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2011
EUNÁPOLIS, BAHIA
PONTO DE CULTURA VIOLA DE BOLSO
EDITORA VIOLADILIVRO
ICONOGRAFIA, HISTÓRIA E RELATOS
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ÍNDICE
3 . APRESENTAÇÃO
5 . A COSTA DA INVASÃO
35 . A CULTURA RESISTE
41 . REFERÊNCIAS E LINKS
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APRESENTAÇÃO
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Essa publicação, apesar de não ser um estudo historiográfico, traz uma
iconografia recente e reúne textos recortados de outras publicações sobre
Itapebi, além do registro da experiência do Viola de Bolso, atendendo ao seu
plano de ação, no qual consta a visita e entrevistas com moradores locais.
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A Costa da Invasão
E sse espaço geográfico em
movimentação permanente, registrado
Por aqui as Sesmarias já haviam dado
por viajantes em meados do século
lugar aos Quartéis de atração e contato
XVIII, se configura como o território dos
(zonas militarizadas) em todo o vale do
povos Pataxó, Tupiniquim e Tupinambá,
Jequitinhonha. Mais tarde, adequaram-
que adentra o interior das matas e se
se à lei de terras, mas a lei era mais uma
estende até o litoral, em muitas léguas.
manobra de grupos, cuja intenção era
Séculos mais tarde, a forte presença de
mostrar serviços ao império em declínio.
famílias de pretos fugidos, de mestras
Um lugar em permanente assalto
e mestres dos saberes de tradição oral,
territorial, em que a história e as
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Nove quilômetros abaixo de Atualmente, essa área é conhecida por
Cachoeirinha, localizava-se a Fazenda Praça 14 de Agosto ou Praça do Avaí.
Pedra Branca, de Ludgero Carmona de Com o crescimento do povoado, as
Souza. Do outro lado do rio, ficava a estreitas ruas passaram a ser iluminadas
Fazenda Estrela do Norte, propriedade com luz de lampião.
do coronel José Francisco de Souza, Pela manhã, o encarregado Valdimiro
mais conhecido como Juca de Vicente, efetuava a limpeza e o abastecimento
um líder da comunidade. (que era feito com querosene) de todos
Próximo às duas fazendas, existia a os candeeiros, e no final da tarde voltava
palhoça de Ana Domingues Santana para acendê-los.
(conhecida como Tuca Capenga), que Em 1935 a Vila Pedra Branca foi elevada
servia comida aos canoeiros que a Distrito, e recebeu o topônimo de Italva
paravam para descansar. - que em tupi-guarani significa pedra
Alguns comerciantes, vindos de branca. Três anos depois foi modificado
Cachoeirinha, por ali dormiam em para Itamarati e posteriormente passou a
barracas de pano para comercializar chamar-se Itapebi.
suas mercadorias.
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Igreja Nossa Senhora da Conceição, localizada na praça.
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NASCIMENTO, M. C. Pedra Branca da Bahia: Itapebi. Brasília: 2006.
Itapebi vira música
Relato de Sumário Santana
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A primeira vez que tive esse privilégio, foi viajando com o meu pai, em 1980 numa
viagem a Itabuna. Ali, enquanto a gente atravessava a ponte, ele me contara sobre
“Pedra Branca”, onde passou pela primeira vez com o meu avô, numa viagem sem
volta, quando saíram do alto da Conquista (desde Angicos, Limeira, vindo até a
gameleira, na beira do Jequi), para morar de vez no sul da Bahia, em 1951.
Na viagem, quando estavam chegando bem à noitinha, na estrada de acesso à
Pedra Branca, meu
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avô José Barreto Santana (vô Dedé), pediu pouso ao senhor
Eugênio Avelino, dono de uma fazenda, entre o rio e o povoado. Ali, a família
dormiu duas noites e depois seguiu viagem, rumo ao sul da região, mais distante
do rio Jequi, bem mais perto do mar, no território municipal de Santa Cruz
Cabrália.
Essa passagem na trajetória de vida e viagem do meu pai é sempre lembrada e
permeada de outras tantas histórias, uma das quais virou música do Viola de Bolso,
intitulada de “Subir o Rio”, numa alusão às idas e vindas de canoas entre
Cachoeirinha, Itapebi baixa, Boca do Córrego e Belmonte, no tempo das aventuras
de jovens e de experientes comerciantes.
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Eugênio Avelino é o pai do Cantador Xangai, cujo nome de batismo é também Eugênio Avelino
O Viola de Bolso lança o olhar
sobre a cidade
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Do mesmo modo, as canoas de travessia tinham tamanhos que impressionam, e as
habilidades de seus condutores eram ressaltadas em comentários e causos - como o
relato que fala do canoeiro de ‘três peitos’, cujo apelido era assim chamado devido
aos anos de ofício, atravessando, levando e trazendo viajantes pelo rio Jequi, em que
de tanto utilizar do remo, uma longa vara que, ajustada à massa corpórea na altura do
peito, criara um calombo, isto é, um calo grande que se assemelhava a um peito.
Meu pai, Wilson Àvila conta que quando vieram para a região em 1951, a família
morou em Gameleira (atual Caiubi), e o meu avô Dedé - que era padeiro - abriu uma
padaria em que havia um salão para sinuca. A peça de sinuca, única na região
naquele período, veio transportado por canoas no rio Jequi e depois transportado
“em lombo de burro”, como dizia meu avô. O detalhe é que o objeto media 3,5m x1,5
m e vinha dividido em 4 partes que se encaixavam. Pelo tamanho do objeto, dá para
se ter uma ideia do tamanho da canoa.
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A canoa mais antiga
Em 1958, Hélio Cacique, mais conhecido como “seu Branco”, desceu o rio Jequi
indo até Belmonte para comprar tecidos e outras novidades, vindas de navio de
Salvador ou do Rio de Janeiro. Após as compras, ele constatou que a canoa em
que ele viajara, já havia partido. Na busca por um canoeiro que o transportasse de
volta até Itapebi, a empreitada foi ficando difícil, dado os compromissos dos
caneiros e suas embarcações. Foi quando ele encontrou um canoeiro vendendo a
sua canoa e, diante da situação, ele decidira comprá-la, com a condição de o
canoeiro transportá-lo até o seu destino. E assim aconteceu. Seu Branco subiu o
rio em sua canoa, que segundo ele, ficou atracada no porto de Itapebi por um
longo tempo. Depois vendeu.
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O Quartel dos Arcos, criado em 1813 pelo então governador Conde dos Arcos, era parte da política de atração e subjugação
dos povos originários. SOUSA, Ana Cristina. Povoados de Cachoeirinha e Massaranduba (Vale do Jequitinhonha): a
relação entre espaço, agentes e contexto sócio-econômico. 2006. Tese (Doutorado em Ciências Sociais)- Universidade
Federal da Bahia, Salvador, 2006.
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O Pife de Turiba é de
coração guardado
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O Encontro das Folias de reis da Costa do Descobrimento foi realizado em Eunápolis em maio de 2017.
A cidade baixa é memória
a cidade alta, esquecimento
L á embaixo tem o rio Jequi, ele assustou muita gente tempos atrás, mas
também deu e ainda dá alimento. Canoa é remada nele, roupa é lavada, peixe é
tratado nele, Nessa parte do rio, sempre tem boas lembranças muito mais que
tristezas. A cidade subiu, mas a memória ficou, porque foi aqui que nasceu a
história da cidade.
Foi isso que nos contou dona senhorinha, moradora que não quis subir, quando
a cidade nova surgiu, lá no alto, em 1979
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Assim que a nossa equipe chegou
na cidade alta (a Itapebi nova),
encontramos a Folia do mestre
Machado, formada por um grupo
de umas 20 pessoas, a maioria
parentes entre si. As filhas do
mestre machado tinham/têm uma
posição de protagonismo no grupo:
As três moças se dividem entre o
canto, a percussão das caixas e a
coreografia das danças.
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Mestre Machado entre reiseiros
O mestre machado puxa o eito com uma gaita e conduz o ritual. O boi de janeiro
dança e desafia no centro do círculo, enquanto é desafiado também pelo bom
vaqueiro, genro do mestre.
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"Quando o avô fazia e eu era menina, me lembro bem”
Não tem canto, é mais o som dos instrumentos, as palmas e os gritos
sincopados, alternados, ocupando os espaços de memória. Vez ou outra
uma cantiga, mas a maioria das músicas só são elas.
Maria D'Ajuda
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As casas da cidade baixa de Itapebi sussurram baixinho seus nomes.
A beira do rio, entre a mureta e a água, oferece de forma generosa
uma areia amarelada e densa pra os pés;
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Canoinhas – assim como a vida é carregada -, também
carregam areia em seu coxo fundo, nas horas mansas do rio
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As ladeiras de Itapebi velha são trilhas da memória, de um liso quase
espelho, lixa que o tempo faz, quando o cotidiano é de ida e de volta na
mesma coragem de quem sempre volta pra casa, depois de tempos idos.
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E os nomes sussurrados pelas casas saem pelas janelas como se
fossem borboletas que voam ligeiras em nossa frente, quase perto do
ouvido, a contar os segredos que todos já sabem, ou pendurados na
janela em pregadores de roupa, vigiados pelo menino que observa a
gente que passa.
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Na cidade baixa, uma canoa imensa guarda a memória e a história da
navegação do Jequi. Desde a cachoeira do Salto, ou do "Tombo do
Fumaça", como é chamada e também conhecida, a corredeira d’água de
pedras pontiagudas, que foi engolida, submersa pela barragem de Itapebi.
A Canoa grande ia dali adiante, até Belmonte.
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Essa canoa imensa fincada na praça, narra a
história dos antigos canoeiros e em sua
madeira, riscos e vincos são como pinturas
rupestres
lembrando dos seus abraços de remo e suor,
no dorso cansado dos dias alternados de maré
Logo à frente, uma casa-planta-musgo do tempo que insiste em dizer:
fiquem comigo, gente daqui.
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E abaixo, numa pequena abertura de rua calçada e íngreme, um
portal para os dia de sol do rio, quando filhas e filhos, esposas e
comadres acariciam vasilhas, roupas e anzóis nas águas do Jequi
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Boteco/mercearia na cidade baixa
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A nova cidade alta
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Nada mais na cidade alta lembra a história de Itapebi, a não ser os seus
moradores e essa obra de arte.
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Veja fotos adicionais no site https://www.flickr.com/photos/violadebolso/10818125556/in/photostream/ 34
A Cultura Resiste
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Existem benzedeiras que rezam com elas celebram e festejam ou com folia, ou com
também. Até hoje no espaço cultural do samba de couro, ou com macumba (as
Viola de Bolso, cultivamos esse milagre danças e batuques africanos).
São lugares em sua maioria, comandadas
por mulheres, portanto, terreiros de fé e de
celebração da vida. Os terreiros de
candomblé e de umbanda são os lugares
de maior destaque e de maior
concentração de gente, de líderes
religiosos, de convidados, de vizinhos
curiosos, de gente que precisa de
alimento, tanto materialmente, como
espiritualmente falando.
Contas de Milagre
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Reiseiros de Itapebi
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Vimos como a herança dessa prática ceramista está presente nas mulheres
que frequentam o Aganju, notadamente, estimuladas pela atuação da
instituição cultural naquele local.
Na verdade é possível registrar em toda a população ribeirinha do
Jequitinhonha entre Itapebi e Belmonte, a presença de ceramistas, com
destaque para o trabalho já reconhecido nacionalmente, de dona Dagmar, a
mestra ceramista dos potes grandes, como é conhecida. Mesmo com o
reconhecimento e valorização da obra de dona Dagmar, ela continua sem
apoio e sem qualquer tipo de financiamento que o seu ofício merece.
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Veja o doc no canal do Viola de Bolso https://www.youtube.com/watch?
v=QSCJh9b2j2I&list=UUXiiUjFrNpSJa3Tf2wceieA&index=38
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Secretaria de promoção da igualdade racial, Bahia.
Itapebi, tão perto, tão longe
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Referências
J. DUARTE. Vultos sem história, p.173 e 174.