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RESUMO
A evolução tecnológica traz inovações constantes na área da Informática, que é responsável
por uma verdadeira revolução na sociedade contemporânea, e isso numa velocidade incrível, pois em
apenas uma geração anterior, nem se cogitava a hipótese de se ter a Internet como ela é hoje, a ponto
de pessoas tornarem-se dependentes de ferramentas como Facebook ou Twitter 3. A informatização
facilitou a vida de grande parte da população de forma direta ou indireta, inclusive na seara
consumerista, pois se originaram formas de relações mais rápidas e dinâmicas, antes não previstas pelo
ordenamento, que, agora, tenta se adaptar à nova sociedade. Por outro lado, a Internet tornou o
consumidor ainda mais frágil na relação jurídica com o fornecedor. Considere-se aqui a fragilidade no
que tange ao acesso e fiscalização dos dados transmitidos pelo fornecedor, além da fragilidade diante
da própria linguagem técnica de que se utiliza a informática no ciberespaço. Estes fatores acabam por
estabelecer um novo paradigma de confiança no comércio eletrônico, vez que o consumidor se torna
mais vulnerável, ao passo que, o fornecedor se veste de um novo poder, o da desmaterialização,
justamente por ficar oculto, sem “rosto” na negociação. Destarte, é de conhecimento notório a
dificuldade do Direito em acompanhar essa dinâmica evolutiva, surgindo, com isso, inúmeras lacunas
que originam discussões no meio jurídico.
Palavras-chave: Direito. Consumidor. Internet. Sociedade da informação.
ABSTRACT
1
Exercício apresentado pelo mestrando Wagner de Souza Berton à disciplina de Privacidade e Protecção de
Dados Pessoais, no curso de Mestrado em Direitos Humanos – Universidade do Minho – Braga – Portugal.
2
Wagner de Souza Berton é Mestrando do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito da
Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC e Mestrando em Direitos Humanos na Universidade do Minho em
Portugal na modalidade "sandwich", possui Graduação em Direito pela Faculdade Meridional - IMED, com
ênfase em Direito Empresarial. Integrante do Projeto de Pesquisa: Os desafios para a concretização de uma
educação voltada aos direitos humanos: Considerações, obstáculos, propostas; do Programa de Pós-graduação
em Direito - Mestrado e Doutorado da Unisc, coordenado pelo professor Pós-Doutor Clovis Gorczevski.
Atualmente é servidor público militar. Endereço eletrônico: wsberton@hotmail.com.
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Também é uma rede social que permite aos usuários enviar e receber atualizações pessoais de outros contatos.
A evolução tecnológica traz inovações constantes na área da Informática, que é responsável
por uma verdadeira revolução na sociedade contemporânea, e isso numa velocidade incrível, pois em
apenas uma geração anterior, nem se cogitava a hipótese de se ter a Internet como ela é hoje, a ponto
de pessoas tornarem-se dependentes de ferramentas como Facebook ou Twitter 4. A informatização
facilitou a vida de grande parte da população de forma direta ou indireta, inclusive na seara
consumerista, pois se originaram formas de relações mais rápidas e dinâmicas, antes não previstas pelo
ordenamento, que, agora, tenta se adaptar à nova sociedade. Por outro lado, a Internet tornou o
consumidor ainda mais frágil na relação jurídica com o fornecedor. Considere-se aqui a fragilidade no
que tange ao acesso e fiscalização dos dados transmitidos pelo fornecedor, além da fragilidade diante
da própria linguagem técnica de que se utiliza a informática no ciberespaço. Estes fatores acabam por
estabelecer um novo paradigma de confiança no comércio eletrônico, vez que o consumidor se torna
mais vulnerável, ao passo que, o fornecedor se veste de um novo poder, o da desmaterialização,
justamente por ficar oculto, sem “rosto” na negociação. Destarte, é de conhecimento notório a
dificuldade do Direito em acompanhar essa dinâmica evolutiva, surgindo, com isso, inúmeras lacunas
que originam discussões no meio jurídico.
Keywords: Right. Consumer. Internet. The information society.
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Também é uma rede social que permite aos usuários enviar e receber atualizações pessoais de outros contatos.
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On-line significa "estar disponível ao vivo". Em um site, significa acesso a uma página de Internet em tempo
real. Na comunicação instantânea, significa estar pronto para a transmissão de dados, também em tempo real.
Neste ínterim, aborda-se neste simples trabalho, alguns aspectos relevantes acerca da
relação de consumo que se dá em ambiente digital através do chamado contrato eletrônico e,
por conseguinte, acaba por gerar o comércio eletrônico (e-commerce).
2. A relação de consumo
A relação de consumo tem, obrigatoriamente, duas partes envolvidas na relação
jurídica, quais sejam, fornecedor e consumidor, tendo por objeto um produto ou serviço.
Segundo o Código de Defesa do Consumidor - CDC, em seu art. 2º, consumidor é “toda
pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”.
Para explicar o conceito de consumidor, surgiram duas correntes doutrinárias, são elas:
a corrente finalista e a maximalista. Para a corrente finalista, consumidor possui um
entendimento restrito, de modo que apenas aquele que adquire um produto ou serviço para
uso particular, em caráter não profissional, sem almejar lucro com o produto ou bem
adquirido, é que seria protegido pelo CDC. Desta forma, excluem-se os profissionais que
adquirem um bem ou serviço no intuito de empregá-lo para gerar vantagem econômica, pois
se entende que o consumidor stricto sensu é a parte mais vulnerável/fraca na relação,
demandando maior proteção jurídica.
Já para a corrente maximalista, consumidor é toda pessoa, física ou jurídica, que
adquire um bem ou serviço, com ou sem o intuito de lucro. Para tanto, basta retirar o objeto
do mercado e consumi-lo para ser sujeito de direitos consumeristas. Observe que aqui, o
conceito torna mais abrangente a figura de consumidor, vez que basta ser o “destinatário
fático” do produto ou serviço. No que tange a estas definições, Sheila Leal (2009, p. 99) faz
uma observação pertinente:
O conceito de consumidor não pode ser visto como um conceito unívoco, pois pode
ocorrer de determinada empresa, em relações de consumo diferenciadas, ora ocupar
a posição de fornecedor, ora ocupar a posição de consumidor. Por exemplo: o lojista,
ao contratar com outra empresa a confecção de programas de computador para
controle do estoque do seu estabelecimento, ocupa a posição de consumidor, pois se
coloca na situação de destinatário fático do serviço. O mesmo lojista, ao revender os
produtos que comercializa, estará na posição de fornecedor.
[...] não se pode olvidar que a vulnerabilidade não se define tão somente pela
capacidade econômica, nível de informação/cultura ou valor do contrato em exame.
Todos esses elementos podem estar presentes e o comprador ainda ser vulnerável
pela dependência do produto; pela natureza adesiva do contrato imposto; pelo
monopólio da produção do bem ou sua qualidade insuperável; pela extremada
necessidade do bem ou serviço; pelas exigências da modernidade atinentes à
atividade, dentre outros fatores.
estamos tão acostumados com o uso do papel para suportar informações que não
ficamos seguros diante do novo suporte. O Código de Hamurabi foi escrito numa
pedra e talvez seus contemporâneos desconfiassem da perenidade das regras, se lhes
fossem apresentadas escritas num papiro. (Apud LAWAND, 2003, p. 21).
É neste cenário que surge o contrato eletrônico, que terá por objeto os mais diversos
tipos de contratações de forma completa ou parcial, ou seja, pode o consumidor apenas aceitar
uma oferta ou pagá-la por meio digital, pode o fornecedor cumprir a obrigação pela própria
Internet, etc., ou todas estas etapas podem se dar pela grande rede como assevera Ricardo L.
Lorenzetti: “Uma vez constatado que o meio digital é utilizado para celebrar, cumprir ou
executar um acordo, estaremos diante de um contrato eletrônico.” (2004, p. 287).
Para Sheila do Rocio Leal, pode se entender por contrato eletrônico: “aquele em que o
computador é utilizado como meio de manifestação e de instrumentalização da vontade das
partes”. (2009, p. 79). No entanto, Silvânio Covas faz uma crítica quanto a este conceito,
pois: “o hardware6 simplesmente dá base para operacionalizar o software, sendo que este,
sim, vai oferecer o ambiente para o aperfeiçoamento do contrato.” (Apud MATTOS, 2009, p.
33).
Em outras palavras, o computador, considerado tão somente enquanto hardware é
incapaz de fazer qualquer processamento, por isso, o conceito ideal deve envolver também a
parte lógica do computador. Neste diapasão, entende-se adequado o conceito de Paulo
Antonio Nevares Alves e Priscilla Pacheco Nevares Alves (2008, p. 27), onde: “contrato
eletrônico é aquele formado, concluído e aperfeiçoado através de transmissão eletrônica de
dados”. O contrato eletrônico pode ser entendido como o contrato clássico numa forma
evoluída, vez que o acordo de vontades é o mesmo, só que expressado por meios eletrônicos,
assim:
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Electronic data interchange – Intercâmbio eletrônico de dados.
Para Lawand (2003), este tipo de contrato é classificado como contrato eletrônico on-
line, que também pode ser off-line. No primeiro caso, a oferta, a aceitação e a execução do
contrato ocorrem pela Internet, em tempo real, ao passo que, no segundo caso, somente a
execução ocorre fora da Rede. Assim, no contrato eletrônico on-line, há a oferta de um
software via Internet, por exemplo, o consumidor aceita a oferta e o fornecedor entrega o
bem, tudo dentro da Rede. Porém, pode ocorrer a oferta e a aceitação de um bem tangível na
Rede e sua entrega ocorrer de forma tradicional, fora da Internet, configurando um contrato
eletrônico off-line.
Contratos eletrônicos interativos:
Este modelo é o que melhor representa a Internet, devido sua presença em massa em
praticamente todos os sites, ofertando permanentemente produtos ou serviços. O contrato
eletrônico interativo decorre da interação entre o usuário e um software previamente
programado para oferecer o produto, demonstrando suas características, seus modelos, suas
imagens, formas de pagamento, endereço de entrega, etc.
O sistema é programado pelo fornecedor para oferecer o bem e receber a aceitação do
consumidor, além dos atos burocráticos da transação, como cadastrar os dados pessoais e
disponibilizar as condições de pagamento, entre outros. Na grande maioria das vezes, estes
contratos são de adesão, onde o consumidor apenas marca uma caixa de opção, indicando que
está de acordo com os termos da transação, formulados unilateralmente pelo fornecedor que
permanece desmaterializado, oculto, sem “rosto”.
O conceito de contrato de adesão está disposto no art. 54 do CDC:
Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela
autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos
ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu
conteúdo.
Ainda, no intuito de garantir maior segurança jurídica aos usuários da Rede, Patrícia
Peck (2002, p. 91), expõe que:
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Art. 2º, I, do Projeto de Lei nº. 4.906 de 2001.
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Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional - A UNCITRAL busca uma padronização
da legislação comercial em nível internacional, tendo inclusive proposto o modelo de lei de comércio eletrônico
aos países membros. O Brasil faz parte da UNCITRAL.
11
Art. 9, “1”, “a” da Lei Modelo da UNCITRAL.
No âmbito do Direito Digital os requisitos para se garantir a segurança das relações
comerciais realizadas eletronicamente são a informação, a transparência, o emprego
padronizado da assinatura eletrônica de duas chaves assimétricas (...) e o uso de
seguros específicos para transações online com pagamento de prêmio.
Para regular esta questão de senha digital, ou ainda, assinatura digital, foi editada a
Medida Provisória 2.200/2001 que instituiu a infra-estrutura das Chaves Públicas Brasileiras -
ICP-Brasil, que visa: “Art. 1º - (...) garantir a autenticidade, a integridade e a validade
jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações
habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações
eletrônicas seguras”.
Analice Castor de Mattos define chave pública como uma “assinatura particular
digital, para uso exclusivo do titular, e previamente registrada junto a um dos órgãos
legitimados pelo Comitê Gestor, para que possa ser feito um controle da validade das
mesmas.” (2009, p. 47).
A assinatura digital garante a titularidade da informação à determinada pessoa, sendo
que é uma das melhores ferramentas de proteção na Internet, já que contém um par de chaves:
a pública e privada, como explica Paulo Antonio Alves e Priscilla Alves:
A chave pública fica na rede disponibilizada para todos, ao passo que a privada é de
conhecimento e utilização exclusivos do proponente. Antes de enviar a sua
mensagem, o proponente a criptografa com a sua chave privada. A mensagem é
transformada em um código único, de modo que o conteúdo da mensagem é
utilizado como uma das variáveis que irá compor o número final. (...) Uma vez
assinada, a mensagem é enviada ao destinatário. Este, ao recebê-la, tem de lhe
aplicar a chave pública do remetente para decodificá-la e ter acesso ao seu conteúdo.
(2008, p. 105).
Aliado à segurança jurídica em meio virtual, Analice Castor de Mattos destaca outros
aspectos:
Disto decorrem duas situações diferentes: 1ª) No site do shopping virtual há um link
que direciona o usuário ao site da loja; 2ª) Quando a própria loja está inserida no site do
shopping virtual. No primeiro caso, o shopping virtual não terá qualquer responsabilidade por
danos de responsabilidade da loja, uma vez que simplesmente disponibilizou um link da
mesma em seu site. Diferentemente ocorre no segundo caso, onde o site traz um link em sua
página inicial que direciona o internauta à loja de interesse, e isso dentro de seu site, no
mesmo domínio. Isto se dá geralmente por pop-up15, que fica interligada ao site do shopping
virtual, trazendo com isso a responsabilidade solidária deste.
5. Considerações finais
O consumidor moderno cada vez mais procura a Internet para realizar transações
comerciais, e isso ocorre por diversos fatores, como por exemplo, o consumidor pode desejar
otimizar seu tempo disponível, manter a privacidade no seu computador, realizar pesquisas de
preços de forma mais ampla, enfim, há vários motivos que justificam o crescimento do
número de internautas. Por conseguinte, é importante analisar esta relação jurídica que se dá
em ambiente virtual, bem como a forma de realizar a contratação, que devido suas
peculiaridades, por vezes, escapam da previsão fática existente na legislação pátria.
Muito embora a Constituição Federal da República Federativa do Brasil, o Código
Civil brasileiro e os princípios gerais da teoria geral dos contratos sejam sempre aplicados a
todas as relações jurídicas, o comércio eletrônico possui peculiaridades distintas da clássica
relação de consumo, o que gera grandes controvérsias na doutrina e nos julgados, como por
exemplo, no que concerne aos requisitos de validade e eficácia dos contratos eletrônicos.
Certo é que, cada vez mais este tema surgirá não só nos meios acadêmicos, mas no
noticiário mundial, haja vista que este parece ser o futuro do comércio. Desta forma, é salutar
a pesquisa científica neste ramo, como forma de explicar as características técnicas que a
informática traz em seu bojo, mas sempre focando na defesa dos direitos e garantias do
consumidor que cada vez mais está inserido numa sociedade de consumo.
Referências bibliográficas
ALVES, Paulo Antonio Nevares; ALVES, Prisicilla Pacheco Nevares. Implicações Jurídicas
do Comércio Eletrônico no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.
BITTAR, Carlos Alberto. Contratos comerciais. São Paulo: Editora Forense, 1991.
DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
1996.
FILOMENO. José Geraldo Brito. Curso fundamental de direito do consumidor. 2. ed. São
Paulo: Atlas, 2008.
15
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link.
GOMES, Orlando. Contratos. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994.
JUNIOR, José Alcebiades Oliveira. Teoria Jurídica e novos direitos. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2000.
LAWAND, Jorge José. Teoria geral dos contratos eletrônicos. São Paulo: Editora Juarez de
Oliveira, 2003.
LEAL, Sheila do Rocio Cercal Santos. Contratos eletrônicos: validade jurídica dos contratos
via Internet. São Paulo: Atlas. 2009.
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 4. ed. São Paulo:
RT, 2002.
MATTOS, Analice Castor de. Aspectos relevantes dos contratos de consumo eletrônico.
Curitiba: Juruá, 2009.