A construção de obras de referência, a exemplo de glossários e outros trabalhos
terminológicos, tem sido de grande importância para a área de informação. No campo da Organização e Representação da Informação e do Conhecimento, a elaboração destes instrumentos também se dá mediante uma postura crítica em relação ao eurocentrismo na representação do conhecimento em toda a América Latina.
Título original
PERFORMATIVIDADE DECOLONIAL DE MACUNAÍMA APRESENTAÇAO
A construção de obras de referência, a exemplo de glossários e outros trabalhos
terminológicos, tem sido de grande importância para a área de informação. No campo da Organização e Representação da Informação e do Conhecimento, a elaboração destes instrumentos também se dá mediante uma postura crítica em relação ao eurocentrismo na representação do conhecimento em toda a América Latina.
A construção de obras de referência, a exemplo de glossários e outros trabalhos
terminológicos, tem sido de grande importância para a área de informação. No campo da Organização e Representação da Informação e do Conhecimento, a elaboração destes instrumentos também se dá mediante uma postura crítica em relação ao eurocentrismo na representação do conhecimento em toda a América Latina.
OBRA DE REFERÊNCIA Míriam Gontijo de Moraes miriam.Moraes@unirio.br OBRAS DE REFERÊNCIA • O termo obra de referência ou documento de referência é relativo às expressões traduzidas do inglês – reference works e reference sources. São definidas como “documento que fornece acesso rápido à informação ou às fontes de informação sobre um assunto […]” (CUNHA; CAVALCANTI, 2008, p. 266). Essas obras são majoritariamente de consulta e visam, principalmente, sanar pequenas dúvidas e/ou remeter para obras que forneçam uma explicação mais detalhada acerca de um tópico. • A coleção é composta por obras de consulta, tais como: dicionários,GLOSSÁRIOS, enciclopédias, tabela, catálogo, guia e etc. GLOSSÁRIO • Um glossário é uma lista alfabética de termos de um determinado domínio de conhecimento com a definição destes termos. Tradicionalmente um glossário aparece no final de um livro e inclui termos citados que o livro introduz ao leitor ou são incomuns. • na Idade Média e Renascença, reunião, na parte final de um manuscrito ou enfeixada num volume próprio, sobre o sentido de palavras antigas ou obscuras encontradas nos textos. GLOSSÁRIO DECOLONIAL • lista alfabética de termos identificados a partir de uma visão que busca problematizar e fazer reflexões de natureza crítica no campo da organização e representação da informação e do conhecimento em relação ao eurocentrismo na representação do conhecimento em toda a América Latina. ESSA PESQUISA NO CONTEXTO DA ORC • Dimensões ideológicas envolvidas nos processos de representação da informação e do conhecimento também estão na agenda de pesquisa. • na década de 1930, autores como Butler, Shera, Nitecki e Egan desenvolvem teorias sobre o papel social das bibliotecas, constituindo a vertente “humanista” do campo (MOSTAFA, 1985). No campo da CI a partir da década de 70 se desenvolveram estudos de denúncia das dimensões ideológicas envolvidas nos processos de representação da informação (ARAUJO,2013) O PARADIGMA SOCIAL DE ESTUDO DA INFORMAÇÃO • Desde o estudo de Berman (1993) sobre a Lista de Cabeçalho de Assuntos da Library of Congress (fundada em 1800) identificou-se uma série de manifestações de etnocentrismo, machismo, racismo na maneira como se busca prescrever formas de representar e classificar documentos • Após a realização da International Conference on Conceptions of Library and Information Science, ocorrida em Tampere, Finlândia, em 1991, começou a tomar corpo um paradigma “social” de estudo da informação, entendendo tal como construído por comunidades de usuários, destacando a ideia de intersubjetividade PARADIGMA SOCIAL E OBRAS DE REFERÊNCIA • A construção de obras de referência, a exemplo de glossários e outros trabalhos terminológicos, tem sido de grande importância para a área de informação. No campo da Organização e Representação da Informação e do Conhecimento, esses instrumentos terminológicos para a recuperação de informação, também devem refletir a postura crítica do paradigma social notadamente em relação ao eurocentrismo na representação do conhecimento em toda a América Latina A PERSPECTIVA DECOLONIAL • A diversidade cultural e linguística da América Latina é muito pouco conhecida sobretudo quando se tem em mente o universo das línguas e culturas ameríndias e africanas sobreviventes ao silenciamento imposto pelos Estados, meios de comunicação e sistema educacional. • Nesta perspectiva, a Ciência da Informação, especificamente a Biblioteconomia, tem grande responsabilidade em contribuir para romper com formas de silenciamento na Organização e Representação do Conhecimento, por meio de obras de referência que venham desmitificar preconceitos e contribuir para a quebra da colonialidade que marcam a estrutura do poder, o modo de ser e o modo de saber de uma comunidade nestas condições. O PARADIGMA DECOLONIAL • O termo Decolonial foi criado pelo Grupo Modernidade/Colonialidade (MC), em 1998, com o propósito de marcar a diferença específica em relação à proposta de análise de um processo histórico de descolonização via libertação nacional, identificada como o movimento Pós-colonialismo. • Formado por intelectuais latino-americanos situados em diversas universidades das Américas, o Grupo MC propõe a renovação crítica e utópica das ciências sociais na América Latina no século XXI. • Para o Grupo MC, a colonialidade se reproduz em uma tripla dimensão: a do poder, do saber e do ser. A OBRA MACUNAÍMA DE MÁRIO DE ANDRADE • Temos na figura de Mário de Andrade a conexão com o paradigma decolonial. • Desenvolveu um trabalho de documentação sobre a história, o povo, a cultura e especialmente a música do interior do Brasil, tanto em São Paulo quanto no Nordeste brasileiro como também a Amazônia. “O Turista Aprendiz” é o título do diário de viagem do escritor modernista pela Amazônia no ano de 1927. Tal viagem foi emblemática na consolidação do pensamento de Mário de Andrade vinculado à temática nacional. A partir daí ele publicaria clássicos como “Clã do Jabuti” (novembro de 1927) e “Macunaíma” (1928), nos quais as referências à Amazônia são evidentes. O GLOSSÁRIO DECOLONIAL DE MACUNAÍMA • Proposta que pretende elaborar um instrumento terminológico conforme a perspectiva decolonial no marco do movimento modernista brasileiro e se vê diante da necessidade de romper com esse cenário de silenciamento e subjugação de povos, etnias, classes e, ou, identidades de grupo. • O projeto está sendo desenvolvido no âmbito do Programa de Pós- graduação em Biblioteconomia, com o apoio da Fundação Carlos Chagas(FAPERJ) de acordo com o Edital 036 de 2021. O GLOSSÁRIO DECOLONIAL DE MACUNAÍMA • Tem como referencial empírico o pensamento de um grupo modernista brasileiro, notadamente registrado na obra Macunaíma de Mario de Andrade, configurando um recorte de seu aspecto em conformidade à visão decolonial na sua leitura de mundo e ressignificação da nossa cultura. • Para evidenciar essa faceta do movimento modernista inaugurado em 1922, pretende-se, a partir da estratégia de análise de domínio, identificar o campo semântico modernista brasileiro tendo como objeto essa obra síntese do movimento , por ser um trabalho de documentação trabalhosa de lendas, superstições, frases feitas, provérbios, modismos de linguagem da paisagem brasileira e conter uma narrativa de projeção continental que questiona as fronteiras das rígidas nacionalidades modernas impostas pelo colonialismo europeu Composição do Corpus para a análise terminológica • Identificar uma coleção homogênea e finita de textos sobre a obra Macunaíma que nos sirva de corpus para a análise terminológica que irá compor o Glossário da obra na perspectiva decolonial • Fontes de Macunaíma identificadas: • Etnoliteratura inspiradora de Macunaíma (os tupinólogos, intelectuais que coletaram narrativas indígenas na segunda metade do sec. XIX, Eles registraram por escrito histórias narradas oralmente quase todas na primeira língua de comunicação interétnica entre os brasileiros – o Nheengatu e as traduziram ao português) OS TUPINÓLOGOS • Couto de Magalhães (1837-1898), mineiro de Diamantina, nascido na fazenda de gado de seu avô, em Diamantina (MG) onde passou sua infância embalado por “lendas tocantes e poéticas, metade cristãs, metade indígenas” contadas pelos vaqueiros. Formado em direito, procurou “as cores do país” não só em arquivos e bibliotecas, mas também em dez viagens por grotões do Brasil profundo, quando ouviu “lendas tupi” que transcreveu em – O Selvagem – editado em várias línguas: francês, inglês, alemão e italiano. Seu interesse cresceu, quando foi nomeado presidente da Província do Pará pelo Imperador Pedro II. (BESSA,2022) OS TUPINÓLOGOS • O geólogo canadense Charles Hartt (1840-1878), veio na missão científica do naturalista Louis Agassiz, inventariar as riquezas da Amazônia. Na parada do navio em Óbidos (PA) viu uma velha senhora contando histórias em Nheengatu na calçada de sua casa, cercada por crianças e jovens. Quando traduziram as histórias, fascinado, aprendeu a língua e coletou mitos amazônicos com o jaboti como personagem central. Descobriu que essa era a riqueza mais importante da região: sua literatura repleta de sabedoria e a língua usada para fazê-la circular. (BESSA,2022) OS TUPINÓLOGOS • o conde italiano Ermano Stradelli (1852-1926), nascido num castelo em Borgotaro. Sua intenção era visitar a Amazônia durante algumas semanas. De noite, numa maloca no Rio Negro, deitado em sua rede, ouviu os índios contarem histórias, o que o fez modificar seu plano ao se inteirar da tradução. Passou o resto da vida no Amazonas até a sua morte em Manaus .Aprendeu a língua, fez um dicionário Nheengatu-Português-Nheengatu, registrou as tradições, entre elas o Mito do Jurupari e as “lendas dos Tariana” , entre uma e outra cuia de caxiri. • Outro que não resistiu aos encantos das narrativas orais foi o botânico mineiro João Barbosa Rodrigues (1842-1909), filho de um comerciante português. Professor do Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, mudou para Manaus em 1872, contratado para criar o Museu Botânico. Aprendeu o Nheeengatu e nessa língua coletou cantigas e contos avaliados por ele como “flores da imaginação de um povo” publicadas no Poranduba Amazonense. Quando perguntava o nome de uma planta dele desconhecida, respondiam com uma história na qual a planta era descrita. Percebeu que em sociedades orais, histórias constituíam as enciclopédias populares. (BESSA,2022) OS TUPINÓLOGOS • Temos ainda Brandão de Amorim (1865-1926) nascido em Manaus, filho de um comerciante português criador da companhia que fez a navegação direta de Liverpool a Manaus. Ele publicou 35 narrativas do alto Rio Negro em edição bilingue, sem mencionar que haviam sido recolhidas por Maximiano José Roberto, índio descendente dos Manaú e dos Tariana do rio Uaupés. (BESSA,2022) OS SUL AMERICANISTAS • Dentre as inúmeras fontes em que Mário de Andrade se documentou para a construção de Macunaíma, destaca-se o livro de Capistrano de Abreu, “Língua dos Caxinauás” resultado dos seus estudos sobre as línguas indígenas brasileiras (Kaxinawás e Bacaeris), em conformidade com o movimento sul-americanista, que reuniu um grupo de especialistas sobre a cultura e línguas sul-americanas de 1890 a 1929 (época das viagens dos etnógrafos alemães à região Amazônica) e o contexto do domínio europeu no conhecimento etnográfico e de linguística dos povos americanos. OS SUL AMERICANISTAS • Capistrano de Abreu como sul-americanista foi interlocutor da etnografia alemã da qual se destacava Theodor Koch-Grünberg, importante fonte de Mário de Andrade. Um grande número de lendas e narrativas indígenas foi colhido no segundo volume da obras de Koch Grumberg. A obra de Capistrano fornece o tema central do capítulo 4 (Boiuna Luna) e do capítulo 13 (A Piolhenta do Jigue) OS SUL AMERICANISTAS • Destaque para Theodor Kock Grunberg (1872-1924), etnólogo alemão, que ouviu as narrativas dos índios de Roraima, em suas viagens pelo norte do Brasil e pela Venezuela entre 1911 e 1913. Ele coletou milhares de objetos de arte indígena hoje em museus de Berlim, Hamburgo e Leipzig. Gravou num fonógrafo músicas e cantos Makuxi, Taurepang, Wapishana, Ingarikó e Patamona. Tirou fotografias, ouviu histórias e deixou tudo isso registrado no livro “De Roraima ao Orenoco”, publicado em cinco tomos na Alemanha em 1916-1917. CONSIDERAÇÕES FINAIS • Revisitar Macunaíma na perspectiva decolonial é refletir sobre as contribuições da obra para a superação da modernidade colonial, que se propõe a pensar a modernidade/colonialidade de forma crítica, desde posições e de acordo com as múltiplas experiências de sujeitos que sofrem de distintas formas a colonialidade do poder, do saber e do ser CONSIDERAÇÕES FINAIS • Essa obra de referência pretende contribuir para a documentação do Inventário Nacional da Diversidade Linguística, sob gestão do então Ministério da Cultura, como instrumento de identificação, documentação, reconhecimento e valorização das línguas portadoras de referência à identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, instituído pelo Decreto nº 7.387, de 9 de Dezembro de 2010 GRATA PELA ATENÇÃO !