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Manuel Marques

O Uso das Ferramentas de Carpintaria para o Auxílio do Ensino de Matemática: Uma


proposta didáctica para o PEA do Teorema de Pitágoras, na 8ª classe, utilizando as
ferramentas de carpintaria (2020 – 2021).

(Licenciatura Em Ensino de Matemática)

Universidade Rovuma
Nampula
2021
2
Manuel Marques

O Uso das Ferramentas de Carpintaria para o Auxílio do Ensino de Matemática: Uma


proposta didáctica para o PEA do Teorema de Pitágoras, na 8ª classe, utilizando as
ferramentas de carpintaria (2020 – 2021).

(Licenciatura Em Ensino de Matemática)

Monografia a ser apresentado no Departamento


de Ciências Naturais, Matemática e Estatística,
Curso de Matemática, Ensino à Distância, para
obtenção do grau de Licenciatura em Ensino de
Matemática com Habilitações em Ensino de
Física.

Supervisor:

Universidade Rovuma
Nampula
2021
ii

ÍNDICE

Índice de Tabelas.....................................................................................................................iv

Índice de Gráficos.....................................................................................................................v

Índice de Figuras......................................................................................................................vi

Declaração...............................................................................................................................vii

Dedicatória.............................................................................................................................viii

Agradecimentos........................................................................................................................ix

Resumo.......................................................................................................................................x

CAPÍTULO I: INTRODUÇÃO.............................................................................................11

1.1 Tema da pesquisa.......................................................................................................12

1.2 Delimitação do tema de pesquisa...............................................................................12

1.3 Problematização da pesquisa......................................................................................12

1.4 Justificativa da pesquisa.............................................................................................13

1.5 Objectivos da pesquisa...............................................................................................14

1.5.1 Objectivo geral....................................................................................................14

1.5.2 Objectivos específicos........................................................................................14

1.6 Relevância da pesquisa...............................................................................................14

1.7 Questões de pesquisa..................................................................................................16

CAPÍTULO II: FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA..............................................................17

2.1 Contextualização.............................................................................................................17

2.2 A função do professor da disciplina de Matemática.......................................................18

2.3 A Matemática presente no dia-a-dia dos indivíduos.......................................................19

2.4 Modelagem matemática e a carpintaria..........................................................................21

CAPÍTULO III: PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS............................................24

3.1 Tipo de pesquisa.............................................................................................................24

3.2 Métodos da pesquisa.......................................................................................................25

3.3 Técnicas de recolha e análise de dados...........................................................................25


iii

3.4 População e amostra da pesquisa....................................................................................26

CAPÍTULO IV: APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS


RESULTADOS.......................................................................................................................27

4.1 Apresentação e análise dos resultados............................................................................27

1.4.1 Aspectos da entrevista semi-estruturada..................................................................27

1.4.2 A Matemática escolar na vida do carpinteiro..........................................................30

4.1.3 A utilização das ferramentas da carpintaria no ensino do Teorema de Pitágoras....31

4.1.4 Aspectos referentes ao teste realizado pelos alunos................................................33

4.2 Interpretação dos resultados............................................................................................33

CAPÍTULO V: CONCLUSÕES E SUGESTÕES DA PESQUISA...................................35

5.1 Conclusões da pesquisa...................................................................................................35

5.2 Sugestões ou recomendações da pesquisa......................................................................35

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...............................................................................36

APÊNDICES...........................................................................................................................38
iv

Índice de Tabelas
v

Índice de Gráficos
vi

Índice de Figuras
vii

Declaração

Declaro por minha honra que esta monografia científica é resultado da minha inteira
investigação e das orientações do meu supervisor. O seu conteúdo é meramente original e
todas as fontes consultadas estão devidamente mencionadas no texto e na bibliografia final.

Declaro ainda que este trabalho nunca foi apresentado em nenhuma outra Instituição para
obtenção de qualquer grau académico.

Nampula, 30 de Abril de 2021

__________________________________
(Paulo João Murapa)
viii

Dedicatória
ix

Agradecimentos
x

Resumo

A presente pesquisa com vista na obtenção do grau de Licenciatura em Ensino de Matemática fez um
estudo de caso, especificamente, com os alunos da 8ª classe da Escola e duas carpintarias sedeadas na
cidade de Nacala Porto.A proposta deste projecto tem como objectivo sugerir uma metodologia
centrada na exploração, onde o aluno passa a ser um agente activo no processo ensino-aprendizagem,
oportunizar situações que exigem a sua capacidade de observar, criar, construir os significados pelas
suas próprias impressões, em que o professor passa a ser o orientador, monitor das actividades
propostas aos alunos e por eles realizadas. Portanto, é de extrema importância a saída dos alunos da
escola, para a exploração das situações reais, onde a matemática é praticada nos diversos contextos
sociais, pois é assim que se consolida o reconhecimento, a aplicabilidade do programa
etnomatemática. Foram convidados os alunos a sair do seu lugar habitual de realização de aulas, a sala
de aulas na escola, para passarem a ter a nova aula junto as carpintarias. Os alunos visitaram duas
carpintarias e com base no uso das ferramentas do carpinteiro conseguiram verificar a aplicabilidade
da Matemática que estudam na escola no seu quotidiano. Conclui-se que para leccionar a disciplina de
Matemática podemos inserir a carpintaria e suas ferramentas, como um meio de aprendizagem e
resolução de exercícios, em particular, no Teorema de Pitágoras. Por mais simples que seja a
explicação e a resolução de exercícios, é importante que o aluno tenha uma noção prática e bem
explicativa do assunto tratado, para que ele tenha um maior rendimento e uma melhor compreensão,
além de se exercitar mentalmente com os exercícios propostos pelo docente.

Palavras-chave: Etnomatemática; Ferramentas de Carpintaria; Teorema de Pitágoras.


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CAPÍTULO I: INTRODUÇÃO

A partir de uma investigação, na área do ensino de matemática, constatamos que a carpintaria


pode ser um meio de ensinar, orientar, incentivar, e também resolver questões que são, em
muitos casos, a base da Matemática ensinada nas escolas de ensino secundário e médio.

É neste contexto que surge o presente estudo com vista a explorar os conhecimentos
matemáticos presentes no quotidiano dos carpinteiros e relacionar com os saberes
matemáticos estudados nas escolas.

Olhando a actividade do carpinteiro, em particular as suas ferramentas de trabalho, foi


possível a formulação de um programa contextualizado para a resolução de actividades de
Matemática por meio da utilização das ferramentas de um carpinteiro.

Foram realizados, por meio de pesquisa de caso, ou seja, visita a algumas carpintarias da
cidade de Nacala, em que os alunos tiveram a oportunidade de observar e identificar os
instrumentos e o trabalho desenvolvido pelos carpinteiros, entrevistá-lo, colher informações
detalhadas, fotografar, bem como, identificar os conhecimentos matemáticos necessários
usados por eles para desenvolver a sua actividade e fazer um registo dos mesmos.

Essa tendência concebe uma aprendizagem significativa em que se buscam estratégias que
possibilitem ao aluno atribuir sentido e construir significados às ideias matemáticas;
desenvolvendo a capacidade de estabelecer relações, justificar, analisar, discutir e criar. Isto
significa que o aluno precisa compreender os conceitos e princípios matemáticos, raciocinar
claramente e comunicar suas ideias matemáticas, reconhecendo suas aplicações. Desse modo,
a Educação Matemática permite uma articulação entre o processo pedagógico, a visão do
aluno, suas opções diante da vida, da história e do quotidiano.

Para melhor compreensão do presente trabalho este, está estruturado em cinco (5) Capítulos
onde: no capítulo I, estão enquadradas os seguintes itens: delimitação do tema de pesquisa, a
justificativa da pesquisa, a problematização, os objectivos gerais e específicos a alcançar no
final da pesquisa, e a relevância da pesquisa; no capítulo II tem-se a Fundamentação Teórica;
capítulo III alberga aspectos ligados com os procedimentos metodológicos; capitulo IV,
consta a apresentação, análise e interpretação de dados, seguido do capítulo V onde estão as
conclusões e sugestões.
12

1.1 Tema da pesquisa

A presente pesquisa foi levada a cabo com o seguinte tema: O Uso das Ferramentas de
Carpintaria para o Auxílio do Ensino de Matemática: Uma proposta didáctica para o PEA do
Teorema de Pitágoras, na 8ª classe, utilizando as ferramentas de carpintaria (2020 – 2021).

1.2 Delimitação do tema de pesquisa

1.3 Problematização da pesquisa

A matemática é vista actualmente como uma disciplina que traz grandes dificuldades no PEA,
tanto para os alunos, como aos professores envolvidos no mesmo. De um lado, observa-se a
incompreensão e a falta de motivação dos alunos em relação aos conteúdos matemáticos
ensinados em sala de aula de forma tradicional, e do outro, está o professor que não consegue
alcançar resultados satisfatórios no ensino de sua disciplina.

A preocupação por este tema surge da crítica a situação do ensino de matemática hoje
existente. É um ponto consensual entre as pesquisas de Educação Matemática, o facto de que
o ensino de matemática tem sido desenvolvido de forma monótona, ou seja, o conteúdo que se
trabalha em sala de aula prioriza a memorização aleatória de resultados conceituais,
impedindo-os então de produzir ou criar novas fórmulas, uma vez que os resultados são pré-
determinados. Entre outras coisas, esse ensino não tem levado em consideração o
conhecimento matemático adquirido pelos indivíduos no decorrer de suas vidas.

A busca por ultrapassar a Matemática vista como uma ciência abstracta e formal tem sido
apontada por diversos pesquisadores e educadores como uma preocupação no PEA. Assim, a
Etnomatemática vem sendo apontada como uma vertente da tendência pedagógica
Socioetnocultural.

É olhando neste panorama da Matemática vista como algo real e não abstracto que surge a
presente pesquisa com vis ta a dar resposta a seguinte pergunta: que impacto motivacional
trará a utilização de ferramentas de carpinteiro no PEA do Teorema de Pitágoras?
13

1.4 Justificativa da pesquisa

As aulas de matemática, de uma maneira em geral, são conduzidas através de exposição oral
do conteúdo com demonstrações de exemplos, em seguida propõe-se a resolução de
exercícios, conforme os modelos resolvidos no quadro, o que não tem trazido resultados
significativos e tem gerado, de certa forma, a falta de interesse pela disciplina. Faz-se
necessário tirar a matemática do pedestal e colocá-la de acordo com a realidade, permitir ao
aluno a leitura da matemática presente na realidade dos diversos grupos sociais, trazer esse
contexto para a sala de aula.

É pensando na problematização da Educação Matemática, tão criticada actualmente por seu


carácter demasiadamente abstracto, e analisando o resgate cultural que a perspectiva
etnomatemática sinaliza, que se apresenta, neste estudo, uma proposta de resgate de saberes
matemáticos existentes e praticados na carpintaria.

A proposta deste projecto tem como objectivo sugerir uma metodologia centrada na
exploração, onde o aluno passa a ser um agente activo no processo ensino-aprendizagem, dar
prioridade situações que exigem a sua capacidade de observar, criar, construir os significados
pelas suas próprias impressões, em que o professor passa a ser o orientador, monitor das
actividades propostas aos alunos e por eles realizadas. Portanto, é de extrema importância a
saída dos alunos da escola, para a exploração das situações reais, onde a matemática é
praticada nos diversos contextos sociais, pois é assim que se consolida o reconhecimento, a
aplicabilidade do programa etnomatemática.

Assim, os professores poderão mostrar a presença da matemática no quotidiano dos alunos e


no processo de desenvolvimento da humanidade. Neste aspecto, estas situações de ensino-
aprendizagem podem ser contextualizadas, adquirindo sentido e significado, colaborando para
o surgimento da motivação necessária para aprendê-la. Diante disso, a matemática passa a ter
como objectivo a busca de explicações e de maneiras para se trabalhar com a realidade. Neste
contexto, reflectir sobre a realidade passa a ser uma acção transformadora que procura reduzir
o grau de complexidade dessa realidade, através da escolha de um sistema que possa
representá-la adequadamente.
14

1.5 Objectivos da pesquisa

1.5.1 Objectivo geral

Propor uma metodologia didáctica motivacional para a disciplina de Matemática com a


utilização das ferramentas do carpinteiro para o PEA do Teorema de Pitágoras na 8ª classe.

1.5.2 Objectivos específicos

 Identificar os instrumentos usados pelos carpinteiros e sua aplicação com a


Matemática desenvolvida em sala de aula;
 Efectuar cálculos utilizando as ferramentas do carpinteiro na resolução de exercícios
envolvendo o Teorema de Pitágoras;
 Analisar o impacto motivacional da proposta nos alunos da 8ª classe quanto a
disciplina de Matemática.

1.6 Relevância da pesquisa

Levando-se em consideração que os alunos da 8ª classe trazem consigo conhecimentos


construídos no decorrer de suas vidas, a partir de suas relações com o quotidiano de suas casas
e dos trabalhos efectuados nos seus bairros, será proposta uma reflexão sobre a matemática,
como ela é vista e como é praticada por eles e pelas pessoas com as quais convivem, e
também, se sabem em que contextos sociais a matemática se faz presente.

Neste momento os alunos serão conduzidos a reflectir sobre a aplicabilidade da matemática,


seu significado, sua importância na sociedade e a perceber que ela se expressa com a
necessidade humana, ou seja, que a matemática foi criada pelo ser humano, para o ser
humano.

Desta forma a importância de uma proposta que contemple a forma de se ensinar e aprender
Matemática partindo da realidade, ou seja, utilizando os conhecimentos matemáticos
aplicados por diferentes grupos sociais, em particular dos carpinteiros, no desenvolvimento de
suas actividades, como ponto de partida para um entendimento contextualizado e de
qualidade, da Matemática académica. Direccionando, assim, a visão dos alunos para a
necessidade de aproximação entre o saber popular e o saber académico, da construção de um
elo entre esses saberes, ou seja, a necessidade do ensino-aprendizagem numa perspectiva
etnomatemática.
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A proposta pedagógica da etnomatemática é fazer da matemática algo


vivo, lidando com situações reais no tempo [agora] e no espaço [aqui].
E, através da crítica, questionar o aqui e agora. Ao fazer isso,
mergulhamos nas raízes culturais e praticam as dinâmicas culturais.
Estamos, efectivamente, reconhecendo na educação a importância das
várias culturas e tradições na formação de uma nova civilização,
transcultural e transdisciplinar (D`AMBROSIO, 2011, p.46/47).

Identificando os saberes matemáticos presentes nas actividades laborais do carpinteiro, torna-


se possível uma aprendizagem transdisciplinar e com maior significado, sem desmerecer ou
minimizar a importância da matemática académica. Não se trata de uma hierarquização, mas
de uma legitimação dos saberes sociais, dos conhecimentos produzidos fora dos ambientes
escolares, que fazem parte de uma realidade dinâmica, popular, ou seja, uma aproximação do
currículo formal e informal.

Para Freire (1997, p. 81), o acto de ensinar “[...] não é a simples transmissão do conhecimento
em torno do objecto ou do conteúdo. Transmissão que se faz muito mais através da pura
descrição do conceito do objecto a ser mecanicamente memorizando pelos alunos”. Não se
ensinam saberes prontos, acabados, mas transformam-se aprendizados através de interacções
com a realidade, levando em consideração a influência de toda bagagem de saberes que o
alunado carrega. Diante disso, Freire (1999) busca uma reflexão sobre a compreensão do acto
de aprender, constatando que foi aprendendo que se entendeu que era possível ensinar. E que
o aluno não se defronta com saberes apenas na escola, no acto da docência, mas em toda sua
relação com o mundo que o cerca.

A partir dessa concepção, é possível aceitar e valorizar a importância das experiências


informais, que se manifestam em diversas situações quotidianas, nas ruas, na família, nas
salas de aulas, na comunidade. Freire (1997) considera um direito de todas as classes
populares a superação do que chama “saber de experiência feito” ou “saber de senso comum”,
todavia observa que não é admissível apenas superar esses saberes cultivados no quotidiano
sem partir dele e através dele caminhar para conhecimentos resultantes de procedimentos
mais formais. Argumenta ainda que os alunos têm “[...] o direito de saber melhor o que já
sabem, ao lado de outro direito, o de participar, de algum modo, da produção do saber ainda
não existente” (FREIRE, 1997, p. 111).
16

1.7 Questões de pesquisa

Para presente pesquisa procurou-se responder as seguintes perguntas, objectivados a dar


resposta a nossa pergunta de partida da pesquisa:
 Que instrumentos são usados pelos carpinteiros e sua aplicação com a Matemática
desenvolvida em sala de aula, em particular, o Teorema de Pitágoras?
 Que cálculos utilizando as ferramentas do carpinteiro na resolução de exercícios
envolvendo o Teorema de Pitágoras;
 Qual o impacto motivacional da proposta nos alunos da 8ª classe quanto a disciplina
de Matemática.
17

CAPÍTULO II: FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 Contextualização

Na Idade antiga, não havia separação entre arte, ciência e religião e, em não raras vezes a
expressão artística buscava agradar aos deuses, fazendo aqui o paralelo com a religião e,
ainda, com a busca pelo ideal perfeito, conceito esse adoptado principalmente pelos gregos
que tentam retratar com o máximo de perfeição o deu ideal de beleza por meio das expressões
artísticas.

Dessa forma, é notável que a arte se tornou um produto do ser humano, do seu meio social e
ainda a essência da sua alma, qualificando-o e distinguindo-o dos outros animais.

Nesse sentido, o desenvolvimento artístico também pode ser estudado com base na concepção
da Etnomatemática, que surgiu na década de 1970, com a proposta do professor Ubiratan
D’Ambrósio de modificar as bases de ensino, versando sobre a necessidade de se enfatizar a
matemática produzida pelas diferentes culturas e civilizações, com o objectivo primordial de
aliar o conhecimento empírico ao academicísmo característicos das bases curriculares.

Para D’Ambrósio (D'AMBROSIO, 2001), a matemática surgiu como “[...] resposta às


pulsações de sobrevivência e de transcendência, que sintetizam a questão existencial da
espécie humana. A espécie cria teorias e práticas que resolvem a questão existencial”.

Na estruturação da palavra Etnomatemática, D’Ambrosio utilizou os termos “tica”, “matema”


e “etno” para explicar que existem diferentes modos de compreender diferentes circunstâncias
naturais, elementos sociais e económicos da realidade vivida.

Desta feita, a Etnomatemática interpreta a substância das mais diversas formas de


apresentação do conhecimento, não se trata somente do estudo abstracto da Matemática, mas
considera o aprendizado dessa aliado com os aspectos socioeconómicos daqueles que devem
aprendê-la.

Considerando essa abordagem, a Matemática transcende do plano das teorias, universalidades


e abstraccionismo para algo palpável, próximo da realidade, um saber adequado aos
conhecimentos adquiridos ao longo da vida.
18

Essa nova conjuntura traz em sua essência o ideal de uma aprendizagem significativa do
aluno, de modo que esse seja capaz de atribuir sentidos e construir conceitos matemáticos.
Significa dizer que os alunos precisam ir além do plano das ideias é necessário relacionar os
conceitos matemáticos, interioriza-los e raciocinar com eles, aplicando-os no seu quotidiano.

Dessa forma, ensinar matemática tomando, como ponto de partida, os conhecimentos


empregados por marceneiros, atende aos pressupostos da Etnomatemática.

2.2 A função do professor da disciplina de Matemática

O grande educador Paulo Freire defendeu a ideia de que, para ensinar, antes de tudo, é
necessário aprender. Aprender matemática é a sabedoria que o professor de matemática possui
incorporada e que lhe confere autoridade para ensinar. O professor de matemática,
definitivamente, não é o sábio em matemática, mas aquele que sabe aprender matemática e,
por isso, sabe como ensinar a outrem a aprender também (FREIRE, 1989).

Para ele, ao aprender matemática, o indivíduo produz o conhecimento matemático e, por isso,
conhece esse tipo de conhecimento, suas características, seus critérios de verdade e as formas
de sua produção (ibidem, 1989).

Portanto, ao professor de matemática, cabe uma reflexão constante sobre estas questões:
Quais são as características do conhecimento matemático? Como são produzidos os
conhecimentos matemáticos? Que disciplina a matemática exige para ser aprendida?
(GIARDINETTO, 1999).

O professor de matemática ainda deve buscar inovações metodológicas que o possibilite


mediar entre a matemática e o estudante, de modo que o conhecimento matemático seja
significativo, ou seja, contribua efectivamente para a melhoria da qualidade de vida do
estudante e, por conseguinte, da sociedade, de modo consciente e objectivado.

Ao ensinar matemática, o professor está, concretamente, relacionando-se com pessoas


(estudiosos, estudantes, outros professores e servidores escolares, famílias e comunidades) em
um ambiente contemporâneo próximo. Portanto, a função social do professor de matemática é
igualmente concreta e exige fé para o seu exercício. Não a fé passiva ou restritamente
religiosa, mas a vontade sincera. É um querer auto-determinar-se a melhorar a qualidade de
vida da sociedade através do trabalho educativo do ensino da matemática. Acreditar que é
19

possível e não esmorecer diante das mazelas do mundo profissional, ou outros motivos
(FREIRE, 1989).

Outro aspecto importante do professor de matemática é justamente a profissão. Essa


profissão, já que existe, deve ser para responder às demandas da sociedade que a criou. Isso
exige cientificidade no trabalho docente para: identificar as demandas sociais que precisam
ser atendidas; conhecer o objecto de estudo (a aprendizagem matemática); objectivar
responder às demandas sociais com o conhecimento da aprendizagem matemática
(GIARDINETTO, 1999).

O ensino da matemática se dá em meio de uma série de acções de intervenção cultural no


ambiente de aprendizagem, desenvolvidas no sentido de preparar o cenário onde as estratégias
de ensino são implementadas, tais como: palestras, trabalhos em equipes interdisciplinares, e
equipes técnicas pedagógicas e de gestão.

2.3 A Matemática presente no dia-a-dia dos indivíduos

Dentre os vários temas de pesquisa presente no ensino de matemática, um tem merecido


especial destaque: trata-se da relação entre a matemática escolar e a matemática presente no
dia-a-dia dos indivíduos. De acordo com Fiorentini e Lorenzato (2007):

Estudos mais recentes, partindo do pressuposto que os


professores produzem em, na prática, saberes práticos sobre a
matemática escolar, currículo, actividade, ensino,
aprendizagem, mostra que esses saberes práticos transformam-
se continuamente, sobretudo quando realizam uma prática
reflexiva ou investigativa (FIORENTINI & LORENZATO,
2007, p. 47).

A preocupação por este tema surge da crítica a situação do ensino de matemática hoje
existente. É um ponto consensual entre as pesquisas de Educação Matemática, o fato de que o
ensino de matemática tem sido desenvolvido de forma monótona, ou seja, o conteúdo que se
trabalha em sala de aula prioriza a memorização aleatória de resultados conceituais,
impedindo-os então de produzir ou criar novas fórmulas, uma vez que os resultados são pré-
determinados. Entre outras coisas, esse ensino não tem levado em consideração o
conhecimento matemático adquirido pelos indivíduos no decorrer de suas vidas.

Assim, os professores poderão mostrar a presença da matemática no quotidiano dos alunos e


no processo de desenvolvimento da humanidade. Neste aspecto, estas situações de ensino-
20

aprendizagem podem ser contextualizadas, adquirindo sentido e significado, colaborando para


o surgimento da motivação necessária para aprendê-la. Diante disso, a matemática passa a ter
como objectivo a busca de explicações e de maneiras para se trabalhar com a realidade. Neste
contexto, reflectir sobre a realidade passa a ser uma acção transformadora que procura reduzir
o grau de complexidade dessa realidade, através da escolha de um sistema que possa
representá-la adequadamente (D'AMBRÓSIO, 1990).

Neste sentido, a defesa da necessidade de se considerar a experiência de vida dos alunos, parte
da constatação de que em muitas situações, o indivíduo já apresenta certo domínio de um
determinado conteúdo em suas actividades quotidianas. Reporta-nos Giardinetto (1999)
quando afirma:

Esse domínio apresenta-se eficaz, porque responde efectivamente a um


problema colocado pela actividade do indivíduo em sua prática social.
Trata-se de um conhecimento essencialmente prático-utilitário, pois
nasce da necessidade da resposta imediata de superação dos problemas
próprios da vida quotidiana (GIARDINETTO, 1999, p. 4).

A ideia de defesa de se considerar a experiência de vida dos alunos ganha maior ênfase ao
constatar o facto de que, ao mesmo tempo em que o aluno domina um determinado conteúdo,
esse mesmo aluno fracassa ao lidar com as formas mais sistematizadas desse mesmo conteúdo
no âmbito escolar.

Assim, nesta expectativa, em garantir a apropriação do conhecimento escolar em contraste


com a eficácia da apropriação do conhecimento no quotidiano, preocupamos neste trabalho
em defender uma solução para melhorar o ensino da matemática e a valorização do
conhecimento que emerge de seu conhecimento de mundo.

Embora o problema da ausência de relação entre o conhecimento escolar e o conhecimento


quotidiano seja algo que necessita ser superado, Giardinetto (1999, p. 9), descreve:

Essa superação não se dá pela super valorização da vida quotidiana


como parâmetro para o desenvolvimento da prática escolar. É preciso
promover uma reflexão sobre as especificidades do processo de
produção do conhecimento matemático no quotidiano.

Convém salientar que, se trata de uma apropriação parcial do conhecimento sistematizado,


que se revela em função da necessidade de conhecimento que o indivíduo tem no
cumprimento de determinada actividade, a exemplo da carpintaria, que o mesmo é obrigado a
21

desenvolver nas relações sociais de exploração, para garantir o mínimo da força de trabalho
necessária para concluí-la.

2.4 Modelagem matemática e a carpintaria

A Matemática tem uma função fundamental na nossa vida quanto à própria linguagem. Todo
ser humano em qualquer grau de escolarização emprega-a de uma maneira ou de outra.
Porém, a maioria deles sente dificuldade ou mesmo verdadeiro pavor a essa disciplina.

Quando trabalhamos com a matemática nas séries iniciais ela parece-nos fácil. À medida que
vamos avançando nas séries posteriores ela vai perdendo seu grau de facilidade, levando
muitas vezes o aluno ao desinteresse, deixando de produzir e de construir seu conhecimento e
passando apenas a reproduzir fórmulas.

É preciso romper com a passividade do aluno e proporcionar-lhe situações investigativas,


criando oportunidades de análise e reflexão sobre os problemas que interferem na sua vida,
tornando-o agente activo na construção do conhecimento e responsável pela aprendizagem.

Por isso procuramos tratar sobre o uso da Modelagem no ensino da matemática, pelo qual, a
noção de modelo se faz presente em todas as áreas e se constitui num conjunto de símbolos
que interagem entre si, representando alguma coisa, e essa representação pode se dar por meio
de um desenho ou imagem, um projecto, um esquema, um gráfico, uma lei matemática,
enfim, um modelo matemático não é um objecto, uma obra arquitectónica ou uma tecnologia,
mas sim um projecto, o esquema, a lei ou a representação que permite a produção ou a
reprodução ou execução dessa acção (GIARDINETTO, 1999).

Para D’Ambrósio (1998), o modelo seria o ponto de ligação entre as informações captadas
pelo indivíduo e sua acção sobre a realidade; situa-se no nível do indivíduo e é criado por ele
como um instrumento de auxílio à compreensão da realidade através da reflexão.

Sabemos que a Matemática tem uma linguagem própria e universal que deve ser
compreendida por todos. A maneira de medir o processo de construção desse conhecimento é
que pode ser diferente. Para isso, é fundamental considerar, já que o saber socialmente
produzido serve como ponto de partida e de chegada para o trabalho docente.

Sendo assim, devemos utilizar metodologias de ensino e recursos didácticos variados, de


modo a permitir que o aluno construa este conhecimento de forma compreensiva e, se
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possível, prazerosa, desta forma acreditamos ser a Modelagem Matemática mais conveniente
e eficaz na construção do saber quotidiano, em especial a que melhor explicaria nosso tema
em questão – A Carpintaria.

Percebemos em sala de aula que quanto mais o aluno mergulhar na imaginação, mais estará
exercitando sua capacidade de concentrar a atenção, de descobrir, e de criar, possibilitando a
alegria de vencer obstáculos. Por sua vez, a função educativa da Modelagem Matemática por
ser um processo de diversificação, que quando empregado de forma coerente, é de extrema
valia, pois o que se espera do aluno é que ele construa estruturas mentais que o capacitem a
atingir outros estágios formais e abstractos, baseados na realidade que estes vivenciam.

A Matemática precisa ser ensinada como instrumento para interpretação do mundo em seus
diversos contextos, isto é, formar para a criticidade, para a indignação, para a cidadania e não
para a memorização, alienação e exclusão. Isso só vem confirmar o que diz Freire (1989, p.
37):

Transformar a experiência educativa em puro treinamento é


amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício
educativo: o seu carácter formador. Se respeita à natureza do ser
humano, o ensino dos conteúdos não pode se dar alheio à formação
moral do educando.

Sendo a matemática uma disciplina abrangente, tanto no contexto escolar como fora dele, faz-
se necessário criar situações novas que desafiem o aluno a se organizar para resolver
problemas. Por isso, é indispensável propor alternativas pedagógicas distintas baseadas na
oportunização de actividades concretas na tentativa de qualificar o ensino-aprendizagem.

Baseando-se nas ideias citadas acima, nos interessamos por Modelagem Matemática porque
através desta, poderemos contribuir para um aprendizado de matemática, mais significativo
aproximando o aluno da sua realidade, que neste contexto, tem na carpintaria, sua e dos seus
familiares a principal fonte de renda na região, levando-o a agir sobre essa realidade.

Acreditamos que, para atingir uma aprendizagem significativa, o aluno precisa se apropriar do
conhecimento matemático, nesse sentido os Modelos Matemáticos são, ao mesmo tempo,
estratégias e recursos que se expressam como uma forma clara de resgatar aspectos do
pensamento matemático, desenvolvendo o pensamento científico; baseiam-se no processo de
construção de conceitos, através de situações que estimulem a curiosidade matemática. Desse
23

modo, o aluno passa a não temer o desafio, mas a desejá-lo, aprimorando seu desempenho e
interesse pela disciplina.

A nossa intenção em propor este estudo é de possibilitar a aprendizagem de outra forma de


fazer matemática com auxilio da modelagem matemática e confrontá-la com a forma
tradicional de ensino é explicar que existem outras possibilidades de organização do saber e
do poder, permitindo que o aluno reconheça e aceite o conhecimento como uma construção
colectiva, forjada sócio-interativamente na sala de aula, no trabalho, na família e em todas as
formas de convivência, ou seja, matemática não é fruto de geração natural e espontânea,
desenvolvida linearmente ao longo da história como nos parece quando a aprendemos na
escola.
24

CAPÍTULO III: PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

3.1 Tipo de pesquisa

Tendo em vista a forma de abordagem do problema, a pesquisa caracterizou-se em aplicada


com um enfoque qualitativo.

De acordo com GIL (2008), as pesquisas qualitativas envolvem aspectos subjectivos e em


muitos casos comportamentais, por isso, são os tipos de pesquisa cujos dados só fazem
sentido através de um tratamento lógico secundário, feito pelo pesquisador.

Os dados qualitativos – a matéria-prima produzida por estes métodos – consistem de


descrições detalhadas de situações, eventos, pessoas, interacções comportamento observados;
citações directas das pessoas acerca de suas, experiências, atitudes, crenças e pensamentos; e
extractos ou passagens inteiras de documentos, registos de correspondência e históricos de
casos. Os dados são colectados sem que se tente enquadrar as actividades institucionais ou as
experiências das pessoas em categorias pré-determinadas e padronizadas, tais como as
escolhas de respostas que compõem os questionários ou testes típicos (Quinn Patton, 1986
citado por Universidade Católica de Brasília [UCB], 2003).

A pesquisa qualitativa consiste em tentar compreender detalhadamente os significados e


características situacionais apresentadas pelos entrevistados, em lugar da produção de
medidas quantitativas de características ou comportamentos. A preferência do tipo de
abordagem qualitativa é pelo facto de ser uma forma adequada para entender a natureza de um
fenómeno social.

Tendo em vista aos objectivos, a pesquisa caracterizou-se em exploratória. De acordo com


GIL (2008:27), as pesquisas exploratórias “têm como principal finalidade desenvolver,
esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a formulação de problemas mais
precisas ou hipóteses pesquisáveis para posteriores”.

Este tipo de estudo é desenvolvido com objectivo de proporcionar visão geral, de tipos
aproximativos a cerca de determinados factos. Este tipo de pesquisa não é imperiosa aos
procedimentos de amostragem e técnica quantitativa de colecta de dados.
25

Para o ambiente em que foram colectados os dados, bem como as formas de controlo das
variáveis envolvidas (procedimentos da pesquisa), a presente pesquisa foi um estudo de caso.

De acordo com YIN citado por GIL (2008:58) o estudo de caso “é um estudo empírico que
investiga um fenómeno actual dentro do seu contexto de realidade, quando as fronteiras entre
o fenómeno e o contexto não são claramente definidas e no qual são utilizadas várias fontes
de evidência”.

3.2 Métodos da pesquisa

Tendo em vista ao método de abordagem do problema (métodos que proporcionam as bases


lógicas da investigação), a pesquisa terá como âncora o método indutivo. No raciocínio
indutivo a generalização deriva de observações de casos da realidade concreta. As
constatações particulares levam à elaboração de generalizações.

De acordo com GIL (2008:10) o método indutivo “é um método que parte do particular e
coloca a generalização como um produto posterior do trabalho de colecta de dados
particulares”, e “a generalização não deve ser buscada aprioristicamente, mas constatada a
partir da observação de casos concretos suficientemente confirmados dessa realidade”.

Tendo em vista aos procedimentos metódicos do tratamento dos dados ou colecta dos dados
(métodos que indicam os meios técnicos da investigação), destacou-se o método
observacional.

3.3 Técnicas de recolha e análise de dados

A pesquisa terá como técnicas de recolha de dados, a observação participante, entrevista


semi-estruturada e teste.

A observação participante, ou observação activa, consiste na participação real do


conhecimento na vida da comunidade, do grupo ou de uma situação determinada.
Neste caso, o observador assume, pelo menos até certo ponto, o papel de um membro
do grupo. Daí por que se pode definir observação participante como a técnica pela
qual se chega ao conhecimento da vida de um grupo a partir do interior dele mesmo
(GIL, 2008:103).

Esta técnica facilitou o rápido acesso aos dados sobre a problemática em pesquisa
possibilitando o acesso a informações que os alunos consideravam de domínio particular e
26

captar as palavras de esclarecimento que acompanharam o comportamento dos observados ao


longo dos experimentos realizados ao longo do estudo.

A pesquisa teve como outra técnica o teste; que é “um instrumento utilizado com a finalidade
de obter dados que permitam medir o rendimento, a frequência, a capacidade ou a conduta de
indivíduos, de forma quantitativa” (LAKATOS & MARCONI, 1992, p. 107).

Após a identificação dos instrumentos usados pelos carpinteiros no seu trabalho diário, a
partir da observação e entrevista, procedeu-se com a aplicação destes instrumentos no cálculo
dos exercícios envolvendo o Teorema de Pitágoras e, efectuaram-se testes experimentais em
forma de questionário para avaliar o nível de domínio, motivação e consolidação dos
conteúdos matemáticos modelados.

De seguida os dados foram tabelados e graficados para posterior análise e interpretação para
fornecer respostas da viabilidade desta proposta para o ensino do Teorema de Pitágoras.

3.4 População e amostra da pesquisa

A pesquisa abrangeu todos os alunos da 8ª classe da escola. Estes alunos constituíram o


universo do estudo num total de 550. Também fizeram parte do universo de estudo, os
carpinteiros situados na cidade portuária de Nacala. Dentro desta população, se fez o uso da
amostragem não probabilística por acessibilidade ou conveniência na recolha de dados.

Deste modo, trabalhou-se com uma amostra de 20 alunos divididos em duas turmas e um
conjunto de 10 carpinteiros que trabalham a tempo inteiro neste ramo. A escolha destes alunos
e carpinteiros foi numa forma aleatória para permitir que fossem abrangidos o maior número
de características duma forma probabilística.
27

CAPÍTULO IV: APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS


RESULTADOS

4.1 Apresentação e análise dos resultados

Os dados ora apresentados, foram levantados com base nas entrevistas efectuadas aos
carpinteiros por parte dos alunos, partindo de uma observação da vida real, em particular, no
ramo da carpintaria. Foram realizadas visitas a duas carpintarias, no número de quatro visitas;
sendo duas para cada.

As primeiras duas visitas tinham como objectivo, formalizar o pedido de realização das
práticas pedagógicas a esses estabelecimentos e especificar os objectivos da actividade. Esta
etapa, apenas foi realizada pelo professor (autor).

Actualmente, na cidade de Nacala Porto, existem muitas carpintarias espalhadas nos diversos
bairros da cidade municipal. Dentre essas, apenas duas carpintarias foram escolhidas para a
realização do presente projecto pedagógico.

De salientar que não se registou descontentamento por parte dos proprietários das carpintarias
uma vez que o professor era residente e bem conhecido por eles e por outro lado se sentiram
felizes por saber que estavam sendo envolvidos num projecto pedagógico.

Em meio ao que observamos e a partir das informações proferidas pelos carpinteiros em


entrevista e aos debates seguidos em sala de aulas, conseguimos identificar os instrumentos e
saberes matemáticos presentes no trabalho realizado na carpintaria e de que forma eles
emergiam.

Durante a pesquisa, os registos foram realizados por meio de anotações e fotografias,


devidamente autorizadas, evidenciadas mais adiante no trabalho.

1.4.1 Aspectos da entrevista semi-estruturada

A entrevista foi dirigida pelos alunos que a medida que seguiam o guião da entrevista
adicionavam outros questionamentos com base na evolução das respostas dadas pelos
profissionais da carpintaria e aos aspectos também por eles observados.
28

A primeira e segunda questão da entrevista tinha como objectivo saber o tempo de profissão
dos entrevistados e como chegaram a aprender o ofício de carpinteiro.

Observou-se que a maior parte destes carpinteiros se dedicaram muito cedo à profissão, tendo
como pressuposto, a luta pela sobrevivência das suas famílias, uma vez que viram neste
ofício, o seu meio de trabalho e ganhar dinheiro. E tal facto foi influenciado, por um lado,
pela forma como estes chegaram a exercer a actividade de carpinteiro. Grande parte destes,
aprenderam com parentes, pais ou tios que vinham desenvolvendo estas actividades nas suas
casas ou residências.
29

Gráfico 1: Tempo de profissão dos carpinteiros

6
5
5

4
3 [1 - 5 anos]
3
[6 - 10 anos]
2
2 [11 - mais anos[

0
Carpinteiro

Fonte: O autor.

Gráfico 2: Aprendizagem do ofício

8
7
7

5 Com os pais
4 Com um outro
membro familiar
3 Um outro carpin-
teiro não familiar
2
2
1
1

0
Carpinteiro

Fonte: O autor.

A seguir, objectivado a saber se estes tinham frequentado algum curso profissionalizante


relacionado com a carpintaria e qual eram seus níveis de escolaridade, foram questionados
sobre a sua situação profissional, pergunta inserida na identificação dos entrevistados.
30

Verificou-se que a maior parte dos entrevistados não tinham frequentado algum curso
profissional mas, estavam a frequentar o ensino secundário, esperançosos de um dia poderem
frequentar um curso profissionalizante, mesmo que este não estivesse relacionado com a
carpintaria.

Este ofício o praticam como mera paixão e olham-no como fonte de renda para os seus
estudos e sustento familiar enquanto procuravam por um trabalho oficial.

Gráfico 3: Nível de escolaridade

7
6
6

5 Não estudou e
não estuda
4 A frequentar a
escola
3 Concluiu o ensino
geral
2 Frequentou um
2 curso de carpin-
1 1 taria
1

0
Carpinteiro

Fonte: O autor.

A questão três tinha como objectivo saber se estes verificavam a presença da matemática no
seu trabalho e se este era importante.

De acordo com as respostas obtidas foi interessante verificar que apesar dos entrevistados
terem pouca ou nenhuma convivência com a matemática sistematizada, que é ensinada no
âmbito escolar, todos afirmaram reconhecer a importância da matemática no desenvolvimento
do seu trabalho quotidiano, e todos fazem uso das operações básicas, ainda que os mesmos
afirmem que em parte das suas actividades quotidianas, eles não utilizam a matemática pura,
na mesma proporção que usam a matemática das tradições dos seus antepassados. Ao mesmo
tempo observa-se segundo a fala de alguns que reconhecem a necessidade de uma
proximidade maior entre a matemática oficial e a popular para o melhor aproveitamento do
que é ensinado na sala de aula com o que eles fazem no seu dia-a-dia.

Quanto a utilização da matemática na sua actividade de carpintaria, obtivemos e


sistematizamos as seguintes respostas:
31

 Fazem uso da matemática na medida em que utilizam as réguas para medir e alinhar a
madeira usada para a criação dos mobiliários;
 (acrescentar mais dizeres por parte dos carpinteiros)

Com relação à produção de mobiliários, os carpinteiros usam a matemática que é aprendida na


escola utilizando as operações de adição e subtracção. Esporadicamente, usam a multiplicação
e divisão. Mas é na interacção entre o conhecimento sistematizado e o popular que as
actividades tornam-se mais interessantes como, por exemplo, a utilização de objectos
convencionais como a régua, a fita métrica, o esquadro e até a calculadora, e aqui constatamos
que um dos carpinteiros faz uso dela, para resolver suas contas de forma mais rápida segundo
ele.

Por fim, pediu-se que os entrevistados mostrassem os instrumentos que possuíam na sua
carpintaria que eram úteis para o seu ofício e indicassem os que eram indispensáveis em
qualquer que fosse o trabalho a fazer1.

(enumerar os instrumentos de carpintaria)

1.4.2 A Matemática escolar na vida do carpinteiro

No retorno à sala de aula e a partir dos registos efectuados pelos alunos durante a visita às
carpintarias, foi proposto um debate, diálogo, sobre as experiências vivenciadas por eles, e
também, a exposição dos registos realizados, com a finalidade de fazer com que os alunos
expressassem os conhecimentos adquiridos e informassem qual matemática puderam perceber
na prática dos carpinteiros, o que eles já sabiam e o que ainda não estudaram ou não se
lembram; se a forma como os carpinteiros se referem à matemática é a mesma ensinada na
escola.

Na investigação realizada, evidenciaram-se as especificidades da Matemática Informal, ou


seja, dos saberes matemáticos produzidos na prática social examinada, mostrando a conexão
lógica existente entre tais saberes e aqueles legitimados pela Matemática Formal.

Os carpinteiros usam para a construção dos seus diversos objectos (mobília) suas formas de
compreender a natureza e os saberes adquiridos ao longo do tempo, os quais, são transmitidos
de geração em geração. Tais conhecimentos podem ser classificados como tradicionais e
científicos.
1
Vide nos apêndices II as fotos referentes aos instrumentos utilizados nas carpintarias visitadas.
32

Durante o debate, identificamos os seguintes conceitos de grandezas e medidas, assim como


de geometria, empregados pelos carpinteiros no processo de construção dos mobiliários:
medidas em metros, centímetros, milímetro e polegadas (quando precisam cortar madeiras,
escolher onde as peças poderão ser empregadas e ao medir distancias), ângulos (ao
posicionarem madeiras, pregá-las ou cortá-las), simetria, polígonos e cálculo de áreas e
volumes.

São diversas as ferramentas usadas pelos carpinteiros, das quais com maior referência as
seguintes: o esquadro, o prumo, o nível, trena, e a mente do carpinteiro (uma das peças
fundamentais para a execução do trabalho).

A partir destes instrumentos houve um planeamento e uma discussão em sala de aula, de


como poderíamos problematizar actividades de ensino utilizando essas ferramentas para
exploração de alguns conceitos matemáticos que estávamos vendo naquele período ou em
operações fundamentais da aritmética, em particular, o Teorema de Pitágoras.

4.1.3 A utilização das ferramentas da carpintaria no ensino do Teorema de Pitágoras

Esquadro é um instrumento que traça linhas rectas e com ângulos específicos para cada tipo
de esquadro. Com ele pode-se verificar se uma peça está no “esquadro” (dito de carpinteiro e
outras profissões para indicar quando a peça está formando um ângulo de 90° ou com o
ângulo necessário).

Existem vários tipos de esquadros: alguns, com o formato de um triângulo rectângulo


isósceles de 45º- 45º- 90º (figura 1); outros, com o formato de um “L”com um vértice com
90° e com uma dobra no vértice de ligação dos dois lados que forma o ângulo de 45° (figura
2).

Nesta actividade utilizou-se o esquadro, formato ‘L’, que é usado comummente pelo
carpinteiro (versão mais pequena) ou pelo pedreiro (versão mais grande), de fácil aquisição
para o professor e para os alunos, a partir de qualquer ferragem da região (figura 2 e 3).

Para se ensinar o Teorema de Pitágoras utilizando o esquadro de carpinteiro foi necessário ter
em mãos o esquadro, um palitinho fino e comprido e uma régua2. Observando-se que no
esquadro já tem uma parte enumerada em centímetros, colocou-se a régua ou fita métrica na
outra parte conforme a figura 4. O palito foi nossa hipotenusa.
2
No lugar da régua, usamos a fita métrica comummentemente usada pelos carpinteiros.
33

Com base no exercício efectuado em sala de aula, poder-se-á perceber melhor como se
ensinou o Teorema de Pitágoras a partir dessa proposta didáctica:

Exercício 1: Qual o tamanho da hipotenusa (x) no triângulo a baixo?

x
2 cm

3 cm

Para fazer a resolução do exercício, com o esquadro em mãos colocou-se o palito nas duas
entradas dos catetos, ou seja, uma ponta na régua onde está o número 3, e a outra ponta onde
está o número 2. Assim formou-se um triângulo rectângulo, e pôde-se seguir com a resolução
do exercício aplicando o Teorema de Pitágoras (figura 5).

Em seguida cortou-se o palito onde acabava a hipotenusa, e com o auxílio da régua mediu-se
o palito da ponta até a parte cortada. Daí ficou demonstrado utilizando um material concreto à
resolução do nosso exercício, onde a hipotenusa foi de 3,61 cm (figura 6).

Para provar que este método de ensino era eficaz e correcto, apresentamos na figura 6 a
questão utilizando como se aprende nos bancos escolares com o método tradicional usado nas
escolas de ensino básico (figura 7).

Este modo também pode ser utilizado para saber quanto vale o cateto: com as mesmas
ferramentas do exercício anterior, sabendo agora o valor da hipotenusa e de um cateto, porém
com o tamanho da hipotenusa procurou-se o cateto com base no toque dela na régua, assim
quando a ponta da hipotenusa tocou na régua fez um comprimento, e esse foi nosso cateto
procurado.

Primeiramente medimos o tamanho da hipotenusa e marcamos, e depois colocamos o palito


no primeiro cateto, e com o tamanho da hipotenusa veremos onde o palito encosta na régua
inferior. A seguir uma resolução de um exercício envolvendo o conteúdo para melhor
entendimento. Vide figura 8 e exercício 2.

Exercício 2: Sabendo que um triangulo rectangulo tem a hipotenusa igual a 10 cm, e um


de seus catetos medindo 5 cm. Calcule a medida do outro cateto.
34

4.1.4 Aspectos referentes ao teste realizado pelos alunos

4.2 Interpretação dos resultados

Os saberes matemáticos dos carpinteiros identificados na pesquisa são etnomatemáticos, ou


seja, são gerados, organizados e difundidos na cultura da profissão da carpintaria. Tais
conhecimentos, mesmo sendo tradicionais e informais, estão ligados à ciência, já que servem
de parâmetro para a construção de novos conhecimentos cientificamente reconhecidos.

Durante a entrevista realizada, foi-nos possível verificar que os carpinteiros não somente
reconhecem que existe matemática no seu ofício, em especial geometria, presente nas
mobílias que constroem, como, também, souberam revelar onde e de que forma elas aparecem
em meio aos rabiscos de medidas, cortes nas madeiras, através do cálculo da quantidade de
material necessário para construir do objecto.

Quando apresentamos um problema e só utilizamos o cálculo como ensinado tradicionalmente


nas escolas, a matemática perde o encanto e sem significado para o aluno, porém se torna
eficaz e com sentido quando o professor utiliza o esquadro e a régua como ferramenta de
ensino, tal como proposto nesta pesquisa.

Diante disso nota-se a indiscutível importância e utilidades do ensino matemático para a


realização sociocultural das comunidades como um todo, independente das diferenças ou
formas de aprendizagens desenvolvidas em todos os grupos sociais existentes.

Em face disso D’Ambrósio (2006) afirma que:

O ensino da matemática pode ter uma importante contribuição


na reafirmação e, em numerosos casos, na restauração da
dignidade cultural [...] o essencial do conteúdo dos programas
actuais, repousa sobre uma tradição estrangeira aos alunos. De
outro lado eles vivem em uma civilização sem precedentes, mas
as escolhidas lhes apresentam uma visão de mundo baseada em
dados (D'AMBRÓSIO, 2006, p. 7).

De acordo com essa afirmativa, o ensino da matemática sistematizada, que é aplicada na


maioria das salas de aula do mundo ocidental, apesar de submeter diferentes culturas a uma
35

padronização quase universal, não perde seu conceito pela sociedade quanto sua importância
para o próprio desenvolvimento como um todo. Todavia, isso não quer dizer que várias
formas de desenvolver e aplicar esses conhecimentos padronizados deve ser seguido sem
nenhum questionamento, pois, ao mesmo tempo em que o sistema de ensino é formalizado
entre as diversas civilizações, aborta-se outros saberes que só enriqueceriam o já conceituado
campo da ciência matemática, conduzindo a humanidade a uma melhor e mais justa dignidade
cultural.

Conforme Fonseca (2002) todos esses factores conferem “ao ensino de matemática que se
pretende processar um carácter de sistematização, de reelaboração e/ou alargamento de alguns
conceitos, de desenvolvimento de algumas habilidades” (FONSECA, 2002, p. 51).

Segundo a autora é necessário que se estabeleçam novas tendências de ensino ou técnicas que
possibilite relacionar ou redefinir conceitos permitindo ampliar assim os saberes matemáticos,
unindo o conhecimento sistematizado ou não sistematizado alcançando assim uma
aprendizagem significativa mais relevante constituindo-se, portanto numa matemática mais
interessante para o aprendiz.
36

CAPÍTULO V: CONCLUSÕES E SUGESTÕES DA PESQUISA

5.1 Conclusões da pesquisa

5.2 Sugestões ou recomendações da pesquisa


37

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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fácil e prático para professores e entusiastas. São Paulo: Edgard Blucher.

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São Paulo: Ática.

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Formação de Professores do Ensino Primário. Maputo: MINEDH.

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matemática de primeiro e quinto ano. Porto Alegre: Artmed.
38

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- DF.
39

APÊNDICES

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