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PELOSI, M. E SOUZA, V. V. (2012) O funcionamento das salas multifuncionais e o perfil de seus professores. In E.
G. Mendes e M. A. Almeida (Orgs), A pesquisa sobre inclusão escolar em suas multiplas dimensoes: Teoria,
Politica e formação (pp. 197-218). Marilia: ABPEE.
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Projeto financiado pela Faperj – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro no Edital
FAPERJ N.º 14/2009 - PROGRAMA “APOIO À MELHORIA DO ENSINO EM ESCOLAS PÚBLICAS
SEDIADAS NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO”. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho com o Protocolo no. 075/10 – CEP.
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Terapeuta Ocupacional, Psicopedagoga, mestre e doutora na área de Educação pela UERJ, professora adjunta
da Faculdade de Medicina da UFRJ no Curso de Terapia Ocupacional. Pesquisadora da área de Tecnologia
Assistiva e Educação Inclusiva, email: miryam.pelosi@gmail.com
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Terapeuta Ocupacional, mestre em Educação pela UERJ, professora assistente da Faculdade de Medicina da
UFRJ no Curso de Terapia Ocupacional. Pesquisadora da área de Comunicação Alternativa, email:
vlvsouza@globo.com
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A Tecnologia Assistiva é uma área de conhecimento interdisciplinar que engloba recursos, estratégias,
metodologias, práticas e serviços com o objetivo de promover a funcionalidade e participação de pessoas com
incapacidades, buscando autonomia, qualidade de vida e inclusão social (BRASIL, 2008). A Tecnologia
Assistiva engloba áreas como a mobilidade alternativa, a adequação postural, a comunicação alternativa e
ampliada, o auxílio para as atividades diárias, os sistemas de controle dos ambientes, o acesso ao computador, à
acessibilidade dos ambientes, os auxílios para os deficientes visuais e auditivos, as órteses e próteses, as
adaptações de atividades escolares, a adaptação de equipamentos de laser e recreação e o transporte adaptado
(King, 1999; Barnes; Turner, 2001; Bersh; Pelosi, 2007).
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Formulação da situação-problema
A cada ano, novas salas de recursos multifuncionais vêm sendo criadas, o que agrava
a demanda de formação de recursos humanos capazes de transformar a tecnologia recebida
em recursos pedagógicos acessíveis que possibilitem minimizar as barreiras para a
aprendizagem dos alunos incluídos.
O aumento na complexidade e na quantidade de equipamentos de Tecnologia
Assistiva vem criando a necessidade de um conhecimento específico dos profissionais da
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A Comunicação Alternativa e Ampliada é uma área da Tecnologia Assista que inclui recursos, estratégias e
técnicas para o desenvolvimento de uma comunicação alternativa ou suplementar à fala e a escrita do
indivíduo. Nessa área estão incluídas as pranchas de comunicação, os comunicadores de voz gravada ou
sintetizada e os computadores.
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escola nessa área e, esse aprimoramento pode ser realizado em programas de formação em
serviço, workshops, conferências, cursos de curta duração em universidades, cursos não
presenciais e em cursos de graduação (Cook; Hussey, 2002).
Contudo, para que a formação possibilite mudanças na ação e na conduta dos
profissionais, ela deve se caracterizar por cursos contínuos que atendam aos interesses dos
grupos, deve trabalhar com grupos homogêneos, e deve incluir a elaboração de cursos com
a participação coletiva dos profissionais. A formação deve permitir que o professor
experimente, na sua prática pedagógica, os conceitos que estão sendo aprendidos e que
possa voltar ao espaço de formação para esclarecer suas dúvidas e realizar novos
aprofundamentos (Pelosi, 2000; 2008).
Objetivos do estudo
O Estudo objetivou planejar, implementar e avaliar os efeitos de um curso de
formação na área de Comunicação Alternativa destinado aos professores que trabalham nas
Salas de Recursos Multifuncionais da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro,
além de traçar o perfil desses professores, dos alunos acompanhados por eles, e da forma de
funcionamento das salas.
Participantes
Participaram do estudo 19 professores das salas multifuncionais do município do
Rio de Janeiro selecionados pelas dez Coordenadorias Regionais de Educação, 200 alunos
com necessidades educacionais especiais com idades entre 6 e 20 anos, que eram
acompanhados por esses professores e cujos responsáveis assinaram o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido, e três professores que trabalhavam na Oficina
Vivencial, serviço que faz parte do Centro de Referência em Educação Especial do Instituto
Helena Antipoff no Rio de Janeiro.
Local e instrumentos
O estudo foi realizado na Escola Municipal Tia Ciata, no centro da cidade do Rio de
Janeiro, que conta com um laboratório de informática e encontra-se em local de fácil acesso
para todos os participantes do grupo. As atividades complementares foram realizadas na
sala da coordenação do curso de Terapia Ocupacional na Universidade Federal do Rio de
Janeiro, na Ilha do Fundão.
Os instrumentos para coletas de dados compreenderam quatro questionários. O
questionário 1 teve o objetivo de colher dados sobre o professor da Sala Multifuncional, o
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Procedimentos
O método utilizado foi a pesquisa-ação. A metodologia da pesquisa-ação serviu de
base para a criação de conhecimentos com o objetivo de aplicar novas alternativas
educacionais facilitadoras do processo de inclusão escolar para os alunos com dificuldades
comunicativas.
O projeto foi desenvolvido em quatro etapas: submissão do projeto a comissão de
ética; contato inicial com os professores já designados para as Salas Multifuncionais e pré-
teste; organização e implementação do curso de formação; acompanhamento dos trabalhos
desenvolvidos nas Salas Multifuncionais, através da supervisão de casos trazidos pelos
professores participantes da formação em serviço.
Em todos os instrumentos foram realizadas análises quantitativas das questões
fechadas e análise de conteúdo das questões descritivas. A técnica utilizada foi a de análise
categorial, que funciona por operações de desmembramento do texto em categorias,
segundo, reagrupamentos analógicos (Bardin, 2002).
Os dados coletados nas perguntas fechadas dos estudos foram organizados em
banco de dados usando-se os softwares Microsoft Office Access e Excel. O primeiro
auxiliando a organização dos dados em categorias para facilitar a análise e o segundo
auxiliando a quantificação dos resultados.
Resultados
Nesse texto serão apresentados os dados relacionados ao perfil dos professores das
Salas de Recursos Multifuncionais, as características dos alunos atendidos e a forma de
funcionamento das salas.
Participaram do estudo 19 professores de salas multifuncionais e três professores
que atuavam na Oficina Vivencial do IHA/SME/RJ que responderam ao Questionário 1. O
instrumento era composto de perguntas fechadas e abertas abordando dados sócio-
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Formação
Quanto à formação das professoras, 18 possuíam curso superior completo e uma
estava cursando. Nove eram formadas em pedagogia. As demais graduações apontadas
foram geografia, português, educação física, biologia e psicologia.
Quanto à pos-graduação, 14 professoras estavam cursando ou já haviam concluído
algum curso de especialização. Destas, uma tinha o Mestrado em Educação. Os demais
cursos de pós-graduação foram realizados em áreas bem variadas como Planejamento e
Administração da Educação, Educação e Reeducação Psicomotora, Psicopedagogia,
Atendimento Educacional Especializado, Especialização em Deficiência Mental,
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com precisão as datas, mas afirmaram que foram de duração variada e ocorreram no período
de 1996 a 2009.
Entre as professoras que não realizaram nenhum curso, foi perguntado se já sabiam
trabalhar com Comunicação Alternativa e como haviam aprendido. Duas professoras não
responderam, uma disse que nunca havia precisado, e duas disseram que não sabiam como
trabalhar. As respostas dadas por oito professoras dividiram-se em professoras que
buscaram informações com outros professores (5), uma que recebeu orientação da Oficina
Vivencial do IHA, uma que destacou a pesquisa na internet e outra que afirmou ter
aprendido com a observação das necessidades de comunicação entre aluno-professor.
Para caracterizar a necessidade de uso dos recursos de CAA, foi perguntado quais as
possibilidades de comunicação oral e escrita dos seus alunos. Somente uma professora
referiu que todos os seus alunos falavam sem dificuldade, e as demais preencheram mais de
uma opção. Treze (13) professoras apontaram que seus alunos falavam sem dificuldade,
enquanto onze (11) assinalaram que seus alunos não falavam, e nove (9) afirmaram que
tinham alunos que falavam poucas palavras. Entretanto apenas duas (2) marcaram que seus
alunos usavam pranchas de comunicação e cinco citaram outros recursos de comunicação,
como o uso de Libras (2), gestos (1), gravuras (1) e uma não mencionou.
Quanto à comunicação escrita, sete (7) professoras assinalaram que os alunos não
eram capazes de escrever por questões motoras e oito (8) que tinham alunos que
necessitavam de adaptações para escrever. O maior número de professoras (17) assinalou
que seus alunos não estavam alfabetizados. Do total, nove professoras tinham alunos sem
dificuldade para escrita.
Troca de informações
Do total de professoras no estudo, 16 afirmaram participar de reuniões vinculadas a
sua atividade, sendo as reuniões mais frequentemente citadas o conselho de classe (7) e
reunião de equipe (6).
As reuniões eram em sua maioria eventuais (7) ou mensais (5). Para outras
professoras, as reuniões ocorriam quinzenalmente (3) ou semanalmente (2). As reuniões
eventuais referidas incluíram: capacitações específicas, reuniões com profissionais de
saúde, como equipe do CAPSI, médicos e terapeutas que atendiam o aluno, e profissionais
da Educação, como professores, Diretores e equipes do IHA.
Ao serem perguntadas sobre com quem trocavam informações sobre seus alunos, as
professoras mencionaram familiares (17), professores de turma (17) e professores de outras
salas multifuncionais (13). Foram citados em menor número professores itinerantes (6),
psicólogos (4), fonoaudiólogos (3), terapeutas ocupacionais (3), equipe do IHA (2),
psiquiatra (1), CRE (1) e coordenadora pedagógica (1).
Conhecimento do aluno
Todas as professoras realizam avaliações iniciais para conhecer melhor os seus
alunos, e cinco delas utilizavam avaliações padronizadas, como as avaliações indicadas
pelos órgãos da própria Prefeitura, CRE e Oficina Vivencial/IHA, a caixa de Piaget,
entrevista com os pais e avaliações das atividades dos alunos. Todas as dezenove
professoras afirmaram realizar reavaliações.
Outras formas de avaliação citadas foram: observação (3), histórico da vida escolar
do aluno (2), conversa com os responsáveis, conversa e observação com os professores de
turma, avaliações da relação do professor de turma com o aluno ao longo do ano, produção
de texto e através do uso dos materiais e atividades disponíveis na sala multifuncional.
Quando perguntado o que as professoras avaliavam, as respostas foram abertas,
sendo mais frequente a avaliação da fala e da comunicação (9), as adaptações possíveis e
necessárias, de material e do currículo (4), as habilidades do aluno (3), seu nível de
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Discussão
Os professores que trabalhavam nas Salas de Recursos Multifuncionais (SRM) eram
mulheres, com idade média de 42 anos, que trabalhavam há 16 anos na SME/RJ, mas com
uma média de acompanhamento de alunos com necessidades educacionais especiais (NEE)
de oito anos.
Quanto à formação, a maior parte era formada em pedagogia com pós-graduação em
áreas afins correspondendo ao perfil do profissional orientado pelo Ministério da Educação
em seus documentos norteadores de implementação das SRM (Brasil, 2006).
Os professores eram experientes no trabalho com alunos deficientes, mas a maior
parte deles não trabalhava com todas as deficiências. Contudo, a maioria considerou que
suas experiências anteriores em Educação Especial, o conhecimento prévio em algumas das
áreas necessárias, os cursos de formação que estavam sendo disponibilizados, e as parcerias
estabelecidas com profissionais da Educação e familiares favoreceram o início do trabalho
nas SRM.
Quanto ao conhecimento na área de Comunicação Alternativa, objeto desse estudo,
apenas 32% dos professores já tinha realizado algum curso de CAA, mas apesar de
possuírem alunos com dificuldades comunicativas apenas duas professoras utilizavam
pranchas de comunicação. A Comunicação Alternativa e Ampliada é uma das áreas em que
o professor da SRM deveria estar habilitado para o trabalho com os alunos com NEE e, a
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maior parte dos professores que assumiu a SRM há dois anos, ainda não tinha esse
conhecimento. Além da CAA, os professores deveriam ter conhecimento acerca de áreas
como: Sistema Braille, Orientação e Mobilidade, Sorobã, Ensino da Língua Brasileira de
Sinais - Libras, Ensino de Língua Portuguesa para Surdos, Atividades de Vida Diária,
Atividades Cognitivas e Aprofundamento e Enriquecimento Curricular (Brasil, 2006).
A maior parte dos professores trabalhava em horário integral e, juntos,
acompanhavam 280 alunos, com uma média de 15 alunos por professor. Apesar das
dificuldades relatadas, o grau de satisfação com o trabalho era “bom” para 70%, “ótimo”
para 15%, regular para 10%. Os aspectos mais citados como itens que melhorariam a
qualidade do trabalho foram: maior quantidade e diversidade de materiais didáticos
acessíveis, mais tempo para produção de material adaptado e encontro com os profissionais
que acompanham o aluno, parcerias com familiares, profissionais da Saúde e da Educação,
e mais oportunidades de formação em serviço.
As professoras acompanhavam alunos de todas as faixas etárias, mas a maior parte
dos alunos tinha idades entre 7-12 anos, com todo tipo de deficiência, mas com predomínio
da deficiência mental, transtorno global de desenvolvimento e deficiência física. A maior
parte dos professores tinha entre seus alunos crianças e jovens que não falavam ou falavam
com dificuldade, e que não estavam alfabetizados. Esses alunos eram avaliados e
reavaliados por seus professores com frequência variável e, na maior parte dos casos, com
avaliações não padronizadas.
Nas avaliações os professores se preocupavam com a fala e a comunicação, com a
necessidade de adaptação do material e do currículo, com as habilidades e o nível de
aprendizado do aluno que incluía a leitura, a escrita, os conceitos matemáticos e o
conhecimento do cotidiano e do mundo.
Estudos conduzidos por Pelosi (2000; 2008) com alunos com deficiência física,
acompanhados pelos professores itinerantes nas escolas públicas do Rio de Janeiro,
apontaram para alunos, caracteristicamente, com idades entre 6 e 12 anos, com distribuição
equivalente entre meninas e meninos e que não estavam alfabetizados. Foram pesquisados
respectivamente 120 e 162 alunos nos dois estudos, que apresentaram um percentual de
20% de crianças que não falavam no universo dos alunos estudados. Esses dados
corroboram com os levantamentos desse estudo de que a alfabetização dos alunos com
necessidades educacionais especiais continua sendo um problema que não está sendo
resolvido nas salas de aula e, por essa razão, era objeto de preocupação de muitos
professores pesquisados.
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Conclusão
Para que a SMR possa contribuir com o a inclusão dos alunos com necessidades
educacionais especiais, o professor precisa se aproximar do professor de turma com
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encontros frequentes para que esse possa utilizar os recursos e as estratégias que foram
implementadas pelo professor da SRM. Para isso é necessário que as barreiras relacionadas
ao pouco tempo para as visitas e a dificuldade de acesso das escolas, seja minimizada. Nas
SRM que se encontram na mesma escola onde o aluno estuda, o professor que realiza o
atendimento educacional especializado é uma referência de apoio ao professor de turma,
facilitando as trocas entre os profissionais.
Finalmente, o conhecimento do perfil dos professores, a forma de funcionamento
das Salas de Recursos Multifuncionais e as características dos alunos atendidos colaboraram
sobremaneira para a organização do curso de formação na área de Comunicação Alternativa
e Ampliada que foi desenvolvido na terceira etapa do projeto de pesquisa, e no
encaminhamento das supervisões que se seguiram ao curso, que compreenderam a quarta
parte do projeto.
Referências Bibliográficas:
Bardin, L. Análise de conteúdo. Trad. Luís Antero Reto e Augusto Pinheiro. Lisboa:
Edições 70, 2002.
Bersh, R.C.R; Pelosi, M.B. Portal para ajudas técnicas. Tecnologia Assistiva: recursos de
acessibilidade ao computador. Brasília: MEC/SEESP, 2007.
Brasil. LEI Nº. 9.394 de 20 de dezembro de 1996. 28f. Estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional. Portal da SEESP – Secretaria da Educação Especial. Legislação
específica/Documentos internacionais. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/lei9394_ldbn1.pdf>. Acesso em 21 de jan.
2006.
Cook, A.M.; Hussey, S.M. Assistive Technologies: Principles and Practice. Missouri:
Mosby, 2nd ed, 2002.
King, T.W. Assistive Technology – Essential Human Factors. Boston: Allyn and Bacon,
1999.