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ISBN: 978-65-994536-4-9
Vários autores.
Bibliografia.
ISBN 978-65-994536-4-9
22-115889 CDD-304.2
Índices para catálogo sistemático:
1. Sustentabilidade ambiental 304.2
Os textos divulgados são de inteira responsabilidades de seus autores, nos termos do edital de trabalhos do
congresso, disponíveis na página da Editora.
Capítulo 32
ESTRATÉGIAS DE GEOCONSERVAÇÃO EM ESTÂNCIAS
HIDROMINERAIS: DIAGNÓSTICO, CONSERVAÇÃO E PROMOÇÃO
DO PATRIMÔNIO HIDROGEOLÓGICO
Maxwell Luiz da Ponte
© Este trabalho integra a obra: E. C. Wenceslau & M. L. Ponte (eds.). Sustentabilidade - conceito
articulador de saberes e práticas. São José do Rio Preto, SP: Reconecta Soluções, 2022.
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Estratégias de geoconservação em Estâncias Hidrominerais
INTRODUÇÃO
Os elementos naturais e culturais associados a águas subterrâneas e ao seu contexto
geológico são expostos a diversas pressões e riscos impostos à disponibilidade e
qualidade hídrica (SCHIRMER; LESCHIK; MUSOLFF, 2013). A ocorrência de
anomalias hidrogeoquímicas confere características composicionais diferenciadas às
águas subterrâneas, resultando em particularidades com valores histórico, sociocultural,
econômico, ambiental, geológico, turístico, paisagístico, educativo, dentre outros
(LOPEZ; GIL; NAVARRO, 1997; RODRÍGUES-ESTRELLA, 1999, 2001,
MARTINEZ; MORENO, 2010; SIMIC; LJILIANA; SRDAN, 2010; YUCEER et al.,
2021).
Fenômenos naturais relacionados a tais sistemas aquíferos, como por exemplo
fontes termais, jorrantes e as anomalias hidrogeoquímicas, estão entre os “maiores
patrimônios naturais da geodiversidade mundial”, e as águas subterrâneas são utilizadas,
ainda, para abastecimento público, atividades econômicas como envase de água mineral,
turismo, hidroterapia, farmacologia, dentre outros (LAZZERINI, 2005; 2013). As
atividades econômicas, de explotação da água subterrânea, podem ser acompanhadas por
atividades de destacado valores educacional e científico, associados com a apresentação
e explanação de fenômenos e problemáticas do contexto geológico, geofísico,
biogeoquímico que resultam nas águas minerais e suas propriedades (LANGER, 2020).
No Brasil, o Código de Águas Minerais estabelece como Estâncias Hidrominerais
as localidades onde as águas subterrâneas são utilizadas com fins terapêuticos, para
explotação e envase, integrando elementos edificados e culturais tais como fontanários,
balneários, termas, hoteis, praças e parques. Sabe-se que as Estâncias Hidrominerais no
Brasil tiveram seu apogeu econômico na década de 40, considerada a época dos “anos
dourados do turismo brasileiro”, na qual os recursos naturais utilizados à fins terapêuticos
foram associados à jogos, espetáculos e luxos para a elite nacional (PAIXÃO, 2007).
Em 1946, com a proibição de jogos no Brasil (BRASIL, 1946) tais localidades
passaram a depender somente dos usos terapêuticos dos bens naturais, e entraram em
declínio do potencial turístico (HAMMLER; SILVEIRA; BENTTI, 2015; SOLHA et al.,
2010; PAIXÃO, 2007). Desde então, a identidade e as atividades econômicas das
Estâncias Hidrominerais deixaram de ser predominantemente turísticas e de lazer, e
passaram a ser majoritamente exploratória e mercadológica, voltada à indústria dos
recursos hídricos subterrâneos (COSTA; MENDONÇA; MAGNO, 2019; SOUZA;
ALCÂNTARA, 2019), alijando a população local de seu uso recreativo e de saúde, e
consequentemente, comprometendo a percepção do significado patrimonial
(WENCESLAU, PONTE; PIRANHA, 2018). Atualmente, identifica-se nos territórios
das Estâncias Hidrominerais significados diferentes relacionados às águas subterrâneas:
água como saúde, água como direito e água como recursos econômico (COSTA;
MENDONÇA; MAGNO, 2019). Nesse contexto, buscou-se, neste estudo, discutir a
importância de estratégias de geoconservação para o patrimônio hidrogeológico de
Estâncias Hidrominerais.
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e que são utilizados como matéria prima para as construções humanas (BRILHA, 2015;
2016; BRILHA et al., 2018; PONCIANO et al., 2011).
A geodiversidade pode ser caracterizada quantitativa e qualitativamente
(BRILHA et al., 2018), por seus valores intrínseco, científicos, educativos, turísticos
(CROFTS et al., 2020) ou por seus serviços ecossistêmicos, conforme cinco funções:
regulação, provisão, suporte, culturais e de conhecimento. Essas funções abarcam vinte e
cinco serviços distintos (GRAY, 2008). Os estudos de elementos e sítios de
geodiversidade, integrando estudos geológicos técnicos e específicos, têm revelado
valores e serviços sistêmicos de elementos da diversidade geológica, caracterizando-os,
em decorrência, como patrimônio geológico, geossítios, sítios da geodiversidade ou
elementos da geodiversidade (BRILHA, 2016). As classificações de elementos da
geodiversidade têm destacada importância para a definição de prioridades nas estratégias
de geoconservação (BRILHA, 2015; BRILHA et al., 2018; GARCIA et al., 2018, 2019;
GRAY, 2018b).
Considerando a importância dos estudos da Geodiversidade para o
desenvolvimento sustentável (HENRIQUES et al., 2011; PROSSER, 2013), a
Geoconservação emergiu como uma ciência no ramo das Ciências da Terra
(HENRIQUES et al., 2011) e pode ser definida como o conjunto de ações que visam
conservar e promover o cuidado com a Geodiversidade, incluindo identificação,
avaliação, proteção, gestão, promoção e interpretação (PROSSER, 2013). Assim, o
principal objetivo da geoconservação pode ser entendido como sendo o de conservar a
diversidade geológica.
Atualmente, a geoconservação possui um amplo portfólio de ações em diferentes
escalas e mediadas por diferentes órgãos e atores (CRISP, ELLISON, FICHER, 2020;
PROSSER, 2013). Segundo Garcia et al. (2022), as estratégias em geoconservação
possuem três etapas essenciais, sendo elas:
DIAGNÓSTICO
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Estratégias de geoconservação em Estâncias Hidrominerais
Conservação
O Código de Águas Minerais do Brasil, em seu artigo 1º, determina que as Águas
minerais são” aquelas provenientes de fontes naturais ou de fontes artificialmente
captadas que possuam composição química ou propriedades físicas ou físico-químicas
distintas das águas comuns, com características que lhes confiram uma ação
medicamentosa” (BRASIL, 1945). Devido às particularidades de suas águas, Estâncias
Hidrominerais apresentam potencial econômico associado aos seus usos, mas também
riscos relacionados à degradação dos recursos hídricos, seja quantitativa ou
qualitativamente, o que torna necessária a formulação de estratégias que fomentem sua
preservação e o uso sustentável desse patrimônio natural (LAZZERINI, 2005; PONTE;
PIRANHA, 2018). Segundo Simic et al. (2012), os principais problemas relacionados à
proteção do patrimônio hidrológico são:
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Estratégias de geoconservação em Estâncias Hidrominerais
Promoção
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Segundo Silva (2008, p. 175) “os subsídios geológicos são, portanto, estratégicos
e indissociáveis do planejamento e gestão ambiental do turismo, principalmente em
estâncias”. Neste sentido, no caso dos gestores, considera-se de extrema importância que
as formações apresentem a eles aspectos legais e administrativos relacionados aos
recursos hídricos subterrâneos, à proteção e conservação da natureza e à formulação de
políticas públicas efetivas para a divulgação e conservação do patrimônio local, no caso
dos gestores. Estes conceitos poderão mobilizar os gestores no questionamento dos
impactos causado pelo modelo de gestão “exploratório” vigente (PONTE; PIRANHA,
2018).
Além disso, considerando tratar-se de uma modalidade de Estância Turística,
destaca-se a importância da divulgação geocientífica junto as comunidades locais e aos
turistas. Sobretudo, devido ao fato de que esta divulgação pode dirimir as
incompreensões, que subsidiam as crenças “místicas”, como de “curas milagrosas”,
associadas ao uso e consumo das águas subterrâneas. Além disso, deverá promover a
valorização do patrimônio, destacando suas particularidades associadas aos usos
terapêuticos, farmacológicos e estéticos da água. Assim, deve-se abordar conceitos
importantes como “termalismo” e “balneoterapia”, buscando divulgar evidenciais
científicas que indiquem contributos das anomalias hidrogeoquímicas, tais como
temperatura, pH, radioatividade, presença e concentração dos minerais, entre outras
(PONTE; PIRANHA, 2018).
Geoturismo
Além disso, Ninis e Drummond (2008, p. 164) consideram que estas áreas estão
desprotegidas e apontam a necessidade de “disseminar a concepção do acesso à água
mineral como um direito fundamental das populações que vivem da exploração
sustentável desse recurso, em associação com uma outra concepção: a das águas minerais
como um patrimônio da humanidade”.
Neste contexto, o advento do geoturismo pode apresentar novos produtos de
interesse turístico e contribuir para o desenvolvimento sustentável destas localidades, em
atenção à conservação do patrimônio geológico (SILVA; PERINOTTO, 2007). O
“geoturismo” refere-se às atividades turísticas com enfoque e diretamente relacionadas à
visitação e interpretação da Geodiversidade, natural, construída ou musealizada –, é
considerado uma forma relativamente nova de turismo (HOSE et al., 2011). Apesar de
não existir um consenso entre estudiosos se o geoturismo é um segmento turístico (SILVA
et al., 2021), atualmente no Brasil, propõe-se que o geoturismo seja considerado como
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Estratégias de geoconservação em Estâncias Hidrominerais
um novo segmento que que objetiva a visitação e interpretação de locais com recursos
geológicos e correlacionados que, somados aos aspectos sociais, culturais e históricos das
destinações, se configuram como atrativos turísticos, e que visa a valorização de
patrimônios natural e cultural, por meio de visita e interpretação de atrativos abióticos
(SILVA et al., op. cit).
No âmbito do desenvolvimento socioeconômico, o geoturismo por promover a
diversificação dos atrativos turísticos (SILVA et al., 2021). A diversificação e
refuncionalização do turismo são importantes para reverter o cenário de fragilidade social,
econômica e ambiental de muitas comunidades que se projetam turísticas, sobretudo
observada nos pequenos municípios brasileiros (ALVES; ENDLICH, 2017). Segundo
Pereira, Cunha e Theodoro (2016, p. 304) “o desenvolvimento do geoturismo [...] é uma
maneira dinâmica de divulgar este geopatrimônio a um maior número possível de
pessoas, sejam turistas ou não, visando sua geoconservação”.
Nesse sentido, o patrimônio das Estâncias Hidrominerais – águas subterrâneas,
anomalias hidrogeoquímicas, termalismo, balneários, cachoeiras, nascentes, dentre
outros – as tornam “locais privilegiados de aprendizagem de geologia com integração de
Ciência, Tecnologia e Sociedade” (RODRIGUES; CANILHO; CARVALHO, 2011, p.
5). Ademais, o geoturismo, ao promover o reconhecimento do patrimônio hidrogeológico,
poderá fortalecer as inciativas de uso terapêutico das águas subterrâneas nas Estâncias
Hidrominerais, preconizadas no âmbito do Programa Nacional de Práticas Integrativas e
Complementares. Tais práticas ainda são pouco exploradas como fator de recuperação,
manutenção e promoção da saúde por carência de informação e pesquisa científica
(HELLMANN; DRAGO, 2017; SANTOS et al., 2021).
A integração dos valores turístico, educativo, econômico, cultural e histórico dos
elementos que constituem o patrimônio hidrogeológico, potencializada pelo geoturismo,
poderá possibilitar que o turismo assuma uma maior acuidade com a geoconservação, a
divulgação científica e a popularização do conhecimento geocientífico (PONTE;
PIRANHA, 2018). Evidentemente, a implementação das atividades requer estudos
relacionados à capacidade de carga de cada localidade, para que sejam adotadas medidas
legais e administrativas tais como controle de visitação, monitoramento e mitigação de
impactos gerados pelo turismo, além da institucionalização de programas educacionais e
de divulgação geocientífica junto a moradores e turistas (ALENCAR, 2020).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
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