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TEOLOGIA DO REMANESCENTE

Pr. Danilo Lopes de Menezes

O remanescente passou a ser sinal de esperança. Traz o sentimento de sobreviventes


que trazem consigo o potencial de preservar a vida de seu grupo. A partir deste conceito, o
termo remanescente está ligado à história divina da salvação.
A teologia do Remanescente é muito ampla. Em poucos minutos não pretendemos
passar por tudo o que a Bíblia apresenta sobre o assunto, mas ter uma visão do significado
desse tópico para os crentes da Igreja Adventista do Sétimo dia. Tratando-se das verdades
bíblicas, os adventistas do sétimo dia consideram-se restauradores das verdades deitadas por
terra, ou seja, um movimento de reforma dentro do mundo cristão (Teologia do
Remanescente: Uma Perspectiva Eclesiológica Adventista, p. 21). A análise do remanescente
na interpretação bíblica conecta o estudante ao dinamismo da missão.
O remanescente no Antigo Testamento
A definição mais simples de remanescente é: “aquilo que resta de uma comunidade
após a ocorrência de uma catástrofe” (Lester V. Meyer, Remnant, ABD, v. 05, p. 669).
Contudo, ainda falha em descrever por completo. Onde não há remanescente não há futuro
(Rold Rendtorff, Canonical Hebrew Bible: a Theology of the Old Testament. Liden: Deo,
2005, p. 706). Podemos encontrar 03 diferentes tipos de remanescentes no Antigo
Testamento. A primeira referência bíblica a um remanescente ocorre em Gn. 04: 01-15.
Perceba que neste contexto aparece um remanescente histórico que não foi muito positivo na
história do povo de Deus, assim como em Nm. 33:55 e Jz. 03:01. Mas esses exemplos
caracterizam o que podemos chamar de remanescentes históricos (Hasel, Remnant, IBSE,
v.04, p. 130).
O segundo grupo podemos denominar de o remanescente fiel, é o que observa-se em
Gn. 7:23. São aqueles que expressam uma fé genuína e um relacionamento com Deus
marcado pela verdadeira fé.
E o terceiro grupo, chamamos de o remanescente escatológico. São os que passarão
pelos juízos e calamidades do Apocalipse e sairão vitoriosos. Como notaremos, o
remanescente fiel é também o histórico, bem como o escatológico também é o fiel. Notam-se
algumas características do remanescente na Bíblia. Primeiro, em geral, o remanescente é uma
comunidade (Ml 03:16-04:03), em algumas exceções, quando a apostasia é nacional, o termo

concentra-se no indivíduo (I Rs 19:14). Segundo, há casos onde o remanescente da


comunidade nem sempre consiste de todos os indivíduos fiéis, como por exemplo, Cam em
Gn. 09:20 -27 e o contexto dos capítulos 18e 19 de Gn, onde Abraão intercede pelos justos de
Sodoma e Gomorra e junto com os salvos encontram-se as filhas de Ló. Terceiro, a salvação
do remanescente não é característica de justiça própria, mas da misericórdia de Deus (Am.
05:15). Quarto, o remanescente é necessário. II Rs. 25:11 revela que Deus levou e trouxe um
remanescente da Babilônia para formar a comunidade do povo de Deus após o exílio, embora,
Judá não provasse ser inteiramente fiel. E quinto e último, destacamos que o remanescente é
muito mais do que um status. Ser parte do remanescente significa envolver-se em uma missão
(Zc. 14:16-19).
É bem interessante de observar que, o remanescente aparece no contexto bíblico em
muitos casos como uma comunidade visível (Is. 65:08 e 21) e escatológica (Zc. 13:08 e 09).
Outro fator relevante, é notar que enquanto o remanescente fiel pode ter elementos infiéis,
como vimos acima, o remanescente escatológico sobressai-se apenas com indivíduos fiéis,
como se fosse um agente purificador (Ed. 09: 13 e 14). Aplicando à Igreja Adventista,
podemos relacionar que assim como o remanescente do Antigo Testamento era uma
comunidade fiel com elementos infiéis que estavam incorporados a uma missão, os
adventistas também coadunam com essa formação.
O remanescente nos evangelhos
Teologicamente falando, Jesus Cristo é o verdadeiro remanescente. Permaneceu
totalmente fiel a Deus em um ambiente hostil, foi Servo por excelência, perseverante até o
final. Todos os demais membros do povo remanescente devem sua existência a Ele e
compartilham da vitória vinda dEle.
Jesus faz menção em Mc. 09:11-13 e 04:11 e 12 da ideia de um remanescente devoto e
purificado. A figura de João Batista fazendo menção a um batismo futuro como Espírito Santo
e com fogo ecoa uma expectativa iminente da separação do joio e do trigo dentro de Israel
(Mt. 03:11 e 12 – Am. 09:09). Tanto João como Jesus criticavam os ditames da época em
relação à exclusão da pureza de Israel em detrimento a uma confiança superficial da eleição.
Uma das formas mais destacadas do remanescente no ministério de Cristo aparece na eleição
dos doze apóstolos. A promessa de que Seus seguidores sentariam em doze tronos para julgar
as doze tribos mostra uma perspectiva futura e presente da restauração de Israel. Jesus
demonstra a intenção do remanescente dentro de Israel ao enviar os doze numa missão onde
excluí especificamente aos gentios (Mc. 10:05). Mas posteriormente, essa preocupação do
remanescente ganha abrangência até chegar ao ponto da grande comissão (Mt. 28:19 e 20).

Essa expansão da formação do remanescente do povo de Cristo vai ganhando forma aos
poucos. Vemos registro da passagem de Jesus a Tiro e Sidom, além do mar da Galiléia para
Decápolis na construção de gentios entre a reconstituição do remanescente. Diversas citações
de Cristo apontam para uma forma de julgamento dentro de Israel em torno da formação de
um grupo ou família (Mc. 03:31-35), como Mt. 05:09, 10:34, 12:30 e 07:21-27 e de forma
mais destacada Mt. 10:06 e 15:24, a procura de Jesus pelas ovelhas perdidas da casa de Israel.
Não poderíamos deixar de mencionar que Jesus se refere a essa formação como um
“pequenino rebanho” (Lc. 12;32).
O remanescente no pensamento paulino
Para Paulo, o remanescente vem de uma aliança especial entre Deus e Israel como
nação escolhida que se expandiu para o “Israel” formado por crentes de todas as nações (Rm.
09: 01-05; Ef. 02:12). A base do assunto nos textos paulinos está em Romanos 09-11. Nesse
trecho, Paulo aborda a doutrina do remanescente de maneira aberta e explicitada num
contraste entre a fidelidade de Deus e a rejeição do Messias por parte de Israel. Paulo fala do
remanescente em termos de salvação distinguindo o remanescente biológico do remanescente
empírico. Paulo faz uso de passagens do Antigo Testamento para ilustrar que o povo especial
por intermédio da promessa dentro do Israel da fé, ressaltando a misericórdia divina
independentemente dos esforços de Israel como detentores da lei ou genética herança. Mas, o
apóstolo faz questão de mencionar que há esperança para o Israel nação ao imergirem para a
promessa de vindicação da nova formação pela graça e fé em Jesus, a consumação da
formação do novo remanescente.
O remanescente no Apocalipse
Há quatro textos que se referem ao remanescente como alguém que passa por
provações, demonstram fidelidade à Deus e Sua Palavra e têm o testemunho de Jesus. Esses
textos são: Ap. 01:09; 12;17; 19:10 e 20:04. Ademais, o conceito do remanescente também
está de modo implícito presente na figura do vencedor, como em Ap. 03:21. São vencedores
por vencerem as provações de seus dias e se apegaram à Palavra de Jesus em meio da
apostasia do cristianismo. O retrato da atenção de Cristo a toda igreja é latente no Apocalipse,
entretanto, nela também nota-se que a salvação não é obtida de maneira corporativa, mas
pessoal. Existe no Apocalipse, a existência de um remanescente fiel que é capaz de subsistir
ao longo da história, bem como, um remanescente escatológico dentro da última igreja.
Não poderíamos deixar de mencionar, que a mesma aliança que vimos no conceito de
remanescente no pensamento paulino, também se relaciona com a presença dos 144 mil e a
grande multidão, ou seja, Israel e gentios (Gl. 03:26-29). As características desse povo

remanescente são descritas como: aqueles que não se macularam mulheres (não se
prostituíram com Babilônia); seguem o Cordeiro em detrimento da besta e do falso profeta;
não participaram de mentiras. Outro ponto interessante a se observar do remanescente no
Apocalipse está no contexto dos selos. O sexto selo conclama a presença do remanescente na
pergunta feita: “quem é que pode suster-se?” (Ap. 06:17). Os 144 mil são a resposta. Quando
o remanescente parecia não ter se arrependido, os conceitos dos capítulos 10 e 11 do livro
indicam que a mensagem deveria continuar a ser proclamada pois, no meio do cenário
catastrófico, a profecia seria ouvida. A missão das duas testemunhas, no apocalipse, inclusive
evoca a comparação com o profeta Elias, símbolo forte do remanescente do Antigo
Testamento (I Rs. 19:14).
Não podemos nos esquecer de que o livro da vida do cordeiro (Ap. 21:27), contém um
referencial ao remanescente. O livro aparece duas vezes no contexto do julgamento final, pra
não dizer, o remanescente escatológico (Ap. 20:12 e 15). É uma lembrança ao pensamento de
Paulo em Ef. 1:04, os “chamados para serem santos”, também a recordação de que esses
inscritos no livro não estão lá por suas obras, mas pela graça dos méritos do sacrifício de
Jesus. Mas o Apocalipse apresenta também que esse povo remanescente tem uma missão
bem específica em 20:06. Eles devem interceder pelos pecadores e clamar pelos culpados.
É no capítulo 12 que o remanescente aparece mais em destaque no livro. Empregando
o método historicista de interpretação, acreditamos que se refere ao período de supremacia
papal do 6º século até o final do século 18, onde Satanás dirige seu ataque ao remanescente da
semente da mulher. Há várias marcas específicas e essências entre os capítulos 12 a 14 de
Apocalipse que podemos identificar: guarda os mandamentos de Deus (12:17); tem o
testemunho de Jesus (12:17); é um povo perseverante (14:12); tem a fé em Jesus (14:12) e por
último, proclamam de modo específico as três mensagens angélicas. Neste contexto a
obediência aos mandamentos de Deus e ter a fé em Jesus são sinais vitais para o
remanescente. Esses dois pilares identifica e autentica a descendência da mulher, a
testemunha profética diante de um mundo inclinado à adoração da besta e sua imagem. Isso se
dá na proclamação das três mensagens angélicas na verdadeira adoração ao Criador.
A ilustração da mulher fugindo para o deserto aponta para o êxodo do povo de Deus e
do profeta Elias pela fúria de Jezabel (I Rs. 17:01-07; 11:05, 06; 13:13). A mulher perseguida
é ilustra o remanescente histórico e fiel ao se esconder por 1.260 dias da destruição total
instigada por motivações religiosas. Ao final, em 18:04, o remanescente proclama o chamado
final para o povo de Deus sair de Babilônia. Apocalipse 12:11 exibe dois pré-requisitos para a
vitória: a morte de Cristo na cruz e o comportamento dos fiéis com Seu Salvador.

A Igreja Adventista do Sétimo Dia sempre afirmou ser a Igreja Remanescente por
mostrar-se: fiel aos mandamentos de Deus, ter o espírito de profecia, anunciar as três
mensagens angélicas e aparecer no contexto do tempo do fim chamando demais
remanescentes para saírem de Babilônia. A declaração de Perth, de 1991 afirma que “A Igreja
Adventista do Sétimo Dia é um movimento profético [...] o remanescente chamado por Deus
para levar uma mensagem única às gerações da Terra, para anunciar o retorno iminente de
Cristo em poder e glória”. (“The Perth Declaration”, AdvR, 7 de novembro de 1991, p. 07).
Assim, concluímos que no Apocalipse, o remanescente é uma entidade identificável,
sociológica, espiritual, constituída de fiéis adoradores ao Senhor e formada por pessoas ainda
não pertencentes a ela enquanto a mensagem ainda está sendo proclama para cumprir a
missão. Sem essa missão não existe o remanescente.
O remanescente no pensamento adventista contemporâneo
A aplicação do conceito remanescente à igreja adventista tem causado fortes reações
de outras comunidades cristãs, que veem nisso um título de exclusivista e uma postura
arrogante. O Conselho Mundial de Igrejas e Movimentos ecumênicos de 1950, apontou “o
primeiro registro oficial de divergência em relação a auto identificação da Igreja Adventista
com a igreja remanescente.” (Garbi, “Remmant Church”, p. 32). Mesmo antes da organização
formal dos Adventistas do Sétimo Dia em 1863, Ellen White publicara um panfleto intitulado
“Ao pequeno remanescente espalhado pelo mundo”. Contudo, como já tratamos acima, vemos
que embora a Igreja Adventista seja distinta dos outros movimentos religiosos no que tange a
suas práticas e doutrina, têm em comum o propósito de trazer uma fé mais próxima às
Escrituras, relacionando-se aos valdenses, anabatistas, puritanos, petistas alemães, metodistas
e pregadores da fé milerita.
A reforma protestante não avançou como se esperava. A igreja caiu no formalismo
depois sem uma restauração completa. Por isso, a Igreja Adventista surgiu ao fim dos 1260
dias para ser essa entidade histórica, a quem foi confiada uma mensagem fiel a ser
proclamada pelo povo fiel. Sabemos que esse povo passará por provas para que seja
purificado como vemos em Ap. 07:14. Mas esta igreja tem a convicção de que a plenitude do
remanescente não reside em uma organização específica, e que assim, o remanescente adota
um aspecto invisível. Este quadro relaciona esse contraste:

Povo remanescente de Deus Povo remanescente universal


Entidade Visível Invisível
Tem características específicas, missão Ainda sem características uniformes
Tem um testemunho e a fé em Jesus Está em Babilônia
Tem a perseverança dos santos São as ovelhas de outro aprisco
Chama outros a saírem de Babilônia Chamados para saírem de Babilônia
Prega e vive as 3 mensagens angélicas

Encerro com esta citação de Ellen White em Profetas e Reis, p. 188 e 189: “Entre os
habitantes do mundo, espalhados por toda a Terra, há os que não têm dobrado os joelhos a
Baal. Como as estrelas do céu, que aparecem à noite, esses fiéis brilharão quando as trevas
cobrirem a Terra, e densa escuridão os povos. Na África pagã, nas terras católicas da
Europa e da América do Sul, na China, na Índia, nas ilhas do mar e em todos os escuros
recantos da Terra, Deus tem em reserva um firmamento de escolhidos que brilharão em meio
às trevas, revelando claramente a um mundo apóstata o poder transformador da obediência a
Sua lei.”

© Associação Sul do Pará, 2018.

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