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RESUMO
Esse artigo busca identificar os aldeamentos indígenas formados na Bahia e nas capitanias adjacentes
durante o Período Colonial. A partir de pesquisas em fontes diversas como as correspondências dos
missionários, autoridades régias e imperiais e na bibliografia correlata, traçou-se uma cartografia dos
núcleos indígenas, procurando-se oferecer pistas sobre sua localização atual. Foram acrescentadas
informações relativas ao histórico de fundação e transformações ocorridas nas referidas povoações ao
longo do tempo, que, para muitos aldeamentos, a partir do século XVIII, significou a sua conversão
em vila ou freguesia. Também são trazidas informações referentes à demografia desses núcleos de
índios. Uma das intenções primordiais é demonstrar a forte presença indígena na história da Bahia
durante o Período Colonial e século XIX, relacionando-se, nesse sentido, com as propostas de estudos
recentes no campo da história indígena, os quais, dentre outros objetivos, esforçam-se por descontruir
a ideia de invisibilidade dos índios na experiência histórica após a chegada dos europeus.
This article seeks identify the indigenous settlements founded in Bahia State and neighbor Captaincies
during Colonial Period. Using searches in several sources as correspondences of missionaries,
authorities of Portuguese Crown and Brazilian Empire and correlate bibliography, one realized
cartography of indigenous places, intending offer evidences about its present localization. Was
increased relatives information on foundation historic and changes occurred in those settlements
during signaled times, that, for much places, at eighteenth centuries forward, signified its conversion
in village or district (freguesia). As well, information relative to demography of those Indian
settlements was registered. The fundamental intention is demonstrate the strong presence of Indians
within history of Bahia during Colonial Era and nineteenth century. In this sense, the job links with
the proposals of recent researches on history of Indians, whose objectives seek deconstructing the idea
of invisibility of the Indians in historical experience after arriving European.
* Doutor em História Social pela Universidade Federal da Bahia-UFBA, mestre em História Social pela UFBA, graduado em Licenciatura
em História pela Universidade Católica de Salvador-UCSAL. Atualmente, é professor adjunto de Humanidades lotado no Campus Paulo
Freire/ Teixeira de Freitas da Universidade Federal do Sul da Bahia - UFSB, Brasil. E-mail: almeida_rego@yahoo.com.br
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1 No século XVIII, também se registra para Abrantes o etnônimo guayaná, conforme se vê no documento com a seguinte referência:
Relação do número de aldeias de índios, que se criaram em vilas, nomes que se lhes deram na sua criação, com a notícia de suas
situações: Bahia, 24 de abril de 1759 Arquivo Público do Estado da Bahia - APEBA Seção Colonial/ Dossiê Índios, maço 603.
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2 DÓREA, José Jacome. Mapa das Aldeias Indígenas da Província da Bahia (Salvador, 14 de janeiro de 1861). Arquivo Público do
Estado da Bahia (APEBA)/ Seção Colonial-provincial: Série Agricultura – Mapa das Aldeias Indígenas da Província da Bahia – MAÇO
4610.
3 SOUSA, Gabriel Soares de. Tratado Descritivo do Brasil em 1587. Biblioteca Digital Brasiliana - Universidade Federal do Rio de Janeiro
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4 Dantas, Sampaio e Carvalho sugerem a possibilidade de serem estes índios payayás: DANTAS, Beatriz G, SAMPAIO, José Augusto e
CARVALHO, Maria do Rosário. Os povos indígenas no Nordeste Brasileiro: um esboço histórico. In: CUNHA, Maria Manuela Carneiro da
(org.). História dos Índios do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras-FAPESP-SMC, 1992. p. 431-456.
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do século XIX como Aldeamento de Nossa que a permanência dessas aldeias foi fruto
Senhora da Saúde do Itapicuru ou Santo de um processo de re-fundação, no qual a
Antônio do Itapicuru5. ordem jesuítica cedeu lugar à franciscana.
Assim, ao invés de apor a informação
Não há menção, por sua vez, do
aceita (com a letra A), para os
aldeamento de Jeremoabo, de índios
aldeamentos em questão, Willeke anota
mongurus, na lista de 1758 ou na
que elas foram fundadas (marca-as com a
documentação do século XIX. Serafim
letra F) pelos franciscanos: Itapicuru de
Leite, em nota de rodapé, traz a notícia de
Cima foi fundada em 1689, mesmo ano
que os mongurus de Jeremoabo deixaram
para o qual se informa a fundação de
a catequese jesuítica e passaram a fazer
Massacará; Bom Jesus da Jacobina tem
guerra aos cariacás, em 1679 (Op.Cit.:
sua inauguração marcada com o ano de
286). Em Jacobina, a relação de 1758
1706 (WILLEKE, 1974: 84).
aponta o aldeamento do Senhor Bom
Jesus da Jacobina, sob a administração Willeke segue dando mais
dos missionários franciscanos, vinculada à informações que ofertam interessantes
vila de Jacobina (freguesia de Santo sugestões: retirando-se os jesuítas das
Antônio), cuja invocação era a do Senhor missões situadas na sesmaria da Casa da
Bom Jesus, composta por 100 casais de Torres (com ameaças de escusa definitiva),
índios sem identificação étnica registrada. os próprios Garcia de Ávila, o arcebispo da
Na documentação do século XIX, a aldeia Bahia e o governador geral recorreram a
tem o nome de Senhor Bom Jesus da diversas ordens religiosas. Eles percebiam
Glória6. que a colonização do sertão não poderia se
viável sem o apoio do trabalho de
Cruzando-se essas informações
catequese empreendido pelos
com os dados constantes na obra do frade
missionários. Por outro lado, dona Leonor
franciscano Venâncio Willeke, percebe-se
Pereira Marinho, uma das Senhoras da
5 P.e: Ofício sem data e sem menção nem de remetente nem de local de confecção, enviado pelo capitão João Dantas – dos Imperiais
Itapicuru, ao presidente da província da Bahia, Manoel Inácio da Cunha Meneses – visconde do Rio Vermelho (abril-maio de 1827).
Manuscrito do Arquivo Público do Estado da Bahia - APEBA: Seção Colonial-Provincial, série Agricultura – Correspondência enviada
pelo Diretor Geral dos Índios... MAÇO 4614.
6Cf. MADUREIRA, Casemiro de Sena (Diretor Geral dos Índios da Bahia). Ofício enviado ao Presidente da Província da
Bahia, João Maurício Vanderlei (Cidade da Bahia, 20 de outubro de 1854). Manuscrito do Arquivo Público do Estado da
Bahia - APEBA: Seção Colonial-Provincial, série Agricultura – Correspondência enviada pelo Diretor Geral dos Índios...
MAÇO 4612.
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Casa da Torre (motor da disputa com os Ávila, ainda que se estabelecessem tréguas
jesuítas), solicitou ao Padre Provincial dos entre a Casa da Torre e outras ordens
franciscanos a cessão de alguns como a dos jesuítas e a dos capuchinhos, o
missionários para as aldeias do rio São missionamento da Ordem dos Frades
Francisco. O pedido foi atendido e sabe-se, Menores (OFM) recebeu um suporte
com segurança, que os franciscanos material importante daquele senhorio,
substituíram os jesuítas nas aldeias de provendo-se assim parte indispensável do
Caruru, Rodelas e Axará (Acará ou sustento das missões naquela região.
Oacará), na região das missões de Rodelas. Dessa forma, a família Ávila doava
Mas, sobre as aldeias da região de diariamente um boi a cada aldeia de
Itapicuru (Itapicuru, Marassacará e franciscanos em suas terras, munindo
Jeremoabo) e Jacobina (São Francisco também as capelas com paramentos
Xavier), Willeke admite não haver dados (WILLEKE, Op. Cit: 107). Isso criou entre
suficientes sobre o que realmente a Casa da Torre e suas aldeias franciscanas
aconteceu após a saída dos jesuítas. Existe uma espécie de padroado que enredava os
o dado de que, em 04 de novembro de aldeados e os apóstolos da OFM ali
1698, a Junta das Missões, deliberando atuantes no tecido das relações de poder
sobre o retorno dos jesuítas às aldeias que gravitavam em torno daquele
abandonadas, decidiu “ser melhor poderoso potentado.
encarregar-se outra Ordem religiosa, visto
Dessa forma, é muito provável que
que D. Leonor sentia bastante
as missões de Itapicuru, Marassacará e de
repugnância à Companhia de Jesus”
Jacobina tenham sido retomadas pelos
(WILLEKE Op. Cit.: 86-87).
franciscanos. Não se trata de uma
É preciso lembrar que havia aquisição, devido às circunstâncias em que
animosidades e disputas entre jesuítas e foi feita a retirada dos jesuítas, mas, antes,
franciscanos, o que ficaria claro no uma reorganização ou re-fundação. Em
episódio da expulsão dos inacianos na Jacobina Velha havia a aldeia de São
região de Rodelas. Além disto, a ordem dos Francisco Xavier, que reunia cariris
franciscanos possuía uma relação sapoyás, separenhenhupãs,
diferenciada por parte da Casa da Torre. secaquerinhéns, borcás, cuparãs e
Não obstante haver conflitos entre os payáyás. Havia uma aldeia específica dos
missionários franciscanos e os Garcia de payayás que durou pouco ali, sendo seus
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região, ainda não tinham seu terreno índios kiriri. Situava-se “no vasto
oficialmente demarcado, sofrendo, por seu tabuleiro, à esquerda do rio Itapicuru” e o
turno, com a invasão de suas terras por seu território estava compreendido dentro
parte dos curraleiros. da jurisdição do atual município de
Ribeira do Pombal. O aldeamento foi
O principal ponto de conflito se
fundado em 1667 por João de Barros e
dava com Gaspar Carvalho da Cunha,
Jacob Rolando, mas foi o padre Jacques
proprietário das terras em que a aldeia
Cocleo o responsável por reerguer a
estava encravada. As denúncias feitas por
missão, a partir de 1672, período marcado
Antônio de Andrade, quando retornou à
pelo atentado da Casa da Torre aos
aldeia em visita, apontaram Gaspar
aldeamentos vizinhos de Massacará,
Carvalho como aliciador dos índios,
Jeremoabo e Itapicuru. Por estar fora dos
tratando-os “como escravos dos seus
limites da sesmaria de Garcia de Ávila, sua
escravos, mandando prender a estes por
igreja e casa de residência não foram
qualquer coisa e trazê-los à sua presença
afetadas. Cocleo encetou a construção de
amarrados”. As terras reservadas aos
nova igreja, mas enfrentou dificuldades na
índios também eram motivo de
catequese, devido ao apego dos índios ao
descontentamento da parte do
culto de Varakidrã (Uariquidzã). A aldeia
missionário, pois era brejeira, permitindo
recebeu um aporte de índios kiriris. Esse
plantação apenas no verão, “e ainda em tão
ingresso ocorreu entre 1678 e 1679,
somente pouca terra”, havendo o risco de
quando, devido à guerra empreendida
as chuvas fortes, comuns ali, baldarem a
contra os kiriris, muitos índios daquela
cultura agrícola. Por conta disso, os índios,
nação foram levados à Cidade da Bahia
durante as chuvas e no inverno, plantavam
como cativos. Os jesuítas intervieram no
no sítio Bendós, a mais de cinco léguas do
sentido de remeter os prisioneiros para
núcleo da aldeia. O apóstolo via nesses
Canabrava, a fim de serem doutrinados
fatores o grande obstáculo à catequese
(LEITE, Op. Cit.: 289-290).
junto aos kiriri de Natuba (ANDRADE
apud LEITE, Op. Cit.: 287-288). Também se assinala o aldeamento
jesuítico da Ascensão do Senhor de Saco
Nos sertões, outro núcleo indígena
dos Morcegos, composto por índios de
erigido pelos inacianos foi a Aldeia de
etnia kiriri. A aldeia situava-se onde hoje é
Santa Tereza de Canabrava, também de
o atual distrito de Mirandela, da jurisdição
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7 As missões de Rodelas localizavam-se na região do atual município de mesmo nome, entre os estados de Bahia e Pernambuco.
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8 Posteriormente Vargem será adquirido pelos capuchinhos franceses, como mais adiante veremos (REGNI, 1988a: 210).
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9 Sobre a menção aos moritises associados aos kiriris em Saco dos Morcegos, ver a seguinte referência: Relação do número de
aldeias de índios, que se criaram em vilas, nomes que se lhes deram na sua criação, com a notícia de suas situações: Bahia, 24 de
abril de 1759. Manuscrito do Arquivo Público do Estado da Bahia - APEBA Seção Colonial/ Dossiê Índios, maço 603
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região das Jacobinas, conforme se viu. O índios tupiniquins e, desde o início, muitas
padre jesuíta Antônio de Oliveira – das suas terras eram arrendadas a
intitulado “o apóstolo dos payayás” – particulares, fato que colaborou para o
missionou na região das Jacobinas, surgimento da freguesia de Maraú,
fundando então um aldeamento com esses fundada em 1718, um pouco mais ao sul da
índios por volta do ano de 1675. Com a sede da aldeia. O sítio da aldeia
guerra deflagrada contra os payayás, por encontrava-se no que é hoje o distrito de
ordem do governador Alexandre de Sousa Barcelos do Sul, dentro da jurisdição do
Freire, e devido a oposições dos sesmeiros, município de Camamu. A povoação
Antônio de Oliveira pleiteou a mudança do vizinha, composta por arrendatários das
sítio da aldeia. Enfrentou a oposição de terras da missão, cresceu no sítio que
João Peixoto Viegas, que tinha a pretensão corresponde ao atual município de Maraú,
de remanejar os payayás aldeados para as extrema sul de Camamu.
fronteiras das suas terras, na intenção de Existe a menção ainda ao
criar uma barreira defensiva contra outros Aldeamento de Boipeba, fundado no
grupos de índios hostis. Viegas, Antônio século XVI, na Ilha de Boipeba. Ali havia
Guedes de Brito e outros potentados do uma Residência dos Jesuítas e o
sertão buscavam, junto ao governador crescimento da aldeia, no fim do mesmo
geral Afonso Furtado de Castro do Rio de século, tem a ver com os ataques dos
Mendonça, retirar dos padres da aimorés e com uma política deliberada
Companhia de Jesus a administração dos para evitar que os holandeses fizessem da
índios payayás. Os jesuítas, apesar disso, Ilha de Boipeba um ponto de apoio para a
conseguiram remanejar os índios aldeados conquista definitiva da Bahia. A trégua
em Jacobina para Serinhaém. estabelecida com os aimorés, a
A aldeia de Maraú estava localizada neutralização da ameaça holandesa e o
em terras outrora pertencentes a Mem de florescimento da região de Camamu
Sá, transferidas posteriormente aos concorreram para que a Residência
jesuítas. Intitulava-se Aldeia da Virgem voltasse ao sítio inicial (Camamu),
da Purificação junto a Camamu, mas o convertendo Boipeba em aldeia de visita,
seu sinônimo era mais usual na tendo sido suas terras rapidamente
documentação: Nossa Senhora das tomadas pelos moradores locais e
Candeias. O núcleo era composto por arrendatários. Nomina-se, por sua vez, a
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Aldeia de Rio de Contas, situada próxima sua história vinculada à catequese dos
à foz daquele rio (nos limites do que é hoje capuchinhos italianos, conforme se verá.
o município de Itacaré). Marca-se, além
dos índios, a presença de alguns Capitania de Ilhéus
portugueses foreiros (LEITE, Op. Cit: 199- Na capitania de Ilhéus os jesuítas
215). O mapa de 1758 marca a etnia gren fundaram o aldeamento de Nossa Senhora
para esta aldeia, que, de fato, é intitulada da Escada, mais tarde convertido em Vila
Aldeia dos Grens, vinculada à vila de São Nova de Olivença. Olivença é hoje distrito
Jorge dos Ilhéus e convertida em Vila de Ilhéus. Sua composição étnica,
Nova de Almada no ano de 1758. Esses registrada pelo Mapa de 1758, é de
índios foram reduzidos pelo padre jesuíta tabajaras ou tupiniquins. Todavia, as
Agostinho Mendes, coadjuvado pelo informações sobre a catequese jesuítica na
coronel da vila de Ilhéus, Pascoal de região dão conta da redução de um grupo
Figueiredo. Havia, na mesma região da de índios denominados socós, “que não
aldeia de Almada, outro aldeamento falavam a língua geral”, ou seja, não eram
denominado de Nossa Senhora dos do grupo tupi-guarani.
Remédios. Serafim Leite informa ter sido Após vencer a oposição de um
o aldeamento extinto em 1757. No Mapa de indivíduo denominado Xorte, que passara
1758, não se assinala sua presença; já a a viver entre os socós, negando-se a aceitar
relação de 1861, Nossa Senhora dos o aldeamento, o padre inaciano Gonçalo
Remédios é apontada como aldeia que do Couto reduziu-os próximo a Olivença,
tinha “ainda selvagens10 em suas matas e em 1691. O Aldeamento dos Socós deixa de
câmara igualmente de posse de seus ser mencionado, todavia, a partir de 1702,
terrenos e usufruto”. A Câmara Municipal fato que sugere terem sido os socós
da Vila da Barra do Rio de Contas estava aglutinados à população de Olivença
de posse da quase totalidade dos terrenos (LEITE, Op. Cit: 223-224), embora não
doados outrora aos índios11. Remédios tem haja menção a esta etnia no Mapa de 1758,
tampouco na relação encontrada no Maço
10 Esse é o termo utilizado na documentação oficial para se referir a índios com pouco contato com a sociedade nacional.
11P.e: MELLO, João Tavares de. Carta do Delegado de Polícia da Barra do Rio de Contas, dirigida ao Diretor Geral dos
Índios da Província da Bahia, Casemiro de Sena Madureira (Vila de São José da Barra do Rio de Contas, 27 de maio de
1854). Manuscrito do Arquivo Público do Estado da Bahia - APEBA: Seção Colonial-Provincial, série Agricultura –
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península itálica. A missão de Aricobé tem adquiriu é 1702, um ano depois da retirada
sua fundação assinalada para o ano de dos capuchinhos franceses do território da
1739. A aldeia tem sua localização inicial às América Portuguesa Colonial. Muito
margens do rio São Francisco, sendo provavelmente os franciscanos tenham
posteriormente transferida para a região substituído os barbadinhos bretões nesse
do atual município de Angical-BA. Sua caso. A mesma transferência (dos
extinção data do ano de 1860, quando já capuchinhos aos franciscanos) parece ter
estava na alçada do clero secular. Nossa ocorrido com a aldeia de Aracapá. Aracapá
Senhora das Neves do Saí foi fundada em e Pambu voltam aos capuchinhos, quando
1697, tendo sua extinção em 1863. da fase dos missionários italianos. O
Situava-se em terras intermediárias entre aldeamento de Curral dos Bois situava-se
os atuais municípios de Senhor do Bonfim na região de Rodelas e tem nos anos de
e Campo Formoso. 1702 e 1843, respectivamente, as datas da
Massarandupió, de índios sua fundação e extinção. São Gonçalo de
tupinambás, foi adquirida em fase tardia Salitre, na região do rio Salitre, foi uma
pelos franciscanos: foi administrada pelos aldeia adquirida pela OFM em 1703. Não
carmelitas descalços e, depois, pelos se registra a data em que ela foi devolvida.
padres marianos até 1831. Sua extinção, Bom Jesus da Jacobina foi fundada em
após um conflituoso processo de 1706 e extinta em 1847. Nossa Senhora das
reivindicação de terra entre aldeados, de Grotas de Juazeiro, dos índios tamaquins,
um lado, e rendeiros e herdeiros da Casa surge no mesmo ano de 1706, mas se
da Torre, de outro, ocorreu oficialmente extingue em 1840.
na década de 1860. A aldeia de Nossa O apostolado capuchinho junto aos
Senhora das Brotas de Jeremoabo foi indígenas iniciou-se com os capuchinhos
fundada em 1702, mas foi decretada franceses. O fim da invasão holandesa
rapidamente extinta em 1718. Nossa (1654), além do matrimônio do rei dom
Senhora da Conceição de Pambu foi Afonso VI com dona Maria Francisca de
adquirida em 1702, mas frei Venâncio Sabóia (1666) são eventos que
Willeke não informa das mãos de que impulsionaram esse apostolado. O
ordem os franciscanos a receberam. encerramento do domínio holandês
Pambu sempre foi área de missionamento reabriu os sertões para o trabalho de
capuchinho. A data em que a OFM a conversão católica, enquanto que a
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12Cf. capítulo 01, “Pambu era o nome da ilha fluvial atualmente denominada Assunção, no município pernambucano de Cabrobó. As
outras localidades – Cavalo e Aracapá – situavam-se à montante de Pambu, a quatro léguas de distância, no atual município de Orocó-
PE. Na outra margem, do lado baiano, encontram-se os municípios de Curaçá, Abaré e Macureré.”
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13Mataroa era o título dado ao capitão-mor dos índios daquela região. Pietro Regni utiliza a expressão governador dos índios para o
mataroa. O provimento desse cargo se dava por indivíduos índios, mas o autor informa não haver certeza se mataroa era um cargo
efetivamente ou uma família indígena que exercia comando entre os indígenas da região. O mataroa será também atuante no processo
de redução dos índios orizes-procazes da região de Jeremoabo.
Opará: Etnicidades, Movimentos Sociais e Educação, Paulo Afonso, v. 4, n. 5, p. 81-108 (com apêndice), jan./jun. 2016
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A aldeia era composta por índios clero secular. Sua história vai até o período
aimorés (grens). Com a enfermidade do imperial. Os índios de São Fidélis
padre José, assumiu a direção da aldeia o exerciam a função de canoeiros no
capuchinho Bernardino de Milão (que transporte de cargas, principalmente de
havia se envolvido na contenda com as madeiras, ao longo do curso do rio Una, na
autoridades pernambucanas em Rodelas). direção do florescente porto de Valença.
Os índios gren, com efeito, solicitavam a
administração da ordem capuchinha, o Carmelitas e clero secular
que passou a ocorrer com a assunção do Os carmelitas também são citados
frei Bernardino. Mas, ao longo de alguns em atividades catequéticas no sertão da
anos, a missão foi abandonada e a razão Bahia, formando assim aldeamentos. Os
principal relacionava-se com a carência de carmelitas calçados administraram a
pessoal entre os capuchinhos14. Em 1748, aldeia de Nossa Senhora do Carmo do Rio
frei Félix Maria de Cremona transferiu os Real da Praia, composta por índios kiriris.
índios de Nossa Senhora dos Remédios A missão estava vinculada à freguesia de
para o novo centro missionário fundado na Nossa Senhora da Abadia, na vila de
região do rio Una, cuja denominação era mesmo nome, com invocação Jesus Maria
São Fidélis ou Aldeia de Una do Cairu. José15. Os calçadistas também estavam à
São Fidélis, hoje distrito do frente do aldeamento de Japaratuba,
município de Valença, foi aldeamento localizada dentro dos limites do atual
fundado por frei Anselmo de Andorno em município de mesmo nome. Japaratuba
1745 e reunia índios de matriz tupinambá, era composta por índios boimés e estava
aos quais foi incorporado o contingente de vinculada à freguesia de São Gonçalo, vila
aimorés trazido de Nossa Senhora dos de Abadia, com invocação de Nossa
Remédios. São Fidélis deixaria de ser Senhora do Carmo. A ala reformada dos
governada pelos capuchinhos em 1761, carmelitas (descalços) dirigiu o
quando o decreto do marquês de Pombal aldeamento de Massarandupió, de índios
expulsou do Brasil todos os missionários tupinambás, que tinha como invocação
provenientes dos Estados Pontifícios. O Santo Antônio de Arguim; localizava-se no
aldeamento seguiu sob a administração do setor costeiro do atual município de Entre
14 Por isso, Nossa Senhora dos Remédios não deve ser confundida com o já referido aldeamento dos índios gren administrado pelos
jesuítas na mesma região da foz do Rio de Contas, o qual foi convertido na Vila de Nova Almada.
15 Abadia é hoje distrito vinculado ao município de Jandaíra, na divisa costeira entre Bahia e Sergipe.
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16Ver também, para o caso das três aldeias dos carmelitas, o mapa de 1758. Para a aldeia de Nossa Senhora do Carmo do Rio Real da
Praia, ver o seguinte documento: FREITAS, Francisco Aires de Almeida. Ofício do ouvidor da comarca da Bahia endereçado à Presidência
da Província da Bahia (Bahia, 05 de agosto de 1826). Manuscrito do Arquivo Público do Estado da Bahia (APEBA)/ Seção de arquivos
coloniais e provinciais/ Governo da província- Série Judiciário: correspondências das ouvidorias – MAÇO 2213.
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REFERÊNCIAS
DANTAS, Beatriz G, SAMPAIO, José Augusto e CARVALHO, Maria do Rosário. Os povos indígenas
no Nordeste Brasileiro: um esboço histórico. In: CUNHA, Maria Manuela Carneiro da (org.).
História dos Índios do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras-FAPESP-SMC, 1992. p. 431-
456.
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REGNI, Pietro Vittorino. Os Capuchinhos na Bahia: uma contribuição para a história da Igreja
no Brasil. Vol. 1 (os capuchinhos franceses). Salvador: Editora Pallotti. 1988. (a)
____. Os Capuchinhos na Bahia: uma contribuição para a história da Igreja no Brasil. Vol. 2 (os
capuchinhos italianos). Salvador: Editora Pallotti. 1988. (b)
SANTOS, Sólon Natalício Araújo dos. Conquista e Resistência dos Payayá no Sertão das
Jacobinas: tapuias, tupi, colonos e missionários (1651-1706). Dissertação (mestrado), Programa de
Pós-graduação em História Social, Universidade Federal da Bahia (PPGH-UFBA), 2011.
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Anexo
Extraído da tese de doutorado do autor, cuja referência é a que se segue: REGO, André de Almeida. Terra,
Trabalho e Identidade indígena na Província da Bahia: 1822-1862. Tese de doutorado, Programa de Pós-
graduação em História Social, Universidade Federal da Bahia (PPGH-UFBA), 2014.
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