia que estava errado.
Quando a ceia estava para ser servida, a energia de Louisa estava
começando a diminuir. Não conseguiu dormir na noite anterior e a soneca
que tirou naquela tarde não tinha sido longa. Estava exausta e Nicholas
percebeu. Depois do jantar, quando todos voltaram ao salão de baile, ele a
puxou de lado.
— Está cansada — disse ele.
— Receio não estar acostumada a ficar até tão tarde e a soneca que tirei
mais cedo não foi muito longa.
Como se para provar suas palavras, ela bocejou. O canto de sua boca se
ergueu enquanto ela corava de vergonha.
— Gostaria de fazer com que mais algumas línguas começassem a
falar?
Ela não tinha certeza se deveria estar cortejando mais fofocas, mas o
brilho de travessura nos olhos dele a deixou curiosa.
— No que está pensando?
— Acho que deveríamos sair pela entrada dos empregados e ir até seu
chalé.
O estômago de Louisa revirou com a sugestão e um novo conjunto de
nervos a assaltou, mas não havia sentido em adiar a noite de núpcias. Ela
assentiu com a cabeça.
Ele abriu um sorriso e Louisa pôde ter um vislumbre de como ele
deveria ter sido quando criança. Perguntou-se se o filho deles teria aquele
mesmo brilho nos olhos quando estivesse aprontando alguma travessura.
Ele agarrou a mão dela com a sua muito maior e guiou o caminho para
fora do salão de baile, descendo até a cozinha. Passaram por alguns servos
no caminho, mas ele levou um dedo aos lábios para silenciar suas
perguntas. Louisa não perdeu os olhares divertidos que os criados lhes
dirigiram enquanto ela e Nicholas escapavam pela porta da cozinha.
Apanhada no momento, ela riu enquanto se dirigiam aos estábulos.
Nicholas tinha planejado tudo e um coche já havia sido preparado para a
partida deles. Não demorou muito para que os cavalos fossem tirados de
suas baias e amarrados. Seus olhos ainda estavam brilhando quando ele a
ajudou a entrar no veículo e subiu atrás dela.
Havia um cobertor no assento entre eles, que ele desdobrou e enrolou ao
redor dela. A intimidade do ato deixou todos os sentidos dela em alerta
máximo. Ele deve ter sentido isso também, pois suas mãos pararam e seus
olhos encontraram os dela por um momento insuportavelmente longo antes
de desviar o olhar e pegar as rédeas.
Ela nunca tinha viajado tão tarde antes. A noite estava fria, porém clara,
e o céu cheio com mil estrelas. Estava sentindo uma imensa alegria
enquanto afastavam-se da Mansão Overlea como dois ladrões.
Deve ter cochilado durante a viagem de meia hora, pois a próxima coisa
que ela percebeu foi que o coche estava desacelerando até parar do lado de
fora do chalé e ela se viu pressionada contra a lateral do corpo de Nicholas.
Ela se endireitou com um solavanco, o constrangimento inundando-a.
Nicholas saltou do veículo e estendeu a mão para ajudá-la a descer. As
mãos dele na cintura dela estavam quentes e permaneceram lá por vários
segundos depois que os pés dela já estavam no chão. Seus olhares se
encontraram. Seu humor brincalhão havia ido embora. Ele a olhou em
silêncio, sua expressão séria. Ela se viu esperando que ele fosse beijá-la.
Em vez disso, ele deixou cair as mãos depois de vários segundos e deu um
passo para trás. Ela sentiu a perda de seu toque agudamente.
— Os cavalariços estarão ocupados em Overlea Manor, então eu
cuidarei dos cavalos
Louisa só pôde assentir antes de entrar no chalé. Não deveria ter ficado
surpresa quando a porta foi aberta por um lacaio. Ela pensou que estariam a
sós, mas as vozes abafadas vindas da cozinha lhe disseram que pelo menos
alguns dos servos foram enviados para cuidar do conforto deles.
Fora isso, tudo estava como haviam deixado naquela manhã. Ela fez
uma nota mental para falar com o reverendo Harnick sobre doar os móveis
da casa para outras famílias necessitadas.
Subiu as escadas e foi para o quarto de seu pai, que ela sabia que tinha
sido preparado para a noite de núpcias. Quando entrou no aposento, ela
ficou surpresa com a transformação. A colcha era de um azul rico, com fios
de ouro. Estava dobrada e ela podia ver que os lençóis outrora puídos
também haviam sido substituídos por outros feitos de um material fino e
acetinado de um branco puro. Ela passou as mãos sobre o tecido frio, depois
sobre os novos travesseiros macios e suspirou. Ela nunca tinha imaginado
dormir em tal material antes, mas é claro que dormir não era tudo o que
faria com ele.
Virou-se para observar o resto do cômodo. A mobília era a mesma, mas
todos os tecidos e acessórios haviam sido trocados. As janelas estavam
cobertas com cortinas de um brocado azul que combinava com a colcha.
Havia até um tapete novo no chão. Ela deu uma olhada dentro do guarda-
roupa, que agora abrigava uma impressionante coleção de roupas para ela e
Nicholas. Ela achou difícil acreditar que tanto trabalho havia sido feito para
a estadia de uma noite, e se perguntou se Nicholas planejava ficar mais
tempo.
Fechou o guarda-roupa com firmeza. Sabia que deveria chamar sua
criada, que devia estar esperando em algum lugar lá embaixo para ajudá-la
a tirar o vestido e colocar a roupa de dormir, mas não teve tanta bravura.
Sentindo-se um pouco constrangida, sabendo que estava fazendo tudo
errado, desceu para a sala de estar para esperar por Nicholas.
Quando ele entrou pouco tempo depois, ficou surpreso ao vê-la.
— Estava cansada. Achei que já estaria na cama.
Louisa não conseguia encontrar o olhar dele.
— Meu pequeno cochilo na viagem parece ter renovado minhas
energias.
E era verdade. Ela não estava se sentindo nem um pouco cansada no
momento, embora suspeitasse que isso não iria durar muito.
— Talvez queira algo para beber antes de se retirar?
Ela não tinha notado que o aparador estava agora abastecido com
garrafas de xerez, conhaque e ela não sabia o que mais. Eles não podiam se
dar ao luxo de ter bebidas em casa.
— Xerez, por favor — disse ela. Talvez isso ajudasse a aliviar seus
nervos, que agora estavam em plena revolta.
Nicholas foi até o aparador e serviu uma taça de xerez para ela e
conhaque para ele. Ele lhe entregou a taça e ergueu a sua em uma saudação.
— Ao marquesado — disse ele antes de levar a taça aos lábios.
Ela achou um brinde estranho, mas também ergueu a taça, bebendo
mais devagar. Observou em silêncio enquanto ele colocava a taça na mesa e
caminhava até a janela. Ele parecia de alguma forma estar mais nervoso do
que ela. Como isso era possível? Nicholas tinha a reputação de ter estado
com muitas mulheres. Por que ele estaria nervoso com ela?
Quando ela terminou sua bebida, ele caminhou até ela e pegou a taça de
sua mão. Ela não tinha certeza do que esperar a seguir, mas certamente não
foi o que se seguiu.
— Deveria se retirar — disse ele suavemente.
Ela reuniu sua coragem antes de perguntar:
— Vai se juntar a mim?
Ele balançou sua cabeça.
— Precisamos conversar amanhã sobre minhas expectativas para este
casamento.
Ela não gostou do som disso. Queria insistir no assunto naquele
momento, mas podia ver que ele não estava com disposição para tal
discussão. Além disso, a fadiga, ajudada pelo xerez que havia bebido,
estava começando a se apoderar de seu corpo novamente.
Confusa, mais do que um pouco preocupada com a conversa do dia
seguinte, ela deu ao novo marido um desajeitado boa noite e subiu para seu
quarto. Chamou a criada para ajudá-la a se despir e foi para a cama sozinha.
Os lençóis estavam um pouco frios no início, mas sobrecarregada pelos
acontecimentos do dia, cansada pela falta de sono da noite anterior, ela
adormeceu imediatamente. Não tinha certeza de quanto tempo dormira
antes de ser acordada. A escuridão e a sensação dos lençóis frios contra sua
pele a desconcertaram e ela levou um tempo para lembrar onde estava.
Ouviu outro barulho, um som de raspagem e então a porta do quarto se
abriu. Louisa cobriu a boca para abafar o grito que quase lhe escapou. No
escuro, ela podia apenas distinguir uma sombra.
— Nicholas?
Houve um murmúrio de assentimento e Louisa sentou-se na cama.
— Ajude-me — disse ele.
Seus olhos se acostumaram com a escuridão e ela pôde ver que ele
estava segurando a maçaneta da porta para se manter de pé. Ela pulou da
cama e correu para o lado dele.
— Está tendo outra crise?
Assim que a pergunta saiu de sua boca, ela percebeu como soava tola.
Era óbvio que ele estava sofrendo de novo, de qualquer doença que o havia
atacado naquela outra vez. Ela inclinou-se para ele e passou seu braço livre
ao redor do ombro dele.
— Já pode soltar a porta.
Ele fez isso e Louisa lutou para permanecer de pé sob o peso dele. A
posição era estranha, mas ela conseguiu levá-lo com alguns passos até a
cama. Quando finalmente a alcançaram, ele a soltou e caiu nela.
Louisa colocou a mão na testa dele e ficou chocada ao perceber a febre.
Como era possível que ele estivesse tão doente quando estava bem apenas
algumas horas antes? Ela virou-se, mas ele a deteve com uma mão em seu
braço.
— Não vá embora — ele conseguiu dizer, sua voz pouco acima de um
sussurro.
— Já volto — disse ela.
Ela correu para o lavatório e colocou um pouco de água na tigela.
Mergulhando um pano no líquido frio, ela torceu o excesso de água e voltou
a colocá-lo na testa de Nicholas. Ele gemeu com o contato. Ficou ali, sem
saber o que fazer. Seus olhos se abriram e a enredaram em suas
profundezas.
— Não vá… por favor — disse ele antes de fechar os olhos novamente.
Louisa olhou para a espreguiçadeira, pensando que poderia dormir ali,
mas logo descartou a ideia. Ela e Nicholas eram agora marido e mulher.
Não haveria nada de errado em compartilharem a mesma cama. Ela seria
capaz de descansar um pouco e se ele precisasse dela, estaria lá.
Antes que pudesse mudar de ideia, ela puxou as cobertas sobre o corpo
de Nicholas, deu a volta para o outro lado da cama e escorregou entre os
lençóis. Desta vez ela ficou acordada por um bom tempo, ouvindo a
respiração constante do marido, antes de finalmente voltar a adormecer.

NICHOLAS TOMOU consciência do corpo quente ao seu lado. Louisa. Ao


contrário de outras mulheres que se saturavam com perfumes pesados, seu
cheiro era suave. Ela estava aninhada contra ele, de costas para seu peito e
seu traseiro confortável contra sua masculinidade. Sua mão serpenteou ao
redor do abdômen dela, puxando-a para mais perto de seu corpo. Seu
traseiro se mexeu contra ele, que gemeu.
Ele colocou a boca em seu ombro e beijou seu caminho até o pescoço.
Ela fez um pequeno som de encorajamento e ele arrastou a mão por seu
torso, finalmente segurando seu seio através do tecido de sua camisola.
Continuou a beijar sua garganta enquanto apreciava a forma como o peso de
seu seio enchia sua mão. Seus dedos brincaram com seu mamilo, puxando-o
em um botão apertado.
— Nicholas — ela suspirou suavemente.
O nome dele naqueles lábios o inflamou. Ele a rolou de costas e olhou
para ela. Seus cabelos claros se espalhavam pelo travesseiro, emoldurando
um rosto corado pelo sono. Seus olhos cinzas escureceram de paixão. Ele
traçou a linha de seu lábio inferior carnudo com o polegar.
Deveria se lembrar de algo sobre Louisa, mas estava fora de alcance.
Ela levou as mãos aos ombros dele e se arqueou contra seu corpo, e ele
descobriu que não se importava com o que quer que fosse que deveria se
lembrar.
E então ele a beijou. Sabia que era a primeira vez dela com um homem
e que tinha que ir devagar, mas achou o esforço maior do que podia. A boca
dela se abriu sob a dele, que aproveitou a oportunidade para saquear suas
profundezas. Sua resposta foi hesitante no início, mas não demorou muito
para que encontrasse seus beijos com sua própria resposta apaixonada –
beijos longos e viciantes que apenas atiçavam o fogo do desejo dele.
Ele rolou de costas e a colocou sobre ele, aproveitando a posição para
desamarrar a fita em seu decote para que ele pudesse empurrar sua
camisola. Quando seus seios se soltaram, ele gemeu e a moveu para que
pudesse tomar uma ponta rosada em sua boca. Louisa inalou alto em
surpresa, mas suas mãos chegaram à cabeça dele e ela o segurou lá,
arqueando ainda mais em sua boca. Ele se moveu de um seio para o outro,
empurrando sua camisola para baixo enquanto a chupava. Quando passou
por seus quadris, ele a rolou de costas novamente e arrastou a roupa de seu
corpo.
Sua boca deixou seu seio e procurou mais abaixo. Ela ofegou quando
ele moveu a mão para dentro de sua coxa e a acariciou entre as pernas.
Deus, ela já estava molhada. Nicholas lutou contra o desejo de tomá-la
naquele momento.
Quando ele se moveu mais para baixo, Louisa ficou rígida de surpresa.
Um olhar foi suficiente para lhe dizer que ele a havia chocado. Decidindo
que ela obviamente não estava pronta para o que ele tinha em mente, ele
beijou seu caminho de volta pelo corpo dela, parando tempo suficiente para
homenagear seus seios novamente. Eles não eram muito grandes, mas
também não eram pequenos. Os sons que ela fazia enquanto ele os percorria
o levaram ao limite da sanidade. Ele subiu completamente sobre ela e a
beijou novamente, sua paixão era uma coisa viva. Ela instintivamente abriu
mais as pernas quando ele se abaixou para desabotoar a calça. Eles estavam
casados agora e não precisava se preocupar em ter um filho fora do
casamento. Estivera com muitas outras mulheres no passado, mas naquele
momento não conseguia se lembrar de nenhum de seus rostos. Havia apenas
Louisa. Ele podia saciar-se totalmente dentro dela e não precisava se
preocupar em sair. Afinal, ela havia prometido lhe dar um herdeiro.
Ele congelou quando sua mão alcançou o último botão. Um herdeiro.
Meu Deus, o que ele estava fazendo? Não podia fazer amor com Louisa e
arriscar conceber uma criança que eventualmente desenvolveria a mesma
doença que parecia atormentar sua família.
Lentamente, com cada fibra de seu ser protestando, ele rolou de costas
ao lado dela e jogou um braço sobre os olhos. Ele lutou para acalmar sua
respiração.
Ela fez um som de protesto que ecoou sua própria decepção profunda.
Ficar longe de Louisa iria matá-lo.
Ela mudou de posição. Embora ele não removesse o braço, ele sabia que
ela o estava olhando.
— Nicholas? Você ainda não está se sentindo bem?
Ele riu amargamente com a pergunta. Esse tinha sido o eufemismo do
século. Tentou se lembrar do que tinha acontecido na noite anterior, mas os
detalhes eram vagos. Depois de compartilhar uma bebida com Louisa e
mandá-la para a cama sozinha, ele não tinha certeza. Um pensamento
horrível lhe ocorreu. Era tarde demais? Já tinham feito amor?
Ele tirou o braço e olhou para a esposa, que segurava as roupas de cama
apertadas contra o peito. Sua testa estava enrugada de preocupação.
— O que aconteceu? — ele perguntou. Louisa corou e ele correu para
elaborar. — O que aconteceu ontem à noite? Você e eu…
Ela balançou a cabeça, seu embaraço era claro.
— Você me mandou para a cama.
Ele respirou fundo antes de continuar.
— Eu me juntei a você depois? Eu pretendia permitir que você
descansasse.
Louisa o estudou por um momento antes de responder:
— Você adoeceu de novo. Conseguiu vir até o quarto e me acordar.
Então isso explicava por que ele estava lá.
— E decidiu se juntar a mim?
— Me pediu para não sair de perto — disse ela com uma voz suave. —
E a cama parecia muito mais confortável do que a espreguiçadeira.
Ele não podia culpá-la por pensar que estaria tudo bem para ele se
compartilhassem a mesma cama. Afinal, eram casados e ele nunca tinha
dado a entender que não queria esse tipo de relacionamento.
Um canto de sua boca se ergueu em uma ironia divertida. A quem
estava enganando? Estava ficando claro para ele que queria muito um
relacionamento físico com sua esposa. Ainda estava duro e sabia que tinha
que se afastar dela antes que a intimidade da situação o provocasse a
continuar de onde haviam parado.
Foi só então que percebeu que ainda estava vestido. Se estivesse
pensando claramente antes, teria percebido que nada de importante poderia
ter acontecido entre eles naquela noite.
Nada de consequência. Exceto que ela tinha cuidado dele duas vezes
agora enquanto estivera doente. Os episódios nunca tinham sido tão
próximos antes.
— Fique na cama — disse Louisa. — Vou me vestir no meu antigo
quarto. — Ela franziu a testa antes de continuar: — Gostaria que eu lhe
trouxesse uma bandeja?
Era irritante que ela o estivesse tratando como um inválido. Dada a
frequência alarmante com que ele desmaiava em sua presença, mal podia
culpá-la, mas mesmo assim isso o irritava.
— Vou encontrá-la lá embaixo em breve — disse ele antes de cobrir os
olhos com o braço novamente.
Ouviu um farfalhar de movimentos antes de ela deslizar para fora da
cama e pegar o roupão. Moveu um pouco o braço e ficou desapontado por
ela ter vestido a camisola novamente antes de sair da cama. A luz do sol
entrava pela janela e ela estava de pé dentro de seu círculo de luz, sem saber
que o contorno de seu corpo era visível através do tecido fino e
transparente.
Gemendo baixinho, ele cobriu os olhos novamente e escutou sua
partida. Não tinha certeza se era forte o suficiente para ficar longe de sua
esposa.
ELA NÃO conseguia se acostumar a ter criados na casa de campo. Apenas
sua nova criada e o valete de Nicholas passaram a noite lá, mas um dos
funcionários da cozinha da Mansão Overlea chegara cedo naquela manhã
para preparar o café da manhã e um lacaio estava postado na porta da sala
de jantar. Depois de preparar seu prato em um aparador no qual nunca tinha
visto tanta comida, Louisa dispensou o lacaio e sentou-se à mesa. Tinha
sido apenas um dia, mas com todas as mudanças no chalé, não parecia mais
um lar.
Ela deu uma sacudida mental em seu sentimentalismo. As mudanças
provavelmente eram uma coisa boa. Ela precisava aceitar que a Mansão
Overlea agora era sua casa.
Tinha acabado de servir o chá quando Nicholas entrou. Murmurou uma
saudação e foi até o aparador para preparar seu próprio prato. Ele não iria
gostar dela pairando sobre ele, mas não conseguia evitar que seus olhos
seguissem seus movimentos caso ele precisasse de sua ajuda.
Suas tentativas de conversar durante o café da manhã foram recebidas
com respostas monossilábicas. Perguntou-se se tinha feito algo errado, mas
rapidamente descartou o pensamento. Ela não o conhecia há muito tempo,
mas já sabia que Nicholas não era o tipo de homem que mostrava sinais de
fraqueza. O fato de que agora ela o tinha visto adoecer duas vezes o
incomodava mais do que nunca.
Desistiu de conversar, então ficou surpresa quando ele virou-se para ela
depois de limpar o prato.
— Os hóspedes que passaram a noite devem partir depois do café da
manhã. Dado o quão tarde alguns foram dormir, acho que podemos evitar a
maioria deles se partirmos no meio da tarde.
Louisa murmurou sua concordância e observou enquanto ele se afastava
da mesa e saía do cômodo. A sensação de que o marido estava escondendo
algo dela, algo diferente de sua doença, voltou com força total. Se pensasse
bem, acreditaria que Nicholas ficava desconfortável perto dela.
 
Capítulo 10

NICHOLAS ESTAVA grato por duas coisas. Primeiro, que a viagem de volta
ao Solar Overlea tinha sido curta e segundo, que ele escolhera conduzir sua
carruagem na noite anterior. Isso significava que ele poderia se concentrar
na tarefa de lidar com os cavalos em vez de encontrar-se no ambiente muito
mais íntimo da carruagem Overlea com sua esposa. Ainda estava quase
dolorosamente ciente dela, principalmente depois do que quase havia
acontecido naquela manhã, mas ele não estava em posição de fazer nada
tolo.
Percebia agora que tinha sido um imbecil ao pedir que Louisa fosse sua
esposa. Talvez ele devesse ter pedido Mary em casamento, afinal. Mas não,
ele descartou esse pensamento quase assim que ele lhe ocorreu. Mary podia
ser mansa, mas ela nunca teria concordado com o arranjo que ele tinha em
mente e não perderia tempo em contar à mãe e ao irmão sobre isso.
Tentou imaginar outras alternativas, mas no final sabia que Louisa tinha
sido sua única possibilidade. O fato de não ter os pais, de que ela tinha dois
irmãos mais novos para cuidar, sua situação desesperadora – tudo
combinado para presenteá-lo com a única mulher que ele sabia que
concordaria com a proposta que ele estava prestes a fazer.
Olhou para ela, mas seu rosto estava virado. Sua mente se esquivou de
qualquer pensamento de que a estivesse tratando tão mal quanto seu primo.
No entanto, lembrar-se da confusão dolorosa que viu no rosto dela quando
rejeitou suas tentativas de conversar durante o café da manhã, o fez se sentir
como um bastardo que chutara um filhote ferido.
Ele repassou a próxima conversa em sua mente. A conversa que teve
com Kerrick não era nada comparada à que teria com a esposa mais tarde
naquele dia. Ele sabia que logo ela o odiaria, e seria incapaz de culpá-la.
Soltou um suspiro de alívio quando a carruagem finalmente se
aproximou da mansão. Enviou seu valete e sua criada de volta ao Solar
Overlea naquela manhã com uma mensagem sobre quando eles voltariam,
mas ainda foi uma surpresa quando a avó os encontrou no saguão da frente.
— Estou feliz que vocês dois estejam de volta tão cedo. Precisamos
conversar — disse antes de se virar e entrar na sala de estar.
Ele encontrou o olhar perplexo de Louisa.
— Sabe do que se trata? — perguntou ela.
Por um momento, ele suspeitou que a avó tinha de alguma forma
descoberto seu plano para um herdeiro. No entanto, a única outra pessoa
que sabia era Kerrick, e seu amigo não teria contado a ela.
Ele balançou a cabeça.
— Não.
Parecendo um pouco nervosa, ela entrou na sala de visitas e Nicholas a
seguiu. Catherine já estava lá, sentada no sofá e parecia miserável. Lady
Overlea estava sentada em uma cadeira à sua frente, mas permaneceu em
silêncio.
— Catherine? — Louisa foi até a irmã e sentou-se no sofá ao lado dela.
— O que aconteceu? Por que está tão chateada?
Nicholas permaneceu de pé junto à porta, hesitante em se intrometer.
Catherine levantou a cabeça. A respiração profunda que ela inspirou
antes de responder foi trêmula.
— Sinto muito, Louisa. Tentei impedi-lo, mas ele não me ouviu.
Discutimos sobre isso. Seu amigo — disse ela, virando-se para olhar para
Nicholas —, ele nos viu, mas não sabia por que estávamos discutindo.
— Você está falando de John? — perguntou Louisa.
Catherine assentiu e estendeu um pequeno pedaço de papel dobrado que
não tinha notado que ela estava segurando no colo. Louisa pegou-o,
perplexa. Ela o desdobrou com as mãos trêmulas e começou a ler. Nicholas
moveu-se para trás do sofá e leu o bilhete por cima do ombro dela.
 
Louisa,
 
Agora que você se casou com Overlea, não seria apropriado que eu
procurasse um emprego como tutor. Felizmente, lembrei-me do velho amigo
de papai, o capitão Farrows. Acredito que ele esteja em Londres agora, ou
estava quando enviou suas condolências alguns meses atrás depois de
saber da morte de nosso pai. Sei que decidimos não aceitar sua oferta de
caridade, mas agora que você e Catherine estão bem, preciso fazer meu
próprio caminho no mundo. Pretendo abordá-lo para me patrocinar na
compra de uma comissão nas forças armadas.
Não mudarei de ideia. Você escolheu seu próprio caminho. Por favor,
permita-me fazer o mesmo.
 
John
 
— Não — disse Louisa, balançando a cabeça enquanto olhava para o
papel e o relia. — Ele não pode fazer isso. John deveria ir para Oxford. —
Virou-se para Catherine. — Quando ele foi embora? Conseguiremos detê-
lo?
Catherine balançou a cabeça.
— Ele saiu ontem à noite, logo depois que notamos que você e Overlea
haviam partido. Ele perguntou a um dos convidados que não ficaram
hospedados se poderia se juntar a eles quando voltassem para Londres.
Louisa levantou-se e deu a volta no sofá até onde Nicholas estava.
— Pode impedi-lo — ela disse a ele. — Deve impedi-lo. Você pode
enviar alguém para segui-lo. Ele estará com o capitão Farrows. Eu posso
lhe dar o endereço e…
Nicholas pegou as mãos dela, que estavam segurando o bilhete e
acalmou seu tremor. Pegou o bilhete e o devolveu a Catherine antes de
voltar-se para Louisa.
Ele disse as palavras que sabia que ela não gostaria de ouvir:
— Ele tem idade suficiente para tomar essa decisão. Não podemos
forçá-lo a fazer o que ele não quer.
Ela soltou um som estrangulado e Nicholas teve que resistir ao desejo
de puxá-la em seus braços.
— Não — disse ela, balançando a cabeça. — Ele queria ir para Oxford.
Para entrar no clero.
— Isso pode ter sido verdade em um ponto, mas não mais.
— A decisão dele foi tomada — disse Catherine. — Eu ameacei contar-
lhe, mas não adiantou. Ele disse que não havia nada que você pudesse dizer
ou fazer que o fizesse mudar de ideia, e eu não queria estragar sua noite de
núpcias.
— Você fez a coisa certa — disse Lady Overlea, falando pela primeira
vez desde que eles entraram na sala. — Não teria resultado e John ainda
teria ido embora, só que ele teria feito isso em maus termos com você e
Louisa.
— Isso não deveria acontecer — disse Louisa. — Tínhamos tudo
planejado.
— As coisas nem sempre saem conforme o planejado — disse Nicholas,
falando de seu próprio conhecimento cínico de quão fora do curso a vida de
alguém poderia ir.
Precisando oferecer-lhe conforto, ele levou as mãos dela aos lábios e
deu beijos suaves em suas costas. Os olhos dele encontraram os dela e o
poder de seu olhar triste o atravessou. Abalado, ele deixou cair as mãos dela
como se tivesse sido queimado.
— Minha cabeça me diz que você está certo, mas meu coração… — Ela
balançou a cabeça, incapaz de continuar por vários segundos. — Preciso
ficar sozinha agora.
Nicholas a observou partir, desejando ir atrás dela, mas sabendo que não
poderia fazê-lo.
— Fez a coisa certa — disse ele, virando-se para Catherine.
Os cantos da boca dela se ergueram um pouco em resposta, mas o
sorriso fraco não encontrou o olhar dele.
Então ele saiu da sala e foi até o escritório, sabendo que a avó faria o
que pudesse para confortar Catherine. Revisar os livros de contabilidade da
propriedade era a última coisa que queria fazer naquele momento, mas o
trabalho tinha que ser feito. O tédio da tarefa também ajudaria a tirar sua
mente da esposa e da bagunça que estava sua vida naquela tarde.
Nicholas sentou-se à sua mesa e abriu os livros da propriedade. Ele
levaria o resto do dia para percorrer as contas, uma tarefa que ele sempre
odiou. Ignorou a dor de cabeça que estava começando a latejar em suas
têmporas, sabendo que era um efeito colateral da crise que sofrera na noite
anterior.
Uma hora depois, uma batida soou na porta. Sem esperar por sua
resposta, Kerrick entrou. Normalmente Nicholas não teria se importado
com a interrupção, mas a maldita pulsação em sua cabeça sempre o deixava
irritado, para não falar do lembrete sobre o motivo de Kerrick não ter
retornado à Londres com o resto dos convidados.
— Por quanto tempo está planejando se esconder aqui? — perguntou
Kerrick.
— Tem uma propriedade. Sabe que elas não cuidam de si mesmas.
Kerrick não percebeu que o amigo estava aborrecido ou não se
importou. Fechou a porta atrás de si e sentou-se do outro lado da mesa.
Nicholas fingiu fechar o livro e dar atenção ao amigo.
— Há algo que eu possa fazer por você?
— Sua esposa é uma mulher bonita — disse Kerrick.
Um choque de aborrecimento passou por ele, mas se esforçou para
ignorá-lo. Afinal, isso era o que ele esperava. Seu amigo de longa data
estava mais propenso a concordar com sua proposta se achasse a mulher em
questão atraente.
— Viu-a hoje?
— Não, achei melhor falar com você primeiro. Contou a ela o que
planejou para nós?
Nicholas balançou a cabeça.
— Estou planejando contar a ela hoje à noite. — Ele hesitou apenas por
um momento antes de perguntar: — Você está concordando em me ajudar?
Kerrick balançou a cabeça.
— Não me decidi. Além disso, o ponto pode ser discutível se ela decidir
deixá-lo depois que você contar a ela.
Nicholas sabia que Louisa não iria embora. Ela não tinha para onde ir.
Poderia, no entanto, recusá-lo completamente.
Kerrick fez um grande show examinando suas unhas antes de continuar:
— Parece-me que está adiando contar à sua adorável esposa que deseja
que ela se deite com seu melhor amigo.
Nicholas achou difícil não vacilar com as palavras. Sua ideia de
conceber um herdeiro não parecia tão censurável quando pensou nisso pela
primeira vez. Porém, quanto mais tempo se passava e quanto mais ele
ficava perto de Louisa, mais desagradável a coisa toda ficava para ele.
— Por acaso você não teria ideia da melhor forma de introduzir o
assunto, teria?
— Eu? — disse Kerrick com uma gargalhada. — Esta ideia insana é
sua, uma com a qual ainda não concordei em ajudá-lo. Você vai ter que
descobrir isso por conta própria.
— Veio aqui apenas para me atormentar, então?
— Na verdade — disse Kerrick, inclinando-se para frente em seu
assento, sua expressão séria agora —, vim aqui para ver se você tinha
voltado a si.
— Foi enquanto eu estava lúcido que percebi que essa era a única
maneira de cumprir meu dever e fornecer um herdeiro aceitável para o
título.
Kerrick esperou um momento antes de dizer:
— Eu os vi juntos ontem à noite.
Nicholas levantou uma sobrancelha.
— Acredito que todos nos viram juntos ontem à noite. Esse era o
objetivo da coisa toda.
— Você sabe o que estou querendo dizer.
— Não, não sei. Por que não me esclarece?
Kerrick recostou-se em sua cadeira.
— Acredito que sua nova esposa desenvolveu uma atração por você. E
se não me engano, acho que não deixa de ser afetado por ela.
— Serei o primeiro a admitir que Louisa é uma mulher muito bonita.
No entanto, ela mal me conhece e certamente não é o suficiente para
desenvolver qualquer sentimento romântico por mim. Tomei o cuidado de
não encorajá-la nessa direção.
Teve que reprimir a culpa que o atravessou quando se lembrou de como
ela ficara magoada quando rejeitou suas tentativas de iniciar uma conversa.
Era melhor para todos os envolvidos se sua esposa descobrisse que a última
coisa que ele queria ou precisava era que eles se tornassem próximos. Já era
difícil ficar longe dela agora.
Nicholas encontrou o olhar curioso de seu amigo, tomando cuidado para
manter o seu próprio neutro. Kerrick exalou ruidosamente e levantou-se.
— Estará no jantar? Já que sei que não vai se envolver de outra forma
com sua nova esposa, então pensei que iria gostar de passar algum tempo
certificando-se de que seu melhor amigo não morresse de tédio.
Nicholas franziu a testa quando seus pensamentos foram imediatamente
para o que Kerrick poderia estar fazendo em breve para aliviar seu tédio.
Lutou para manter a voz casual quando respondeu:
— Vejo-o no jantar. Será uma boa oportunidade para você e Louisa se
conhecerem antes de eu falar com ela esta noite.
Kerrick apenas assentiu antes de sair.
Nicholas ficou sentado olhando por algum tempo para a porta pela qual
o amigo havia passado antes de voltar sua atenção para os livros. Não
queria pensar na conversa que logo teria com sua esposa.

A PARTIDA DE John abalou Louisa totalmente. As coisas não estavam


indo como ela esperava. A última coisa que queria era que John sacrificasse
seu futuro. Ainda não conseguia acreditar que ele tinha deixado de lado a
oportunidade de estudar em Oxford, que tinha sido garantida por seu
casamento com Nicholas. A ironia não passou despercebida por ela ter
tentado manter a proposta de Edward Manning escondida de seu irmão; ela
queria mantê-lo seguro, pois sabia que ele confrontaria Manning se
soubesse. E agora ele tinha fugido para se alistar nas forças armadas.
Também estava tendo dificuldade em antecipar o humor do marido.
Nunca sabia se, de um momento para o outro, ele seria o homem aberto e
amigável que ela vislumbrava de vez em quando, ou o homem que mal
parecia tolerar sua presença.
Hesitou do lado de fora da porta da sala de jantar, passando a mão sobre
o vestido pensativamente. A cor amarela pálida complementava sua
coloração e ela se viu esperando que Nicholas achasse adequado.
Perguntou-se em que humor ele estaria naquela noite.
Relaxou um pouco quando entrou na sala e viu que o marido ainda não
havia chegado. Catherine e Lady Overlea já estavam sentadas e
conversavam sobre algumas das plantas da estufa. Confortava-a saber que
sua irmã, pelo menos, estava se sentindo em casa no Solar Overlea.
Tinha acabado de se sentar quando Nicholas e Lorde Kerrick chegaram.
Ela havia sido informada de que o amigo de seu marido ficaria para uma
visita, mas ainda não o tinha visto desde que voltara. Perversamente, ela se
perguntou brevemente se ele também a estaria evitando.
Nicholas a cumprimentou com um sorriso, que notou que não alcançou
seu olhar. Esses pareciam estar sombreados pela tensão. Queria perguntar
como estava se sentindo, mas sabia que ele não aceitaria sua preocupação.
Em sua posição, sentada em frente ao Nicholas, ela tinha um ponto
excelente para observá-lo, embora tentasse não ser óbvia quanto a isso. Ele
a estava evitando novamente, envolvendo todos na conversa, menos ela.
Conversaram apenas brevemente e apenas quando necessário. Seu amigo,
no entanto, que estava sentado ao seu lado, parecia se esforçar para
compensar a falta de atenção do marido.
Lorde Kerrick era muito divertido e não demorou muito para tirá-la de
seu humor sombrio, até mesmo fazendo-a rir alto. Os olhos de seu marido
se voltaram em sua direção com isso, mas ele virou-se rapidamente com
uma leve carranca no rosto. Ela suspirou, muito consciente do abismo
intransponível que parecia crescer entre ela e Nicholas. Depois disso, o
amigo do marido não conseguiu provocar sequer um sorriso nela.
No entanto, preocupada com seus próprios pensamentos, Louisa notou
que sua irmã parecia estar apaixonada por Lorde Kerrick. Catherine e ele
trocavam gentilezas, mas era óbvio que estava intrigada com o homem.
O jantar parecia interminável e ela ficou feliz quando finalmente
acabou. Nicholas e Lorde Kerrick retiraram-se para a biblioteca, enquanto
as damas iam para a sala de visitas onde a avó de Nicholas ficou satisfeita
em ouvir Catherine tocar piano. Louisa lamentou uma dor de cabeça e
escapou para seu quarto.
Estava prestes a chamar sua criada quando uma batida suave na porta a
assustou. Acreditando que a mulher soubesse que ela já havia se retirado
para a noite, convidou-a a entrar e ficou surpresa quando a porta se abriu,
revelando seu marido. Ele fechou a porta suavemente atrás dele.
— Nicholas — disse ela, seu coração começando a acelerar —, eu não
esperava por você esta noite.
— Eu precisava falar com você em particular.
Algo em seu tom a alarmou. Ela havia pensado, não, ela esperava que
ele estivesse lá para finalmente consumar o casamento. Parecia que estava
errada e se repreendeu por ser uma tola.
Eles ficaram lá por vários longos e embaraçosos minutos. Louisa
permaneceu em silêncio, esperando que ele abordasse o assunto que o
levara até ali. Finalmente, quando não podia mais suportar o silêncio, ela
fez a pergunta que estivera em sua mente o dia todo:
— Você me fez uma pergunta ontem. Agora eu pergunto o mesmo a
você.
Ele levantou uma sobrancelha.
— Se arrepende de ter se casado comigo? Se o fizer, tenho certeza de
que um homem em sua posição não teria nenhum problema em
providenciar a anulação do casamento. Você poderia continuar com sua
vida como se eu nunca tivesse existido.
Ele não respondeu de imediato e seu ânimo se afundou.
— Eu tenho arrependimentos — disse ele com uma voz baixa depois de
um momento.
Ela queria morrer de mortificação.
— Entendo — ela de alguma forma conseguiu dizer.
Ela começou a se virar, mas ele cruzou a distância entre eles e segurou
suas mãos.
— Lamento não poder ser o tipo de marido que você merece.
Ele soltou as mãos dela e indicou que ela deveria se sentar. Ela estava
grata, pois não tinha certeza de quanto tempo mais seria capaz de
permanecer de pé. Abaixando-se no banco ao pé da cama, ela desejou não
ter feito a pergunta.
Sentando-se na cama, ele virou-se para ela. Seus olhos se encontraram e
ela podia ver a desolação neles.
— Eu preciso de um herdeiro e você concordou em me fornecer um.
Ela estava confusa. Isso não era o que esperava ouvir.
Ela assentiu, sem saber para onde aquela conversa estava indo. Minutos
antes, ela esperava que ele lhe dissesse que queria terminar o casamento e
agora ele estava falando sobre ter filhos.
— Prefere ter uma mulher diferente como mãe?
Ele balançou a cabeça.
— Não, será a mãe dos meus herdeiros.
Louisa passou a língua nos lábios, esperando por mais explicações. Os
olhos dele seguiram o movimento, mas ele não continuou.
— Veio aqui então para… — Sua mão varreu a cama e suas bochechas
começaram a esquentar.
— Não — disse ele suavemente.
Era arrependimento que ela via nos olhos dele?
— Não estou entendendo. Como vou lhe dar um herdeiro se você não
vai se deitar comigo?
Ele endireitou os ombros e continuou:
— Louisa, sabe que eu sofro de uma doença.
A preocupação guerreou com sua confusão.
— Devo chamar alguém?
Ela levantou-se para chamar um criado, mas ele a deteve.
— Não, estou me sentindo bem no momento.
Ela sentou-se novamente no banco e respirou fundo para acalmar os
nervos.
— Por favor, continue.
— Já me viu adoecer duas vezes — disse ele, suas palavras lentas e
medidas. Ela assentiu e ele continuou: — Meu pai e meu irmão sofreram
crises semelhantes. Os médicos não sabem o que as causou, mas é provável
que minha doença me mate, assim como aconteceu com os dois marqueses
anteriores.
Pela expressão dura nos olhos de Nicholas, ela podia ver que ele
acreditava no que dizia. Não conseguia entender como podia aceitar com
calma tal destino.
— Certamente deve haver alguém que possa ajudá-lo.
Ele balançou a cabeça.
— Meu pai e irmão consultaram todos os melhores médicos. É uma
doença misteriosa, para a qual parece não haver cura.
Dizer que ela estava chocada seria um grande eufemismo. Lutou para
controlar suas emoções turbulentas antes de falar novamente, sabendo que
Nicholas não queria a simpatia dela.
— Eu não sei o que dizer. — Estendeu a mão para colocar uma mão
sobre a dele.
Ele olhou para as mãos dela e um canto de sua boca se curvou para cima
sardonicamente. Autoconsciente, ela tirou a mão e a colocou em seu colo.
— Aprecio sua preocupação, mas pense no que eu lhe disse: meu pai e
meu irmão sofreram desta doença, e agora eu também. Isso significa que é
muito provável que qualquer filho que eu tenha também sofra com isso.
Uma pontada a atravessou ao pensar em ter um filho que poderia morrer
da doença misteriosa de Nicholas. Respirou fundo e tentou considerar todas
as implicações do que ele estava lhe dizendo. Foi por isso que ele havia
parado naquela manhã enquanto eles estavam fazendo amor? Ele estava
com medo de que seus filhos desenvolvessem a mesma doença?
— Não é uma certeza, Nicholas — disse ela. — Nenhum de nós pode
prever o futuro.
Ela observou enquanto ele balançava a cabeça, indiferente às suas
palavras.
— Minha mãe morreu no parto — disse ela, continuando quando ele
não respondeu. — Ela morreu ao dar à luz a Catherine. Isso significa que eu
não deveria tentar ter meus próprios filhos? Que eu deveria recusar minha
cama com medo de algo que pode nunca acontecer?
— Não é a mesma coisa.
Louisa levantou-se e aproximou-se dele. Respirando fundo,
intensamente consciente de seu marido em um nível físico, apesar do tema
sombrio da conversa, ela sentou-se ao lado dele na cama e pegou sua mão
novamente. A princípio pensou que ele iria se afastar, mas no final, ele
permitiu que ela lhe desse o conforto que estava tão ansiosa para transmitir.
— É a mesma coisa. Não podemos permitir que o medo do futuro nos
impeça de viver o presente.
Ele desviou o olhar dela antes que ela pudesse definir a emoção que vira
nos olhos dele. Raiva? Frustração?
— Você não mostra nenhum sinal de fraqueza, Louisa. Você é uma
mulher jovem, saudável e está no auge da vida. A morte no parto é uma
possibilidade para todas, mas não é uma certeza. Eu, no entanto, estou
exibindo os mesmos sintomas de uma doença que já matou dois dos meus
familiares mais próximos. Ao contrário de você, não sou saudável e não
vou correr o risco de passar essa doença para os meus filhos.
Louisa queria confortá-lo, mas não sabia como. Ele se afastou dela e
agora estava cerrando as mãos em punhos nas coxas. Ela se perguntou se o
tempo iria dissuadi-lo de sua convicção ou enraizá-la ainda mais em sua
mente. Provavelmente o último, principalmente se continuasse a sofrer com
suas crises.
— O que vamos fazer então? — perguntou ela. — Como disse, precisa
de um herdeiro. A menos que… — Sua respiração ficou presa quando ela
considerou uma possibilidade. Quando ela continuou, sua voz era cautelosa:
— Edward é o próximo da fila, não é?
Ele virou-se para encará-la incrédulo. Uma mecha de seu cabelo preto
tinha caído em sua testa. Os dedos de Louisa coçaram para alisá-la, mas em
vez disso ela manteve as mãos cruzadas no colo.
— Você honestamente acredita que eu permitiria que meu primo se
tornasse o próximo Marquês de Overlea? Depois do que eu fiquei sabendo
sobre ele? Depois do que tentou fazer com você e Catherine? Isso colocaria
você de volta sob o poder dele quando eu morrer.
— Entendo — disse ela, sua voz trêmula ao pensar em mais uma vez ter
que confiar na noção de generosidade de Edward Manning para sua
sobrevivência —, mas você já disse que não vai gerar filhos.
Uma sugestão de cautela rastejou em seu rosto e em suas palavras.
— O que foi? — perguntou ela.
— Não posso correr o risco de passar minha doença para os meus
filhos, é verdade, e mantenho-me firme quanto a isso.
Havia algo que ele não estava lhe dizendo.
— Mas?
— Mas não há nada que impeça você de ter filhos.
Ele a encarou atentamente enquanto falava, observando sua reação. A
princípio não houve nenhuma. Suas palavras não faziam sentido. Então
quando a compreensão do que ele estava propondo surgiu, a raiva começou
a percorrê-la.
Não se incomodou em esconder isso dele. Ela levantou-se e virou-se
para ele, esperando fervorosamente estar enganada. Que de alguma forma
ela havia interpretado mal suas palavras.
— Você não está sugerindo o que eu acho que está — disse ela, as
palavras apertadas e cortadas.
Ele não se comoveu com a raiva dela.
— É o único caminho. Devo ter um herdeiro. E lembre-se, você
concordou em me dar um. Assinou um contrato de casamento para esse
efeito.
Ele estava fora de si. Como ele poderia sentar-se lá e sugerir
calmamente que ela… Ela não conseguia nem terminar tal pensamento.
— Não.
— Eu pretendo mantê-lo em seu acordo — disse ele.
— Concordei em lhe dar um herdeiro, e não um a um homem que eu
não conheço.
— Você estaria me dando um herdeiro. Reconhecerei a criança como
minha.
O pânico começou a se instalar.
— Não me faça fazer isso, Nicholas.
Sua voz se suavizou um pouco.
— Eu nunca forçaria você a dormir com outra pessoa. — Seu rosto era
uma máscara sem emoção enquanto falava. — Você mal me conhece, mas
concordou em se tornar minha esposa. Sei que me acha desejável.
Certamente não está fora do reino da possibilidade que não vá achar outro
homem atraente da mesma maneira.
Louisa afastou-se dele. Ele realmente esperava que ela fizesse isso.
Dormir com outro homem e passar o filho dessa união como sendo deles.
Sim, o que disse era verdade, ela estava disposta a fazer amor com
Nicholas. Ela o desejava mais do que estava disposta a admitir naquele
momento. O que ele não sabia, o que ela não lhe contaria, dada a maneira
arrogante com que estava discutindo a possibilidade de ela se deitar com
outra pessoa, era que os sentimentos dela por ele iam além de simplesmente
achá-lo atraente ou desejável. Ficou surpresa, considerando o pouco tempo
que o conhecia, mas estava atraída por Nicholas Manning de uma forma
que nunca tinha se sentido atraída por outro homem. Duvidava muito que
isso aconteceria novamente.
Um pensamento horrível lhe ocorreu e ela virou-se para encará-lo
novamente.
— Quem?
Não precisava elaborar. Ele sabia exatamente o que ela estava
perguntando.
— Kerrick.
Era como se ele a tivesse esbofeteado. De alguma forma, ela manteve a
voz calma.
— Por favor, saia.
Nicholas levantou-se e ergueu as mãos em súplica.
— Louisa…
— Saia. Agora. — Ela não podia suportar ouvir mais sobre isso.
Ela observou como as mãos dele caíram nas laterais de seu corpo e se
moveu em direção à porta. Ele parou com a mão na maçaneta e, por um
momento, pensou que ele não fosse sair. A tola romântica nela esperava que
ele fosse desmentir tudo. Que dissesse que não esperava ou queria que ela
fizesse uma coisa daquelas. Que a queria apenas para si.
No final, após apenas um momento de hesitação, ele abriu a porta e
saiu. Louisa se segurou apenas o suficiente para atravessar o cômodo e girar
a fechadura. As lágrimas então vieram. Não se importando que ela ainda
estava completamente vestida, arrastou-se até a cama e puxou as cobertas
sobre seu corpo.
 
Capítulo 11

NA MANHÃ seguinte, Louisa pensou em pedir que lhe levassem uma


bandeja, mas decidiu não fazer isso. Não podia se esconder do marido para
sempre. Preparando-se para enfrentá-lo, dispensou sua criada depois de se
vestir e foi para a sala de café da manhã. Ficou mais do que um pouco
aliviada ao saber que ele já tinha comido e saído para um passeio logo cedo
pela manhã, e se perguntou se ele normalmente acordava cedo. Percebeu
mais uma vez o quão pouco sabia sobre Nicholas. Dado que ele claramente
não desejava ter um casamento convencional, era provável que sempre
permanecessem estranhos.
Como a nova Marquesa de Overlea, os deveres de supervisionar a casa
agora recaíam sobre ela. No entanto, como Lady Overlea não esperava que
ela voltasse de sua lua de mel tão cedo, os menus já estavam definidos para
a semana e não havia muito o que fazer. A viúva prometera repassar com
ela seus novos deveres em breve, mas já havia prometido a Catherine, que
estava se divertindo muito aprendendo sobre as plantas exóticas abrigadas
na estufa, que passaria a manhã com ela.
Sem nada melhor para fazer, Louisa decidiu explorar a casa sozinha. Era
o fim da manhã e ela estava na galeria examinando a longa linhagem de
ancestrais Manning quando Sommers a encontrou e a informou que ela
tinha visita. Ele apresentou o cartão de visita e ela gemeu interiormente
quando viu que pertencia a Elizabeth Manning, a mãe de Edward Manning.
Temendo o encontro, ela foi até a sala de estar e encontrou a tia de
Nicholas e sua prima Mary sentadas no sofá. Elas estavam envolvidas na
conversa, mas suas vozes eram muito baixas para ouvir o que estavam
dizendo. Ela as observou do corredor, sem ser detectada, por alguns
segundos. Pela expressão impaciente no rosto da mulher mais velha, soube
que não seria uma visita amigável. Ambas as mulheres esperavam que
Nicholas propusesse à Mary. Ainda assim, ela agora fazia parte da família
Manning e, sem dúvida, as veria com frequência. Este primeiro encontro
seria estranho. Nenhuma das duas tinha ido ao baile de Overlea e a última
vez que as viu foi para tirar as medidas do vestido de manhã que ela havia
sido contratada para fazer para Mary. Ainda assim, esperava que, uma vez
que passassem por esse primeiro encontro, tudo ficaria bem.
Ela respirou fundo e entrou no cômodo.
— Milady — disse ela, fazendo uma breve reverência antes de virar-se
para a mulher mais jovem. — Senhorita Manning. Que surpresa agradável.
Elizabeth Manning deu-lhe um olhar que estava longe de ser cordial. A
expressão de Mary, no entanto, era impossível de ser lida. Elizabeth
levantou-se enquanto Louisa entrava na sala.
— Minha filha e eu estamos aqui para lhe desejar felicidades pelo seu
casamento. Se soubéssemos que o baile que minha sogra organizou
recentemente era em homenagem ao casamento do meu querido sobrinho,
teríamos recusado o convite que nos afastou de casa.
Louisa percebeu que as palavras da mulher não eram sinceras, mas
agradeceu mesmo assim.
— Nós temos um pedido a fazer a você — Elizabeth continuou. — No
passado, Lady Overlea nos permitia tirar mudas de algumas de suas plantas.
Já que agora está no comando da casa, achei que deveria entrar em contato
com você antes de continuar pegando mais mudas. Receio que algumas das
plantas mais exóticas não se saiam muito bem sem o sol extra que recebem
aqui em seu jardim de inverno, mas Mary ama as plantas, então
continuamos tentando.
— Ah, é claro — disse Louisa, correndo para tranquilizá-la —, mas não
há necessidade de ser tão formal. Afinal, agora somos uma família.
— Fico feliz que pense assim — disse Elizabeth Manning com um
sorriso que não era nada genuíno. Ela virou-se para a filha. — Por favor,
Mary, seja uma querida e vá pegar as plantas. Se vir sua avó, talvez possa
convencê-la a se juntar a nós para uma visita.
— Sim, mamãe — disse Mary, com os olhos baixos enquanto se
apressava para sair da sala
Elizabeth esperou que a filha fosse embora antes de deixar cair sua
máscara de civilidade. Louisa procurou algo para dizer para aliviar o clima
tenso.
— O clima está surpreendentemente quente para esta época do ano.
Pergunto-me se teremos um inverno tardio.
A expressão no rosto de Elizabeth era de desprezo.
— Eu deveria parabenizá-la por conseguir seduzir meu sobrinho.
Louisa ficou chocada com a hostilidade escancarada da outra mulher.
Ela sabia que a tia de Nicholas se ressentiria do fato de ele ter escolhido se
casar com ela, mas não esperava ser insultada tão abertamente.
— Não enganei Nicholas — disse ela, fazendo seu melhor para manter
seu tom uniforme. — Na verdade, ninguém ficou mais surpreso do que eu
quando ele me pediu em casamento.
— Acho difícil de acreditar. — Quando Louisa não respondeu, ela
continuou: — Quando é o nascimento do bebê?
A audácia da pergunta a surpreendeu. Abandonando sua tentativa de
pacificar a mulher mais velha, ela se endireitou e respondeu com mais força
do que pensava ser capaz:
— Isso não é da sua conta.
Um brilho entrou nos olhos de Elizabeth.
— Vejo que estou certa.
Seu olhar viajou para a barriga de Louisa, mas o estilo solto de seu
vestido esconderia facilmente uma gravidez precoce. Louisa se irritou com
o escrutínio da outra mulher, ressentindo-se da insinuação de que ela era
uma mulher traiçoeira que prendera Nicholas para se casar com ela.
— Se quer saber, não estou grávida.
A última coisa em que Louisa queria pensar era a questão do futuro
herdeiro do marquesado. Se Nicholas persistisse em seu desejo de não ter
um casamento verdadeiro, era inevitável que ela nunca tivesse um filho.
Esse pensamento trouxe consigo uma pontada de dor.
Louisa não tinha ouvido a avó de Nicholas entrar na sala de estar até
que o olhar de Elizabeth se desviou para a porta.
— Que bom vê-la novamente, Elizabeth — Lady Overlea disse
enquanto atravessava a sala para cumprimentar a nora. Então virou-se para
Louisa e perguntou: — Ainda está se sentindo mal, minha querida? Espero
que essa dor de cabeça não esteja atormentando você.
Levou um momento para perceber que Lady Overlea estava falando
com ela. Ela deve ter ouvido parte de sua conversa com Elizabeth e estava
lhe dando uma desculpa para ir embora. Ela poderia tê-la abraçado. Em vez
disso, levou a mão à têmpora.
— Sim, infelizmente — disse ela.
— Bem, tenho certeza de que Elizabeth vai entender se você for
descansar. Vamos entreter uma à outra na sua ausência.
Louisa deu um beijo na bochecha de Lady Overlea e despediu-se da tia
de Nicholas antes de sair da sala. Antes de buscar refúgio em seu quarto, ela
foi para a biblioteca. Um bom livro era apenas a distração que ela precisava
no momento.
Ela parou abruptamente na soleira quando viu Lorde Kerrick no
cômodo. Ele estava sentado em uma poltrona, lendo. Aparentemente, tivera
a mesma ideia. Ele olhou para a chegada dela e sorriu.
— Lady Overlea — disse ele, fechando o livro e colocando-o sobre a
mesa ao lado dele. — Estava esperando uma oportunidade para falar com
você.
Ela estava tentada a usar sua desculpa de dor de cabeça para ir embora,
mas havia algo na expressão dele que a fez ficar.
Ele levantou-se, mas não se aproximou dela. Ela deixou a porta aberta
antes de se mover mais para dentro da biblioteca.
— Nicholas falou contigo?
Parece que não havia um lugar que ela pudesse ir para se esconder desse
assunto doloroso.
— Na noite passada — respondeu ela.
Ele suspirou.
— Pela sua expressão, deduzo que a discussão não correu bem.
Louisa achou impossível avaliar a intenção por trás das palavras de
Lorde Kerrick.
— Como você esperava que essa conversa fosse?
— Bem, imagino que tenha jogado algo nele. Ou talvez tenha lhe dado
um chute.
Louisa não pôde deixar de sorrir com suas palavras.
— Receio que não.
— Está considerando a sugestão dele?
Seu estômago pesou com a pergunta.
— Lamento desapontá-lo. O único homem com quem vou… — Sua voz
vacilou quando o calor inundou suas bochechas. — Pretendo permanecer
fiel aos meus votos de casamento.
Era alívio no rosto de Lorde Kerrick?
— Fico feliz!
Ela estava bem e verdadeiramente confusa.
— Pensei que você queria… — Ela se debateu em busca de palavras.
Um olhar de horror cruzou o rosto dele.
— Meu bom Deus, não. Apesar do que Nicholas lhe disse, e apesar do
que ele queira acreditar, acho que ele me mataria se continuássemos com
este esquema. E devo acrescentar que estou aliviado por ele ter escolhido
tão bem sua esposa.
Por mais que ela quisesse, ela não tinha certeza se poderia acreditar
nele.
— Está errado. Meu marido parece muito ansioso para que eu conceba
um filho com outra pessoa. Com você.
Ela não podia acreditar que estava ali, discutindo uma coisa tão íntima
com um estranho. Toda a situação em que ela se encontrava era ridícula.
Presa em um casamento com alguém que mal conhecia, alguém que queria
muito conhecer melhor, mas que aparentemente não a queria. Ela ficou
surpresa com a intensidade das emoções que a dominaram quando Nicholas
a beijou. Foi um golpe perceber que o marido não sentia nem um pouco do
que ela sentia. Se o fizesse, não teria sido capaz de sugerir que ela se
tornasse íntima de outra pessoa.
— Não posso acreditar que estamos tendo essa conversa — disse ela,
cobrindo as bochechas quentes com as mãos.
O sorriso no rosto de Lorde Kerrick era gentil.
— Senti-me da mesma maneira quando ele me falou sobre isso pela
primeira vez. E agora que a conheci… — Ele balançou a cabeça. —
Nicholas é um tolo maior do que eu pensava que fosse possível.
Louisa afastou-se dele antes de continuar:
— É óbvio que ele não sente nada por mim.
Lorde Kerrick foi por trás dela, colocou as mãos em seus ombros e a
virou gentilmente para encará-lo. Quando ele falou, sua voz era suave,
porém firme:
— Não acho que isso seja verdade.
— Tem que ser. Ele deve ter me escolhido para ser sua esposa porque
sabia que não teria dificuldade em me permitir fazer isso.
Ela odiava estar discutindo isso com aquele homem. Dada a posição
difícil em que Nicholas colocara os dois, no entanto, ela não tinha escolha.
— Vi o jeito que seu marido olha para você. Acredito que ele pode se
importar mais do que gostaria de admitir.
— Não — disse ela, balançando a cabeça.
— Sim — disse ele, com mais firmeza. — Há uma maneira de descobrir
com certeza.
Louisa não tinha certeza se gostava do brilho nos olhos dele, mas a
promessa em suas palavras era demais para ela resistir.
— Como? — perguntou, incapaz de manter a ponta de esperança, por
mais tola que fosse, em sua voz.
Ela observou enquanto Lorde Kerrick ia até a porta. Ele olhou
rapidamente para o corredor antes de fechá-la com firmeza e virar-se para
responder à pergunta.
— Daremos a ele o que acha que quer.
Ela não sabia o que esperar, mas definitivamente não eram essas
palavras. Ela balançou a cabeça. — Não, absolutamente não.
— Claro que não — disse ele com um estremecimento exagerado. —
Afeiçoei-me bastante ao meu esconderijo E mesmo que Nicholas me
permitisse mantê-lo depois, tenho certeza de que não seria mais bem-vindo
aqui.
— Então o que propõe exatamente?
— É bem simples. Nós dois faremos o papel que ele quer que
desempenhemos. — Quando ele viu a reação negativa dela a essa sugestão,
ele apressou-se em acrescentar: — Não até o fim que ele escolheu. Não, eu
não vou fazer isso com ele. Apenas o suficiente para fazê-lo pensar que
estamos seguindo seu plano. Se ele me perguntar novamente sobre minha
decisão, direi a ele que estou disposto a prosseguir se você também
concordar. Já que nós dois sabemos que isso nunca vai acontecer, não seria
mentira.
— E eu?
— Pode dizer a ele o que quiser. Tanto pode dizer que não se decidirá
até me conhecer melhor, ou pode optar por não discutir o assunto.
Ela ainda estava insegura.
— E em que isso nos ajudaria?
— Quando seu marido teimoso nos vir cada vez mais próximos, quando
ele acreditar que você e eu nos alinharemos com seu plano, acho que seus
verdadeiros sentimentos por você aparecerão. Nicholas pode estar sendo
caridoso no momento, mas ele não será capaz de manter seu ciúme sob
controle. Não tenho dúvidas de que seus verdadeiros sentimentos virão à
tona. Só espero que ele não venha a me odiar muito quando isso acontecer.
Pela primeira vez desde que Nicholas a rejeitou na noite de núpcias,
Louisa sentiu uma verdadeira faísca de esperança. Lorde Kerrick estaria
correto? Ele conhecia seu marido melhor do que ela. Seria possível que ele
não fosse tão indiferente a ela quanto queria que ela acreditasse? Ela se
lembrou novamente dos beijos que deram. Quão perto eles chegaram de
consumar o casamento na manhã seguinte à noite de núpcias. Se houvesse a
menor chance de o plano de Lorde Kerrick levar seu marido a perceber que
queria o que ela queria, um casamento de verdade, sabia que tinha que
concordar com ele.
Ela estava prestes a dizer isso a ele quando ouviu um barulho na porta
da biblioteca. Ela começou a se virar para ver quem estava prestes a entrar
quando Lorde Kerrick deu um passo mais perto dela e agarrou suas mãos
nas dele.
Quando a porta se abriu, ele soltou a mão dela e deu um passo para trás.
Preocupada que um dos servos tivesse visto Lorde Kerrick segurando suas
mãos, Louisa virou-se para a porta e ficou horrorizada ao ver seu marido
ali.
Seu rosto era uma máscara sem emoção. Ele curvou-se brevemente,
desculpou-se por interromper e saiu, fechando a porta atrás de si.
Ela virou-se para encarar Lorde Kerrick.
— Fez isso intencionalmente.
— Fiz — disse ele. — Se quisermos forçar Nicholas a revelar seus
verdadeiros sentimentos, teremos que despertar seu ciúme.
Ela considerou a falta de reação do marido um motivo para esmaecer a
esperança que havia experimentado momentos antes.
— Ele não pareceu se importar.
— Oh, ele definitivamente ficou surpreso e nem um pouco feliz em nos
ver juntos. Peguei um lampejo disso antes que ele disfarçasse.
— Ele ficou surpreso porque eu disse que nem consideraria isso. E
agora nos viu juntos.
— Tenha fé. Nicholas é teimoso. Ele está escondendo seus sentimentos
até de si mesmo. Temo que isso possa levar um pouco de tempo.
Louisa endireitou os ombros e assentiu, decidida a seguir com o plano
de Lorde Kerrick.
— Posso pedir sua permissão para chamá-la pelo seu nome de batismo?
Ela ficou surpresa com o pedido.
— Nós não nos conhecemos tão bem…
— Sim, mas acho que vai incomodar seu marido.
Ela considerou por um momento.
— Tem certeza?
— Tem três opções, Lady Overlea. Durma comigo agora e termine com
isso, mande-me embora ou arrume um pretexto para atiça-lo. Se escolher a
primeira, acho que ambos nos consolidaremos no desfavor de seu marido
para sempre. Com a segunda, Nicholas continuará a evitá-la e nunca terá
um casamento de verdade. Escolha a terceira, no entanto, e poderá
descobrir a profundidade dos sentimentos dele a seu respeito. E com
alguma sorte, Nicholas ainda estará falando comigo depois que isso
terminar
Ele estava certo. Das três opções abertas para ela, havia apenas uma que
ela poderia escolher.
— Quando começamos?
— Já começamos. Deveria ir agora. Dada a sua reação quando ele se
aproximou de você ontem, Nicholas espera que se sinta culpada depois de
ser pega sozinha comigo. Não seria certo se ficasse aqui.
— Espero que estejamos fazendo a coisa certa — disse ela antes de se
virar para sair.
— Assim como eu — respondeu Lorde Kerrick.

LOUISA TEVE o cuidado de manter distância de Lorde Kerrick pelo resto


do dia. Por sua vez, Nicholas continuou a evitá-la. Claro, ele a estava
evitando há algum tempo, então não tinha como saber se seu
comportamento atual era devido à cena que ele testemunhara na biblioteca.
O jantar foi um assunto constrangedor. Louisa não queria preocupar a
irmã com a verdade sobre o relacionamento dela e de Nicholas, mas estava
claro que ela sentia que algo estava errado. Catherine sempre foi intuitiva,
captando o humor dos outros com muita facilidade. Ela tagarelava
alegremente, porém, sem dúvida em uma tentativa de levantar o ânimo de
todos os outros.
Louisa falou muito pouco. Seu olhar se desviou para o marido, que
estava sentado em silêncio na cabeceira da mesa, pelo que parecia ser a
centésima vez. Tentou adivinhar seu humor, mas era impossível. Ao
contrário do que Lorde Kerrick havia sugerido, ele não mostrou nenhum
sinal de ciúmes. Parecia calmo e controlado.
Lorde Kerrick brincava com Catherine. Louisa podia ver a paixão na
expressão da irmã quando ela olhava para ele. Kerrick parecia estar se
divertindo, mas poderia muito bem estar dando um show para o marido
dela. Ela olhou para Nicholas novamente e o pegou olhando para seu amigo
com uma carranca no rosto. O olhar dele se voltou para encontrar o dela e
sua expressão voltou para sua máscara impassível. O sinal revelador de
emoção tinha sido tão breve que ela se perguntou se tinha imaginado.
Depois do jantar, juntou-se a Catherine e à marquesa viúva na sala de
visitas. Nicholas e Lorde Kerrick ficaram para trás, e Louisa não pôde
deixar de se perguntar se estavam discutindo sobre ela.
Como fizera na noite anterior, Catherine foi imediatamente ao piano e
começou a tocar. Eles tinham um piano forte no chalé até o ano anterior,
quando tiveram que vendê-lo depois que seu pai adoeceu. Na época,
Catherine disse que não se importava, mas ver a alegria em seu rosto
enquanto sentava-se no banco do piano, dizia a Louisa que ela sentia muita
falta.
Louisa sentou-se em um sofá e pegou um lenço novo que planejava
bordar. Fazia anos que ela não fazia qualquer tipo de bordado além de
remendar, e estava ansiosa pelo trabalho decorativo como uma mudança de
ritmo bem-vinda. A avó de Nicholas sentou-se ao lado dela. Estavam
ouvindo em silêncio Catherine tocando por cerca de um minuto quando
Lady Overlea virou-se para ela e perguntou:
— Há algo errado entre você e meu neto? — Sua voz estava baixa para
que Catherine não ouvisse.
As mãos de Louisa pararam no bordado e levou vários segundos antes
que ela pudesse encontrar o olhar da mulher mais velha.
— Não é algo que eu possa discutir com a senhora — disse ela quando
finalmente respondeu.
Os lábios de Lady Overlea se apertaram em uma linha fina.
— Vou falar com meu neto e resolver o assunto.
— Oh, não, por favor, não se preocupe — disse ela, ansiosa para
tranquilizar a mulher mais velha. — É apenas um mal-entendido.
Ela não achava que Nicholas aceitaria bem que a avó interferisse em sua
vida romântica.
Lady Overlea olhou para ela. Ficou claro que ela estava medindo suas
palavras quando falou novamente:
— Você sabe da doença dele?
Ela estava prestes a admitir que havia testemunhado duas crises, mas
algo a impediu. A avó de Nicholas não teria feito a pergunta se ele tivesse
lhe contado sobre isso, e Louisa imaginou que ele estava tentando protegê-
la de qualquer preocupação adicional.
— Sim — disse ela.
Lady Overlea apenas acenou com a cabeça em resposta. Por um
momento, Louisa teve medo de ser submetida a mais um sermão sobre a
necessidade premente de um herdeiro, mas Lorde Kerrick entrou na sala
naquele momento. Seu olhar passou por ele quando a forma alta de seu
marido entrou na sala. Ela ficou novamente impressionada com o quão
bonito ele era. Com seu cabelo escuro e olhos escuros, ele tinha a aparência
de um anjo sombrio. O anjo sombrio dela. Só que ele estava fazendo tudo
ao seu alcance para empurrá-la para outro homem.
Uma percepção horrível veio sobre ela quando ela encontrou o olhar de
Nicholas. Não sabia como ou por que, já que mal o conhecia, mas tinha
certeza de uma coisa: ela se importava muito com ele. Talvez até o amasse.
Naquele momento ela sabia que faria o que fosse necessário para descobrir
se Nicholas Manning tinha um pouco de afeto por ela.
Olhando de seu marido para Lorde Kerrick, não podia dizer o que havia
se passado entre eles durante os poucos minutos que passaram juntos antes
de se juntarem a elas na sala. Nenhum deles mostrou qualquer sinal de
terem tido um desentendimento. Lorde Kerrick encontrou seu olhar e lhe
deu um sorriso tranquilizador antes de voltar sua atenção para Catherine,
juntando-se a ela ao piano. Louisa percebeu o rubor revelador de sua irmã
sob sua atenção.
Louisa começou a bordar enquanto ouviam a irmã tocar, mas estava
muito consciente do marido. Ele ficou ao lado da lareira, mantendo-se
distante dos outros na sala. Às vezes ela quase podia sentir os olhos dele
sobre ela, mas quando ela olhava por cima de seu trabalho, ele estava
sempre olhando para outro lugar. Sofreu para não estender sua mão para
ele. Sabia que tal abertura não seria bem-vinda.
Catherine terminou sua peça sob aplausos entusiásticos de Lorde
Kerrick. Ela corou novamente e levantou-se.
— Seria maravilhoso se pudéssemos jogar whist — disse Catherine. —
Não jogamos há tanto tempo. Não desde que papai adoeceu e não tínhamos
mais quatro jogadores.
Um sorriso tocou os lábios de Louisa quando ela se lembrou dos jogos
frequentes de sua família.
— Que ideia esplêndida — disse Lorde Kerrick. Ele virou-se para
Louisa e continuou: — Como o único convidado presente, vou me impor a
sua hospitalidade, Nicholas, e reivindicar a adorável nova marquesa como
minha parceira.
Um brilho de alegria dançou em seus olhos. Louisa olhou para o marido
e ficou animada ao ver um breve lampejo de aborrecimento cruzar seu
rosto.
Nicholas virou-se para Lady Overlea.
— Gostaria de formar o quarteto, vovó? Sei o quanto a senhora gosta de
uma boa partida de whist.
Lady Overlea balançou a cabeça e levantou-se, seus movimentos eram
lentos.
— Esforcei-me hoje e acho que deveria retirar-me mais cedo.
Catherine ficou alarmada com suas palavras.
— Sinto muito — disse ela. — Eu me empolguei olhando todas as
plantas na estufa. Nunca pensei em ver aqueles exemplares fora das páginas
de um livro.
— Eu me diverti — disse Lady Overlea. — Tanto que esqueci que não
sou tão jovem quanto antes.
Depois que a avó se despediu, Nicholas virou-se para Catherine.
— Isso me deixa com a honra de fazer parceria com você.
Catherine sorriu largamente e liderou o caminho até a mesa de jogo.
Em circunstâncias normais, Louisa teria gostado do jogo. Catherine
estava de bom humor e Lorde Kerrick flertava descaradamente com as
duas. Nicholas realmente fez um esforço para participar da conversa, mas
era óbvio para todos que seu coração não estava no jogo.
No final, ela e Lorde Kerrick venceram. Ele fez questão de comentar
sobre o bom time que eles formavam e sorriu largamente para ela. Ela
devolveu o sorriso, mas não pôde deixar de lançar um olhar para o marido.
Ele não achara graça.
Louisa levantou-se e disse:
— Acho que também vou me retirar agora.
Ela podia sentir os olhos de sua irmã sobre ela enquanto dava boa noite
a todos e fugia para seu quarto, respirando aliviada quando o alcançou.
Estava longe de estar cansada e pegou um livro para ler, mas descobriu que
estava muito tensa para seguir a história. Em vez disso, andou de um lado
para o outro na frente da lareira, permitindo que o calor do fogo a
envolvesse. Tudo em que conseguia pensar era em perceber que amava
Nicholas. E com essa descoberta, se pegou pensando cada vez mais na
morte dele.
Uma batida suave na porta de seu quarto a tirou de seu devaneio. Ela
virou-se a tempo de ver um pedaço de papel dobrado sendo deslizado por
baixo da porta, seguido pelo som de passos se afastando.
Ela atravessou o cômodo e abaixou-se para pegar o bilhete. Ela fez uma
pausa quando ouviu passos no corredor e prendeu a respiração quando eles
pararam do lado de fora de sua porta. Não podia deixar de esperar que fosse
Nicholas. Quando os passos continuaram, ela soltou a respiração em uma
onda de decepção.
Ela olhou para o bilhete em sua mão onde seu nome estava escrito. Ela
desdobrou o pedaço de papel e leu a breve mensagem:
 
Encontre-me na biblioteca em trinta minutos.
~K
 
A próxima meia hora se arrastou enquanto ela se perguntava o que
Lorde Kerrick queria dizer a ela que eles ainda não haviam discutido antes.
Finalmente, quando chegou a hora marcada, ela desceu as escadas. Aliviada
ao chegar à biblioteca sem ter visto ninguém, abriu a porta e entrou.
As velas ainda estavam acesas, mas não havia fogo na lareira. O
cômodo estava vazio e ela se viu esperando mais uma vez. Virou-se quando
finalmente ouviu a porta da biblioteca se abrir e ficou chocada ao encontrar
não Lorde Kerrick, mas seu marido parado ali.
Sua expressão lhe dizia que ele estava com raiva.
— Você estava esperando outra pessoa?
Ela engoliu em seco quando ele fechou a porta e entrou no cômodo,
seus passos medidos. Ameaçador. O brilho estranho nos olhos dele enviou
um arrepio de consciência pela espinha dela.
— Acho que vocês dois decidiram seguir meu plano.
Ela não disse nada. O que poderia dizer? Ela não mentiria para ele, mas
era vital que acreditasse no que a estava acusando.
Ele parou diante dela e ela mal resistiu ao desejo de dar um passo para
trás.
— Teria sido bom se vocês dois tivessem decidido agir com um pouco
mais de discrição. Será um milagre se a equipe já não estiver fofocando
sobre vocês dois lá embaixo.
Enervada pelo calor nos olhos de Nicholas, ela desviou o olhar.
— Diga-me — disse ele, a ameaça em sua voz suave —, vocês dois já
se beijaram? Certamente ainda não foi para a cama dele.
O temperamento dela explodiu com a condenação em seu tom. O que
havia de errado com ele? Era ele quem queria que ela concebesse um filho
com seu melhor amigo, e agora a tratava como se fosse uma prostituta.
Ela inclinou o queixo para cima e encontrou seu olhar uniforme, sem se
incomodar em esconder a própria raiva.
— É o que desejava, não era?
Ela sabia que ele iria tomar isso como uma confirmação. Um músculo
se contraiu ao longo de sua mandíbula e ele deu um passo mais perto.
— Você gostou?
Ela desviou o olhar. O humor de Nicholas era imprevisível e ela não
sabia mais o que ele queria dela.
— Não vou discutir isso com você.
Ela pulou quando ele a agarrou pelos braços.
— Responda-me.
Ela permaneceu em silêncio. Ele abaixou a cabeça até que seus olhos
estivessem nivelados e ela não teve escolha a não ser encontrar o olhar dele.
Ela podia ver a turbulência ali.
— Nicholas — disse ela suavemente, sua raiva evaporando naquele
instante.
Seus olhos se fecharam e ela prendeu a respiração. Seu aperto afrouxou
como se ele quisesse soltá-la, mas então ele xingou e a puxou contra seu
corpo. O próprio ar parecia faiscar ao redor deles. Louisa estava congelada,
com medo de fazer ou dizer qualquer coisa que pudesse fazer com que ele
se afastasse dela.
Ele xingou novamente e baixou a boca para a dela. O beijo foi duro no
início, punitivo em sua intensidade. Ela deu as boas-vindas, no entanto.
Boas-vindas a beijá-lo e ser segurada contra ele. Ansiava por seu toque,
temendo nunca mais recebê-lo.
Seus lábios se separaram e a língua dele surgiu em sua boca. Ela
encontrou a urgência dele com a dela. Ele soltou seus braços e ela os
levantou para rodear o pescoço dele, desesperada para chegar mais perto.
As mãos dele desceram pelas costas dela e acariciaram seu traseiro, e ele a
trouxe firmemente contra ele enquanto continuava o ataque na boca dela.
Ela podia sentir a dureza da excitação dele e sua respiração ficou presa com
antecipação. Ela fez um som baixo no fundo de sua garganta e tentou trazer
seu corpo ainda mais firmemente contra o dele. Seu desejo era uma coisa
viva.
Quase tão rápido quanto começou, acabou. Ele puxou sua boca da dela
e olhou para ela, com a respiração em raspas audíveis. A respiração dela
estava igualmente instável.
Ele a soltou, deu um passo para trás e desviou o olhar.
— Vá para a cama — disse ele, sua voz irregular.
Ela colocou a mão no braço dele.
— Eu quero ficar.
O silêncio se estendeu entre eles. Ela esperou enquanto ele estava
imóvel, sua postura insuportavelmente reta. Finalmente, sem outra palavra,
ele virou-se e saiu da biblioteca.
Ela só podia olhar para sua figura recuando, o desespero varrendo-a. Ela
pensou que a situação era ruim antes quando acreditava que ele não a
queria, mas isso era muito pior. Mesmo que ele não a amasse, estava claro
que a desejava. Estava igualmente claro, no entanto, que ele lutaria contra
sua atração por ela até o fim.
 
Capítulo 12

NA MANHÃ seguinte, foi abordada por Lorde Kerrick a caminho do café


da manhã.
— Funcionou? — perguntou ele.
Seus lábios se apertaram quando suas suspeitas sobre o encontro da
noite anterior com Nicholas foram confirmadas.
— Planejou tudo, não é?
Ele assentiu.
— Deixei outro bilhete no meio da sua porta para ele encontrar. Achei
que, se ele estivesse irritado o suficiente, não suspeitaria que eu fosse tão
descuidado. Posso imaginar a expressão em seu rosto quando viu que era
você, não eu, esperando na biblioteca.
— Poderia ter me avisado sobre seus planos.
Ele balançou sua cabeça.
— Foi melhor assim para que sua surpresa fosse genuína quando ele
entrasse.
Ela fez uma tentativa de controlar seu aborrecimento. Não era culpa de
Kerrick, afinal, que Nicholas permanecesse inflexível em seguir com seu
plano absurdo.
— Ele estava muito zangado — disse ela depois de um momento.
— Eu não lhe disse? Apesar do que ele diz, não deseja ver nós dois
juntos. — Ele parou quando notou o humor dela. — Você está bem? O que
aconteceu?
Ela hesitou, mas apenas por um momento. Kerrick era a única pessoa
em quem podia confiar.
— Ele queria saber se havíamos concordado com a proposta.
— E o que disse?
— Eu não respondi.
Ele acenou com a cabeça.
— Ele deve ter interpretado como um sim.
— Sim, e então ele…
— E então ele o quê?
— Ele me beijou.
Kerrick soltou a respiração em um assobio baixo.
— Eu sabia! Eu sabia que ele se importava com você. — Sua expressão
ficou sóbria. — Não quero me intrometer, mas preciso saber como as coisas
estão agora entre vocês dois. A última coisa que quero fazer é continuar
fazendo Nicholas acreditar que estou perseguindo você. Não se ele decidiu
que não quer mais que eu o faça.
— Ele foi embora — disse ela, sua voz falhando um pouco antes de
continuar: — Era óbvio que se arrependeu de suas ações. Não acho que ele
vai me beijar novamente.
Kerrick praguejou:
— Maldito seja aquele teimoso. Esse homem irá para o túmulo,
tornando a si mesmo e a todos ao seu redor miseráveis.
— Sim, bem, seja como for, decidi que não vou desistir. Ele pode ter
desistido do nosso casamento antes mesmo de ter começado, mas eu não.
Kerrick sorriu.
— Boa menina.
Eles foram para a sala de café da manhã. Lady Overlea e Catherine já
estavam sentadas, mas as expressões sombrias em seus rostos quando se
viraram para ela causaram um nó de preocupação na boca do estômago de
Louisa.
— Qual é o problema?
— É o Nicholas — disse Lady Overlea. — Uma criada o encontrou esta
manhã em seu escritório. Ele sofreu uma crise.
Pela expressão no rosto da mulher mais velha, Louisa temeu o pior.
— Como ele está? — perguntou ela com um nó na garganta.
— O médico está com ele agora, mas o ataque foi grave. Ele não tem
certeza…
Catherine ficara em silêncio até aquele momento, mas quando Lady
Overlea não pôde continuar, ela interveio:
— Ele não tem certeza se Nicholas sobreviverá ao dia de hoje.
Louisa ofegou. Suas pernas ameaçaram ceder e Kerrick colocou um
braço ao redor de sua cintura para firmá-la. Não, ela se recusava a acreditar.
Ela tinha visto Nicholas na noite anterior e ele parecia bem saudável.
— Onde ele está agora?
— Ele foi transferido para o quarto dele — disse Catherine.
Louisa virou-se e voltou correndo para cima. Kerrick a seguiu em
silêncio, algo pelo qual ficou grata. Tudo o que ela conseguia pensar
naquele momento era em seu marido. Quando chegou ao quarto dele, não se
incomodou em bater e a cena que a encontrou do outro lado da porta quase
fez seu coração parar.
Nicholas estava imóvel na cama, sua pele pálida como a morte. Os
lençóis estavam virados até a cintura e sanguessugas haviam sido
administradas em seu torso. Manchas escuras se destacavam em relevo
contra sua pele muito branca. Seu olhar voou para o médico, que havia
parado com sua entrada. Ela não sabia dizer se ele estava aplicando mais
uma sanguessuga ou removendo as que já haviam começado a cair,
empanturradas com o sangue de seu marido.
— Como ele está? — Ela estava quase com medo de fazer a pergunta.
O médico, um homenzinho de cabelo grisalho, afastou-se dela e colocou
outra sanguessuga no corpo de Nicholas.
— Nada bem. Você não deveria estar aqui.
Ela observou quando ele enfiou a mão em uma jarra e puxou outro
verme. A raiva cresceu dentro dela. Nicholas parecia estar a ponto de
morrer e aquele médico estava fazendo o possível para drenar seu sangue
restante.
— Basta — disse ela.
Ele não parou.
— Você não deveria estar aqui. As mulheres sempre ficam enjoadas
com esta cena. — Ele colocou a sanguessuga no peito do marido dela.
A visão de Louisa ficou vermelha. Sem dizer uma palavra, ela marchou
até o médico e tirou o pote de sanguessugas das mãos dele. Surpreso, ele só
podia olhar para ela em um silêncio atordoado.
— Eu disse basta.
O homem gaguejou por um momento antes de se recompor.
— E quem é você para me dar ordens?
Louisa encontrou seu olhar indignado diretamente.
— Eu sou a Marquesa de Overlea. Como meu marido está doente
demais para falar, farei isso por ele. Você está dispensado.
Ela estendeu o pote de sanguessugas para ele pegar. Ele a encarou, o
rosto vermelho de indignação, mas quando ela não recuou, ele puxou o pote
para longe dela e fechou a tampa. Sem nenhuma outra palavra ou um olhar
na direção dela, ele jogou o frasco em sua bolsa preta de médico e saiu do
quarto. Foi só então que Louisa percebeu que Kerrick e sua irmã a seguiram
até o quarto de Nicholas e testemunharam toda a cena.
— Você tem certeza disso? — perguntou Kerrick.
— Sim, eu o vi em duas dessas crises e ele se recuperou nas duas vezes
com o sangue intacto.
— Mas o médico…
— Lorde Kerrick — disse ela, interrompendo-o —, conheço os
médicos. Eu os vi fazerem meu pai sangrar quase até a morte enquanto
estava doente. Ele nunca melhorou. Tudo o que os sangramentos fizeram
foi enfraquecê-lo ainda mais. Nicholas não pode permitir que a mesma
coisa aconteça com ele. Não se ele vai lutar contra essa doença.
Ela voltou-se para a cama. Empanturradas de sangue, mais algumas
sanguessugas caíram. Ela estava mais preocupada, no entanto, com as que
ainda estavam no corpo, drenando lentamente seu marido.
Kerrick foi até o outro lado da cama.
— Ouvi dizer que o sal faz com que caiam.
Louisa balançou a cabeça.
— Sim, mas antes de caírem, elas regurgitam na ferida.
Kerrick levantou uma sobrancelha.
— Como sabe disso?
— Eu tentei com meu pai e as feridas inflamaram. No entanto, observei
para ver como o médico as removia antes que caíssem por conta própria. —
Ela virou-se para Catherine. — Traga-me o lavatório — disse ela, seu tom
era rápido.
Quando Catherine voltou com ele, ela o colocou na mesa de cabeceira.
— Um selo é criado quando a ventosa se prende ao corpo. Deve quebrar
esse selo de ambas as extremidades da sanguessuga antes de removê-la.
Ela balançou o dedo ao longo da lateral menor da sanguessuga, usando
a unha para quebrar o selo e então varrendo a ventosa. Ela fez o mesmo no
lado maior e soltou um som baixo de triunfo quando a sanguessuga saiu
limpa. Ela largou a sanguessuga na bacia e passou para a próxima.
Kerrick copiou suas ações e os dois trabalharam rapidamente para
remover o resto das criaturas. Quando a última foi removida, Louisa olhou
para o marido. Ele estava tão pálido, sua respiração tão superficial que ela
não podia ter certeza de que ainda vivia. De repente, com medo, ela
inclinou-se sobre ele com o rosto virado para que sua bochecha pairasse
sobre a boca dele. Ela exalou com alívio quando sentiu sua respiração
suave.
— Preciso limpá-lo — disse ela. Catherine saiu para buscar outra bacia
no quarto de Louisa. Quando voltou, Louisa limpou rapidamente o rastro de
manchas de sangue no torso do marido. A tarefa a acalmou, fez com que
sentisse que estava realmente ajudando-o em vez de apenas ficar parada,
impotente. Algumas das feridas feitas pelas sanguessugas continuaram a
escorrer sangue. Felizmente, Catherine havia antecipado a necessidade de
curativos e pediu que alguns fossem levados enquanto Louisa lavava
Nicholas.
Quando o resto do sangue foi lavado e os pequenos ferimentos
enfaixados, Louisa olhou para cima e encontrou o olhar de Kerrick do outro
lado da cama.
— Vou ficar com ele caso precise de alguma coisa. Poderia ver o que
pode ser feito para acalmar Lady Overlea?
— O que acontece agora? — perguntou Kerrick. Ela podia ver a
preocupação genuína na expressão sombria da mandíbula dele.
— Agora esperamos com fé de que ele tenha forças suficientes para se
recuperar. Não sei quanto sangue ele perdeu. — Ela olhou para o marido.
— Nicholas é um homem forte e, apesar dessas crises, está saudável em
todos os outros aspectos. Ele vai sair dessa.
Kerrick assentiu.
— Há algo que eu possa fazer? — perguntou Catherine.
Louisa balançou a cabeça.
— Fique com Lady Overlea. Tente tranquilizá-la. Ela já perdeu um filho
e um neto. Imagino que esteja fora de si de tanta preocupação.
Catherine deu-lhe um abraço rápido antes de sair com Kerrick. Depois
que eles foram embora, Louisa puxou uma poltrona até a cabeceira de
Nicholas e acomodou-se para esperar.

ELE ESTAVA com medo. Este era, sem dúvida, o fim e ele havia deixado
um caso fracassado para trás. Edward seria o próximo Marquês de Overlea.
Pensou em Louisa. Tentou recordar o rosto dela, lembrar da sensação
dela em seus braços, mas tudo estava começando a desaparecer.
O tempo passou e ele se perguntou se já estava morto e ainda não sabia.
Ele parecia estar flutuando em um vazio escuro, sua força diminuindo
lentamente. A certa altura, ele ouviu vozes, mas elas se calaram e ele não
conseguiu entender o que estava sendo dito. Pequenas picadas o atingiram
em todos os lugares e ele sabia que este era o fim. Estava no inferno. Ele se
entregou completamente. Tinha pouquíssima força sobrando.
Ficou confuso no início quando a sensação de muitas bocas pequenas
saindo de seu corpo começou a desaparecer. Talvez tenha sido apenas uma
pausa momentânea antes que a dor piorasse. Sua confusão aumentou
quando o toque frio de uma toalha varreu seu corpo. E então ele podia sentir
o cheiro dela. Louisa. Ele respirou fundo, confortando-se com o
pensamento de que ela estava por perto. E então isso também se foi.
Desolado, ele se afastou ainda mais.
Não sabia quanto tempo ficara sumido antes de começar a perceber que
não estava morto. Abrindo os olhos, piscou algumas vezes para focar a
visão e exalou um suspiro de alívio quando percebeu que estava em seu
quarto. Em sua cama.
Não estava sozinho. Ele virou a cabeça para a direita e sua visão nadou
novamente por um momento.
Louisa.
Ela estava dormindo em uma poltrona ao lado de sua cama. Ele a
encarou, apreciando a oportunidade de tomá-la. Normalmente tentava evitar
olhar para ela ou pensar nela.
A poltrona o encosto em forma de asas e ela havia se acomodado em
um dos cantos. Seu cabelo dourado pálido havia começado a escapar de
seus grampos e vários tentáculos longos emolduravam seu rosto oval
pálido. Suas bochechas estavam coradas por causa do sono e seus lábios
entreabertos.
Lembrava-se muito bem da sensação da boca dela sob a dele. Ficou com
raiva quando descobriu o bilhete que Kerrick havia deixado para ela. Era
uma emoção estúpida e que não entendia completamente. Afinal, fora ideia
dele ter Kerrick como pai de seu futuro herdeiro. Ele havia promovido a
ideia para ambas as partes e estava ansioso pelo acordo. Então por que
havia ficado furioso ao descobrir que os dois tinham combinado de se
encontrar depois que todos fossem para a cama? Ele deveria ter ficado
aliviado.
Na hora, no entanto, pareceu uma traição. Disse a si mesmo que se eles
tivessem ido até ele e revelado que haviam concordado com sua proposta,
não teria se sentido tão enganado. O fato de nenhum deles falar com ele
sobre a aceitação e que estavam tentando organizar encontros secretos pelas
suas costas, o fez se perguntar se havia mais naqueles encontros do que o
arranjo prático que ele havia proposto.
Ao observar os dois rindo durante o jantar, enquanto Kerrick flertava
abertamente com sua esposa, ele percebeu que provavelmente seria muito
fácil para Louisa se apaixonar por seu amigo. E por que ela não deveria?
Seu marido estava sendo um bastardo frio e insensível com ela. Só fazia
sentido para ela buscar consolo do único homem que parecia ansioso
demais para oferecê-lo.
Quando descobriu o bilhete, pensou que Kerrick estava tentando roubar
sua esposa. Estava ciente do absurdo da situação e que era tudo de sua
autoria. Bem, nem tudo. A maior parte provinha da doença amaldiçoada
que ele herdara do pai. A que o fez tirar sua carruagem da estrada, matando
a si mesmo e a mãe de Nicholas.
Observando Louisa agora, aparentemente em paz enquanto dormia,
Nicholas estava dolorosamente consciente do quanto a queria para si. O
pensamento de ela e Kerrick juntos se tornou odioso para ele.
Ele fez um som de desgosto com seus meandros melancólicos e se
mexeu para poder sair da cama. Supôs que não deveria ter ficado surpreso
ao descobrir que não conseguia fazer isso sozinho.
— Nicholas! — exclamou Louisa, despertando completamente e
curvando-se sobre sua forma prostrada. — Você está acordado.
O sorriso enorme que cruzou o rosto dela o deslumbrou por um
momento e ele descobriu que tinha que desviar o olhar para clarear os
pensamentos.
— Claro que estou acordado — disse ele. — Por que diabos não
consigo me sentar? — Ele lutou para se erguer sobre os cotovelos.
O sorriso de Louisa diminuiu um pouco e ele se arrependeu de seu tom
ríspido.
— Está de cama há dois dias e o médico o fez sangrar. Seu corpo
precisa de tempo para recuperar a força.
Ele parou de lutar para se sentar e afundou-se de volta na cama. Dois
dias? Ele nunca tivera uma crise que durasse tanto tempo.
Ela deve ter percebido a preocupação dele, pois apressou-se em
acrescentar:
— Temo que seu médico tenha sido muito zeloso em cumprir seu dever
e eu o mandei embora quando vi o que ele estava fazendo.
Surpreso, ele só conseguiu olhar para ela por vários segundos antes de
encontrar sua voz.
— Mandou-o embora?
— Ele estava fazendo você sangrar — disse ela com uma ponta de raiva
rastejando em sua voz.
— Isso é o que todos os médicos fazem quando não sabem mais o que
fazer.
— Eu sei, vi os médicos fazendo isso algumas vezes com meu pai. E
cada vez ele ficava mais fraco. Eu deveria tê-los detido mais cedo. No final,
ele não tinha força suficiente para lutar para viver. — Seus olhos brilharam
com uma indignação apaixonada quando seu olhar encontrou o dele. —
Não vou permitir que eles façam isso com você. Que o drenem até que
também não tenha mais forças para lutar contra sua doença.
Lembrou-se então de sua certeza de que estivera no inferno. Lembrou-
se da sensação de pequenas criaturas agarradas ao seu corpo e bebendo
dele. Ele também se lembrou da remoção abrupta delas e da sensação das
mãos de Louisa em seu corpo enquanto ela o limpava. O cheiro dela quando
ela inclinou-se sobre ele de novo e de novo, sem dúvida verificando se ele
ainda estava vivo. Ele também se lembrou de que ela havia falado com ele
durante toda a sua provação, embora não conseguisse se lembrar agora do
que havia dito.
Ele olhou para ela com admiração, a intensidade apaixonada de seu
olhar tocando uma corda dentro dele. Percebeu então que já estava perdido.
Estava apaixonado por ela.
Ele desviou o olhar, odiando sua fraqueza. Ela o tinha visto assim
muitas vezes para o seu gosto. E agora as crises estavam piorando. Ele se
perguntou quanto tempo levaria antes que elas o matassem. A ironia da
situação não passou despercebida para ele. Nunca quis ser herdeiro e
sempre foi grato por ter nascido um segundo filho. Também nunca quis se
casar e certamente nunca se considerou um tolo romântico a ponto de se
apaixonar. Agora ali estava ele, o Marquês de Overlea e apaixonado por sua
esposa. E ele nunca viveria o suficiente para desfrutar das duas posições.
— Precisa comer. Vou mandar buscar algo leve. — Ela foi até a
campainha para chamar um criado.
Ele falou sem olhar para ela:
— Obrigado por tudo que tem feito. No entanto, você está claramente
cansada. Tem que se cuidar também. Se convocar Harrison, tenho certeza
de que ele poderá providenciar tudo o que preciso.
Ele estaria mais seguro com seu valete. A última coisa que queria era
pedir a ajuda de sua esposa para ajudá-lo a se sentar. Sabia que não corria o
risco de puxá-la para a cama com ele, não em sua condição atual. Permitir
que Louisa continuasse cuidando dele, no entanto, especialmente à luz de
sua recente descoberta sobre seus sentimentos por ela, adicionaria um nível
de intimidade ao relacionamento deles que seria difícil de afastar. Por mais
que odiasse só de pensar nisso, esta última crise significava que era
imperativo que seguissem com seu plano original para Louisa conceber um
herdeiro com Kerrick.
Ela ficou em silêncio e Nicholas cometeu o erro de olhar para ela. Todo
o seu comportamento havia endurecido e percebeu que a havia machucado.
Novamente. A mulher quente, sonolenta e feliz que acabara de acordar
havia ido embora. Em seu lugar estava uma mulher que estava se tornando
muito hábil em manter-se distante dele.
KERRICK FICOU aliviado ao ouvir uma criada dizendo a um lacaio que
Lorde Overlea estava se sentindo melhor. Ele realmente temia que Nicholas
morresse. Quando encontrou Louisa na sala do café da manhã, porém, esse
alívio rapidamente se transformou em aborrecimento. Ela não iria contar o
que tinha acontecido, mas estava claro que estava chateada.
Sem se preocupar em perguntar se o amigo estava disposto a receber
visitas, foi direto para o quarto de Nicholas depois do café da manhã, bateu
bruscamente e entrou. Nicholas estava, de fato, parecendo melhor. Sua pele
não tinha mais aquela aparência cinzenta horrível e ele estava sentado na
cama ao lado dos restos de sua bandeja de café da manhã.
Nicholas largou o jornal que estava lendo e levantou uma sobrancelha.
— Parece que nos últimos dois dias as pessoas se acostumaram a entrar
no meu quarto sempre que dá vontade.
Kerrick sorriu. Apesar do fato de que Nicholas era um tolo teimoso,
Kerrick se confortou ao vê-lo com uma boa aparência.
— Você esteve por um fio — disse ele.
— Ouvi falar sobre isso.
— Espero que tenha percebido que pode muito bem dever sua vida à
sua esposa.
Nicholas franziu a testa.
— Todos estão me dizendo isso.
— Todos?
— Minha avó também esteve aqui — disse ele com um suspiro
exagerado. — Ela realmente quer que eu concorde em não me mover sem
supervisão. Nem mesmo na minha própria casa. Consegue imaginar? Eu
com uma babá, na minha idade?
Era óbvio que ele estava tentando aliviar o clima, mas Kerrick não
estava com disposição para brincar sobre a situação. Ele foi até a poltrona
onde Louisa ficara durante a doença do marido e afundou-se no assento.
— O que aconteceu, Nicholas?
Seu amigo soltou um suspiro áspero e recostou-se.
— Sabe o que aconteceu — disse ele, os cantos de sua boca virando
para baixo. — Tive uma crise. Uma criada me encontrou e o médico foi
chamado. Saberia melhor do que eu, já que fiquei inconsciente a maior
parte do tempo.
Kerrick observou o amigo atentamente. Ele sempre sabia quando
Nicholas estava mentindo ou escondendo algo e seus instintos lhe diziam
que ele estava escondendo algo agora.
— Você também pode me contar. Não vou embora até que faça isso.
— Eu poderia mandá-lo embora.
— Poderia, mas não vai.
Nicholas não se deu ao trabalho de negar.
— Preciso falar com você sobre Louisa — disse ele.
Então é isso. Ele vai me dizer que reconsiderou seu pedido ridículo de
que eu seja pai de um filho que ele reivindicaria como herdeiro, pensou
Kerrick. Ele teve o cuidado de manter a expressão neutra enquanto esperava
que o amigo continuasse.
— Pareceu-me antes desta última crise que os dois tinham ou estavam
prestes a chegar a um entendimento sobre minha proposta.
Ele não respondeu. Ele queria saber o que seu amigo estava pensando
primeiro.
— Pelo amor de Deus, Kerrick, não vai me responder?
— Desculpe, isso foi uma pergunta? Parecia mais uma declaração.
Nicholas fez uma careta.
— Tem sorte de eu estar muito fraco para sair desta cama agora.
Kerrick decidiu que agora talvez não fosse o melhor momento para
testar a paciência do amigo. Ele não tinha dúvidas de que Louisa o
estrangularia com as próprias mãos se sua provocação fizesse com que seu
marido sofresse uma recaída.
— Se quer saber — disse ele —, ela ainda não me disse se está disposta
a fazer isso. E você já sabe que não vou pressioná-la.
— Então decidiu que o melhor curso de ação é cortejá-la abertamente
em minha própria casa?
— Não estou cortejando; estou tentando conhecê-la. Você dificilmente
pode esperar que ela concorde em se deitar com um homem que mal
conhece. Outra mulher poderia fazer isso, mas sua esposa não. Até eu sei
disso pelo pouco tempo que passei na companhia dela.
— Meu cérebro não ficou confuso com este último episódio. Vi você
em ação e sei quando está cortejando uma mulher.
Isso é bom, pensou ele. Nicholas estava definitivamente aborrecido e
isso só podia ser porque queria Louisa para si.
— Se preferir, eu sempre posso ir embora. Não gostaria de exceder sua
hospitalidade.
Nicholas pareceu lutar para dizer as próximas palavras:
— Não — disse ele. — Não quero isso.
— Então o que quer?
— Quero isso tudo acabado imediatamente. Quero que Louisa já esteja
grávida de seu filho e então quero fazer o meu melhor para esquecer essa
coisa toda.
Kerrick ficou atordoado.
— Você deseja que continuemos?
— Preciso que pergunte a ela de uma vez por todas se ela vai fazer isso
ou não. Certamente ela já o conhece bem o suficiente. E dado o que
aconteceu, reconhecerá que o tempo não é um luxo que temos.
— Mas você acabou de me dizer… — Ele não conseguiu encontrar as
palavras para continuar. Não conseguia acreditar que Nicholas desejava
continuar com tal absurdo, principalmente porque estava tão claro para
todos os envolvidos que ele estava odiando cada segundo.
— Eu disse que não quero que o mundo inteiro veja você cortejando
minha esposa. Não quero que haja qualquer dúvida sobre a paternidade do
filho de Louisa.
Embora estivesse no papel há pouco tempo, Nicholas vestiu sua
imperiosa fachada de marquês. Kerrick odiava quando fazia isso, pois o
forçava a colocar sua própria máscara formal. Já era bastante cansativo ter
que fazer isso com o resto do mundo. Ele odiava quando tinha que
representar o papel do Conde de Kerrick com seus amigos.
— Como quiser, Overlea. Farei o possível para seduzir sua esposa e
depois me retirar de sua presença. Com alguma sorte, não terei que voltar
no próximo mês ou em nove se ela tiver uma menina. — Ele pegou o aperto
reflexivo das mãos do amigo. Isso é bom, pensou ele. — Acho que você ia
me dizer o que está escondendo.
Quando Nicholas permaneceu em silêncio, Kerrick pensou que não iria
responder. Apesar de seu aborrecimento com a obstinação colossal do
amigo, ele não tinha intenção de sair do quarto até descobrir o que Nicholas
estava escondendo.
— Você sabe que meu pai e meu irmão também sofreram com essas
crises.
Kerrick assentiu. Nicholas estava muito preocupado com a saúde deles.
— Eu também lhe disse que as crises eram frequentemente
desencadeadas ou agravadas pelo consumo de álcool.
Kerrick franziu a testa.
— Sim, mas isso não se aplicaria aqui porque sei que está sendo
cuidadoso.
A boca de Nicholas se torceu com ironia.
— Não exatamente.
Kerrick praguejou. Incapaz de ficar parado por mais tempo, levantou-se
e começou a andar de um lado para o outro. Ele não podia acreditar no que
estava ouvindo.
Ele virou-se para encarar Nicholas.
— Deixe-me entender, está mesmo me dizendo que está bebendo?
Mesmo sabendo o que aconteceu com seu pai e irmão?
— Já tive algumas crises sem beber.
— Sim, mas dane-se. Que inferno, Nicholas! Por que seria tão
imprudente? Deseja morrer? — Um pensamento horrível lhe ocorreu. —
Meu Deus, não vai me dizer que estava à beira da morte nos últimos dois
dias porque andou bebendo?
Nicholas permaneceu em silêncio, o que Kerrick tomou como uma
confirmação. Horror e culpa o inundaram quando percebeu que a culpa era
sua. Ele tinha feito isso com o amigo. Seu joguinho para tentar fazer
Nicholas perceber que se importava com a esposa o levou longe demais.
Louisa lhe dissera que ela e o marido haviam se beijado naquela noite na
biblioteca. Ela também disse a ele que o beijo não fez diferença para o
marido. Que ainda estava determinado a seguir em frente com seu plano
para seu herdeiro. Isso só podia significar que Nicholas estava bebendo para
tentar tirar essa confusão horrível da mente. Para esquecer o beijo que dera
na esposa. Um beijo que poderia nunca ter acontecido se ele não tivesse
planejado provocar o ciúme de Nicholas e unir ele e Louisa deixando
aqueles bilhetes malditos.
 
Capítulo 13

LOUISA TENTOU não pensar muito no que tinha acontecido naquela


manhã. Ficou tão aliviada quando abriu os olhos e encontrou Nicholas
lutando para se levantar… por um momento, ela se viu incapaz de respirar.
Quando ele a dispensou, doeu. Ela percebeu então que seus sentimentos,
quaisquer que fossem, não importavam. Ele pode ter ficado com ciúmes,
mas claramente estava determinado a manter um muro impenetrável entre
eles.
Depois do beijo que compartilharam, era óbvio para ela que ele a
desejava fisicamente. A sensação de suas mãos em seu corpo quando ele a
apertou contra ele, a sensação de sua excitação pressionando contra sua
barriga… ela queria que aquele beijo durasse para sempre. Em vez disso,
ele a deixou de lado, assim como naquela manhã.
Ela não esperava vê-lo naquele dia. Ele não queria que ela percebesse,
mas estava mais fraco do que gostaria de admitir. Sabia que levaria tempo
para ele se recuperar. Não se podia chegar tão perto da morte como ele sem
sentir as consequências depois.
Louisa resistiu à vontade de vê-lo depois do jantar. Aliviada por seu
neto ter sobrevivido ao ataque, Lady Overlea fizera questão de procurá-lo
com frequência. Louisa teria que confiar na avó dele para saber sobre o
progresso do marido.
Nicholas estava certo sobre uma coisa: depois de ficar ao lado da cama
dele por dois dias, estava exausta. Ela se manteve ocupada o dia todo, mas
naquela noite, adormeceu quase antes de sua cabeça encostar no travesseiro.
Acordou na manhã seguinte revigorada, mas então o medo tomou conta
dela enquanto considerava o longo dia pela frente. Suspirando, saiu da cama
e chamou sua criada para ajudá-la a se vestir.
Lorde Kerrick se juntou a elas para o desjejum naquela manhã. Depois
de ver Nicholas no dia anterior, ele saiu e não tiveram a chance de
conversar. Olhando para o homem agora, teve a nítida impressão de que
estava tentando evitá-la. Quando o homem levantou-se da mesa do café
para sair, ela pediu licença e o seguiu até o corredor. Ele estava saindo
novamente.
— Lorde Kerrick — chamou ela.
Ele parou e virou-se para ela, seus movimentos curiosamente
cautelosos.
— Lady Overlea — disse ele com uma reverência abreviada.
Ela franziu a testa. Algo definitivamente estava errado.
— Posso lhe falar por um momento? — perguntou ela, consciente do
fato de que eles estavam sendo observados pelo lacaio.
— Eu tinha outros planos…
— Serei breve. Diz respeito ao meu marido.
Viu a relutância em seus olhos, mas ele finalmente concordou com a
cabeça. Ela liderou o caminho até a biblioteca. Queria fechar as portas, mas
sabia que não seria apropriado. Em vez disso, fez seu caminho para o centro
do cômodo grande para que eles não fossem ouvidos antes de virar-se para
Kerrick.
— Mudou de ideia — disse ela.
— Parcialmente.
— O que isso significa? Por que está me evitando? — Ela quase riu do
absurdo da situação em que se encontrava. — Todo mundo está pisando em
ovos ao meu redor. Todos parecem saber de algo que está acontecendo, mas
ninguém quer falar sobre isso. Não sei se estão tentando poupar meus
sentimentos ou se têm pena de mim.
— Ninguém quer machucá-la.
— Incluindo você — disse ela suavemente.
Ele assentiu.
— Vai me dizer o que aconteceu? Foi algo que eu disse ou fiz?
— Não, absolutamente não. Não é a culpada. Na verdade, temo que eu
seja.
Não estava fazendo sentido.
— Não estou entendendo.
Ele fechou os olhos brevemente antes de abri-los novamente e olhar
diretamente para ela.
— A última crise de seu marido, aquela que quase o matou… Deus,
odeio ter que dizer isso. Foi culpa minha.
Ela só podia olhar para ele. O que ele estava dizendo?
— Não consigo enxergar como pode ser culpado pelo que aconteceu
com meu marido. Ele tem uma condição médica. Esta não é a primeira vez
que a doença o fez perder a consciência, embora eu acredite que seja a crise
mais grave que ele já sofreu.
Ele ficou parado por um momento, olhando para outro lado. Quando
olhou para ela novamente, toda a sua postura se enrijeceu como se estivesse
se preparando. Para quê, ela se perguntou. Sua condenação?
— Eu sei sobre as crises de Nicholas. Já até testemunhei uma — disse
Kerrick.
— Então sabe sobre sua condição médica. Claramente, não poderia ser
culpado pelo que aconteceu.
Ele balançou a cabeça.
— Pelo contrário. — Ele exalou bruscamente e continuou: — Nicholas
me disse que as crises podem ocorrer quando ele bebe. Ele viu a mesma
coisa acontecer com seu pai e irmão e aconteceu com ele.
— Deu a ele algo para beber? — perguntou ela, franzindo a testa.
— Não diretamente, mas eu sou o responsável por ele estar bebendo.
Naquela noite, aquela em que ele desmaiou… bem, sabe que eu planejei
provocar o ciúme dele. Para que ele se declarasse. Achei que estava sendo
tão inteligente.
— E estava — concordou ela. — Sou grata que tenha feito isso. Aquela
noite me confirmou que ele tem sentimentos por mim. No mínimo, sei que
ele não me acha pouco atraente.
Lorde Kerrick sorriu com isso.
— Duvido muito que alguém ache isso.
Ela corou com o elogio e ele continuou:
— Temo que minhas manobras naquela noite o levaram ao limite.
Ela balançou a cabeça.
— Isso é um pouco extremo. Ele não me machucou. Na verdade, muito
pelo contrário — disse ela, seu rubor se aprofundando.
— Sim, mas percebe? Nicholas admitiu para mim que bebeu naquela
noite depois que a deixou. Deus! — Ele virou-se e caminhou até a janela
distante. Louisa ficou atordoada quando a importância de suas palavras a
derrubou. — Ele nunca vai ceder. E esta última crise só fortaleceu sua
determinação. A única coisa que meu jogo estúpido conseguiu foi levar
meu melhor amigo a fazer exatamente o que poderia acabar matando-o.
— Não — disse ela, vendo como ele estava angustiado. — Não. Isso
não foi culpa sua. E lembre-se, eu concordei em seguir seu plano.
— Eu o levei para aquelas bebidas, Louisa — disse ele com uma voz
sombria. — Tão certo como se eu mesmo tivesse pegado a garrafa e
colocado na mão dele.
A raiva saltou dentro dela como uma besta de várias cabeças. Como ele
ousava? Nicholas sabia que beber era a última coisa que deveria fazer e
continuou a fazê-lo mesmo assim. Ele estava tentando se matar? Estar na
presença dela era tão difícil para ele?
Ela moveu-se para ficar diante de Kerrick.
— Não tem culpa disso — disse ela. — Ele tem. Ele concebeu este
plano. Casou-se comigo depois de me levar a acreditar que queria que eu
carregasse o herdeiro dele. Herdeiro dele. Que piada — disse ela com uma
risada curta e amarga. — Em vez disso, creio que ele quer me entregar ao
melhor amigo. Quem ele pensa que é?
Agora era sua vez de sair andando. Quanto mais ela pensava sobre isso,
mais irritada ficava. Tinha que fazer alguma coisa. Ela não sabia o que
exatamente, não a princípio, mas então algo surgiu em sua mente. Ela parou
e voltou-se para Lorde Kerrick.
— Nós vamos superar isso — disse ela com uma voz firme e
determinada. — Todos nós.
Ela deixou um Kerrick de boca aberta parado na biblioteca e desceu as
escadas para cuidar do assunto.

DEPOIS DE passar um dia em seu quarto, Nicholas decidiu se aventurar


no andar de baixo na tarde seguinte. Ele havia se recuperado de sua crise de
fraqueza, mas não gostava da ideia de fazer uma grande aparição no jantar.
Se a reação de seu valete ao vê-lo na manhã anterior fosse um alerta, ele
sabia que seria alvo de olhares e de uma curiosidade ávida dos funcionários
da casa. Poderia muito bem tirar isso do caminho agora. Mostrar a todos
que não era um inválido.
Mas não Louisa. Ele a veria no jantar, mas por enquanto faria o possível
para evitá-la. A revelação da profundidade de seus sentimentos por ela
ainda o inquietava.
Ficou surpreso com a rapidez com que se cansou novamente. Sommers,
os lacaios e algumas criadas já o tinham visto e ele sabia que logo se
espalharia para o resto da equipe que ele estava melhor. Depois de visitar a
avó, decidiu ir à estufa visitar a cunhada. Ainda não podia ver Louisa, mas
esperava saber como ela estava.
Encontrou Catherine debruçada sobre alguns livros que estavam abertos
sobre uma pequena mesa na estufa, um pequeno caderno e um lápis ao seu
lado. Parecia que ela levava muito a sério a catalogação de todas as plantas
da coleção de sua avó. A avó adorava as cores e os aromas das plantas
exóticas que adquirira ao longo dos anos, mas nunca se deu ao trabalho de
aprender mais sobre elas.
Catherine sorriu quando o viu, lembrando-o de sua irmã quando ele
acordou na manhã anterior, e ele sentiu uma pontada em algum lugar perto
de seu coração.
— Estou tão feliz em vê-lo de pé, milorde — disse ela.
Ele estalou.
— Nicholas, lembra? Agora somos uma família.
— Claro — disse ela com um sorriso.
Uma pequena covinha apareceu na bochecha dela e ocorreu-lhe que não
sabia se Louisa também tinha uma. Ela raramente teve a oportunidade de
sorrir na presença dele, e ele estava muito confuso na manhã anterior para
ter notado.
Cheia de um entusiasmo borbulhante por sua tarefa, Catherine ficou de
pé e começou a acompanhá-lo em um passeio. Estava animada para
compartilhar as informações que descobrira sobre algumas das plantas, mas
depois de alguns minutos ele teve que fingir que questões prementes da
propriedade precisavam de sua atenção. Além de se sentir um pouco
cansado por estar em pé por tanto tempo, o cheiro avassalador de todas as
flores exóticas estava começando a deixá-lo tonto. Por um momento
horripilante, temeu estar prestes a sofrer outra crise e quase correu para as
portas que davam para o jardim. Assim que escapou do espaço
superaquecido com seu perfume avassalador, começou a respirar um pouco
mais facilmente. O ar fresco do outono clareou sua mente e um alívio
profundo o percorreu quando sua tontura desapareceu completamente.
Irritado por obviamente ainda estar sentindo os efeitos de sua última crise,
ele deu a volta para a frente da casa.
Foi capaz de ir para seu escritório sem esbarrar em Louisa, e lá ele
fechou a porta e se encostou nela de olhos fechados. Ele se sentiu mais do
que um pouco tolo. Estava realmente se escondendo em sua própria casa
com medo de uma mulher pequena, embora muito bonita. Alguém que
sabia que nunca machucaria ninguém intencionalmente, mas que tinha feito
mais do que qualquer um ou qualquer outra coisa para destruir sua paz de
espírito.
Se ele ia passar o resto do dia escondido em seu escritório, ele poderia
muito bem tentar fazer algum trabalho. Seu mordomo havia deixado um
plano descrevendo melhorias e reparos propostos para várias das casas de
inquilinos que precisariam ser concluídos quando a primavera chegasse.
Isso ainda estava a vários meses de distância, mas ele não podia garantir
que sua saúde duraria tempo suficiente para ele supervisionar os negócios
imobiliários mais tarde. Muita coisa ficou relegada a segundo plano pelos
dois últimos marqueses depois que eles adoeceram, um logo após o outro, e
ele não queria que a mesma coisa acontecesse durante seu mandato.
Ele abriu os olhos, virou-se para sua mesa e congelou. Sentada atrás
dela estava a única pessoa que estava evitando. Louisa.
Ela parecia muito diferente da mulher que estivera no quarto dele na
manhã anterior. Aquela mulher tinha sido calorosa, convidativa e muito
tentadora. A mulher diante dele agora era seu oposto completo. Seu cabelo
estava preso, nem uma mecha fora do lugar, e seu vestido era de um azul
rico que acentuava sua palidez e cabelos louros. Também destacava seu
comportamento frio.
Ela recostou-se na cadeira com os braços cruzados e a expressão
ilegível.
— Queria discutir algo comigo? — perguntou ele quando ela
permaneceu em silêncio.
— Na verdade, sim.
Ele assistiu com descrença quando ela indicou que ele deveria tomar a
cadeira de convidados. Estava muito aborrecida. Apesar do fato de que ele
deveria estar assim, ele se viu curioso sobre este lado da esposa. Teve um
vislumbre disso quando ela desafiou as convenções de viajar sozinha até
sua casa para pedir sua ajuda com seu primo. Ele não tinha visto nada
parecido desde então.
Ele sentou-se sem dizer uma palavra e esperou que ela continuasse.
— Falei com Lorde Kerrick esta manhã.
As mãos de Nicholas se apertaram nos braços da cadeira antes que ele
se obrigasse a relaxar e permanecer impassível. Suas palavras, porém,
caíram como um golpe no estômago. Levou alguns segundos antes que
pudesse se forçar a falar a mentira que era necessária.
— Fico feliz em saber que vocês dois chegaram a um acordo.
Ela olhou para ele como se ele tivesse perdido os sentidos.
— Ele me contou, Nicholas.
Ele não tinha ideia do que ela estava falando.
— Já expliquei tudo a você. O que mais havia para contar?
Ela fez um som de desgosto. Um lampejo de uma emoção sem nome
cruzou seu rosto, mas ela o mascarou rapidamente. Por alguma razão, isso o
deixou triste. Parecia que ele a havia ensinado muito bem para manter-se
distante dele. Era necessário, é claro, mas lamentou a perda de sua antiga
franqueza.
— Isso é tudo em que consegue pensar? Você está realmente tão ansioso
para que eu me deite com Lorde Kerrick que não lhe ocorreu que eu poderia
estar falando de outra coisa?
Ele ignorou a piada.
— Desejo que o assunto seja resolvido.
Ele nunca tinha falado palavras mais verdadeiras. Ele queria que aquela
provação ficasse para trás. Desejou que ela já estivesse grávida de um filho
que, com sorte, seria seu herdeiro. Não achava que poderia passar por isso
novamente se ela concebesse uma menina. O pensamento dela e Kerrick
juntos, compartilhando os mesmos beijos apaixonados que os dois
compartilharam, as mãos de Kerrick em seu corpo, cobrindo-a…
Pensamentos sobre uma relação sexual entre os dois o atormentavam sem
fim.
— Ele me disse que sua doença piora quando você bebe. Ele também
me informou que você admitiu que estava bebendo na noite em que
adoeceu. — A fachada calma dela desapareceu enquanto falava para ser
substituída por uma pitada de raiva. — Por que, Nicholas? Por que você
faria uma coisa dessas?
Ele não respondeu de imediato. O que deveria dizer? Que estava
bebendo porque odiava a ideia de ela dormir com Kerrick, ou com qualquer
outro homem? Que ele estava bebendo para bloquear o conhecimento de
que tinha que continuar pressionando para que isso acontecesse, apesar do
fato de que cada fibra em seu ser gritava com ele para torná-la sua de uma
vez por todas? Que ela o estava deixando absolutamente louco?
— Eu não estava exatamente pensando nas consequências na hora.
Ela poderia fazer dessa declaração o que quisesse. Ele não iria discutir
isso. Então ele continuou:
— Se já terminou de ser minha mãe, tenho trabalho a fazer. Pretendo me
encontrar com o comissário amanhã e tenho que analisar algumas de suas
propostas primeiro.
Sua expressão mudou e Nicholas se encolheu quando viu a compaixão
ali. A última coisa que ele queria era a pena dela. Preferia sua raiva.
— É muito cedo para isso, Nicholas. O que quer que você precise
discutir, tenho certeza de que pode esperar pelo menos mais alguns dias. —
Ela levantou-se e deu a volta na mesa para ficar diante dele. Colocou a mão
em seu braço e continuou: — Você parece cansado. Talvez devesse ir
descansar agora.
O calor do toque dela queimou o tecido do casaco dele. Por um
momento, ele só podia ficar ali e respirar seu perfume suave enquanto
lutava contra o desejo de puxá-la para si. Era verdade que estava um pouco
cansado, mas tinha certeza de que tinha energia suficiente para finalmente
derrubar a parede que havia entre eles. Uma parede inteiramente construída
por ele.
No final, ele deu um passo para trás e a mão dela caiu.
— Se você me der licença — disse ele, movendo-se ao redor dela e
caindo no assento que ela havia abandonado.
Ele não a observou enquanto ela atravessava o cômodo. Antes de sair,
ela virou-se e esperou até que ele olhasse para ela.
— Instruí o pessoal a limpar qualquer bebida que você mantenha aqui e
na biblioteca. Eles também descartaram as garrafas da adega.
Ela saiu sem esperar por sua resposta
Nicholas enterrou a cabeça nas mãos. Se sua doença não o fizesse
primeiro, sua esposa seria o motivo de sua morte.

O JANTAR FOI um momento sombrio. Lady Overlea presumiu que


Nicholas estava jantando em seu quarto, mas Sommers informou a Louisa
que ele havia saído pouco antes do jantar. No entanto, Louisa manteve essa
informação para si mesma. Ela sabia que a mulher mais velha ainda estava
preocupada com o neto, mas se preocuparia mais se soubesse que ele estava
longe de casa. Louisa estava bem preocupada com os dois, embora sua
preocupação fosse parcialmente dissipada pelo fato de ele ter levado a
carruagem e um cocheiro.
Lorde Kerrick também havia saído mais cedo e ainda não havia voltado
para casa. Louisa não ficou surpresa, pois agora ele parecia determinado a
ficar longe dela para não provocar mais Nicholas. Catherine fez beicinho
quando soube que ele ficaria fora novamente, mas se recuperou
rapidamente. Ela continuou a conversa durante o jantar, compartilhando o
que tinha aprendido sobre algumas das plantas mais exóticas do
conservatório.
Louisa nunca se interessou muito por jardinagem, e assim seus
pensamentos voltaram para o marido. Ela o conhecia a tão pouco tempo e
haviam passado a maior parte desse período separados, mas de alguma
forma não conseguia imaginar sua vida sem ele. Sua própria presença
chamava a atenção. Ele não era um homem que pudesse ser ignorado, e se
algo lhe acontecesse, ela sabia que sentiria profundamente sua perda.
Como se por mútuo consentimento, todos foram para seus quartos
depois do jantar. Uma vez lá, o olhar de Louisa pousou, como sempre
acontecia, na porta que ligava seu quarto ao de Nicholas. Sabia que a porta
estava destrancada, mas nem ela nem Nicholas a tinham usado. Nem
mesmo quando ele estava doente e ela passava a maior parte do tempo em
seu quarto. Não parecia certo. Usar a porta de ligação era muito íntimo.
Algo que um verdadeiro casal usaria para passar a noite com seu cônjuge.
Ela e Nicholas não tinham esse tipo de relacionamento, então ela usou o
método mais formal de entrar no quarto dele pela porta do corredor.
Estava muito tentada a usar aquela porta de conexão agora. Ela se
preocupava com a condição em que seu marido estaria quando voltasse para
casa. Estaria doente de novo ou apenas cansado depois de se esforçar tão
logo após sua última crise? E o que faria se a encontrasse esperando por ele
em seu quarto? Deu uma pequena risada autodepreciativa por sua
imaginação. Se ele não estivesse tendo outra crise quando voltasse para
casa, ficaria irritado e a mandaria de volta para seu quarto.
Chamou sua criada e se preparou para dormir. Estava muito preocupada
para tentar adormecer até saber que Nicholas já estava em casa, então se
acomodou na cama para ler. Deve ter adormecido em algum momento,
porque a próxima coisa que ela percebeu foi um barulho que a fez acordar
sobressaltada. Uma olhada rápida no relógio lhe disse que já passava da
meia-noite.
O barulho veio de novo - passos no corredor. Ela sentou-se e guardou o
livro que estava aberto ao lado dela em sua cama. Ouviu o murmúrio de
uma voz, depois a de Nicholas em resposta enquanto passavam pela porta
do quarto. Precisando ver por si mesma se ele estava bem, foi até a porta,
abriu-a e olhou para o corredor. Nicholas e seu valete estavam diante da
porta de seus aposentos, e viraram ao mesmo tempo para olhá-la. Ela deu
um passo à frente, então congelou quando viu a expressão no rosto de seu
marido.
Culpa.
A fúria a dominou e roubou sua voz. Incapaz de falar naquele momento,
ela voltou para seu quarto e bateu a porta.
Andou por algum tempo, sua raiva crescendo a cada minuto que
passava. Ela ouviu as vozes abafadas dos dois homens no quarto ao lado e
se perguntou o quanto Nicholas havia bebido.
O murmúrio finalmente parou e o som abafado de uma porta se
fechando disse a ela que Harrison havia saído. Enquanto o silêncio do outro
lado da porta se estendia, a preocupação começou a superar sua raiva. E se
Nicholas sofresse outra crise e não fosse descoberto novamente até de
manhã? Ela foi até a porta que ligava seus quartos, mas parou, indecisa,
diante dela. Se ele não estivesse doente, não aceitaria sua intrusão.
Estava se afastando da porta, seus ombros caídos em desânimo, quando
um estrondo alto soou. Os últimos vestígios restantes de sua raiva e
incerteza evaporaram quando visões de Nicholas desmoronando e deitado
às portas da morte no quarto ao lado passaram por sua mente. Sem pensar
duas vezes, ela abriu a porta de ligação e passou por ela. Nicholas estava
sentado na beirada da cama, a cabeça apoiada nas mãos. A origem do
acidente logo se tornou evidente. Uma cadeira estava deitada de lado na
base de uma parede de gesso que agora tinha marcas do impacto da cadeira.
Preocupada mais com sua postura do que com o sinal inconfundível de sua
raiva, ela deu vários passos para dentro do quarto. Congelou, no entanto,
quando Nicholas levantou a cabeça e olhou para ela. Seus olhos, escuros
com uma emoção sem nome, pareciam ver através dela.
Incerta agora quanto ao seu humor, ela passou a língua nos lábios em
um gesto nervoso. Os olhos dele se moveram brevemente para a boca dela e
sua mandíbula se apertou.
— Eu temia que pudesse estar doente. — Embora tenha falado
suavemente, suas palavras pareciam quase altas demais no silêncio que
ameaçava engolir os dois.
Ele simplesmente ficou ali sentado, imóvel, seu olhar atento fixando-a
onde ela estava. O olhar dele varreu o corpo dela e Louisa percebeu que
estava ali apenas de camisola. Aquela feita para sua noite de núpcias que
era transparente e mostrava muito mais do que estava costumava exibir. A
intimidade da situação era quase demais para suportar. Nicholas parecia à
beira de se zangar e, esperando uma breve dispensa, ela deu um passo para
trás.
— Se não precisa da minha ajuda, vou voltar para o meu quarto agora.
 
Capítulo 14

ELA VIROU-SE para sair, mas Nicholas não estava pronto para deixá-la ir.
Movendo-se rapidamente, ele levantou-se e cruzou o espaço que os
separava para alcançá-la e fechar a porta antes que pudesse escapar. Ela
ficou ali de frente para a porta fechada, mas sua atenção estava focada na
proximidade do corpo dele a poucos centímetros atrás do dela. Sua mão
permaneceu na porta, e agora sua outra mão também se aproximou para
pressioná-la, efetivamente prendendo-a. Ela não conseguia se mexer. Ele a
cercou, o calor de seu corpo a alcançando para envolvê-la.
Ela respirou fundo e virou-se para ele. Ela estava muito perto e deu um
passo para trás, mas parou quando suas costas encontraram a madeira sólida
da porta. Ela olhou nos olhos de Nicholas. Estavam mais escuros que o
normal, quase pretos. E o calor dentro deles… Ela estremeceu, mas se era
de nervosismo ou antecipação, ela não sabia dizer.
Sua respiração ficou presa quando ele abaixou a cabeça. No último
momento, pouco antes de seus lábios encontrarem os dela, moveu a cabeça
para o lado e levou a boca contra sua orelha. O calor de sua respiração teve
um efeito estranho nela, fazendo com que precisasse estar ainda mais perto
dele.
— Diga-me, Louisa, está aqui para bancar minha mãe?
Ela balançou a cabeça, incapaz de responder.
— Então por que está aqui e vestida apenas com isso?
Sua voz tremeu quando ela respondeu:
— Eu… eu ouvi a cadeira cair. Eu queria ter certeza de que não estava
doente novamente.
Ele exalou suavemente em seu ouvido, causando arrepios na espinha
dela.
— Deveria ter ficado segura em sua própria cama.
A voz dele era baixa com um tom de ameaça, mas ela soube naquele
momento que o último lugar que queria estar era sozinha em sua cama fria.
Queria estar ali, com Nicholas. Ele estava enganado se pensava que a estava
assustando. Ignorando a pequena voz de advertência em sua mente que lhe
dizia que corria o risco de ser rejeitada mais uma vez, ela colocou as mãos
no peito do marido. Ele ficou estranhamente imóvel. Encorajada, ela
separou as bordas de seu roupão para revelar que ele não estava vestindo
uma camisa. Ela podia sentir a parte superior de seu corpo subindo e
descendo. A respiração dele ficou tão irregular quanto a dela. Fascinada
pela visão dele, e incapaz de parar agora, ela empurrou mais as bordas e
colocou as mãos em seu peito nu. Ele era tão diferente dela, mais largo,
seus músculos sólidos sob seu toque.
Ela moveu as mãos para os ombros dele, depois de volta para baixo e
ele ainda estava sob suas carícias. O roupão estava totalmente aberto agora
e viu que ele ainda estava de calça. O fato de ele não a ter afastado deu-lhe
mais coragem, e ela moveu as mãos mais para baixo para traçar os
músculos bem definidos de seu abdômen. Perguntou-se até onde teria que ir
antes que Nicholas a afastasse ou finalmente a levasse para a cama dele.
Tentando não pensar em sua rejeição, ela arrastou as mãos para baixo.
Quando alcançou a borda da calça, ele a deteve segurando seus pulsos. Ele
se afastou, olhando para ela com uma expressão ilegível. Ela inalou
bruscamente quando notou o aperto de sua mandíbula e o brilho de suor em
sua testa.
— Você não está bem?
Foi um momento antes que respondesse:
— Não.
Ela passou a língua nos lábios e notou, novamente, que seu olhar foi
atraído para o pequeno movimento.
— Me permite ajudá-lo? Ou prefere que eu chame outra pessoa para
cuidar de você?
Ele continuou olhando-a, seu corpo completamente imóvel e ela
começou a se perguntar se ele iria desmaiar. Quando finalmente falou, ela
levou um momento para perceber o que estava dizendo.
— Acho que isso é algo que só você pode me ajudar.
Ele trouxe os braços dela para envolver seu pescoço. Incapaz de
acreditar no que estava acontecendo, ela se agarrou a ele quando ele a
soltou. Um arrepio de antecipação passou por ela quando ele segurou seu
rosto em suas mãos.
— Eu não sou forte o suficiente para mandá-la embora novamente.
Preciso que seja forte o suficiente por nós dois.
Ela balançou a cabeça.
— Não esta noite, Nicholas. Nunca mais.
Ele gemeu e fechou os olhos brevemente, como se estivesse com dor,
antes de colocar sua boca na dela. Ela podia sentir o gosto do álcool em seu
hálito, mas não se importava mais que ele tivesse bebido. Ela mesma estava
intoxicada com o conhecimento inebriante de que Nicholas não a negaria.
Que finalmente admitiu querê-la.
Ele foi gentil no início. Seus polegares acariciaram ao longo da linha de
suas bochechas enquanto seus lábios bebiam dos dela. Em vez de se
preocupar com o marido, ela agora temia que suas próprias pernas
cedessem e fosse desmaiar. Agarrou-se ao pescoço dele e pressionou-se
contra seu corpo.
As mãos dele deixaram seu rosto e se estabeleceram na cintura dela. Ela
suspirou com a sensação deliciosa de suas mãos acariciando-a ali através do
tecido fino de sua camisola antes de se mover mais para cima.
— Diga-me para parar, Louisa — disse ele contra a boca dela.
— Não — disse ela com um som de negação. — Por favor, não pare.
Ela se viu pressionada contra a porta, as mãos dele cobrindo seus seios.
Ele segurou seu peso e seus polegares desenharam círculos
enlouquecedores ao redor de seus mamilos. Ela ofegou e a língua dele
surgiu em sua boca, aprofundando seu beijo. Ela fez um som suave de
encorajamento e se empurrou mais firmemente em suas mãos.
Seus dedos pararam, então suas mãos se moveram para os ombros dela.
Ele levantou a cabeça para olhar para ela e ela pôde ver o desejo escuro
refletido em seus olhos. Ele respirou fundo e, por um momento ela entrou
em pânico, certa de que ele iria afastá-la novamente. Em vez disso, seus
dedos pegaram as bordas da camisola e ele começou a arrastar a roupa pelos
braços dela. Hipnotizada, só conseguia olhar para ele enquanto observava o
progresso do material quase transparente deslizando por seu corpo. Quando
passou por seus seios, ela viu o tique de um músculo ao longo da mandíbula
dele. Ficou imóvel quando ele soltou o tecido que caiu no chão com um
sussurro suave. Estava com medo de se mexer, quase com medo de respirar,
para que o momento não se transformasse em um sonho cruel do qual ela
logo acordaria.
Nicholas também ficou parado, olhando para ela. Então como se
finalmente tivesse decidido que esse momento sempre fora inevitável,
inclinou-se e a pegou nos braços. Sentindo-se um pouco constrangida, ela
enterrou o rosto em seu ombro enquanto ele a carregava até a cama, ciente
de sua pele pressionada contra seu peito nu. Ele a deitou suavemente na
cama e deu um passo para trás para olhá-la. Deitada diante dele sem
nenhuma peça de roupa, ela sentiu como se fosse morrer de vergonha.
— Nicholas — disse ela, uma sensação de urgência correndo por seu
corpo.
Ele deveria saber o que ela queria. Ela observou em silêncio enquanto
ele tirava o roupão, seus movimentos refletindo seu próprio senso de
urgência. Ele desabotoou a parte de baixo da calça e tirou-a, e então tirou a
roupa de baixo que estava vestindo. Foi a vez de ela olhar enquanto ele
estava nu à sua frente.
Ele era tudo o que ela não era. Duro onde ela era suave e escuro onde
ela era clara. Seu olhar se moveu rapidamente para aquela parte dele onde
ele era mais diferente, mas ao vê-la, ela se perguntou se a consumação de
seu casamento seria muito dolorosa. No entanto, recusou-se a insistir nesse
pensamento. Isso era algo que ela queria pelo que parecia uma eternidade.
Ele se abaixou na cama, seu corpo sobre o dela, mas ainda sem a tocar.
Sua cabeça mergulhou e sua boca cobriu a dela. Alívio e desejo a varrendo,
ela levou as mãos aos seus ombros e se agarrou a ele, retribuindo o beijo
com um fervor crescente. Ele fechou o espaço entre seus corpos, e ela
ofegou ao sentir sua pele quente na dela. Seu peito musculoso pressionou
contra seus seios e aquela parte mais íntima dele roçou contra a coxa dela.
Nada jamais pareceu tão maravilhoso.
Sua boca deixou a dela e arrastou uma linha de beijos em seu pescoço.
Ele continuou descendo até que seus lábios cobriram seu seio. Ele puxou
seu mamilo, e ela pôde sentir o puxão da boca dele diretamente em seu
núcleo.
Cobriu o seio dela com uma mão e com a outra começou um
movimento lento e agonizante pelo interior de sua coxa. Ela se contorceu, o
tumulto de sensações quase demais para suportar.
Sua boca voltou para o pescoço dela enquanto a mão continuava seu
movimento implacável. Ficou tensa por um momento, então abriu as pernas
quando a mão alcançou a junção de suas coxas. O choque a congelou
quando a tocou ali. Ele a separou com os dedos e começou um lento
movimento de vai e vem que logo a fez esquecer seu constrangimento.
Nicholas ergueu a cabeça para olhá-la enquanto deslizava um dedo
profundamente em seu interior.
Queria tranquilizá-lo, dizer que estava bem, mas na verdade não estava.
Mexeu-se inquieta enquanto ele continuou, primeiro um dedo, depois dois
movendo-se dentro dela enquanto seu polegar circulava em um ponto de
sensibilidade quase dolorosa do lado de fora.
Ela gemeu e puxou a cabeça dele para beijá-lo.
— Goze para mim, Louisa — disse contra a boca dela, aumentando o
ritmo de suas carícias.
E então tudo desmoronou para ela. Ela ofegou de surpresa, mas ele
captou o som com a boca. Então a mão dele a deixou e ela fez um som
suave de decepção. Ele agarrou os joelhos dela e afastou mais suas pernas
para que ele pudesse se acomodar entre elas.
— Mal posso esperar — disse ele, sua voz apertada com o esforço para
se conter.
Ela colocou a mão na bochecha dele.
— Eu quero isso também.
O sexo inchado dele cutucou sua excitação e ela instintivamente moveu
seus quadris para que pudesse senti-lo mais completamente. Não havia nada
no mundo além de Nicholas quando ele começou a empurrar para dentro
dela. Seu corpo se abriu para aceitá-lo. Ela tinha se esquecido de que
deveria temer sua primeira vez com um homem, mas a pontada aguda de
dor a lembrou.
Ela endureceu, seus dedos afundando nos músculos dos braços dele
quando ele se colocou completamente dentro dela. Vendo o desconforto
dela, ele parou.
— Sinto muito — disse ela, temendo tê-lo desapontado.
— Está tudo bem, Louisa. Aqui, deixe-me…
Ele colocou a mão entre eles e começou, novamente, a acariciar aquele
ponto sensível logo acima de onde seus corpos estavam unidos. Sua boca
capturou a dela em um beijo acalorado que a fez se esquecer da dor quando
seu sangue começou a esquentar novamente.
Ela fez um som suave de angústia quando ele removeu sua mão
novamente e começou a puxar para fora dela, pois estava com medo de que
ele fosse parar porque estava preocupado com ela. Quando ele voltou para
ela, no entanto, ela poderia ter chorado de alegria. A dor tinha diminuído
para uma dor surda, e isso também se tornou uma memória distante
enquanto ela se deliciava com a sensação gloriosa de ser preenchida por ele
repetidamente. Ela se moveu com ele, combinando com seus impulsos e ele
murmurou seu consentimento:
— Louisa. — Ele levantou a cabeça e olhou para ela novamente, seus
olhos refletindo a profundidade de sua paixão.
O ritmo de seus impulsos se acelerou e, sentindo como se estivesse
girando fora de controle, ela o envolveu com suas pernas e braços. Nunca
imaginou que tal prazer fosse possível.
Desta vez, quando ela atingiu o ápice, chamou o nome dele e o levou
com ela.

LOUISA ACORDOU na manhã seguinte com um sorriso no rosto.


Murmurando o nome do marido, rolou na direção dele. Ela franziu a testa
quando percebeu que estava de volta em seu quarto. Levou um momento
antes de se lembrar de acordar em um ponto durante a noite para se
encontrar nos braços do marido enquanto ele a carregava de volta para seu
quarto, mas ele não a tinha deixado lá. Ele se juntou a ela em sua cama e,
apesar do fato de ela ter se sentido um pouco carinhosa, eles fizeram amor
novamente.
Ela levantou-se e pegou o roupão para se cobrir, lembrando que sua
camisola ainda estava no quarto de Nicholas. Foi até a porta que ligava seu
quarto ao dele, perguntando-se brevemente se era um mau sinal que a porta
estivesse fechada. Deixando de lado suas dúvidas, abriu a porta e entrou no
quarto dele. Corou quando seu olhar encontrou o da criada que estava
trocando os lençóis da cama do marido. A mancha reveladora de seu sangue
nos lençóis chamou sua atenção e tudo o que pôde fazer foi esconder seu
constrangimento. Logo todo o pessoal da casa saberia que ela e Nicholas
não tinham feito amor até a noite anterior.
— Lorde Overlea desceu para o café da manhã?
— Não, milady — respondeu a criada com uma reverência. — Ele foi
para os estábulos.
Ela agradeceu à jovem e voltou para seu quarto. Ela se perguntou se
Nicholas tinha decidido voltar a ignorá-la. Se tivesse, teria que lutar com
ela a cada passo do caminho, porque ela não permitiria mais que ele a
afastasse.

A CABEÇA DE Nicholas doía por ter consumido muito conhaque na noite


anterior, mas a dor não era nada quando comparada à que ele experimentava
durante uma de suas crises da doença. Ele foi até os estábulos, onde um dos
cavalariços se aproximou imediatamente, mas Nicholas o dispensou,
dizendo que ele próprio selaria o Zeus. Ele precisava se manter ocupado.
Tentar não pensar e ficar se julgando pelo erro horrendo que cometera na
noite anterior.
Ele tentou se concentrar na tarefa em mãos. Enquanto escovava o
cavalo, no entanto, seus pensamentos se voltaram para as lembranças de
passar as mãos pelo corpo delicioso de Louisa. Ele cerrou os dentes e
afastou os pensamentos com firmeza. Ele fez um trabalho rápido de selar
Zeus e prender sua rédea, forçando-se a se concentrar na tarefa em mãos.
Assim que montou em seu cavalo, no entanto, seus pensamentos
estavam livres para vagar. E vagaram; de volta para sua esposa.
Ele incitou sua montaria em um galope, ignorando o latejar em sua
cabeça. Por algum milagre, ele não havia sofrido uma crise na noite
anterior. Não sabia dizer por que, mas prometeu não correr riscos tão
imprudentes no futuro. A bebida, no entanto, apagou sua determinação de
ficar longe de Louisa. Ele riu alto com tal pensamento, reconhecendo que
não havia sentido em mentir para si mesmo. Ele sabia muito bem o que
estava fazendo o tempo todo que estava com ela. Ele sabia que deveria ter
parado, mas não queria. Como o bastardo fraco e egoísta que era, aceitou o
que ela lhe oferecera e agora tinha que lidar com o conhecimento de que
suas ações poderiam muito bem ter resultado em Louisa grávida de um
herdeiro que estava condenado a herdar a doença de sua família.
Ficou tentado a continuar cavalgando até Londres, mas não podia fazer
isso com a esposa. Depois de devolver Zeus aos estábulos e caminhar até a
frente da casa, ficou surpreso ao ver a carruagem de seu primo se afastando
e acelerou o passo. Era muito cedo para uma visita social. Não achava que
Edward fosse tolo o suficiente para assediar sua esposa ou cunhada em sua
própria casa, mas ele não podia ter certeza. Não visto que seu primo tinha
ameaçado vingança na última vez que haviam conversado.
Respirou aliviado quando o lacaio lhe informou que a senhorita Mary
Manning estivera ali com sua criada. Mary era irritante, mas também
inofensiva. Ele dirigiu-se às escadas, com a intenção de tomar banho e se
trocar, quando ouviu a voz de Catherine vinda da sala de café da manhã.
— Fiquei surpresa ao vê-los juntos.
Por um momento temeu que ela estivesse se referindo a Louisa e
Kerrick, mas reconheceu que o medo era tolo. Ainda assim, a curiosidade o
fez mudar de direção e dirigir-se à sala de café da manhã.
Encontrou Catherine e Louisa sozinhas, os restos do desjejum sobre a
mesa diante delas. Louisa virou a cabeça e o estômago dele se apertou
quando seus olhos se encontraram. Ela estava linda, como sempre. Seu
cabelo estava preso em um penteado modesto, suas roupas recatadas, mas
tudo o que ele viu quando olhou para ela foi a mulher com quem fizera
amor na noite anterior. A cor penetrou em suas bochechas e soube que ela
também estava se lembrando. Ele queria pegar a mão dela e levá-la para
cima. Seria muito mais agradável tê-la, em vez de seu valete, ajudando-o
em seu banho. Seu corpo se contraiu em resposta ao pensamento.
Ele percebeu que estava agindo como um estudante apaixonado. Se não
tomasse cuidado, logo se veria escrevendo sonetos de amor.
Como nem ele e nem Louisa pareciam capazes de falar naquele
momento, foi Catherine quem falou primeiro:
— Você parece bem esta manhã. Sua cavalgada foi agradável?
Ele respondeu, mas estava olhando para Louisa quando o fez:
— Foi a melhor de todas.
Os olhos dela se arregalaram um pouco quando percebeu o duplo
significado por trás das palavras dele e desviou o olhar. Nicholas também
desviou o olhar dela e olhou para Catherine, que ostentava um grande
sorriso. Ela deve ter percebido que o relacionamento dele e de Louisa havia
mudado, e ficou claro que ela aprovava.
Ele teve que forçar seus pensamentos de volta à visitante.
— Vi minha prima saindo. Por que ela veio aqui?
Foi Louisa quem respondeu:
— Ela nos convidou para jantar neste fim de semana.
Ele franziu a testa.
— Existe alguma razão pela qual ela tenha feito o convite
pessoalmente?
— Ela não disse, mas talvez sua tia acredite que estaríamos mais
propensas a aceitar se Mary entregasse o convite. Foi muito curioso,
principalmente quando sua criada desapareceu por alguns minutos.
Ele levantou uma sobrancelha.
— Desapareceu?
— Você não vai acreditar — disse Catherine, inclinando-se para a frente
e aquecendo o assunto: — A criada de Mary estava sozinha com seu valete.
— Harrison? — Nicholas não poderia estar mais surpreso. — Tem
certeza?
— Oh, sim. Eles estavam nos fundos da casa e não perceberam que eu
estava na estufa. — Sua voz baixou enquanto ela continuava: — Ela deu
algo a ele. Acho que era uma carta de amor.
Nicholas não sabia dizer por que, mas estava preocupado com o que sua
cunhada acabara de lhe contar. Harrison vinha se comportando de maneira
estranha ultimamente. Seu criado sabia que não havia qualquer sentimento
amoroso entre Nicholas, sua tia e primos, então faria sentido que ele
escondesse o fato de estar tendo um relacionamento com uma de suas
criadas. No entanto, Nicholas não tinha o hábito de se intrometer nos
assuntos de sua equipe e tentou ignorar seu desconforto com as notícias de
Catherine.
— Está uma bela manhã hoje, não está?
Ele virou-se para encontrar Kerrick parado na porta. Para grande
aborrecimento de Nicholas, Kerrick foi até Louisa e pegou a mão dela.
— Você está ainda mais linda do que o normal esta manhã — disse ele,
curvando-se sobre a mão dela.
Louisa corou e as palmas das mãos de Nicholas coçaram com o desejo
de tirar o sorriso do rosto do amigo. Ele observou em silêncio enquanto
Kerrick cumprimentava Catherine de maneira semelhante antes de se voltar
para Louisa.
— Apesar do desejo de Nicholas de se enterrar no trabalho, tive uma
estadia maravilhosa. Espero que não tenha sido muito inconveniente que
minha estada tenha sido longa.
Louisa sorriu com carinho para ele e a irritação de Nicholas cresceu.
— Claro que não — disse ela. — Como amigo do meu marido, você é
sempre bem-vindo.
Nicholas tinha que acabar com isso de uma vez por todas. As coisas
haviam mudado e era hora de Kerrick saber disso. Antes que ele acabasse o
matando.
— Preciso falar com você — disse ele, cortando Kerrick antes que ele
pudesse dizer qualquer outra coisa.
Ele virou-se e saiu da sala, mas não antes de pegar o olhar que passou
entre sua esposa e seu amigo. Catherine também percebeu, e a expressão
em seu rosto refletiu o próprio aborrecimento de Nicholas.
Ele não parou até chegar ao escritório. Kerrick o seguiu sem dizer uma
palavra.
— Feche a porta — disse Nicholas.
O amigo concordou com um suspiro.
— Você deveria saber que eu me afeiçoei muito a sua esposa. Talvez um
dia, após sua morte…
Nicholas se moveu rapidamente até ficar cara a cara com o amigo, sua
raiva mal contida.
— Se você valoriza sua vida, não vai terminar essa frase.
Kerrick deu um passo para trás e estalou.
— Seremos discretos, meu velho. Passará tempo suficiente para que
ninguém suspeite que seu herdeiro é realmente meu filho.
— Kerrick — disse ele com os dentes cerrados —, você precisa parar de
falar.
Ele estava a um fio de cabelo de distância de dar um soco no amigo. Ele
virou-se e respirou fundo enquanto tentava controlar sua raiva. Mesmo
sabendo que a noite anterior havia sido um erro, ele não podia desejar que
isso fosse desfeito. E ele definitivamente não queria que Kerrick chegasse
perto de Louisa. Sabia que, assim que ele se fosse, Louisa seria um partido
muito desejável e ela encontraria outro marido facilmente. O lado
possessivo dele, aquele que queria guardá-la apenas para si, não queria nem
considerar esse futuro.
Sabiamente, seu amigo permaneceu em silêncio. Sem mais
provocações, Nicholas conseguiu controlar sua raiva crescente. Quando ele
virou-se para encará-lo novamente, Kerrick levantou uma sobrancelha em
questão.
Nicholas lutou com o que precisava dizer, ciente de que iria parecer um
tolo. Não por dizer a Kerrick para ficar longe de sua esposa, mas por ter
feito sua proposta antes.
— Há algo que queira discutir comigo? — Kerrick perguntou quando
ele não disse nada.
— Sim, droga. Você vai me fazer dizer isso, não vai?
— Pode acreditar que sim.
— Tudo bem — falou Nicholas. — Fui um imbecil por ter sugerido que
você fosse pai do meu herdeiro.
Em vez de se regozijar como ele esperava, Kerrick franziu a testa e
cruzou os braços.
— Não está bom o suficiente.
— Perdão?
— Quero saber por que mudou de ideia.
Nicholas ponderou o que iria lhe dizer.
— Decidi que era muito arriscado. Não queria que a possibilidade de
um escândalo se ligasse ao futuro marquês.
Kerrick fez um som de desgosto.
— Você não consegue admitir, não é mesmo?
Nicholas voltou ao comportamento gélido que dominava tão bem desde
a morte do irmão e o anúncio de que agora era o Marquês de Overlea.
— Já admiti que cometi um erro de julgamento. Deixemos assim. E não
pense em me provocar continuando seu cortejo absurdo com minha esposa.
Kerrick riu.
— Você é um tolo, Nicholas. Sabe, no começo pensei que era apenas
porque você achava sua esposa atraente e queria dormir com ela. E quem o
culparia? Tenho certeza de que a maioria dos homens se sentiria da mesma
maneira.
Nicholas fez uma careta.
— Eu não — disse Kerrick, dando um passo para trás e levantando as
mãos em inocência. — Mas vendo você agora? Ouvi-lo se esforçar tanto
para negar o que se torna cada vez mais claro para mim?
— Não estou com paciência para jogar esses jogos com você hoje —
disse Nicholas, passando por seu amigo e indo até a porta.
— Já teve a coragem de admitir isso para si mesmo?
Nicholas não resistiria e seria chamado de covarde. Ele parou e virou-se
para Kerrick, seu rosto uma máscara de desdém imperioso.
— Está apaixonado por sua esposa, Nicholas. — Kerrick riu. — Nunca
pensei que viveria para ver este dia.
Maldito fosse antes de ficar lá e permitir que Kerrick risse de seus
sentimentos.
— Está se divertindo às minhas custas?
Kerrick ficou sério instantaneamente.
— Entre você ou sua esposa, não sei de quem ter mais pena. Não fica
incomodado em mentir para ela?
Nicholas deu de ombros casualmente.
— Não há nada a dizer.
— Entendo — disse Kerrick. — Posso ficar o resto da semana?
— O que preferir.
Ele captou a expressão passageira de resignação no rosto de seu amigo
antes de se virar e sair do cômodo.
Sim, ele estava realmente em um estado triste e lamentável.
Irremediavelmente apaixonado por sua esposa, mas incapaz de contar a ela.
Primeiro por causa da maneira desonrosa como a tratava desde que a
conheceu, e segundo porque sabia que sua admissão causaria mais dor a ela
quando ele morresse.
 
Capítulo 15

PELA PRIMEIRA vez desde que tinha ido morar no Solar Overlea, Louisa
estava feliz. Não podia acreditar que Nicholas tinha feito aquele comentário
sobre cavalgar na frente de Catherine, mas era um bom presságio para o
casamento que ele não a estivesse mais evitando.
Depois que ele saiu com Kerrick, não o viu novamente até o jantar.
Ficou ocupada com assuntos domésticos durante a maior parte da manhã, e
Nicholas tinha se encontrado com seu administrador naquela tarde por
algum tempo. A maneira como ele continuou olhando para ela durante todo
o jantar, seus olhos prometendo um mundo de prazer sensual mais tarde,
tornou difícil acompanhar o que todos estavam dizendo. Mais de uma vez
teve que pedir a alguém para repetir quando lhe dirigiam um comentário.
Nicholas sorria se divertindo por seu estado de distração, o que por sua vez
só piorou. Ainda não conseguia acreditar o quão diferente ele estava e meio
que temia que voltasse ao seu antigo eu distante
Mais tarde naquela noite, depois de dispensar sua criada, Louisa
esperou por Nicholas. Ela usava a mesma camisola que vestira na noite
anterior, lembrando-se de como isso o havia inflamado, e seu cabelo caía
solto pelas costas.
Retirou-se primeiro e demorou um pouco antes de ouvir o som de seu
marido e as vozes de seu valete através da porta que ligava seus quartos.
Franziu a testa quando pensou no que Catherine havia revelado naquela
manhã. Harrison era um homem sério e meticuloso e, embora não o achasse
velho, já não era mais jovem. Teve dificuldade em acreditar que ele ficaria
com a criada de Mary, que era um pouco mais nova que ela. Reconheceu,
porém, que sua percepção poderia estar sendo influenciada pelo fato de que
ele sempre se mantivera muito distante e ela nunca tenha visto um
vislumbre de sua verdadeira personalidade. Sua formalidade não era a
mesma deferência que recebia do resto da equipe da casa. Sempre parecia
muito cuidadoso em evitar olhar para ela, o que a deixava desconfortável
em sua presença.
Balançou a cabeça e riu de si mesma por ser supersensível. Harrison era
meramente leal ao marido e preocupado com o casamento deles. Antes da
noite anterior, era dolorosamente óbvio para todos que Nicholas a evitava
sempre que possível. Como seu criado, Harrison teria notado seu
relacionamento tenso, e isso teria influenciado seu trato com ela.
Ela ouviu a porta se fechar e esperou pelo que pareceu uma eternidade,
tentando reunir coragem para ir até o quarto de Nicholas. Uma coisa era
entrar correndo quando temia que ele tivesse adoecido de novo e outra bem
diferente entrar descaradamente.
Levantou-se e respirou fundo. Antes de tudo, pelo menos precisavam
conversar. Precisava saber de uma vez por todas o que ele esperava em
relação ao relacionamento dos dois. Ela deu um passo em direção à porta,
mas parou quando uma batida suave soou. Ela se perguntou se tinha
imaginado isso. Deu os últimos passos com o coração martelando no peito e
abriu a porta.
Seu marido nunca falhava ao roubar seu fôlego. Ele estava na soleira,
vestindo seu roupão por cima das calças e parecendo deliciosamente
pecaminoso. Seus olhos escuros percorreram seu corpo mal escondido sob o
tecido transparente da camisola.
— Não consigo ficar longe de você.
Ela fechou o espaço entre eles, jogando-se em seus braços, e ele a
puxou contra ele e a abraçou. Alívio e alegria a inundaram. Eles ficaram
assim por um bom tempo, simplesmente sentindo a sensação de estar nos
braços um do outro.
— Eu sou um bastardo egoísta — disse ele, sua respiração
despenteando o cabelo dela. — Eu deveria estar pensando no futuro. Deus
sabe como eu tentei fazer a coisa nobre.
Louisa recuou e olhou para ele.
— Acho que prefiro você quando não é nobre.
O calor entrou nos olhos dele.
— Então vai gostar muito de mim pelo tempo que tivermos juntos.
Ela levou um momento para examiná-lo de perto antes de responder.
Precisando ter certeza de que era isso que ele realmente queria, ela
perguntou:
— Andou bebendo?
Um sorriso pesaroso cruzou seu rosto.
— Não se preocupe, Louisa. Este sou eu. E apesar do que possa ter
temido, ontem à noite também era.
Ela podia sentir um sorriso correspondente se formando em seu próprio
rosto. O que quer que acontecesse no futuro, eles tinham um ao outro.
Nicholas podia não a amar, mas a queria. Isso era o suficiente por enquanto.
Ele abaixou a cabeça e tomou sua boca. O beijo foi gentil, mas cheio de
promessas. Ela colocou as mãos em volta do pescoço dele e o segurou
contra ela, com medo de soltá-lo enquanto eles exploravam um ao outro.
Quando Nicholas levantou a cabeça, seus olhos escuros ardiam com
intensidade. Ele a pegou pela mão e a levou para a cama dele. Quando ela
se deitou com ele a seguindo, viu o que estava na mesa de cabeceira. A
raiva a percorreu, ela colocou as mãos no peito dele para empurrá-lo para
trás e se arrastou para se sentar.
Uma pitada de cautela penetrou na expressão de Nicholas.
— Há algo errado?
Ela não podia acreditar que ele iria bancar o inocente.
— Há algo errado? — Ela enterrou as mãos no cabelo e balançou a
cabeça. — O que há de errado contigo, Nicholas? Está tentando se matar?
Não precisava contar a ele o que havia causado seu desânimo. Seus
olhos viajaram para a garrafa de conhaque e o copo que repousavam em sua
mesa de cabeceira.
— Eu não pedi isso. Harrison trouxe por conta própria, pensando que eu
iria querer.
Ela zombou:
— Esse é o seu conhaque favorito? O que eu pedi ao pessoal para
descartar? E você saiu ontem à noite para beber. Por quê? Por que faria
isso?
Para seu horror, ela começou a chorar. Nicholas a puxou para si
enquanto ela soluçava todos os seus medos. Quase vê-lo morrer trouxe para
ela o quão pouco tempo ela poderia muito bem ter com ele e ela estava
furiosa por ele estar se arriscando tanto com sua vida. Estava furiosa e
aterrorizada.
Quando seus soluços diminuíram, Nicholas recuou e olhou para ela.
— Eu estava bebendo ontem à noite por sua causa.
Ela riu, mas terminou em um soluço sufocado. Ele a sacudiu levemente.
— Eu a queria tanto… Eu estava tentando tanto fazer a coisa certa, mas
imaginá-la junto a Kerrick… — Ele desviou o olhar. — Estava me
matando.
Vendo a dor em seu rosto, a raiva dela começou a diminuir, sendo
substituída por uma necessidade de tranquilizá-lo. Ela ergueu a mão para a
bochecha dele, que se aninhou contra sua palma, mas ele manteve os olhos
baixos.
— Nicholas, olhe para mim.
Ele ergueu o olhar e a angústia em seus olhos quase a fez suspirar.
— Eu gosto de Kerrick — disse ela. Ele começou a virar a cabeça, mas
ela levou a outra mão ao rosto dele para mantê-lo quieto. — Gosto muito
dele, mas apenas como amigo. Eu nunca poderia estar com ele. Meus
sentimentos por você nunca permitiriam.
Não houve palavras depois disso. Ele a tomou em seus braços e juntos
caíram de volta nos travesseiros. Ao contrário da noite anterior, seu ato de
amor era mais urgente desta vez. Havia perdido suas inibições e passou as
mãos ansiosas por cada parte dele que podia alcançar. Ficou claro pela
reação dele que fazia algo que lhe agradava, e isso deu-lhe a confiança que
precisava para explorá-lo enquanto ele fazia o mesmo. Nem chegaram a
tirar as suas roupas quando se viu debaixo dele, sua camisola puxada até a
cintura. Ele abriu as calças e ela estremeceu com antecipação ao toque de
seu membro duro contra seu quadril. Abriu as pernas para recebê-lo dentro
dela, mas ele a surpreendeu rolando e colocando-a sobre ele.
— Assim — disse ele, arrumando-a para que ela ficasse escarranchada
sobre ele, posicionada bem sobre seu eixo duro.
Ela não sabia o que deveria fazer.
— Eu não posso — ela começou, mas ele a interrompeu.
— Shh — disse ele, arrastando-a para um beijo.
Ele alinhou seus corpos novamente e então mostrou a ela como levá-lo
para dentro dela. Ela aliviou-se sobre ele, amando a forma como ele a
preenchia, só parando quando atingiu o fundo. Ele colocou as mãos em seus
quadris e puxou-a ao longo de seu comprimento, então de volta para baixo
com mais força do que da primeira vez. E então ela encontrou o jeito e ele
permitiu que ela ditasse o ritmo enquanto suas mãos se moviam para seus
seios, seus dedos fortes levantando o peso deles e acariciando as pontas
endurecidas através da camisola. Deleitou-se com a sensação dele duro
dentro dela enquanto alcançava seu próprio clímax. Ela deveria ter ficado
envergonhada com os sons que estava fazendo, quase ofegante enquanto se
movia sobre ele, mas seus gemidos correspondentes lhe diziam que ele
estava gostando de fazer amor tanto quanto ela.
Impaciente, ele acelerou seus movimentos, empurrando-a enquanto ela
deslizava para baixo. As mãos dele percorriam pelo corpo dela, deixando
um rastro de fogo onde quer que ele a tocasse. Atordoada, ela olhou para
ele, para seu lindo rosto, enquanto continuava a se mover. A maneira como
ele estava a olhando, seus olhos queimando através dela, ela quase podia se
fazer acreditar que ele a amava.
— Nicholas — disse ela com um gemido, o ritmo constante ameaçando
destruí-la. As mãos dele se estabeleceram em seus quadris e ele a segurou
enquanto empurrava nela de novo e de novo. Ela explodiu e ele a seguiu
momentos depois.
Ela caiu em cima dele. Ele a segurou contra ele, uma mão enterrada em
seu cabelo e a outra deitada possessivamente em seu traseiro, logo acima de
onde eles ainda estavam unidos. Lentamente, seus batimentos cardíacos se
estabilizaram e a respiração de ambos desacelerou.
— Posso ficar aqui esta noite? — perguntou ela.
Por um momento, pensou que ele iria dizer não. Ele os rolou até que
estivessem de lado, um de frente para o outro, e ela soltou um suspiro
quando ele saiu dela. Ele trouxe a boca dela para a dele e a beijou
intensamente.
— Espero que fique aqui na maioria das noites — disse ele, sua
expressão tão satisfeita quanto o que ela imaginava que a sua estivesse.
Contente, ela se aconchegou contra ele e adormeceu.
A DESCOBERTA DE que seu valete poderia estar em algum tipo de
relacionamento com a criada do primo perturbava Nicholas. Ele não tinha
prestado muita atenção ao homem até agora porque seu valete nunca tinha
sido muito amigável, mas agora que o observava de perto, parecia que
Harrison tinha o comportamento de alguém tentando esconder sua culpa.
Certamente Harrison não tinha medo de sofrer repercussões por causa de
seu relacionamento. Nicholas não era tão insensível a ponto de esperar que
sua equipe evitasse relacionamentos pessoais.
Nicholas revirou a situação várias vezes em sua mente, mas ainda não
conseguia acreditar que mesmo a mais tola das mulheres enviaria um
bilhete de amor para seu valete. No final, decidiu falar com Catherine
novamente antes de se aproximar de Harrison. Talvez ela tenha interpretado
mal a cena, já que seu valete não aparentava ser um homem apaixonado.
Deus sabia que Nicholas estava intimamente familiarizado com esses
mesmos sintomas. Claro, também era possível que Harrison estivesse
simplesmente envolvido em um encontro romântico e que suas emoções
não estivessem envolvidas.
— Milorde — exclamou Catherine quando ele entrou na estufa. — Isto
é uma surpresa.
— Catherine — disse ele com um sorriso carinhoso —, quantas vezes
tenho que lhe pedir para que me chame de Nicholas?
— Muitas, ao que parece.
Nicholas riu em resposta. Ele gostava do entusiasmo juvenil de
Catherine. Isso o lembrava de sua própria juventude despreocupada.
Aqueles dias pareciam muito distantes agora.
— Tenho que lhe mostrar essas duas plantas que acabei de identificar.
Ela desapareceu na fileira de vegetação que cobria a parede de vidro ao
longo de um lado da estufa. Nicholas suspirou e seguiu-a enquanto ela
recitava os nomes latinos de duas das plantas tropicais. Ele tocou
preguiçosamente em uma grande flor branca enquanto ela divagava sobre a
flor, fingindo um interesse que ele estava longe de sentir.
— Eu queria agradecer-lhe por me dar uma temporada na próxima
primavera — disse ela, recuperando sua atenção. — Estou muito ansiosa
por isso. — Ela parou por um momento antes de continuar, o calor
rastejando em seu rosto. — Lorde Kerrick prometeu dançar comigo no
Almack’s.
Essa declaração inocente disparou alarmes em sua mente e ele fez uma
nota mental para falar com Kerrick sobre sua cunhada. Seu amigo não era o
tipo de pessoa que brincava com as afeições de uma jovem, mas estava
claro que Catherine havia desenvolvido uma preferência por ele.
Nicholas estremeceu de horror simulado.
— Como sempre, deixarei o planejamento de tais diversões para a vovó
e sua irmã.
Catherine exalou dramaticamente.
— Não vejo a hora da primavera chegar. Estou tentando ser paciente,
mas está sendo muito difícil.
Nicholas voltou o assunto para o verdadeiro motivo de sua visita. A
atmosfera abafada da estufa estava começando a afetá-lo.
— Queria falar com você sobre o que nos disse ontem. Sobre o encontro
entre meu valete e a criada de Mary.
O entusiasmo dela diminuiu.
— Eu não deveria ter dito nada. Eles estão em apuros agora?
Nicholas se apressou para tranquilizá-la.
— De jeito nenhum. Enquanto a equipe continuar fazendo seu trabalho,
não me importo nem um pouco com quem se encontram em particular. No
entanto, esse é o ponto da minha visita. Simplesmente não consigo imaginar
Harrison se envolvendo em tal comportamento. Tem certeza de que o que
você testemunhou foi um encontro romântico?
Catherine franziu a testa em concentração.
— Por que mais eles se encontrariam? E ele aceitou uma carta dela.
Uma dor surda começou atrás de sua têmpora, que ele massageou
distraidamente. Ele não conseguia explicar seu senso de urgência, mas
precisava de mais informações sem despertar ainda mais a curiosidade de
Catherine.
— Talvez ele estivesse aceitando a carta para outra pessoa. Quero
garantir a Harrison que sua posição aqui é segura, mas não quero dizer nada
se ele estava apenas agindo como intermediário.
Ela lhe deu um sorriso largo que o lembrou de sua irmã.
— É muito gentil. John achava que não, mas eu sabia que Louisa
tomara a decisão certa quando aceitou sua proposta.
Ele sentiu uma pontada de culpa por mentir para a garota e mais do que
indigno de seu elogio. Pensativa, ela franziu a testa, e ele esperou,
ignorando o calor crescente da estufa.
— É verdade que eles não pareciam excessivamente afetuosos um com
o outro. Fiquei tão surpresa com o que vi que não considerei o
comportamento deles. No entanto, agora que estou pensando nisso, eles
estavam bem sérios.
— O amor pode ser um negócio sério, especialmente quando se tenta
escondê-lo — disse ele, pensando em sua própria situação confusa.
A testa de Catherine relaxou.
— Claro, deve ter sido isso.
A visão de Nicholas se turvou momentaneamente e o pavor se instalou
em sua barriga. De novo não. Sem uma palavra, ele foi para a porta que
levava para fora. Ele supôs que deveria entrar na casa ao invés de ir para
fora, mas no momento estava desesperado por ar fresco.
— Milorde… Nicholas — chamou Catherine enquanto o seguia, sua
preocupação evidente.
Ele se atrapalhou com a maçaneta da porta, incapaz de abri-la.
Catherine o alcançou e abriu a porta para ele. Ele tropeçou, sua cabeça
começando a rodar de verdade agora. Balançando à beira de cair, ele deu
alguns passos pela lateral do jardim de inverno em um esforço para escapar
do ar sufocante que entrava pela porta antes de parar para se encostar na
parede externa, inalando grandes lufadas de ar.
Catherine o seguiu, a ansiedade estampada em suas feições. Para ser
honesto, Nicholas estava mais do que um pouco preocupado. Tudo o que
ele conseguia pensar naquele momento era em Louisa e o quanto ele não
queria perdê-la. Não quando ele havia acabado de encontrá-la.
— Vou buscar Sommers — disse Catherine.
Nicholas balançou a cabeça. Ele foi incapaz de falar coerentemente,
mas percebeu que este episódio era diferente dos outros. Sua cabeça já
estava começando a clarear. Em questão de minutos, sua visão embaçada
clareou e sua respiração não estava mais restrita.
— Quer que eu o ajude a voltar para casa? A estufa é o caminho mais
rápido…
— Não! — Em seu pânico, ele falou mais alto do que pretendia. Tentou
um sorriso tranquilizador. — É muito estranho, mas estou me sentindo
melhor agora.
Cautelosamente, ele se afastou da parede. Preparou-se para a queda
inevitável e ficou perplexo quando ela não veio.
Ele virou-se para encarar Catherine.
— Você sabe sobre a minha condição? — Em seu aceno de cabeça, ele
estremeceu por dentro. Logo todos saberiam. O pensamento o deixou
sombrio. — Achei que estava tendo uma crise, mas parece que me enganei.
— Isso já aconteceu antes?
— Não, nunca. Nunca tive isso, apenas caia de repente.
A testa de Catherine se enrugou.
— O que você estava sentindo?
Ele supôs que não deveria ter ficado surpreso com a franqueza de sua
pergunta. Ele não conhecia sua cunhada há muito tempo, mas já sabia que
era da natureza dela ser curiosa.
— Tontura, principalmente. Também achei difícil respirar.
— E você começou a suar.
Ele levantou uma sobrancelha.
— Acho que sei o que lhe causou isso. Algumas das plantas do
conservatório são altamente venenosas. Claro, a maioria só causaria
sintomas se ingerida. Algumas podem deixar óleos em sua pele se você as
tocar… e você estava esfregando os olhos.
— Estava?
— Sim — disse ela. — Você estava esfregando suas têmporas, aqui. —
Ela gesticulou para seu próprio rosto. — Então você esfregou os olhos
brevemente. — Uma tristeza penetrou em sua expressão. — Infelizmente
acho que você tem que evitar a estufa. Parece que, dada a sua doença, você
pode ser mais sensível às plantas lá de dentro.
Sua cabeça estava girando novamente, mas desta vez com a importância
de suas palavras. Seria possível…? Ele odiava até mesmo considerar tal
coisa, mas seria possível que a doença de sua família não fosse devido a
uma condição hereditária? Seria possível que todos os homens da família
tivessem sofrido porque eram sensíveis a uma das plantas de sua avó?
Ainda mais horripilante era a suspeita de que sua exposição a essa planta
não tivesse sido acidental.
Ele não tinha percebido que tinha começado a andar de um lado para o
outro. Ele parou e virou-se para encarar Catherine.
— Acho que talvez você esteja certa. Acha que seria possível que me
fornecesse uma lista das plantas que são as mais prováveis de serem as
culpadas?
Ela estava prestes a perguntar o motivo, mas ele não queria que ela
soubesse sobre suas suspeitas até que tivesse alguma prova. Qualquer um
que já tivesse assassinado duas pessoas e estivesse tentando matar uma
terceira, sem dúvida, não pararia por nada para manter seu segredo.
— Precisamos garantir que as criadas não tragam nenhuma dessas flores
para dentro de casa — acrescentou.
Sua feição clareou.
— Ah, isso seria terrível! Já identifiquei muitas das plantas que Lady
Overlea não conhecia, mas ainda estou procurando informações sobre
algumas…
Sua voz sumiu e ela virou-se e voltou para a estufa, concentrada em sua
tarefa. Ele também estava perdido em pensamentos. Todo o seu mundo
tinha acabado de se desequilibrar, mas pela primeira vez no que parecia
uma eternidade ele começou a ter esperança.
 
Capítulo 16

LOUISA NÃO tinha certeza se algum dia se acostumaria a administrar uma


casa tão grande. Depois de ter lidado com seus novos deveres, Lady
Overlea transferiu a ela o trabalho de cuidar de todos os detalhes do dia a
dia de administrar a Mansão Overlea, dizendo-lhe que a melhor maneira de
se adaptar era pular com os dois pés. Louisa sabia que poderia contar com a
ajuda da marquesa viúva se tivesse dúvidas, mas se lançou na tarefa com a
esperança de não se mostrar uma decepção. Lady Overlea aceitara ela e
Catherine na família de braços abertos, e Louisa se afeiçoou à mulher mais
velha no pouco tempo em que a conhecia.
Tinha acabado de se encontrar com a governanta para revisar os menus
da semana e estava prestes a subir as escadas para voltar ao seu quarto
quando se viu arrastada contra uma figura muito masculina. Ela fechou os
olhos e sorriu quando um desejo perverso de provocar seu marido veio
sobre ela.
— Kerrick…
Ela girou tão rapidamente que quase perdeu o equilíbrio. Quando viu o
olhar de indignação no rosto do marido, não conseguiu conter o riso.
Nicholas ainda estava muito sensível sobre aquela proposta ridícula que
fizera a ela e ao amigo, e era muito fácil provocá-lo em relação a isso.
Levou alguns segundos para ela notar que Lorde Kerrick estava parado
a poucos metros de distância, com um olhar horrorizado no rosto.
— Meu Deus — disse ele —, quer que seu marido me mate? Nem
brinque com uma coisa dessas.
Ela riu novamente.
— Bem, vocês dois merecem.
— Eu era tão inocente quanto você. Nada disso foi ideia minha.
Nicholas assistia à conversa deles em silêncio, mas finalmente rompeu
com a leve brincadeira.
— Preciso falar com minha esposa por um momento.
Seu amigo parecia muito disposto a atendê-lo. Com uma reverência
rápida, ele virou-se e saiu para o corredor, deixando-os sozinhos.
Louisa se perguntou por que Nicholas queria vê-la. Ele a pegou pela
mão e a levou para a biblioteca, fechando a porta atrás deles. Ela não gostou
da expressão sombria em seu rosto. Isso a lembrou muito do jeito que ele
era quando se casaram. Querendo desesperadamente vê-lo sorrir
novamente, ela se aproximou e trouxe a cabeça dele para um beijo.
Havia uma ternura na maneira como ele movia sua boca contra a dela
que a fez prender a respiração. Quando ele se afastou, segurou a bochecha
dela e passou o polegar sobre seu lábio inferior, a encarando atentamente.
— Qual é o problema? — perguntou ela, começando a se preocupar.
— Gostaria que você recusasse o convite para jantar na casa da minha
tia.
Conhecendo seus sentimentos sobre sua tia e primos, seu pedido não a
surpreendeu.
— Sua avó está ansiosa por isso. Ela espera que isso ajude a curar a
fenda na família.
— Não acredito que um jantar vá conseguir isso. Há muita história aí.
Os dois ramos da família nunca se deram bem.
Suas palavras a fizeram sentir uma pontada de culpa. O casamento de
seu irmão com Mary teria curado essa fenda. Eles ainda não estavam
formalmente noivos, mas ela sabia que havia um entendimento. Todos
esperavam que Nicholas cumprisse esse entendimento quando James
morreu.
— Sua tia não gosta de mim. Ela acredita que eu o enganei de alguma
forma para se casar comigo.
Ele fez uma careta e deixou cair a mão.
— Você não pode saber disso com certeza.
— Sim, posso — disse ela, lembrando-se daquele encontro horrível
logo após o casamento. — Ela fez questão de me dizer isso pessoalmente.
Seu temperamento explodiu com tal revelação.
— Então não pode haver dúvida de nossa presença.
— É muito tarde. Já aceitei o convite.
— Louisa, não posso permitir que ela insulte você na sua cara e finja
que está tudo bem.
Ela colocou a mão no braço dele, esperando acalmar sua raiva.
— Significa muito para sua avó. Não que sua tia Elizabeth me aceite,
não acredito que Lady Overlea goste dela mais do que você ou eu, mas ela
quer que você se reconcilie com seus primos.
Nicholas fez um som curto e desdenhoso.
— Depois do que Edward tentou fazer com você? Já são dois em cada
três membros da família que a insultaram. Devo me afastar e permitir que
Mary faça isso também?
Ele estava certo, é claro. Ela daria tudo para não ter que comparecer a
esse jantar. Sabia que seria um caso doloroso e esperava que houvesse
muito antagonismo dirigido a ela. No entanto, significava muito para Lady
Overlea e Louisa tinha que tentar por ela.
— Eu não acho que Mary seja capaz de um comportamento tão odioso.
Ela parece bem-educada.
— Sim, ela é mansa. Nem um pouco parecida — disse ele, puxando o
corpo dela contra o dele —, com minha esposa.
Ele inclinou-se e acariciou o pescoço dela. Ele arrastou uma linha de
beijos até a orelha dela, enviando arrepios por sua espinha.
— Talvez — disse ele suavemente, sua língua traçando a concha da
orelha dela —, podemos enviar todos e ficarmos para trás. Levaremos o
jantar para o nosso quarto e teremos uma pequena lua de mel.
Louisa ficou tentada. Seu marido sabia muito bem como tocá-la e fazê-
la se esquecer de todo o resto.
— Nós não podemos — disse ela, sua voz ofegante pelo desejo que ele
estava despertando nela. — O que iríamos dizer? Que nós dois estamos nos
sentindo mal? Todos saberão que estamos mentindo.
A mão dele segurou o seio dela e ela arqueou o corpo com a carícia. Ele
arrastou a boca até a borda do corpete e espalhou beijos sobre a pele
exposta.
— Ainda estamos em lua de mel. E francamente, não me importo se
minha tia e meus primos não entenderem isso.
Ela afastou-se do aperto dele, lutando para estabilizar sua respiração.
— Nicholas, nós não podemos.
A expressão dele tinha mais do que uma pitada de aço.
— Eu digo que podemos.
Ela teria que tentar uma abordagem diferente.
— Você pode imaginar a expressão no rosto de Edward quando ele for
forçado a nos receber?
Os olhos de Nicholas se iluminaram com isso.
— Pode ser divertido vê-lo se contorcer. — Ele considerou um
momento antes de continuar: — Tudo bem, nós iremos, mas tem que me
prometer ficar ao meu lado.
— Nada pode acontecer lá, Nicholas. Não com uma casa cheia de gente.
Ele tinha uma expressão estranha no rosto quando respondeu:
— Você ficaria surpresa com o que pode ser feito bem debaixo do nariz
de alguém.
Era óbvio que ele estava pensando em algo em particular. Ela estava
prestes a questioná-lo, mas ele mudou de assunto.
— Quero levá-la para cavalgar.
Um arrepio de antecipação passou por ela. Sua primeira viagem ao
Solar Overlea, quando ela foi até lá para pedir a ajuda de Nicholas, foi a
primeira vez em anos que ela andou a cavalo. Seu amor pela equitação
havia sido despertado, mas ela estava muito preocupada com seu dilema na
época para apreciá-lo.
— Acho que não tenho uma vestimenta. — Ela estava atordoada
durante os dias que antecederam o casamento e, depois de todos os ajustes
que Lady Overlea havia providenciado para ela com um pequeno exército
de costureiras, decidiu deixar para trás a maior parte de suas roupas fora de
moda.
— A vovó geralmente é bastante meticulosa. Eu ficaria muito surpreso
se ela não arranjasse pelo menos um novo traje de montaria quando mandou
fazer seu enxoval.
Claro, pensou ela, sua excitação crescendo.
— Vou perguntar à minha criada. Ela parece conhecer meu guarda-
roupa melhor do que eu.
Ele parecia bastante satisfeito com o entusiasmo dela.
— Vou encontrá-la nos estábulos.
Louisa estendeu a mão para lhe dar um beijo rápido, mas ele a pegou
antes que ela pudesse se afastar e aprofundou o beijo.
— Talvez devêssemos adiar a cavalgada — disse ele, sua respiração se
misturando com a dela. — Posso pensar em algumas coisas que poderíamos
fazer que provavelmente seriam bem mais divertidas.
Louisa se afastou, rindo.
— Oh, não, foi você quem ofereceu e aumentou minhas esperanças.
Não vou deixá-lo mudar de ideia.
Nicholas a soltou com óbvia relutância e ela correu para o quarto para
se trocar. O marido estava certo, é claro. Sua criada tirou um lindo traje de
montaria vermelho e preto de seu guarda-roupa e a ajudou a se vestir.
Ela se apressou, mas quando chegou aos estábulos, Nicholas já estava
esperando por ela. Ele sorriu quando a viu e afastou-se da parede em que
estava encostado.
— Eu sabia que a vovó não iria nos decepcionar.
Ela alisou a mão sobre o rico tecido de lã de sua saia.
— É adorável.
Nicholas pegou a mão dela e a levou para os estábulos. Ela ficou
surpresa ao ver quantos cavalos o lugar tinha, mas então balançou a cabeça
em sua própria loucura. Claro que o Marquês de Overlea teria um estábulo
grande. Além de cavalos para montar, também precisavam de animais para
suas carruagens.
Um cavalariço estava selando o cavalo de Nicholas para o passeio, mas
seus olhos foram atraídos para a égua branca pura que estava ao lado, já
selada.
— Oh, ela é linda — disse ela, soltando a mão do marido e se
aproximando da égua. — Você é linda, não é? — murmurou ela baixinho
para a égua enquanto passava a mão pelo focinho. — Qual é o nome dela?
— Athena — disse Nicholas.
— Ela é tão bonita quanto uma deusa. — Ela virou a cabeça para olhar
para Nicholas, que a observava com um sorriso satisfeito.
— Fico feliz que tenha gostado dela. É sua.
— Ah, não — protestou ela. — Você não precisa fazer isso. Eu ficaria
contente em visitá-la e montá-la de vez em quando.
Ele balançou a cabeça em descrença.
— Não precisa ser tão prática o tempo todo, Louisa. E não precisa mais
compartilhar tudo. Além disso, eu a comprei para você.
Seus olhos se arregalaram com isso.
— Você a comprou para mim? Quando?
Ele deu de ombros, o movimento casual.
— Antes do casamento. Eu a vi quando estava em Londres e pensei em
você.
Um brilho de felicidade se espalhou por ela. Mesmo enquanto ele estava
inventando seu plano imbecil de jogá-la nos braços de Lorde Kerrick, ele
estava pensando nela e até havia lhe comprado um presente.
— Obrigada — agradeceu ela, tomada pela emoção.
Seus olhos se encontraram e eles compartilharam um momento de
compreensão silenciosa. Um canto da boca dele se ergueu como se
reconhecesse o quão sem sentido tinha sido seu comportamento.
Ele fez uma reverência superficial.
— Podemos ir?
Ela assentiu e juntos tiraram suas montarias do estábulo. Uma vez do
lado de fora, ele a ajudou a montar em sua égua antes de montar em Zeus.
Virou-se para a vila e Louisa o seguiu.
— Aonde estamos indo?
— Pensei em apresentá-la a alguns dos meus inquilinos.
— Já conheço a maioria.
— Sim, mas eles a conhecem como Louisa Evans. Devem ter ouvido
falar sobre nosso casamento e tenho certeza de que estão muito curiosos
para vê-la em seu papel como a Marquesa de Overlea.
Ela estremeceu.
— Não tenho certeza se posso ser mais do que Louisa Evans. Não sei
como uma marquesa deve se comportar e temo que, se tentasse, pareceria
ridícula.
Eles estavam cavalgando lado a lado e Nicholas inclinou-se para ela
quando respondeu:
— Vou compartilhar um pequeno segredo com você. Não me sinto
confortável atuando como marquês. Nunca prestei muita atenção às
palestras a que meu pai submetia James e a mim. Deveria, é claro, já que eu
era o reserva, mas nunca imaginei que um dia me tornaria o marquês.
— Somos um belo par, não somos? — disse ela, em um tom de leveza
para aliviar o clima subitamente sombrio.
— Teremos que definir nossos próprios papéis. No final, ninguém
ousará nos criticar. Pelo menos não na nossa cara. Além disso, tenho certeza
de que você me manterá com os pés no chão se eu começar a achar que sou
muito bom.
Ela riu.
— Vou considerar isso minha primeira prioridade.
Cavalgaram em silêncio o resto do caminho. Havia apenas alguns
inquilinos que ela ainda não conhecia, e estava nervosa sobre como eles a
veriam em seu novo papel como marquesa. No entanto, não precisava ter se
preocupado. Além de alguns olhares curiosos em sua cintura de alguns que
se perguntavam se o marquês havia se casado com ela para evitar um
escândalo, todos pareciam genuinamente felizes por eles. Parece que,
apesar da reputação de seu marido como libertino, as pessoas em sua
propriedade realmente gostavam dele. Pelo menos, pareciam aliviados que
finalmente tenha se acalmado. Esse sentimento aumentou quando souberam
de seus planos de fazer melhorias em muitas de suas casas na primavera.
Foi uma longa tarde. Louisa nunca tinha visitado tantas pessoas em um
dia e estava exausta quando chegou a hora de voltar para casa. Estava feliz,
no entanto, por ter saído com Nicholas. Isso lhe deu a oportunidade de ver
um novo lado dele. Ele levava a sério sua responsabilidade para com seus
inquilinos e queria ter certeza de que eles seriam bem cuidados. Sua
preocupação genuína a fez perceber que seria um ótimo pai. Esse
pensamento foi seguido por uma onda de tristeza quando ela pensou que ele
poderia não estar por perto para ver um filho deles crescer.
Ela colocou a mão em seu abdômen, imaginando se já poderia estar
carregando um filho dele naquela mesma hora. Ainda era muito cedo para
dizer, mas esperava que sim.
Tinha ficado atrás dele. Nicholas parou e esperou que ela o alcançasse.
Ele franziu a testa quando viu a tristeza dela.
— Qual é o problema?
Ela tentou sorrir, não querendo tocar no assunto de sua doença. Ela
sabia que era uma tentativa fraca na melhor das hipóteses.
— Só estou cansada — disse ela. — Foi uma tarde longa e já faz muitos
anos que não percorria uma distância tão grande. E não ajuda que você
tenha me mantido acordada metade da noite.
Um sorriso de lobo cruzou o rosto dele.
— Então é melhor tirar uma soneca quando voltarmos, porque sinto que
pode ter outra noite sem dormir.
A forma como o olhar dele percorreu seu corpo a fez corar.
— Você parece cansado também. Gostaria de se juntar a mim para
descansar?
Ela esporeou seu cavalo para frente, sem esperar para ver a reação dele.
Ela não tinha dúvidas de que Zeus poderia facilmente ultrapassar sua
montaria, então Nicholas deve tê-lo detido. Ela não se importou. O sol
estava se pondo mais cedo naqueles dias, mas havia apenas uma leve brisa
no ar de outono. A sensação da brisa em seu rosto e do poderoso animal
abaixo dela era emocionante. Não tinha percebido o quanto sentia falta de
cavalgar.
Ela tinha acabado de virar na estrada que se aproximava da mansão
quando percebeu que algo estava errado. Sua sela deslizou muito
ligeiramente, acionando sinos de alerta em sua mente. Ela puxou as rédeas,
mas o movimento lateral não parou. A sela escorregou ainda mais e ela se
viu caindo das costas da égua. Assustada, sua montaria ganhou velocidade
em vez de parar. Ela fechou os olhos horrorizada e tentou se preparar para o
impacto, mas nada poderia prepará-la para a sensação de seu corpo batendo
no chão duro. Ela teve a presença de espírito de tirar o pé do estribo e soltar
as rédeas, e ficou feliz com isso quando abriu os olhos e viu sua égua
galopando pela estrada, com a sela pendurada em um ângulo precário.
— Louisa!
Ela podia ouvir a preocupação na voz de Nicholas, mas não conseguiu
recuperar o fôlego para responder. Ele parou Zeus, saltou de suas costas e se
ajoelhou ao lado dela. Seu rosto entrou em foco acima do dela.
— Meu amor?
Ela gostou do som disso. Nicholas nunca a tinha chamado assim antes.
— Louisa, fique comigo.
Ela percebeu que seus pensamentos estavam à deriva. Ela tentou se
concentrar no rosto e na voz do marido.
— Isso mesmo — disse ele, colocando a mão em sua bochecha. —
Mantenha sua atenção em mim.
Ele passou as mãos pelos braços e pernas dela. Levou vários segundos
para ela perceber que ele estava procurando por ossos quebrados. Quando
ele lhe pediu para mexer os dedos e mover as pernas, ela finalmente
conseguiu recuperar o fôlego e sua mente começou a clarear. Não achava
que estava ferida, apenas atordoada, mas fez o que ele pediu.
— Você pode virar a cabeça?
Ela virou para um lado, depois para o outro, estremecendo com a
rigidez. Um alívio cruzou seu rosto.
— Posso me sentar agora?
Ele a ajudou a se sentar e então a arrastou para seu colo. Ele a segurou
assim por algum tempo, apenas embalando-a.
Quando ela se afastou, viu a angústia dele.
— Não estou ferida — disse ela, precisando aliviar a preocupação dele.
— Quando vi você caindo daquele cavalo… — Ele balançou a cabeça
como se quisesse limpar a memória de sua mente. — Meu coração quase
parou.
— A sela — disse ela com a voz ainda trêmula. — Eu pude senti-la
escorregando.
A mandíbula dele endureceu.
— Vou levá-la para casa agora.
Ele levantou-se, mas em vez de ajudá-la a ficar de pé como ela
esperava, ele a ergueu em seus braços.
— Eu consigo andar — disse ela.
Ele a ignorou e a carregou até seu cavalo. Soltou-a para subir na sela
antes de puxá-la para sentar-se de lado diante dele. Era um pouco
desconfortável, mas ela se sentia segura estando tão perto de Nicholas.
Colocou as mãos ao redor da cintura dele e se acomodou contra seu peito,
tentando atrair um pouco de sua força para ela.
DEPOIS DE insistir que Louisa descansasse por causa da queda, Nicholas
voltou aos estábulos para falar com os cavalariços. Eles não tinham
explicação para o que havia acontecido, mas o que descobriu quando
examinou a sela de Athena fez o sangue congelar em suas veias.
Agora, de volta ao escritório, andava de um lado para o outro diante do
fogo, tentando entender o que havia descoberto. Lutou contra a vontade de
tomar um gole da garrafa de conhaque que seu valete havia escondido para
ele, mas no final resistiu, sabendo que não poderia arriscar ter outra crise.
Tinha que manter a cabeça limpa e sua mente focada. A vida dele e de
Louisa poderia muito bem depender disso.
Não conseguia deter a memória de assistir, impotente, enquanto ela
puxava as rédeas de sua égua antes de deslizar para fora das costas do
animal, o que aparecia uma vez ou outra em sua mente. Ele estremeceu ao
se lembrar de vê-la no chão, pálida e imóvel. Foi atingido com força por seu
medo de que ela estivesse gravemente ferida.
Kerrick entrou no escritório, sem se incomodar em bater.
— O que foi isso que ouvi sobre Louisa ter sofrido um acidente?
Nicholas parou de andar e virou-se para ele. Ia precisar de um aliado
nisso e Kerrick era o homem certo para o trabalho.
— Feche a porta e sente-se — disse ele.
Kerrick fez isso antes de se voltar para o amigo.
— Fico nervoso quando me diz para fazer isso. A última vez que
precisou falar comigo em particular, você queria que eu fosse para a cama
com sua esposa.
— Pode ter certeza de que não vamos revisitar esse assunto. — Ele foi
até sua mesa e abaixou-se para pegar a sela que havia colocado no chão ao
lado de sua cadeira. Ele a deixou cair sobre a mesa com um baque alto. —
Esta é a sela do cavalo de Louisa. Diga-me o que acha.
Kerrick levantou as sobrancelhas, mas não disse nada enquanto
examinava a sela. Não demorou muito para ele descobrir o problema.
— Os tarugos quebraram? Ambos? Quantos anos tem esta sela?
— Comprei quando estive em Londres pela última vez. Até hoje nunca
tinha sido usada.
Kerrick balançou a cabeça em descrença.
— Não entendo. Como eles poderiam ter se desgastado tão cedo? E por
que um cavalariço não notaria sua condição?
— Olhe para a parte de baixo dos tarugos.
Kerrick os virou e franziu a testa.
— A junção está desgastada — disse ele, correndo um dedo ao longo da
borda onde o couro havia rasgado.
Nicholas permaneceu em silêncio, esperando para ver se Kerrick
confirmaria o que ele suspeitava.
Depois de examinar todas as arestas, Kerrick praguejou.
— Estes foram cortados.
Nicholas assentiu.
— Acredito que sim. Nem toda a extensão. A parte de baixo foi cortada,
mas o couro ficou intacto o suficiente para não ser visível do lado direito
das tiras. A sela é nova. O mestre do estábulo examinou-a quando foi
entregue pela primeira vez, mas não a olhou novamente, pois só foi usada
pela primeira vez hoje.
— Então parecia tudo bem da superfície — disse Kerrick. Ele examinou
a profundidade do corte novamente. — Aguentou por um tempo, mas
depois começou a se desgastar à medida que Louisa cavalgava.
Nicholas mal conseguia controlar a raiva que fervia sob sua pele,
deixando-o desesperado para atacar alguém.
— Não faz sentido. Por que alguém iria querer machucar sua esposa?
— Isso não é tudo.
Nicholas continuou explicando o que havia acontecido na noite em que
Louisa havia mandado tirar todo o seu conhaque. Como ele tinha ido à vila
para beber e não tinha adoecido. Ele também contou a Kerrick sobre como
ele começou a ter sintomas quando estava na estufa depois de tocar em
algumas das flores que Catherine o informou que eram venenosas.
— Estava no conhaque, droga. Tenho quase certeza disso. Alguém está
adicionando algo de uma dessas plantas para me deixar doente.
Kerrick estava claramente atordoado.
— Já tomei um pouco daquele conhaque.
— Assim como eu e nem sempre adoeci. Suspeito que quem esteja
fazendo isso está agindo seletivamente, certificando-se de que sou o único
que bebe das garrafas que foram misturadas com o veneno.
— Você sabe o que está insinuando? Seu pai e seu irmão tiveram a
mesma doença, o que significa que eles também foram envenenados.
— Eles foram assassinados.
Kerrick chegou à mesma conclusão que Nicholas.
— E você acredita que Edward está por trás disso.
— E quem mais tem algo a ganhar? Todos sabemos que ele é um
bastardo sem escrúpulos, e com todos os homens da minha família fora do
caminho, ele pode herdar.
— Mas por que ele iria querer machucar Louisa?
— O pessoal da casa sem dúvida percebeu que Louisa e eu
consumamos nosso casamento. A notícia deve ter chegado a Edward. Ele
não iria querer arriscar que ela pudesse estar carregando um filho meu. Se
ela ficasse grávida de um menino, ele não estaria tão perto de herdar como
ele acredita que está agora.
Kerrick ficou em silêncio por um momento antes de dizer:
— Sinto muito, Nicholas. Por saber que seu pai e seu irmão foram
assassinados… — Ele balançou a cabeça, sem palavras.
As mãos de Nicholas se fecharam em punhos.
— Quero ir lá agora e estrangular aquele bastardo.
— Teremos que chamar as autoridades.
— Eu sei. Essa é uma das razões pelas quais queria falar com você.
Acredito que tenha amigos que sejam qualificados de forma única para nos
ajudar. — Nicholas suspeitava há algum tempo que Kerrick tinha ligações
com o Ministério do Interior do governo. Ele até se perguntou se algumas
das misteriosas ausências de seu amigo poderiam ser atribuídas a ele se
envolver em trabalhos de espionagem. Nunca perguntou a ele sobre isso,
mas a resposta de Kerrick agora parecia confirmar suas suspeitas.
— Claro — disse Kerrick, não se preocupando em fingir inocência
sobre suas conexões. — Conheço o homem certo. Ele vai descobrir a culpa
de Edward. — Nicholas assentiu em agradecimento. — Sairei hoje e
voltarei assim que puder. Tente ter cuidado até lá. Afeiçoei-me bastante à
sua esposa e, por mais que eu queira estrangulá-lo às vezes por sua
teimosia, prefiro não voltar para descobrir que você se tornou outra vítima
da ganância de seu primo.
 
Capítulo 17

ESTA FOI a primeira discussão que eles tiveram desde que se casaram e
Louisa não conseguia entender por que Nicholas tinha escolhido aquele
momento, quando eles eram esperados em breve para o jantar de sua tia,
para teimosias. Ela ficou consternada ao saber que ele ainda não tinha se
vestido e finalmente o encurralou em seu escritório, onde agora estava de
frente para o marido em sua mesa enquanto ele se reclinava em sua cadeira.
— Se cancelarmos agora, a rixa entre você e seus primos nunca será
consertada.
— Bom — disse ele, sua carranca se aprofundando —, todos eles
podem ir para o inferno. Não me importo se não vir algum deles
novamente.
Por mais que concordasse de todo o coração quando se tratava de
Edward Manning, não podia deixar de sentir que Mary não merecia tal
censura do marido.
— Se não comparecer por causa de sua avó, faria isso por mim?
— Estou fazendo isso por você. Não a quero perto do meu primo. Eu
não me importo com quantas pessoas estejam no cômodo no momento.
Ela pensou que eles já tinham resolvido esse assunto e não conseguia
entender por que estavam discutindo sobre isso mais uma vez. Teria que dar
a ele um incentivo extra. Com um cálculo cuidadoso, ela colocou as palmas
das mãos na mesa dele e inclinou-se para frente, dando-lhe uma visão
tentadora de seus seios que agora ameaçavam transbordar. Ela escondeu o
sorriso quando os olhos dele desceram.
— Lembra daquela coisa que você queria fazer na cama na outra noite?
Sua carranca levantou e um brilho de interesse entrou em seus olhos.
— O que você está propondo?
— Faça uma coisa para sua avó, uma noite na casa de sua tia. Em troca,
vou concordar em tentar o que você sugeriu.
Ele franziu a testa.
— Isso é chantagem.
— Prefiro pensar nisso como uma negociação.
Ele levantou-se rapidamente e contornou a mesa. Quando ela se
endireitou para encará-lo, ele segurou sua nuca, seu polegar acariciando ao
longo da coluna e de seu pescoço.
— Talvez possamos tentar o que eu pedi primeiro e depois podemos ir
ao jantar.
A voz dele era baixa e rouca e, apesar de suas dúvidas, um arrepio de
antecipação passou por ela.
Ela balançou a cabeça e girou fora do alcance dele para aproveitar sua
vantagem.
— Não, porque assim você não terá nenhuma razão para manter sua
parte do acordo.
Os olhos dele se estreitaram.
— Qual é a minha garantia de que depois do jantar você não vai mudar
de ideia?
— Vai ter que confiar em mim.
Ele caminhou em direção a ela.
— Isso não é bom o suficiente. Acho que vou precisar de um pequeno
adiantamento primeiro.
— Deixamos para cancelar muito tarde e não temos tempo para… você
sabe. — Ela podia sentir que estava corando.
— Não deixamos muito tarde. Você que decidiu ignorar meus desejos
de enviar nossas desculpas. — Ele capturou uma de suas mãos e a puxou
para ele. — Acho que, dadas as circunstâncias, você me deve alguma
compensação.
O coração dela acelerou quando ele arrastou a mão pela parte externa de
sua coxa e começou a puxar seu vestido para cima. Ela enterrou a cabeça no
ombro dele. Sabia que seu protesto era fraco, mas tinha que fazer isso.
— Não temos tempo…
— Tia Elizabeth esperou tanto tempo para preparar seu pequeno jantar
de reconciliação. Ela pode esperar mais um pouco.
Ela não resistiu quando ele a virou e começou a fazer com que andasse
para trás. Quando o traseiro dela bateu contra a borda de sua mesa, ele a
levantou para que ela pudesse se sentar na borda. Não precisava dizer a ela
o que queria. Agora quase tão ansiosa quanto ele, ela desabotoou a calça
dele e estendeu a mão para envolver sua ereção. A respiração dele sibilou
quando ela o apertou.
— Megera — disse ele, levantando suas saias até que ela estivesse nua
da cintura para baixo.
— Acredito que você me prefere assim — disse ela, puxando a mão
para cima e para baixo ao longo de seu comprimento considerável.
— Você não pode nem começar a imaginar — disse ele, abrindo as
pernas dela e movendo-se entre elas.
Ela ajudou a guiá-lo, seu corpo pronto, e gemeu em apreciação quando
ele empurrou nela com um golpe certeiro. O ritmo que estabeleceu foi
implacável, e ela atingiu seu pico duas vezes antes que ele se permitisse à
própria liberação.
POR FIM, atrasaram meia hora. Pelo alívio óbvio no rosto de sua avó,
Nicholas podia dizer que ela esperava que ele a mandasse sozinha. Ele
ainda tinha grandes reservas sobre a sabedoria de colocar sua esposa em
perigo. Permitiu que ela o influenciasse, mas apenas porque parte dele
queria a oportunidade de observar seu primo. Rezou para que Edward não
fosse estúpido o suficiente para fazer qualquer coisa com toda a família lá,
mas sabia que homens desesperados não podiam agir racionalmente. O
atentado contra a vida de Louisa tinha sido a prova disso.
Ele estava no limite e não se incomodou em tentar mascarar seu humor.
A tensão na viagem de carruagem até a casa de sua tia era palpável. Até
Catherine, sempre disposta a preencher qualquer silêncio com conversas
animadas, permaneceu calada. Pegou Louisa examinando-o algumas vezes.
Odiava não poder ser honesto com ela, mas não queria que se preocupasse
ou tivesse falsas esperanças sobre sua doença até que tivesse provas de suas
suspeitas.

QUANDO CHEGARAM à casa, as reservas que Louisa tentara ignorar


começaram a surgir. Aumentando seu estresse estava o fato de que esta
seria a primeira vez que ela pisaria em sua antiga casa desde que eles foram
expulsos por Henry Manning há tantos anos. Catherine era muito jovem
para se lembrar de sua vida antes de seu pai perder tudo, mas Louisa se
lembrava muito bem. Nicholas apertou sua mão para tranquilizá-la e ela
sorriu para ele, grata por tê-lo ao seu lado. Se Lady Overlea parecesse
menos esperançosa, ela teria mudado de ideia naquele momento e voltado
para casa. No entanto, não poderia decepcionar a avó de Nicholas. Não
depois da rapidez com que acolhera ela e Catherine na família. Ela
experimentou uma pontada de dor sabendo que John também teria se
sentido bem-vindo se tivesse ficado.
Nicholas levantou a aldrava e bateu duas vezes, o som quase
ensurdecedor no silêncio que os envolvia. A porta foi aberta um momento
depois por um lacaio e eles foram conduzidos à sala de visitas.
Nicholas inclinou-se para ela e disse suavemente:
— Tem certeza de que quer continuar com isso? Ainda podemos fugir.
Antes que Louisa pudesse repreendê-lo, sua avó o interrompeu:
— Não dê ouvidos a ele, minha querida. — Ela voltou-se para Nicholas.
— Você vai se comportar esta noite.
— Ou o quê, vovó? A senhora tem mais alguma coisa para me obrigar a
isso?
Sua pergunta surpreendeu Louisa. O que o tornou mais perturbador, no
entanto, foi o rápido olhar que Lady Overlea lançou em sua direção. Ela
teria que se lembrar de perguntar a ele sobre aquela conversa mais tarde.
Elizabeth Manning entrou na sala naquele momento e Louisa ficou feliz
por ter tomado cuidado extra com sua aparência. A mulher mais velha
estava vestida com um vestido de seda dourada deslumbrante e joias
escorriam de sua garganta e braços. Louisa não estava vestida de maneira
tão elaborada, mas ela sabia que ninguém iria criticar seu traje.
Ela foi seguida por um Edward taciturno e uma Mary recatada. A tia de
Nicholas, Elizabeth, parecia ser a única pessoa do grupo ansiosa pela noite.
Até Lady Overlea, embora claramente esperando o melhor, parecia
cautelosa.
— Estou tão feliz que todos estejam aqui — exclamou Elizabeth. — Faz
muito tempo desde que nossos dois lados da família estiveram juntos.
A avó de Nicholas aceitou o beijo que sua nora deu em sua bochecha.
Louisa não pôde deixar de notar que seu sorriso foi forçado.
— Foi convidada para o casamento do meu neto — disse ela, sua voz
cuidadosamente neutra.
Elizabeth acenou com a mão descartando.
— Dado o quão magoada minha pobre Mary ficou por ter se enganado
sobre suas perspectivas, tenho certeza de que todos entendem por que ela
não se sentiu disposta a comparecer. E como mãe dela, era meu papel ficar
ao seu lado durante seu momento de grande decepção. Decidimos, no
entanto, que chegou a hora de deixar nossas divergências para trás. Afinal,
somos uma família.
Louisa lançou um olhar rápido para o marido, meio que esperando que
ele fizesse um comentário cáustico sobre a falsidade da esperança da prima.
Ela ficou surpresa quando ele permaneceu em silêncio, porém agradeceu.
Quanto antes o assunto terminasse, mais cedo eles poderiam passar para
temas menos controversos.
— Estou muito feliz com esta oportunidade de conhecer melhor a todos
— disse Louisa.
Ela evitou olhar para Edward enquanto falava, lembrando muito
claramente que não muito tempo atrás ele esperava conhecê-la muito bem.
Mary interrompeu, falando com sua voz suave habitual:
— Mamãe, acredito que o jantar está pronto para ser servido.
— Claro, querida — disse Elizabeth. — Parece que começamos tarde
esta noite.
Louisa podia ouvir a censura na voz da mulher e ficou surpresa,
novamente, quando Nicholas não disse nada. Quando olhou para ele, pôde
ver o porquê. Edward tinha se movido para a lareira e estava lá, com um pé
nela, olhando para o fogo. Nicholas o estava examinando, seus olhos
semicerrados em contemplação. Ela não ficou surpresa com a pitada de
raiva em sua expressão, e adivinhou então que seria uma noite bem longa
ou muito curta se ele permitisse que sua raiva se liberasse.
Elizabeth aproximou-se de Nicholas, esperando que ele a levasse para
jantar, mas ele não saiu do lado de Louisa. Tentando, mas não conseguindo
esconder seu aborrecimento, ela foi até o filho, que relutantemente voltou
sua atenção para os convidados. Ele a conduziu e os outros os seguiram.
A estranha rigidez da noite continuou durante todo o jantar. Sem dúvida,
sentindo que Mary era a pessoa mais receptiva do outro grupo, Catherine
tentou várias vezes iniciar uma conversa. Seus esforços, no entanto, foram
recebidos com meias respostas empoladas. Elizabeth parecia fazer um
esforço, mas não conseguia conter os pequenos golpes pelos quais era
conhecida. E Edward… Louisa o pegou olhando para ela uma vez, seu rosto
abertamente hostil, e um arrepio de inquietação a percorreu. As mãos de seu
marido, ainda segurando seus utensílios, endureceram. Por um momento ela
temeu que ele fosse usar a faca como arma contra o primo. Colocou a mão
sobre a dele e sorriu tranquilizadora quando ele virou-se para olhá-la. Uma
veia pulsava em sua bochecha. Foi nesse momento que ela percebeu que ele
estava certo. Não deveriam ter ido. Se a noite terminasse sem Nicholas e
seu primo brigando, seria um milagre.
Louisa virou-se para Mary.
— Catherine vai debutar na próxima primavera e nós iremos à cidade
para a temporada. Estará lá?
Mary olhou para a mãe antes de responder.
— Nós ainda não decidimos.
— Nós não esperávamos que Mary precisasse de uma temporada —
Elizabeth disse em um tom frio —, então não fizemos arranjos. Talvez,
dada a nossa recente decepção, possamos nos impor ao meu sobrinho e ficar
em sua casa.
— Infelizmente isso não será possível. — O tom de Nicholas era suave,
porém firme.
— Mas primo — disse Edward, sua voz escorrendo com falsa
sinceridade, — certamente você pode fazer muito por nós, já que toda a
nossa família tem sido tão ofendida ultimamente.
Suas palavras foram acompanhadas por um olhar nada sutil na direção
de Catherine e o estômago de Louisa revirou-se de desgosto.
Nicholas levantou-se tão rápido que sua cadeira teria caído no chão se
um lacaio não tivesse corrido para pegá-la antes que ela caísse.
— Vamos embora — disse ele.
Louisa congelou, mas apenas por um momento. Ela tirou o guardanapo
do colo e o colocou sobre a mesa. Catherine não sabia o que estava
acontecendo, mas estava claro que havia percebido as palavras de Edward e
estava visivelmente abalada. Louisa pegou a mão dela e a apertou, e ambas
levantaram-se.
Nicholas virou-se para Lady Overlea.
— Vovó?
O olhar de Lady Overlea moveu-se do rosto determinado de Nicholas
para o exultante de seu primo. Edward havia realizado o que se propusera a
fazer. Ficou claro agora para todos que ele nunca teve a intenção de
consertar a rixa entre as duas famílias.
Sem dizer uma palavra, a viúva levantou-se e saiu do cômodo.
— Vá em frente, vá embora — gritou Elizabeth atrás de sua figura em
retirada. — Todos nós sabemos qual neto você prefere. Por que fingir o
contrário?
Os passos da mulher mais velha não vacilaram. Ela nem olhou para
Nicholas quando passou por ele. Louisa e Catherine seguiram
silenciosamente com Nicholas por último. Esperaram do lado de fora até
que a carruagem fosse trazida. O ar estava frio, mas ninguém disse uma
palavra. Esse silêncio continuou enquanto a carruagem se afastava da casa.
Nicholas olhou pela janela, sua mandíbula apertada.
A culpa atacou Louisa.
— Sinto muito — disse ela, sua voz soando anormalmente alta na
atmosfera opressiva.
Surpreso, Nicholas virou-se para olhá-la.
— Pelo quê?
— Eu deveria ter ouvido você. Nós nunca deveríamos ter vindo aqui
esta noite.
— Não — interrompeu a marquesa viúva —, a culpa é minha. Sei que
você aceitou por minha causa.
— Não é culpa de ninguém, e sim deles — disse Nicholas. Embora
tentasse, não conseguia manter a raiva oculta em sua voz.
Catherine externou a questão que Louisa estava se perguntando:
— O que aconteceu entre os dois ramos da família? Deve ter sido muito
ruim para causar uma ruptura tão grande.
Nicholas riu, o som era amargo.
— Pode-se imaginar que esse seja o caso. O fato, porém, é que não
aconteceu nada. Meu tio sempre odiou meu pai e passou esse ódio para sua
esposa e filhos.
— Eles eram gêmeos, não eram? — perguntou Louisa.
— Sim — respondeu ele. — Lembro-me de uma vez, quando criança,
confundi meu tio com meu pai. Corri até ele e tentei abraçá-lo. Só consegui
alcançar as pernas dele na hora. — Ele fez uma pausa breve, mas ninguém
disse uma palavra, esperando que ele continuasse. — E ele me chutou.
Louisa ofegou horrorizada. Ela podia imaginar muito bem a confusão e
a dor que Nicholas deve ter sentido na época.
— No entanto, tive sorte. Meu tio reservava a maior parte de seu ódio
para meu pai e irmão. Como era improvável que eu herdasse, ele
geralmente me ignorava.
Lady Overlea balançou a cabeça e suspirou. Ela se manteve com
dignidade, mas Louisa podia sentir sua tristeza à espreita logo abaixo da
superfície.
— Henry nunca superou o fato de ter perdido o título por meros dez
minutos. Certamente não ajudou que meu marido não escondesse o fato de
preferir o pai de Nicholas a ele. Tentei compensar isso, mas obviamente
falhei.
Nicholas pegou a mão da avó.
— Nada disso é culpa sua, vovó. Meu tio pode ter se sentido enganado,
sim. Acho que posso entender, embora tenha que dizer que nunca invejei
James por ele ser o herdeiro. Dada a proximidade de suas idades, não tenho
dúvidas de que foi uma pílula amarga para meu tio engolir. No final, porém,
ele é o único responsável por suas próprias ações. Ele não tinha que passar a
vida chafurdando em sua amargura. E transmitir esse ódio aos seus filhos
foi algo inconcebível.
Ninguém falou pelo resto da viagem para casa. Assim que chegaram,
Lady Overlea deu boa noite a todos e subiu para seus aposentos. O coração
de Louisa se condoeu com a avó de Nicholas enquanto ela a observava
subir as escadas, a decepção pesando em seu corpo miúdo.
Ela virou-se para Catherine, ansiosa para confortá-la pelo término
desagradável do jantar, mas foi a irmã quem falou primeiro:
— Estou bem, Louisa — disse ela. — Devo dizer, no entanto, que seu
primo não é nem remotamente parecido com você, Nicholas.
— A inveja pode levar um homem a fazer muitas coisas vis.
— Acho difícil acreditar que é apenas ciúme. Há um ar de desagrado
nele e duvido que se comportasse de maneira diferente se fosse o marquês.
— Sim — disse Nicholas, sua expressão sombria. — Bem, pelo menos
agora está feito. Pode confiar que não haverá repetição da farsa desta noite.
Depois de se despedirem, Louisa esperou até que a irmã estivesse fora
de vista antes de se voltar para o marido.
— Eu sinto muitíssimo.
Nicholas a tomou em seus braços.
— Pare de falar bobagem. Nada disso é culpa sua. Quero que tire essas
ideias da cabeça.
Louisa tentou sorrir, mas o estresse do jantar ainda pesava sobre ela.
— Bem, pelo menos a noite acabou.
— Não exatamente — disse Nicholas com um sorriso malicioso se
formando. — Pelo que me lembro, prometeu fazer algo por mim…

CONFORME OS dias se passaram, Louisa tentou empurrar seu medo para o


fundo de sua mente, mas não conseguia parar de observar o marido,
esperando sua próxima crise. Nicholas parecia tão cheio de vitalidade, tão
saudável, que a última coisa que alguém que o olhasse seria acreditar que
ele era um homem com uma doença terrível. Houve momentos, no entanto,
em que o medo pelo futuro a dominava. Normalmente esses momentos
vinham depois que faziam amor e ela estava deitada saciada e contente nos
braços dele. O pânico surgiria espontaneamente então, provocando-a com o
conhecimento de que tais momentos de pura felicidade poderiam chegar ao
fim a qualquer momento, e ela levava muito tempo para adormecer.
Quando amanhecia, Louisa se ocupava e se recusava a permitir que
esses pensamentos sombrios a dominassem. Observando Nicholas naquela
manhã do outro lado da mesa do café, ela ficou novamente impressionada
com o quão saudável ele parecia.
Ela estava tão perdida em seus próprios pensamentos que mal percebeu
o humor de Catherine. As palavras de seu marido, portanto, a
surpreenderam.
— Eu quase posso ouvi-la pensando, Catherine. Já decidiu se quer me
perguntar sobre o que está claramente em sua mente?
Louisa olhou para a irmã a tempo de vê-la corar.
— Ouvi dizer que recebeu uma carta de Lorde Kerrick ontem — disse
ela, seu rubor se aprofundando. — Eu só estava me perguntando como ele
está. Ele foi embora tão de repente sem nem se despedir.
Louisa estava tão preocupada com suas próprias inquietações, que só
então ela pensou a respeito e percebeu que o humor de Catherine andava
sombrio ultimamente. Na verdade, desde que Kerrick partira.
— Receio que tenha sido inevitável. Surgiu uma situação que exigia sua
atenção imediata. No entanto, ainda há alguns assuntos que precisamos
resolver e ele deve retornar amanhã.
Um sorriso iluminou o rosto de Catherine.
— Fico muito feliz em saber disso.
Nicholas levantou uma sobrancelha com a resposta entusiasmada dela,
mas não disse mais nada. Depois que ele pediu licença e foi para seu
escritório, Louisa parou Catherine antes que ela pudesse desaparecer na
estufa durante o dia.
— Temo a ter negligenciado ultimamente, Catherine. Ando preocupada
com outras coisas, mas isso não é desculpa.
— Estou um pouco velha para esperar que cuide de mim. Estarei na
sociedade em breve. — Seu humor melhorou ainda mais. — É sobre isso
que deseja falar comigo?
— Lady Overlea me disse que a modista que usamos para o meu
guarda-roupa virá nos visitar no final desta semana para tirar as medidas
para as roupas de noite que irá precisar para a próxima primavera.
Catherine apertou sua mão.
— Isso não é maravilhoso, Louisa? Quando penso em como as coisas
eram há tão pouco tempo, quão terríveis nossas circunstâncias… — Ela
balançou a cabeça. — Foi sorte que Nicholas tenha encontrado o caminho
para nossa casa naquela noite. Sei que se preocupa com John, mas devemos
ter fé de que ele está bem.
Ela estremeceu por dentro quando percebeu que não pensava em seu
irmão mais novo há algum tempo.
— Não era sobre isso que eu lhe queria falar. Eu queria discutir sobre
Lorde Kerrick.
— Ele está fora há apenas uma semana, mas sinto falta dele. — A testa
de Catherine se enrugou quando um pensamento lhe ocorreu. — Imagino
que quando ele retornar, sua visita será curta.
— Escute a si mesma. Lorde Kerrick é onze anos mais velho que você.
Catherine se enrijeceu.
— Sei a idade dele. Isso tem a ver com alguma coisa?
— Tornou-se evidente para todos que desenvolveu uma paixão por
Lorde Kerrick.
— Por que eu não deveria? Está irritada por ele não lhe prestar mais
atenção? Isso é muito injusto, Louisa. Quer ter o interesse de todos os
homens?
Louisa ficou chocada com a acusação da irmã, principalmente porque o
oposto havia acontecido recentemente. Ao longo dos últimos anos, ela tinha
visto os olhares masculinos especulativos dirigidos a Catherine. No entanto,
dado o trato que ela e Kerrick tinham feito para despertar o ciúme de
Nicholas, ela não podia culpar a irmã por acreditar naquilo.
— Lorde Kerrick e eu somos apenas amigos. Não tenho nenhum desejo
de receber qualquer atenção romântica dele.
A raiva de sua irmã murchou.
— Sério?
— Como pode pensar desta forma? Não está claro que tenho
sentimentos por meu marido? Sabe que não sou de flertes.
Catherine pensou em todos os seus dezessete anos, sua incerteza e alívio
eram muito evidentes.
— Não achava que fosse desse tipo, mas houve vezes em que os vi
juntos… não pude deixar de me perguntar.
Louisa pesou o quanto dizer à irmã. Se ela notara o jogo que ela e
Kerrick fizeram para despertar o ciúme de seu marido, então quantos outros
também teriam notado?
— Lorde Kerrick estava se divertindo às custas de Nicholas. Ele achava
divertido as demonstrações de ciúmes do meu marido.
— Fico aliviada em ouvi-la me dizer isso — disse Catherine, mas
Louisa não tinha certeza se a irmã acreditava nela.
Um pensamento horrível lhe ocorreu. Ela não achava que Kerrick fosse
do tipo que tirava vantagem de uma inocente, mas tinha que perguntar.
— Lorde Kerrick fez algum avanço impróprio em relação a você?
Catherine corou.
— Claro que não. Ainda não debutei.
Louisa sabia que isso não deteria muitos homens. Ficou aliviada, no
entanto, ao saber que sua fé no amigo de Nicholas não era equivocada.
Catherine levantou-se e virou-se para sair, e Louisa a liberou com uma
esperança silenciosa de que sua irmã não sofreria um futuro desgosto. Ela
sabia que Kerrick gostava de Catherine e a achava atraente. Viu que olhava
para a irmã vezes suficientes para discernir sua admiração por sua beleza,
mas isso não significava que ele pretendia cortejá-la.
— Oh, eu quase me esqueci — disse Catherine. — Antes de você
descer, dei a Nicholas a lista de plantas que ele queria.
Louisa franziu o cenho. Não achava que Nicholas estivesse interessado
em botânica.
— Que lista de plantas?
— A lista de plantas venenosas que me pediu para pegar para ele.
— Por que ele precisa de uma lista de plantas venenosas?
Catherine revirou os olhos como se a resposta fosse óbvia.
— Para mantê-las fora de casa. Uma das plantas na estufa o deixou
tonto na semana passada.
Catherine virou-se e saiu da sala de café da manhã, deixando-a
perplexa. Nicholas sofrera outra crise recentemente e não tinha contado a
ela? Foi em direção ao escritório para confrontá-lo, mas parou quando
percebeu que estava exagerando.
Ela saberia se ele tivesse sofrido uma crise, mas ele só ficara tonto, e
Catherine e ele pensaram que uma das plantas na estufa tinha causado isso.
O que isso significava? Mais importante, por que Nicholas não contou a ela
sobre isso?

NICHOLAS OLHOU para cima dos papéis que estava estudando e esfregou
os olhos. Nunca tinha percebido quanto trabalho estava envolvido em ser
um marquês. Como filho mais novo, ele nunca teve que aprender todos os
detalhes envolvidos na administração da propriedade e, embora sempre
tenha se interessado por política, suas opiniões eram apenas isso. Opiniões.
Agora que era esperado que ele se sentasse no Parlamento, ele levava essa
responsabilidade a sério. Especialmente porque agora ele tinha uma
esperança renovada em seu futuro.
Seu futuro. Ele sorriu ao pensar em Louisa e na vida que teriam juntos,
mas primeiro ele tinha que determinar a culpa de Edward. Kerrick poderia
não chegar ali rápido o suficiente. Sua carta dizia que estaria acompanhado
por Lorde Brantford. Não deu mais detalhes, mas Nicholas sabia que
Kerrick tinha amigos envolvidos na inteligência. No entanto, nunca
imaginou que o Conde de Brantford fosse um desses homens.
Ele voltou a atenção para sua leitura, mas foi interrompido alguns
minutos depois por uma batida na porta. Esperando que fosse sua Louisa,
ele a mandou entrar, mas em vez disso era seu valete. Ficou desapontado,
mas apenas por um momento. Harrison estava agindo de forma estranha e
era hora de entender o motivo de sua evasão.
— Peço desculpas, milorde — disse o valete com uma breve reverência.
O homem estava definitivamente nervoso. Nicholas fingiu olhar para o
relógio da lareira antes de falar.
— É algo que não podia esperar até que eu o visse mais tarde?
— Lady Overlea pode interferir mais tarde.
Parecia que ele não precisaria chamar seu valete depois de tudo. Sabia
que o homem se referia a Louisa e teve que reprimir a vontade de
repreendê-lo por falar contra a dona da casa.
— Então o que é?
— Consegui adquirir algumas garrafas de seu conhaque favorito. Lady
Overlea foi bastante meticulosa quando se livrou de todas as bebidas da
casa, e sei que ela pegou a última garrafa que lhe dei. Achei que seria mais
prudente se ela não soubesse que o senhor tem um novo estoque.
Novo estoque? Meu Deus, quanto o homem havia adquirido? Ele
percebeu que era muito provável que sua próxima bebida contivesse uma
dose letal do veneno. Edward deveria estar ficando impaciente.
Ele recostou-se na cadeira, fingindo uma aparência de resignação.
— Isso não será necessário, Harrison.
— Ela desistiu?
Ele balançou a cabeça.
— Receio que minha esposa tenha razão. Dada a gravidade da minha
última crise, decidi parar de beber.
Nicholas observou o outro homem cuidadosamente para analisar sua
reação.
— Parar de beber? Quer dizer não beber conhaque, milorde? Se for esse
o caso, posso obter outra coisa para o senhor.
Nicholas balançou a cabeça.
— Infelizmente terei que parar de beber destilados.
A expressão no rosto de Harrison era impagável.
— Mas o senhor sempre gostou de uma boa bebida de vez em quando.
Nicholas suspirou.
— Receio que esses dias tenham ficado para trás. Terá de ser chá e café
pelo tempo que me resta.
— Chá?
Enquanto seu valete estava desequilibrado, Nicholas se moveu para
matar.
— Quando estava planejando me contar sobre sua conexão com a casa
do meu primo?
A cor sumiu completamente do rosto de Harrison.
— Perdoe-me, milorde?
— Foi visto, Harrison.
Seu valete parecia que não queria nada além de dar meia-volta e fugir.
— Achou que o iria desaprovar formando um apego romântico? Posso
ter sido um solteirão declarado antes do casamento, mas dificilmente era
um monge. Entendo que um homem tem suas necessidades.
O alívio no rosto do outro homem era ridiculamente óbvio. Ele esperava
que Harrison nunca começasse a jogar. Ele seria horrível nisso.
— Um interesse romântico. É claro. Está se referindo a…
— Seu encontro com a criada do meu primo. Ela foi vista lhe passando
um bilhete de amor.
Harrison desviou o olhar e limpou a garganta antes de continuar:
— Não havia nada a dizer, milorde. Receio que a garota tenha formado
um apego mais forte do que eu pretendia. Foi apenas um flerte leve.
Ele tropeçou em suas palavras enquanto falava. Ótimo, pensou
Nicholas. Ele deixara o homem claramente abalado.
— Entendo, mas se o relacionamento se tornar mais sério, virá até mim,
espero. Eu não sou um ogro a ponto de esperar que os dois continuem se
esgueirando pelas minhas costas.
— Não, milorde. Obrigado, milorde. Vou permitir que volte ao seu
trabalho agora…
A boca de Nicholas se firmou em uma linha sombria enquanto
observava o homem sair correndo de seu escritório. Ficou claro que
Harrison estava envolvido no envenenamento. Nicholas tinha toda a
confiança de que confessaria rapidamente sob interrogatório.
Ele levantou-se e começou a andar. Não queria nada além de seguir seu
valete e torcer o pescoço do homem para descobrir os detalhes da trama
naquele exato momento. Quando pensou em como Edward tinha matado
seu pai e irmão… Seus punhos se fecharam e ele teve que respirar fundo
várias vezes antes que pudesse relaxar. Nada seria ganho se ele se revelasse
agora. Só esperava que seu questionamento impulsivo não lhe tivesse
entregado. Era vital que seu primo acreditasse que ele teria sucesso em
matar o atual marquês.
Fez o seu caminho de volta para a mesa e tentou reorientar sua atenção
em sua leitura. Tudo o que podia fazer agora era esperar.
 
Capítulo 18

PELA MANEIRA que Louisa continuava olhando para ele durante o jantar,
Nicholas percebeu que queria falar com ele. Como Catherine lhe dera a lista
que ele pedira naquela manhã, ele imaginou que ela poderia ter comentado
com a irmã o que havia acontecido na estufa. Relutou com o quanto contar
a ela sobre aquele incidente e sua crescente convicção de que os homens de
sua família tinham sido, e continuavam sendo, envenenados. Não queria
mentir para ela, mas era primordial que a mantivesse segura. Ela já tinha
sido alvo de uma tentativa deliberada de machucá-la. Saber a verdade
permitiria que ela fosse mais cautelosa, ou colocaria um alvo maior nela se
começasse a se comportar de maneira diferente depois de saber a verdade?
Graças a Deus, Kerrick e Lorde Brantford deveriam chegar no dia
seguinte. Queria que toda essa bagunça terminasse. Não havia como dizer o
que Edward faria em seguida.
Louisa retirou-se depois do jantar, alegando dor de cabeça. O olhar que
ela lhe dera antes de subir as escadas, no entanto, deixou claro que queria
que a seguisse. Ele sorriu enquanto contemplava todas as coisas que faria
para tentar distraí-la das perguntas que queria fazer. Ele a deixaria sem
dúvidas de que estava no auge da saúde.
Sorrindo, ele entrou em seus aposentos um quarto de hora depois. Ele
esperava encontrar Louisa acordada, então a visão dela dormindo em sua
cama, em cima da colcha, o fez parar. Talvez ela realmente estivesse com
dor de cabeça.
Ele fechou a porta suavemente antes de se aproximar da cama e olhar
para a esposa. Seu coração se revirou com a profundidade de seus
sentimentos por ela. Mal podia esperar que essa provação terminasse para
que pudesse dizer a ela que a amava. Enquanto sua vida estava em perigo,
no entanto, não queria aumentar a perda dela caso algo lhe acontecesse.
Sabia que ela sentia o mesmo por ele. Pelo menos, esperava que ela
sentisse. Sofreu um momento de dúvida enquanto se perguntava se ela só
estava preocupada com ele porque era de sua natureza cuidar dos outros.
Afinal, ela estava há alguns anos encarregada da casa e de sua família,
cuidando dos irmãos mais novos e do pai durante a doença que finalmente
acabou tirando a vida dele. Ele franziu a testa enquanto as dúvidas enchiam
sua mente.
Sua respiração congelou quando percebeu que ela estava corada. Isso
não era um sintoma normal de uma dor de cabeça. Ele colocou uma mão
ligeiramente trêmula em sua testa e xingou silenciosamente quando
descobriu o quão quente ela estava ao toque. Isso era mais do que apenas
uma dor de cabeça.
Foi só então que ele notou a xícara de chá espreitando debaixo de uma
dobra de seu vestido. Seu olhar se moveu para a mesa de cabeceira, sobre a
qual repousava uma bandeja com um bule e outra xícara. Ele estava tão
preocupado que não percebeu e seu coração se apertou quando entendeu o
que deveria ter acontecido.
Amaldiçoou-se por sua estupidez quando atacou Harrison naquela tarde,
dizendo-lhe que só tomaria chá a partir daquele momento. Nunca lhe
ocorreu que Louisa pudesse consumir um veneno que era para ele. Não, não
só para ele. Havia duas xícaras. O suor brotou em sua própria testa.
Harrison, em um ato de desespero, decidiu resolver o assunto com suas
próprias mãos, ou foi ordenado a fazê-lo?
Caminhou até a campainha e a puxou antes de voltar para a cama.
Colocou a xícara vazia com seu mate na bandeja de chá e com um cuidado
exagerado se abaixou na cama ao lado de sua esposa. Ele levantou a mão
para embalar a bochecha dela e falou baixinho:
— Louisa? Pode me ouvir?
Nada.
Ele a sacudiu suavemente.
— Louisa? Por favor, querida, abra os olhos. Deixe-me saber que está
bem.
Para seu alívio, as pálpebras dela se abriram, mas fecharam de novo
quase que imediatamente. Sua boca se moveu, formando seu nome, mas
nenhum som escapou.
Houve uma batida suave à porta antes que uma das criadas entrasse.
Nicholas não ficou surpreso. Depois de um ato tão desesperado, Harrison
provavelmente se fora há muito tempo.
Ordenou à criada que enviasse um dos lacaios e que fosse chamar um
médico. O pânico nublou seu cérebro e seu estômago se apertou quando ele
olhou para Louisa, deitada imóvel na cama. Sua respiração era superficial,
mas ele agradeceu a Deus por ela ainda estar respirando.
Levantou-se quando o lacaio entrou. Nicholas não conhecia o homem
pessoalmente, mas conhecia sua família. Os Tate eram inquilinos da
propriedade há muitas gerações e, de tudo o que ele ouvira, eles eram uma
família boa e sólida. Era o suficiente. Ele teria que esperar que o homem
pudesse ser confiável.
— Nancy me disse que Lady Overlea adoeceu — disse o criado, seu
olhar indo para Louisa antes de retornar para Nicholas. — O que eu puder
fazer para ajudá-los, milorde, farei com prazer.
Nicholas assentiu sombriamente com as palavras do homem. Sabia que
Louisa era muito querida entre os funcionários.
— Preciso de sua ajuda, William. Posso contar contigo para manter
silêncio sobre o que vou lhe dizer?
O lacaio se endireitou com a pergunta.
— Tem a minha palavra, milorde, que não direi nada a ninguém.
— Bom homem — disse Nicholas. — Primeiro, preciso saber se
Harrison está lá embaixo.
O lacaio balançou a cabeça.
— Não tenho certeza, milorde. Eu o vi há cerca de uma hora, mas não o
vi desde então. É uma casa grande.
— Acho que percebeu que Harrison já tenha ido embora.
Os olhos de Tate se arregalaram quando a importância das palavras de
Nicholas o atingiu e seu olhar se moveu novamente para Louisa.
— O senhor não acredita…
— Temo que ele possa ter dado a Lady Overlea algo que a fez adoecer.
Os punhos de William se fecharam.
— Aquele vira-lata. Eu mesmo vou encontrá-lo e fazê-lo se arrepender.
Nicholas concordou plenamente com o sentimento. Não queria nada
além de perseguir o homem, mas não podia sair do lado de Louisa. Não
enquanto sua vida estivesse em perigo.
— Preciso que veja se pode encontrá-lo. Se ele não estiver em casa,
pergunte nos estábulos. Veja se consegue descobrir em que direção ele pode
ter viajado. E por favor, não conte a ninguém sobre minhas suspeitas.
Ele observou como o lacaio, com os punhos ainda cerrados, virou-se e
saiu correndo do quarto. Se Nicholas fosse um bom juiz de caráter, William
Tate não estava envolvido nesse esquema. Ele parecia genuinamente
surpreso e zangado com o que havia descoberto.
Nicholas passou as mãos pelo cabelo. Desejou que Kerrick já estivesse
lá. O matou saber que Harrison provavelmente estaria escapando naquele
exato momento, mas enquanto a criada permanecesse a serviço de seu
primo, e era improvável que seu valete tivesse tido tempo de enviar uma
mensagem a ela, tinham alguém que poderia testemunhar sobre a culpa de
Edward. Porém, Harrison quem havia administrado o veneno e Nicholas
garantiria que ele fosse enforcado por isso.
A porta tinha acabado de ser fechada quando se abriu novamente e um
redemoinho de cabelos louros voou para dentro do quarto.
— Ouvi dizer que Louisa está doente.
Catherine correu para o lado de sua irmã e tomou seu rosto ruborizado e
imóvel antes de virar-se para enfrentá-lo. — O que aconteceu? Ela disse
que estava com dor de cabeça, mas isso não se parece com nenhuma dor de
cabeça que eu já tenha visto.
Catherine. Se ele estivesse pensando com clareza, teria mandado
chamá-la primeiro. Ela estava estudando as plantas na estufa. Sabia que
algumas eram venenosas, e era possível que soubesse o que precisaria ser
feito naquele momento.
Ele fechou a porta do quarto e virou-se para ela antes de retirar do bolso
a lista que ela lhe dera naquela manhã. Estendendo-o para ela, ele
perguntou:
— Qual destas plantas pode fazer com que sua irmã adoeça dessa
maneira?
Seu rosto ficou branco com o choque. Levou vários segundos antes que
ela conseguisse perguntar:
— O que está dizendo? — Ela pegou a lista com os dedos trêmulos, mas
não olhou para ela.
— Sei que isso é muito para assimilar, mas preciso que pense,
Catherine. Eu tive essa reação outro dia na estufa… Acho que foi por causa
de uma sensibilidade que tenho a uma determinada planta. Uma planta que
alguém vem administrando em mim sem meu conhecimento há algum
tempo.
— Mas por quê?
— O motivo não importa agora. Basta dizer que passei a acreditar que
minha doença foi, na verdade, resultado de envenenamento. Faz sentido que
a fonte do veneno seja a planta que me fez reagir. Com toda a
probabilidade, também é o veneno que Louisa bebeu.
Catherine ofegou com a notícia e olhou perturbada, para a irmã.
— Preciso que se concentre — disse Nicholas, com urgência na voz. —
Qual planta pode causar isso e, o mais importante, o que podemos fazer
para neutralizar seus efeitos?
Catherine balançou a cabeça enquanto olhava para a lista.
— Não sei. Podem ser várias. Tudo dependeria de quanto fosse dado…
— Ela olhou para Nicholas, o desespero em seus olhos. — Algumas dessas
são fatais se ingeridas em qualquer quantidade.
Nicholas fechou os olhos brevemente, concentrando-se em conter seu
próprio pânico antes de dizer:
— Temos que assumir que ela recebeu o mesmo veneno que eu. Isso
eliminaria as plantas que são imediatamente fatais.
Catherine assentiu e olhou para a lista novamente.
— Algumas delas deixariam a pessoa muito doente, mas não são fatais,
a menos que sejam administradas em grande quantidade. — Seus olhos
estavam esperançosos quando ela olhou para Nicholas novamente.
Pensou no que ele acreditava ser sua doença.
— Acho que estamos procurando uma planta que possa ser
administrada em pequenas quantidades para produzir mudanças na
percepção. Causaria tontura, esquecimento e provocaria febre. E sim,
também causaria a morte com uma dose grande — disse ele, pensando no
irmão.
Catherine engoliu em seco visivelmente.
— Acha que Louisa…
— Espero que não — disse ele, enviando uma oração silenciosa e
fervorosa.
As mãos dela tremiam, mas ela revisou a lista novamente com cuidado.
— Não tenho certeza. Pode ser a Datura, mas não tenho certeza de
todos os sintomas.
Nicholas respirou fundo antes de fazer a próxima pergunta:
— Há algo que possamos fazer? Louisa ficou sozinha por quinze
minutos antes de eu encontrá-la.
A pouca cor que ainda restava no rosto de Catherine parecia se esvair
diante de seus olhos.
— Para ter causado este efeito, a dose deve ter sido grande.
A mente de Nicholas girou com as implicações. Ele olhou para a esposa
novamente. Sua cor estava forte e sua respiração ainda superficial. Ele se
familiarizou com o sentimento de impotência dos últimos meses à medida
que sua própria doença progredia, mas isso era muito pior.
Catherine interrompeu sua miséria com um som de exclamação.
— O veneno não está no organismo dela há muito tempo. Podemos ser
capazes de liberar o resto antes que seja totalmente absorvido.
Nicholas virou-se para ela, momentaneamente confuso.
— Como…?
Catherine era a imagem da eficiência agora. Ela o fez lembrar de sua
irmã, o que fez seu coração doer.
— Se ela bebeu o veneno há pouco tempo, ainda estará no estômago.
Podemos induzi-la a esvaziar seu conteúdo…
— O que diminuiria o tamanho da dose que ela recebeu — ele terminou
por ela. É claro. Ele deveria ter pensado nisso.
Ele se moveu rapidamente para o lavatório e voltou com a bacia.
— Gostaria que eu fizesse isso? — perguntou Catherine.
— Eu mesmo vou fazer. Vá buscar água na cozinha. Traga uma jarra
grande e uma taça. Depois que eu terminar aqui, fazê-la beber água pode
ajudar a diluir o que foi absorvido no organismo. — Ele balançou a cabeça.
— Não sei se será útil, mas não há mais nada que possamos fazer, então
devemos tentar.
Catherine virou-se para sair, mas ele a deteve, acrescentando:
— Certifique-se de pegá-los pessoalmente. Não temos como saber
quem mais pode estar envolvido nesta trama.
Catherine assentiu e sem uma palavra saiu correndo do quarto.
Nicholas virou-se para a esposa e endireitou os ombros.
— Hora de acordar, Louisa. — O momento não estava para gentilezas.
— Precisamos lhe tirar essa coisa maldita.

FOI UMA longa noite, mas em algum momento nas primeiras horas da
manhã Louisa abriu os olhos e olhou para ele.
— Eu estava imaginando coisas, ou…?
Ela levou a mão à boca e imitou o movimento.
Um alívio mais poderoso do que qualquer coisa que Nicholas já tinha
experimentado varreu seu corpo.
Louisa franziu o cenho.
— E por que não está na cama comigo?
Ele subiu na cama ao lado dela, arrastou-a em seus braços e apenas a
abraçou. Passou-se um minuto inteiro antes que ele pudesse encontrar sua
voz.
— Me assustou até a morte ontem à noite.
Louisa tentou se sentar.
— O que aconteceu? Por que ainda estou com minhas roupas?
— Lembra-se do que aconteceu ontem à noite depois do jantar?
Ela o encarou inexpressivamente.
— Depois do jantar? Não aconteceu nada.
— Disse a todos que estava com dor de cabeça e subiu as escadas.
Ela levou a mão à cabeça.
— Minha cabeça está doendo. — Sua carranca se aprofundou. — Mas
não estava doendo ontem à noite. Só disse isso porque queria lhe falar em
particular. — Ela deixou cair a mão. — Falando nisso…
Ele a interrompeu:
— Antes de chegarmos a isso, diga-me o que aconteceu quando chegou
ao meu quarto.
— Eu já lhe disse, não aconteceu nada. Eu vim aqui para esperá-lo.
Nicholas precisava saber se Harrison havia colocado a mão em Louisa.
Se ele a forçara a beber o chá.
— Meu valete estava aqui?
— Harrison? Não, o quarto estava vazio. — Ela olhou para ele, sua
expressão curiosa. — Desde quando começou a tomar chá antes de dormir?
Encontrei um bule de chá ainda fresco e duas xícaras na sua mesa de
cabeceira.
— E tomou uma xícara?
— Estava um pouco frio, mas achei que acalmaria meus nervos
enquanto o esperava. Eu estava mais chateada contigo. Catherine me contou
que teve um breve episódio no conservatório. Houve mais crises que
escondeu de mim?
O tempo de proteger sua esposa havia acabado. Com Harrison fora, era
provável que estivessem a salvo de qualquer perigo imediato, mas Nicholas
não podia correr esse risco. Até que esse assunto terminasse e todos os
envolvidos fossem apreendidos, ambos teriam que ter cuidado com tudo o
que consumiam.
Ele contou a ela o que sabia e sobre sua suspeita de que o primo o
estava envenenando. Ele esperava que a reação dela fosse semelhante à de
Catherine na noite anterior, choque e descrença no início. O que ele não
esperava era a compreensão e a compaixão repentinas que iluminaram os
olhos dela.
— Oh, Nicholas — disse, pegando as mãos dele. — Isso vai muito além
de você, não é?
Ele deveria saber que sua primeira preocupação não seria consigo
mesma, mas com ele. Um nó se formou em sua garganta. Ele estava
tentando não pensar em seus pais e seu irmão. Sentira profundamente a
perda deles, mas conseguia manter uma fachada de compostura sempre que
falava dos dois. E depois de saber sobre o envenenamento, a emoção que
ele estava experimentando predominantemente sempre que pensava neles
era a raiva. Raiva pela pessoa que causou suas mortes prematuras – seu
primo Edward – e uma necessidade quase irresistível de vingá-los.
Confrontado agora com a compaixão de Louisa, no entanto, essa raiva
retrocedeu.
Ele enterrou o rosto no pescoço da esposa e se agarrou a ela quando
uma onda de tristeza o varreu. Não poderia dizer quanto tempo eles
permaneceram assim. O que sabia, porém, era que Deus lhe dera um
presente quando seu caminho se cruzou com o de Louisa Evans. Ele quase
estragou o relacionamento deles com seu esquema absurdo para que ela
gerasse um herdeiro com outro homem, mas de alguma forma ele não
conseguiu afastá-la. Jurou que faria o que fosse preciso para mantê-la
segura, mesmo que isso significasse matar Edward ele mesmo.
 
Capítulo 19

OS CONDES Kerrick e Brantford chegaram logo após o café da manhã.


Nicholas os levou para seu escritório, onde se juntou a eles depois de sair
do lado de sua esposa.
Ao entrar no cômodo de painéis escuros, Nicholas se perguntou, mais
uma vez, sobre a escolha da pessoa que Kerrick havia chamado para ajudá-
los a investigar os envenenamentos. Brantford era alguns anos mais velho
que ele e Kerrick, mas o homem louro e de olhos azuis parecia mais jovem.
Havia um ar de calma serena nele, e Nicholas não podia deixar de especular
agora sobre o quanto isso era uma fachada.
Ele contou aos dois homens tudo o que havia acontecido, terminando
com os eventos da noite anterior. William Tate soube que Harrison havia, de
fato, saído de casa enquanto a família estava jantando e que foi visto pela
última vez viajando para o norte. Em vez de retornar para dar essa
informação a Nicholas, entretanto, o lacaio lhe enviou uma nota selada e foi
atrás de Harrison ele mesmo.
— O homem tem alguma experiência em situações como esta? —
perguntou Kerrick.
Nicholas balançou a cabeça.
— Não que eu saiba. No entanto, ele conhece a área muito bem. Melhor
do que Harrison, que cresceu em Londres. Isso deve lhe dar uma vantagem.
— Vamos torcer para que Tate tenha pensado em levar uma arma —
disse Brantford com uma expressão sombria. — Homens desesperados são,
via de regra, perigosos quando confrontados.
— Quero confrontar meu primo o mais rápido possível — disse
Nicholas. — Depois de toda a comoção do dia anterior, não demorará muito
para que a notícia da fuga de Harrison chegue até Edward. Ele vai perceber
que sabemos do envenenamento quando souber que a lady da casa está
supervisionando pessoalmente a preparação de todas as refeições.
Brantford assentiu.
— Acho melhor Kerrick ir atrás de Tate para ajudá-lo a rastrear seu
valete. Vou ficar de olho na casa de seu primo para garantir que ele não vá
embora. Precisamos reunir o máximo de informações que pudermos de seu
homem antes de confrontarmos Edward Manning. Afinal, não temos provas
de que ele esteja envolvido. Uma confissão de Harrison, juntamente com
um exame do chá que teve o bom senso de guardar, deverá ajudar bastante a
provar a culpa dele.
— Há uma criada na casa de meu primo que também está envolvida —
disse Nicholas. — Nós poderíamos questioná-la agora mesmo.
Brantford considerou essa possibilidade antes de finalmente balançar a
cabeça.
— Ainda não. Disse que ela passou um bilhete ao Harrison. Se foi
lacrado, a criada pode nem estar ciente de seu conteúdo. Não, seria melhor
se tivéssemos Harrison primeiro. Ele administrou o veneno, então sabemos
que tem as informações de que precisamos.
Nicholas apertou os dentes em frustração.
Kerrick colocou a mão em seu ombro.
— Brantford sabe do que se trata. E com Tate já em perseguição, temos
uma vantagem inicial em localizá-lo. É uma coisa boa que ele tenha
pensado em enviar uma mensagem de volta. Pelo que parece, não ficaria
surpreso se ele já estivesse voltando com o bastardo enquanto conversamos.
Nicholas assentiu, seu humor estava sombrio. Toda essa provação tinha
que terminar em breve. Estava no limite de sua paciência e não tinha
certeza de quanto tempo mais seria capaz de ficar sentado sem fazer nada.

LOUISA ERGUEU os olhos de seu bordado e olhou para o marido, que


estava sentado atrás de sua mesa lendo mais relatórios. Seu coração
acelerou quando viu a boa aparência sombria dele. Linhas de fadiga
marcavam sua boca, a única evidência de que ele ficara acordado a noite
toda cuidando dela, mas ele recusou sua sugestão de que fosse descansar.
Sabia que seria capaz de seduzi-lo para a cama se prometesse se juntar a
ele, mas ainda estava sofrendo os efeitos posteriores de seu recente
envenenamento. Sua cabeça latejava e seu corpo inteiro estava pesado. Ela
estremeceu novamente ao pensar em quão perto pode ter chegado da morte.
Depois de todas aquelas semanas que ela passou se preocupando com a
saúde de Nicholas, teria sido o cúmulo da ironia se ela tivesse sucumbido à
suposta doença dele.
Ela sorriu quando Nicholas ergueu os olhos de sua leitura e encontrou o
olhar dela.
— Deveria descansar — disse ele, a preocupação gravada em seu rosto.
— Eu estava pensando o mesmo a seu respeito.
Ele empurrou a cadeira para trás da mesa, levantou-se e caminhou até
onde ela estava sentada.
— Tudo bem, ganhou — disse ele, estendendo a mão para ela. —
Vamos pedir a Catherine para supervisionar a preparação do jantar e nos
retirar para um cochilo da tarde.
Ela estreitou os olhos em suspeita.
— Vai esperar até eu adormecer e voltar aqui para baixo.
Ele colocou a mão sobre o coração e arregalou os olhos, parecendo
muito com uma criança pega fazendo uma arte.
— Me fere com sua desconfiança.
Louisa não conseguiu conter a risada que borbulhou dentro dela. O dia
tinha sido difícil, e não apenas por causa dos efeitos físicos duradouros da
noite anterior, mas o conhecimento de que alguém, o próprio primo de
Nicholas, havia tentado ferir os dois – e que de fato conseguira matar os
pais de Nicholas e seu irmão – pairava como uma nuvem escura sobre tudo.
Ela achava quase impossível de acreditar. Nicholas sorriu para ela e sua
respiração ficou presa. Mesmo que ele não retribuísse seu amor, ela dissera
a si mesma que eles eram bons juntos. Se eles pudessem parar os
envenenamentos, era possível que os dois pudessem ter uma vida longa e
feliz juntos. Tinha que se agarrar a essa esperança.
Colocou a mão na dele e permitiu que a ajudasse a se levantar. Nicholas
abriu a porta do escritório, mas parou com a cabeça inclinada para um lado.
— Qual é o problema? — perguntou ela.
Então ela ouviu. O som de várias vozes raivosas vindo da frente da casa.
Seus olhos se encontraram.
— Acha que…?
— Pretendo descobrir.
Nicholas saiu do escritório. Ela estava apenas um passo atrás dele.
Sua primeira impressão foi de caos. O salão da frente estava cheio de
pessoas, e várias vozes competiam para serem ouvidas acima das outras.
Edward Manning estava xingando profusamente, seu rosto vermelho de
raiva. A voz de sua mãe, estridente de indignação, igualou-se à dele em
volume. Mary era o único membro daquela família que permanecia calada.
Ela afastou-se do grupo, seu rosto sereno. O grupo incluía a avó de
Nicholas, o Conde de Brantford e Kerrick.
O silêncio caiu quando o grupo notou a entrada de Nicholas e Louisa,
mas apenas por um momento.
— O que está tramando, primo? — perguntou Edward.
— Eu exijo um pedido de desculpas — gritou Elizabeth Manning. —
Como se atreve a arrastar meu filho aqui como um criminoso comum…
— Basta.
A voz de Nicholas mal se ergueu, mas o comando em seu tom trouxe
obediência instantânea. Olhando para ele agora, Louisa achou difícil
acreditar que ele não tinha sido criado desde o berço para ser o próximo
Marquês de Overlea. O silêncio era absoluto enquanto todos os olhos se
fixavam em Nicholas, que estava ereto e inflexível, com o comportamento
de alguém que não toleraria nenhum desafio.
Nicholas virou-se para encarar Brantford.
— O que aconteceu?
Elizabeth deu um passo à frente e interrompeu antes que o outro homem
pudesse responder.
— Esta… esta pessoa abordou seu primo…
Sua voz morreu quando Nicholas virou todo o peso de sua cólera gelada
sobre ela.
— Quando eu estiver pronto para ouvi-la falar, madame, pedirei sua
versão dos acontecimentos.
A tia respirou fundo para responder, mas mudou de ideia e sabiamente
optou por permanecer em silêncio. Dado o humor atual do marido, Louisa
não ficaria surpresa se Nicholas a trancasse em um dos muitos quartos da
mansão para mantê-la em silêncio.
O Conde de Brantford estava encostado a uma parede, uma expressão
de extremo tédio no rosto. Ele endireitou-se quando Nicholas voltou sua
atenção para ele. Louisa ficou surpresa ao ver que ele era quase tão alto
quanto o marido. Isso, no entanto, era onde a semelhança entre os dois
homens terminava. Enquanto Nicholas tinha o cabelo e olhos escuros,
Brantford era louro. Luz para a escuridão de seu marido. Seu cabelo estava
em um corte curto da moda e seus olhos eram de um azul pálido. Louisa
não tinha dúvidas de que aqueles olhos podiam atravessar uma pessoa.
— A residência de seu primo ficou quieta até o meio-dia, momento em
que observei os criados carregando baús da casa. Como havia duas
carruagens preparadas, uma para a família e outra para a bagagem que
estava sendo arrumada para a viagem, eu só podia supor que uma ausência
muito longa havia sido planejada. Quando seu primo e sua família entraram
na carruagem, eu lhes trouxe aqui em vez disso.
Nicholas levantou uma sobrancelha, mas Brantford respondeu antes que
pudesse fazer a pergunta:
— Tive uma conversa agradável com o cocheiro e ele concordou em me
deixar conduzir a carruagem.
Nicholas assentiu.
Edward permaneceu em silêncio por tempo suficiente.
— Agora veja aqui, Overlea — começou ele, seu rosto ainda vermelho
de raiva. — Está levando nosso desacordo familiar um pouco longe demais.
Não temos que implorar por sua aprovação para nos movermos.
A voz de Nicholas estava estranhamente calma quando ele perguntou, e
Louisa sabia que ele estava mantendo sua raiva sob controle.
— Onde estavam indo?
Edward gaguejou.
— Eu não tenho que lhe responder.
Seu marido se moveu tão rapidamente que Edward não teve chance de
evitá-lo. Nicholas estava cara a cara com seu primo, seus braços agarrando
as bordas do casaco do outro homem para mantê-lo no lugar.
— Minha paciência contigo está no fim — disse ele, sua voz em um
grunhido baixo.
Tia Elizabeth interrompeu:
— Se quer saber, nós estávamos indo para a cidade — disse ela, com o
desdém amarrando cada palavra. — Edward está entediado aqui e devemos
começar a fazer arranjos para um novo guarda-roupa para a temporada de
Mary na próxima primavera.
Passaram-se vários segundos antes que Nicholas soltasse o primo e
desse um passo para trás.
— Achei que não tivessem lugar para ficar na cidade.
— Nós não estamos totalmente sem conexões — respondeu a tia.
— Se importaria de explicar por que nossa casa estava sendo vigiada
por esse rufião? — perguntou Edward.
O homem em questão deu um passo à frente.
— O Conde de Brantford — disse ele, curvando-se com um floreio. —
Prazer em conhecê-lo.
Os olhos de Edward se arregalaram ligeiramente, o que deixou Louisa
muito curiosa. Enquanto antes ele era a imagem da raiva indignada, agora
ele parecia claramente inquieto.
— Por que decidiu nos manter prisioneiros aqui em Kent? — perguntou
Edward.
Nicholas o ignorou e voltou-se, em vez disso, para Lorde Kerrick.
— Eu não esperava vê-lo de volta tão cedo.
— De fato — disse Kerrick. — Eu não estaria aqui agora se não fosse
por seu lacaio. Quando consegui localizá-lo, Tate já estava voltando com
Harrison.
Os olhos de Louisa estavam em Edward enquanto Kerrick falava, mas
se o primo de Nicholas estava preocupado com essa notícia, ele não se traiu
em nada com sua expressão. Se estava sentindo alguma coisa, ele parecia
completamente confuso.
— E? — Nicholas cutucou.
— E o homem foi muito cooperativo. Depois de nos contar tudo, Tate o
levou ao magistrado local. — Kerrick fez uma breve pausa antes de
continuar. — Nicholas, estava certo sobre o envenenamento.
Louisa prendeu a respiração. Em sua mente, depois do que acontecera
com ela, sabia que seu marido estava certo em suas suspeitas, mas tê-las
confirmadas… Uma parte dela não queria acreditar que era verdade. Saber
sem dúvida que tal maldade e ciúme existiam no mundo.
Ela não tinha percebido que Catherine tinha entrado no corredor até
aquele momento. Sua irmã foi para o lado dela e apertou sua mão. Louisa
podia ver que ela também estava muito perturbada com o que estava
testemunhando.
— Dane-se tudo — disse Edward. — Alguém vai me dizer o que diabos
está acontecendo?
Nicholas voltou-se para Edward. Os cantos de sua boca se curvaram,
mas não havia satisfação em seu rosto, apenas uma determinação sombria.
Louisa queria muito ir até ele, mas ela se conteve, sabendo que ele tinha
que fazer isso sozinho.
— Acabou o jogo, primo — disse ele com uma voz quase cansada. —
Nós sabemos sobre o veneno. Será enforcado por isso. Não assassinou um,
mas dois marqueses e tentou matar um terceiro.
A cor sumiu do rosto de Elizabeth Manning, mas Edward continuou a
protestar sua inocência:
— Está louco — disse ele, o primeiro indício de medo tocando seus
olhos. — Não pode esperar fazer as pessoas acreditarem que eu envenenei
alguém, principalmente meu próprio tio e primo.
— Temos provas de que Nicholas estava sendo envenenado — disse
Kerrick. — Nós temos o próprio veneno. Harrison, sendo tolo como é,
ainda estava com ele. Ele esperava descartá-lo assim que deixasse Kent. E
confessou que foi generosamente pago para adicionar uma pequena
quantidade ao conhaque de Nicholas para que todos acreditassem que ele
estava doente. Sua eventual morte seria, portanto, atribuída a essa doença
misteriosa.
O olhar de Edward balançou descontroladamente entre Kerrick e
Nicholas.
— Os dois estão loucos. Eu não envenenei ninguém.
— Na verdade — disse Kerrick —, disso já sabia.
Agora foi a vez de Nicholas e Louisa olharem confusos para ele.
— Acabou de dizer que Harrison confessou — disse Nicholas.
— Ele confessou, mas não estava sendo pago por Edward.
Com aquela notícia explosiva, todos os olhos se voltaram para Elizabeth
Manning. A raiva da mulher aumentou ainda mais e ela não fingiu esconder
seu ódio.
— Não tive nada a ver com nenhum envenenamento. Se essa pessoa
espera colocar a culpa por suas próprias ações em mim, está redondamente
enganada.
Kerrick balançou a cabeça.
— Não, você não. Sei que é inocente. Sua filha, no entanto, não é.
— Mary? Isso é um absurdo!
Mary estava parada silenciosamente ao fundo, absorvendo toda a cena
como se fosse apenas uma espectadora. Agora que ela havia sido empurrada
ao centro das atenções, no entanto, todo o seu comportamento mudou.
Louisa só podia olhar com uma fascinação horrorizada enquanto a mulher
anteriormente mansa se transformava bem diante de seus olhos. Ela deu um
passo à frente e ficou com a cabeça erguida. Sua voz soou em um volume
que eles nunca tinham ouvido dela.
— Obviamente eu demorei demais. Eu deveria ter acabado contigo
meses atrás — disse ela, com ódio e algo mais brilhando em seus olhos.
Levou alguns segundos para Louisa reconhecer. Loucura. Pelas
expressões nos rostos da mãe e do irmão de Mary, ficou claro que eles
estavam igualmente chocados.
— O que está dizendo, Mary? — A voz de Elizabeth estava instável. —
Pare com essa bobagem de uma vez.
Mary riu e o som causou um arrepio de inquietação na espinha de
Louisa.
— Bobagem? Não achou que me negociar com um primo odiado e
tentar fazer o mesmo com um segundo era bobagem. Oh, não, eu sou a
mansa e suave Mary. Eu deveria me afastar e permitir que me vendesse para
que pudesse ter mais dinheiro para gastar.
— Mary!
Edward ficou atordoado com as palavras de sua irmã. Ela virou-se para
ele, sua compostura de volta ao lugar.
— Deveria me agradecer, querido irmão. Com esta família fora do
caminho, era o próximo na fila para herdar. Então, nós dois estaríamos
livres. Poderia fazer o que quisesse sem restrições monetárias e eu não seria
forçada a me casar.
— Fez essa coisa horrível por mim? Assassinato? O que diabos estava
pensando?
— Não seja estúpido, Edward, eu fiz isso por mim. Não me olhe assim,
mãe. Quando Nicholas escapou de suas garras e se casou com outra, nós
duas sabemos que pretendia me casar com o próximo maior lance assim que
chegássemos à cidade. Sem dúvida algum velho bode que iria me maltratar.
Depois de sua explosão estonteante, Mary virou-se para sair, mas
Brantford havia se movido atrás dela enquanto ela falava e agora impedia
sua saída.
— Vou ter que insistir que me acompanhe até o magistrado — disse ele.
Seu tom era uniforme, mas mesmo em sua loucura, Mary podia ver que
ele não era um homem para ser contrariado. Ela não disse mais nada
enquanto o conde a conduzia para fora da casa. Louisa não sabia dizer se
não conseguia reconhecer as consequências que a esperavam ou se
simplesmente não se importava.
Nicholas virou-se para Louisa e segurou suas mãos, apertando-as
levemente. Ela podia dizer pela expressão dele que a revelação de que era a
Mary bem-comportada que estava por trás dos envenenamentos o abalou.
— Kerrick e eu precisamos ir com eles — disse ele.
Louisa assentiu. É claro. O magistrado precisaria saber tudo o que
Nicholas havia experimentado nos últimos meses e o que o levou a
suspeitar que estava sendo envenenado. E também houve os dois atentados
contra a vida dela.
— Voltarei assim que puder. Tente descansar um pouco enquanto eu
estiver fora. Sei que ainda não está se sentindo bem.
Ele deu um beijo rápido em seus lábios antes de soltá-la e Louisa o
observou sair sem dizer uma palavra. Ela pensou que ficaria aliviada
quando o perigo que enfrentavam acabasse, mas não estava. Novas dúvidas
inundaram sua mente e seu coração. Agora que Nicholas sabia que era
saudável, ele se arrependeria da decisão precipitada de se casar com ela?
Seu humor afundou quando ela contemplou essa possibilidade.

TANTA COISA aconteceu nos últimos meses que era quase impossível para
Louisa absorver tudo. Depois da dramática confissão e saída de Mary,
Edward e Elizabeth foram embora sem dizer mais nada. Junto com o agora
falecido Henry Manning, sua família se ressentia do ramo da família de
Nicholas com um ódio que ia além da razão. Ficou claro, no entanto, que
ninguém imaginou que seu ódio contagiaria de tal maneira Mary, o membro
mais frágil da família.
Quando Nicholas voltou, disse a Louisa que Mary havia confessado
tudo. Como ela ficou sabendo das qualidades venenosas da flor que ela
tanto gostava com a observação casual de um amigo pouco antes de os dois
lados da família Manning finalizarem o acordo para que o irmão de
Nicholas, James, se casasse com Mary. O que eles não sabiam era que Mary
havia se apaixonado pelo filho mais novo de um baronete empobrecido
durante sua primeira temporada, mas sua mãe havia proibido o casamento.
Ela assistiu, com o coração partido, enquanto ele cortejava e depois se
casava com outra.
As sementes de sua loucura foram plantadas e cresceram rapidamente.
Ela tentou se matar consumindo um chá preparado com as folhas da planta.
Em vez de morrer, no entanto, ela apenas adoeceu. Ela então concebeu a
ideia de dar o veneno ao seu tio, esperando que sua doença resultante
fizesse com que os Overlea adiassem seu casamento com James.
Ela não pretendia matá-lo, mas os efeitos da ingestão da planta não
eram instantâneos se apenas uma pequena quantidade fosse usada. Quando
o pai de Nicholas sofreu um ataque tardio enquanto dirigia até a vila,
perdendo o controle da carruagem que acabou matando-o e a esposa
instantaneamente, em vez de sentir culpa, no entanto, Mary ficou aliviada.
Seu noivado com James ainda não havia sido anunciado oficialmente, e ela
esperava que ele mudasse de ideia durante o período de luto.
Ela ficou desapontada quando soube que ele pretendia continuar com a
união deles depois que o período de luto terminasse e seguiu em frente com
um cronograma mais agressivo para James, sem se importar que ela
estivesse desempenhando um papel ativo na morte de outra pessoa. Em seu
desespero, ele recebeu doses muito maiores e sua morte rápida pelo veneno
foi inevitável. Ela estava tão envolvida naquele ponto que não conseguia
parar. Decidiu que só estaria livre dos esquemas casamenteiros de sua mãe
se garantisse que seu irmão se tornasse o Marquês de Overlea.
Eles estavam se preparando para dormir quando Louisa disse a Nicholas
que sentia pena de Mary.
Nicholas zombou com a brandura de seu coração.
— Aquela “coitadinha” matou minha família e quase conseguiu me
matar. E para que não se esqueça, ela fez o mesmo contigo. Não uma, mas
duas vezes. A primeira foi quando ela ordenou que Harrison sabotasse sua
sela para que caísse do cavalo.
Louisa ofegou.
— Foi ela quem causou meu acidente? Quando descobriu isso?
— Soube que sua sela tinha sido adulterada quase que imediatamente.
— E nunca me disse nada?
— Eu não queria assustá-la. — Nicholas a alcançou e a puxou em seus
braços. — Eu já suspeitava do envenenamento, mas não suspeitei que
também estaria em perigo. Acredito que naquela época Mary não estava
pensando com clareza.
— Acho que ela nunca pensou com clareza — disse Louisa, balançando
a cabeça. — O que irá acontecer com ela?
— É provável que seja internada em um asilo.
Louisa estremeceu com o pensamento. A morte seria mais
misericordiosa.
— Eu não entendo a parte de Harrison em tudo isso. Disse que a criada
de Mary não sabia o que estava entregando a ele, mas Harrison claramente
sabia exatamente o que estava fazendo.
— Ele fez isso pelo dinheiro — disse Nicholas. Ela franziu a testa
incrédula e ele continuou: — Aparentemente ele teve um filho em sua
juventude. Quando o menino atingiu a maioridade, desenvolveu um gosto
por cartas, mas não tinha habilidade com isso e rapidamente acumulou uma
quantidade bem grande de dívidas de jogo. Claro, ele piorou sua situação
pegando dinheiro emprestado das pessoas erradas. — Nicholas fez uma
pausa enquanto lutava para manter a voz calma. — Se Harrison tivesse ido
até meu pai em vez de aceitar o pagamento de Mary para envenená-lo,
tenho certeza de que o teria ajudado.
Ele a puxou para um abraço apertado, e ela esperava que ele encontrasse
tanto conforto no abraço quanto ela.
— Graças a Deus ele foi encontrado — disse ela, recuando um pouco
para olhar para Nicholas. — Se tivesse conseguido fugir, nunca saberíamos
que Mary estava por trás de tudo e ela poderia ter encontrado outra pessoa
para terminar a tarefa.
— Sim, graças a Deus e a William Tate — disse Nicholas. — Ele
lembrou que Harrison havia falado sobre ter família em Londres. Quando o
cavalariço lhe disse que Harrison tinha ido para o norte, apostou em seu
palpite e foi em direção à cidade.
— Devemos pensar em uma maneira de agradecer-lhe.
— Já pensei. Como agora estou precisando de um novo criado e não
consigo pensar em ninguém mais merecedor, ofereci-lhe o cargo. Tenho
certeza de que nós dois vamos nos atrapalhar até que ele aprenda os laços.
Ela retribuiu o sorriso com um que estava longe de sentir. Estava
tentando, sem sucesso, livrar-se da sensação de angústia que se apoderara
dela quando percebeu o que precisava fazer. Nicholas havia se casado com
ela pensando que estava à beira da morte. Era verdade que o relacionamento
deles tinha crescido desde o que ele havia imaginado inicialmente, mas ela
o amava o suficiente para não forçá-lo a passar o resto de sua vida com
alguém que ele não amava em troca. Ele já havia perdido tanto na vida. Os
pais, o irmão. Ele merecia a chance de ter alguém em sua vida que pudesse
amar. Se não fosse ela, ela se afastaria para que ele pudesse encontrar essa
pessoa. Provavelmente a mataria, mas faria isso por ele.
Nicholas passou a conhecê-la bem no pouco tempo que estiveram
juntos, e ela não conseguia esconder seu humor dele.
— Está acontecendo alguma coisa — disse ele levemente, inclinando o
rosto dela para cima para encontrar seu olhar. Ele passou o polegar ao longo
de seu lábio inferior. — Está infeliz.
Louisa estremeceu ao toque dele. Não seria capaz de fazer isso se ele a
estivesse tocando. Respirando fundo, ela saiu de seus braços.
— Está completamente saudável — disse ela.
— Vou pedir ao médico que me examine, mas espero saber que não
sofri efeitos duradouros do veneno. — Ele a examinou, tentando ler a
intenção dela. — Espero que o fato de que agora esteja presa a mim
indefinidamente não lhe cause angústia.
Ele falou as palavras levemente em uma tentativa de arrancar um sorriso
dela, mas tiveram o efeito oposto.
— Na verdade, era sobre isso que eu queria falar-lhe — disse ela. —
Agora que não está mais doente, não tem a necessidade urgente de um
herdeiro.
Os olhos dele se estreitaram.
— Ainda preciso de um herdeiro.
Ela seguiu em frente, suas palavras saindo apressadas:
— Sim, mas não precisa ter um comigo. — Ele começou a falar, mas ela
ergueu a mão para detê-lo. — Tenho que dizer isso agora, enquanto posso.
Quando me pediu em casamento, foi uma questão de conveniência. Eu
precisava de sua ajuda e você precisava de algo que eu poderia lhe dar, mas
esse não é mais o caso.
Uma expressão estranha cruzou o rosto dele. Sua voz era gentil quando
disse:
— Eu ainda preciso de você, Louisa.
Ela acenou com a mão para ele e pressionou:
— Precisa de mim da mesma forma que precisava das amantes que sem
dúvida teve antes do nosso casamento, mas não precisa ficar amarrado a
mim.
Uma pitada de cautela surgiu nos olhos dele.
— O que exatamente está querendo dizer?
Então era isso? Ele ficaria aliviado quando ela dissesse que estava
devolvendo sua liberdade?
— As circunstâncias que cercaram nosso casamento foram
extraordinárias, e na época havia a preocupação sobre sua saúde. Nós dois
sabemos que em circunstâncias normais nunca teria se casado comigo. —
Ela teve que respirar fundo novamente antes de continuar: — Eu vou
entender se quiser se separar. Isso é feito o tempo todo e ninguém comenta.
Um silêncio longo e desconfortável se estendeu entre eles quando ela
terminou.
— E quanto a você? — perguntou ele finalmente. — Realmente acha
que eu simplesmente a deixaria de lado como um lixo e voltaria a viver
como um solteiro na cidade?
Ela estremeceu com as palavras dele e virou-se, incapaz de encará-lo.
Não o ouviu se mover e ficou surpresa quando ele a virou para encará-lo
novamente, as mãos segurando seus braços. Ele estava com raiva dela.
— Pensa tão mal de mim que acredita que eu lhe faria isso?
Ela colocou a mão na bochecha dele. Ele era tão bonito e ainda podia
lhe tirar o fôlego, mas ela o amava o suficiente para não o prender se ele
não compartilhasse dos mesmos sentimentos.
— O nosso não foi um casamento de amor. Merece isso, Nicholas.
Ele reagiu como se ela o tivesse esbofeteado. Ele a soltou e deu um
passo para trás.
— Vamos falar claramente aqui, Louisa. Sei que está acostumada a
cuidar dos outros. Catherine, John, seu pai. Eu. Isso era tudo que eu era para
você? Outra causa? Alguém para cuidar e, agora que sabe que estou bem,
acha insuportável a ideia de passar o resto da vida comigo?
Ela ofegou com a amargura em seu tom.
— Não…
Ele riu, mas o som não era de felicidade.
— Bem, isso é muito ruim. Não vou concordar com uma separação.
Eles ficaram lá pelo que pareceu uma eternidade. Ele estava muito
bravo com ela. Suas mãos estavam fechadas nas laterais de seu corpo, sua
respiração áspera.
— Parece que estamos em um impasse — disse ele finalmente.
Louisa podia sentir toda a energia sendo drenada de seu corpo com as
palavras dele para ser substituída pela derrota. Ela havia arruinado tudo. Só
queria fazê-lo feliz, mas em vez disso, tudo o que conseguiu foi arruinar a
pouca felicidade que os dois conseguiram arrancar da situação em que se
encontravam.
Ela virou-se e dirigiu-se à porta que ligava seus quartos. Ele estava com
raiva dela e ela não podia ficar perto dele quando estava assim. Como o
estranho frio e distante com quem havia se casado. Doía demais. Talvez
com o tempo, pudessem voltar à camaradagem fácil que haviam
desenvolvido recentemente. Poderia ser o suficiente que ela o amasse e ele
parecesse gostar dela. Ou pelo menos que sentisse isso antes daquela noite.
Ela alcançou a porta e girou a maçaneta, mas Nicholas foi por trás dela
e estendeu a mão ao redor dela para mantê-la fechada. Eles ficaram ali
daquele modo por vários segundos, Louisa de frente para a porta e Nicholas
parecendo grande e poderoso atrás dela, prendendo-a entre seus braços.
Seus pensamentos voltaram para aquela outra noite quando ela se viu na
mesma posição. Na noite em que os dois fizeram amor pela primeira vez.
Estava com medo de dizer qualquer coisa que pudesse deixá-lo ainda
mais irritado. Ela pensou apenas em lhe dar a liberdade que ele merecia e,
em vez disso, ele tomara suas palavras como um insulto. Deveria ter
percebido que ele não era o tipo de homem que abandonaria suas
responsabilidades.
— É realmente isso que quer? — perguntou ele, sua voz tensa. —
Deixar-me?
Ela fechou os olhos enquanto a dor a invadia. Essa era a última coisa
que queria fazer.
A boca dele caiu para a curva do pescoço dela e ele a beijou ali. Ela
relaxou nele e soltou a respiração que estava segurando.
— Eu não quero ir.
Ele então a virou, mas não recuou. Ela levou as mãos ao peito do
marido e encontrou seu olhar escuro e intenso.
— Bom, porque eu não vou deixa-la ir tão facilmente.
Sua boca encontrou a dela em um beijo terno, roubando a respiração de
Louisa. Ela fez um som de alívio e ergueu as mãos para emaranhá-las no
cabelo dele, segurando-o contra ela. As mãos dele deslizaram pelas costas
dela e a trouxe totalmente contra ele.
— Diga-me o que quer — disse ele, sua boca pairando sobre a dela.
Ela passou a língua nos lábios dele e ele gemeu em resposta.
— Eu quero você. Sei que não deveria. Merece ser feliz, Nicholas, não
ligado a mim, uma mulher com quem se casou apenas por necessidade.
Ele levantou a cabeça e olhou para ela, claramente perplexo.
— Estou feliz, Louisa. Nosso casamento pode ter acontecido por todos
os motivos errados, mas você é a mulher que eu quero. A mulher que eu
amo.
A felicidade se desdobrou no peito dela.
— Me ama?
— Achei que estava óbvio. Tenho agido como um tolo apaixonado
desde que a conheci, embora tenha demorado um pouco para perceber isso.
Ela jogou os braços ao redor dele, agarrando-se nele.
— Isso significa que não ouvirei mais bobagens sobre terminar nosso
casamento?
— Eu também te amo, Nicholas — disse ela, quase com medo de deixá-
lo ir e de descobrir que estava apenas sonhando.
Ele exalou com alívio e enterrou a cabeça no pescoço dela.
— Graças a Deus.
 
Epílogo

SE LOUISA achou a atividade em torno da preparação de seu enxoval de


casamento impressionante, a modista e o pequeno exército de costureiras
que desceu sobre o Solar Overlea no final do inverno envergonhava tal
experiência. A avó de Nicholas claramente não poupou despesas para
garantir que Louisa e Catherine estivessem vestidas apenas com a moda
mais atual para a próxima temporada.
Sob o olhar perspicaz de uma das modistas mais requisitadas de
Londres, as irmãs passaram por uma variedade aparentemente infinita de
tecidos e designs. Quando essa etapa do planejamento de seus novos
guarda-roupas foi concluída, começaram os ajustes sem fim. Louisa tinha
certeza de que nunca precisariam de tantas roupas diferentes, mas ficou
feliz ao ver como a atividade tinha levantado o ânimo de Catherine. A
alegria normal de sua irmã havia desaparecido quando Kerrick partiu logo
após a descoberta dos crimes de Mary Manning, mas seu humor melhorou
com este sinal concreto de que o início da temporada estava quase
chegando. Louisa só esperava que Catherine encontrasse alguém para
distraí-la dos pensamentos sobre o homem por quem ela estava ansiando tão
claramente.
Faltando apenas uma semana para sua partida para Londres, estavam
mais uma vez no quarto de Catherine experimentando a última das roupas
novas. Duas costureiras estavam ajudando Catherine a colocar um vestido
novo, enquanto outra estava de joelhos diante de Louisa, prendendo a
bainha de seu vestido. A modista observava, sua boca fazendo uma careta
de desagrado ao ver o caimento desajeitado do vestido de Louisa.
Os pensamentos de Louisa vagaram. Na superfície, o dia era como
muitos outros que haviam experimentado no último mês, mas era um que
ela nunca esqueceria. Nicholas tinha saído naquela manhã para tratar de
assuntos imobiliários e ela estava contando os minutos até seu retorno.
— O que acha, Louisa?
Ela olhou para cima para ver a irmã se examinando no espelho
basculante. O vestido amarelo pálido complementava perfeitamente a
coloração clara da irmã e o decote baixo era a garantia para chamar a
atenção.
— Terá todos os homens presentes comendo na sua mão — disse ela,
sabendo que não seria um exagero.
Elas se viraram ao som de vozes altas no corredor.
— Não pode entrar aí…
A porta do quarto se abriu e Nicholas ficou ali, com sua avó ao lado
dele.
— Graças aos céus as duas estão vestidas — disse a marquesa viúva.
O coração de Louisa congelou, depois acelerou com a expressão
sombria no rosto do marido. Ela tinha visto aquele olhar muitas vezes
durante o início de seu casamento e esperava nunca mais vê-lo.
— Qual é o problema? — perguntou ela, correndo para o lado dele.
Seu olhar varreu o quarto, mas antes que ele pudesse responder,
Catherine deu um passo à frente.
— Acho que gostaria de tomar um refresco. Podem voltar mais tarde
para terminar a prova — disse ela em despedida à modista e às costureiras.
Nicholas entrou no quarto enquanto suas antigas ocupantes saíam. Os
pensamentos de Louisa estavam centrados no que poderia ter acontecido
para perturbar seu marido que não prestava atenção em mais nada a sua
volta. Por um momento de parar o coração, ela quase pensou que ele estava
tendo outra crise. Parecia que ainda não havia superado sua preocupação
com a saúde dele, apesar do fato de que não houvera mais episódios desde
que a culpa de Mary havia sido exposta.
Quando a última pessoa saiu, Nicholas fechou a porta e ficou parado
olhando para ela. A expressão assustada em seus olhos a fez imaginar todo
tipo de coisas horríveis.
— Aconteceu alguma coisa? Nicholas, está me preocupando.
Ele deu um pequeno e abreviado aceno de cabeça e engoliu em seco.
— O médico esteve aqui para vê-la.
Ela franziu a testa.
— Sim, mas por que está tão aborrecido?
Ele agarrou os braços dela.
— Por que ele esteve aqui? — Seus olhos correram sobre ela antes de
voltar para seu rosto. — Se está doente…
E foi então que ela entendeu tudo. Depois de ter experimentado tanta
morte e ter tido que enfrentar a possibilidade de sua própria partida
iminente, bem como a dela não muito tempo atrás, era natural que ele
tirasse as piores conclusões depois de ouvir sobre a visita do médico.
Ela correu para tranquilizá-lo.
— Está tudo bem. Eu estou bem. — Quando ele não a soltou, ela disse:
— Está me machucando.
Ele baixou as mãos e deu um passo para trás, mas as palavras dela não o
confortaram.
— Anda cansada ultimamente — disse ele. — E ontem de manhã estava
doente. Precisa me falar…
— Não, Nicholas, escute-me, eu não estou doente. — Ela pegou o rosto
dele com as duas mãos e sorriu. — Estou grávida.
Passaram-se vários segundos antes que suas palavras fossem absorvidas.
— Não está doente?
Ela balançou a cabeça.
— Bem, não exatamente. Eu me sinto um pouco enjoada pela manhã,
mas me disseram que isso já era esperado.
Ele tirou as mãos dela de seu rosto e as apertou nas suas. Ele fechou os
olhos e Louisa esperou.
— Quando a vovó me disse que havia mandado chamar o médico,
fiquei com tanto medo de que tive que vir vê-la com meus próprios olhos.
Certificar-me de que…
Ele não precisava terminar. Ela sabia que ele precisava ter certeza de
que não estava prestes a perdê-la, assim como havia perdido seu irmão e
seus pais. Ele a esmagou contra ele e ela o apertou, colocando os braços em
volta da cintura dele, esperando transmitir o máximo de conforto que
pudesse com aquele gesto simples.
— Nada vai ficar entre nós. Está bem e verdadeiramente preso a mim.
— Graças a Deus — disse ele, recuando para olhá-la. — Me deu tudo.
Uma família, uma razão para viver. E agora um bebê.
O olhar em seu rosto era de admiração e Louisa sentiu seu coração
apertar. Ela o amava tanto, mais do que jamais imaginou ser possível.
O olhar dele desviou para baixo e sua expressão mudou.
— O que diabos está vestindo?
Ela seguiu a direção de seu olhar e sentiu o calor rastejar sobre sua pele
na forma como seus seios ameaçavam transbordar por cima do corpete.
— Madame Bonlieu está bem descontente comigo. Parece que estou
crescendo em todos os sentidos.
O sorriso de Nicholas só poderia ser descrito como lupino.
— E eu aprovo de todo o meu coração. Aqui, deixe-me ajudá-la a tirar
seu vestido.
— Estamos no quarto de Catherine…
Ele não deu a ela a chance de terminar antes de pegá-la em seus braços.
Abriu a porta com uma facilidade ridícula e a carregou para o corredor, que
misericordiosamente estava vazio. Ela não teria sobrevivido ao
constrangimento de ter testemunhas dos arroubos amorosos de seu marido.
Não demorou muito, no entanto, para que os pensamentos de Louisa se
concentrassem apenas em seu marido e na atenção pródiga que ele estava
concedendo a ela.

Obrigada por ler Apaixonando o Marquês! Espero que ame Louisa e


Nicholas tanto quanto eu.
O próximo livro da série Conquistando um Lorde conta a história de
Catherine e Kerrick.

Vire a página para ler uma prévia de Seduzindo o Conde, livro 2 da série
Conquistando um Lorde.
 
 
Seduzindo o conde

Seu mundo inteiro havia mudado…


Até o casamento da irmã há menos de um ano antes, Catherine Evans
nunca esperava ter uma temporada em Londres. Agora que suas
perspectivas haviam mudado, ela espera conquistar o coração do homem
que nunca poderia ser apenas um amigo.
Ele é obrigado pelo dever…
O Conde de Kerrick tentou ver a cunhada de seu melhor amigo como
uma irmã mais nova, mas quando ele percebe que seus sentimentos por ela
são muito mais profundos, o dever o obriga a cortejar outra.
Ambos querem o que não podem ter…
Supostamente era para ser um breve cortejo apenas no nome. Enquanto
Kerrick trabalha para se libertar para que possa finalmente perseguir a
mulher que deseja, forças externas conspiram para garantir que ele se case
com a mulher errada.
 
1807
CATHERINE EVANS não deveria estar entediada. Ela estava em Londres em
um baile lotado e dançava com um homem bonito. Deus sabia que ela havia
ansiado por sua primeira temporada por meses, desde que soubera no
outono anterior que sua irmã logo se casaria com o Marquês de Overlea.
Esse evento mudou completamente suas vidas para melhor. Até o dia em
que sua irmã fez o anúncio, ela nunca pensou que realmente se encontraria
na cidade, participando de todos os tipos de bailes e outros entretenimentos
noturnos. Estava ansiosa para a primavera com crescente entusiasmo desde
então.
Agora, com menos de um mês de temporada, ela já estava cansada das
intermináveis demandas sociais. Bailes pelo menos uma vez por semana,
musicais, passeios e visitas ao teatro. Ela imaginou que toda a experiência
seria mais emocionante. E sabia que teria sido se um homem estivesse
presente, um homem que prometera estar ali para dançar com ela quando o
conheceu no outono passado.
Ela sorriu educadamente para seu parceiro, o visconde Thornton,
enquanto suas mãos enluvadas se encontraram brevemente enquanto se
moviam entre as figuras da dança campestre. Ele era apenas alguns anos
mais velho que ela, e tinha que admitir que era muito bonito com seu cabelo
loiro e olhos azuis. Não podia deixar de compará-lo com o homem que ela
ainda procurava em cada baile, e nessa comparação ele parecia pouco mais
que um menino ansioso.
Quando a dança acabou, ele a levou de volta a sua irmã. Ela aceitou
seus elogios por sua graça de movimento friamente e redirecionou a
conversa de volta ao assunto muito mais seguro sobre o tempo. Thornton
não escondia sua admiração por ela, e ela suspeitava que ele se tornaria um
incômodo se o encorajasse mesmo que levemente.
Foi com algum alívio que ela viu Louisa e Nicholas a poucos metros de
distância. Ele estava com suas costas largas voltadas para a pista de dança, e
foi só quando se aproximou dele que ela se lembrou de que seu cunhado
usava um casaco azul-escuro enquanto este homem usava um preto. Uma
sensação de vibração começou em sua barriga.
Quando Louisa a viu, disse algo ao companheiro e ele virou-se para
cumprimentá-la. A sensação de vibração floresceu em um tumulto completo
de borboletas e ela ficou impotente para parar o sorriso que se espalhou por
seu rosto.
— Kerrick — exclamou ela.
Ela conseguiu dar um rápido sorriso de despedida na direção de
Thornton antes de se apressar pelos últimos metros que a separavam do
homem que estava ansiosa para ver novamente. Ela parou um pouco, sua
respiração muito irregular para ter sido causada pelo leve exercício da
dança. Ela quase pegou as mãos dele, mas resistiu ao impulso. Aprendera o
suficiente durante seu tempo em Londres para saber que tal demonstração
de afeto causaria sobrancelhas levantadas e muita fofoca.
— Senhorita Evans. É tão bom vê-la de novo.
Ele sorriu para ela, seus olhos azuis enrugando nos cantos, e a alegria se
desenrolou dentro dela. Ele era tão bonito quanto se lembrava.
— Seu tratante, prometeu dançar comigo durante minha temporada. E
aqui estamos, três semanas completas, e não compareceu a nenhum dos
bailes.
Ele fingiu uma expressão de desânimo exagerado.
— Me fere ao me acusar de tal negligência. Infelizmente, eu tinha
assuntos urgentes para resolver que me mantiveram longe da cidade.
Ela fingiu considerar cuidadosamente as palavras dele antes de
responder:
— Eu vou perdoá-lo, mas só desta vez.
Os olhos dele brilhavam com a situação divertida.
— Pobre de mim.
Ela só podia sorrir em resposta. Ele voltou-se para Louisa e Catherine
teve que tomar cuidado para não deixar transparecer sua decepção.
— Recebeu notícias de seu irmão?
Depois de saber no outono anterior que Louisa havia aceitado a
proposta de casamento de Nicholas Manning, o Marquês de Overlea, seu
irmão John ficou furioso. O tio de Nicholas havia arruinado o pai deles e
John não conseguia acreditar que Louisa entraria para aquela família.
Louisa esperava que o irmão aceitasse o casamento com o tempo, mas em
vez disso John fugiu, deixando para trás um bilhete informando que pedira
a ajuda de um amigo da família para comprar uma comissão no exército.
— Não — disse Louisa. — Escrevi para ele, mas não soube de mais
nada depois de sua primeira resposta. — Sua voz falhou antes de continuar:
— Estou tão preocupada com ele. Ele nunca foi tão imprudente.
Aborrecimento tomou conta de Catherine quando Kerrick pegou a mão
de sua irmã e deu um aperto rápido e reconfortante.
— A maioria dos jovens é imprudente, mas felizmente acabamos
superando isso. Tenho certeza de que John está bem.
Antes que Catherine pudesse lembrar aos dois que ela ainda estava
presente, foram interrompidos por um casal mais velho se aproximando de
seu pequeno grupo. O homem era de estatura e constituição médias, seu
cabelo ralo abundantemente salpicado de cinza. Sua esposa, no entanto, era
uma mulher impressionante, cujo cabelo escuro estava apenas começando a
mostrar sinais de cinza ao redor das têmporas. Kerrick os apresentou como
Lorde e Lady Worthington.
— Nós estávamos nos perguntando quando retornaria à cidade — disse
Lorde Worthington, voltando sua atenção para Kerrick. — Rose ficou bem
chateada por sua negligência.
Kerrick levantou uma sobrancelha e respondeu com fria equanimidade:
— Ninguém poderia supor isso pelo comportamento dela.
Catherine seguiu seu olhar e avistou uma jovem que havia sido
anunciada mais cedo como Lady Rose Hardwick, filha de Lorde e Lady
Worthington. A garota tinha mais ou menos sua idade e estava a vários
metros de distância, cercada por um grupo de jovens que disputavam sua
atenção. Catherine não ficou surpresa com a beleza quase radiante da
garota. Ricos cachos castanhos emolduravam um rosto claro que era
extraordinariamente bonito. Seus olhos brilhavam, seus lábios faziam
beicinho e suas bochechas floresciam com um brilho rosado. Com seu
cabelo e coloração clara, Catherine se sentia sem graça e sem vida em
comparação.
Worthington deu de ombros.
— Ela é jovem. Esperava que ficasse em um canto e definhasse por sua
causa?
Lady Worthington foi rápida em acrescentar:
— Ela simplesmente flerta com aqueles garotos. Ela sabe com quem
será o futuro dela.
O choque rolou por Catherine com as palavras da mulher mais velha e
seu olhar voltou-se para Kerrick. Sua expressão não mudara, mas ele não
negou a afirmação da senhora mais velha.
— Ela parece estar se divertindo muito bem sem a minha atenção.
— Bobagem — disse Worthington. — Isso é porque ela não sabe que
está aqui. Acabamos de vê-lo por conta própria. Embora eu não consiga
imaginar por que não nos enviou uma mensagem antes.
— Acabei de chegar ontem à noite — disse ele.
Worthington assentiu, mas ficou claro que a resposta de Kerrick não o
satisfez. Ele voltou-se para Catherine e Louisa.
— Lady Overlea, Srta. Evans, poderiam nos dar licença?
Catherine apenas acenou com a cabeça em resposta. Ela olhou
novamente para Rose Hardwick, seus pensamentos cheios da implicação
das palavras do homem mais velho. Ela se recusou a acreditar que havia um
entendimento entre Rose e Kerrick. O destino não seria tão cruel.
Determinada a saber a verdade, ela virou-se para questioná-lo, mas
Kerrick já havia se afastado para falar com o casal mais velho em particular.
Sua consternação cresceu quando eles se voltaram, juntos, para se
aproximar da filha de Lorde e Lady Worthington. O grupo de homens se
dispersou na presença de seu pai, mas alguns ficaram por perto, para
esperar por outra oportunidade com ela.
Seu desânimo se transformou em total descrença enquanto observava
Kerrick curvar-se sobre a mão da jovem e levá-la para o salão de baile.
 
Nota da autora
Obrigada por ler Apaixonando o Marquês. Se gostou deste livro, pode
compartilhar esse prazer recomendando-o a outras pessoas e deixando um
comentário.
Eu me diverti muito escrevendo este livro. Admito, porém, que tive
alguma dificuldade em encontrar o veneno perfeito que causaria os efeitos
experimentados por Nicholas ao longo desta história. Decidi que a flor
Datura era a mais próxima do que eu precisava, mas admito que tomei
algumas liberdades com os sintomas. Por essa razão, nunca é declarado
abertamente qual planta foi usada por Mary Manning e Harrison.
Admito também um carinho especial pela valsa, que em 1806 ainda
estava a vários anos de ser aceita pela sociedade britânica. Tomei liberdades
criativas ao incluí-la aqui. Como sempre, quaisquer erros ou imprecisões na
história são meus.
Suzanna
Sobre a Autora
A autora best-seller do USA Today, SUZANNA
MEDEIROS, escreve romances históricos ambientados na
Regência. Ela leu seu primeiro romance Harlequin no
ensino fundamental e se formou em Austen no ensino
médio. Ela considera que Orgulho e Preconceito deu o
pontapé inicial em sua história de amor com romance
histórico e Persuasão cimentou essa paixão.
Nasceu e foi criada em Toronto, Canadá. Seu amor pela escrita a levou a
se formar em Literatura Inglesa pela Universidade de Toronto. Em seguida,
ela obteve o título de Bacharel em Educação, mas se formou em uma época
em que não havia empregos de professora disponível. Depois de trabalhar
em vários lugares interessantes, incluindo um escritório de investigação
federal, um escritório de liberdade condicional para jovens e o Escritório do
Corpo de Bombeiros de Ontário, decidiu prosseguir com seu primeiro amor
- escrever.
Suzanna é casada com seu herói próprio e é a orgulhosa mãe de filhas
gêmeas. Ela é uma romântica declarada que gosta de passar seus dias
escrevendo histórias de amor.
Ela gostaria de agradecer a seus pais por lhe mostrarem que o amor à
primeira vista e o feliz para sempre realmente existe.
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