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Teoria do Estado e
da Constituição
3ª edição
Revista, atualizada e ampliada
~
fORENSE
Rio de Janeiro
íNDICE SISTEMÁTICO
Do Autor. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . XVII
ata da 2" edição. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . XXI
ata da 3" edição. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . XXI
PART I
O E TADO HI TÓRlA
apítulo I
LO LlZ çÃO HI TÓRICA DO E TADO
§ 1°
O stado, realidade histórica
I. O E tad ,e pécie de ociedade política. ... ..... . . ... ... ... . .... .. . ... . .. ... . . ... ... 3
2. O aparecimento hi tórico do Estado. . . . ... ..... . . ... ... ... . .... .. . ... . .. ... . . ... ... 4
3. ociedade p líticas pré-e ta ta i . . . . . . . ... ..... . . ... ... ... . .... .. . ... . .. ... . . ... ... 4
4. Proce o de formação do E tado. . . . . . ... ..... . . ... ... ... . .... .. . ... . .. ... . . ... ... 5
5. araterí tica gerais do tado. . . . . . . . ... ..... . . ... ... ... . .... .. . ... . .. ... . . ... ... 5
6. A in erção territorial do E tado. . . . . . . . ... ..... . . ... ... ... . .... .. . ... . .. ... . . ... ... 6
2°
Tipo hi tórico de E tado
apítulo 11
O DIREITO p' BLI O MODE O E O E T DO DE TIPO E ROPE
1°
Formação
§ 2°
Evolução
PARTE 11
ESTRUTURA DO E TADO
apítulo 1
O E TADO EM GERAL
29. equência................................................................... 47
30. A grande corrente doutrinais acerca da natureza ou es ência do E tado . . . .............. 48
31. A conceções mais significativas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .............. 50
32. Outras elaboraçõe doutrinais.................................................... 54
33. Posição adotada. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..... ......... 56
34. As relações entre Estado e sociedade. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..... ... ... ... 59
35. O elementos ou condições de exi tência do E tado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..... ... ...... 62
36. As vicissitudes do Estado. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..... ......... 64
37. O Estado como pe soa coletiva. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..... ......... 67
apítulo 11
O E TADO COMO COMU IDADE POLÍTICA
apítulo 111
ACIDADA IA
§ l°
A cidadanía ou qualidade de membro do Estado
§ 2°
condição jurídica das pe soa em razão da cidadania
Capítulo IV
O PODER POLÍTICO
§ 1°
Poder e soberania
Capítulo V
O TERRITÓRIO DO E T DO
62. O território, condição de ex i tência do E tado. . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . ... .. . ... . .. ... . . 125
63. O território e o Direito do tado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . ... .. . ... . .. ... . . 127
64. Território, poder e povo ... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . ... .. . ... . .. ... . . 128
65. O direito do Estado obre o eu território. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . . . ... .. . ... . .. ... . . 129
66. Outro direitos territoriai do E tado e outra ituaçõe territoriai 131
67. Referência ao domínio público e ao domínio privado. . . . . . . . . ........................ 133
6 . O E tado e outra coletividade territoriai 134
apítulo VI
FORMA DE E T DO
§ 1°
s formas de Estado em geral
PARTE 1Il
CO TIT IÇ O
TÍTULO I
CO TIT IÇÃO COMO FE ÓME O J RíDI O
apítulo I
E TIDO O CO T1T IÇ- O
10
Con tituição e con titucionalismo
§20
Conceções gerai obre a Constituição
Capítulo )(
FORM çÃO O CO TlT lÇ - O
§ 10
Poder con tituinte e formação da Constituição
§ 2°
Fontes da normas constitucionais
104. A fonte formai de Direito e o Direito constitucional. . . . .. .... . .... .. .... .......... 235
105. O problema do costume em onstituição formal. . . . . . . . . .. .... . .... .. .... .......... 237
106. Vi ão adotada obre o costume con titucional . . . . . . . . . . . .. .... . .... .. .... .......... 239
107. Figura afins do co tume con titucional. . . . . . . . . . . . . . . . .. .... . .... .. .... .......... 244
108. Ajurisprudência como fonte de normas constitucionais. . . . .. .... . .... .. .... .......... 246
Capítulo 111
MODIFICAÇ-O E UBSISTÊ CIADACO STlTUIÇÃO
§ l°
As modificações constitucionais em geral
§ 2°
revisão constitucional e o seu processo
§ 3°
Os limites materiais de revisão constitucional
TÍTULO 11
ORMA CO STlTUCIO AIS
Capítulo I
ESTRUTURA DAS ORMA CO TlTUCIO AI
Capítulo II
I TERPRET ç- O, I TEGRAÇ O E PU ç- O
§ 1°
Interpretação e integração das normas con titucionais
§20
A aplicação da norma constitucionai no tempo
§30
A aplicação da normas constitucionais no espaço
PART IV
ATI IDADE CO TIT CIO AL DO E T DO
apítulo I
F ÇÕE DO E T DO
Capítulo 11
ÓRGÃO DO E TADO
§ 1°
Conceito e elementos
§20
Categorias de órgãos
§ 3°
Vicissitudes dos órgãos
Capítulo [11
TO J RÍDlCO- O TIT CIO
§ 1°
tos jurídico-constitucionais em geral
§20
Atos legislativos
PART V
CO TlT CIO LID DE E G RA TI D TIT I O
Capítulo I
I CO TIT CIO ALID DE EM GERAL
§ 1°
Inconstítucionalidade
§20
Con equências da incon titucionalidade
Capítulo II
G RA TIA EM GERAL
§ 1°
Garantia e fiscalização
§20
As decisões de fiscalização
206. Juízo de incon titucionalidade e deci ões dos tribunais. . . . . . . . . . . . . ... . ... ..... ...... 474
207. As decisõe em fi calização concreta. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . ... ..... ...... 476
20 . A decisão de inconstitucionalidade em fi calização ab trata. . . . . . . . . ... . ... ..... ...... 477
209. atureza da declaração de incon titucionalidade. . . . . . . . . . . . . . . . . . ... . ... ..... ...... 4 O
210. A deci ão de não inconstitucionalidade em fi calização ab trata 4 1
211. A interpretação conforme com a on tituição e a deci õe interpretati a ................ 483
212. A decisões limitativas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ................... 485
213. s deci õe aditiva 4 7
fndice Sistemático _
apítulo 111
FI L1ZAÇ- O D O TIT 10 LID DE EM DIREITO O PRADO
§ lº
O Estado, realidade histórica
eja qual for a e sência do político e, portanto, do E tado, há trê maneira prin-
cipai de encarar a relaçõe entre um e outro conceito. O E tado é político, mas todo o
político é estatal?
Para algun are po ta é po itiva: E tado e ociedade política identificam-se e aque-
le é tomado como fenómeno humano permanente uni er aI. Para outro ,o E tado é uma
e pécie (a mai importante, ma uma entr vária espécie) de sociedade política. Ainda
doutro pri ma, o probl ma não e põe, ou por não e lidar com o conceito de tado' ou
por e reduzir o E tado ao nome convencionalmente dado a qualquer ociedade política.
Preferimo a egunda orientação. A ociedade política ou ociedade de fin ge-
rai apre entam-se em tal ariedade que é cientificamente impre cindí el proceder a di -
tinçõe e ela ificaçõe. ão e justifica confundir as formas primitivas de ociedade
política com a forma de envolvidas e complexas que tardiamente surgem. E o E tado
tem tanto de peculiar que tudo acon elha a eparar o eu tratamento do e tudo de outras
figura, embora afin .
Toda ia, o E tado que conhecemo hoje, comummente definido atravé de trê ele-
mento ou condiçõe de exi tência - povo, território e poder político - é apenas um do
tipo po ívei de E tado: o E tado nacional oberano que, na cido na Europa, se espa-
lhou ucessi amente por todo o mundo.2
Reve te caráter interdi ciplinar (de Sociologia histórica, História política, História
do Direito, Antropologia cultural, Ciência política comparada) a pe qui a re peitante à
origem do Estado.3
As conclusõe principais de sa indagação parecem ser:
3 Cfr., por exemplo, MAURICE HAURIOU, Précis de Droit Constitutionnel, 2~ ed., Paris, 1929, págs. 78 e
segs.; LAWRENCEKRADER,A formoção do Estado, trad., Rio de Janeiro, 1970; ELMAN R. SERVICE,Las ori-
genes dei Estada y de la civilización, trad., Madrid, 1975; MANUEl DE LUCENA,"Ensaio sobre a origem
do Estado", in Análise Social, nº 48, 1976, págs. 917 e segs.; JEAN WILlIAM LAPIERRE,Vivre sans État?
- Essai sur le pouvair po/itique et i'innovation saciale, Paris, 1977; The Early State, obra coletiva edita-
da por HENRI J. M. CLAESSENe PETERSKALNIK, Haia, 1978; BERTRANDBADIE, Culture et Pa/itique, Paris,
1983; GEORGESBALANDIER,Anthropologie Po/itique. 2~ ed., Paris, 1991; L'État au pluriel- Perspectives
de Sociolagie Historique, obra coletiva sob a direção de ALI KAZANCIGIL,Paris, 1995; DARCYRIBEIRO, O
processo civilizatório - etapas da evolução sociocultural, 11~ ed., São Paulo, 1997, máxime págs. 110 e
segs.; MÁRIO LúCIO QUINTÃO SOARES,Teoria do Estado, Belo Horizonte, 2001, págs. 120 e segs.; R. C. VAN
CAENEGEM,An Historicallntroduction to Western Constitutional Law, trad. Uma introdução histórica ao
Direito Constitucional Ocidental, Lisboa, 2009.
4 Cfr., sobre diferentes formas de organização política na Hispânia pré-romana, NUNO ESPINOSAGOMES
DA SILVA,História do Direito Português, 3~ ed., Lisboa, 2000, págs. 53 e segs.
5 Cfr. LAWRENCEKRADER,A formação do Estado, trad., Rio de Janeiro, 1970, págs. 18 e segs. e 54 e segs.
Parte I I O Estado na História
6 Cfr. GEORGESBURDEAU,Traité de Science Palitique, I, 2! ed., Paris, 1966, págs. 476 e segs.; e, doutra ótica,
F. H. HINSLEY,Savereignity, trad. castelhana EI concepta de saberania, Barcelona, 1972, págs. 10 e segs.
7 JEAN-WILlIAN LAPIERRE,ap. cit., págs. 167 e segs. Apresenta nove graus de diferenciação e de complica-
ção na organização política (págs. 95-96).
8 Cfr. a classificação de formas políticas estatais e não estatais de GEORGESBALANDIER, op. cit., págs. 50
e segs.
9 No Direito internacional atual há também entidades pró-estatais (os beligerantes e os movimentos
nacionais e de libertação).
10 Cfr. The Early State, cit., págs. 619 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
11 BURDEAU, op. cit., I, págs. 488 e segs., 11,1967, págs. 145 e segs.
12 Cfr. infra.
13 Cfr., por todos, GIANFRANCO POGGI, The State - Its Nature, Development and Prospects, Cambridge,
1990, págs. 4 e segs.
14 V. MAX WEBER, op. cit., 11,págs. 1.060 e segs., ou J. KENNETH GALBRAITH, Anatomia do Poder, trad., lis-
boa, 1987, págs. 159, 163 e segs.
15 Cfr. ADRIANO MOREIRA, op. cit., pág. 22.
16 Cfr. JOSEPH R. STRAYER, On the Medieval Origins of the Modem State, trad. portuguesa As origens me-
dievais do Estado Moderno, 1985, págs. 11 e segs.
17 Cfr. o quadro de sociologia histórica de DARCY RIBEIRO, op. cit., pág. 61.
Parte I I O Estado na História
§ 2º
Tipos históricos de Estado
21 AlIgemeine Staatslehre, 1900, trad. castelhana Teoria General deI Estado, Buenos Aires, 1954, págs.
215 e segs.
22 Cfr., por exemplo, NICOS POULANTZAS,Poder político e classes saciais, trad., Porto, 1971, 1, págs. 156 e
segs.; ou CARLOSDE CABO MARIN, Teoria historica deI estada y deI derecho constitucianal, 2 vols., Barce-
lona, 1988 e 1993.
23 V., entre tantos, Ono HINIZE, Staat und Verfassung, 1962, e Soziologie und Geschichte, 1964, trad. cas-
telhana Historia de las formas palíticas, Madrid, 1968, págs. 15 e segs.; A. ApPADORAI, The Substance of
Polítics, 1Oª ed., Madrasta, 1965, págs.175 e segs.; MANUEL ANTUNES, "Governo", in Enciclapédia Verbo,
IX, págs. 845 e segs.; ANTÓNIO PEDRORIBEIRO DOSSANTOS,As metamorfoses do Estado, Coimbra, págs.
41 e segs. Noutra obra (Staatsverfassung und Heeresvertassung -1906, trad. italiana Stato e Esercita,
Palermo, 1991), HINTZE adota uma perspetiva diferente, dizendo que toda a Constituição estatal é na
origem uma Constituição da guerra, uma Constituição militar (pág. 10), e que agentes da história mais
importantes do que os conflitos de classes são as guerras entre os povos e que em todos os tempos as
pressões externas influíram de modo determinante sobre as estruturas internas (pág. 13).
Parte I I O Estado na História _
9. O Estado oriental
II- Lugar à parte ocupa apena I rael, firmado na crença monoteí ta, na recu a da
natureza divina do rei e no princípio da ubmi ão da vontade de te à lei ditada por
Deu .27
24 Como sucedeu em certas épocas no Egito. Cfr. JosÉ NUNESCARREIRA,"A legitimidade do poder no Egito
faraónico", in Revista do Centro de História da Universidade de Lisboa, 2000, págs. 19 e segs.; Luís MANUEL
DEARAÚJO,Da teoria à prótica: o exercício do poder real no Egito faraónico, ibidem, págs. 33 e segs.
25 Um império que domine o mundo (mas o mundo conhecido do tempo e do lugar de que se trata). Sobre o
assunto, v. a obra coletiva Le concept d'empire, Paris, 1980, máxime págs. 25 e segs., 49 e segs. e 69 e segs.
26 Cfr., por todos, MANUEL GARCIA PELAVO,Las formas políticas dei Antiguo Oriente, 2~ ed., Caracas, 1993.
27 Cfr. NIVAZIYELTEKIN,La nature juridique des droits de I'homme, Lausana, 1950, pág. 170; RAPHAELORAI,
"~tat de droit et alliance prophétique dans le droit hébra"ique", in Droits - Revue française de théorie
juridique, 15, 1992, págs. 51 e segs.; MARIO OOGLlANI, Introduzione 01 Diritto Costituzionale, Bolonha,
1994, págs. 33 e segs.; 5. E. FINER, The History of Government, 1997, trad. A Historio do Governo, I,
Lisboa, 2003, págs. 260 e segs.
28 Recorde-se FUSTELDE COULANGES,La Cité Antique (de que há tradução portuguesa, Lisboa, 1957).
29 Apesar das tentativas havidas e de manifestações de unidade como os jogos olímpicos e quando das
guerras pérsicas. Cfr. GEORGETÉNÉKIDES,"Droit international et communautés fédérales dans la Grece
des Cités", in Recueit des Cours, 1956, 11, págs. 475 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
11- O contributo mai original da Grécia para o pen amento político-con titucional
acha- e no periodo áureo de Atena com a ua d mocracia, a primeira democracia de i-
damente e truturada que e conhece.32
Ma era uma democracia di tinta da atual por er outra a conceção de lib rdad ,
por apena terem direito político os cidadão de certo e trato da população, e apena
o homens, e por ele o exercerem em governo direto.33 Do me mo modo, a i onomia
ape ar de fundamento da ordem ocial, também ó dizia re peito ao cidadão .34
À democracia tal como é concebida pode aplicar- e ( em e quecer outro aspeto)
a célebre di tinção de BE JAMI CO TA T entre liberdade do antigo e liberdade do
modernos,35 próxima da distinção entre liberdade-participação e liberdade-autonomia de
alguma teorização constitucional do século XIX e XX.
30 Cfr. HANAH ARENDT,Was ist Palitik7, Munique, 1993, trad. portuguesa O que é a Política 7, Rio de Janeiro,
1993, págs. 42 e segs.
31 Cfr. CHARLESHOWARD MCILWAIN, Canstitutionalism Ancient and Modem, 1947, trad. castelhana Cons-
titucionalismo antiguo y maderno, Madrid, 1991, págs. 45 e segs.; FRANCISCORODRIGUEZADRADOS,
I/Iustración y politica en la Grecia Clasica, Madrid, 1966; A. R. BURN, As Cidades Rivais da Grécia, trad.,
Lisboa, 1972; ROBERTOBONINI, Polis, in Dizionario di Politica, Turim, 1976, págs. 724 e segs.; JosÉ RIBEI-
RO FERREIRA,A democracia na Grécia antiga, Coimbra, 1990; 5. E. FINER, ap. cit., págs. 341 e segs.; ISA-
BELBANOND, "A ideia de liberdade no mundo antigo: notas para uma reflexão", in Revista da Faculdade
de Direito da Universidade de Coimbra, 1999, págs. 368 e segs.; MARGARIDA lEISTER,"A polis ateniense",
in Revista do Mestrado em Direito da UNIFIEO (Osasco, São Paulo), 2006, págs. 15 e segs.
32 V. ARISTÓTELES,Constituição dos Atenienses (tradução de Delfina Fevereiro leão), Lisboa, 2003.
33 A par da Assembleia dos Quinhentos e dos Arcontes. Sobre os elementos representativos, cfr. J. A. o.
LARSEN,Representative Government in Greek and Roman History, Berkeley e los Angeles, 1966.
34 Assim, por todos, WERNERJAEGER,Alabanza de la ley, trad., Madrid, 1982, pág. 35.
35 "De la liberté des anciens comparée à celle des modernes", 1815 (in Cours de Politique Constitutionnel-
le, IV, Paris, 1820, págs. 238 e segs.).
Parte I I O Estado na História _
Nas coisas que nos parecem mais úteis, interpõe-se a autoridade do corpo social e afeta a vontade dos
indivíduos - Nas relações mais domésticas, intervém ainda a autoridade."
"Assim, entre os antigos, o indivíduo, soberano quase habitualmente nos assuntos públicos, é
escravo nos assuntos privados. Como cidadão, decide da paz e da guerra; como particular, aparece
circunscrito, observado, reprimido em todos os seus movimentos; enquanto porção do corpo coletivo,
ele interroga, destitui, condena, despoja, exila, fere de morte os seus magistrados ou seus superiores;
enquanto submetido ao corpo coletivo, pode, por sua vez, ser privado do seu estado, despojado das
suas dignidades, banido, condenado à morte pela vontade discricionária do conjunto de que faz parte.
Entre os modernos, pelo contrário, o indivíduo, independente na sua vida privada, não é soberano,
mesmo nos Estados mais livres, senão na aparência".36-37
Ou, como dizem Autores mais recentes:
"A política era um assunto de todos os cidadãos, mas, entretanto, todos os assuntos dos cida-
dãos eram assuntos políticos."
"Os cidadãos antigos não usufruem de direitos do homem e do cidadão, nem sequer de liber-
dade no plural ou no singular, mas só de deveres ... Os Atenienses apenas gozam da liberdade que o
Estado lhes deixa; um Estado moderno não cuida da moralidade dos cidadãos, salvo nos casos expres-
samente definidos, enquanto o direito de um cidadão antigo de perscrutar a vida dos seus concida-
dãos era ilimitado, mesmo se não exercido na prática."38
Todavia, ape ar de a poli er algo de es encial superior e insubstituí el, não deixa
a cultura helénica de, no limite, prefigurar um direito de de obediência a lei inju ta
( Tí A).39
111- ntretanto é na Grécia que o poder político é, pela primeira ez, que tionado e
objeto de e peculação intelectual. ela e encontram a matrize do pen amento político
ocidental, tanto filo ófico como científico. ela urgem o primeiro quadro ela ifica-
tório de i tema político.
orno b m abe, à i ão id ali ta d PLATÃO (A República, A Lei) contrapõe- e
a vi ão reali ta de RI T TELE com o u e tudo de dezena de on tituiçõe (Política).
E, da me ma maneira, ão diferente a cla ificaçõe de forma de governo de um e de
outro: em PL TÃO forma reai - timocracia oligarquia democracia, tirania - e ideai
- monarquia e ari tocracia; em ARI T T L , forma pura - monarquia, ari tocracia po-
liteia (democracia) - e degenerada - tirania, oligarquia demagogia.40
O desen 01 imento da noção de pod r político, como poder upremo e uno, cuja
plenitud - imperium, pote ta , maje tas43- pode ou deve er re ervada a uma
única origem e a um único detentor;44
A razão do grande interesse do e tudo do Direito público romano está no longo período
de tempo a ob ervar, com urna rica evolução política (realeza, república, principado) e social
(do E tado patrício ao Estado plebeu), e no incremento que nele tiveram algumas das noções
e da in tituições jurídico-política (como a magi traturas colegiais da época republicana).49
1lI - Finalmente, seria durante o domínio romano da Palestina que urgiria o Cris-
tiani mo e eria para o Império que ele, primeiro, e difundiria; e o Cristianismo viria a
abalar a principai conceçõe sociais romana e, a prazo, o próprio alicerces de idade
durante o principado leva alguns a falar numa síntese entre Cidade-Estado grega e despotismo oriental
(assim, MANUELANTUNES,loc. cit.). Cfr. ainda DANIELVALLERIBEIRO,"O Principado: origem e ideologia", in
Revista Brasileira de Estudos Políticos, nOS69-70, Julho de 1989 - Janeiro de 1990, págs. 135 e segs.
45 Cfr. JEANGAUDEMET,Dominium-Imperium, "Les deux pouvoirs dans la Rome ancienne", in Droits, nQ 22,
1995, págs. 3 e segs.
46 Cfr. MARNOCOE SOUSA,Histórias das Instituições de Direito Romano, Coimbra, 1910, págs. 280 e segs.
47 Segundo HANNAH ARENDT(O que é a política, cit., pág. 119), aquilo a que os Romanos aspiravam não
era tanto um Imperium Romanum, um domínio sobre povos e terras, quanto uma Sacie tas Romana,
um sistema de alianças infinitamente dilatado, no qual povos e terras estivessem ligados a Roma por
vínculos eternos.
48 Sobre a relação entre a pertença a um município e a cidadania romana, V. FERDINANDDEVISSCHER,"La cit-
tadinanza romana", in Annali dei seminario Giuridico dell'Università di Catania, 1948-1949, págs. 1 e segs.
49 Cfr. RUDOLPHVON JEHRING,O Espírito do Direito Romano, trad., Rio de Janeiro, 1943, máxime, I, págs.
154 e segs., e 11,págs. 159 e segs.; ARTUR MONTENEGRO,O Antigo Direito de Roma, I, Coimbra, 1898,
págs. 119e segs., e A conquista do Direito na sociedade romana, Coimbra, 1934, págs. 67 e segs.; PEDRO
MARTINS, História geral do Direito Romano, Peninsular e Português, Coimbra, 1907, págs. 83 e segs.;
CHARLESHOWARDMCILWAIN, op. cit., págs. 64 e segs.; JoÃo DE CASTROMENDES, História do Direito Ro-
mano, policopiado, Lisboa, 1956, págs. 78 e segs.; LÉONHAMON, Institutions politiques romaines, Paris,
1970; MARCELLOCAETANO,História ..., cit., págs. 65 e segs.; ALBERTOBURDESE,Manuale di Diritto Pub-
blico Romano, 2~ ed., Turim, 1982; SEBASTIÃOCRUZ, Direito Romano, I, 4~ ed., Coimbra, 1984; NELSON
SALDANHA,"Direito Público Romano e Revoluções Modernas", in Revista Brasileira de Estudos Políticos,
nQ 59, Julho de 1984, págs. 175 e segs.; AGERSONTABASA,Da Representação Política na Antiguidade
Clássica, Fortaleza, 1987, págs. 39 e segs.; MARIO DOGLlANI, op. cit., págs. 73 e segs.; S. E. FINER,op. cit.,
págs. 414 e segs. e 561 e segs.; ANTONIOGUARINO,"Stato Romano (storia delle strutture costituzionali)",
in Digesto delle discipline Pubblicistiche, XV, Turim, 1999, págs. 81 e segs. E ainda OLIVEIRAMARTINS,
História da República Romana, 1885 (7~ ed., Lisboa, 1987).
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
50 Cfr., por todos, JULIO NAVARROMONZÓ, "Los problemas de la democracia", in Boletim da Faculdade de
Direito da Universidade de Coimbra, ano XIII, 1932-1934, págs. 49 e segs.; FRANZISKUSSTRATMANN,Cristo
e o Estado, trad., Lisboa, 1956; MAURICE BARBIER,La modernité politique, Paris, 2000, págs. 21 e segs.
51 Die politischen Religionen, 1938, trad. francesa Les Religions Politiques, Paris, 1994, pág. 58.
52 Porque outras áreas geográficas e civilizacionais (v.g., a fndia ou o Japão) também tiveram as suas Ida-
des Médias.
53 Cfr. (mas só considerando a relação com a Igreja) STEVEN RUNCIMAN, The Byzantine Teocracy, 1977,
trad. portuguesa A Teocracia Bizantina, Rio de Janeiro, 1978.
54 Sobre as doutrinas e conceções jurídico-políticas da Idade Média, v. aTTO GIERKE,Political Theories of
the Middle Age, trad., Cambridge, 1900 (reimpressão em 1968); ERNSTCASSIRER,The Myth of State,
1946, trad. O mito do Estado, Lisboa, 1961, págs. 105 e segs.; PEDROCALMON, O Estado e o Direito n'Os
Lusíadas, Rio de Janeiro-Lisboa, 1945; FRITZKERN,Derecho dei Rey y Derechos dei Pueblo, trad., Madrid,
Parte I I O Estado na História
o ri tlani mo ou, ante ,a ri tandade en olve toda a ida medie ai e tran põe- e
para o plano político como exigência de limitação do poder - do poder que vem de Deu
(" on e t pote ta ni i a Deo "), que de e er aferido por critério de legitimidade e que
de e er usado para o bem comum (Regnum non e t propter regem, ed rex propter reg-
num). 'ne e elemento de ordem objetiva que re ide a principal garantia das pessoas.
In i tindo na di tinção entre lei divina e lei humana ou entre lei eterna, lei natural
e lei humana e anali ando a contradição entre lei humana e lei natural, a Escolástica
obretudo com . TOMÁ D AO I O (Summa Teologica) viria, mais tarde, a enfrentar o
problema da lei inju ta e a admitir o direito de re i tência em certa condiçõe .55
Por eu lado, a conceçõe germânica colocam o príncipe (e a r laçõe direta e
pe oai dos úbdito com ele), não a idade, como centro da vida política (e daí que,
em contra te com a maior parte da Antiguidade clá ica o enhorio e depoi o novo
E tado europeu enham qua e todo a adotar a forma monárquica). Afirmam também o
dual i mo da po ição príncipe-povo (ou rei-povo), mais tarde rei-reino.
Finalmente, na Baixa Idade Média, algun etores intelectuai viriam a u tentar
que o poder vinha de Deu per popu/um ( ÃOTOMÁ) ou até que o pactum subjectionis
não punha em cau a o poder de raiz do povo (MAR íLlOD PÁDUA).
1955; MANUEL GARCIA-PELAVO,EI Reino de Dios, Arquetipo Politico, Madrid, 1959; BRUNO PARADISI,"For-
mule di sovranità e tradizione biblica", in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra,
1982, págs. 785 e segs.; MARTlM DE ALBUQUERQUE,O pader político no Renascimento Português, sepa-
rata de Estudos Políticos e Sociais, vols. IV e V, e "Política, Moral e Direito na Construção do Conceito
do Estado em Portugal", in Estudos de Cultura Partuguesa, Lisboa, 1983, págs. 135 e segs.; MARIO 00-
GLlANI, op. cit., págs. 111 e segs.; CARSONHOLLOWAV,"Christianity, Magnanimity and Statesmanship", in
The Review of Politics, 1999, págs. 581 e segs.; MARIA DA GLÓRIAGARCIA, Da Justiça Administrativa em
Portugal, Lisboa, 1994, págs. 29 e segs.
55 Sobre a conexão entre a investidura do Rei "por graça de Deus" e o direito de resistência, cfr. Ono
BRUNNER,Neue Wege der Verfassung und Sazialgeschichte, Gotinga, 1968, trad. italiana Per una una
nuova storia costituzionale e sociale, Milão, 1970, pág. 172.
56 V., por todos, MAX WEBER, op. cit., I, págs. 204 e segs., e 11, págs. 810 e segs.
57 Cfr. ROGÉRIOSOARES,Interesse Público, Legalidade e Mérito, Coimbra, 1955, págs. 48-49.
58 QUEIROZ LIMA, Teoria do Estado, 8! ed., Rio de Janeiro, 1957, pág. 81.
59 COSTANTINOMORTATI, Le forme di governo, Pádua, 1973, pág. 9.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Além das grandes abadias monacais, as estruturas urbana autónoma que vão sur-
gindo - comuna ou concelhos, corporações de mesteres, uni ver idade, etc. - cada qual
com a sua função, desenvolvem-se (ou formam- e e de envolvem- e) à margem de qual-
quer e trutura administrativa centralizada. Longe do E tado, é ne e corpo ociai, com
relevância política, que o indivíduo e itua e de envolve a sua vida.60
E, porque não há uma relação geral e imediata entre o poder do Rei e os súbdito ,
o direitos são a estes conferidos não enquanto tai , individualmente con iderado , mas
sim enquanto membro dos grupo em que e integram; ão direito em concreto e em
particular, como expressão da situação de cada pe oa; direito que e apre entam como
privilégio, regalia, imunidade que un têm e outros não, ou direitos in titucionai , em
vez de direito atribuído genericamente a todas as pessoas.61
IV - Naturalmente, o papel da Igreja Católica avulta nesta época, tal como já avulta-
ra aquando da queda do lmpério do Ocidente, e bem que em circun tâncias e em molde
diver o .62
Como e creve ALFREDOVo MARTIN,à Igreja Univer aI, muito centralizada, con-
trapõe-se uma multiplicidade de grupos, de irradiação local, entre o quai o vínculo de
coe ão é muito ténue. Na sociedade medieval, o fator deci ivo de organização tanto polí-
tica quanto cultural vem a ser uma instituição em rigor "não medieval", de ba e jurídica-
política, e e truturada segundo um princípio racional-finali ta, ou seja, uma instituição
estranha, no mais íntimo do seu ser, à tendência feudal e corporativa.63
Era a Igreja, e não o Estado (que não existia ainda, oujá não exi tia), que e contra-
punha à sociedade e com ela mantinha relaçõe ,64 e o menor valor do Estado comparado
com o da Igreja era um dos princípio fundamentai da conceção medieval do mundo,
que nem sequer o poder temporal punha em que tãO.65
"21. Não serão aplicadas multas aos condes e barões senão pelos seus pares e de harmonia com a
gravidade do delito."
11- O E tado moderno de tipo europeu, para lá da caraterí tica globai de qual-
quer E tado, apre enta, porém, ainda caraterí tica muito própria :
Estado nacional: o tado tende a corre ponder a urna nação ou comunidade hi tó-
rica de cultura; o fator d unificação política deixa, as im de er a religião, a raça,
a ocupação bélica ou a izinhança para pas ar a er uma afinidade de índole no a;
Secularização ou laicidade: porque - por influxo do ri tiani mo e ao contrário
do que ucede com o E tado i lâmic067 - o temporal e o e piritual e afirmam
e fera di tinta e a comunidade política já não tem por base a religião, o poder
político não pro egue fin religio o e o acerdote deixam de er agente do
~u exercício;6
Soberania: ou poder upremo e aparentemente ilimitado, dando ao tado capa-
cidade não ó para encer as resi tência interna à ua ação como para afirmar a
ua independência em relação ao outro E tado (poi se trata agora de Estado
que, ao invé do anteriore, tem de coexi tir com outro E tado ).
66 O L'État, c'est mai de Luís XIV significa concentração, não personalização ou individualização do poder.
67 Cfr. BERTRANDBADIE, Les Deux États-Pouvoir et Société en Occident et en Terre d'lslam, Paris, 1986;
DJIBRll SAAB, "La 'Ia'icité', archéologie historique et significations", in Conscience et liberté, nº 38, 2º
semestre de 1989, págs. 7 e segs.; LUCIANOGUERZON, "11 principio di laicità tra società civile e Stato", in li
principio di laicità nello Stato democratico, obra coletiva editada por MARIO TEDESCHI,Catanzaro, 1996.
Para uma visão histórica mais ampla, FERNANDOCATROGA,Entre Deuses e Césares - Secularização, lai-
cidade e religião civil, Coimbra, 2006.
68 Embora até momento tardio subsistam, no plano institucional, regimes de união entre a Igreja e o Es-
tado. Por outro lado, laicidade não é o mesmo que o laicismo (ou regime a-religioso ou antirreligioso)
que, por vezes nos séculos XIX e XX, sucede ao regalismo (ou interferência do Estado na jurisdição
eclesiástica). Cfr. Manual ..., IV, 3! ed., Coimbra, 2000, págs. 405 e segs.
O poder no Ocidente não teve senão esporadicamente tendência para se erigir em teocracia, em con-
sequência da natureza transcendente do poder superior de Deus: THOMAS MOlNAR, Le socialisme sans
visage, trad., Paris, 1976, pág. 67. V. ainda, sobre a secularização política, GUY HERMET,Sociologie de la
Construction Démocratique, Paris, 1986, págs. 73 e segs.; ou ERNST-WOlFGANG BÕCKENFORDE,Le droit,
J'État et la Constitution démocratique, trad., Bruxelas-Paris, 2000, págs. 101 e segs.
Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
III - Como tem sido observado, no mundo antigo, o E tado dividiam- e em dua
categoria : o império - grande, ma deficientemente integrado ; e unidades pequena ,
ma com elevado grau de coe ão - a Cidade -E tado . O E tado europeu combina-
riam, em certa medida, as vantagens dos impérios e da Cidade -E tado. eriam ufi-
cientemente va to ,ma con eguiriam envolver no proce o político uma boa parte dos
eu habitantes e criar um certo sentimento de identidade comum.70
75 BODIN fala ainda em república (em Les six livres de la république). E, entre nós, RODRIGUESLOBO, por
exemplo, ainda afirma: "A pessoa real é a cabeça da República, como escreve Plutarco; e nenhuma
coisa na terra há sobre ela mais que a Lei, a que deve obedecer, e ela fica sendo Lei para todos os infe-
riores" (Corte na Aldeia, edição da Livraria Sá da Costa, 1945, pág. 274).
76 Fala-se também em Estado nessa altura para designar província ou território em situação particular
(por ex., entre nós, os Estados do Brasil ou o Estado da fndia).
Capítulo II
O DIREITO PÚBLICO MODERNO E O ESTADO DE TIPO EUROPEU
§ 1º
Formação
1 Cfr. WERNER NAEFF,Staat und Staatgedanke, trad. castelhana La Idea dei Estado en la Edad Moderna,
Madrid, 1947, pág. 6.
2 Cfr., por todos, ANTONIO PÉREZMARTlN, "La 'Respublica Christiana' Medieval: Pontificado, Império y
Reino", in EI Estado Espanol en su dimensión historica, obra coletiva, Barcelona, 1984, págs. 59 e segs.;
ou Ruy DEALBUQUERQUEe MARTIM DEALBUQUERQUE,op. cit., págs. 453 e segs.
3 É o caso da questão das investiduras (1.024-1.112).
4 Cfr. HINTZE, Historia ..., cit., págs. 143 e 146, ou VEZIO CRISAFULLI,Lezioni di Diritto Costituzionale, 2l ed.,
I, Milão, 1970, pág. 55 (desde Carlos Magno o Império era uma abstração, não uma realidade).
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Desde os século XIII-XIV ocorre a cri e do i tema, até por reflexo da cri e geral
da mentalidade e da vida medievais (a Cruzadas e o rompimento das barreiras do Medi-
terrâneo, melhore comunicaçõe interna e alargamento da área de segurança, novas
tendência literária e artí tica que hão-de conduzir ao Rena cimento, a cidades e as
manife tações de e pírito burguês e de economia mercantil e capitalista).
Papel importantíssimo têm então dois eventos: o despontar da naçõe europeia e a
receção do Direito romano. As nações, comunidade de laço novo e e peciai a ente
em afinidades de e pírito e de interes es e num sentimento comum,5 transformam a geo-
grafia da Europa.6 O Direito romano, e tudado e divulgado pelo legi ta preparado nas
Universidades, irá pôr em causa as conceções jurídico-política de origem germânica.
A naçõe vão- e formando durante éculo . O primeiro sinal da tomada de consci-
ência de uma comunidade de si mesma é dar- e um nome, eparando o que a ela perten-
cem dos que lhe ão estranhos ou estrangeiro . O nome do paí e ão agora nome de
povos, e não de terras. E outro elementos acrescem ou se acentuam: a língua, a procura
de origem comum, a idêntica vivência da religião, os santos e os heróis, o hábito de viver
juntos, intere ses comun não puramente locai, a própria ideia de ujeição ao rei. enti-
mento nacional exi te já, em alguns paí e ,no éculo XIV-Xv.7
As sociedades políticas estatais, que vão surgir em con equência da cau a gerai
apontada, ficarão, pois, ob a influência da naçõe . A comunidade nacional dará o espaço
e o apoio neces ário para a ação do rei e cada E tado erá talhado à medida de uma nação.
Ou ainda, egundo um autor, a nação é a ideologia do E tado burocrático centralizado.8
O rena cimento do Direito romano, a partir de fin do século XI e obretudo do
éculo XIII, é um dos mais importante evento da hi tória cultural europeia. Direito
do acro Império, os reges vão também favorecer a ua receção na medida em que e
afirmam no eu reino iguais ao impera/ar e con troem o eu poder à emelhança do
Imperador9 e as categorias jurídicas romanas vão largamente enformar toda a nova
construções política .
5 Ao passo que na Idade Média o sentimento do destino comum é de natureza religiosa ou de pertença
social (donde, a unidade da Europa, por um lado, e o relevo dos estratos sociais, por outro).
6 Cfr. BERNARDGUENNÉ, op. cit., págs. 113 e segs. e 296 e segs.; MARTIM DE ALBUQUERQUE,A consciência
nacional portuguesa, Lisboa, 1974, máxime págs. 49 e segs. e 273 e segs.; The Formation of National
States in Western Europe, obra coletiva, 1975; JOSEPH R. STRAYER,op. cit., pág. 17; PIERRE
Princeton,
FOUGEYROLLAS,La Nation - Essar et déclin des sociétés modernes, Paris, 1987; ERNSTGELLNER,Nations
and Nationalism, 1983, trad. portuguesa Noções e Nacionalismo, Lisboa, 1993; HAGEN SCHULZE,Staat
und Nation in der Europiiischen Geschichte, trad. Estado e Nação na história da Europa, Lisboa, 1997;
MAURICE BARBIER,ap. cit., págs. 138 e segs.; Manual ..., 111,cit., págs. 68 e segs.
GELLNERsustenta, porém, que é o nacionalismo que dá origem à nação, e não o contrário (pág. 89),
e define-o como princípio de unidades culturais homogéneas servindo de base da vida política e da
unidade cultural obrigatória de governantes e governados.
7 Só muito mais tarde, no século XIX, iria surgir, especialmente na Alemanha, a ideia de nação etnocultu-
ralou definida por fatores étnicos. Cfr., por todos, GUY HERMET,Histoire des nations et du nationalisme
en Europe, Paris, 1996, págs. 115 e segs.
8 MARIO ALBERTINI, "L'ldée de Nation", in L'ldée de Nation, obra coletiva, Paris, 1969, pág. 13.
9 NUNO ESPINOSAGOMES DA SILVA,op. cit., 3ª ed., 2000, pág. 202.
Parte I I O Estado na História _
10 O Papa, que em 1250 ainda consegue triunfar do Imperador, cinquenta anos depois já não consegue
triunfar do Rei da França: é o conflito entre Bonifácio VIII e Filipe, o Belo.
11 Sobre este processo e as suas interpretações, v. as sínteses de WERNERNAEFF,op. cit., máxime págs.
8 e 55.; HERMAN HELLER,Staaslehre, trad. portuguesa Teoria do Estado, São Paulo, 1968, págs. 157 e
segs.; MANUEL GARCIAPELAVO,"Hacia el surgimento historico dei Estado moderno", in Idea de la Poli-
tica y otros escritos, Madrid, 1983, págs. 109 e segs.; ROMANO GUARDINI, Das Ende der Neuzeit, 1986,
trad. O fim da Idade Média, Lisboa, 2000, págs. 33 e segs.; OANIEL-LoUISSEILER,op. cit., págs. 79 e
segs. (falando em duas matrizes institucionais, a inglesa e a lotaríngio-germânica); GIANFRANCOPOGGI,
ap. cit., págs. 34 e segs.; MAURIZIO FIORAVANTI,"Stato", in Enciclopedia dei Diritto, XLVIII, págs. 708 e
segs.; ANDRÉ-JEANARNAUD, Pour une pensée juridique européenne, Paris, 1991; JEAN-MARIECONSTANT,
Naissance des États modernes, Paris, 2000; Luís SALGADODEMATOS,O Estado dos Ordens, Lisboa, 2004,
págs. 177 e segs.
12 PAULOMERÊA,O Poder Real e as Cortes, Coimbra, 1923, págs. 8-9.
13 CABRALDE MONCADA, "As ideias políticas depois da reforma: Jean Bodin", in Boletim da Faculdade de
Direito da Universidade de Coimbra, XXIII, 1947, págs. 48-49.
14 MACHADOPAUPÉRIO, O conceito polémico de soberania, 2~ ed., Rio de Janeiro, 1958, pág. 65.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Não é fácil divi ar, com rigor, quando surge o tado, quando e pa a da organiza-
ção política medieval para a nova forma de organização política - até porque a in titui-
çõ e a ida têm uma continuidade que e capa à pura análi e conceitual.'8 O que pode
afirmar- e ' que ele urge, em momento diver o ,na ária parte da uropa, con oante
a ua circun tância e pecífica .
O E tado encontra- e relativamente cedo na Penín ula Ibérica, onde a luta da Re-
conqui ta cri tã favorecem a unidade de comando político no interior do diver o reino
que e vão formando (até e chegar, ao fim do éculo XV, ao duali mo Portugal-E panha)
e onde o rei nunca deixam de e afirmar indep ndente do acro Imp 'rio.
Ainda mai cedo e em molde mai modernizado, aparece na Inglaterra e, d certo
modo, na icília, de ido ao regime burocrático-militar impo to pelo normando (o qu
não terá ido estranho à precoce experiência con titucional ingle a).
15 Embora não se trate ou não se trate ainda de monarquia absoluta e apenas de monarquia real ou legí-
tima, contraposta por BODIN quer à monarquia senhorial, quer à monarquia tirânica: assim, CABRALDE
MONCADA, op. cit.,loc. cit., págs. 50-51 (salientando que BODINé, em muitos aspetos, ao mesmo tempo
o continuador e o primeiro grande adversário de MAQUIAVEL); ROBERTDERATHÉ,"Théorie et pratique
en philosophie politique: la monarchie française selon Jean Bodin et Montesquieu", in Theory ond Poli-
tics - Theorie und Polítik - Festschrift zum 70. Gebtlrstag fiir Carl Joachim Friedrich, obra coletiva, Haia,
1971 (aproximando BODIN e MONTESQUIEUna preocupação de, em épocas diferentes, abrir caminho a
uma monarquia moderada); JosÉ ADELlNO MALTEZ,op. cit., li, págs. 69 e segs.; DIOGO FREITASDO AMA-
RAL,Ciência Política, Lisboa, 1994, 11,págs. 135 e segs.
16 Cfr. HERMANN HELLER,La Savranità el alti scritti sul/a dottrina dei Diritto e dei Stata, 1926-1929, trad.,
Milão, 1987, págs. 70 e segs.; JULlAN H. FRANKLlN,Jean Badin and the Rise af Absalutist Theory, Cam-
bridge, 1973; MARTIM DEALBUQUERQUE,Jean Badin na Peninsula - Ensaia de História das Ideias Políti-
cas e de Direita Público, Paris, 1978 (sobre a adoção do termo em Portugal, v. págs. 169 e segs.); ENNIO
CORTESE;"Sovranità (storia)", in Enciclapedia dei Diritta, XLIII, 1990, págs. 205 e segs.; ERICVOEGELlN,
Estudos de Ideias Políticas - De Erasmo a Nietzsche, trad., Lisboa, 1996, pág. 106.
17 Por isso, MANUEL GARCIAPELAVO(Hocia ..., cit., loc. cit., págs. 119 e segs.), se refere à passagem de rela-
ções intransitivas a relações transitivas.
18 Cfr. BARTOLOMÉLAVERO,"Institución política y Derecho: acerca dei concepto historiografico dei 'Estado
moderno"', in Revista de Estudios Políticos, nº 19, Janeiro-Fevereiro de 1981, págs. 43 e segs.
Parte I I O Estado na História _
§ 2º
Evolução
19 Como a França foi o primeiro país a resolver o problema da criação de um Estado a partir de províncias
virtualmente independentes, o modelo francês acabaria por se impor na Europa (JOSEPH STRAYER, op.
cit., págs. 53 e segs.).
20 A fixação de fronteiras varia também de país para país. Portugal é talvez o país europeu com mais antigas
fronteiras precisas. Mas a Inglaterra até à guerra dos 100 anos teve veleidades de um domínio continen-
tal; os cantões suíços acharam-se, durante muito tempo, em parte dentro e em parte fora do Império;
a Borgonha pertenceu tanto ao sistema feudal alemão como ao francês; a França foi ampliando os seus
limites até ao século XVIII; e os de todos os outros países avançavam ou recuavam consoante as guerras.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
o progre O técnico e o apro eitamento (tanta veze, a degradação) da natur za; a difu-
ão da cultura e a pa agem da cultura de corte e de clau tro à cultura de ma a.
Conh cem- e a condiçõe ocio conómica : a decadência da nobreza da ari to-
cracia rural e a a cen ão da burgue ia até ch gar, no éculo XIX, a praticamente mono-
polizar a ida política; o de en 01 imento do capitali mo ob ária forma económica
e jurídica ;21a re olução indu trial, o aparecimento da cla e operária, o indicali mo e
a amplitude do conflito ociai.
Há doi fin público que, dora ante, e ão propor - o de cultura o de progre o
materia(22- e a ordem e tatal apre enta- e como um projeto racional de humanidade em
olta do próprio de tino terreno.23
o plano exterior avultam o de cobrimento marítimo e a expan ão colonial, por um
lado, e o i t ma de E tados, por outro. Um e outro fatore (nun ca o mai o primeiro, nou-
tros mai o egundo) afetam profundamente a e trutura do E tado europ u . A expan ão
marítima e colonial há de conduzir à planetarização da conceçõ e da forma jurídico-po-
lítica . O i tema de Estados vive num proce o dialético de olidariedade e antagoni mo, de
isolamento e as ociação, de neutralidade e coligação, de luta pela hegemonia e de equilíbrio;24
e o eu modelo acaba por er tran posto, apó a guerra de 1939-1945, para o plano mundial.
ão difer nte a per petivas por que pode er tomada a e olução do moderno E ta-
do europeu, a refletirem a preocupaçõe de e tudo dominante .
Uma primeira per peti a, de natureza cultural, toma o E tado em cada época como
expre ão da ci ilização (europeia) de a época. Atende, por con guinte, obr tudo, à
conceçõe filo óficas, ociai e jurídica que legitimam o poder e p la quai ão a alia-
do o caráter e o móbei de ação do governante . O período que di tingue ão os cor-
21 Sobre as relações entre Estado moderno e capitalismo, v. HINTZE, op. cit., págs. 63 e segs. e 300 e segs.;
ou BERTRANDBADIE e PIERREBIRNBAUM, Sociologie de I'État, Paris, 1992, 2! ed., págs. 12S e segs.
22 EDUARD ROSENTHAL,"A transformação das funções do Estado no último período histórico", in Boletim
da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, ano VIII, 1923, pág. 42.
23 PIERANGELOSCHIERA,op. cit., loc. cit., págs. 1.008-1.009.
24 Cfr. NAEFF,op. cit., págs. 152 e segs. Aponta as seguintes fases da evolução do sistema europeu de Esta-
dos: 1) a época de Carlos V e seus adversários; 2) as coligações católicas e protestantes e a guerra dos
30 anos; 3) a época de luís XIV; 4) o século XVIII após a guerra de sucessão de Espanha; 5) a Revolução
Francesa e Napoleão; 6) a Europa após o Congresso de Viena; 7) a época de Bismarck; 8) o imperialismo
entre 1880 e 1914; 9) a Europa da Sociedade das Nações.
25 Cfr. MASSIMO BALDINI, La Storia delle Utopie, Roma, 1994; ou PAULOFERREIRADA CUNHA, Constituição,
Direito e Utopia, Coimbra, 1996.
Parte I I O Estado na História _
26 Cfr. a obra de JACOBBURCKHARDT,A Civilização da Renascença Italiana (de que há tradução portuguesa,
Lisboa, s.d.), onde o Estado é tomado como "obra de arte".
27 Assim procede NAEFF (op. cit., págs. 23 e segs., 81 e segs. e 129 e segs.), embora a sua observação
praticamente acabe em meados do século XIX e dê ao Estado do Romantismo um cunho meramente
histórico e de reação contra a Revolução Francesa e o racionalismo.
28 Cfr. FULCOLANCHESTER,"Stato (forme di)", in Enciclopedia dei Diritto, XLIII, 1990, págs. 806 e segs.
29 Desta perspetiva poderia, porventura, aproximar-se a da evolução das ideias de autoridade segundo
OLIVEIRAMARTINS (Teoria do Socialismo - Evolução política e econ6mica das sociedades na Europa, na
ed. de 1974, págs. 7 e segs.); 1º) OMNI5 POTE5TA5 A DEO; 2º) OBLlGATlO Ex CON5EN5U; 3º) IL MONDO E
FArro DAGLI UOMINI.
30 HINTZE, Historia ..., cit., págs. 300 e segs.
31 Salvo, porventura, em certos países.
32 Ou em Estado territorial institucional: Ono BRUNNER,op. cit., pág. 204.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
ciedade complexa de unidades sociais e territoriais. Tal como na Idade Média, o direito
da pe oa e tão aí fragmentados e e tratificado .
A principal forma de participação dos estamentos encontra- e na a embleia esta-
mentai (Parlamento, Estado Gerai , Dieta , Corte) com particulare formas de com-
po ição, dividida ou não em mai de uma câmara e com faculdade ora deliberativa,
ora con ultivas.33
Em Portugal, interes am particularmente o éculos XIV e XV (mormente e te que
é também a época áurea das Cortes). Contudo, as Cortes portugue a têm natureza predo-
minantemente consultiva, exceto em circunstância excecionai (como vagatura do trono
ou modificação da "lei fundamentai do reino") e em matéria de impostos.34
33 Sobre o Estado esta mental, v. NAEFF,op. cit., págs. 12 e segs. e 55 e segs.; HINTZE, op. cit., págs. 79 e
segs.; RUI MACHETE,Corporativismo e Direito Corporativo, Lisboa, policopiado, 1964-1965, págs. 97-98,
108 e 109 e segs.; CABRALDE MaNCADA, Filosofia do Direito e do Estado, 11,Coimbra, 1966, págs. 201
e segs.; C. GRIFFITHS,Representative Government in Western Europe in the Sixteenth Century - Com-
mentary and Documents for the Study of Comparative Constitutional History, Oxónia, 1968; BERNARD
GUENÉE,Op. cit., págs. 81 e 225 e segs.; ROBERTVILLERS,"Le déclin des Assemblées d'État en Europe du
XVI au XVIII siecles", in Hommage à Robert Besnier, Paris, 1980, págs. 279 e segs.; PIERANGELOSCHIERA,
"Sociedade de 'estados', de 'ordens' ou corporativa", in Poder e Instituições na Europa do Antigo Regi-
me, obra coletiva, Lisboa, 1984, págs. 123 e segs.; Luís SOUSADA FÁBRICA,"A Representação no Estado
corporativo medieval", in Estado e Direito, 22 semestre de 1993, págs. 69 e segs.
34 Cfr. PAULOMERÊA, op. cit., págs. 13 e segs. e 26 e segs.; ANTÓNIO MANUEL HESPANHA,Curso de História
das Instituições, policopiado, Lisboa, 1978, págs. 410 e segs.; MARCELLOCAETANO,História ..., cit., págs.
470 e segs.; ARMINDO DE SOUSA,As Cortes Medievais Portuguesos, 2 vols., Lisboa, 1990; Ruy DEALBU-
QUERQUEe MARTIM DEALBUQUERQUE,op. cit., págs. 539 e segs.
35 NAEFF,op. cit., págs. 14-15.
36 Cfr., por exemplo, BARBASHOMEM, Judex Perfectus - Funçõo jurisdicional e estatuto judicial em Portu-
gal-1640-1820, Coimbra, 2003, 11,págs. 139 e segs.
Parte I I O Estado na História
III - O critério principal de ação política toma- e a razão de tado, a con eniência,
o b m público, não a ju tiça ou a legalidade, ape ar de a religião cri tã, oficialmente
profe ada nece ariamente contrariar o maquia eli mo.44 enalt c - e o poder pelo
poder, po to ao erviço do E tado ob rano.45
A função hi tórica do E tado ab oluto con i te em recon truir (ou con truir) a uni-
dade do tado e da ociedade, em pa ar de uma situação de di i ão com pri ilégio da
orden (sucessores ou ucedâneo do privilégio feudai) para uma ituação de coe ão
nacional, com relativa igualdade de vínculo ao poder (ainda que na di er idade de di-
reito e devere ).46
obretudo no éculo XVIII, a lei prevalece sobre o costume como fonte do Direito e
e boça- e o movimento de codificação, reforma- e aju tiça, con olida- e a função públi-
ca, criam- e exército nacionai e o E tado intervém em algun etore até aí ignorado
da cultura, da economia e da a i tência ocial.
Incrementa- e, entretanto, o capitali mo, primeiro comercial, depoi indu trial, e
a burgue ia revela- e o etor mai dinâmico da ociedade. O contra te cre c nte entre o
pod r económico da burgue ia e a ua falta de poder polític047 hão-de le á-la depoi a
fazer ou a apoiar a revolução.
deres e Instituições ..., págs. 309 e segs.; JORGEREIS NOVAIS, Contributo poro uma teoria de Estado de
Direito, Coimbra, 1987, págs. 26 e segs.; MARIA DA GLÓRIAGARCIA, op. cit., págs. 150 e segs.
11- m larga medida, a máquina (política e admini trativa) do E tado con titucional
é a me ma do E tado de polícia. E, por outra banda, dir- e-ia que alguma da suas ca-
raterí tica aparentemente corre pondem ao de envolvimento de caraterística vinda de
trá: a on tituiçõe escrita reforçam a in titucionalização jurídica do poder político; a
oberania nacional, una e indivi í el, a ua unidade; o povo como conjunto de cidadãos
iguai em direito de ere a ua imediati idade.
em por i o, meno nítida é a divergAncia no plano da ideia da regra jurídica
po itiva .49 Em ez da tradição o contrato ocial; em vez da oberania do príncipe, a obe-
rania nacional e a lei como expre ão da vontade geral; em vez do exercício do poder por
um ó ou eu delegados, o exercício por muito, eleitos pela coletividade; em vez da razão
do E tado o E tado como executor de norma jurídica' m ez de úbdito cidadão,
atribuição a todo o homen , apena por erem homens de direito con agrado na lei . E
in trurnento técnico-jurídico principai tornam- e dora ante a on tituição, o princípio
da legalidade a declaraçõe de direito, a eparação de podere, a repre entação política.
A atitude e piritual corr pondente a e te novo e tado de coi a é bem de crita por 1<ANT:
"Ninguém me pode constranger a ser feliz à sua maneira (como ele concebe o bem-estar dos ou-
tros homens), mas a cada um é permitido buscar a sua felicidade pela via que lhe parece boa, contanto
que não cause dano à liberdade de os outros aspirarem a um fim semelhante e que pode coexistir com
a liberdade de cada um, segundo uma lei universal possível."
"Um governo que se erigisse sobre o princípio da benevolência para com o povo, à maneira de
um pai relativamente aos seus filhos, isto é, um governo paternal (imperium paternale), onde, por
48 Sobre o movimento político cultural em que se insere, v., por exemplo, BENNO VON WIESE, La Cultura
de la lIustracción, trad. castelhana, Madrid, 1954 (reimpressão de 1979); BERNARDGROETIIUYSIN,Philo-
sophie de la Révolution Française, Paris, 1956; MAURIZIO FIORAVANTI,op. cit., págs. 107 e segs.; GARCIA
DE ENTERRíA,La lengua de los derechos. La formación deI Derecho Publico europeo tras la Revolución
francesa, Madrid, 1994; MARIO DOGLlANI, op. cit., págs. 150 e segs.; VIRIATOSOROMENHOMARQUES,A era
da cidadania, Lisboa, 1996; MARTIN KISCH, "Conceitos centrais de análise histórico-constitucional dos
Estados de transição europeia por volta de 1800", in Themis, n!! 5, 2002, págs. 189 e segs.; HORSTDIPPEL,
História do constitucionalismo modermo - Navas perspetivas, trad., Lisboa, 2007. Como nota VON WIESE:
a radical racionalização da ideia do Estado conduz à revolução (pág. 40). Quanto ao jusracionalismo, cfr.,
por todos, FRANZWIEACKER,História do Direito Privado Moderno, trad., Lisboa, 1980, págs. 279 e segs.
49 Assim como dos mitos: cfr. PAULOFERREIRADA CUNHA, Mito e constitucionalismo, Coimbra, 1990, págs.
32, 161 e segs. e 181 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
conseguinte, os súbditos, como crianças menores que ainda não podem distinguir o que lhes é ver-
dadeiramente útil ou prejudicial, são obrigados a comportar-se de modo passivo, a fim de esperarem
somente do juízo do chefe do Estado a maneira como devem ser felizes e apenas da sua bondade que
ele também o queiram - um tal governo é o maior despotismo que pensar se possa."so
"O iluminismo é a saída do homem da sua menoridade, de que ele próprio é culpado. E meno-
ridade é a incapacidade de se servir do entendimento sem a orientação de outrem. Tal menoridade
é por culpa própria se a sua causa não reside na falta de entendimento, mas na falta de decisão e de
coragem em se servir de si mesmo sem a orientação de outrem."Sl
IIJ - No sentido que assim se recorta, a Constituição traduz algo de diver o e origi-
naI. Ela traz consigo uma nova fundação e uma nova limitação e envolve todo um modo
de ser concebido o poder. Na Con tituição e pIa ma um determinado i tema de valore
da vida pública, do quai é depois indissociável. Um conjunto de princípios filosófico-
jurídico e filo ófico-políticos (embora de in piraçõe algo diver a ) vem-na ju tificar e
vem-na criar.52
O mais significativo texto de ta nova conceção são americano e franceses - a
Declaração de Direito de Virgínia e a Declaração de Independência dos E tados Unido,
amba de 1776, e a Declaração dos Direitos do Homem e do idadão, de 1789, aquela
mai próxima do pensamento cristão, esta de um racional i mo laico.
Lê-se no art. 1° da Declaração de Direitos do E tado de Virgínia: "Todo o homen
ão, por natureza, livre e têm certo direito inato, de que, quando entram no estado
de sociedade, não podem, por nenhuma forma, privar ou de pojar a ua po teridade,
nomeadamente o direito à vida e à liberdade, tal como o meio de adquirir e po uir a
propriedade e procurar obter a felicidade e a segurança."
Na Declaração de Independência dos Estados Unidos afirma- e:" on ideramo de
per e evidentes a verdade seguintes: todos os homen ão criatura iguai , ão dotado
pelo eu Criador de certos direitos inalienáveis e, entre e te ,acham- e a vida, a liberdade
e a bu ca de felicidade; os governos ão e tabelecido entre o homen para a egurar
e te direitos e os seus justos podere derivam do con entimento dos governados; quando
a forma de governo se torna ofen iva de te fin é direito do povo alterá-Ia, ou aboli-Ia e
in tituir novo governo ... "
Por ua vez, na Declaração dos Direito do Homem e do Cidadão (votada pela A -
embleia Nacional france a), proclama-se no art. 1°: "Os homen na cem e ão livre e
iguais em direito; as in tituições políticas só podem fundar- e na utilidade comum."
No art. 2°: "O fim de toda a associação política é a con ervação do direito naturai
e impre critívei do homem. Estes direito ão a liberdade, a propriedade, a egurança e
a re i tência à opres ão."
No art. 6°: "A lei é a expre ão da vontade geral. Todo o cidadão têm o direito de
concorrer, pessoalmente ou através dos seus repre entante , para a lia formação ... "
No art. 16°: "Qualquer sociedade em que não esteja a segurada a garantia do direi-
tos, nem estabelecida a separação dos poderes, não tem Con tituição."
50 "Sobre a expressão corrente: isto pode ser correto na teoria, mas nada vale na prática" (1793), in A Paz
Perpétua e outros Opúsculos, trad. de ARTURMOURÃO,Lisboa, 1988, pág. 75.
51 Que é o iluminismo? (1784), ibidem, pág. 11.
52 Nosso Contributo para uma teoria da inconstitucionalidade, Lisboa, 1968, pág. 30.
Parte I I O Estado na História
IV - uma primeira noção, E tado con titucional ignifica E tado a ente numa
on tituição fundadora e r guladora tanto de toda a ua organização como da relação
com o cidadãos e tendente à limitação do poder.
Governo repre entativo ignifica a forma de governo em que e opera uma dis ociação
entre a titularidade e o exercício do poder - aquela radicada no povo, na nação (no entido
re olucionário) ou na coleti idade, e e te conferido a go ernante eleito ou con iderado
repre entati o da col tividade (de toda a coletividade, e não de e trato ou grupo como
no E tado e tamental). E é uma forma de governo nova em confronto com a monarquia,
com a república ari tocrática e com a democracia direta, em que inexiste tal dissociação.
E tado de Direito é o E tado em que, para garantia do direito dos cidadão , e e -
tab lece juridicamente a di i ão do poder e em que o re peito pela legalidade ( eja a mera
legalidade formal, eja - mai tarde - a conformidade com alore materiai) se ele a a
critério de ação do go ernante .53
] - O tado con titucional, repre entati o ou de Direito urge como E tado liberal
a ente na ideia de liberdade e, em nome dela, empenhado em limitar o poder político
tanto internamente, p la ua di i ão, como externamente, pela redução ao mínimo da
ua funçõe perante a ociedade.55
53 ROBERTVON MOHL, considerado por alguns como o autor que lançou o conceito, dizia que a ideia em
que se fundamentava o Estado de Direito se resumia nisto: o desenvolvimento o mais humano possível
de todas as forças humanas em cada um dos indivíduos (Polizei, 1841, "Concepto de policia y Estado de
Derecho", in Liberalismo aleman en el siglo XIX-1815-1848, coletânea de estudos, trad., Madrid, 1987,
pág. 141). E acrescentava: "Ninguém pode ser sacrificado como um meio ou como uma vítima à ideia
de todo" (pág. 142); "nenhum direito deve ficar sem proteção, porque seja demasiado insignificante
para o Estado" (pág. 143); "Estado de Direito exige proteção jurfdica" (pág. 144).
Cfr., recentemente, sobre o "Rechtsstaat" na história intelectual e constitucional alemã, Figures
de I'ttat de Droit, obra coletiva sob a direção de OUVIER JOUANJAN, Estrasburgo, 2001.
54 La Constitution comme loi fondomentale ..., Turim-Paris, 1966, págs. 9-10.
55 Embora o Estado intervenha diretamente na economia por meio de obras públicas, dos "melhoramen-
tos materiais" (Fontes Pereira de Melo em Portugal).
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
III - Por o mo e ou por imitação, por meio revolucionário ou por cedência régia,
o regime liberai vão- e implantar ao longo da primeira metade do éculo XIX. Ao
me mo tempo, com ba e no "princípio das nacionalidade" (aliá, nem empre tomado
em e pirito romântico liberal), avança- e para a unificação da Itália e da Alemanha e
dá- e a ind pendência da Grécia e do demai pai e balcânico. Também o paí e da
mérica Latina e eparam da E panha e de Portugal.
um primeiro momento, o grande conflito político e ociai opõ m liberai e
con ervadore (ou legitimi ta em algun paí e ,apó a queda da monarquia ab oluta).
um egundo momento, opõem liberai e radicai (democrata, republicano, ociali ta ,
anarqui ta ).58
Por outro lado, o liberali mo ai enfrentar crítica doutrinai pro eniente de á-
rio quadrante : do pen amento r acionário (Jo eph de Mai tre, De Bonald e outro ), do
p n amento católico (do 'Yllabu à Rerum ovarum e à outra ncíclica ociai), do
p n amento ociali ta ( aint- imon, Owen, Fourier, Proudhon, Marx, Engel ).
orno quer que e entendam tai crítica, decisivas devem ter- e, ape ar de tudo, al-
gumas da aqui içõe trazida pelo liberali mo, quer direta e imediatamente, quer indire-
ta ou mediatamente. Diretamente: a abolição da e cravatura, a humanização do Direito e
do proce o penai, a progre i a upre ão de pri ilégio de na cimento, a liberdade de
impren a.59 Indiretamente: a pre crição de princípios que, ainda quando não po to logo
em prática, iriam, pela ua própria lógica, numa e pécie de aUlorregência do Direilo,60
a ervir a todas as elas es, e não apena à classe burgue a que começara por os defender
em proveito próprio (a im, a partir da liberdade de a ociação a conqui ta da liberdade
indicai e a partir do princípio da oberania nacional a do ufrágio universal).
temacionai .67Muito diver a pelo fins (políticos, económicos, técnicos, culturai etc.),
pelo âmbito (mundial e continental ou regional), pelo ace o (relativamente aberto ou
restrito) e pelo podere (da cooperação ou de integração), elas a inalam uma nova fa e
do Direito da Gentes. A Carta das Nações Unida não só e tabelece o princípio da 0-
lução pacífica de conflito internacionai (art. 2°, nO3) e apena admite a legítima defe a
(art. 51°) como se impõe mesmo a E tados não membro (art. 2°, n° 6). urgem também
organizações de integração continental ou regional, como a Comunidades Europeia
(hoje União Europeia) e o MERCO UL.
Ligada à organização da comunidade internacional - porque em ela não ganha efe-
tividade - nasce a proteção internacional do direito do homem, ou eja, a promoção, por
meio jurídico-internacionais, da garantia do direito fundamentai relativamente ao próprio
Estado de que cada um é cidadão. Tem por cau as a tendência para a humanização do Direito
internacional e o alargamento da noção de ujeito de Direito internacional, ma obretudo o
repúdio da opre são feita por regime político de vário inais ideológicos e a consciência
univer ai da dignidade da pessoa humana que e vai formando. E devem er conhecido o
principai in trumento em que e tem traduzido: a Declaração Universal dos Direitos do Ho-
mem, de 1948, "como ideal comum a atingir por todos os povos e toda as naçõe ", o Pacto
Internacionai de Direito Económico, Sociais e Culturais e de Direitos Civi e Político,
de 1966, a Convenção Europeia de alvaguarda do Direito do Homem e da Liberdade
Fundamentais, de 1950, e a Convenção Interamericana do Direito do Homem, de 1969.
67 Cfr. o nosso Curso de Direito Internacional Público, Rio de Janeiro, 2009, págs. 195 e segs., e autores
citados.
68 Cfr., por exemplo, AFONSO ARINOS, "Crise do Direito e Direito da Crise", in Estudos de Direito Consti-
tucional, Rio de Janeiro, 1957, págs. 151 e segs.; JosÉ H. SARAIVA, op. cit., págs. 86 e segs.; FRANCISCO
LUCAS PIRES, O problema da Constituição, Coimbra, 1970, págs. 10 e segs.
Parte I I O Estado na História
o E tado ocial d Direito não é enão uma egunda fa e do E tado con titucional,
r pre entati o ou de Direito. Por dois moti o : 1°) porque, para lá da fundamentaçõ
que e mantêm ou e uperam (ilumini mo, ju racionali mo, liberali mo filo ófico) e do
individual i mo que e afa ta, a liberdade - pública e privada - da p oa continua a er
o valor bá ico da ida coletiva e a limitação do poder político, um objeti o perman nte;
2°) porque continua a er (ou em a er) o po o como unidade e totalidade do cidadão,
confonne proclamara a Re olução France a, o titular do poder político.
Do que e trata é de articular direito, liberdade e garantia (direito cuja função
imediata é a proteção da autonomia da pe oa) com direito ociai (direito cuja função
imediata é o refazer das condições materiai e culturai m que vivem a pe oa); de
articular igualdade jurídica (à partida) com igualdade social (à chegada) e egurança ju-
rídica com egurança ocial; e ainda de e tabelecer a recíproca implicação entr lib rali -
mo político (e não já, ou não já nece ariament, económico) e demo racia, retirando- e
do princípio da oberania nacional todo o eu corolário (com a pa agem do go erno
repre entativo clá ico à democracia repre entati a).
Do que e trata é ainda para tornar efetiva a tutela do direito fundamentai, de
reforçar os mecani mos de garantia da onstituição; e daí a afinnação de um princípio da
con titucionalidade a acre cer ao princípio da legalidade da ati idad admini trativa e a
in tituição de tribunai constitucionais ou de órgão análogo .74
Para já diga- e apena que a on tituiçõ donde arranca e ta linha diretriz ão
a mexicana de 1917 e, obretudo, a alemã de 1919 (dita on tituição de Weimar) e que,
entre a Con tituiçõe vigentes que a seguem, se contam a italiana de 1947, a alemã de
1949, a portugue a de 1976, a e panhola de 197 e abra ileira de 1988.
74 Cfr. Contributo ..., cit., págs. 79 e segs.; ou GUSTAVO ZAGREBELSKY, op. cit., págs. 84 e segs.
75 Cfr., para uma introdução, Manual ..., I, 8! ed., Coimbra, 2009, págs. 184, 185 e segs. e 223 e 224.
Parte I I O Estado na História
76 Cfr., por exemplo, de vários prismas, HANS VAN DEN DOEL, Democracy and Welfare Economics, 1979,
trad. italiana Democrazia e benessere, Bolonha, 1981; A. 1. PORRASNADALES,Introducción a una teoria
dei Estado post-social, Barcelona, 1988; Luc ROUBAN,"Innovation, complexité et crise de l'État moder-
ne", in Revue française de science politique, 1988, págs. 325 e segs.; VASCOPEREIRADA SILVA,Para um
contencioso administrativo dos particulares, Coimbra, 1989, págs. 56 e segs.; CLAUSOFFE, Contradic-
ciones en el Estado de Bienestar, trad., Madrid, 1990; GIANFRANCOPOGGI, op. cit., págs. 173 e segs.; 1.
P. HENRY,La fin du rêve prométhien? - "Le marché contre l'État", in Revue du Droit Public, 1991, págs.
631 e segs.; FRANCISFUKUYAMA,The end of history and the last man, 1992, trad. portuguesa O fim da
história e o último homem, Lisboa, 1992; GIOVANNISARTORI,Democrazia, Cosa e, Milão, 1993; MANUEL
ARAGÓN,"Los problemas dei Estado social", in Sistema, Março de 1994, págs. 23 e segs.; IGNACIOARA
PINILLA, Las transformaciones de las derechos humanos, reimpressão, Madrid, 1994; BOAVENTURADE
SOUSASANTOS,Pela mõo de Alice - O social e o político na pós-modernidade, Porto, 1994, máxime págs.
69 e segs.; ERNSTGELLNER,Conditions of Liberty, 1994, trad. portuguesa Condições da Liberdade, lis-
boa, 1995; ALAIN TOURAINE,Qu'este-ce que la Démocratie, Paris, 1994; The Constitutional Development
on the Eve ofthe Third Millenium, obra coletiva, Friburgo, 1995; ANTONINOSPADARO,"GIi effetti della c.
d. 'globalizzazione"', in Politica dei Diritto, 1998, págs. 441 e segs.; SAMUELP. HUNTINGTON,The crash of
civilizations - Remakting of World Order, 1996, trad. portuguesa O choque das civilizações e a mudança
na ordem mundial, Lisboa, 1999; PAULOOTERO,A democracia totalitária, S. João do Estoril, 2000; ELOY
GARCIA,"EI ultimo triunfo de la libertad: la democracia constitucional ante su momento maquiavélico",
Bogotá, 2000, págs. 41 e segs.; NOEL PARKER,Revolutions and History, trad. portuguesa As Revoluções
e a História, Lisboa, 2001, págs. 267 e segs.; ISABELESTRADACARVALHAIS,Os desafios da cidadonia pós-
nocional, Porto, 2004, págs. 93, 112 e segs. e 187-188.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
11- e ta ituação, o próprio E tado - o E tado moderno de tipo urop u - dir- -ia
e tar ameaçado ou em crise: o pela dificuldade ou pela impo ibilidade de ati fazer maio-
re e mai diversificadas nece idade coletiva, por tendência centrífuga de diver a natu-
reza, por diver o proce o de integração regional ou continental pela globalização.81
77 Cfr. a síntese de MARIA DA GLÓRIA GARCIA, "Sociedade de risco, política e Direito", in Estudos comemo-
rativos dos 10 anos da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, I, obra coletiva, Coimbra,
2008, págs. 111 e segs.
78 BOAVENTURADE SOUSA SANTOS,A crítica da razão indolente - contra o desperdício da experiêncio, I,
Porto, 2000, págs. 165 e 169.
79 Até um Autor como FRANCISFUKUYAMA, que fala numa "história direccional e universal rumo à de-
mocracia liberal", reconhece que, ainda que a maioria das carruagens da caravana da história chegue
eventualmente ao seu destino, não sabemos se os seus ocupantes, ao olharem em redor, não julgarão
inadequadas as novas circunstâncias e "resolverão dar início a uma nova e mais distante viagem" (op.
cit., págs. 324 e 325; v., ainda, págs. 303, 310 e segs. e 320-321).
80 Cfr. sobre esta problemática, de diferentes prismas, JEAN-WILlIAM LAPIERRE,Vivre sons État?, Paris,
1977; o vol. V, nº 2, de 1986, da International Political Science Review (com artigos de KLAUSVON BEYME,
SABINO CASSESEe KARLW. DEUTSCH);SILVERIODA ROCHA E CUNHA, "Estado, consenso, legitimidade e os
paradoxos da modernidade", in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 1987,
págs. 110 e 135 e segs.; JÜRGENHABERMAS,Die Einbestekung des Anderen. Studien zur Politischen Theo-
rie, 1996, trad. L'intégratuion républicaine, Paris, 1998; MIGUEL Avuso TORRES,Despues dei Leviathan?,
Sobre el Estadi y su signo, Madrid, 1998; MANOEL GONÇALVESFERREIRAFILHO, "Especulações sobre o
futuro do Estado", in O Estado do Futuro, obra coletiva, São Paulo, 1998, págs. 102 e segs.; SABINO
CASSESE,La crisi dello Stato, 2ª ed., Roma-Bari, 2002; WLADIMIR BRITO, "Do Estado - Da construção à
desconstrução do conceito de Estado-Nação", in Revista da Histório das Ideias, 2005, págs. 259 e segs.;
ADRIANO MOREIRA, "A reinvenção da governação", in Cultura - Revista de História e Teoria das Ideias,
vol. XVI-XVII, 2007, págs. 35 e segs.
81 Cfr., por exemplo, PEDRODEVEJAGARCIA, Mundialización y Derecho Constitucional: para una palingene-
sia de la realidad constitucional, Madrid, 1998; MARIA ROSARIAFERRARESE,"Le istituzioni dei la globali-
zzazione", in Diritto e Diritti nella società trasnozionale, Bolonha, 2000, máxime págs. 11 e 101 e segs.;
Parte I I O Estado na História
o entanto, não parece que tão cedo ele vá de aparecer e que á emergir um modelo
político alternativo ou que um con titucionali mo global á neutralizar o constituciona-
li mo nacional.82
I o por ária razõe: 1°) P rque a autoridade do E tado continua a er, enão a
única, p lo meno a predominante e a que e aplica diretam nte obre a pe oa' 2°)
porque o tado, enquanto E tado de Direito, continua a re elar- e indi pen á el para
a garantia da liberdade frente ao podere fático (económico, corporati o , locai
etc.); 3°) p rque, ap ar da dinâmica que alcançaram a organizaçõe internacionai e a
União Europeia, a ua deci õe fundamentai a entam na conjugação da ontade do
E tado - membro ; 4°) porque nela até agora não se con eguiu a egurar a participação
política e enfermam de d 'fice d mocrático' 5°) porque, na própria uropa, o E tado na-
cional continua a mo trar urpreendente capacidade de re i tência e, noutro continente,
a ua formação e a ua autoridade e têm re elado condiçõe de de envolvimento contra
ímpeto locali ta e tribalista .
O tado tem, sim, de coexi tir com outras estrutura, acima e abaixo do eu âmbi-
to; tem de e in erir no contexto cada ez mai complexo e concorrencial, numa "rede d
pod re público"; e tem de repen ar a ua funçõe, o eus meios de agir, muita da
ua fórmula jurídico-política.
111- Re ta ublinhar a tran po Iça0, mesmo e ainda precária, de per petiva e ele-
mento de Direito con titucional para o Direito internacional.
om feit, no Direito internacional contemporâneo, marcado pela ub tituição da
conceçõ oluntari ta e duali ta por fatore de in titucionalização e de moni mo na re-
laçõ com a orden interna, não ão pouco o fenómeno de upremacia (ou hi rarquia,
egund certo pri ma) de determinada norma em relação a outra , nomeadamente:
ALBERTOMASSERA,"Oltre lo Stato: Italia ed Europa tra locale e globale", in Rivista Trimestrale di Diritta
Pubblico, 2001, págs. 1 e segs.; ARMANDI MARQUES GUEDES(FILHO), "O funcionamento do Estado em
época de globalização - O transbordo e as cascatas do poder", in Nação e Defesa, Primavera de 2002,
págs. 101 e segs.; MARCO CESA, "Le vecchie novità delia globalizzazione", in Politica deI Diritto, 2002,
págs. 389 e segs.; JEAN-BERTRANDAUBY, "Globalisation et droit public", in Revue européenne de droit
public, 2002, págs. 1.219 e segs.; MICHAEL ZORN, "Glabalization and global governance: frem societal
to political denationalization", in European Review, 2003, págs. 341 e segs.; JAVIERTAJADURATEJADA,
"EI ocaso de Westfalia? Reflecciones en torno a la crisis dei constitucionalismo en el contexto de la
mundialización", in Revista de Estudios Politicos, 2004, págs. 315 e segs.; GOMES CANOTILHO, "Direito
constitucional internacional", in Revista de História das Ideias, vol. 26, 2005, págs. 346 e segs.; STEFA-
NO BATIlNI, "La globalizzazione dei Diritto Pubblico", in Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico, 2006,
págs. 325 e segs.; ANTÓNIO CELSOBAETA, "Globalização e Estrado no siculo XXI", in Revista Brasileira
de Estudos Políticos, n!! 95, Janeiro-Julho de 2007, págs. 185 e segs.; LUIZ ALBERTOG. S. ROCHA,Estado,
Democracia e Globalizaçãa, Rio de Janeiro, 2008.
82 Cfr. GOMES CANOTlLHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7~ ed., Coimbra, 2004, págs.
1.369 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
entre as quai princípio gerai de Dir ito - como o da b a-fé, de pacta unt er-
vanda e da re pon abilidade por ato dano o - e o d igualdade do E tado ,
da solução pacífica do conflito e da não ingerência no a sunto interno (art.
2° da Carta das Nações Unida );
A pre alência da obrigaçõe deri ada da arta obre a obrigaçõe r ultante
de qualquer outro tratado (art. 103° da arta);
O regime do tratado con tituti o de organizaçõe internacionai , no referente
à re erva , à interpretação à duração e à modificaçõe; e, quanto à açõe
Unida, a ujeição à emenda à Carta, aprovada de acordo com a sua regra,
de Estado - membro que a não tenham aprovado (art. 10 ° e 109°);
A integração europeia, com a edição de um número con iderá el de norma pe-
lo órgão comunitário com primazia obre a norma interna (e até, egundo
o Tribunal de lu tiça da omunidade, obre a norma con titucionai do
E tado -membro ). 3
29. Sequência
I - Pelo que e acaba de referir há pouco, não poucos Autore têm po to em causa
o intere e do stado - eja à luz da suas visões teóricas, seja por causa de fenómenos
como a integração upranacional e a globalização, a privatizações, o neocorporativismo e
o regionalismo centrífugo. hega a falar- e em desestatização e em de territorialização.1
orno e creve uma Autora, ferido na ua imagem, o E tado vive o drama de não
aber quai o limite certos e o conteúdo exato da sua razão de er. O Estado tem difi-
culdade em admitir que a sua identidade perdeu a substantividade clara e inviolável do
i tema ve tefaliano ... O Mundo não lhe exige que e renda ou se autodestrua, mas que
saiba negociar a ua pre ença e a ua relação com a comunidade humanas que o adotam
como princípio de organização política.2
Que o E tado não po a a umir hoje a me ma ou todas as funções de que antes
e arrogava, em dúvida. Que ele tenha de e in erir num contexto cada vez mais com-
plexo e concorrencial, que ele apareça, doravante, no âmbito de uma "rede de poderes
público" e que aquilo a que se chama soberania ofra o impacto inten o de re triçõe
e devoluçõe , tudo i to é irrecu áve1. Que as fronteiras estejam cada vez mais abertas
1 Cfr., sobre esta problemática, de diferentes prismas, JEAN-WILlIAM LAPIERRE, Vivre sans État? Paris, 1977,
págs. 323 e segs.; o vol. 7º, nº 2, de 1986, da Internatianal Palitical Science Review (com artigos de KLAUS
VON BEVME, SABINO CAsSESE e KARL W. OEUTSCH); SILVÉRIO DA ROCHA E CUNHA, Estado, cansensa, legitimida-
de e os paradoxos da modernidade, in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 1987,
págs. 110 e 135 e segs.; JÜRGEN HABERMAS, Die Einbestekung des anderen. Studien zur politischen Theo-
rie, 1996, trad. francesa L'intégration républicaine, Paris, 1998 e Apres I'État-Nation, trad., Paris, 1998;
MIGUEL Avuso TORRES, Despues dei Leviathan? Sobre el Estado y su signo, Madrid, 1998; MARIA ROSARIA
FERRARESE,Le istituzioni della globalizzazione, in Diritto e Diritti nella società trasnazionale, Bolonha, 2000,
máxime págs. 11 e 101 e segs.; ALBERTO MASSERA, Oltre lo Stato: /talia ed Europa tra locale e globale, in
Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico, 2001, págs. 1 e segs.; ARMANDO MARQUES GUEDES (FILHO), O funcio-
namento do Estado em época de globalização - O transbordo e as cascatas do poder, in Nação e Defesa,
Primavera de 2002, págs. 101 e segs.; SABINO CAsSESE, La crisi della Stato, 2~ ed., Roma-Bari, 2002; MICHA-
ELZORN, Globalization and global governance: from societal to political denationalization, in European Re-
view, vol. 11, nº 3, Julho de 2003, págs. 341 e segs.; ISABEL ESTRADA CARVALHAIS, Os desafios da cidadania
pós-nacional, Porto, 2004, págs. 93 e 112 e segs.; JAMES PUTZEL, Globalization, liberalization and prospects
for the State, in International Political Science, 2005, págs. 4 e segs.; THEODORE J. LOWI, La globalizzazione,
la guerra e iI declino dello Stato, in Rivista Italiana di Scienza Politica, 2009, págs. 3 e segs.
2 ISABEL ESTRADA CARVALHAIS, op. cit., págs. 117-118.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
também. Ma que tal signifique o e vaimento, a curto ou a médio prazo, do E tado nada
meno certo - repetimo .
Por is o, embora em cri e, importa ainda anali ar a e trutura do E tado. tudá-Ia
com a con ciência de que vivemo , em larga medida, uma época de tran ição, ma em
transformar a pro petiva em referente decisivo. Estudá-Ia em fechar a porta a novo
horizontes, mas em enjeitar o contributos teóricos formulado ao longo da evolução do
E tado moderno de tipo europeu.
Enunciado , logo no início de te livro, o traços fundamentai do E tado conforme
re ultam da experiência, vamo agora procurar de crevê-Ios, enquadrando o E tado em-
pre pela norma jurídica que o regem - antes de mai , pela Constituição.
Por outro lado, é que tão extremamente complexa e controver a aber qual a natu-
reza ou essência do E tado, aber qual a realidade a que corre pondem todo o a petos
mencionados (e, aí, evidentemente, Estado e político não e distinguem). Cabe também
con iderá-Ia; e - porque e afigura er que tão prévia, pelo meno do modo como levar a
cabo aquele exame de critivo - justifica- e, mesmo, começar por ela.
II - Mais para efeitos didático do que científico , grande número de autore re-
conduz o tratamento do Estado ao do eu trê "elemento": povo, território e poder
político. É te e a que não aderimo; quando muito, aceitamo falar em "condiçõe de
existência". ão ob tante, iremos - pelo peso da tradição e por maior facilidade de expo-
sição - dedicar o próximo capítulos ao E tado como comunidade política (ou povo), à
cidadania como qualidade de membro do E tado, ao E tado como poder e ao território do
Estado; ó depois ver aremo a forma de E tado e, por último, a forma de governo.
Não menos do que às ciência juspublicí tica diz re peito à filo ofia o problema da
natureza, da es ência, do er do E tado; e o debate sobre e te ponto anda, de de há muito,
bem próximo do debate acerca da formação ou da justificação do poder (ou acerca da
legitimidade do poder e dos governante ).
As grandes correntes que se deparam na doutrina - jurídica, filo ófica e politológica
- podem umariar- e a partir da eguintes contraposiçõe :
4 V. a exposição e, por vezes, a apreciação crítica das doutrinas em, por exemplo, GEORGJELlINEK,AlIge-
meine Staatslehre, 1900, trad. castelhana Teoria General deI Estada, Buenos Aires, 1954, págs. 102 e
segs.; MARNOCOESOUSA,Lições de Direito Político, Coimbra, 1900, págs. 7 e segs.; J. FREDERICOLARAN-
JO, Princfpio de Direito Polftico e Direito Constitucional Português, Coimbra, 1907, fascículo 11, págs. 49
e segs.; HANS KELSEN,AlIgemeine Staatslehre, trad. castelhana Teoria General deI Estado, Barcelona,
1934, págs. 35 e segs.; HERMANN HELLER,Staatslehre, 1934, trad. portuguesa Teoria do Estado, São
Paulo, 1968, págs. 243 e segs. e 273 e segs.; ANTONIO FALCHI,Stato Collettività, Milão, 1963, págs. 153 e
segs.; CABRALDEMONCADA, Problemas de Filosofia Política, Coimbra, 1963; BALLADOREPALlIERI,Dortrina
dello Stato, trad. portuguesa A Doutrina do Estado, Coimbra, 1969, I, págs. 30 e segs.; JUlIEN FREUND,
L'essence du politique, Paris, 1965, págs. 46 e segs.; GEORGESBURDEAU,Traité de Science Politique, 11,
2~ ed., Paris, 1967, págs. 7 e segs.; RUI MACHETE,Direito das Instituições Públicas, policopiado, Lisboa,
Instituto de Estudos Sociais, 1967-1968, págs. 22 e segs., e As perspetivas científicas modernas sobre o
poder político, in Estudos de Direito Pública e Ciência Política, Lisboa, 1991, págs. 655 e segs.; ROGÉRIO
SOARES,Lições de Direito Constitucional - Tópicos, policopiado, Coimbra, 1971, págs. 44 e segs.; MA-
NUELDELUCENA,Ensaio sobre o tema do Estado, in Anólise Social, n°S47 e 48, 1976, págs. 621 e segs. e
917 e segs.; ARMANDO MARQUESGUEDES,Teoria Geral do Estado, policopiado, Lisboa, 1981, págs. 13 e
segs.; VIRGllIO GIORGIANNI,Analisi deI concerto di Stato e deI processo di democratizzazione deI potere,
Pádua, 1983, págs. 53 e seg.; FREITASDO AMARAL, Estado, in Polis, 11, 1984, págs. 1162 e segs.; GEORGES
BALANDIER,Anthropo/ogie politique, 2~ ed., Paris, 1991, págs. 28 e segs.; MAURICIOGODINHO DELGADO,
Política: introduçõo à conceituação do !enómeno, in Revista Brasileira de Estudos Políticos, 1993, págs.
55 e segs.; REINHOLDZIPPELlIUS,AlIgemeine Staatslehre, 12~ ed., 1994, 3~ ed. portuguesa Teoria Geral
do Estado, Lisboa, 1994, págs. 35 e segs.; MAURICEBARBIER,La modernità politique, Paris, 2000; o vol.
n!! 26, de 2005, da Revista de História das Ideias. Aconselha-se ainda, em geral, a leitura de CABRALDE
MONCADA, Filosofia do Direito e do Estado, I, 2~ ed., Coimbra, 1955.
5 Cfr. ADRIANOMOREIRA, Ciência Política, Lisboa, 1979, ou GOMESCANOTILHO,Tópicos de Ciência Política,
policopiado, Coimbra, 1985.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
e unir com ele, a fim de con er arem em egurança, paz e so ego, a ua ida,
lib rdade e ben .9
R EA, di er amente, ê no pacto ocial a alienação total de cada a ociado, com
todo o eu direito , à comunidade, de sorte que cada um, dando- e a todo , não se dá a
ninguém, a condição é igual para todo e cada um ganha o equivalente daquilo que perde
e mai força para con ervar aquilo que tem.
O ato de a ociação produz um corpo moral e coletivo, que dele recebe a ua uni-
dade, o eu eu comum, a ua ida e a ua ontade, e e chama Estado quando pa ivo,
soberano quand ati o e potên ia quando comparado ao demai . E e ato encerra um
compromi o recíproco do público e do particulare : contratando, por a im dizer, con-
igo próprio, cada indi íduo fica inculado, numa dupla qualidade - como membro do
oberano para com o particulare e como membro do E tado para com O oberano.lo
egundo KA T, apena no contrato originário e pode fundar entre o homen uma
on tituição ci il, por con eguinte inteiramente legítima, e também uma comunidade.
Ma e te contrato (chamado contractu originariu ou pactum o iali ) enquanto
coligação de toda a ontade particulare e privada num povo numa vontade geral
e pública (em i ta de uma legi lação imple ment jurídica) não se de e, de modo al-
gum, pre upor nece ariamente como um/ato (e nem equer é po í el pre upô-Io). E
uma simples ideia da razão a qual tem, no entanto, a ua realidade (prática) indubitá el:
obriga todo o legi lador a formar a uas leis como e ela pude em emanar da ontade
coleti a de um po o inteiro, e a con iderar todo o úbdito, enquanto quer er cidadão,
como ele ti e e a entido pelo eu ufrágio a emelhante vontade.11
11- A ária corrente organici ta o cilam entre a con ideração do Estado como
unidade espiritual e a equiparação a um organi mo natural ou biológico.
primeira tendência (GI RK , de ignadamente) arranca da e cola histórica alemã e
do romanti mo para o quai Direito e E tado não ão enão expre õe do e pírito de um
po o. O tado é um princípio ital, uma totalidade, uma integração ou união de ontade.
De cre er o tado como um organi mo ignifica repre entá-Io imbolicamente
com um corpo i o, que e de en 01 e egundo uma ideia própria.12
outra tendência (PE ER, de ignadamente) liga- e ao positi i mo e ao cienti mo
tão caraterístico de certo pen amento oitocenti ta, e procura, alargar ao domínio do polí-
tico e do jurídico o e quema do cienti ta da natureza. O stado é um er vi o, ujeito
a lei paralela à do re tante ere vivos.
9 An Essay Concerning the True Original Extent, and End of Civil Government, 1690 (consultá mos a tra-
dução portuguesa de João Oliveira de Carvalho, Ensaio sobre a verdadeira arigem, extensão e fim do
governo civil, Londres, 1833, reimpressão de 1999, máxime capítulos I, VIII e IX).
10 Ou Contrat Social (1756-1760), livro I, capítulos VI e VII (seguimos as Oeuvres Completes, Paris, Éditions
du Seuil, 1971, 11,págs. 518 e segs., máxime 522-523).
11 Zum Ewigen Frieden, 1795-1796 trad. portuguesa A Paz Perpétuo e outros Opúsculos, de Artur Morão,
Lisboa, 1988, págs. 82-83.
12 C. F. VON GERBER,Über offentliche Rechte (1852). trad. italiana Oiritto Pubblico, Milão, 1971, pág. 197.
Este autor adere à conceção orgânica, embora a repute insuficiente ou carecida de complemento, pois
apenas fornece a base da construção jurídica do Estado e esta não pode fazer-se senão tomando o
Estado enquanto dotado de uma específica capacidade de querer, de uma personalidade.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
1lI - Para HEGEL, o Estado é a realidade em ato da ideia moral objetiva, o e pírito
como vontade sub tancial revelada, clara para i me ma, que e conhece e se pen a, e
realiza o que sabe e por que abe.
Como realidade em ato da vontade sub tancial, realidade que e ta adquire na con ci-
ência particular de si univer alizada, é o racional em i e para i: e ta unidade substancial
é um fim próprio absoluto, imóvel; nele a liberdade obtém o eu alor upremo e, a im,
este último fim po ui um direito soberano perante os indivíduos que em serem membros
do Estado têm o seu mai ele ado dever. E e o Estado é o e pírito objetivo, então ó
como eu membro é q~e o indivíduo tem objetividade, verdade e moralidade.14
13 MARNOCO E SOUSA, op. cit., pág. 33 (mas afirma que não aceita a escola homológica-orgânica, nem a
axiológico-orgânica).
14 Rechtsphilosophie, trad. portuguesa Princípios de Filosofio do Direito, Lisboa, 1959, §§ 257 e 258, págs.
246-247.
A filosofia de HEGEL pode considerar-se, de uma maneira geral, uma grande tentativa no sentido de
voltar a unir e a identificar o ideal e a realidade, incluída nesta a história. "Todo o racional é real e
tudo o que é reol é racional." O ideal protende a conformar-se segundo o modelo da realidade; e esta,
a realidade, passa a ser interpretada como revelação de um conteúdo ideal (CABRAL DE MONCADA,
Filosofia ..., cit., I, pág. 282). HEGELprofessa um idealismo objetivo, que não olha para as ideias como
se elas se limitassem a provar a inteligência dos homens; procura-as na realidade, isto é, no curso dos
acontecimentos históricos (ERNSTCASSIRER,O Mito do Estado, trad., Lisboa, 1961, págs. 305 e segs.).
Cfr., entre tantos, também SHLONOAVINERI, Hege/'s theory of the modem state, Cambridge, 1972; JEAN-
HVPPOLlTE,Introduction à la philosophie de /'histoire de Hegel, Paris, 1983, máxime págs. 89 e segs. e
105 e segs.; KARL POPPER,The Open-Society and its enemies, 1945, trad. A sociedade aberta e os seus
inimigos, Lisboa, 1993, 11, págs. 33 e segs.
15 FRIEDRICHENGELS,A origem do família, da prapriedade privada e do Estado, trad., Lisboa, 1970, pág. 225.
Cfr. os desenvolvimentos de LENINE, L'État et la Révolution, trad., Paris, Seghers, 1971, págs. 57 e segs.
Parte 11I Estrutura do Estado
VII - Muito ao invé , para a e cola normativista de Viena, o E tado aparece identi-
ficado com o Direito, como ordem jurídica relativamente centralizada.
O E tado con titui uma ordem normativa de comportamento humanos e ó através
de ta forma e toma po ível conhecê-lo no âmbito da Teoria do Direito e do Estado. Os
(frisando que a existência do Estado prova que as contradições de classes são inconciliáveis); de Nlcos
POULANTZAS,Poder política e classes sociais do Estado capitalista, trad., 1971, págs. 33 e segs. (acentuan-
do o papel do Estado como fator de coesão da sobreposição complexa de diversos modos de produção
na mesma formação social historicamente determinada); ou (em resposta às críticas de KELSEN)de MAX
ADLER,La concezione dello Stoto nel marxismo (1922), trad., Bari, 1979, máxime págs. 60 e segs.
Para uma visão panorâmica das correntes marxistas, neomarxistas e pós-marxistas, cfr. CLYDEW. BAR-
ROW,Criticai Theories of the State, Universidade de Wiscousin, 1993.
trê elementos tradicionai do E tado não ão mai do que a vigência e a validade de uma
ordem jurídica: a população corresponde ao domínio pe oal de vigência, o território ao
domínio e pacial e o poder à eficácia dessa ordem jurídica (e não a qualquer força ou
in tância mística escondida por detrá do E tado e do Direito ).19
I - Com CARl SCHMITI, não se visa encontrar uma substância ou uma axiologia; procura-se o
critério, o princípio identificador do político. Ele consiste na distinção - a que reconduz os atos e os
móbeis políticos - entre amigo e inimigo (distinção essa que corresponde, na ordem política, aos cri-
térios relativamente autónomos de diversas outras oposições - o bem e o mal na moral, o bonito e o
feio na estética, etc.).
Inimigo não significa inimicus, mas sim hostis (estrangeiro): é um conjunto de indivíduos agru-
pados, afrontando um conjunto da mesma natureza e empenhado numa luta, pelo menos, virtual,
quer dizer, efetivamente possível. E o Estado aparece então como uma unidade política organizada,
formando um todo a que cabe a divisão amigo-inimigo.20
11- Para RUDOlFSMEND,o Estado é uma associação voluntária real, e tem de ser compreendido
através de um processo de integração (pessoal, funcional e material).
O Estado não é um fenómeno da natureza, mas uma realização cultural, um conjunto de rela-
ções objetivadas no mundo do espírito; como qualquer realidade da vida do espírito necessita de re-
novação e desenvolvimento; e, se a sua dinâmica corresponde a uma permanente restauração como
agrupamento soberano de vontades, ela não é em si senão um sistema de integração.
Falar em Estado equivale a falar num plebiscito que se repete todos os dias.21
111- HERMANNHEllER adota uma perspetiva dinâmica, à luz da qual o género próximo do Estado
vem a ser a organização, a estrutura de efetividade organizada de forma planejada para a unidade de
decisão e de ação, e a diferença específica a sua qualidade de dominação territorial soberana.
A unidade estatal não se identifica com nenhum dos seus elementos. O Estado não é uma ordem
normativa e também não o é o "povo"; não é formado por homens, mas por atividades humanas; e
tampouco pode ser identificado com os órgãos que atualizam a sua unidade de decisão e ação.
A organização estatal é aquele status renovado constantemente pelos seus membros, a que se
juntam organizadores e organizados. E a unidade real do Estado adquire existência somente pelo fato
de dispor de um governo, de modo unitário, sobre as atividades unidas, necessárias à autofirmação do
Estado; assim como o povo, o território e os órgãos do Estado só adquirem plena verdade e realidade
na sua recíproca relação.22
19 V.,especialmente, KELSEN, Teoria GeneraL, cit., págs. 21 e segs. e 123 e segs.,e Teoria Pura do Direito,
2~ ed. portuguesa, Coimbra, 1962, 11, págs. 174 e segs.
20 Der Begriff des Politischen, 1928, trad. francesa La notion du politique, Paris, 1972, máxime págs. 66,
69 e 70. Cfr. as análises de HElMUTHKUHN,Der Staat (Munique, 1967). trad. castelhana EI Estado,
Madrid, 1979, págs. 40S e segs.; a obra coletiva La Politica oltre lo Stoto-Carl Schmitt, Veneza, 1981;
GERMANGóMEZORFANEl,Excepción y normalidad en el pensamiento de CarlSchmitt, Madrid, 1986;
MARIASTElLABARBIERI, 1/Senso dei Politico. Saggio su Carl Schmitt, Milão, 1990.
21 Verfassung und Verfassungsrecht, 1928, trad. castelhana Constitución y Derecho Constitucional, Ma-
drid, 1985, págs. 52 e segs., máxime 61, 63 e 107.
22 Op. cit., págs. 246 e segs., máxime 282-283. Cfr. a interpretação de RENATO TREVES, La dottrina del/o
Stoto di Hermann Hel/er, in Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico, 1957, págs. 50 e segs.
Parte 11I Estrutu ra do Estado
IV - Para SANTIROMANO,são entes políticos os entes de fins gerais, os entes que, embora pro-
pondo-se finalidades que em dado momento se podem precisar e circunscrever, são, apesar disso,
suscetíveis de assumir qualquer outra finalidade sem mudança de natureza.
Todos os entes territoriais são também entes políticos, porque, de regra, a sua esfera de compe-
tência se estende a uma infinita série de interesses que se manifestam dentro do seu território. Todos
os entes territoriais são entes políticos enquanto os seus fins (mesmo se em concreto e em determina-
do momento se restringem aos previstos nos ordenamentos jurídicos que os regulam) se apresentam
sempre suscetíveis de indefinidas mutações, sem que os seus carateres se transformem por isso. O
Estado é sempre um ente político, ainda quando a prossecução dos seus fins gerais (que nunca faltam)
surge coordenada ou subordinada a um fim particular.H
VII- Análise predominantemente filosófica (em que entram elementos vindos de SCHMIIT e de
outros autores) é a de JUlIEN FREUNDao enunciar as caraterísticas que diferenciam o político de outros
fenómenos de ordem coletiva (como o económico ou o religioso).
Para ele, o político como categoria fundamental, constante desenraizável da matriz humana,
é uma essência que tem por pressupostos as relações de comando e obediência, de privado e de
público e de amigo e inimigo; e a dialética dessas três relações traduz-se, respetivamente, em ordem,
23 Principii di Diritto Costituzionale Generale, reimpressão, Milão, 1947, pág. 53. Cfr., igualmente, VEZIO
CRISAFULLI, Lezioni di Diritto Costituzionale, 2! ed., I, Milão, 1970, pág. 56; ou COSTANTINOMORTATI,
Istituzioni di Diritto Publico, 9! ed., Pádua, 1975, I, págs. 19 e segs.
24 Traité..., 11,cit., págs. 156 e segs. e 251 e segs.
25 Problemas..., cit., págs. 27 e segs., máxime 33 e 35.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
opinião e luta. Por outro lado, o fim específico do político é o bem comum e a sua menor especificação
é a força (como obstáculo a outra força).
A política é a atividade social que se propõe assegurar pela força, geralmente fundada no direi-
to, a segurança exterior e a concórdia interior de uma unidade política particular, garantindo a ordem
no meio de lutas que nascem da diversidade e da divergência das opiniões e dos interesses.26
VIII - Como exemplo de visão exclusivamente sociológica, em que se não depara ou se dilui o
conceito de Estado, dê-se conta da de TAlcon PARSONS.
Segundo este autor, a política é um subsistema funcional primário da sociedade, com status
teórico exatamente paralelo à economia. Ela não deve ser identificada com nenhuma estrutura ey
pecífica de coletividade dentro da sociedade, como o governo (assim como a economia não deve ser
concebida como o agregado de empresas de negócios), nem com nenhum tipo concreto de atividade
individual. Analiticamente, a política é entendida como o aspeto de toda a ação relacionada à função
da busca coletiva de bens coletivos.27
26 L'essencedu politique, cit., máxime págs. 5, 44, 45, 84 e segs., 650 e segs. e 75l.
27 O aspecto político da estrutura e do processo social, in Modalidades de Análise Política, obra coletiva
organizada por David Easton, trad., Rio de Janeiro, 1970, págs. 95-96.
28 Direito Constitucional, 6~ ed., Coimbra, 1993, págs. 40 e segs., 45 e segs. e 48-49.
29 Cfr. MARCElLOCAETANO, op. cit., I, págs. 18 e segs.
30 Pois a sociedade política não se reduz a mera federação de sociedades menores.
Parte 11I Estrutura do Estado _
o político é O global;31 é tudo aquilo que assume relevância para toda uma sociedade
ou um conjunto de sociedade, em certo tempo e em certo lugar. E quanto maiore forem
(como ucede na no a época) o condicionamento e a interaçõe de ociedade me-
nore e de intere e particulare - e nunca completamente redutívei ou amalgamávei
- mai e paço haverá para o político.
Político é o que envolve, prende e insere num me mo âmbito uma multiplicidade
de grupo e o que comporta contrapo ição, a cendente e de cendente, entre diferentes
fin gerais e diver os quadro institucionai em que e ses fins podem ser concretizados.32
aturalmente aqui e tornam mai nítido os contornos da convergência e do conflito, da
integração e da exclu ão, da igualização e da hierarquia, do con entimento e do con tran-
gimento, da permanência e da mudança.33
A e ência do político encontra-se obretudo na dialética do grupo humano e do
poder. O grupo empresta enquadramento ao poder, modela o homens que o exercem,
reconhece-lhe legitimidade; o poder político (a que e exige mais do que a qualquer
outro poder) gera um proce o próprio de agir e afirma- e em grau variávei que, no
E tado, chegam à autonomia.34 Mas, porque o poder e tá em relação com fin e pre upõe
pessoa que o partilhem ele é o poder numa comunidade; pre upõe obediência e é obe-
diência tran iformada;35 traduz- e em oberania de ujeição;36 é certa forma de relaçõe
humana, inerente à condiçõe de sub istência do grupo;3? é um univer o de exi tência
ocial;38 daí, um con tante influir e refluir da comunidade e do poder.39
O político po ui uma estrutura duali ta e implica um momento de unidade: estru-
tura duali ta, na medida em que e analisa em comunidade e em poder, em participação
e em ujeição a autoridade, em di tinção entre o membros da Civítas e os que detêm o
governo; momento de unidade, vi to que comunidade e poder não existem por i, impli-
cam-se reciprocamente e apena podem ligar- e atravé de uma organização e de valore
jurídico .40
31 Cfr. GERMAN BIDARTCAMPOS, Teoria dei Estado, Buenos Aires, 1991, pág. 49; HANNAH ARENDT,Was ist
Politik?, 1993, trad. Qu'est-ce que la politique, Paris, 1995, págs. 39, 40 e 43.
32 A unidade política é partitiva - ela não unifica nunca a sociedade humana globalmente, mas só uma
sociedade determinada (JULlENFREUND,ap. cit., pág. 37).
33 O poder é o resultado, em cada sociedade, da necessidade de luta contra a entropia que a ameaça de
desordem (GEORGESBALANDIER,op. cit., pág. 43).
34 Sobre o Estado como associação de domínio institucional com o monopólio do poder legítimo, v. MAX
WEBER, Wirtschaft und Gesellschaft, trad. castelhana Economia y Sociedade, Madrid, 1969, 11,págs.
1.056 e segs.
35 JElLlNEK, op. cit., pág. 319.
36 MAURICEHAURIOU,Précis de Drait Constitutionnel, 2~ ed., Paris, 1929, pág. 89.
37 CARLJ. FRIEDRICH,Le probleme du pouvoir dans la doctrine constitutiannaliste, in Annales de Philoso-
phie Politique - Le Pouvoir, I, Paris, 1956, págs. 35 e 39.
38 NIKKLASLUHMANN, Macht, trad. portuguesa Poder, Brasília, 1985, pág. 75.
39 Cfr. ANTÓNIO TEIXEIRAFERNANDES,Os fenómenos políticos, Porto, 1988, págs. 43 e segs.; AFONSO
O'OLlVEIRAMARTINS,Sabre o conceito de poder, in Estado e Direito, 1989, págs. 47 e segs.; CESARSALDA-
NHASOUZAJÚNIOR, Consenso e Democracia Constitucional, Porto Alegre, 2003, págs. 45 e segs.
40 Assim, MIGUEl GALVÃOTElES, Estado, in Verbo, VII, pág. 1.358, ou VIRGILlO GIORGIANNI, op. cit., págs.
235 e segs.; cfr., numa perspetiva crítica, ALFIO MASTROPAOLO,L'État ou /'ambiguité: hypotheses pour
une recherche, in Revue française de science politique, 1986, págs. 477 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
41 Cfr., já, Ciência Política e Direito Constitucional, policopiado, Lisboa, 1972-1973, I, págs. 136 e segs.
42 Falando aqui em "comunidade", não nos comprometemos forçosamente com a celebérrima dicotomia de
TONNIES"comunidades"-"associações". No entanto, não podemos deixar de atender, pelo menos, a um
dos carateres das "comunidades": o caráter natural e necessário para os indivíduos seus componentes.
43 O Estado moderno é um Estado laico, mas o fenómeno político exibe fortes conexões com o fenómeno
religioso. Como escreve um Autor (ERIC VOEGELIN,Die politischen Religionen, 1938, trad. francesa Les
Religions Politiques, Paris, 1994, págs. 107 e 108), o homem vive na comunidade política com todos os
traços do seu ser, tanto em geral como espiritual e religioso; e a comunidade política aparece sempre
incorporada na relação entre a experiência humana do mundo e a do divino, seja no caso de o domínio
político ocupar um lugar inferior à ordem divina na hierarquia do ser, seja no caso de o domínio político
se achar ele próprio divinizado.
44 Sobre a organização em sentido sociológico, cfr. NIKLAS LUHMANN, op. cit., págs. 81 e segs.
45 De resto, o Direito, o jus, é o que liga os homens.
Parte 11I Estrutura do Estado _
46 Cfr. JOÃo BAPTISTAMACHADO, Lições de Introdução 00 Direito Público, in Obros Dispersas, 11,Braga,
1993, pág. 404: o Estado não parece ser uma realidade com assento exclusivo na esfera do cultural,
mas representa uma realidade de ordem mediadora entre dois mundos - entre o mundo ideal da
cultura (universo cultural) e o mundo da faticidade social empírica, o mundo das necessidades, dos
interesses e das forças que impulsionam a sociedade.
47 Cfr. CASTANHEIRANEVES,A redução político do pensamento metodológica-jurídica, Coimbra, 1993, má-
xime págs. 14-15.
48 Cfr., por todos. LORENZVON STEIN. Geschichte der sozialen Bewegung in Fronkreich von 1789 bis aul
unsere Tag, 1850, trad. castelhana Movimientos sociales y Monarquia, Madrid, 1957, págs. 33 e segs.;
ANTÓNIO COSTALOBO, O Estado e a liberdade de associação, Coimbra, 1864, máxime págs. 59 e segs.;
JosÉ TAVARES,Ciência do Direito Político, Coimbra, 1909, págs. 21 e 22; HELlER. op. cit., págs. 139 e segs.;
ROGÉRIOSOARES,Direito Público e Sociedade Técnica, Coimbra, 196~, págs. 39 e segs.; EGIDIOTOSATO,
op. cit., loc. cit.. págs. 1.809 e segs.; JÜRGENHABERMAS,Mudança ..., cit., pág. 101; SilVIO DEFINA, Ordi-
namenti giuridici e ordinamenti sociali, in Rivista Trimestrole di Diritto Publico, 1969. págs. 126 e segs.;
GERHARDLEIBHOlZ, Problemas lundamentales de la democrocia moderna, trad., Madrid, 1971, págs.
95 e segs.; ERNSTFORSTHOFF, EI Estado de la Sociedade Industrial, trad., Madrid, 1975, págs. 27 e segs.;
NORBERTOBOBBIO, Società civile, in Dizionario di Politica, obra coletiva. Turim, 1976, págs. 952 e segs.;
DINO PASINI, Stato-Governo e Stato-Società, reimpressão, Milão, 1978, págs. 69 e segs.; H. KUHN, op.
cit., págs. 264 e segs.; JACQUESCHEVAlllER, L'association entre public et privé, in Revue du droit public,
1981, págs. 887 e segs.; GIOVANNI SARTORI,A Política, trad., Brasília, 1981, págs. 158 e segs.; KONRAD
HESSE,Escritos de Derecho Constitucional, trad., Madrid, 1983, págs. 12 e segs.; ANTÓNIO MANUEL HES-
PANHA,Para uma teoria da história institucional do Antigo Regime, in Poder e instituição na Europa do
Antigo Regime, Lisboa, 1984, págs. 26 e segs.; JEAN-LoUISQUERMONNE, Les régimes politiques occiden-
taux, Paris, 1986, págs. 187 e segs.; JOÃo BAPTISTAMACHADO, Lições ...• cit., loc. cit., págs. 429 e segs.
e 513 e segs.; BOAVENTURADE SOUSASANTOS,O Estado e o Direito na transição pós-moderna: paro
um novo senso comum sobre o Poder e o Direito, in Revista Crítica de Ciências Sociais, nº 30, Junho
de 1990, págs. 13 e segs.; ERNESTGELlNER, Conditions 01 Liberty, 1994, trad. portuguesa Condições de
liberdade, Lisboa, 1995, págs. 111 e segs.; JOHN KEANE,Civil Society, 1998, trad. A sociedade civil, lis-
boa, 2001; ERNST-WOlFGANGBOCKENFORDE, Le droit, /'État et la Constitution démocratique, trad., Paris,
2000, págs. 176 e segs.; MÁRIO LúCIO QUINTÃOSOARES,Teoria do Estado, Belo Horizonte, 2001, págs. 65
e segs.; MARIA LÚCIAAMARAL, Sociedade e Constituição ou do uso jurídico da noção de sociedade civil,
Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
11- No pensamento grego e romano não e encontra uma noção autónoma de socie-
dade fora da poli ou da Civita . A Cidade Antiga não era con tituída por uma ociedade
civil que devesse er governada como coi a di tinta do E tado.49
Durante a Idade Média e na transição e tamental, o político di per a- e e e tá pre-
nte na ociedade e na ua riquí ima teia de in tituições - as orden religio a , a uni-
ver idade , a obra a i tenciai , a corporaçõe de me teres, a comuna ou o conce-
lho , etc. Ou antes: é na sociedade como expressão integrante de toda a in tituiçõe
(incluindo a instituição real) que re ide o político.
Pelo contrário, com o absolutismo, o Estado identifica- e com o poder, com a obe-
rania, com o Rei, e a ociedade - seja naquilo que vem de longe, eja naquilo que traz de
novo - aparece à margem do político e em projeção obre o poder. Vem a ser apena na
época liberal que a sociedade volta a afinnar- e, e bem que em termo negativos, abran-
gendo tudo quanto e pretende que fique ubtraído à ação do poder. A im como vem a er
com a conceçõe contratuali ta então dominante, primeiro, e, depois, com a pa agem à
democracia que e toma ou e readquire con ciência da face comunitária do stado. , mai
tarde, certos regimes políticos afastam-se tanto da vontade e do intere e do cidadão
que o E tado-poder, no limite, se lhes entremo tra completamento alheio e exterior.50
O E tado liberal tem em vista uma sociedade livre da ge tão ou direção do poder.
O Estado social intervém nela para a transfonnar ou conformar. um ca o ou noutro,
a ociedade carrega- e de intenções política 51 ou, e e preferir, de funções política.
Num caso ou noutro, a sociedade corresponde ao E tado-comunidade, ma não tem de
e lhe a similar, de com ele coincidir ou de ser por ele ab orvida. Já no E tado marxi ta-
leninista não existe sociedade civil.
49 PAUL VEYNE, I Greci hanna canasciuto la democrozia?, in CHRISTIAN MEIR e PAULVEYNE, L'identità dei
cittadino e lo democrazia in Grecia, trad., Bolonha, 1989, pág. 76.
50 O aparelho governativo aparece como alguma coisa que a sociedade civil pode julgar, expulsar, tomar,
reformar, destruir, sem perda da identidade do Estado e da sua própria identidade (ADRIANO MOREIRA,
op. cit., págs. 18-19).
51 Na expressão de ROGÉRIOSOARES,Direito Público ..., cit., pág. 46.
52 A sociedade forma-se na variedade e na ligação das suas partes pela liberdade, enquanto o Estado é
investido do poder externo de coação (COSTALOBO, op. cit., pág. 59).
Parte 11I Estrutura do Estado
S3 Não cabe aqui entrar nas problemáticas fundamentais, mas laterais a este tomo, dos grupos de inte-
resses, do neocorporativismo e do pluralismo. Cfr., entre tantos, Trends toword corporotist intermedic-
tion, obra coletiva editada por Ph. Schmitter e G. Lehmbruch, Londres, 1972; Political Stalility and Nea-
Corporation, obra coletiva editada por lida Scholten, Londres, 1987; e, entre nós, VIEIRA DE ANDRADE,
Grupos de interesses, plurolismo e unidade política, Coimbra, 1977; MARIA LÚCIA AMARAL, O problema
da função política dos grupos de interesse, in O Direito, 1974-1987, págs. 147 e segs.; JoÃo BAPTISTAMA-
CHADO,A hipótese neocorporativa, in Revista de Direito e Estudos Sociais, 1987, págs. 3 e segs.; BARBOSA
RODRIGUES,Grupo de interesses, in Dicionário Jurídico da Administração Pública, v, págs. 35 e segs.
54 Como escreve BOAVENTURADE SOUSASANTOS,Reinventar a democracia, Lisboa, 1998, o contrato social
é a metáfora fundadora da modernidade ocidental.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
as desigualdades ociai só são admissíveis, desde que tragam vantagens para todo e e
liguem a po ições aberta a todo .55
Também a ideia de contrato manifesta-se no procedimento participativo impo-
tos pelas estrutura ociai da época atual, de de a concertação ocial (art. 56°, nO2, alínea
d, da Constituição portuguesa) à participação no planeamento urbaní tico (art. 65°, nO5)
e até à participação de grupos de intere ado direto na feitura das lei (art. 56°, n° 2,
alínea d, ou 77°, nO2). Insuficiente ou enfraquecida a autoridade do E tado, tem ele então
que se abrir ao diálogo com esses grupos. 56
55 A Theory of Justice, 1971 (seguimos a trad. portuguesa Uma teoria da justiça, Brasília, 1981).
56 Sobre este Autor, cfr., por exemplo, Individu et justice saciale - Autaur de John Rawls, obra coletiva,
Paris, 1988; CHANDRAN KUKATHASe PHllIP PETIIT, Rawls: '~ Teory of Justice" and its Critics, 1990, trad.
portuguesa Rowls: "Uma Teoria de Justiça" e os seus críticos, Lisboa, 1995; OTFRIEDHOFFE,lur Vertrags
Theorietischen Begründung Politischer Gerechtigkeit: Hobbes, Kant und Rawls in Vergleich, trad. caste-
lhana Acerca de la fundamentación contractualista de la justicia politica: uma comparación entre Hob-
bes, Kant e Rawls, in Estudias sabre Tearia dei Derecha y atros Ensayas, México, 1992, págs. 7 e segs.
Cfr., por exemplo, NORBERTOBOBBIO, Cantrotto Saciale, Oggi, Nápoles, 1980; BARBOSADE MelO, Intro-
dução às formas de concertação social, in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra,
1983, págs. 65 e segs. e 76 e segs.; MARCelO REBelO DE SOUSA, Discussão pública, cancertação com os
agentes políticos e audição dos agentes económicos e sociais, in A feitura das leis, obra coletiva, 11,
Oeiras, 1986, págs. 23 e segs.; PAULOOTERO,Lições de Introdução ao Estudo do Direito, vol. I, 22 tomo,
Lisboa, 1999, págs. 105 e segs.
57 Além de JElllNEK (op. cit., págs. 130 e segs. e 295 e segs.), cfr., por exemplo, JosÉ TAVARES,op. cit., págs.
65 e 257 e segs.; ROCHASARAIVA,op. cit., 11, págs. 7 e segs. e 26 e segs.; SANTI ROMANO, op. cit., págs.
50-51; QUEIROZ liMA, Teoria do Estado, 8~ ed., Rio de Janeiro, 1957, págs. 120 e segs. (numa visão
positivista); BAlLADORE PAlllERI, op. cit., 11, págs. 67 e segs. (que fala em elementos da ordem jurídica
estatal); MARCElLO CAETANO,op. cit., I, págs. 158 e segs.; TEMISTOClE MARTINES, Diritta Costituzionale,
Milão, 1978, págs. 153 e segs.; ARMANDO MARQUES GUEDES, Ideologias e Sistemas Políticos, Lisboa,
1978, págs. 22, 52 e segs. e 63 e segs.; MARCelO REBelO DE SOUSA,Direito Constitucional, Braga, 1979,
pág. 109 (que distingue entre o conceito de Estado - de que são integrantes o povo, o território e o
poder político - e a estrutura do Estado - que é mais ampla); FRANCOFARDElLA,I fondamenti epistemo-
logici dei concetto di stato, Milão, 1981, págs. 89 e segs. (não se trata de uma combinação estática de
elementos preconstituídos e justapostos, mas de uma perspetiva dinâmica indicativa de um processo
em que povo, território e poder soberano constituem, cada um, em sentido diacrónico, o momento
último de uma sequência, e, em sentido sincrónico, o termo de uma interação); FREITASDO AMARAL,
Estado, in Polis, 11, págs. 1.130 e segs.
Parte 11 I Estrutura do Estado ••
111 - Julgamo de afa tar a ideia d elemento e senciai ou con tituti o do E tado.
O elemento não podem er tomado como parte integrante do E tado, i to que
o: I) uporia reduzir o tado a ele, à ua oma ou à ua aglutinação qua e mecânica
Contra a teoria dos três elementos, V., entre outros, CARRÉ DE MALBERG, Contribution à la Théarie Gé-
nérale de I'État, I, Paris, pág. 8; SMEND, op. cit., págs. 52 e 104; KELSEN, Teoria General..., cit., pág. 124;
GEORGES BURDEAU, op. cit., 11,págs. 77 e segs.; GIUSEPPE CHIARELLI, Popolo, in Novissimo Digesto Italia-
no, XIII,1966, pág. 284; EGIDIO TOSATO, Sugli aspetti fundamentali dello Stato, in Studi in memoria di
Carla Esposita, obra coletiva, 111,Pádua, 1973, págs. 1.787 e segs. e 1.800 e segs.
58 Assim, BURDEAU (que considera a ação do poder - na qual trata do território e da autoridade - e a obra
do grupo - nação e consentimento ao poder); MIGUEL GALVÃO TELES, op. cit., loc. cit., págs. 1.359 e
segs.; VEZIO CRISAFULLI, op. cit., I, pág. 150.
59 JELLlNEK, op. cit., pág. 130.
60 SANTI ROMANO, op. cit., págs. 50-51.
61 FRANCO FARDELLA, op. cit., pág. 155.
62 FREITAS DO AMARAL, op. cit., loc. cit., pág. 1.132.
63 TOMMASO PERASSI, Paese, territorio e signoria nella dottrina dello Stato, in Rivista di Diritto Pubblico,
1912, págs. 146 e segs.
64 RENATO ALESSI, Intorno 0110nozione di ente territoriale, in Scritti in onore di Arturo Carlo lemolo, obra
coletiva, 111,Milão, 1963, págs. 9 e 6.
65 EGIDIO TOSATO, op. cit., loc. cit., pág. 1.802.
66 JosÉ ADELlNO MALTEZ, op. cit., 11,págs. 31 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
67 Para HAURIOU (op. cit., págs. 78 e segs.), os elementos essenciais do Estado são uma nação, um governo
central e a ideia e a empresa de coisa pública.
68 Assim, CABRAL DE MONCADA (Filosofia ..., cit., 11,Coimbra, 1966, págs. 168 e segs.) aponta a ideia de
Estado, a organização jurídica e os fins como os verdadeiros elementos ônticos do Estado; e MARCelO
REBelO DE SOUSA(Estado, in Dicianário Jurídico da Administração Pública, IV, pág. 211) refere-se à per-
sonalidade jurídica.
Contra os fins como elementos do Estado, ARMANDO MARQUES GUEDES,Idealogias ..., cit., págs. 53-54.
Os fins do Estado não constituem um novo elemento, pelo menos no sentido estático, material, de
parte que com as restantes se congrega para formar o todo. Em si mesmo considerados, os fins são
algo de exterior, de transcendente ao Estado; ou então, como as conceções monistas sustentam, algo
de imanente, de consubstanciado no próprio Estado e, por conseguinte, imanente também em cada
um dos elementos que o constituem.
69 Que adotamos desde Ciência Política e Direito Constitucional, cit., I, págs. 128 e segs.
70 Sobre o assunto, cfr., por exemplo, JElllNEK, op. cit., págs. 109 e segs.; JosÉ FREDERICOLARANJa, op.
cit., tomo 22, fascículo 32, livro 11,Coimbra, 1908, págs. 59 e segs.; GIUSEPPEBISCONTINI, L'annessione
e la fusione di Stati ed i loro riflessi sul fenomeno successorio, in Rivista di Diritto Internazionale, 1940,
Parte 11I Estrutura do Estado
págs. 133 e segs. e 321 e segs.; COSTANTINOMORTATI,La Costituzione in Senso Materiale, Milão, 1940,
págs. 203 e segs., e Instituzioni ..., cit., I, págs. 69 e segs.; QUEIROZLIMA, págs. 137 e segs.; BURDEAU,op.
cit., 11,págs. 210 e segs.; ANA BARAHONA,A nacionalidade e as modificações territoriais dos Estados,
Lisboa, 1984, págs. 45 e segs.; IAN BROWNLlE,PrincipIes of Public International Law, 4~ ed., Oxónia,
1990, págs. 131 e segs.; HÉlENE RUIZ FABRI,Génese et disparation de /'État à /'époque contemporaine,
in Annuaire français de droit international, 1992, págs. 153 e segs.; HABIB GHERARI,Quelques observa-
tions sur les États éphemeres, ibidem, 1994, págs. 419 e segs.; ANDRÉ GONÇALVESPEREIRAe FAUSTODE
QUADROS,Manual de Direito Internacional Público, 3~ ed., Coimbra, 1993, págs. 332 e segs.; JEAN-PAUL
MARKUS, La continuité de /'État en droit public intervue, in Revue du drait public, 1999, págs. 1.067
e segs.; NGUYENQuoc DINH, PATRICKDAILLlERe ALAIN PELLET,Droit International Public, 6~ ed., Paris,
1999, págs. 510 e segs.; JosÉ ALBERTODEAZEREDOLOPES,Entre solidão e intervencionismo - Direito de
autodeterminação dos povos e reações de Estados terceiras, Porto, 2003, págs. 311 e segs.; VALÉRIODE
OLIVEIRAMAZZUOLl, Curso de Direito Internacional Público, 3~ ed., São Paulo, 2009, págs. 383 e segs.;
JORGEBACELARGOUVEIA, Manual de Direito Constitucional, 3~ ed., I, Coimbra, 2009, págs. 168 e segs.
11- O Estado é uma criação da vida jurídica; endo um mecanismo de pre ervação
da ordem, ao mesmo tempo é um conjunto de ituaçõe de direito.75 enhuma da ua
vicis itudes vem a er, portanto, indiferente ao Direito, nenhuma decorre fora do âmbito
das regras jurídica, deixa de implicar um ignificado normati o, uma legitimidade ou
uma regularidade.
A própria formação (originária) de um novo E tado não e reduz a puro fato ou a ato
material ou metajurídico. Pelo contrário, até pode re ultar de um proce o, no todo ou em
parte, previ to pelo Direito do Estado a que e tava ujeita a comunidade que se erige em
estatal, Direito e se que chama a intervir ou apena o órgão governa tivos comp tente
para manife tarem o con entimento definitivo do E tado ou também os órgãos que já
tenham ido in tituído eventualmente em tal coletividade.76 Ma , ainda quando tudo se
passe à margem ou contra e e Direito, por declaração (unilateral ou revolucionária) de
independência, nem por isso cessa a juridicidade: a in tituição do Estado, pelo meno ,
opera- e à luz da conceção de Direito natural ou da ideia de Direito dominante na coleti-
vidade ou na vida internacional.77
Ao Direito das Gente cabe, por eu lado, di por obre o ace o à comunidade inter-
nacional de qualquer dos seus membros ou, em certo ca o ,promovê-lo e orientá-lo.78 Ele
e tabelece o requi ito de aquisição dessa qualidade ou oberania e o modo e efeitos
do reconhecimento pelo demai E tado ; ele define o âmbito possível da relaçõe entre
a nova ordem jurídica e tatal e a ordem ou a regra jurídica preexistente, em termo de
uma eventual receção ou novação de ta ;79 ele ocupa- e da ucessão dos Estado quanto
ao direito e obrigaçõe internacionais, provenientes de tratado 80 ou doutra fonte. ão
74 Sobre limites às mutações constitucionais e continuidade do Estado, cfr. VEZIO CRISAFULLI,op. cit., I,
págs. 107-108.
75 QUEIROZ liMA, op. cit., pág. 139.
76 A descolonização francesa e a britânica oferecem numerosos exemplos e tipos de processos de au-
tonomia e de independência regulados pelo Direito do Estado colonial; e mesmo a descolonização
portuguesa veio a ser feita, nas circunstâncias conhecidas, ao abrigo da Lei n2 7/74, de 27 de Julho.
77 Recordem-se a declaração de independência dos Estados Unidos e, mais recentemente, a da Guiné·
Bissau em 1973 (sobre esta, v. ANTÓNIO DUARTESILVA,A natureza da formação do Estado: o caso da
Guiné-Bissau, in Boletim da Faculdade de Direito de Bissau, n2 4, Março de 1997, págs. 161 e segs.).
78 V. os capítulos da Carta das Nações Unidas, sobre "Declaração relativa aos territórios não autónomos"
(arts. 732 e 742) e sobre regime internacional de tutela (arts. 752 e segs.).
79 Cfr. SALVATORE VILLARI, La continuité juridique dans les pays nouveaux, in Scritti in memoria de Antonimo
Giuftre, obra coletiva, 111, Milão, 1967, págs. 993 e segs.
80 Cfr. ANDRÉ GONÇALVESPEREIRA,Da sucessão de Estados quanto aos tratados, Lisboa, 1969.
Parte 11I Estrutura do Estado
faltam ainda E tado hi toricamente con tituído , reconhecidos ou organizados por trata-
dosl ou atra és de um procedimento próprio de uma organização internacional.s2
1- unidad jurídica que o E tado con titui pode exprimir- e com recur o à noção
de pe oa coleti a, di tinta de cada uma da pe oa fi ica que compõem a comunidade
e dos próprio go ernante e u cetível de entrar em relaçõe jurídica com outra enti-
dade , tanto no domínio do Direito interno como no do Direito internacional, tanto ob a
e te do Direito público como ob a do Direito pri ado.
Per onaliza- e o E tado na e trutura que lhe pert nc - na ua e trutura dual de comu-
nidade e de poder (ape ar d ,uma eze, a doutrina e o regime jurídico alientarem mai a
comunidade, a ba e corporacional, e outra eze mai o poder a ba e in titucional).83
E cu ado erá ublinhar - tendo em conta a premi a de que partimo - que, e a
unidade do E tado advém do i tema nonnativo, não é e te o sub trato da per onalidade
do E tado,84 ma tão ó o elemento donde ju tamente procede o fenómeno jurídico de
atribuição da per onalidade.
11- ubjeti ação ou per onificação do E tado ob d ce a uma dupla finalidade: de
racionalização e de acentuação da ub rdinação à nonnajurídica.
Ela propicia, em primeiro lugar, um in trumento técnico ou construtivo muito im-
portante (embora, não o único po í cl) de tinado a dar respo ta a algumas das mais
prem nte nece idade da ida do tado na multiplicidade de ato e contrato que tem
con tantemente de celebrar e de dir ito e obrigaçõe que e lhe inculam.
Implica, em egundo lugar uma mai imediata e nítida afirmação de integração no
mundo jurídico na medida em qu endo ujeito de relaçõe e me mo quando dotado de
prerrogativa ou pri ilégio de autoridade, o tado tira a ua capacidade de quer r e de
agir da norma jurídica.
ão é por aca o que ( em e quecer antecedente diver o ) e ta figura remonta a
meno de duzento ano, formulada de ignadamente por GERB R.8S-86 a conceção pa-
trimonial, o E tado não era ujeito, ma objeto de um direito do monarca, e no E tado
de Polícia procedia- e à di tinção ntre E tado propriamente dito e Fi co. omente com
o início do aprofundamento dogmático do Direito público e com a ideia e o concei-
to do tado de Direito e ai a ançar na linha da per onalidade do E tad08? - a qual
sidade de Lisboa, vol. I, n°S3 e 4, Julho-Dezembro de 1917, págs. 283 e segs.; LEÓN DUGUIT, La doctrine
al/emande d'autolimitation de /'État, in Revue du drait public, 1919, págs. 161 e segs.; FElICE BATTAGlIA,
Estudios de Teoria dei Estado, trad., Bolonha-Madrid, 1966, págs. 71 e segs.; E. TOSATO,op. cit., loc. cit.,
pág. 1.970; ALBERTOMASSERA, Contributo aI/o studio del/e figure giuridiche soggettive nel Diritto Am-
ministrativo, Milão, 1986, págs. 10 e segs.; ALFREDOGALLEGOANABITARTE,Constitución y personalidad
juridica dei Estado, Madrid, 1992, págs. 20 e segs.; REINHOLDZIPPElIUS, op. cit., págs. 119 e segs.
100 Se, acaso, houver ações ou omissões dessas outras pessoas coletivas públicas que envolvam respon-
sabilidade internacional, será o Estado que a assumirá, ainda que, porventura, com direito de regresso
perante elas.
Capítulo II
O ESTADO COMO COMUNIDADE pOLíTICA
1 Cfr., por todos, JELLlNEK,ap. cit., págs. 305-306; MAURICE HAURIOU,op. cit., pág. 87; GEORGESBURDEAU,op.
cit., v, págs. 38-39; COSTANTINOMORTATI,ap. cit., I, págs. 124-125; HELMUT KUHN, op. cit., págs. 145-146.
2 MARIA HELENA ROCHA PEREIRA,Sobre o sentida da palavra povo: uma subida às origens, in O que é o
povo?, obra coletiva (coordenada por José Manuel dos Santos). Lisboa, 2010, págs. 93 e segs.
3 CAMÕES, Os Lusíadas, "Lusitana Gente" (I, 30) ou "Gente Portuguesa" (I, 90).
4 RODRIGUESLOBO, Corte na Aldeia, ed. da Livraria Sá da Costa, Lisboa, 1945, pág. 274.
5 V. FRANCISCOJOSÉVELOZO,Estrutura do Estado, in Scientia luridica, 1981, págs. 177 e segs.
6 Etimologicamente remontando, segundo parece, ao sanscrito purúh (FRANCISCOPUY,Topica Jurídica, San-
tiago de Compostela, 1984, pág. 587). Cfr. o inglês peaple que tanto designa povo ou gente como pessoas.
7 V. PAOLOCOLLlVA,Papalo, in Dizzionario di Politica, obra coletiva, Turim, 1976, págs. 761 e 762.
8 CíCERO(De Re Publica, I, 25): "Populus est non omnis hominis coetus quoque modo congregatus, sed
coetus multitudinis juris consensu et utilitatis camuniane sociatus'~ Cfr. LEOPEPPE,Popala (diritta roma-
na), in Enciclopedia dei Diritta, XXXIV, 1985, págs. 315 e segs.
9 Cfr. GEORGEBOAS, Vox Papuli - Essays in the Histary af an Idea, Baltimore, 1969 (estudo predominante-
mente cultural).
10 A teologia católica refere-se ao povo de Deus ou ao povo cristão para descrever a comunidade dos fiéis.
V., por exemplo, ANSCARVONIER, O povo de Deus, trad., Lisboa, 1960, pág. 16: Igreja, Povo de Deus e
Reino de Deus designam a mesma realidade observada de três angulos diferentes. Cfr. JACQUESMA-
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
RITAIN, Le Paysan de la Garonne, trad. portuguesa O Camponês do Garona, Lisboa, 1967, págs. 229 e
segs.; ou M. ISIDROALVES,Povo de Deus, Corpo de Cristo, in Communio - Revista Internacional Católica
(ed. portuguesa), 1987, págs. 389 e segs.
I - Qualquer E tado urge como realidade nece ária e envol ente, como ambiente
em que cada cidadão ou úbdito t m de e in erir. Ma localiza- e também na hi tória, re-
ulta de atos de ontade, sofre o influxo de fatore muito ariado, na ce e e olui requer
capacidade de adaptação aos tempo e à circun tância .
De te modo cabe di tinguir: o E tado e a formação do tado, o po o como co-
leti idade e tatal e a coleti idade que hi toricamente precede o E tado, o Dir ito con -
titucional do E tado e a norma que regem e ta coleti idade, a condiçõ ociai
económica ubjacente à organização política e as que pro ocam o u aparecim nto m
certo momento.
Entre a coletividade pré-e tatal e o povo ou coletividade e tatal, a diferença não é tanto
de índole cronológica ou ociológica - fa e na ua exi tência ou tran formação d estrutura
ociai , económica e culturai - quanto de índole jurídica - ad trição a um Direito, a uma
organização que não procede do exterior e que torna a fonte objeti a da ua unidade.
Intere a, portanto, ob er ar, e bem que em termo e qu mático , a ituação (ou o
mod lo d ituação) corre pond nte à coleti idade pré-e tatal, ou eja, àquele grupo hu-
mano que, em virtud da in tituição do pod r político, e em a tran formar em po 0.21
11- Como e apre enta tal grupo? O laço que o un m podem er de di er a na-
tureza: étnico e geográfico, linguí tico e culturai , religio o e meramente político.
o tipo uropeu de E tado (em que entroncam qua e todo o tados contemporâneo ),
tend m a mostrar um caráter imultaneamente mai profundo, duradouro e complexo por
tomarem por ba e a exi tência de uma nação.
LAnANzl, Autodeterminaziane dei popoli, in Digesta delle Discipline Pubblicistíche, 4! ed., 11,1987, págs.
4 e segs. E, entre nós, AFONSOQUEIRÓ,Ultramar: direito a independência?, Coimbra, 1974; FAUSTODE
QUADROS,Autodeterminação, in Polis, I, págs. 478 e segs.; CARLOSBLANCODE MORAIS, O direito à au-
todeterminação dos povos - O estatuto jurídico do enclave de Cabinda, 1998, págs. 222 e segs.; JosÉ
ALBERTOAZEREDOLOPES,op. cit., págs. 17 e segs.
24 Porque assim é, porque a humanidade se divide (ou se divide ainda) em Estados, é que a conservação
ou a transformação em Estado, a independência política ou a soberania internacional continuam - ape-
sar de tudo - a ser uma necessidade das coletividades que querem ser senhoras do seu destino.
25 Cfr. HELMUTKUHN, op. cit., págs. 154 e segs.
Parte 11I Estrutura do Estado _
26 Op. cit., v, pág. 43. Como se vê, a contraposição que faz entre cidadão abstrato e cidadão real situa-se
num plano histórico, diferente do de ROUSSEAU: não são já duas faces da mesma pessoa, mas duas
etapas de uma evolução.
27 Cfr. FRIEDRICH MÜLLER, distinguindo o povo com instância de atribuição, povo ativo e povo como desti-
natário de prestações (op. cit., pág. 80).
28 Abrangendo não apenas os titulares dos órgãos governativos, como tais descritos na Constituição, mas
também os titulares de quaisquer órgãos com relevância política e até os agentes políticos.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
idadão não ativo vêm a er o que, por qualqu r cau a, não po uem capacidade
de participação política.
No E tado moderno, todas a pessoas que à comunidade política e tejam ligada de
modo duradouro e efeti o ão cidadão e todo o cidadão, enquanto tai , têm direito
perante o E tado;32 ma a interferência, atual e não puramente irtual, de cada cidadão no
poder depende da erificação de certas condiçõe , em con onância com o princípio en-
formadore do i tema con titucional. ão cidadão toda a pe oa de de o na cimento
até à morte; contudo, nem todo ão titulare de direito político.
omo e abe, a Con tituiçõe liberai e tabeleciam largo condicional i mo ,prin-
cipalmente de natureza económica, à atribuição de direito político; ,embora pre i í el
o re ultado,33-34decorreria mai de um éculo até e pa ar do ufrágio c n itário e do
capacitário ao sufrágio universal.35
29 V. a secção 11do capítulo I do título 111da Constituição francesa de 1791 ou o art. 90º da Constituição
brasileira de 1824 e o art. 63º da Constituição portuguesa de 1826.
30 Porque, como diz MONTESQUIEU (op. cit., pág. 532), o povo só pode ser monarca através dos sufrágios
que são as suas vontades, as leis que os regulam são tão importantes em democracia como em monar-
quia saber quem é o monarca e de que maneira deve governar.
31 Na linha ascendente de situações jurídicas enunciada por JELlINEK (System der subjectiven offentlichen
Rechts, 1892, trad. italiana Sistemo dei diritti pubblici subietivi, Milão, 1912, págs. 96 e segs.).
32 Os direitos políticos são direitos de cidadania, e não privilégios: SIEYES,Qu'est-ce que le tiers-étot? (na
edição crítica de Roberto Zapperi, Genebra, 1970, pág. 210).
33 Cfr. Monuol..., VII, Coimbra, 2007, págs. 18 e segs.
34 Para ALEXIS DE TOCQUEVILLE(De lo Démocrotie en Amérique, Paris, 1! parte, 1835, na edição de 1951,
pág. 90) trata-se de uma das regras mais invariáveis que regem as sociedades: à medida que se recua
o limite dos direitos eleitorais, sente-se necessidade de recuar mais; porque, depois de cada nova con-
cessão, as forças da democracia aumentam e as suas exigências crescem com o seu novo poder.
35 Cfr., em diferentes óticas históricas, RENÉREMOND, Pour une histoire idéologique du suffrage universel.
D'une utopie contestée ou consensus relotivisé, in ltinéraires - Études en /'honneur de Léo Homon, obra
Parte 11I Estrutura do Estado
coletiva, Paris, 1982, págs. 563 e segs.; PIETROCOSTA,Cittadinanza, Bari, 2005; CRISTINANOGUEIRADA
SILVA,Conceitos oitocentistas de cidadania: liberalismo e igualdade, in Análise Social, n2 192, 32 trimes-
tre de 2009, págs. 548 e segs.
Cfr. ainda ANTÓNIOTEIXEIRAFERNANDES,O pobre em luta pela cidadania, in Pobreza, exclusão: horizon-
tes de intervenção, obra coletiva, Lisboa, 2000, págs. 45 e segs.
36 Seguimos nestes dois parágrafos o parecer n2 29/78, de 7 de Dezembro de 1978, da Comissão Consti-
tucional, in Pareceres, VII, pág. 54.
37 V. Manual ..., VII, Coimbra, 2007, págs. 341 e segs.
38 V.já a nossa Ciência Política - Formas de Governo, Lisboa, 1996, págs. 294 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
111- ntre nação e pátria exi te coincidência no e encial. Toda ia, podem ainda
di cernir- e.
nação é um conceito cultural acompanhado de vi ência dominante afetiva; a
pátria pertenc , toda ela, ao domínio da afeti idade. a nação realçam- e, obretudo o
elemento pe oal e a ideia de uma comunidade tran temporal; a pátria tem de er vi ta em
relação a um território concreto (a pátria é a terra do pai ).46
1-A im como que tinha tido uma importância deci i a na formação da maior parte do
E tado europeu, a nação olta a de empenhar um ignificati o pap I no último 200 ano .
E, em e confundir com o E tado, em a receber não raro, projeção em norma jurídica.
Em primeiro lugar, e a nação fora éculos ante um podero o eículo de apoio
à ação centralizadora do Rei aquando da Revolução France a ela é trazida para a luta
política, identificada com o povo ou, egundo IEYÉ ,47 com o "terceiro e tado". um
43 Sobre a influência das instituições políticas na formação do caráter nacional, S. EHRLlCH, op. cit., loc.
cit., págs. 491-492.
44 Filosofia do Direito, 4~ ed. portuguesa, Coimbra, 1961, 11, pág. 166.
45 Mensagem, 1~ parte, 11, quarto.
46 Sobre as relações entre pátria e nação, v. JosÉ TAVARES,Ciência do Direito Político, cit., págs. 23 e segs.;
MAURICE HAURIOU, op. cit., pág. 82; PASSERIND'ENTREVES,La Dottrina dello Stato, 2~ ed., Turim, 1967,
págs. 241 e segs.; MARTlM DE ALBUQUERQUE,op. cit., págs. 99 e segs.; MIGUEL NOGUEIRA DE BRITO, O
patriotismo como civilidade: Egas Moniz, Maquiavel e as Nações Europeias, in Revista da Faculdade de
Direito da Universidade de Lisboa, 2001, págs. 835 e segs.
47 "O Terceiro Estado abrange tudo o que pertence à nação; e tudo o que não é Terceiro Estado não pode
tomar-se como sendo da Nação" (op. cit., pág. 126). Cfr., doutra perspetiva, as observações de HELLER,
op. cit., págs. 198 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
a) Através da identificação do E tado por referência à nação a que corre ponde (ou
pretende corresponder) ou por menção da comunidade política de ta indi ociá-
vel (assim, o preâmbulo da Con tituição alemã de Bona, antes e depois da reuni-
ficação, ou o art. 10 em Con tituições como a italiana, a francesa, a portugue a,
a e panhola ou a brasileira);
111- Em número considerável e de não pouco interesse são as situações dos Estados plurina-
cionais e, mutatis mutandis, dos Estados plurilinguísticos,ss dos pluriconfessionais e dos pluricomu-
nitários. Com exceção talvez do Império Austro-Húngaro poucos eram os que em 1918 como tais se
assumiam; não já depois.
A pluralidade, às vezes, determina estatutos pessoais separados, garantias específicas ou simples-
mente divisão ou reserva de cargos públicos (como na Constituição libanesa de 1926 ou na cipriota de
1960). Na maior parte das vezes - até por isso poder contender com a unidade política e com a igualdade
dos cidadãos - importa diferenciações territoriais, leva à adequação da forma de Estado e é uma das
principais causas de federalismo ou de regionalismo político. Outras vezes, ensaiam-se sistemas mistos.56
Casos típicos de organização territorial complexa eram os da URSS - "Estado multinacional", as-
sente na "livre autodeterminação das nações" (art. 70º da Constituição de 1977); da Iugoslávia - "co-
munidade política de nações livremente unidas" (art. 1º da Constituição de 1974) e cuja presidência
da República era um órgão colegial composto de tantos membros quantas as repúblicas e províncias
autónomas (art. 321º); e da Checoslováquia, entre 1969 e 1992.
A Espanha, primeiro com a Constituição de 1931 e agora com a de 1978, adotou uma estrutura di-
ferente, mas de alcance semelhante. Se continua a invocar-se a "indissolúvel unidade da nação espanho-
la", reconhece-se e garante-se, ao mesmo tempo, o "direito à autonomia" das "nacionalidades e regiões
que a integram" (art. 2º atual) e distinguem-se províncias ou grupos de províncias com caraterísticas his-
tóricas, culturais e económicas comuns e províncias com mera entidade regional histórica (art. 143º).
Indiquem-se ainda: a China, "Estado multinacional unitário, com zonas nacionais autónomas"
(arts. 4º e 112º e segs. da Constituição de 1982); a rndia, cujos Estados federados reproduzem as
grandes áreas linguísticas; a Rússia, antes e depois do desmembramento da URSS (cfr., hoje, art. 3º da
Constituição de 1993); e a Bélgica, com três áreas culturais, agora organizada sob forma federal.
Em plano diverso, a Constituição sul-africana de 1996 garante os direitos de membros das comu-
nidades culturais, religiosas e linguísticas (art. 31º).
identità culturale, Milão, 2001. Noutra perspetiva, cfr., ainda, PEDROPEREIRADESENA,Direito linguístico:
direitos e deveres nas palavras da lei, in Administração (Macaul, nº 36, Julho de 1997, págs. 385 e segs.;
ou BERNHARDGROSSFELD,Language, Writing and law, in European Review, Outubro de 1997, págs. 383
e segs. (a língua não é só serva de Direito, é também sua senhora); Langue(s) et Constitution(s), obra
coletiva sob a direção de ANNE-MARIE LE POURHIET,Paris-Aix, 2004.
56 Cfr. ANDRÉ THOMASHAUSEN,Local and regional authonomy: the camparative law approach to residen-
tial and spatial conflicts, in Comparative and International Law Review of Southern Africa, 1985, págs.
297 e segs.; ALESSANDROPrzzoRussO, op. cit., págs. 105 e segs.
57 Cfr. FRITZ FLEINER,Le Droit des Minorités en Suísse, in Mélanges Maurice Hauriou, obra coletiva, Paris,
1929, págs. 287 e segs.; ALESSANDROPIZZORUSSO,Minoranze etnico - linguistiche, in Encic/opedia dei
Diritto, XXI, 1976, págs. 527 e segs., e Minoranze e maggioranze, cit., págs. 45 e segs. e 63 e segs.; JUAN
OBLlETA CHALBAUD,op. cit., págs. 179 e segs.; PIERREGEORGE,Géopolitique des Minorités, Paris, 1984;
GUY HÉRAUD,Minorités et Conflits éthniques en Europe, in Le Reglement Pacifique des Différends Inter-
nationaux en Europe: Perspectives d'Avenir, obra coletiva, Dordrecht, 1991, págs. 41 e segs.; AUGUSTO
CERRI, Libertà, eguaglianza, pluralismo nella problematica della garanzia delle minorauze, in Rivista
Trimestrale di Diritto Pubblico, 1993, págs. 289 e segs.; JESUSPRIETODE PEDRO,op. cit., loe. cit., págs. 69
e segs.; VICTORSEGESVARY, Group rights: the definitin of group rights in the contemporary legal debate
based on sociocultural analysis, in International Journal of Group Rights, 1995, págs. 89 e segs.; NOR-
BERTROULAND,STÉPHANIEPIERRÉ-CAPSe JACQUESPOUMAREDE,Droit des minorités et des peuples autoch-
tones, Paris, 1996; CATARINAPINTO CORREIA,La définition des minorités, in Direito e Justiça, 2000, nº 2,
Parte II I Estrutura do Estado _
da ta final de Viena de I 15. oment, porém a partir da primeira guerra mundial (ou,
mai recentemente, apó a grande modificaçõe ub equente a 19 9) e lhe tem atribu-
ído uma i temática atenção - e tanto na Europa como no demai continente.
tá em cau a, ante de mai , o reconh cimento ao cidadão pertencente a uma
minoria do me mo direito da me ma condiçõe de exercício do direito do de-
mai cidadão. Ma não ba ta e itar ou uperar a di criminação. É nec ário a egurar
o re peito da identidade do grupo e propiciar-Ih meio de pre ervação e de li re de-
en 01 imento. Donde a atribuição de dir ito particulare - de direito fundamentai
próprio d e grupo de caráter indi idual ou in titucional - e a pre crição ao Estado
de corre pondente incumbência.
págs. 13 e segs.; JosÉALBERTO DEAZEREDO LOPES, op. cit., págs 187 e segs.; PATRíCIA
JERÓNIMO,
Direito
das minorias, in Dicionário Jurídico da Administração Pública, 32 suplemento, 2007, págs. 372 e segs.
GUYHERAUD,por exemplo, apresenta uma tipologia das minorias (págs. 61 e segs.), em que avultam
as contraposições entre minorias em sentido puramente étnico e minorias nacionais, entre minorias
territorial mente agrupadas e minorias dispersas, entre minorias resultantes de anexação e minorias re-
sultantes de inversão das relações demográficas, entre minorias correspondentes a nações sem Estado
e minorias nacionais stricto sensu (que são projeção além-fronteiras de nações constituídas em Estado)
e entre minorias reconhecidas e minorias não reconhecidas.
de igualdade efetiva na vida económica, social e cultural (art. 42); a garantia das liberdades fundamentais
(arts. 72, 82 e 92); o livre uso da língua materna, inclusive através de meios de comunicação social (arts. 92,
102 e 112); a promoção do conhecimento da cultura, da história, da língua e da religião da minoria, inclu-
sive através de escolas próprias (arts. 122, 132 e 142); a não modificação da composição demográfica da
área geográfica de implantação da minoria (art. 162); o direito de livre comunicação com pessoas de ou-
tros países com as quais partilhe a mesma identidade étnica, cultural, linguística ou religiosa (art. 172).
O regime das minorias foi um dos precursores da proteção internacional dos direitos do homem,
mas não se reconduz simplesmente a esse domínio; está também na fronteira dos direitos dos povos,
como a experiência histórica vem demonstrando.
61 A expressão aparece, pela primeira vez, na Carta Canadiana de Direitos e Liberdades, de 1982.
62 Cfr. PAOLOBARILE,Eguaglianza e tutela delle diversità, in Quademi Castituzionali, 1994, págs. 53 e segs.;
ALAIN TOURAINE, Qu'est-ce que la Démocratie?, Paris, 1994, págs. 72 e 113 e segs.; JÜRGEN HABERMAS,
op. cit., págs. 86 e segs.; MATTEOGIANNI, Cittadinanza diferenziata e integrazione multiculturale, in Rivista
Italiana di Scienza Politica, 1997, págs. 495 e segs.; GIOVANNI SARTORI,Pluralismo, multiculturalismo e
estranei, in Rivista Italiana di Scienza Politica, 1997, págs. 477 e segs.; SVLVIEMESURE e ALAIN RENAUT,
Alter Ego - Lesparadoxes de I'identité démocratique, Paris, 1999; Direitos humanos, estrangeiros, co-
munidades migrantes e minorias, obra coletiva coordenada por Gomes Canotilho, Oeiras, 2001; HANS
VERMEULEN, Imigração, integração e dimensão política da cultura, trad., Lisboa, 2001; PATRíCIAJERÓNI-
MO, OS direitos das minorias no ordenamento jurídico português - Breve incursão pelos meandros do
multiculturalismo, in Scientia luridica, Maio-Agosto de 2001, págs. 69 e segs. e Imigração e minorias
em tempo de diálogo intercultural- Um olhar sobre Portugal e a União Europeia, ibidem, Janeiro-Maio
de 2009, págs. 7 e segs.; VEIT BADER, Em defesa de políticas multiculturais diferenciadas, in Ideias polí-
ticas para o nosso tempo, obra coletiva, Braga, 2004, págs. 207 e segs.; MIGUEL CARBONELL,Problemas
constitucionales dei multiculturalismo, in Derecho Constitucional y Cultura - Estúdios en homenaje a
Peter Hiiberle, obra coletiva, Madrid, 2004, págs. 249 e segs.; Extranjero y immigracián, obra coletiva,
Madrid, 2004; GUSTAVOZAGREBELSKV, La virtu dei dubbio, Roma-Bari, 2007, págs. 107 e segs.; Cidadania
na presente política contemporânea, obra coletiva, S. João do Estoril, 2007.
Escreve ALAIN TOURAINE: "A democracia não é compatível com o rejeição das minorias mas também não
o é com o da maioria pelas minorias e com a afirmação de contraculturas e de sociedades alternativas.
É preciso afastar quer uma convenção jacobina de cidadania, quer um multiculturalismo extremo que
repudia todas as formas de cidadania" (pág. 113).
E sublinha HABERMAS: "O direito democrático à autodeterminação inclui o direito de preservar a sua
própria cultura política, mas não inclui o direito de afirmar uma forma de vida cultural privilegiada.
No contexto de uma Constituição de Estado de Direito democrático, diversas formas de vida podem
coexistir beneficiando de direitos iguais. Importa, porém, que se revejam numa cultura política comum
aberta a impulsos vindos de formas de vida novas" (pág. 93).
63 Cfr. ANTÓNIO AUGUSTOCANÇADO, Le déracinement et la protection des migrantes dans le Droit intema-
tional des droits de I'homme, in Revue Trimestrielle des Droits de I'homme, 2008, págs. 289 e segs.
Parte 11I Estrutura do Estado _
I- Próximo do problema das minorias ' o da exi tência no interior das fronteira de al-
gun tado - na América, na Á ia, na Oceânia e até na Europa - de comunidade ou popu-
laçõe em e tádio cultural ou ci ilizacional di erso do da generalidade da população (ou da
ua parte politicamente dominante). o eu conjunto ultrapa am 250 milhõe de pe oas.
Tanto a minoria como a comunidade ne sa condiçõe - dita aborígene, indí-
gena ou autótone - e tão ujeita a regra e p ciais, tenham e ta origem na própria
comunidade (obretudo, então, com caráter con uetudinário) ou venham do exterior.
Ma , até há pouco ano, entendia- e que, diferentemente do regime das minoria , o
r gime do indígena ou aborígene de eria i ar a integração ou a imilação na comu-
nidade e tatal a que pertence em, por ó a integração propiciar o de en 01 imento
económico, ocial e cultural e o ace o à ci ilização modema.64
Hoje tende- e a realçar a emelhança não ó por cau a de maus resultados (ou do
mau meio) do proces o de a imilação como por a princípio da autodeterminação e tar a
encontrar eco ne e grupo . Daí a recu a da integração pura e imple ,a afirmação da prio-
ridade hi tórica em área territoriai ,a rei indicação da identidade cultural e a procura de
e tatuto p Iítico compatí ei ,tanto m ní el interno quanto em ní el intemacional.6s-u
Por outro lado, há acentuada afinidade ociológica entre o indígena e o nati o
de território coloniai ou dep ndente do passado e podia haver me mo analogia de itu-
açõe jurídico-pública, quando os indígena não goza em ou não gozassem plenamente
de direito político .
o entanto não meno avulta a diferença. O indígena ão cidadão de um E tado,
de tinado ,portanto, à igualdade com o demai cidadão. O nati o de territórios coloniais
ou dependente não o eram faziam parte de comunidad di tinta de tinada cada uma
delas a con tituir um no o p o, um novo E tado (ou a integrar- e noutro povo ou E tado);
64 Nessa linha, Convenção n!! 107 da Organização Internacional do Trabalho, de 26 de Julho de 1957, so-
bre integração das populações aborígenes e outras populações tribais e semitribais em países indepen-
dentes. Curiosamente, Portugal só se retirou desta Convenção em 2009 ... (Resolução da Assembleia da
República n!! 83/2009, de 7 de Setembro).
65 Cfr. F. VAN LANGENHAVE,Lo protection des populotions oborigenes aux Nations Unies, in Recuei! des
Cours, 1956, I, págs. 325 e segs.; FRANCESCO CAPOTORTI,op. cit., loc. cit., pág. 42; DAVIDB. KNIGHT,op.
cit., loc. cit., págs. 266 e segs.; Les Droits des Peuples Autochtones, ed. das Nações Unidas, Genebra,
1990; NORBERTROULAND,STÉPHANIEPIERRÉ-CApse JACQUESPOUMAREDE,op. cit., págs. 351 e segs.; JosÉ
ALBERTODEAZEREDOLOPES,op. cit., págs. 250 e segs.; MIGUEL CARBONELL,La constitucionalización de
los derechos indigenas en America Latina: una aproximación teorica, in Boletín Mexicano de Derecho
Comparado, 2003, págs. 839 e segs.; NATALIAPATRICIACOPêLLOBARONE,La diferencia en la igualdacJ. EI
desafio judiciol pora la inclusión de las comunidades oborígenes en un mundo pluriculturol, in Cuestio-
nes constitucionales, n2 20, Janeiro-Julho de 2009, págs. 103 e segs.
66 Em 1981, foi elaborado um projeto de Pacto, afirmando que o direito de autodeterminação poderia ser
concretizado pela associação com um ou mais de um Estado, pela autonomia regional, pela autonomia
interna ou pelo estatuto de Estado associado; e a partir de 1985 começou a ser preparada uma Decla-
ração de Direitos dos Povos Autótones.
Por outro lado, em 1989 a OIT reviu a Convenção n!! 107 em sentido inovador e não integracionista,
donde resultaria a Convenção n2 169. Sobre esta, V. J. R. HERNÁNDEZPuLIDO, La OIT y los pueblos indi-
genas, in Boletim Mexicano de Derecho Comparado, 1995, págs. 153 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
e, enquanto tal não e de e, a ua relação com o E tado que o go ema a, dir ta ou indir -
tamente, era de uj ição - eram úbdito no ntido literal do termo, úbdito coloniai .67
IIT - O conceito marxista de povo apre enta- e, em primeiro lugar, como respo ta
à noção e à prática burguesas e, em segundo lugar, como re ultado da análi e, até às úl-
timas consequências, da situação económica relativa da pe oa e do grupo dentro da
comunidade política.
É um conceito que privilegia a po ição perante o ben e a relaçõe de produção
e que se prende com a vontade de a transformar de acordo com a conceção do homem
e da vida própria do materialismo histórico e dialético - de acordo com a conceção do
individuo concreto e " ocializado"79 o que está em causa é substituir a atual divi ão da
ociedade em cla e por uma unidade construída a partir da revolução feita pelo prole-
tariado, em que se alterem tanto a natureza da comunidade política como o estatuto do
indivíduo. O povo não pode abranger explorado e exploradore , omente pode abranger
as classes trabalhadoras ou as clas e revolucionária.
A emancipação política, e creve MARX, reduz o homem, por um lado, ao membro da
sociedade civil, ao indivíduo egoí ta independente, e, por outro lado, ao cidadão, à pessoa
moral. " erá apenas quando o homem real individual retomar em si o cidadão ab trato
e se tornar, na ua vida empírica, no seu trabalho, nas suas relações individuais, um er
genérico, erá apena quando ele reconhecer e organizar a ua força própria como
força ociai e não mais eparar de i a força ocial ob a forma de força polífica, será
apena ne a altura que e con umará a emancipação humana."so-s'
A primeira e a quarta Constituições soviética continham conceito de povo - quali-
ficado segundo o povo ativo - paradigmáticos das dua uce iva fa e de "ditadura do
proletariado" e de "Estado de todo o povo": "A República Ru a é uma livre comunidade
78 Mantemos a opinião exposta em Contributo para uma teoria da inconstitucionalidade, Lisboa, 1968,
págs. 60-61, diferente da de BURDEAU,op. cit., 11,págs. 118 e 298 e segs. (que fala em artifício da conti-
nuidade democrática e em falta de imaginação constitucional).
79 Na expressão ainda de GUSTAVRADBRUCH,op. cit., I, pág. 174.
80 Question juive, trad., in KARLMARX, Oeuvres choisis, I, Paris, 1963, págs. 88-89.
81 Cfr. GONZALO PUENTEOJEA,As revoluções marxistas e a validade do sufrágio universal, in Critério, nº 3,
Janeiro de 1976, págs. 36-37: MARX não ignora o progresso implícito na consagração do homem como
cidadão de pleno direito; mas não aceita o postulado de um cidadão eleitor como sujeito de uma ética
universal abstrata, incondicionada histórica e socialmente, como soberano absoluto de uma racionalida-
de incontaminada; em vez do homem abstrato, existe o homem concreto, sujeito de relações de produ-
çõo que o convertem ou em explorador ou em explorado e que, em qualquer das posições antagónicas,
não pode iludir os condicionamentos sociais e económicos da perceção da realidade que o circunda.
V. também, por exemplo, UMBERTO CERRONI,La libertad de los modernos, trad., Barcelona, 1972, págs.
201 e segs., ou GALVANODELLAVOLPE,Rousseau e Marx - A liberdade igualitária, trad., Lisboa, 1982, págs.
39 e segs. e 109 e segs.; e, de premissas bem diferentes, HELMUTH KUHN, op. cit., págs. 163 e segs.; MAU-
RICEBARBIER,op. cit., págs. 178 e segs.; JÓNATASMACHADO, Nás o Povo ..., cit., loc. cit., págs. 64 e segs.
Parte II I Estrutura do Estado
82 V., criticamente, HERMANN HEllER, op. cit., págs. 183 e segs., ou ERNST CAsSIRER, op. cit., págs. 277 e segs.
83 Segundo o programa do Partido Nacional-Socialista, ninguém poderia ser cidadão alemão se não tives-
se "sangue alemão" (art. 42).
84 Cfr. UlRICH SCHEUNER, Le peuple, L'État, le droit et la doctrine nationale-socialiste, in Revue du droit
public, 1937, págs. 41, 43, 45 e 51. Cfr. ROGER BONNARD, Constitution et administration du /11'Reich
alemand, ibidem, págs. 607 e segs.; CABRAL DE MONCADA, Filosofia..., cit., I, págs. 390 e segs.; PLAUTO
FARACO DE AZEVEDO, Limites e justificação do poder do Estado, Petrópolis, 1979, págs. 97 e segs. e 120
e segs.; MAURICE BARBIER, op. cit., pág. 173 e segs.
85 Na qualificação de CABRAL DE MONCADA, Filosofia..., cit., I, págs. 388 e 390.
86 MIRKINE-GUETZÉVITCH, Lesthéories de la dictature, in Revuepolitique et parlementaire, 1934, pág. 138.
O "princípio político da nação" a que alude é o da Revolução Francesa.
Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Do prisma histórico, ocial, orgânico, o povo é, não uma ma sa, uma multidão, uma
soma, um número, ma uma coletividade irredutível ao elemento que a compõem ao
indivíduos; o todo está antes e é mai que as partes em entido ari totélico, e unive~ ita
non olvitur in singularitates; é um ente em i, um ujeito, uma pe oa ideal, e piritual ou
moral, me mo e não jurídica; é um "organi mo ético", no entido hegelianoY
"A ação italiana é um organi mo com fins, vida e meio de ação uperiore, pelo
poder e pela duração, ao do indivíduo, i olado ou a ociado, que o con tituem. É
uma unidade moral, política e económica, que e realiza integralmente no E tado Fa ci -
ta" (art. 10 da Carta dei Lavoro).88 "A Nação Portugue a con titui uma unidade moral,
política e económica, cujo fin e interes e dominam o do indivíduo e grupo que a
compõem" (art. IOdo Estatuto do Trabalho Nacional).
Na Nação portugue a, afirma OLIVEIRA SALAZAR, estão incorporados e por ela vi em
os indivíduos, as família, o organi mo privado e público. E na unidade re ultante
da ua integração e da concordância profunda dos seu interesses, ainda que às veze
aparentemente contrário, não há que epará-los ou opô-lo, ma que ubordinar a ua
atividade ao interesse coletivo. Nada contra a Nação, tudo pela Nação. 9
Há, para MAR ELLOCAETAo, dua aceçõe do termo nação: como povo portuguê ,
elemento humano do E tado, e como comunidade cultural tran pe oal "formada pela
ininterrupta cadeia de geraçõe onde e con erva e elabora tudo o que dá caráter ao por-
tugue e e o diferencia no mundo, e donde resultam imperativo a que o E tado como
expres ão política da unidade nacional e instrumento da ua missão ecuménica tem de e
subordinar".90 E a soberania nacional não e confunde com a oberania popular, porque
e ta assenta na manifestação da vontade do povo pelos eleitore , enquanto aquela existe
me mo quando interpretada, e até adivinhada, pelos homens de escol que abem dar
consciência a tendências latentes, mas ignorada ou pa iva no eio da coletividade.
"Mas a soberania nacional é compatível com a oberania popular, e admitirmo que
em certo grau de evolução da Nação o eu cidadão e a ociedade primária que a
integram e tão apto a traduzir a con ciência e a vontade atuais da comunidade, embora
não ejam enhore de rliemordela e devam ser considerados meros depositários do poder
para exercerem a delicada função de realizar no pre ente a continuação do pa ado e a
preparação de um futuro egundo a mesma linha de continuidade tradicional.',,}'
Com relativa facilidade se reconhece que, ape ar da emelhanças, a noção fasci ta
italiana e a noção nacionalista portugue a po uem sentido diver o : a egunda e tá
mai próxima da conceçõe românticas antiliberai do éculo XIX92 e tem um cunho
conservador, ma não totalitário.
87 SERGIOPANUNZIO, op. cit., págs. 27-28. Este autor distingue, aliás, povo e nação (esta é o povo privilegia-
do ou aristocrático na hierarquia dos valores históricos, o povo tomado idealmente na perspetiva dos es-
peciais vínculos nacionalizantes como a língua, o território, a raça, a religião, o Estado ou a economia).
88 Cfr. a análise jurídica de CARLOESPOSITO,Lo Stato e la Nazione Italiana, in Archivio di Diritto Pubblico, 11,
1933, págs. 409 e segs.
89 Discursos, I, 4ª ed., Coimbra, 1948, pág. 34. V., também, MANUEL RODRIGUES,Política, Direito e Justiça,
Lisboa, 1934, págs. 7 e segs., máxime 53.
90 Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, 5ª ed., 11, Lisboa, 1972, pág. 509.
91 Ibidem, págs. 542-543.
92 Que, aliás, não é o único fundamentalismo religioso em expansão nos nossos dias.
Parte 11I Estrutura do Estado _
Segundo PAULOOTERO,93
seria possível encontrar através do apelo à ideia de nação, vista numa
aceção hegeliana como "espírito do povo", uma vertente de expressão democrática da vontade da
coletividade com direta projeção constitucional, isto independentemente de estar (ou não) expressa-
mente formalizada em normas escritas: o desuso e o costume contra constitutionem seriam manifes-
tações visíveis da desadaptação da Constituição formal à nação a que se destinam e, simultaneamente,
a expressão da vontade constituinte da nação em sentido contrário às normas escritas da Constituição
"oficial" carecidas de efetividade social.94
Mostrar-se-ia possível a concorrência constitucional entre soluções ditadas por diferentes mode-
los democráticos que, sendo uma expressão de pluralismo de uma sociedade aberta, poderia conduzir
a uma certa conflitualidade de legitimidades reivindicativas de democraticidade: por um lado, a ex-
pressão da vontade maioritária através de formas orgânico-representativas previstas expressamente na
Constituição (v.g., resultados de um referendo, votação parlamentar) e, por outro lado, a reivindicação
vivificadora da identidade cultural comum como fonte de soluções contrárias à vontade majoritária.
Uma tal conflitualidade potencial de soluções, traduzindo o pluralismo de expressões democrá-
ticas da vontade popular, não poderia deixar de fazer apelo, segundo um espírito de tolerância, a um
consenso ele sobreposição ou entrecruzado (RAWLS):inexistindo numa democracia soluções irreversí-
veis, haveria sempre que procurar um respeito mútuo pela diversidade de soluções e tentar encontrar
procedimentos democráticos tendentes a moderar as rivalidades, impossibilitando que, verificando-
se a ausência de soluções atentatórias da justiça e da dignidade humana, uma delas pudesse ser
imposta pelo Estado por via sancionatória.9s
Rejeitamos esta conceção. Ainda que se afirme que nunca a Constituição poderia conceder re-
levância a uma identidade cultural atentatória da dignidade humana,96 ela abala os fundamentos da
democracia própria do constitucionalismo moderno, cuja expressão privilegiada é o voto dos cida-
dãos. A nação, enquanto comunidade ou cadeia de gerações, não pode formar uma vontade política
à margem das instituições representativas ou contra elas.
VII - Para o fundamentali mo i lâmico, não pode exi tir eparação entre a e fera
política e a e fera religio a, o po o é a comunidade do crente e a lei i lâmica de e vi-
gorar como lei civil.
A República i lâmica do Irã, proclamada em 1979, apre enta- e com a experiência
mai radical de realização de ta ideia97 e a ua on tituição, de 1986, patenteia-a bem
impressivamente.
A im, a República i lâmica é um " i tema ba eado na fi'" (art. 2°), em que o povo
é "chamado à irtude" e "o crente, homen e mulhere, ão amigo uns dos outros,
rejubilam no Bem e proíbem o Mal' (Alcorão, 9:71) (art. 8°).
98 Cfr., por todos, MAURICE BARBIER,ap. cit., págs. 213 e segs.; e Manual ..., I, cit., págs. 64 e 222-223.
Capítulo 111
A CIDADANIA
§ 1º
A cidadania ou qualidade de membro do Estado
Não exi tem, contudo, apena ,como e abe, E tado - ou ó E tado oberano. Para
além deles existiram em número considerável e ainda existem outras comunidades política ,
em face da quai e e tabelecem qualidade ou ínculo imilares ao da cidadania: a im a
condição de súbdito feudais, a do úbdito coloniai ,a do cidadão de E tado em ace o ou
sem ace o pleno à vida intemacional, ou a do territórios associados ou intemacionalizado ;3
e daí entro amentos com as leis dos E tado oberano a que po am e tar ligado .4
Por outro lado, em E tado complexos (Estado federai, uniõe reai) ocorre um
de dobramento da cidadania em molde variávei, embora (alva alguma exceçõe)
eja empre a cidadania do E tado central a determinar ou a preceder a cidadania corre -
pondente a qualquer da entidades competentes.
Diversamente, em confederações, em organizaçõe internacionais e noutras entida-
des de Direito internacional não pode falar- e, em rigor, em cidadania, nem é uma verda-
deira cidadania a cidadania europeia consagrada no Tratado de Maa tricht ou de União
Europeia, de 1992, a que adiante no vamo referir.
3 Cfr. H. F. VAN PANHUYS,The role of nationality in International Law, Leida, 1959, págs. 34 e segs.
4 Era o caso da lei da nacionalidade britânica de 1981, a qual distinguia três categorias de cidadãos: bri-
tânicos, britânicos de territórios dependentes e britânicos do ultramar, além dos estatutos dos British
protected persons e dos British subjects without citizenshif (British subjects). Cfr. O. Hooo PHILlPSe PAUL
JACKSON,Constitutional and Administrative Law, 3ª ed., Londres, 1987, págs. 452 e segs.
5 Neste sentido, CABRALDE MONCADA, Lições de Direita Civil, 2ª ed., I, Coimbra, 1954, pág. 302, nota. Salien-
ta que a expressão "nacionalidade" é ambígua, por não se ligar rigorosamente a um conceito político.
6 V. art. 486º do Código Comercial e Convenção de Aeronáutica Civil de Chicago, de 1954. Cfr. TABORDA
FERREIRA,op. cit., págs. 33 e segs. e 41 e segs.; DIAS MARQUES, Conceito e natureza jurídica da naciona-
lidade, in Revista da Ordem dos Advogados, 1952, nº 3, págs. 106 e segs.; FERNANDESCOSTA,Da nacio-
nalidade das sociedades comerciais, in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra,
suplemento ao nº XXVII, 1984, págs. 1 e segs.; ANTÓNIO MARQUES DOSSANTOS,Algumas reflexões sobre a
nacionalidade das sociedades em Direito internacional privado e em Direito internacional público, Coim-
bra, 1985 (agora incluído em Estudos de Direito da Nacionalidade, Coimbra, 1998, págs. 7 e segs.).
7 Sobre a terminologia em Direito comparado, v. ROLAND QUAORI, Cittadinanza, in Novissimo Digesto
Italiano, 111, pág. 313.
8 Cfr., por todos, VIRIATO SOROMENHO MARQUES,A era da cidadania, Lisboa, 1995.
9 É o que sucede em alguns países latino-americanos, como o México (arts. 30º e segs. e 34º e segs. da
Constituição de 1917), o Equador (arts. 5º e segs., 12º e 133º da Constituição de 1979) ou a Colômbia
Parte 11I Estrutura do Estado _
(arts. 962, 982 e 992 da Constituição de 1991). Cfr. J. J. SANTA-PINTER,Ciudadania y nacionalidad en las
Constituciones americanas, in Revista de Derecho Espanol e Americano, 1964, págs. 33 e segs. E tam-
bém em alguns territórios dependentes dos Estados Unidos.
les critério ; bem ao invé , cada E tado tem de o definir reconhecendo a existência dos
re tante e, por con eguinte, está adstrito a certa baliza. Além di o, avulta a nece -
idade de regras destinadas a evitar ou a re olver conflito po itivos (pluricidadania ou
pluripatridia) ou negativo (apatridia, apolidia) de cidadania.
International Public, Paris, 1997, págs. 318 e segs.; EDUARDO CORREIABAPTISTA,Direito Internocional
Público, li, Coimbra, 2004, págs. 184 e segs.; JÓNATASMACHADO, Direito internacional- Do paradigma
clássico ao pós-ll de Setembro, 3ª ed., Coimbra, 2006, págs. 187 e segs.; VALÉRIODE OLIVEIRAMAZZUO-
LI, op. cit., págs. 606 e segs.
1 - Começando por uma breví ima referência do Direito internacional (por mais
não caber na economia deste livro), aliente-se que aí a cidadania é principalmente objeto
de princípios gerais ou de regra con uetudinárias, e só em egundo nível de convençõe
multilaterai e bilaterai. em poderia deixar de ser a im tendo em conta a natureza do
fenómeno e a e trutura da comunidade internacional.
egundo o mais importante tratado sobre a matéria - a Convenção da Haia, de 1930,
relativa ao conflito de lei no domínio da nacionalidade -, as leis de cada Estado somen-
te devem er ob ervada pelo re tante E tado ,de de que estejam de acordo com as con-
vençõe internacionai o co tume internacional e o princípio de direito reconhecidos.
O Direito da Gente devolve para o Direito interno de cada Estado a definição das
regra de aquisição e de perda da cidadania re petiva. Ou eja: confere competência para
tanto aos órçãos estatai 19 e ad tringe o demai E tado a re peitar a ua deci õe -
tanto normativas como não normativa - pertinente à cidadania de qualquer pe oa.20
17 Cfr. JoÃo LOPESALVES,Ética e Democracia: que relação?, in Ética e o futura da democracia, obra co-
letiva, Lisboa, 1998, pág. 21; ALASTA1RDAVIDSON,The citizen who does not belong: multiculturalism,
citizenship and democracy, ibidem, págs. 337 e segs.; Cidadonia e novos poderes na sociedade global,
obra coletiva, Lisboa, 2000; ISABELESTRADACARVALHAIS,Os desafios ..., cit., máxime págs. 17,61 e segs.,
114 e segs,: ELSPETHGUILD, The Legal Elements of European Identity: EU Citizenship and Migration Law,
Klever Law International; RITAKASTORYANO, Vers un nationalisme transnational, in Revue française de
science politique, 2006, págs. 533 e segs.; Cidadania no pensamento político contemporâneo, obra
coletiva, S. João do Estoril, 2007.
18 Cfr., aliás, a crítica de JEREMYRABKIN,Por que é a cidadania supranacional uma mó ideia, in Cidadania
e novos poderes na sociedade global, pág. 152: o tipo de cidadania supranacional vinculada à União
Europeia é uma desvalorização da atual cidadania, que encoraja um tipo de políticas, nas quais os cida-
dãos são geridos e manipulados a distância por poderes quase insondáveis e incontáveis.
19 Aliás, uma competência originária, e não delegada: cfr. JosÉ FRANCISCO REZEK,op. cit., loe. cit., pág. 353.
20 Cfr. FERRERCORREIA,O estatuto pessoal dos plurinacionais e dos apótridas, in Revista de Direito e Estu-
dos Sociais, ano 111, 1947, nQ 2, pág. 471: aquele Estado que, na legislação sobre nacionalidade das pes-
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
soas, afirmasse o seu desprezo pela personalidade e autonomia dos demais cometeria uma violação do
Direito internacional; e a obrigatoriedade de tal legislação seria restrita ao território em que o Estado
legislador exercesse a sua soberania.
con tituído ou recém-admini trante de certo território não pode negar arbitrariamente
a ua cidadania ao re idente ne e território com a cidadania do E tado predece or
me mo que pertencente a minoria .26-27
naturalização ou qualquer outra forma de aqui ição uperveniente da cidadania
pre upõe o con ntimento;28 e e te de e er dado, em regra, explicitamente e não pelo
ilêncio,29 para garantia da liberdade da pe oa.
Ocorrendo pluricidadania ou polipatridia, e a pe oa em causa e encontrar no
interior do território de um do E tado a que e tá vinculada, em princípio aí ó poderá
in ocar a corre pondente cidadania·30 e, e e encontrar no território de terceiro E tado
ha erá aí de in ocar a cidadania do E tado com que mantiver relação efeti a ou ativa.ll
O que não poderá erá in ocar a cidadania de um E tado contra a do outro.32
Ocorrendo apatridia, o E tado no qual o indivíduo re idir ou com que tiver qualquer
outra ligação efl tiva terá a faculdade de lhe atribuir a ua cidadania.D
26 Cfr. O'CONNEl, The Law af State Successian, Cambridge, 1956, págs. 245 e segs.; ERNESTOLAPENNA,op.
cit., págs. 89 e segs., máxime 109; FRITZMUNCH, ap. cit., loc. cit., págs. 1.140 e seg.; RUI DE MOURA RA-
MOS, ap. cit., lac. cit., págs. 145 e segs. e 273, nota; ANA BARAHONA,op. cit., págs. 11 e segs. e 41 e segs.;
JOHANNESM. M. CHAN, op. cit., loc. cit., págs. 111 e segs.; Comission Européenne pour la Democratie
pour le Droit, Incidences de la sucession /'État sur la nationalité, Estrasburgo, 1998; VALÉRIODEOLIVEIRA
MAZZUOLl, op. cit., págs. 431-432.
27 O art. 10Q da Convenção sobre Redução de Casos de Apatridia estabelece que os tratados relativos à
cessão de qualquer território deverão conter disposições destinadas a impedir situações de apatridia
em sua consequência.
28 ALFREDVERDROSS, op. cit., pág. 238. Cfr. OPPENHEIM,Internatianal Law, I, Londres, 1960, págs. 643 e segs.
29 JoSÉFRANCISCOREZEK,ap. cit., lac. cit., pág. 361.
30 Problema diferente é o de saber se este Estado pode restringir-lhe direitos políticos por possuir a cidada-
nia de outro Estado. Cfr. JEAN-FRANÇOIS FLAUSS,Le drait du Cansei! de /'Europe ou service d'élections libres
et de la dauble natianalité, in Revue trimestrielle des droits de /'homme, nQ 79, 2009, págs. 851 e segs.
31 Por isso, se distingue entre efetividade em sentido genérico, pressuposto geral de caráter qualitativo
que permite a atribuição da cidadania de certo Estado a esta ou àquela pessoa; e efetividade em sen-
tido restrito ou quantitativo, traduzida em maior ou menor intensidade do vínculo, de tal sorte que,
tendo um indivíduo duas ou mais nacionalidades, só uma delas deva ser havida como efetiva ou dotada
de mais efetividade: ANT6NIO MARQUESDOSSANTOS,Nacionalidade e efetividade, cit., loc. cit., págs.
280-281 e 285.
32 Por causa do princípio da igualdade soberana dos Estados: cfr. JosÉ FRANCISCOREZEK,ap. cit., loc. cit.,
págs. 363 e segs.; JEANCOMBACAUe SERGESUR, ap. cit., págs. 325-326.
33 Cfr. MAURI, citado porTABORDA FERREIRA,loc. cit., pág. 117.
34 Cfr. PHILlPPEDELACHAPElLE,La Déclaration Universelle des Draits de /'Hamme et le Cathalicisme, Paris,
1967, págs. 132 e segs.; GUNNAR G. SCHRAM,Comentário, in The Universal Declaratian of Human Ri-
ghts, obra coletiva, Oslo, 1992, págs. 229 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Há aqui doi direitos35 - sobretudo, o primeiro do maior relevo e ao qual corre pon-
de a obrigação do Estado de atribuir a sua cidadania ou de não privar dela um indivíduo
que com ele tenha uma ligação efetiva e que não adote um comportamento de entido
contrário.36 E liga-se a cidadania à vontade, admitindo- e o direito de opção por cidadania
diferente da que e po ua.37
Por seu turno, a garantia contra privaçõe arbitrária con iste na garantia de proces-
o jurídicos regulares, com meios de defesa a segurado , e, e pecialmente, a proibição
de privações por motivos políticos, ideológicos, religio o ou rácico 38(como as que
fizeram diversos regimes totalitários ao longo do século XX, inclu ive contra re idente
no próprio território do E tado).39
Na linha da Declaração Universal, a Convenção obre Redução da Apatridia, de
1961, transformou em obrigação para a sua parte, em certo ca o , a faculdade do
Estado de atribuição da sua cidadania aos indivíduos com ligação efetiva com ele e,
que, doutro modo, eriam apátridas; e fez depender a perda da cidadania, em face de de-
terminados E tado , da po e ou aqui ição da cidadania doutro Estado.
Mais recentemente, em 1997, foi celebrada uma Convenção Europeia obre a a-
cionalidade, na qual se explicitaram os grandes princípio de Direito internacional (art .
3°,4°, 5°, 8°, nOI, alínea e, e 18°); se estabeleceram, uma vaze obrigaçõe, outra veze
faculdade dos E tado ignatário (arts. 6° e eg .); e dispôs sobre sucessão do E tado
(arts. 18° e segs.), e cidadania, em e pecial no domínio da obrigações militares (arts. 14°
e segs. e 21° e segs.); e se previram formas de cooperação (art. 23° e eg .).
Um relance comparativo mo tra que não ão muita a Con tituiçãe formai dou-
tros paí es que contemplem expressamente a problemática da cidadania (o que não 19m-
fica que ela não entre, insi timos, no Direito constitucional material).40
Quando contemplam, é para pre crição de garantia concernentes à perda da cida-
dania: art. 22° da Con tituição italiana (fonte do no o art. 26°, n° 3): art. 16° da Con ti-
tuição alemã federal; art. 4°, n° 3, da Constituição grega de 1975; art. 26°, nO4 e 19°, n°
6 da Con tituição portugue a; art. 11°, n° 2, da Constituição espanhola de 1978; art. 69°
da Con tituição húngara; art. 8° da Con tituição e toniana de 1992; art. 11° da onsti-
tuição checa de 1992; art. 24° da Constituição albanesa de 1993; art. 20° da Con tituição
sul-africana de 1996. Ou é para remissão para a lei: art. 4° da Con tituição belga; art. 5°
da Constituição romena de 1991; art. 5° da Constituição cabo-verdiana de 1992; art. 19°
35 Cfr. VAN PANHUYS,op. cit., págs. 220 e segs.; RUI DE MOURA RAMOS, op. cit., loc. cit., págs. 338 e 339;
JOHANNESM. M. CHAN, op. cit., loc. cit., págs. 3 e 8 e segs.
36 Cfr. ANTÓNIO MARQUES DOSSANTOS,op. cit., loc. cit., págs. 300-301.
37 O princípio antigo, pelo contrário, era de vinculação perpétua de qualquer indivíduo ao seu Estado,
salvo banimento.
38 As quais, doravante, se tornam inválidas ou, mesmo, ilícitas (contra: LAPENNA,op. cit., págs. 131 e segs.).
39 São improcedentes, pois, as críticas ao art. 15º de ANA BARAHONA,op. cit., págs. 32 e 33.
40 Para o tratamento pela legislação ordinária, V. as coletâneas de GIOVANNI KOJANEC,Lo cittadinanza nel
mondo, 3 vols., Pádua, 1977 a 1982, e de FElICIANO BARREIRASDUARTE,Regime Jurídico Comparado do
Direito de Cidadania, Lisboa, 2009.
Parte 11I Estrutura do Estado ••
§ 2º
A condição jurídica das pessoas em razão da cidadania
tão vinculado tran itória e pr cariamente e o u e tatuto é r cortado a partir do Dir ito
internacional.41
em empr a im foi: em Roma por e emplo, chegou a formar- e um Dir ito int r-
no e p cial para o e trangeiro ou p regrino o ju gentium.42 Ma ,no i t ma europeu
de E tado urgido na Idade moderna, o lugar primacial tem pertencido ao Direito int rna-
cional e ó depoi tem intervindo o Direito interno. m contrapartida, o Direito internacio-
nal convencional não molda de forma completa e uniforme a condição do e trangeiro .
De qualquer orte, doi ponto de ba e par c m hoje43 e identes: em primeiro lugar
que o trangeiro 44de em ter uma condição jurídica re peitadora da dignidade da pe oa
humana que de em er tratado como homen mulhere li re eu ufruir, p r con eguinte,
do direito que daí decorrem; e, em egundo lugar, qu podem tar pri ado de direito po-
lítico ,ou, pelo meno , de participação na formação da deci õe fundam ntai do E tado.
Entre e ta baliza abre- e uma gama ariada de oluçõe con oante o di er o ordenamen-
to jurídico interno e a circun tância culturai ,política e conómica d cada tempo.
1lI - A Declaração Univer ai, proclamando que todo o ere humano na cem
livre e iguai em dignidade e direito (art. 1°), con agra:
e a ordem pública comunitária, Lisboa, 1992, págs. 22 e segs.; JEAN COMBACAUe SERGESUR, op. cit.,
págs. 370 e segs.; BRUNO NASCIMBENE,Straniero nel diritto internazionale, in Digesto delle Discipline
Pubblicistiche, XV, 1999, págs. 179 e segs.; MARIA CHIARA,La dignità dello straniero, in Politica deI Dirit-
to, 2006, págs. 283 e segs. Cfr. ainda Lufs DELIMA PINHEIRO,Direitos dos estrongeiros - Uma perspetiva
de Direito Internacional Privado, in O Direito, 2006, págs. 967 e segs.
47 Que retoma, nos seus arts. 162 e 262, os princípios dos arts. 62 e 22 da Declaração Universal, respetiva-
mente.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
48 Cfr. HUGO CABRALDE MaNCADA, O asila interna em Direito internacional público, Coimbra, 1946; CARLOS
A. FERNANDES,Da asilo diplomático, Lisboa, 1961.
49 Cfr., por todos, J. L. BRIERlY,op. cit., págs. 227 e 280.
Parte 11 I Estrutura do Estado
arta ocial uropeia56 procura, por seu turno, assegurar aos trabalhadores mi-
grante informação e acolhimento adequado' conceder-lhe um tratamento não meno
fa orável que o do cidadão locai quanto à remuneração e condiçõe de trabalho, in-
dicalização, alojamento, impo to e ace o àju tiça; e garantir o reagrupamento da ua
família, bem como a tran fer~ncia da ua conomia.
Ma é no e paço mai homogéneo e mai integrado da União Europeia que e tem
caminhado mai longe no rumo da equiparação de direito , independentemente de cida-
dania como adiante e mo trará.
50 Quanto aos refugiados, v. art. 52º da Convenção de 1951; e, quanto aos apátridas, art. 31º da Conven-
ção de 1954.
51 Cfr. JEAN-MARIE HENCKAERTS,The current status and context of the prohibition of mass expulsion of
aliens, in Human Rights Law Journal, 1994, págs. 301 e segs.
52 Através da Organização Internacional do Trabalho: convenção nº 97 e recomendação nº 96 (de 1951) e
convenção nº 143 e recomendação nº 151 (de 1975).
53 Cfr. FREDERICKG. WHELAN, Citizenship and the Right to Leave, in The American Political 5cience Review,
vol. 75, Setembro de 1981, págs. 636 e segs.
54 Ainda que se admitam restrições em determinadas zonas, justificadas pelo interesse público numa
sociedade democrática (art. 22, n2 4). Cfr. MARIA LuíSA DUARTE, ap. cit., pág. 53.
55 A Convenção Interamericana e a Carta Africana contêm disposições semelhantes: arts. 22º e 12º, res-
petivamente.
56 De 1961, agora substituída pela Carta Revista de 1996.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
r - Entre E tado com afinidades hi tórica e culturai têm ido e tab I cido ,na úl-
tima década, por tratado ou por outra fonna ,e tatuto de igualdade do u cidadão,
traduzido em mai direito do que os atribuído aos cidadão do re tant stado .57
É o que e verifica entre o Brasil e Portugal, de de a onvenção de Brasília de 1971
e hoje com o Tratado de Porto eguro de 2000.
61 Sobre esta, v. Curso ..., cit., págs. 299 e segs., e autores citados.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
propo ta adequada em matérias sobre a quai e e cidadão con iderem nece ário um
ato jurídico da União a aplicar o Tratado (art. Ii n° 4). 0,
III - De todo o modo, não pode confundir- e a cidadania da União com a cidada-
nia em entido próprio que atrá ver ámo ; nem e apre enta uficientemente den o e
abrangente o elenco de direito a que ela e reporta - direito un para rem exercido
em nível da União, outro em ní el interno do E tado - para e poder falar num ac r o
autónomo e com alor a e.
ão há uma cidadania europeia, equi alente à cidadania e tatal, porque o tratado
europeu não a definem à margem do E tado.62 ão e te que livremente continuam a
fixar quem é eu cidadão e, apena como ua decorrência, e fica ndo cidadão da União.
Mai do que obrepo ição dá- e, poi , aqui uma conexão entre o momento primário -
dentro de cada E tado - e o momento ecundário - relati o à União Europeia.
Como e creve Rui de Moura Ramo ,no Tratado de Pari e Roma o direito
do cidadãos dos Estado -membro giravam obretudo em tomo de uma realidade eco-
nómica; não se dirigiam à pe oa como cidadãos, ma enquanto participante num
proce o económico. O Tratado de Maa tricht, com a in tituição da cidadania da União
em repre entar a mudança do paradigma dominante ao a entar o centro de gra idade
d certo direito de caráter público no homem europeu e não já no operador económico,
elevando-o a im ao tatu de verdadeiro cidadão europeu.
Simple mente, a cidadania da União é bem diver a da cidadania e tatal. Trata- e de
um estatuto muito mais frágil e que não pretende sub tituí-Ia, antes se lhe vindo obre-
por. E tal fragilidade resulta da sua falta de autonomia em relação à nacionalidad do
E tado -membro e re ulta do conjunto de direito que nela e nglobam.63
62 o próprio Tratado sobre o funcionamento da União estabelece que é cidadão da União qualquer pes-
soa que tenha a nacionalidade de um Estado-membro. A cidadania da União acresce à ciadania nacio-
nal e não a substitui (art. 20º, nº 1).
63 Maastricht e os direitos do cidadão europeu, in A União Europeia, obra coletiva, Coimbra, 1994, págs.
127 e 128; e, do mesmo Autor, A cidadania da União: caraterização, conteúdos e desenvolvimentos, in
Revista de Legislação e de Jurisprudência, nº 3939, Julho-Agosto de 2006, págs. 352 e segs. V. também
Les Aspects Nouveaux de la Libre Circulatin des Personnes: vers une citoyenneté européenne, obra cole-
tiva, Lisboa, 1992; FERNANDOLOUREIROBASTOS,A União Eurapeia - Fins, Objetivos e Estrutura Orgânica,
Lisboa, 1993, págs. 45 e segs.; ANA MARIA MARTINS, O Tratado da União Eurapeia - Contributo paro
a sua compreensão, Lisboa, 1993, págs. 50 e segs.; Los derechos dei eurapeo, obra coletiva, Madrid,
1993; VINCENZO L1PPOLlS,La cittadinanza europea, in Quaderni Costituzionali, Abril de 1993, págs. 113
e segs.; GILES SÉBASTlEN,La citoyenneté de rUnion Européenne, in Revue du droit public, 1993, págs.
1.263 e segs.; FRANCISCOLUCASPIRES,Os novos direitos dos Portugueses, Lisboa, 1994, e Múltiplos da
cidadanio: o caso da cidodania europeia, in AB VNO AD OMNES - Nos 75 onos da Coimbra Editora,
obra coletiva, Coimbra, 1998, págs. 1.267 e segs.; MARIA LuíSA DUARTE,A cidodania da União e o res-
ponsobilidode dos Estados por violação do Direito Comunitário, Lisboa, 1994, máxime págs. 25 e segs.
e O estatuto de cidadão da União e a (não) discriminação em razão da orientação sexual, in Estudos
em memória do Prafessor Doutor António Marques dos Santos, obra coletiva, 11,Coimbra, 2005, págs.
361 e segs.; NUNO PiÇARRA, Cidadania europeia, direito comunitário e direito nacional, in O Direito,
1994, págs. 185 e segs. e 409 e segs.; MARIA ELISABETEGOMES RAMOS, Breves notas sobre a cidadania
da União Europeia, in Temas de Integração, 1º semestre de 1996, págs. 63 e segs.; Luís SÁ, A crise ...,
cit., págs. 440 e segs.; CARLAGOMES, A natureza constitucional do Tratado da União Europeia, Lisboa,
Parte II I Estrutura do Estado
No entanto, ob erva ainda o mesmo Autor, ape ar de tudo não e e camoteie o ca-
ráter simbólico do e tatu to do cidadão da União. Ao reforçar o sentimento de pertença
a um todo integrado dos nacionai de todo e de cada um dos Estado -membros que o
compõem, ele não é de pido de eficácia tran formadora no que re peita ao relacionamen-
to entre estes dois polos.64
1997, págs. 55 e segs.; PILAR SUAREZ PEREZ, Nacionalidad estatal y ciudadania europea, Madrid, 1998;
SÉRGIO BARTOLE, La cittadinanza e /'identità europea, in Quademi Costituzionali, 2000, págs. 39 e segs.;
JosÉ BARROS MOURA, Cidadania Europeia - Uma construção racional, Lisboa, 1999; GIOVANNI CORDINI,
La cittadinanza europea. Profili dei diritti costituzionale comunitario e comparatto, in 1/ Politico, 2003,
págs. 65 e segs. LUIS MARIA DIEZ-PICAZO, Citoyenneté et identité européenne, in Revue Européenne de
Droit Public, 2003, págs. 771 e segs. ; FAUSTO DE QUADROS, Direito da União Europeia, Coimbra, 2004,
págs. 114 e segs.; MARTIN P. VINK, Limits of European Citizenship, in Cidadania no pensamento politico
contemporâneo, obra coletiva, S. João do Estoril, 2007, págs. 239 e segs.; ISABEL ESTRADA CARVALHAIS,
op. cit., págs. 150 e segs.; JORGE PEREIRA DA SILVA, op. cit., págs. 59 e segs.
Sobre a situação anterior, v. MARIA ISABEL JALLES, Os direitos da pessoa na Comunidade Europeia, in
Documentação e Direito Comparado, n!! 2,1981, págs. 27 e segs.; ou MOITINHO DE ALMEIDA, Direito Co-
munitário - A ordem jurídica comunitária - As liberdades fundamentais na C. E. E., Lisboa, 1985, págs.
397 e segs.
§ lº
Poder e soberania
o E tado urge em virtude de se instituir um poder que tran forma uma coletividade
em povo. Esta in tituição é (como alientámo) um fenómeno jurídico - ainda quando
na ce à margem de atos previ to em norma ordenada a es e re ultado; e a própria
criação revolucionária do poder é portadora de juridicidade plena, pois que não ó define
relações jurídica entre o cidadãos como se funda no Direito natural ou, e se preferir, na
ideia do Direito dominante na coletividade em certa circun tância.1
Constituir o E tado equivale a dar-lhe a ua primeira Constituição, a lançar as ba es
da ua ordem jurídica, a dispor um e tatu to geral de governante e governado. Todo o
Estado, porque constituído, tem Con tituição ne ta aceção e era assim também antes do
con titucionali mo moderno.
O poder político é, por con equência, um poder constituinte enquanto molda o Es-
tado segundo uma ideia, um projeto, um fim de organização. E este poder con tituinte
não ce a quando a on tituição fica aprovada; ele perdura ou e tá latente na vigência
de ta, confere-lhe con i tência, pode substituí-la por outra em face da realidade política
económica e social sempre mutável.
Ma o E tado não exi te em si ou por si; exi te para re olver problema da ocie-
dade, quotidianamente; exi te para garantir segurança, fazer ju tiça, promover a comu-
nicação entre os homens, dar-lhe paz e bem-e tar e progresso. É um poder de deci ão
no momento pre ente, de e colher entre opçõe diversa, de praticar o atos pelo quai
ati faz preten õe generalizada ou individualizadas das pessoas e dos grupo. É auto-
ridade2 e é serviço.3
Repartido juridicamente por órgão e agente do Estado, o poder toma por outro
lado, a configuração de um conjunto de competências ou poderes funcionais de tai ór-
I - O Estado não pode, pois, viver à margem do Direito (nunca é demais insistir).
Ele atua sempre através de processos ou procedimentos jurídicos ou de operações mate-
riais que remontam a normas de competência. Significa isto, porém, que o poder político
se submete efetivamente ao Direito? Significa isto que os detentores do poder observam,
na prática, a Constituição e a lei?
Mesmo que haja um ou mais órgãos encarregados de velar pela conformidade dos
atos do Estado com o Direito, quis custodiet custodes? A quem cabe a última palavra?
Em definitivo, quem decide eventuais conflitos e declara as situações jurídicas recíprocas
das entidades públicas e dos particulares?
E, declarado o direito, tem de se passar à execução. Admitindo que um tribunal pro-
fere uma sentença desfavorável ao Estado - o que, à primeira vista, dir-se-ia paradoxal,
porquanto o tribunal funciona como órgão desse mesmo Estado -, será possível obrigá-lo
a prestar-lhe acatamento? Como explicar a execução das sentenças pelo Estado?
Por ser de homens, a autoridade está tão propensa a infringir as normas jurídicas
como a liberdade humana individual. Tem então de se averiguar se é racional recorrer a
um sistema de sanções. Pois, se algum indivíduo viola a lei, logo aquela autoridade, de
regra, o vai ferir de uma sanção; ao passo que o Estado é o próprio titular do poder san-
cionatório e, como tal, aparentemente, insuscetível de a sofrer.
Recai-se, de novo, na controvérsia sobre o conceito de Direito. A opinião ainda
dominante fala em coercibilidade. Mas, como não se afigura fácil explicar como pode o
Estado ser objeto de sanção coativa, de duas uma: ou a coercibilidade é caraterística de
norma jurídica, e então o Direito público não é Direito na plena aceção do termo; ou a
coercibilidade não é caraterística do Direito.
Este o problema da limitação jurídica do poder político, conforme habitualmente é
posto.
adesão às teses que afirmam a limitação do Estado pelo Direito - mesmo pelas leis por si
decretadas - porque sem o seu cumprimento não subsistiria a organização indispensável
ao perdurar do poder e seria destruída a segurança em que assenta a comunidade jurídica.
o Estado está adstrito ao seu próprio Direito positivo, seja este qual for, por uma
necessidade lógica de coerência e de coesão social. E isto até porque, como diz Gustav
RADBRUCH,4 "o positivismo jurídico e político pressupõe, quando levado logicamente
às suas últimas consequências, um preceito jurídico de direito natural na base de todas
as suas construções". Eis esse preceito: "Quando numa coletividade existe um supremo
governante, o que ele ordenar deverá ser obedecido." Ora, só os governantes, pela cir-
cunstância de o serem, se acham em condições de poder pôr termo por meio dum ato de
autoridade à luta das opiniões - ou melhor, em condições de poderem impor, eles, uma
decisão e de a tomarem eficaz -, o que equivale a reconhecer unicamente neles o poder
de garantir a segurança do direito. Mas se esta garantia da segurança jurídica é que cons-
titui o fundamento e o título justificativo do poder dos governantes para fundar e criar
o direito ... são ainda essa mesma garantia e essa mesma segurança jurídica que devem
afinal servir também de limites a esse mesmo poder. Continua Radbruch: "Só por via da
obrigatoriedade das suas leis e da certeza dessa obrigatoriedade é que o Estado tem o po-
der legislativo. Mas uma tal certeza e a segurança que lhe está ligada desapareceriam, se
o Estado pudesse, ele próprio, libertar-se da obrigatoriedade das suas leis. Ou, por outras
palavras: pode dizer-se que o Estado não é chamado ao poder de legislar senão porque
promete, e não pode deixar de prometer, sujeitar-se às leis que ele próprio faz; esta sujei-
ção é a condição para ele poder ser chamado a legislar. E, assim, pode também se dizer
que os dois preceitos jurídicos de direito natural- o que estabelece o poder legislativo de
todo o governante e o que estabelece a sujeição desse mesmo governante às suas próprias
leis - se acham indissoluvelmente ligados um ao outro. Os governantes cessariam de
ter o direito de legislar, desde que procurassem fugir ao cumprimento e respeito devido
às suas próprias leis, comprometendo assim, eles próprios, a segurança jurídica. É no
mesmo momento em que o poder é assumido por alguém que é também por esse alguém
assumida, necessária e iniludivelmente, a obrigação de fundar um Estado de direito ...
Em resumo: é ainda um direito suprapositivo e natural que obriga o Estado a manter-se
sujeito às suas próprias leis. O preceito jurídico que isto determina é o mesmo que serve
de fundamento à obrigatoriedade do direito positivo".
4 Filosofia do Direito, 4ª ed. portuguesa, Coimbra, 1961, 11, págs. 134 e segs. Cfr., entre tantos, JosÉ
TAVARES, Ciência de Direito Político, cit., págs. 79 e segs.; MAURICE HAURIOU, Précis .., cit., págs. 17 e
segs. e 79 e segs.; BALLADORE PALLlERI, op. cit., 11;CASTANHEIRA NEVES, Questão de facto - questão de
direito, Coimbra, 1967, págs. 537 e segs.; MARCELLO CAETANO, Direito Constitucional, cit., I, págs. 327 e
segs.; MARTIN KRIELE, Einführung in die Staatslehre, 1972, trad. castelhana Introducción a la Teoria dei
Estado, Buenos Aires, 1980, págs. 17 e segs.; JORGE REIS NOVAIS, Contributo para uma teoria do Estado
de Direito, Coimbra, 1987; REINHOLD ZIPPELlUS, op. cit., págs. 383 e segs.; JosÉ LUIS PEREZ TRIVINO, Les
limites juridicos ai soberano, Madrid, 1998; Luc HEUSCHLlNG, État de Droit, Rechtsstaat, Rule of Law,
Paris, 2002; CEZAR SALDANHA SOUZA JÚNIOR, A supremacia do Direito no Estado Democrático e os seus
modelos básicos, Porto Alegre, 2002.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
rIr - Pode con iderar- e, não em razão, e te tipo d limitação do E tado pelo Di-
r ito como puramente fonnal: porque, e o E tado de e obediência à ua I i enquanto
igorem, também pode re ogá-Ia , sub tituindo ou negando o direito e garantia qu
daquela con tem.
o entanto, diante do condicional i mo político, conómico, ociai e culturai
em que o E tado e move, podem os go ernante encontrar ob táculo para retirar ou
apagar direito e garantia do indivíduo e do grupo, poi a reaçõe e a resistência
nem empre ão de afa tar e, na no a época, ganham re onância internacional. E, por
outro lado, a forma jurídica po uem um dinami mo próprio, i to que a lei, uma
ez decretada , de prendem- e de quem a tenha feito, ai m por i e o eu objetivo pod
ervir intençõe ou intere e diferente do que ti eram em i ta o eu autore.5
IV - Para além di to, que já é muito, importa ter em conta que a limitação do poder
político pode e deve procurar- e noutra ede: em ede de uma limitação material, e não
ó formal, atravé de um conteúdo precetivo que e impõe por i ou atra é da referência
a valore permanente e uperiore a qualquer deci ão política.
Do que e trata então não é de limitação pela fonna do ato, mas de limitação por nor-
ma que impeçam o poder de invadir (ou deixar in adir por outro podere ociai) a e fera
própria das pe oa. Limitação material ignifica di ciplina do poder - inclu i e, do pod r
con tituinte -, contenção do go ernante e defe a dos direito do go emado ; traduz- e no
re pito pela autonomia de te último; implica in trumento jurídico de garantia.
ejam quai forem o fin, a limitação do poder depende, em última in tância, da
conceção de go ernante e go ernado obre a ua relaçõe recíproca, do equilíbrio
entre liberdade e autoridade em acrifício, em ca o algum, da primeira à egunda ( ai o
em e tado de nece idade), da eti tiva ob ervância pelo governante do direitos do
governados e da consciência que e tes po uam tanto do eu direito como do eus
devere cívico .
Um E tado com fin muito reduzidos pode na experiência ivida, ai aguardar pior
a ti ra li re da p oa do que um E tado com dilatado fin , por não lhe dar ou tirar-
lhe egurança no exercício do dir ito e por naquilo em que intervém, e afinnar pre-
potente e arbitrário. Tal como, em contrapartida, mai acentuada interv nção do E tado
pode de tinar- e ju tamente a dar condiçõe de liberdade e igualdade à pe oa.
Tudo consi te em aber se, diante do fin que o E tado atual é capaz d le ar a cabo,
há ou não re peito pela liberdade individual e in titucional. omente e verifica limitação
quando o Estado - pelos ponto fixos em que a enta, p lo fundamento para que apela,
pela coerência da ua política com os princípio e valore proti ado - admite e promo-
ve e ta liberdade na ua ação concreta, na prática.
Ei um ti ixe d pergunta cuja re po ta tem de e encontrar, agora, não tanto no
terr no da Filo ofia jurídica e política quanto no terreno da Hi tória e do Dir ito público
po iti o. É aqui que e vão encontrar diferente ituaçõe e r gime político; é aqui qu
e exibe uma maior ou menor inculação do E tado a norma jurídica de ua la ra ou
de origem que o tran cende - com o inerente reflexo no cidadão e na comunidade
política em geral; é aqui que tem ou não entido falar em E tado de Direito, na aceção
exata do terrno.6•7
J[ - ão quer i to dizer que todo o E tado tenha de ser, em pura lógica, democrático.
A hi tória antiga e contemporânea prova-o à aciedade. O traço caraterístico da democracia
- como governo contraposto à autocracia - con i te em algo mai do que ne a relação do
poder político com a comunidade e até, e e perfilhar um mínimo de conceção democráti-
ca de legitimidade do governante, em algo mai do que na origem popular do poder.
om efeito, uma coi a é a titularidade do poder no E tado, de crito como comuni-
dade, organização e pessoa coleti a e poder e e nece ariamente exercido por órgão ,
agente , entidade ou pe oa fi ica no de empenho de erviços ou funçõe em eu
beneficio ou a ele imputado; outra coi a (importa empre ter pre ente) a titularidade do
poder no po o, conjunto de cidadãos dotado de direito de participação ativa na vida
pública (o direito político).
Para lá da criação do E tado, ó deve falar- e em princípio democrático (distinto,
por exemplo, do princípio monárquico) quando o povo é o titular do poder constituinte
como poder de fazer, decretar, alterar a on tituição po itiva do E tado. só deve falar-
e em go erno democrático, oberania do po o, oberania nacional ou soberania popular
6 Cfr. Manual ... , IV, cit., págs. 30 e segs. e 216 e segs., e autores citados.
7 O que fica escrito no texto situa-se explicitamente no estrito campo do Direito constitucional, não no
da Filosofia do Estado. Concerne ao modo como se suscita e verifica (ou não se verifica) a limitação do
poder na experiência jurfdicapalítica, não ao fundamento da limitação do poder ou à fundamentação
do próprio poder. E, por isso, não se justifica criticar a nossa visão, apodando-a de positivismo socio-
lógico (como faz FREITASDO AMARAL, Apreciação do currfculo ... , in Revista da Faculdade de Direito da
Universidade de Lisboa, 1985, págs. 377 e 378).
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
III- eja como for, é nece ário con iderar em conjunto a titularidade e o exercício
do pod r (gro o modo o a peto e tático e o a p to dinâmico do pod r), porquanto:
8 Torna-se, assim, possível tentar conciliar a doutrina (de origem alemã) da soberania do Estado com a
doutrina (de origem francesa) da soberania do povo.
9 Cfr. infra.
10 Cfr. A Constituição de 1976, cit., págs. 365 e segs.
11 Cfr., por exemplo, JELlINEK, op. cit., págs. 331 e segs.; MARNOCO E SOUSA, Direito Político - Poderes do
Estado, Coimbra, 1910, págs. 7 e segs.; ROCHASARAIVA,Construção Jurídica de Estado, Coimbra, 1912, I,
págs. 34 e segs.; JORGECARPIZO,La soberania dei pueblo en el Derecho interno y en ellnternacional, in
Revista de Estudios Politicos, nº 28, Julho-Agosto de 1982, págs. 195 e segs.; MASSINO SEVEROGIANNINI,
Sovranità (diritto vigente), in Enciclopedia dei Diritto, XLIII, 1990, págs. 224 e segs.; REINHOlD ZIPPElIUS,
op. cit., págs. 74 e segs.; LUIGI FERRAJOll, La sovranità nel mondo moderno, Bari, 1997; o nº 1 de 1998
de Fundamentos - Cuaderno monografico de Teoria dei Estado, Derecho Publico e Historia, Oviedo;
MARTIN LOUGHlIN, Swords and Scales, Oxónia-Portland, 2000, págs. 111 e segs.; ou LoulS FAVOREUet
alii Droit Costitutionnel, 5~ ed., Paris, 2003, págs. 35 e segs.; MARIA LÚCIA AMARAL, A forma da Repú-
blica, Coimbra, 2005, págs. 321 e segs.; EMERSONGARCIA, Influxos de ordem jurídica internacional na
protecção dos direitos humanos: o necessário redimensionamento da soberania, in Justitia (revista do
Ministério Público de São Paulo), nº 198, 2008, págs. 117 e segs.
Parte 11I Estrutura do Estado _
A im para Jel1inek, a nota e encial do E tado é a exi tência de um poder que não
se deriva de nenhum outro, que procede dele próprio e de harmonia com o eu próprio
direito. Onde haja uma comunidade com tal poder originário e m io co rciti o de do-
mínio obre os seu membros e o eu território, no âmbito da ua ordem jurídica, aí exi te
um E tado. oberania significa capacidade de auto-organização e auto inculação.14
egundo anti Romano, o E tado é empre oberano em face da ua ordem jurídica,
poi a oberania deve er ista perante a ordem jurídica que a tabelec. Uma coi a é a
soberania atribuída ao E tado pelo eu Direito interno, outra coi a a que lhe pode er ou
não atribuída pelo Direito de uma comunidade como o Direito de um tado federal ou
o Direito internacional.'5
Para Kel en, a oberania é uma qualidad de Direito, da ontad do tado con i-
derada como ordem jurídica na sua e fera e p cífica de alidad . Um E tado é oberano
quando a ordem nele per onificada é uma ordem uprema in u cetí el de ulterior funda-
mentação, quando é uma ordem jurídica total, não parcial.16•17
TIl- Problema diferente con i te em aber, no plano e tritam nte interno do Estado
(e não já em relação a outra entidade compreendida no eu eio), qual a manife tação
e pecífica ou mai qualificada da oberania ou em aber qual o verdadeiro titular (políti-
co) da oberania ou o órgão hegemónico do aparelho do poder.
A te e clá ica ão a legi lativa a executiva : a primeira encontram a e -
ência da ob rania na emis ão da lei (a im, BODl , Lo K , Ro u), a egunda,
no momento da execução ou da coerção (a im, HOBBE ). E também há quem ligue a
ob rania ao poder d emitir mo da, ao d lançar impo to ,ao d punir ou ao de recrutar
tropa . A im como há quem ustente que oberano é quem d creta o tado de e ceção
( RL HMITI).18-19
oa unto não tem que er propriam nte com a condiçõe de exi tência do E tado.
Pertence, ante, ao domínio da funçõe do órgão, ao da forma d go emo ao do
regime político .
23 Assim, COSTANTlNOMORTATI,Note introdutive ad uno studio sulle garanzie dei diritto dei singoli nelle
formazioni sociali, in Scritti in onore di Salvatore Pugliotti, obra coletiva, 111,Milão, 1978, pág. 1.575. Cfr.
infra.
24 Cfr. DIOGO FREITASDO AMARAL, Curso ..., cit., I, pág. 878.
25 Na doutrina, sobretudo italiana, distinguiu-se durante muito tempo, entre autarquia e autonomia.
Haveria autarquia nas hipóteses b) e c), ligando-se autonomia (de acordo com a ordem etimológica) à
criação de normas; e é interessante a aproximação entre autonomia pública, autonomia privada e au-
tonomia coletiva. Cfr. SANTIROMANO,Autonomia, in Frammenti di un dizionario giuridico, reimpressão,
Milão, 1953, págs. 14 e segs.; MASSIMO SEVEROGIANNINI, Autonomia, in Studi di Diritto Costituzionale in
memoria di Luigi Rossi, obra coletiva, Milão, 1952, págs. 197 e segs.; GUIDO ZANOBINI,Autonomia pub-
blica e autonomia privata, in Scritti vari di diritto pubblico, Milão, 1955, págs. 391 e segs.; GIUSEPPINO
TREVES,Autarchia, autogoverno, autonomia, in Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico, 1957, págs. 277
e segs.; SABINOCASSESE, Autorchia, in Enciclopedia dei Diritto, IV, págs. 324 e segs.; ENRICOGUSTAPANE,
"Autarchia'~ Prafilo storico de un termine giuridico in disuso, in Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico,
1980, págs. 200 e segs.; ALBERTOROMANO,Autonomia nel Diritto Pubblico, in Digesto delle Discipline
Pubblicistiche, obra coletiva, 11, Turim, 1987, págs. 30 e segs. E, na doutrina de outros países, por exem-
plo, ROCHASARAIVA,Construção ..., cit., 11, pág. 93, nota; DANIELVIGNES,Sur la notion d'autonomie en
drait constitutionnel, 1956, págs. 88 e segs.; ARMANDO MAROUESGUEDES,Autarquia, in Verbo, 111,pág.
67; BIGOTIE CHORÃO,Autonomia, in Dicionário Jurídico da Administração Pública, I, págs. 606 e segs.;
VITALMOREIRA,Administração ..., cit., págs. 66 e segs.
Parte II I Estrutura do Estado _
o nexo entre ambo o termo não e mo tra, contudo, tão unívoco quanto pareceria
prima facie, por mai de um motivo:
1°) Porque na descentralização parte- e do E tado para pessoa coletiva por ele cria-
das ou com podere por ele outorgado, ao pas o que na ub idiariedade o movi-
mento é inver o, é a cendente, e em último termo arranca da ociedade civil;
2°) Porque, por i o mesmo, a ub idiariedade dir- e-ia mais adequada a um E tado
federal do que a um Estado unitário (embora nem sequer esteja pre ente em
toda a conceçõe de federalismo);
3°) Porque e a ub idiariedade deve entender- e como garantia da descentraliza-
ção, não é só por si garantia suficiente - tudo depende do juízo que, em cada
momento, se faça acerca das necessidades coletiva e acerca do modo e do
meios de as ati fazer.
nal e organização da poder, obra coletiva (org. de André Ramos Tavares, George Salomão Leite e Ingo
Wolfgang Sarlet), São Paulo, 2010, págs. 93 e segs.
Capítulo V
O TERRITÓRIO DO ESTADO
a) ó exi te poder do E tado quando ele con egue impor a sua autoridade, em
nome próprio, sobre certo território;
b) A atribuição de per onalidade jurídica internacional ao E tado ou o eu reconhe-
cimento por outro E tado d pende da efetividade de e poder'
e) órgão do E tado encontram- e empre ediado ai o em situação d ne-
ce idade, no eu território;
d) o eu território cada E tado tem o direito de excluir podere concorrente de
outro tado (ou de preferir a ele ).
e) o eu território, cada E tado ó pode admitir o exercício de podere doutro
E tado obre quai quer pe oa com a ua autorização'
j) O cidadão ó podem beneficiar da plenitude de proteção do eu direito pelo
re peti o E tado no t rritório de te.
1 Sobre o território em Direito constitucional, v. JELLlNEK.op. cit., págs. 130 e 295 e segs.; JosÉ TAVARES,
Ciência do Direito Político, cit., págs. 257 e segs.; ROCHASARAIVA,Construção jurídica ...• cit .• 11, págs. 30 e
2 Sobre o território em Direito internacional. v. KELSEN, Théorie du Droit International Public, cit., loe.
cit., págs. 204 e segs.; AlFRED VERDROSS,op. cit.. págs. 202 e segs.; BRIERlY,Direito Internacional, trad .•
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Continuação do nota 1
segs.; SMENO, op. cit., págs. 103 e segs.; HELLER, op. cit., págs. 166 e segs., 245, 265 e 281 e segs.; SAN-
TI ROMANO, Principii ..., cit., págs. 50-51, 52, 53 e 78 e segs., e Osservazioni nella natura giuridica dei
territorio dello Stoto, in Scritti Minori ..., I, Milão, 1950, págs. 167 e segs.; CARLO CERETII, Costituzione e
territorio, in Scritti in memorio di V. E. Orlondo, obra coletiva, I, Milão, 1957, págs. 397 e segs.; COSTAN-
TINO MORTATI, Istituzioni ..., cit., I, págs. 130 e segs.; VEZIO CRISAFULLI, Lezioni..., cit., I, págs. 73 e segs.;
MARCELLO CAETANO, Direito Constitucional, cit., I, págs. 162 e segs.; GIUSEPPE CHIARELLI, Territorio dello
Stato, in Novissimo Digesto Italiano, XIX, 1977, págs. 196 e segs.; MARTIN KRIELE, op. cit., págs. 123 e
segs.; TEMISTOCLE MARTINES, Diritto Costituzionale, cit., págs. 153 e segs.; FRANCO FAROELLA, op. cit.,
págs. 134 e segs. e 150 e segs.; GIORGIO LOMBAROI, Spazio efrontiera tra eguaglianza e privilegio: proble-
mi costituziona/ifra storia e diritto, in Diritto e Società, 1985, págs. 47 e segs.; THOMAS FLEINER-GERSTER,
op. cit., págs. 165 e segs.; BISCARETII DI RUFFIA, Territorio, in Enciclopedia dei Diritto, XLIV, págs. 333 e
segs.; MÁRIO LúCIO QUINTÃO SOARES, op. cit., págs. 179 e segs.; REINHOLO ZIPPELlUS, op. cit., págs. 108 e
segs.; ALESSANORO DI MARTINO, 11 território; dallo Stato-Nazione alia Globalizzazione, Milão, 2010.
Continuação da nota 2
Lisboa, 1965, págs. 159 e segs.; MARQUES GUEDES, Território ..., in Verbo, XVII, pág. 1.428; MANUEL DIEZ
DE VELASCO, op. cit., I, págs. 256 e segs.; CELSO DE ALBUQUERQUE MELLO, op. cit., I, págs. 717 e segs.;
AZEVEDO SOARES, op. cit., págs. 219 e segs.; IAN BROWNLlE, op. cit., págs. 107 e segs.; MALCON N. SHAW,
International Law, 3~ ed., Cambridge, 1991, págs. 276 e segs.; FRANCISCO REZEK, Direito Internacional
Público, cit., págs. 163 e segs.; SILVA CUNHA, Direito Internacional Público (A Sociedade Internacional),
4~ ed., Lisboa, 1993, págs. 207 e segs.; JEAN COMBACAU e SERGE SUR, op. cit., págs. 417 e segs.; NGUYEN
Quoc DINH, PATRICK DAILLlER e ALAIN PELLET, op. cit., págs. 408 e segs. e 459 e segs.; PIERRE-MARIE Du-
PUY, op. cit., págs. 778 e segs.; JORGE BACELAR GOUVEIA, op. cit., págs. 651 e segs. e 709 e segs.; WLAOI-
MIR BRITO, Direito Internacianal Público, Coimbra, 2008, págs. 354 e segs.
I - e o ordenamento jurídico e tatal parece regular ante de mai fato que ocor-
rem dentro do território, ele não e gota aí a ua alidade e a ua eficácia. Criado em
função da pe oa que compõ m a comunidade a ua política - o cidadão - aplica- e-
lhe, ou pode aplicar- e-lhe onde quer que e encontrem.7
uced i to com a lei ci il e com a lei con titucional com a lei tributária e até com a lei
p nal. E há m mo regra jurídica e tatai ditada ju tamente tendo em vi ta a ua aplica-
ção no e trangeiro ou por cau a de ituaçõe ou relações que decorram no e trangeiro.
orno e cre e ntónio Marque do anto a doutrina clá ica (que remonta a a-
igny) pronunciou- e decididamente a fa or da territorialidad da norma de Direito pú-
blico, entendida e ta no entido de que cada tado aplica a tai norma indi tintamente no
eu território a nacionai e e trangeiro independentemente do que determina e quanto a
e te último, a re peti a lei do domicílio enquanto lei reguladora do e tatuto pe oal.
id ia da não aplicação do Direito público e trangeiro e tá hoje abandonada com
ba e na conte tação ou no e batimento da difer nça entre Direito público e Direito pri a-
do, na nece idade de incrementar a cooperação internacional e na indi pen abilidade de
incrementar a harmonia internacional de oluçõ também no âmbito de matéria de Di-
reito público (o que não significa que não haja graves problema, como o da qualificação
da regra de Direito público e trangeiro e o da sua autolimitação e pacial).11
7 Sobre a aplicação das leis no espaço em geral, cfr., por todos, OLIVEIRAASCENSÃO,O Direito -Introdução
e Teoria Geral, 11~ ed., Lisboa, 2001, págs. 563 e segs.
8 Sobre as relações de remissão entre sistemas jurídicos, JosÉ DIAS MARQUES, Introdução 00 Estudo do
Direito, 4~ ed., Lisboa, 1972, págs. 372 e segs.
9 As regras de conflitos (de Direito internacional privado) permitem tanto a aplicação de normas de Direi-
to material brasileiro no exterior como a aplicação de normas de Direito material estrangeiro no Brasil.
10 Cfr. BALLADOREPALLlERI,op. cit., págs. 89 e segs.; NORBERTOBOBBIO, Teorio dell'ordinamento giuridico,
Turim, 1960, págs. 185 e segs.; FRANÇOISRIGAUX, Le pluralisme juridique face au principe de réalité, in
Estudios de Derecho Internacional- Homenaje aI Profesor Miaja de la Muela, obra coletiva, I, Madrid,
1979, págs. 291 e segs., máxime 295 e segs.; PIERREMAYER, Lerôle du droit public en droit international
privé, in Revue international de droit comparé, 1986, págs. 467 e segs.
11 As normas de aplicação imediata no Direito Internacional Privado, Lisboa, 1990, 11, págs. 767 e segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Mais ainda: se o poder do E tado obre o território implica que toda a pe oa que aí
se encontra e tá, no limites do Direito internacional, sujeita à ua autoridade, i o não
impede que po a ser exercida dentro do território uma autoridade que não der i e do
próprio E tado, desde que e trate de uma autoridade não e tatal. É o que ucede com a
autoridade da famílias e com a das Igreja ,a quai e exercem, decerto, em coordena-
ção com a autoridade estatal, nun plano, e em ubordinação, noutro ,ma nunca por
mera derivação da vontade do E tado.
Dá-se isto tanto em Estado unitário como em Estado compo to (quando con iderado
todo o seu território, ou orna dos territórios dos Estados componentes, em relação ao
poder político central).
Ill- O território é um limite para o poder político efetivo, não para o povo. Os cida-
dão do Estado, em perderem a cidadania, podem sair do território e viver no estrangeiro
e aqui continuam a pertencer ao povo. Já o vimo atrá.
a) Como direito real, como direito sobre coisas - seja como e pécie de propriedade
de Direito internacional (te e clá ica),16 como e pécie de domínio eminente
(U o FORTI),17 ou como direito real institucional, direito que põe o bem do terri-
tório ao erviço da in tituição e tatal (DABIN, B RD AU); 18
b) orno mero reflexo do Direito do Estado sobre as pessoas (J LU EK)19ou como
direito do E tado obre a própria pe oa (SA TI ROMA 0)20 - coerentemente,
num ca o e noutro, com tomar-se o território como elemento con titutivo do
E tado;
15 E há uma relação estreitíssima entre a territorialidade típica do Estado saído da Revolução Francesa e a
afirmação do princípio da igualdade perante a lei, a soberania popular e a lei como expressão da von-
tade geral; não por acaso se afirmam a unidade e a indivisibilidade da República (GEORGIO LOMBARDI,
op. cit., loc. cit., págs. 52-53 l.
16 Cfr. RENATOALESSI,Intorno ..., cit., loc. cit., págs. 10 e 11.
17 li diritto dello Stato sul territorio, in Studi di Diritto Pubblico, I, 1937, págs. 197 e segs., máxime 216 e
segs.
18 Op. cit., li, pág. 97.
19 Op. cit., págs. 298 e segs.
20 Osservaziani sulla natura giuridica dei territorio dello Stato..., cit., lac. cit., págs. 167 e segs. Cfr. ROCHA
SARAIVA,ap. cit., pág. 32; ou BISCARETIIDI RUFFIA, op. cit., loc. cit., págs. 337 e 339.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
c) orno imple âmbito e pacial de vigência da ordem jurídica e tadual, poi Di-
reito e tado id ntificam- e (KEL E );2'
d) orno dir ito de juri dição, dir ito qu abrang imultaneam nte o território e a
pe oa no território ou, melhor, a pe oa através do território.22-23
III - Propendemo para a teoria do direito de juri dição, tal ez hoje dominante,
por no par cer amai idónea a explicar a complexidade de fenómeno e a alientar que
o poder do E tado obre o eu território importa não tanto por cau a do paço fi ico,
em i, que abrange, ou da utilidade que ele daí retira, quanto por cau a da pe oa
que lá e encontram e que, então, de certa forma, ficam ujeita ao eu ord namento
jurídico.
E ta teoria aproxima- e da tese do direito real, enquanto toma o território como
objeto e, por i o, pode adotar mutati mutandi alguma da análi e que ela propõem.
Di tingue- e dessa teses, por procurar er para além da configuração e tática e patrimo-
niaP4 e por dar todo o realce à relação, de natureza política, com a pe oa. O poder de
mandar e a autoridade pública só podem er exercidos sobre pe oa .25 O direito obre o
território não é fundamento do direito de enhorio, ma o contrário, e o direito à integri-
dade do território não é enão o direito ao re peito do enhorio.26
Por outro lado, não deixa a teoria dajuri dição de colher algun contributo das dua
outra teoria, ma afa ta-se, liminarmente, de amba ,em irtude da difer nça de i ão
global acerca do E tado.
28 Cfr. GIUSEPPECAVARRETTA, Diritti sui territori oltrui, Palermo, 1905; SUZANNEBASTIO,Les problémes territo-
rioux dans la jurisprudence de la Cour Internationale de Justice, in Recuei! des Cours, 1962, 111,págs. 365 e
segs.; ELlEVAN BOGAERT,The Lease of Territory in International Law, in Miscellania W. J. Ganshof van der
Meersch, Bruxelas, 1972, págs. 315 e segs.; IAN BROWNLlE,op. cit., págs. 110 e segs.; BISCARETIIDI RUFFIA,
op. cit., loc. cit., págs. 350 e segs.; SILVACUNHA, op. cit., págs. 267 e segs.; JORGEBACELARGOUVEIA,O di-
reito de passagem inofensiva no novo Direito do Mar, Lisboa, 1993, págs. 98 e segs.; NGUYENQuoc DINH,
PATRICKDAILlERe ALAIN PELLET,op. cit., págs. 479 e segs. (falam em competências territoriais "menores").
29 Situação de Bósnia entre 1878 e 1905 ou de Chipre entre 1878 e 1914.
30 Situação da zona do Canal do Panamá até há pouco.
31 Os mandatos constituídos ao abrigo do Pacto da Sociedade das Nações (Palestina, Sudoeste Africano, etc.).
32 Ou territórios sob tutela previstos no capo XII da Carta das Nações Unidas.
33 No sentido clássico e de que pode aproximar-se o direito de uso de bases militares em território estrangeiro.
34 O antigo direito de passagem de Portugal entre Damão e Dadrá e Nagar-Aveli.
35 Cfr. C. D'OLlVIER FARRAN,Os enclaves internacionais e o problema das servidões em Direito internacio-
nal, in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbro, 1957, págs. 38 e segs.
36 Frequentes na América Latina no século XIX.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
pode tomar medida de fi calização nece ária a pre enir ou r primir infraçõe - pre e-
nir infraçõe da ua nonna aduaneira, fi cai, de imigração ou anitária reprimir a
infração de quai quer nonna (art. 33° da on enção de Montego Bay, d 19 2).
A zona económica exclu i a, por seu lado não pod e tender- e para além de 200
milha (art. 57° da me ma Convenção). Ape ar d aí e falar em "direito de oberania"
(art. 56°), na realidade a ela liga- e um conjunto de podere tipificado relativo ao re-
cur o naturais, à exploração e ao aproveitamento económico e àjuri dição quanto a ilha
artificiai , inve tigação científica e meio marinho (art. 56°). Ao me mo tempo, implica
determinada obrigaçõe (art. 61° e eg .) e o demai E tado gozam da liberdade de na-
vegação e de obre 00, bem como de outro u o internacionalmente lícito (art. 58°).37
IV - Acre cente- e que há ou tem ha ido ainda território obre o quai nenhum
E tado exerce enhorio ou oberania, ma tão ó upremacia,39 e territóri obre o quai
nenhum poder e exerce (território neutro).
Além di o, tem havido até território ob admini tração direta de organizaçõe
internacionais sem mediação de quaisquer E tado .40-41
37 Cfr. RUI MACHETEe GIL GALVÃO,Consequêncios do evolução do Direito Internacional do Mor nos trata-
dos e acordos de pescas que Portugal subscreveu, in Relaçães Internacionais, 1982, págs. 21 e segs.;
VICENTEMAROTIA RANGEL,O Direito do Mar e a sua unificação legislativa entre países de língua por-
tuguesa, in Estudos em Homenagem ao Pro! Doutor A. Ferrer Correia, I, Coimbra, págs. 69 e segs.;
PEREIRACOUTINHO,Poderes do Estado costeiro sobre os recursos vivos da zona económica exclusiva, in
O Direito, 1988, págs. 371 e segs.; MARQUESGUEDES,Direito do Mar, Lisboa, 1989, págs. 103 e segs. e
115 e segs.; PEDROMACHETE,A zona económica exclusiva: um conceito do novo direito internacional do
mar, in Direito e Justiça, 1991, págs. 221 e segs.; ANGELADELVECCHIO,Zana economica exclusiva, in En-
ciclopedia deI Diritto, XLV,1993, págs. 1.176 e segs.; JORGEBACELARGOUVEIA,Zona económica exclusiva,
in Dicionário Jurídico da Administração Pública, VII, 1996, págs. 611 e segs.; FAUSTODEQUADROS,JORGE
BACELARGOUVEIAe PAULOOTERO,Portugal e o Direito do Mar, Lisboa, 2004, págs. 71 e segs.
38 Assim, o Sudão, anglo-egípcio antes de 1956, ou as Novas Hébridas (hoje Vanuatu), anglo-francesas até 1981.
39 A cidade de Berlim, entre a segunda guerra mundial e 1990.
40 Assim, o Sarre, entre 1919 e 1935; a Nova Guiné Ocidental, entre 1962 e 1963; de jure (mas não de
fato); o Sudoeste Africano ou Namíbia de 1966 a pouco antes da independência em 1990; Camboja em
1992 e 1993; de certo modo, Cossovo, desde 1999; Timor Leste entre 2000 e 2002; e foi também para
a internacionalização de Jerusalém que apontou a resolução nº 181/11,de 29 de Novembro de 1947, da
Assembleia Geral das Nações Unidas.
Sobre Timor Leste, v. a já referida obra coletiva Timor e o Direito.
41 Cfr., sobre o assunto, MERCEDESSOLADOMINGO, La competência de administración de territorios por las
organizaciones internacionales, in Revista Espanola de Derecho Constitucional, 1982, págs. 125 e segs.
Parte 11 I Estrutura do Estado _
o problema da aqui ição de direito sobre terra livre ou em dono (ou tida como
em dono) foi, como e abe da mai alta importância quando do Descobrimento e da
expan ão colonial.
Hoje, num mo imento inver o, é uma noção de "património comum da humani-
dade" que ai apar cendo. A on enção da ações Unidas obre o Direito do Mar, de
19 2, acolheu-a ao e tab lecer que o fundos marinho do alto-mar e os eu recur o ão
património comum da humanidade (art. 136° e eg .).42 O me mo poderá vir a acontecer,
em futuro próximo, à Antártida (sujeita de de 1959 a um tratado pelo qual não e reco-
nhece obre ela qualquer preten ão territorial).
Quanto ao alto-mar ele é declarado, pelo costume e pela referida Convenção (art.
87°), aberto a todo o E tado quer co teiro , quer de provido de litoral.
42 Cfr. MAHOMED BEDJAOUI, Para uma nava ardem económica internacional, trad., Lisboa, 1980, págs. 239
e segs.; RENÉ-JEAN Dupuy, La natian de patrimaine commum de I'humanité apliquée aux fands marins,
in Draits et libertés à la /in du X~'"" siec/e- Études af/ertes à C. A. Colliard, obra coletiva, Paris, págs. 197
e segs.; ROBERT A. GOLDWIN, Le droit de la mer: sens commun contre «patrimoine commun», in Revue
Générale de Drait International Public, 1985, págs. 719 e segs.; PAULO OTERO, A Autoridade Internacio-
nal dos Fundos Marinhos, Lisboa, 1988; SILVA CUNHA, op. cit., págs. 317 e segs.; JosÉ MANUEL PUREZA, O
património comum da humanidade, Porto, 1998, págs. 173 e segs.
43 MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, 11, 9~ ed., Lisboa, 1972, pág. 857. Cfr. JosÉ PEDRO
FERNANDES, Domínio Público, in Dicionário Jurídico da Administração Pública, IV, págs. 166 e segs.;
ANT6NIO MENEZES CORDEIRO, Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral- tomo 11, Lisboa, 2000,
págs. 35 e segs.; RUI MACHETE, O domínio público e a rede elétrica nacional, in Revista da Ordem dos
Advogados, 2001, págs. 1.367 e segs.; ANA RAQUEL GONÇALVES MONIZ, O domínio público. O critério e o
regime jurídico da dominialidade, Coimbra, 2004; JosÉ Luís BONIFÁCIO RAMOS, Domínio público e domí-
nio privado: mitos e sombras, in O Direito, 2009, págs. 815 e segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Por outro lado, nem todo o domínio público equivale a propriedade pública, poi o
conceito de propriedade exige a po ibilidade de apropriação.
Finalmente, por património do E tado entende- e o conjunto do ben do eu do-
mínio público e privado e dos direitos e obrigaçõe com conteúdo conómico de que o
E tado é titular, como pe oa coleti a de direito público.
44 Neste sentido, ANDRÉ GONÇALVESPEREIRA,Contribuição para uma teoria geral do Direito Municipal, cit.,
págs. 226 e segs. Cfr. FREITASDO AMARAL, op. cit., I, pág. 420, que fala numa tripla função: de identifica-
ção, de definição da população e de delimitação das atribuições e competências das autarquias e dos
seus órgãos.
45 Também se discute na doutrina acerca da natureza do poder que o município exerce sobre o território
municipal (de qualquer modo menos intenso do que o poder de jurisdição do Estado). Cfr., numa atitu-
de crítica e negativa, CANNADA BARTOU, Osservazioni intorno a taluni aspetti dei territorio comunale, in
Scritti giuridici in memoria di V. E. Orlando, obra coletiva, I, Pádua, 1957, págs. 273 e segs.
V., ainda, lIvlo PALADIN, 11territorio degli enti autonomi, in Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico, 1961,
págs. 607 e segs.; MARIO NIGRO, GIi enti pubblici con dimensione territorialmente definita, ibidem, 1976,
págs. 351 e segs.; GARCIA DE ENTERRIAe TOMAS-RAMON FERNANDEZ,Curso de Derecho Administrativo, I,
5! ed., Madrid, 1990, págs. 385 e segs.
Parte 11I Estrutura do Estado ••
§ lº
As formas de Estado em geral
II - Forma de tado não equi alem a tipo hi tórico de E tado, tal como, de de
JELLI EK, ão enumerado (E tado oriental, E tado grego E tado romano, E tado medie-
ai ou preten o E tado medie ai e E tado moderno).'
O tipo hi tórico de tado ão forma de organização política corre pondentes a
conceçõe gerai obre o E tado enquanto ociedade política ao lado de quai quer outra
ociedade humana e, doutro pri ma , a forma de ci ilização e a e tádio hi tórico
determinado . Já a forma de Estado apena têm que er com a conceçõe e o quadros
de relacionamento entre poder, por uma parte, e comunidade política (bem como territó-
rio), por outra parte.
O conceito de forma de Estado ó e toma erdadeiramente operacional no interior
de um me mo tipo hi tórico de E tado. Em rigor, ó intere a di tinguir E tado unitário
e E tado federal no âmbito do E tado moderno de tipo europeu e, especialmente, a partir
do de pontar do con titucionali mo.
1lI - Forma de E tado não e confundem com forma d governo e com i tema
de go mo.
1 V.supra.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
2 V. o nosso estudo Governo (Formos e sistemos), in PoJis, 111,págs. 76 e segs.; ou BARBOSADE MElO,
Democracia e Utopia, Coimbra, 1980, pág. 40.
3 MARNOCO E SOUSA, Direito PoJitico - Poderes do Estado, Coimbra, 1910, pág. 105.
4 KElSEN, Teorio General..., cit., pág. 409.
5 CHARLES,EISENMANN, Cours de Droit Constitutionnel Comporé, policopiado, Paris, 1950-1951, pág. 43.
6 QUEIROZ LIMA, op. cit., pág. 162.
7 Seguindo BURDEAU,op. cit., 11, 2! ed., págs. 347-348.
8 ARMANDO MARQUES GUEDES,Teoria ..., cit., pág. 41.
Parte 11I Estrutura do Estado ••
Il- O E tado unitário tanto pode ser Estado unitário centralizado como Estado uni-
tário de centralizado ou regional.
Se todo ou qua e todos o Estado do mundo admitem descentralização admi-
ni trativa, quer de âmbito territorial - atravé de municípios ou comunas e através de
circun crições mais va ta 12 -, quer de âmbito in titucional ou funcional - atravé de
a ociações, fundaçõe , in tituto ou outra entidade pública -, ó algun E tado com-
portam de centralização política. E não é a de centralização admini trativa, ma im a
política que aqui importa.
E ta de centralização política é sempre em nível territorial: ão províncias ou
regiões que e tomam politicamente autónomas por os seus órgãos desempenharem
funções política, participarem, ao lado do órgão e tatais, no exercício de alguns po-
9 Cfr. infra.
10 Ou talvez melhor: unicidade.
11 BURDEAU (Traité ..., cit., 11, 2~ ed., pág. 348) alude ainda a unidade ou pluralidade de ideias de Direito,
mas este critério é de rejeitar em nome, exatamente, da distinção entre regime e forma de Estado. Em
qualquer Estado, ainda que composto, dificilmente pode admitir-se mais de um regime ou mais de uma
ideia de Direito.
12 A descentralização administrativa territorial pode ser, assim, consoante os países, municipal, provincial
ou, simultaneamente, municipal e provincial.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
dere ou competência de caráter legi lati o e governati 0.13 Daí que e fale em E tado
regional. 14
111 - Por ua vez, o E tado compo to ora e configura como federação ou E tado
federal,15 ora e configura como união real. um ca o e noutro, a ua ba e de organiza-
ção é tamb' m geográfica ou territorial. 16
Quer na federação quer na união real, regi ta- e uma a ociação ou união de E tado
dando origem a um no o E tado que o ai englobar ou integrar. A diferença e tá em que
na federação e criam órgão completamente di tinto do órgã do E tado -membro
e todo um i tema jurídico e político-con titucional no o, nquanto que na união real e
apro eitam algun dos órgãos do E tado -membro elevando-o a comun . A e trutura
fi derati a é de sobrepo ição; a da união real, defu ão ou de comunhão institucional.
IV - A maior parte dos E tados do mundo, ontem e hoje, con tituem- e em E tado
unitário e centralizados. Isso não ignifica que a forma unitária seja a forma normal de
existir do E tados. Tão normai como o E tado centralizado ão o E tado regional o
Estado federal.
o que pode dizer-se, entretanto, é que no eio do E tado compo to exi tem em-
pre E tado unitário. O E tado componente ão, em geral, com rarí ima exceçõ ,
imediatamente E tado unitário . E, claro está, qualquer E tado, me mo o stado federal,
é unitário no sentido de que, em i, na re petiva e trutura interna, o eu p der é uno (ou,
se e preferir, único).
13 Poderia imaginar-se ainda descentralização política a nível institucional: através, por exemplo, da atri-
buição de faculdades legislativas a organismos corporativos. Mas não se conhecem exemplos de tal
fenómeno, que seria como que a revivescência do Estado esta mental ou corporativo da passagem da
Idade Média para a Idade Moderna. O chamado sufrágio orgânico ou a participação de representantes
de organizações socioprofissionais em órgãos do Estado, deliberativos ou consultivos, tem índole diver-
sa, pois, que, de qualquer modo, tudo se passa aí no interior dos órgãos do Estado.
14 Aliás, região tem a mesma raiz de regere (governar).
15 Defoedus, aliança, tratado.
16 Uma exceção parece ser, até certo ponto, o federalismo belga, em face da Constituição de 1993, com a
sua estrutura compósita de regiões e comunidades. V. FRANCIS DELPÉRÉE, Le fédéralisme belge, in Revue
européenne de drait public, 1993, págs. 29 e segs.
Parte II I Estrutura do Estado _
17 Cfr. GASPARREAMBROSINI, Un tipo intermedio di Stato tra I'unitario e il federale caratterizato dal/'autono-
mia regionale, in Rivista di Diritto Pubblico, 1933, págs. 92 e segs.; GUIDO LUCATElLO,Lo stato regionale
quale nuova forma di Stato, in Atti dei primo convegno di studi regionali, Pádua, 1955, págs. 136 e segs.;
CHARLESOURAND,De I'État fédéral à I'État unitaire décentralisé, in L'évolution du droit public - Études en
I'honneur d'Achille Mestre, obra coletiva, Paris, 1956, págs. 193 e segs.; JUAN FERRANDOBADIA, Formas dei
Estado desde la perspetiva dei Estado regional, Madrid, 1964; CLAUDEPALAZZOLl,Les régions italiennes.
Contribution à I'étude de la décentralisation politique, Paris, 1966; FAUSTODEQUADROS,A descentraliza-
ção das funçães do Estado nas províncias ultramarinas portuguesas, Braga, 1971; AMÂNCIO FERREIRA,As
regiões autónomas na Constituição portuguesa, Coimbra, 1980, págs. 11 e segs.; RAFAElENTRENA CUESTA,
Estado regional, Estado autonómico, Estado federal, in Administración y Constitución - Estudios en ho-
menaje ai Professor Mesa Moles, obra coletiva, Madrid, 1982, págs. 209 e segs.; JUANGONZÁLEZENCINAR,
EI Estado unitario regional, Madrid, 1985; GARCIADE ENTERRfA,Estudios sobre autonomias territoriales,
Madrid, 1985; ANTONIO O'ATENA,Costituzione e Regioni, Milão, 1991; L'État autonomique; forme nouvelle
ou transitoire en Europe?, obra coletiva, Paris, 1994; Louls FAVOREUet alii, op. cit., págs. 411 e segs.
18 No Estado regional parcial e no Estado regional heterogéneo pode falar-se em regionalismo assimétrico.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
1lI - O grau de de centralização aria muití imo; de de regiõe que pouco mai
par cem do que coleti idade admini trativa a regiõe que par cem E tados-membro
de uma federação. Geralmente, o e tatuto ão-Ihe outorgado p lo poder central, ma
há ca o (a regiõe italiana, a regiõe autónoma portugu a) em que la chegam a
participar na elaboração e na revi ão de e e tatuto .22
A maior emelhança po ível entre E tado regional e Estado federal dá- e quando
aquele é integral e a regiõe, além de faculdade legi lativa ,po uem faculdade de
auto-organização. Me mo a im, porém, cabe di tinguir:
Juridicamente o E tado federal dir- e-ia criado pelo E tado componente. Pelo
contrário, a regiõe ão criada p lo poder central, e a atribuiçõe política que têm
tanto podem ir a er alargada como extinta por este. Mai ainda: o E tado fed ral
de aparecer, em princípio o E tado federado adquirem ou readquirem plena ob rania
de Direito internacional; não a sim a regiõe autónoma, a quai ,como quai quer ou-
19 Cfr. RUI DE MOURA RAMOS,A Declaração conjunta luso-chinesa na perspetiva do Direito internacional, in
Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 1998, págs. 678 e segs.; JosÉ CASALTANA-
BAIS, Região Administrativa Especial de Macau: federalismo ou regionalismo?, ibidem, 2001, págs. 433
e segs.; JORGEBACELARGOUVEIA, A Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau - Contributo
para uma compreensão de Direito Constitucional, in Homenagem ao Pra! Doutor André Gonçalves
Pereira, obra coletiva, Coimbra, 2006, págs. 261 e segs.; WEI DAN, Soberania nacional e autonomia
territorial: reflexão sobre o constitucionalismo chinês e as Leis Básicas de Hong Kong e Macau, in Direito
e Cidadania, nº 29, 2009, págs. 239 e segs.; One Country, Two Systems, Three Legal Orders - Perspec-
tives of Evolution - Essays on Macau's Autonomy after the Resumption of Sovereignity by China, obra
coletiva, Berlim-Haidelberga, 2009.
20 Cfr. AUGUSTO NASCIMENTO, O papagaio e o falcão. A génese da autonomia na ultraperiférica ilha do
Príncipe, in Autonomia e Histária das Ilhas, obra coletiva, Funchal, 2001, págs. 275 e segs.
21 Esta ainda com a situação particular das duas províncias de Trento e Bolzano.
22 No sentido de que só haveria verdadeiramente Estado regional quando existisse tal participação das
regiões na sua própria organização, FAUSTODE QUADROS, op. cit., págs. 58 e segs.
23 Ibidem, op. cit., pág. 62.
Parte 11I Estrutura do Estado _
l-A par da autonomia regional, que é etl ito de de centralização política ou político-
admini trati a, conhece- e a autonomia (ou talvez melhor uma gama algo di er ificada
de fonna de autonomia) de que ão dotada certa comunidades territoriai dependente
doutro E tado ou em regime e peciais.
Trata- e aqui de um conceito empírico de tinado a de cre er algo de ituado entre
a não autonomia territorial e o e tatu to de E tado independente2S-26ou entre a não au-
tonomia territorial a integração em E tado independente, em igualdade com quai quer
outra comunidade que de te façam parte.
a) Autonomia deri ada de antigo laço feudai (a Ilha de Man e a Anglo- or-
manda em relação à oroa Britânica);27
b) Autonomia ligada a vínculo coloniai ou emicoloniai (a colónias autónoma
e emiautónoma britânica, como foram ante de acederem à independência
qua e todo os paí es do Commonwealth e como ainda hoje ão a Bennuda
e Gibraltar; de certo modo, os territórios ultramarino france e como a ova
28 Cfr., sobre os territórios ultramarinos franceses, THIERRYMICHALON, La République Française, une fédé-
ration qui s'ignore?, in Revue du droit public, 1982, págs. 623 e segs.; FRANÇOISLUCHAIRE,L'autonomie de
la Polynésie française devant le Conseil Costitutionnel, in Revue du droit public, 1996, págs. 953 e segs.
29 Sobre o estatuto de Berlim, v. HONORÉ MARC CATUDAl, Origins and Early Development of the Berlin
Problem, in Revue de droit international, 1983, págs. 81 e segs.
30 Cfr. JORGEMIRANDA, Ordem constitucional e fiscalização de constitucionalidade em Macau, in O Direito,
1991, págs. 693 e segs.; CARLOSBLANCO DE MORAIS, A organização do poder político-legislativo no ter-
ritório de Macau - durante e após a transição para a soberania chinesa, in Estudos em homenagem ao
Pra! Doutor Rogério Soares, obra coletiva, Coimbra, 2001, págs. 133 e segs.
31 Cfr. RUTH LAPIDOTH, op. cit., loc. cit., págs. 384 e segs.
Parte 11I Estrutura do Estado
comunidade na definição da ua própria organização (pág. 100), para ele trata-se essen-
cialmente do conceito de "fragmentos de Estado" ou "País" (Land) como descritivo de
ituações em que se deparam algum ou algun do elemento do E tado, ma não todo
- quer dizer, situaçõe na quai , em vez de povo, território e poder político aparecerem
reunidos, aparecem dissociados uns dos outros (pág. 57). E naturalmente, por isso, J LL1-
EK exclui de te conceito o E tados federado .32
32 Cfr. as observações críticas de SANTI ROMANO, Sui cosidetti "Stoats!ragmente'; in Scritti Minori, I, págs.
41 e segs.: os três elementos do Estado só o são quando todos reunidos; se não há os três juntos, tam-
bém não há nenhum, também não há "fragmentos de Estados". Ou as de KELSEN,Teoria General ..., cit.,
págs. 249 e segs.: só a grande diversidade e a forma política existente nos territórios parciais e certos
aspetos de natureza ético-política podem ocultar a unidade jurídica e conduzir à hipótese perturbadora
de uma forma peculiar de descentralização.
33 Parte da doutrina sustenta, por isso, que a união real não é um novo Estado, mas uma associação de
Estados, mais próxima da confederação do que da federação: v., por todos, GARCIA PELAVa, Derecho
Constitucional Comparado, 8ª ed., Madrid, 1967, págs. 206 e segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
, O titular do órgão e não o próprio órgão. A união real é r guiada por uma on tituição
ou por outro ato jurídico e pecífico' a união pe oal nonnalmente (embora n m empre
re ulta da mera coincidência de de ignação da p oa do hefe do E tado pelo Direito
próprio de doi ou mai paí e .
Acre cente- e uma nota interessante obre as Comunidades Europeias: é que tendo
urgido originariamente eparada - Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, Comu-
nidade Económica Europeia e omunidade Europeia de Energia Atómica - fundiram as
suas instituiçõe a partir de 1965, embora tenham mantido distintas as individualidades
jurídica e a competência do re petivos órgãos à luz dos eu tratado con titutivo ;
mas com a criação da União Europeia, e ta ituação eria progre sivamente ultrapa sada.
41 Cfr. JORGE MIRANDA, União de Estodos, in Verbo, XVIII, págs. 439 e segs., e autores citados.
42 Cfr. ALEXIS DE TOCQUEVILLE, op. cit., I, pág. 224; Louls LE FUR, État Fédéral et Confédérations d'États,
Paris, 1986; CARL J. FRIEDRICH, Constitutional Government and Democracy, 1950, trad. francesa La Dé-
mocratie Constitutionnelle, Paris, 1958, págs. 164 e segs.; ALFRED VERDROSS, op. cit., págs. 280 e 281;
PAUL REUTER, Confédération etfédération, in Mélanges offerts à Charles Rousseau, obra coletiva, Paris,
1974, págs. 209 e segs.; Luclo LEVI, Confederazione, in Dizionario di Política, págs. 211 e segs.
43 Cfr. JELLlNEK, Teoria General ..., cit., págs. 577 e segs.; LABAND, Le Droit Public de /'Empire Allemand,
trad., I, Paris, 1960, págs. 202 e segs.; CARRÉ DE MALBERG, op. cit., I, págs. 90 e segs.; RUDOLF SMEND, op.
cit., págs. 176 e segs. e 235 e segs.; KELSEN, Teoria General ..., cit., págs. 272 e segs.; MICHEL MOUSKHÉLY,
111 Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
La théorie juridique de I'État Fédéral, Paris, 1931; CARL SCHMITI, Teoria ..., cit., págs. 417 e segs.; GUIDO
LUCATELLO, Lo Stato Federale, I, Pádua, 1939; PABLO LUCAS VERDU, Estodo Federal, in Nuevo Enciclopedia
Juridica, IX, Barcelona, 1958, págs. 1 e segs.; Guv HÉRAUD, Aspects juridiques de la génese fédérale, in
Estudios Juridico-Sociales en Homenaje ai Professor Luis Legaz y Lacambra, obra coletiva, Santiago de
Compostela, 1960, 11,págs. 885 e segs.; GEORGES BURDEAU, Traité ... , cit., 11,págs. 461 e segs.; GARCIA PE-
LAVO, op. cit., págs. 215 e segs.; Le fédéralisme et le développement des ordres juridiques, obra coletiva,
Bruxelas, 1971; E. STEIN, Derecho Politico, trad., Madrid, 1973, págs. 107 e segs.; WILLlAM H. STEWART,
Concepts of Federalism, Lanham, 1984; STANISLAW EHRLlCH, Theoretical Reflections ou Federations and
Federalism, in Revue internationale de science politique, vol. 5, n2 4, 1984, págs. 359 e segs.; OLIVEIRA
BARACHO, Teoria geral do federalismo, Rio de Janeiro, 1986; STÉPHANE RIALS, Destin du fédéralisme,
Paris, 1986; PAULCHARLES GOOSSENS, Esquisse d'une typologie différentielle du fédéralisme, in Présence
du Droit Public et des Droits de I'Homme - Mélanges offerts à Jacques Velu, obra coletiva, 11,Bruxelas,
págs. 929 e segs.; Fédéralisme et Cours Suprêmes, obra coletiva, Bruxelas, 1991; SERGIO ORTONI, In-
troduzione ai diritto costituzionale federativo, Turim, 1993; Quali dei tanti federalismi, obra coletiva,
Pádua, 1997; DIRCÊO TORRECILLAS RAMOS, O federalismo assimétrico, São Paulo, 1998; OllVIER BEAUD,
Fédéralisme et souveraineté: notes pour une théorie costitutionnelle de la fédération, in Revue du droit
public, 1998, págs. 83 e segs.; AUGUSTO ZIMMERMANN, Teoria Geral, cit.; MÁRIO LúCIO QUINTÃO SOARES,
op. cit., págs. 427 e segs.; LOUIS FAVOREU et alii, op. cit., págs. 377 e segs.; MARIA LÚCIA AMARAL, Afor-
ma ..., cit., págs. 328 e segs.; JESSICA BULMAN-POZEN e HEATHER K. GERKEN, Uncooperative Federalism, in
Yale Law Journal, 2009, págs. 1.256 e segs.
47 Referendos ou votações populares em que os resultados são apurados por Estados, não bastando a
maioria obtida pela soma de votos em toda a união.
48 Cfr. G. LEIBHOLZ,La Rappresentazione nello Democrozia, trad., Milão, 1989, págs. 286 e segs.
49 E podem ser consideradas normas centrais da Constituição federal precisamente as que traduzem estes
grandes princípios organizativos da forma federal: cfr. RAÚLMACHADO HORTA,Normas centrais da Consti-
tuição federal, in Revista de Informação Legislativa, nQ 135, Julho-Setembro de 1997, págs. 175 e segs.
50 A Rússia antes de 1991 era, assim, um Estado federal, mas não um Estado soberano de Direito inter-
nacional (o que mostra que não se pode simplesmente dividir os Estados soberanos em unitários e
federais).
De resto, pode haver ou tem havido federações de entidades políticas não estatais, como antigas fede-
rações coloniais britânicas (fndias Ocidentais, Rodésia e Niassa, Arábia do Sul).
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
A uniõe reai nunca agrupam mai de doi ou trê E tado e a indi idualidade con-
cr ta de cada um conta empre ba tante. Ma a fi deração tanto p de er apena de doi ta-
do fed rado (por exemplo, a h co lováquia ntr 1969 1992), ou d meia dúzia (a Au -
trália, a ex-Iugo lávia) como de vária dezena (o E tado Unido, o México, oBra il).
Há Estados federais igualitário e não igualitário (o que e prende, qua e empre,
com diferenças de dimen ão territorial, humana ou económica do E tado federado) e
pode haver hegemonia de um E tado federado obre o demai (v.g., a Prú ia na Alema-
nha imperial ou a Rú ia na UR ).
Há federali mo de largo e paço e de p queno e paço. O E tado federado,
uma eze, têm grande exten ão populacional e territorial (como no E tado Unido no
Canadá no Bra il); outra veze, pouco mai ão que cidade ou di tritos (ca o do can-
tõ uíços ou de alguns dos Liinder alemãe). aquele a ulta a complexidade; ne te ,o
caráter qua e municipal, com implicaçõe político-admini trati a inerente.
VI - ituação particularí ima vem a ser a do Bra il, onde e articulam ti derali mo
em nível de E tado e regionali mo político em nível de Município.
egundo a on tituição de 1988, a organização político-admini trativa da República
compreende a União, o E tado o Di trito Fed ral e o Municípios, 'todo autónomo '
(art. I 0); compete ao Município legi lar obr a unto de int re e local, uplem ntar
a legi lação federal e a e tadual e in tituir e arrecadar tributo (art. 30°); e ele regem- e
por lei orgânica otada pela re peti a câmara municipai (art. 29°).
O município ão, poi ,entidade política integrante da trutura do E tado, m-
bora não propriamente entidade e tata i de 2° grau.51-52
51 Cfr. as diferentes visões de JosÉ AFONSO DA SILVA,O Município na Constituição, São Paulo, 1989, máxime
págs. 7 e 8; CARLOSMÁRIO DA SILVAVELLOSO,Estado Federal e Estado Federado na Constituição Brasilei-
ra de 1988: do equilíbrio federativo, in Revista de Informação Legislativa, 1992, págs. 66 e segs.; ANDREAS
J. KREIL,Diferenças de conceito, desenvolvimento e conteúdo da autonomia municipal na Alemanha e
no Brasil, in Revista de Informação Legislativa, nQ 128, Outubro-Dezembro de 1995, págs. 107 e segs.;
ROCHA FILHO, O município no Brasil: aspectos históricos, jurídicos e económicos, ibidem, págs. 237 e
segs.; MANOEL GONÇALVESFERREIRAFILHO, Comentários ..., cit., I, págs. 207 e segs.; ALESSANDROSILVEI-
RA, Configuração jurídico-constitucional do município brasileira, in Scientia Juridica, Julho-Setembro de
2005, págs. 451 e segs.; JOSÉNICO DE CASTRO,Direito Municipal Positivo, Belo Horizonte, 2006.
52 Além do Brasil, outros Estados federais contêm "distritos federais" destinados a colocar as respeti-
vas capitais fora de influência imediata de qualquer dos Estados federados (Estados Unidos, México,
Austrália). A sua natureza jurídica não se oferece fácil. Cfr. NINO OUVETII RASON, Washington D. C. tra
"centro" e "periferia", in Quademi Costituzionali, 1990, págs. 192 e segs.; GILBERTOTRISTÃO,O Distrito
Federal nas Constituiçães e na Revisão Constitucional de 1993, in Revista de Informação Legislativa, nQ
118, 1993, págs. 31 e segs.
Parte 11I Estrutura do Estado _
Em contrapartida, o poder con tituinte federal tem como limite ab oluto o re peito
do conteúdo e encial da oberania locai ; a lei do E tado federado fundam- e na
re peti a on tituiçõe , e não na on tituição federal;53 e à federação incumbe garantir
o exercício efeti o da autoridade do E tado federado .
11- m qua e todo o E tado federa i ,preveem- e matéria re ervada aos E ta-
do federado matéria re ervada à União e matéria concorrente, bem como di er a
forma d intervenção relati amente a ela (por meio de competência legi lativa e por
meio de competência executi a ).54
Há doi i tema típico. o federali mo c1á sico Estado Unido, uíça) procede-
e a uma repartição horizontal ou material: o duali mo de oberania envolve um dual i mo
legi lati o e executivo (o E tado federal faz e executa a ua lei, e o me mo fazem o
E tado ti derado). o federali m dito cooperativo (Alemanha), tende- e a uma repar-
tição ertical: o E tado federal legisla ou define a ba es gerai da legi lação e o E tado
federado executam ou de envolvem a ba e gerais.
53 Sobre lei do Estado federado e lei de região autónoma, cfr. Manual ..., v, cit., págs. 383 e 384.
54 V. os arts. 222 e segs. da Constituição brasileira.
55 V. ALEXIS DE TOCQUEVILLE, De la Démacratie en Amérique, I, cit., págs. 224, 231, 235 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
111- O fator político é, em cada paí determinado por pre upo to hi tórico -
modo como o E tado e con tituiu ou expandiu; pre upo to geográfico - afa tamento
entre a parcela do mesmo E tado' pre upo to nacionai ,culturai e étnico - diferen-
ciaçõe no po O' pre supostos ociai e económico - intere e a d fender ou di funçõe
ociai e económica a atender; pre upo to ideológico - filo ofia de centralização ou
de centralização e mo imento partidário ou não, favorá ei ou de fa orá ei .
Há federali mo de agregação ou centrípeto (E tado Unido, uíça, Alemanha) e
federalismo de de agregação ou centrífugo (Bra il, igéria). Há federali mo in titucio-
nal (E tado Unido, uíça, Alemanha), geográfico (Canadá, Bra il, Au trália), multina-
cional (Rú ia), linguí tico (Índia), tribal ou étnico (Nigéria). Há fi derali mo de origem
(Estado Unido, Austrália), de tradição (Alemanha), de imitação (México, Bra il, Ve-
nezuela), de nece idade (Índia), etc. E algo de emelhante poderia dizer- e do Estado
unitário descentralizado ou até do centralizado.
Hoje, a tendência parece er para o empolamento do poder central, quer eja único,
quer seja federal. Ao mesmo tempo, a si te- e a um realçar de certo a peto da de -
centralização política e admini trativa, advogado egundo o di er o quadrante (em
nome de uma maior funcionalidade, ou do particulari mo locai, ou de um princípio
de participação, ou do desenvol imento ou do equilíbrio económico- ocial). E, não raro,
56 V. Manual ..., I, cit., págs. 116 e segs. e 133 e segs., e autores citados.
Cfr. o cotejo (embora não em termos jurídicos) que OLIVEIRA MARTINS estabelece entre os federalismos la-
tino e germânico (em Teoria do Socialismo - Evolução política e económica das sociedades na Europa,
na edição de 1974, págs. 101 e segs.).
Parte 11 I Estrutura do Estado _
57 Cfr. KLAUSVON BEYME, Federalismo, in Marxismo y Democracia-Politica, obra coletiva, 111, trad., Madrid,
1975, págs. 45 e segs.; MICHel FROMONT,L'évolution du fédéralisme ollemand depuis 1949, in Mélanges
ofterts à Georges Burdeau - Le pouvoir, págs. 661 e segs.; Descentralist trends in Western Democra-
cies, obra coletiva, Londres, 1979; Federalismo y regionalismo, obra coletiva, Madrid, 1979; VERNON
BOGDANOR, The English Constitution and Devolution, in The Political Quarterly, 1979, págs. 36 e segs.;
1/federalismo statunitense fra autanamie e centralizzazione, obra coletiva, Bolonha, 1979; CONSTANCE
GREWE-LEYMARIE,Le fédéralisme coapératif allemand, Paris, 1981; nQ 16 de Pouvoir, 1981; MACHADO
HORTA,Reconstruçãa da federalisma brasileira, in Revista Brasileira de Estudos Políticos, 1982, págs. 60
e segs., e O Estado-membro na Canstituição federal brasileira, in Revista Brasileira de Estudos Políticas,
nOS69-70, Julho de 1989-Janeiro de 1990, págs. 61 e segs.; número de 1984 de Le Regioni; vol. 5, nQ 4,
de 1984, de International Political Science Rewiew; PHILlP MAWHOOD, The Palitics of Survival-Federal
States in the Third World, in Revue internationale de science politique, 1984, págs. 521 e segs.; BERNARD
SCHWARTZ,O federalismo norte-americano atual, trad., Rio de Janeiro, 1984; ANTONIO JIMENEZ-BLANCO,
Las relacianes de funcionamenta entre el pader central y los entes territoriales, Madrid, 1985; GIOVANNI
BOGNETII, Le Regiani in Eurapa: alcune riflessioni sui loro prabemi e sulloro destino, in Studi in onore di
P. Biscaretti di Ruffia, obra coletiva, Milão, 1987, págs. 91 e segs.; JosÉ MARIA BANO LEÓN, Las autona-
mias territoriales y el princípio de unifarmidade de las condiciones de vida, Madrid, 1988; ENOCHALBER-
TI ROVIRA,Las canvenios entre el Estado y las Camunidades Autónomas, in Anuario de Derecho Constitu-
cianal y Parlamentaria, 1990, nQ 2, págs. 71 e segs.; The territarial distribution af power in Europe, obra
coletiva, Friburgo, 1990; PETERHÃBERLE,Problemi attuali dei federalismo tedesco, in Giurisprudenza
Costituzionale, 1992, págs. 3.353 e segs.; MAURICE CROISAT,Le fédéralisme d'aujourd'hui: tendances et
controverses, in Revue française de droit constitutionnel, 1994, págs. 451 e segs.; Federalismo e Regio-
nalismo in Europa, obra coletiva (coord. por Antonio D'Atena), Milão, 1994; KEITH RUSEN,Federalism in
the Americas in the Comparative Perspective, in Inter-American Law Review, Outubro de 1994, págs.
1 e segs.; número de Dezembro de 1995 de Quaderni Costituzionali; MARC VERDUSSEN,Évoltuion du
fédéralisme, de la décentralisation et du régionalisme, in Five Decades of Constitutionalism - Reality
and Perspectives (1945-1995), obra coletiva, Basileia-Genebra-Munique, 1999, págs. 221 e segs.; PAULO
CASTRORANGel, Introdução ao federalismo contemporâneo, in Revista da Ordem dos Advogados, 2001,
págs. 789 e segs.; FRANCISCOFERNÁNDEZSEGADO,Reflexiones criticas en torno ai federalismo en Améri-
ca Latina, in Estado e Direito, nQ 27-44, 2001-2009, págs. 13 e segs.
58 Recordem-se os casos da União Soviética ou do Brasil entre 1964 e 1985.
59 Ou um dos aspetos do constitucionalismo moderno: op. cit., pág. 162.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
60 Recordem-se a luta pelos direitos civis no sul dos Estados Unidos e a reserva pela Constituição portuguesa
aos órgãos de soberania da legislação sobre direitos, liberdades e garantias (arts. 167º, 168º e 227º).
PARTE III
CONSTITUiÇÃO
TíTULO I
A CONSTITUiÇÃO COMO FENÓMENO JURíDICO
Capítulo I
SENTIDO DA CONSTITUiÇÃO
§ 12
Constituição e constitucionalismo
1 Para uma introdução histórica geral ao conceito de Constituição, V., entre tantos, JELlINEK, AlIgemeine
Staatslehre (1900), trad. Teoria General dei Estado, Buenos Aires, 1954, págs. 199 e segs.; SANTI Ro-
MANO, "Le prime carte costituzionali (1907)", in Scritti Minori, I, Milão, 1950, págs. 259 e segs.; MAU-
RleE HAURIOU, Précis de Droit Constitutionnel, 2ª ed., Paris, 1929, págs. 242 e segs.; CARL SeHMIIT,
Verfassungslehre (1927), trad. Teoria de la Constitución, Madrid e México, 1934 e 1966, págs. 45 e
segs.; CHARLESHOWARD Me ILWAIN, Constitutionalism Ancient and Modem, Nova Iorque, 1947; CARL
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
2 V., porém, CíCERO,De legibus, livro 111 (trad. portuguesa Das leis, São Paulo, 1967, pág. 95): "A missão
dos magistrados consiste em governar segundo decretos justos, úteis e conformes às leis. Pois, assim
como as leis governam o magistrado, do mesmo modo os magistrados governam o povo; e, com razão,
pode dizer-se que o magistrado é uma lei falada ou que a lei é um magistrado mudo."
3 Sobre a ideia de Constituição na Idade Média, v. PAULBASTlD,op. cit., págs. 49 e segs.
4 V. a descrição das Constituições ou formas de governo puras (realeza, aristocracia e república) no livro
111 da Política.
5 Cfr. WERNERJAEGER,Alabanza de la Ley, trad., Madrid, 1982, pág. 36.
6 Cfr. EMILlO CROSA,"11 concetto de Costituzione nell'Antichittà Classica e la sua modernità", in Studi di
Diritto Costituzionale in Memoria di Luigi Rossi, obra coletiva, Milão, 1952, págs. 99 e segs.; ou JEAN-
CHARLESJOBART,"La notion de Constitution chez Aristote", in Revue française de droit constitutionnel,
nº 65, págs. 97 e segs., 2006.
Parte 111I Constituição
lll- A "Lei Fundamentai "não regula am enão muito e par amente a atividade
do go emante e não traçavam com rigor a ua relaçõe com o go emado ; eram di-
fu a e aga; inda de longe a enta am no co tume e não e ta am ou pouca e ta am
documentada por e crito; apareciam como uma ordem u cetí el de ser moldada à me-
dida da e olução da ociedade .11 ão admira por i o, que e re ela em inadaptada
7 Cfr. CABRALDE MONCADA, "As ideias políticas depois da reforma: Jean Bodin", in Boletim da Faculdade
de Direito do Universidade de Coimbra, vol. XXIII, 1947, págs. 51-52; JEAN BARBEY,"Génese et consé-
cution des Lois Fondamentales", in Droit - Revue française de théorie juridique, 1986, págs. 75 e segs.;
PAULOFERREIRADA CUNHA, Teoria ..., I, cit., págs. 343 e segs.
8 V. a recolha de LOPESPRAÇA,Coleção de leis e subsídios para o estudo do Direito Constitucional Portu-
guês, Coimbra, 1983, vol. I.
9 Ensaio sobre a inconstitucionalidade das leis no Direito português, Coimbra, 1915, pág. 6. Sobre a evo-
lução das leis fundamentais desde a Restauração, v. págs. 10 e segs.
10 MARCELLOCAETANO,Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, 6ª ed., 11,Lisboa, 1972, pág. 410.
Sobre as tentativas de Constituição escrita nos séculos XIV-XV, cfr. História do Direito Português, Lisboa,
1981, págs. 455 e segs.; ANTÓNIO MANUEL HESPANHA,"Qu'est-ce que la 'Constitution' des Monarchies Ibé-
riques de l'Époque Moderne", in Themis (revista da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa),
ano I, nº 2, págs. 5 e segs., 2000; ANTÓNIO PEDROBARBASHOMEM, Judex Perfectus - Função jurisdicional
e estrutura judicial em Portugal-164D-182D, Coimbra, 2003, págs. 93 e segs. V. ainda MANUEL FILIPEMo-
RAISCANAVEIRA,"Testemunhos estrangeiros sobre as leis tradicionais da monarquia portuguesa (séculos
XVI e XVII)", in Constituições da Europa - Congresso, obra coletiva, Lisboa, 1992, págs. 107 e segs.
No sentido, porém, de ter havido não uma "Constituição informal" desde 1143, mas sete, com alte-
rações importantes, DIOGO FREITASDO AMARAL, "As sete Constituições informais da Monarquia portu-
guesa antes do Liberalismo", in Estudos em homenagem ao Pro! Doutor Martim de Albuquerque, obra
coletiva, I, Coimbra, 2010, págs. 431 e segs.
11 Escrevia GARRETT(Portugal na balança da Europa, na edição de Livros Horizonte, Lisboa, 1970, pág.
207): "Fundada em sólidos e naturais princípios, a antiga Constituição de Portugal pecava na forma;
já porque dispersa em várias leis escritas, em costumes e em usanças tradicionais, carecia de regula-
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
ridade e nexo de harmonia; já porque, destituída de garantias e remédios legítimos para os casos de
infração da lei positiva ou aberração do seu espírito, forçosamente corria o perigo de ser mal conhecida
e esquecida pela Nação, desprezada portanto e infringida pelo Governo."
12 Cfr. ZfUA OSÓRIO DE CAsTRO, Constitucionalismo vintista - Antecedentes e pressupostos, Lisboa, 1986,
págs. 8 e segs.
13 Recordem-se, contudo, já no séc. XVII, as Fundomental Orders of Connecticut (1621).
14 Op.cit., IV, págs. 23-24.
15 Cfr., entre nós, ANTÓNIO JosÉ BRANDÃO,Sobre o conceito de Constituição Político, Lisboa, 1944, máxime
págs. 95 e segs.; MARCELLOCAETANO,Direito Constitucional, I, Rio de Janeiro, 1977, págs. 391 e segs.
Parte 111I Constituição ••
16 The Federalist Papers (1787); na trad. portuguesa O Federalista, Brasília, 1984, págs. 577-578.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
obra do poder con tituído, mas sim do poder con tituinte. enhum poder delegado pod
alterar as condiçõe da ua delegação. '17
VIl- Le ada à última con equência ,e ta conceção equi aleria a con iderar a on-
tituição não apena como fundação ma tamb' m como fundamentação do poder público
e de toda a ordem jurídica. Porque é a on tituição que tabelece o podere do E tado e
que r gula a formação das norma jurídica e tatai ,todo o ato norma do E tado têm
de e tar em relação po itiva com a norma con titucionai ,para participarem também ele
da ua legitimidade; têm de er conforme com e ta norma para erem álido.
o entanto, a ideia de Con tituição como fonte originária, em termo lógico-jurídi-
co do ordenamento e tadual, como fundamento de validade da demai norma jurídi-
ca 18 e como repo itório de norma dir tamente invocávei pelo cidadão, não urgiu
logo ou da mesma maneira em amba a margen do Atlântico. Uma coi a . a verificação
a posteriori que a doutrina po a faz r, outra coi a o proce o hi tórico de formação do
imperativo normativo e do corre pondente in trumentos conceituai .
No E tado Unidos, até porque a on tituição de 1787 foi o ato con titutivo da
União, muito cedo se percebeu que ela era também, por i o me mo, a norma funda-
mentadora de todo o istema jurídico. Daí o pa o acabado de citar de HAMILTO (a im
como, de certo modo, O art. VI, n° 2, qualificando-a de "Direito upremo do Paí "); e daí
o corolário retirado, a partir de 1803, pelo upremo Tribunal de uma faculdade de apre-
ciação da con titucionalidade da lei .
Já na uropa (onde as ici itude política e con titucionai mam a er muito
meno lineare mai comple a que no E tado Unido) o caminho para o reconheci-
mento de um erdadeiro e pleno primado da on tituição foi mai longo, p r trê razõe
principai : porque, tendo em conta o ab oluti mo precedente, toda a pr ocupação e r -
porta a à ree truturação do poder político (em e pecial, do poder do Rei); porque pr a-
leeia o entendimento da lei (ordinária) como expre ão ou da razão ou da ontade g ral;
e porque não e qui ou não e pôde in tituir enão no século XX forma de fi calização
juri dicional da con titucionalidade.'9
17 Qu'est-ce que le tiers-état? (1789), na edição crítica de Roberto Zapperi, Genebra, 1970, págs. 180-181.
18 Como Constituição em sentido genética, enquanto conjunto das normas cuja validade (ou cuja eficácia)
se não fundamenta em nenhuma outra do mesmo ordenamento (MIGUEL GALVÃOTELES,"Constituição",
in Verba, V, págs. 1.499 e 1.500).
19 Cfr., entre tantos, GARCIA DE ENTERRíA,La Constitución como norma y el Tribunol Constitucional, Ma-
drid, 1981, págs. 501 e segs.; IGNACIODE ano, Derecho Constitucionol- Sistema de Fuentes, Barcelona,
1987, págs. 17 e segs. e 37; RAINERWAHL, "O primado da Constituição", in Revista da Ordem dos Advo-
gados, 1987, págs. 66 e segs.; nosso Manual ..., VI, 2! ed., Coimbra, 2005, págs. 108 e segs.
Parte 111I Constituição _
órgão . Ou, relendo o art. 16° da Declaração de 1789: "Qualquer sociedade em que não
esteja assegurada a garantia do direitos, nem estabelecida a separação dos poderes não
tem Con tituição."
Em vez de os indivíduo estarem à mercê do soberano, ele agora pos uem direitos
contra ele, impre critívei e inviolávei . Em vez de um órgão único, o Rei, passa a haver
outro órgãos, tais como Assembleia ou Parlamento, Mini tro e Tribunai independente
- para que, como preconiza Mo TE QUIEU, o poder trave o poder. Daí a nece idade duma
Con tituição de envolvida e complexa: pois quando o poder é mero atributo do Rei e os
indivíduos não são cidadão ,ma im úbditos, não há grande nece sidade de e tabelecer
em pormenor regras do poder; ma , quando o poder é decompo to em vária funçõe
apelidadas de poderes do E tado, então é mister estabelecer certa regra para dizer quais
ão o órgão a que competem e sa funçõe, quai são as relações entre esses órgão,
qual o regime do titulare do órgãos, etc.
A ideia de on tituição é de uma garantia e, ainda mais, de uma direção da garantia.
Para o con titucionalismo, o fim e tá na proteção que e conqui ta em favor do indivíduo,
do homen e cidadão , e a on tituição não pa a de um meio para o atingir. O Estado
constitucional é o que entrega à Con tituição o pro eguir a alvaguarda da liberdade e
dos direitos do cidadão, depo itando as virtual idades de melhoramento na observância
do seus preceitos, por ela er a primeira garantia de e direitos.20
Ma o constitucional i mo liberal tem ainda de bu car uma legitimidade que e con-
traponha à antiga legitimidade monárquica; e ela só pode ser democrática, mesmo quan-
do na prática e na própria lei constitucionais daí se não deduzam todo os corolários.
A Constituição é então a auto-organização de um povo (de uma nação, na aceção revolu-
cionária da palavra) o ato pelo qual um povo se obriga e obriga os seus repre entante ,
o ato mai elevado de exercício da soberania (nacional ou popular, consoante a conceção
que se perfilhe).
11- No século XX o fenómeno con titucional iria ofrer duas vici itude decisivas:
generalizar- e-ia, univer alizar-se-ia; e, simultaneamente, perderia a ua referência (ou
referência nece ária) a um conteúdo liberal.21
Por um lado, todo os regimes adotam uma Constituição (no entido moderno),
de de aqueles que, de uma maneira ou de outra mantêm Constituições vinda de época
anterior e o que con agram evolutivamente exigências sociais (o E tado ocial de Di-
reito) até ao que pretendem instaurar- e de novo (o E tado marxi ta-Ienini ta, o fa ci ta
e fa cizante, o de fundamental i mo i lâmico). E, do me mo modo, todo os Estados que
20 Nosso Contributo para uma teoria da inconstitucionalidade, Lisboa, 1968, pág. 32.
21 Cfr., entre tantos, GEORGESBURDEAU,"Une survivance: la notion de Constitution", in L'évolution du droit
public - Études en /'honneur d'Achille Mestre, obra coletiva, Paris, 1956, págs. 59 e 60; KARLLOEWENS-
TEIN, op. cit., págs. 213 e segs. e 224 e segs.; ROGÉRIOSOARES,Direito Público e Sociedade Técnica,
Coimbra, 1969; FRANCISCOLUCASPIRES,op. cit., págs. 53 e segs.; GEORGESBURDEAU,Traité ..., VII, VIII e
IX, 2ª ed., Paris, 1973, 1974 e 1976; MANUEL GARCIAPELAVO,Las transformaciones deI Estado Contem-
poraneo, Madrid, 1977; PABLOLUCASVERDÚ,"La Constitución en la crucijada", in Estado e Direito, IV, n9
14, 29 semestre de 1994, págs. 7 e segs.; PEDRODEVEGA, "La crisis dei concepto político de Constitución
en el Estado social", in Liber Amicorum FIX Zamudío, obra coletiva, S. José da Costa Rica, 1998, págs.
593 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
22 Op. cit., págs. 216 e segs.; e, antes, "Reflections on the Value of Constitutions in Our Revolutionary
Age", in Constitutions and Constitutional Trender after World War, obra coletiva, 11, Nova Iorque, 1951,
págs. 191 e segs.
23 GOMES CANOTILHO,Direito Constitucional, I, 2ª ed., 1980, págs. 96-97. Cfr., em linha próxima, HENCVAN
MAARSEVEN e GER VAN DER TANG, Written Constitutions - A Computerized Compara tive Study, Nova
Iorque e Alphen aan den Rijn, 1978, pág. 261.
Parte 111I Constituição ••
a on tituiçõe , ' irrecu á el que on tituiçõe exi tem que e re elam fundamento
(em concreto) da autoridade do governante e que outra e revelam, obretudo in -
trumento de que ele e munem para a ua ação; Con tituiçõe que con ignam direito e
liberdade fundamentai perante ou contra o poder e Con tituiçõe que o funcionalizam
ao objetivo do poder' Con tituições que valem ou se impõem por si só e on tituiçõe
meramente simbólica .24
24 V. MARCelO NEVES,A constitucionolização simbólica, São Paulo, 2007, máxime págs. 101 e segs., onde
se referem três tipos: constitucionalização destinada à corroboração de valores sociais, fórmula de
compromisso dilatório e Constituição álibi. Sobre as relações com o quadro de LOEWENSTEIN,v. págs. 9S
e segs. Cfr. também "Constitucionalização simbólica e desconstitucionalização fática: mudança simbóli-
ca da Constituição e permanência das estruturas reais de poder", in Revista de Informaçãa Legislativa,
nº 132, págs. 321 e segs., outubro-dezembro 1996.
Na 3! edição desta sua obra (São Paulo, 2007, págs. 191 e segs.), MARCELO NEVESnão exclui a possibi-
lidade de uma "globalização econ6mica" radical levar à destruição da autonomia dos sistemas jurídi-
co-políticos segmentados em Estados, com impacto sobre a normatividade jurídica das Constituições,
que se tornariam (hipertroficamente) simb6licas.
2S GOMES CANOTILHO,Direito Constitucional, I, 2! ed., cit., págs. 114 e segs. (na 4! ed., 1986, págs. 72 e
segs., este Autor aponta, porém, três modelos de Constituição - do Estado de Direito liberal, do Estado
de Direito social e do Estado socialista). Cfr., sobre as interpretações liberal e socialista do conceito de
Constituição, por exemplo, DOMENICO FARIAS,Idealità e indeterminatezza dei principi costituzionali,
Milão, 1981, págs. 123 e segs. e 127 e segs.
26 Cfr., entre tantos, VITAL MOREIRA, Economia e Constituição, 2.! ed., Coimbra, 1979, págs. 19 e segs.; JOR-
GE MIRANDA, Direito da Economia, policopiado, Lisboa, 1982-83, págs. S9 e segs.; ou MIGUel HERRERO
DE MINON, "La Constitución economica: desde la ambigüedad a la integración", in Revista Espanola de
Derecho Constitucional, págs. 11 e segs., 1999.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
27 Cfr., por todos, WILLlS SANTIAGO GUERRA FILHO, "A Constituição como processo", in Ensaios de Teoria
Constitucional, Fortaleza, 1989, págs. 7 e segs., e Antopoiese do Direito na Sociedade Pós-Moderna,
Porto Alegre, 1997, págs. 30 e segs.
28 E também não coincide com a distinção usual no âmbito circunscrito da Constituição económica entre
Constituição estatutária (estatuto do sistema económico) e diretiva ou programática (diretrizes de
transformação económica): v. VITAL MOREIRA, op. cit., págs. 136 e segs., ou Luís S. CABRALDE MaNCADA,
Direito Económico, 2ª ed., Coimbra, 1988, págs. 82 e segs.
Parte 111I Constituição ••
VII - Finalmente, merece alguma atenção o quadro cla ificativo global formulado
por um autor olhando a relaçõe entre eon tituição e regime político.31
29 Cfr., de ângulos diferentes, CARLSCHMITI, op. cit., págs. 33 e segs.; PAOLOBARILE,La Castituzione come
norma giuridica, Florença, 1951, págs. 40-41 e 58 e segs.; C. J. FRIEDRICH,op. cit., págs. 85-86; COSTANTI-
NO MORTATI,"Costituzione", in Scritti, Milão, 11,1972, pág. 72; GOMESCANOTILHO,Constituição dirigente
e vinculação do legislador, Coimbra, 1982, págs. 141 e segs.; PAULOBONAVIDES,Política e Constituição,
Rio de Janeiro, 1985, pág. 130; JORGEVANOSSI,EI Estado de Derecho en el constitucionalismo social,
Buenos Aires, 1987, págs. 48-49; FRANCISCOLUCASPIRES,Teoria da Constituição de 1976 - A transição
dualista, Coimbra, 1988, págs. 96 e segs.; GUSTAVOZAGREBELSKY, 11Diritto Mite, Turin, 1992, págs. 9 e
segs.; MARCELONEVES,op. cit., págs. 68-69; ANTONIO D'ATENA,"In tema di principi e valori costituziona-
li", in Giurisprudenza Costituzionale, 1997, págs. 3.075 e segs.
30 Cfr. RALFDAHRENDORF,On the Concept of the "Living Constitution", in L'ldée de Philosophie Politique,
obra coletiva, Paris, 1965, pág. 140: é um erro identificar a "Constituição viva" com estado harmonioso
e pacífico da sociedade organizada em sistema político; há tensões e conflitos simultaneamente entre
as forças sociais vivas e entre os "poderes vivos" e a Constituição; e a Constituição prova a sua validade
não tanto prevenindo conflitos quanto estabelecendo regras para os resolver.
31 JORGEDE ESTEBAN,estudo preliminar da coletânea Constituciones espanolos y estronjeras, Madrid,
1977, págs. 22 e segs., máxime 44. Cfr. HENCVAN MAARSEVENe GERVAN DERTANG,op. cit., págs. 275 e
segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Legitimadora
Autoritário Fictícia
Organizativa
Legitimadora
Totalitário Ideológica Programática
Organizativa
Legitimadora
Aproximativo Organizativa Pseudodemocrática
Jurídica
Legitimadora
Organizativa
Democrático tradicional Aplicada
Política
Jurídica
Legitimadora
Organizativa
De democracia social Jurídica Ativa
Política
Transformadora
111- sta e não aquela forma de E tado, este e não aquele regime político, e ta e não
aquela forma de governo, esta e não aquela forma institucional, eis escolhas básicas que
cada povo faz em cada momento histórico. O cerne de uma Con tituição re ide aí.
À on tituição em entido material, estatuto jurídico ou ordenação racionalizante
e i temática do Estado, pode corre ponder historicamente um Ó conteúdo (como acon-
tecia, na ótica do regime político, na era liberal) ou pode corre ponder uma pluralidade
de conteúdos (como vem sucedendo depoi ). E e e conteúdo em cada Estado e em cada
tempo pia ma- e em princípios jurídicos específicos, explícita ou implicitamente - o
princípio que, abrangendo também a forma de Estado, a forma de governo, o istema de
governo e a fonna institucional, no seu conjunto dão corpo a uma Constituição material.
Uma Con tituição não e reduz, por certo, a e e princípios, a e se princípio fun-
damentai . Ela urge, aparentemente, como um somatório de preceito . Porém, ão e e
princípio e outro com eles conexos que lhe conferem unidade, identidade e durabilida-
de, de acordo com um po tulado elementar de coerência. Voltaremos a este tema adiante.
I - e na Europa, nos séculos XVIII e XIX, não houve uma clara perceção de toda
as dimen õe e exigência da upremacia da Con tituição, nem por i o deixou de e lhe
vincular uma forma e uma con i tência tai que fo e po ível e nece ário di tinguir a
ua norma da demai normas do ordenamento jurídico.
Uma on tituição apena in titucionalizadora do E tado não car eria de a forma
jurídica irredutível. Já não uma Con tituição produto de uma ontade normativa parti cu-
L'ttat Constitutionnel, trad. francesa, Aix-en-Provence e Paris, 2004, págs. 123 e segs.; CARMEN LÚCIA
ANTUNES ROCHA, "Reforma constitucional total e Constituição: remédio ou suicídio constitucional?",
in Crise e desafios da Constituição (obra coletiva coordenada por JosÉ ADÉRCIO LEITESAMPAIO), Belo
Horizonte, 2004, pág. 168; WERNER KÃGI, La Constitución como ordenamiento juridico fundamental
dei Estado, trad., Madrid, 2005, págs. 102 e segs.; GARRYJEFFREYJACOBSON,"Constitutional Identity",
in Review of PoJitics (Universidade de Notre Dame), nº 68, 2006, págs. 361 e segs.; AUGUSTOBARBERA,
"Ordinamento costituzionale e carte costituzionali", in Questioni CostituzionaJi, nº 2/2010, págs. 311 e
segs. Mas quem terá empregado, pela primeira vez, os termos Constituição material ou Constituição
em sentido material foi COSTANTlNOMORTATI (La Costituzione in senso materiale, Milão, 1940), embora
num sentido diferente, ligada às forças e aos fins políticos: cir. infra.
Na doutrina portuguesa, v. FRANCISCOLUCASPIRES,O problema ..., cit., págs. 53 e segs.; ROGÉRIOSOA-
RES,"Constituição", in Dicionório Jurídico da Administração Pública, 11, págs. 666; MARIA LÚCIAAMARAL,
"Poder constituinte e revisão constitucional", in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de
Lisboa, págs. 350 e segs., 1987; RUI MACHETE, "Os princípios estruturais da Constituição de 1976 e a
próxima revisão constitucional", in Revista de Direito e Estudos Sociais, 1987, págs. 337 e segs.; MARCE-
LO REBELODE SOUSA,O valor jurídico do ato inconstitucional, Lisboa, 1988, págs. 171 e 172: MIGUEL No-
GUEIRA DE BRITO,A Constituição constituinte, Coimbra, 2000, págs. 395, 401, 428, 430; CARLOSBLANCO
DE MORAIS, Justiça Constitucional, I, 2~ ed., Coimbra, 2006, págs. 53 e segs.; PAULOFERREIRADA CUNHA,
Direito ..., cit., págs. 132 e segs. Em pensamento próximo do de MORTATI, v. GOMES CANOTILHO,Direito
..., cit., págs. 1.065-1.066, 1.073 e 1.139.
35 Cfr. a visão de GARRYJEFFREYJACOBSOHON(op. cit., loc. cit., págs. 353 e 395): a identidade emerge
dia logicamente e representa um misto de aspirações políticas e comandos, que exprime tanto o pas-
sado da nação como a determinação daqueles que, dentro da sociedade, procuram, por alguma forma
transcendê-lo.
Parte 111I Constituição _
larizada em certo momento hi tórico (mormente quando criada por via revolucionária) e
ocacionada para uma regulação ampla da vida política. Sem uma forma adequada, ela
não conseguiria estabelecer- e.
Onde se encontra onstituição em entido material moderno emerge, pois, Con -
tituição em entido formal. A única36 exceção é a Grã-Bretanha, ma a au ência aí de
Con tituição formal explica-se pelas caraterí tica peculiares do seu desenvolvimento
constitucional e do eu i temajurídico;37 é uma exceção que confirma a regra.
36 Ou quase única exceção, porque também se fala, por vezes, na Hungria antes de 1945.
37 Cfr. Manual.", I, cit., págs. 123 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
titucionai uces ivas foram as sete Leis Fundamentais espanholas do regime autoritário
feitas entre 1938 e 1967, ou as trinta e cinco leis constitucionais revolucionária portu-
gue as de 1974 a 1976; e ão a dua lei con titucionai do Canadá, de 1867 e 1982.
III - Es e nexo entre a Constituição e certa norma que, por virtude dela, adquirem
categoria de norma formalmente constitucionais designa- e uma relação de receção.
Figura mai e tudada a re peito da relaçõe entre i tema jurídico di tinto 40do que
a re peito da relaçõe entre norma do me mo istema jurídico e tatal,41 dificilmente e
vi lumbra como em ela p a encarar- e a conjugação do poder constituinte posto em
ato atra é da on tituição com a ub i tência de norma con titucionai anteriore ou
com a outorga d alor con titucional a norma de Direito internacional ou a norma de
certo ord namento interno.
Por um lado o núcleo operati o da Con tituição formal re ide na on tituição ori-
ginária e primariamente criada pelo poder constituinte formal e material. Por outro lado,
e te poder é livre de, em face da condições em que e mova, da e trutura do istema e da
ua e tratégia de normação, con iderar como tendo valor con titucional normas já exis-
tente, que ele não queira ou não po a editar ou editar de no o) e que com a primeiras
ão ficar num ne o de complementaridade ou de ace oriedade.
Ma a receçã042 tanto pode er uma receção formal quanto uma receção material,
tanto p de er a r ceção de um ato normati o quanto a receção apena de uma norma.
A receção formal pre upõe a con ervação da identidade do princípios ou preceitos
(embora p r força, in i ta- e, de uma norma con titucional que as im pre creve)' pre upõe
que o princípio ou preceito alham com a qualidade que tinham; acarreta, por con eguin-
te, a ua interpretação, a ua integração e a ua aplicação no exato parâmetro da ua itu-
ação de origem (e, quando e trate de ordenamento diferente, a ua e entual modificação,
a ua u p n ão ou a ua re ogação, e aí forem modificado , u pen o ou revogado ).
Ao invé , a receção material re ume- e a expediente de preenchimento de zonas de
regulamentação jurídica. A norma recebida ão incorporada como norma do i tema
que a recebe ou nele enxertada com o me mo e pírito que a e te pre id ; e a ua vigên-
cia, a ua interpr tação e a ua int gração ficam em tudo dependente de outras norma
do no o i tema ou ub i tema a que ficam pertencendo.
40 Cfr. SANTI ROMANO, L'Ordinamento Giuridico (consultá mos a trad. castelhana EI Ordenamiento Juridico,
Madrid, 1963, págs. 248 e segs.); COSTANTlNOMORTATI, Istituzioni di Diritto Pubblico, 9~ ed., Pádua,
1975, I, pág. 318; NORBERTOBOBBIO, Teoria dell'Ordinamento Giuridico, trad. Teoria do Ordenamento
Jurídico, 7~ ed., São Paulo, 1996, págs. 38 e segs.
41 Cfr. SERGIOFOIS, "Problemi della recezione nel diritto interno: leggi di recezione e riserva di legge", in
Studi in memoria di Tullio Ascarelli, obra coletiva, 11, Milão, 1969, págs. 635 e segs.
42 Sobre o conceito, v., na doutrina portuguesa, GONÇALVESDE PROENÇA,Relevância do Direito Matrimo-
nial Canónico no Ordenamento Estadual, Coimbra, 1955, págs. 205 e segs.; ISABELDE MAGALHÃESCOLA-
ço, Direito Internacional Privado, policopiado, Lisboa, 1958-1959, 11, págs. 51 e segs. e 68 e segs.; JosÉ
DIAS MARQUES, Introdução ao Estudo do Direito, 4~ ed., Lisboa, 1972, págs. 386 e segs.; JOÃo BAPTISTA
MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Coimbra, 1983, págs. 107-108; JoÃo DE
CASTROMENDES, Introdução ao Estudo do Direito, Lisboa, 1984, págs. 66 e 67.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
43 Naturalmente, quando se emprega a primeira técnica, também é publicada a respetiva lei de revisão,
mas esta caduca com a incorporação das novas normas constitucionais na Constituição e com a produ-
ção dos efeitos das normas transitórias que, porventura, ainda contenha.
44 V., por todos, OLIVEIRAASCENSÃO,O Direito -Introdução e Teoria Geral, 13! ed., Coimbra, 2005, págs.
51 e segs.
45 E, na Grã-Bretanha, algumas das normas materialmente constitucionais.
46 Assim, MIGUEL GAlVÃO TELES, Eficácia dos tratados
na ardem interna portuguesa, Lisboa, 1967, pág.
92, nota; JORGEMIRANDA, Decreto, Coimbra, 1974, pág. 97; GOMES CANOTllHO, Direito Constitucional,
4! ed., cit., pág. 67. No sentido da distinção entre rigidez e flexibilidade constitucional, no art. 144º da
Carta, Contributo ..., cit., págs. 40 e 41-42, e MARCELLOCAETANO, Manual..., cit., 11, pág. 427. Cfr. ainda
Parte III I Constituição _
Por seu turno, num istema em que e imponha atender a normas constitucionais
primárias e a normas constitucionai recebida ou ubprimária, vale a pena falar em
Con tituição in trumental na aceção restrita atrás enunciada, porquanto, através de ta,
melhor se captam, à vi ta de armada, as relações entre uma e outras normas e melhor se
apreendem as condiçõe concreta em que a Con tituição formal do Estado tenha surgido
e esteja a vigorar.47
LOPESPRAÇA,Estudos sobre a Carta Constitucional, I, Coimbra, 1878, págs. XXI e segs.; MARNOCO E
SOUSA,Direito Político - Poderes do Estada, Coimbra, 1910, págs. 602 e segs.; MANUEl AFONSOVAZ, Lei
e reserva da lei, Porto, 1992, pág. 288, nota; MIGUEl NOGUEIRADE BRITO,op. cit., pág. 423. Falando em
Constituição semirrrígida por causa do art. 178º da Constituição brasileira, JosÉ AFONSODASILVA,Curso
de Direito Constitucional Positivo, 9ª ed., São Paulo, 1992, págs. 43-44.
1II - Seja qual for o critério ou princípio teórico que e queira adotar para definir
o âmbito da Con tituição em sentido material - e muitos têm ido propo tos, desde a
ao Direito Constitucional Comparado, Lisboa, 1970, págs. 11 e segs.; P. LUCASVERDU, Curso..., cit., 11,
págs. 417 e segs.; MARCELLOCAETANO,Direito Constitucional, I, cit., págs. 399 e segs.; GIANCARLOROLLA,
Riforma delle Istituzioni e Costituzione Materiale, Milão, 1980, pág. 120; JORGEBACELARGOUVEIA, op.
cit., I, págs. 594 e segs.; JosÉ AFONSO DA SILVA, Aplicabilidade das normas constitucionais, 7! ed., São
Paulo, 2007, págs. 37 e segs.
49 Nem se invoquem contra esta opinião disposições constitucionais que, expressamente, parecem vir
elas próprias circunscrever o âmbito da Constituição material- entre as quais o art. 178º da Constitui-
ção brasileira de 1824: "É só constitucional o que diz respeito aos limites e atribuições respetivas dos
Poderes políticos e aos Direitos políticos e individuais dos cidadãos. Tudo o que não é constitucional
pode ser alterado pelas legislaturas ordinárias."
Este preceito, desqualificando certas normas e afastando-as da Constituição formal, nem sequer inte-
ressa para a questão.
Parte 111I Constituição _
50 Cfr. JosÉ TAVARES,Ciência da Direito Político, Coimbra, 1909, págs. 135 e segs.; CARL SCHMITI, op. cit.,
págs. 17-18; HERMANN HELLER,op. cit., pág. 324. Como escreve este autor, os textos constitucionais
têm certamente conteúdos típicos, mas não existem princípios teóricos que determinem o que se deve
reservar à lei constitucional. Sobre o que há-de regular o texto constitucional decidem a tradição, a
conveniência política, a situação de poder e a consciência jurídica.
51 Cfr. infra.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
52 Cfr., por exemplo, The Constitutional Develapment on the Eve of the Third MiJlenium, obra coletiva
editada por Thomas Fleiner, Friburgo, 1995; MASSIMO LUCIANI, "L'Antisovrano e cri si delle costituzione",
in Rivista di Diritta Costituzionale, 1996, págs. 124 e segs.; PEDRODE VEGA, "Mundialización y Derecho
Constitucional", in Revista de Estudios Politicos, págs. 13 e segs., abril-junho de 1998; La nuova età deJle
Costituzioni, obra coletiva (ao cuidado de LORENZOORNAGHI), Bolonha, 2000; VITAL MOREIRA, "O futuro
da Constituição", in Direito Constitucional - Estudos em homenagem a Paulo Bonavides, obra coletiva
organizada por Eros Roberto Grau e Willis Santiago Guerra Júnior, São Paulo, 2001, págs. 318 e segs.;
CESAREPINELlI, 1/momento deJla scrittura - Contributo ai dibattito deJla Costituzione europea, Bolonha,
2002; JoÃo LOUREIRO,"Da sociedade técnica de massas à sociedade de risco: prevenção, precaução e
tecnociência. Algumas questões juspublicísticas", in Estudos em homenagem ao Pro! Doutor Rogério
Soares, obra coletiva, Coimbra, 2002, págs. 71 e segs.; PAULOOTERO, Legalidade e Administração PÚ-
blica, Coimbra, 2003, págs. 557 e segs.; Crise e desafios da Constituição, obra coletiva coordenada por
JosÉ ADÉRCIOLEITESAMPAIO, Belo Horizonte, 2004; GOMES CANOTILHO,Direito ..., cit., págs. 1.369 e segs.
e 1.447 e segs.; EDUARDO CAPELLARI,A crise da modernidade e a Constituiçãa, Rio de Janeiro, 2004;
Luís ROBERTOBARROSO,Interpretação e aplicação da Constituição, 6~ ed., São Paulo, 2004; Constitucio-
nalismo e Estado, obra coletiva (organizada por Agassiz Almeida Filho e Francisco Bilac Moreira Pinto
Filho), Rio de Janeiro, 2006; Derecho Constitucional para el sigla XXI, obra coletiva, correspondente ao
Congresso Ibero-americano de Direito Constitucional, Elcano (Navarra), 2006; PETERHÃBERLE,"Novos
horizontes e novos desafios do constitucionalismo", in Anuário Português de Direito Constitucional, vol.
V, 2006, págs. 42 e segs.; A constitucionalização do Direito - Fundamentos teóricos e aplicações especí-
ficas, obra coletiva, Rio de Janeiro, 2007; JOAQUIM FREITASDA ROCHA,Constituição, ordenamento e con-
flitos normativos, Coimbra, 2008, págs. 515 e segs.; EDUARDORIBEIROMOREIRA, Neoconstitucionalismo
- A invasõo da Constituição, São Paulo, 2008; KRZYSTOFWOJTYLZEK,"La mondialisation et les mutations
du droit constitutionnel", in Revue Européenne de Droit Public, vol. 22, 1/2010, págs. 143 e segs.
Parte 111I Constituição _
II - Quanto à teoria con titucional mod ma pode dizer-se que ela tem, primeiro
procurado aprofundar e de en 01 er a aqui içõe daquilo a que temo chamad05] a re-
olução copernicana do Dir ito público ub quente à egunda gu rra mundial- ou eja,
o reconh cimento da aplicabilidade direta da on tituição e da sua pre alência obre a
lei (ordinária).
ão tai aqui içõe :
É nulo todo o tratado que, no momento da ua conclu ão, eja incompatí el com
uma norma imperati a de Dir ito internacional g ral (art. 53°, I parte); U
58 Cfr. JORGE MIRANDA, Manual ..., I, cit., págs. 109 e segs .. Em edições anteriores à 8~ edição, conside-
rávamos também famílias constitucionais de matriz norte-americana, de matriz francesa e de matriz
soviética; mas achamos não ser possível agora considerá-Ias, em virtude da muito maior diversidade
entre os sistemas constitucionais dos Estados que as poderiam integrar e do fim da União Soviética.
59 Cfr. ANTONiO-ENRIQUE PÉREZLUNO, "EI Derecho Constitucional comum europeo: apostilla en torno a
la concepción de Peter Haberle, in Revista de Estudios Politicos, nº 88, Abril-Junho de 1995, págs. 165
e segs.; 1/ diritto costituzionale comune europeo. Principi e diritti /ondamentali, obra coletiva la cargo
de MICHELE SCUDIERO), Nápoles, 2002; JosÉ ALFREDO DE OLIVEIRA BARACHO, "Teoria geral do Direito
Constitucional Comum Europeu, in Lições de Direito Constitucional em homenagem ao Professor Jorge
Mirando, Rio de Janeiro, 2008, págs. 639 e segs.
60 Cfr. CARLOSBLANCODE MORAIS, "Tópicos sobre a formação de uma comunidade constitucionallusófona,
in Ad Uno Ab Omnes - 75 onos da Coimbra Editora, obra coletiva, Coimbra, 1998, págs. 55 e segs.; RUI
MEDEIROS, Constitucionolismo de matriz lusá/ona: realidade e projeto, Lisboa, 2010.
61 Cfr. o nosso Curso ..., cit., págs. 105 e segs., e autores citados.
Parte 111I Constituição ••
O que e diz da arta pode e tender- e a qualquer outro tratado con titutivo de
organização internacional enquanto fundamento de competência do eu órgão e que
e impõe não ó ao ato que e te pratiquem ma também ao tratado celebrado pelo
tado -membro e me mo a quai quer outro de Direito interno.62
E a on enção de Montego Bay, de Direito do Mar, de 1982, dispõe, a propó ito
da Autoridade para o Fundo Marinhos, que qualquer revi ão do eu preceito deve
ob ervar algun princípio como o da con ideração do alto-mar como património comum
da humanidade ou o da ua utilização para fin pacífico.
Ora, torna- e indi cutível aqui não pequena aproximação à noção de força jurídica e -
pecífica de certa norma frent a outra e, con equentemente, à noção de conformidade ou
de conformidade ntre norma d grau diver o. onceito na cido no campo do Direito
con titucional irradiam para o Direito das Gente a im como reciprocamente, a ad tri-
çõe pro eniente da in erção do E tado na ida jurídico-internacional e projetam obre
a on tituiçõ a começar pela relaçõe entre ordem interna e ordem internacional.63
O que já não e afigura plau ível é falar (p lo meno , por enquanto) numa on ti-
tuição internacional ou mundial imilar ou homóloga da on tituiçõe e tatai ;64 nem
62 Cfr. RICCARDOMONACO, "Le caractere institutionnel des actes institutifs des organisations internationa-
les", in Mélanges afferts à Charles Rausseau, obra coletiva, Paris, 1974, págs. 153 e segs., ou NGUYEN
Quoc DINH, PATRICKDAILLERe ALAIN PELLET,Drait International Public, 6! ed., Paris, 1997, págs. 575 e
segs.; GIOVANNIBIAGGINI,"La idea de Constitución: nueva orientación en la época de la globalización",
in Anuaria Iberoamericano de Derecho Constitucional, 2003, págs. 43 e segs.; JAN KLABBERS,ANNE PE-
TERSe GEIRULFSTEIN,The Constitutionalizatian af International Law, Oxónia, 2009.
63 Cfr. JORGEMIRANDA, Curso..., cit., págs. 123 e segs.. Doutros prismas, cfr. GOMESCANOTILHO,Direito ...,
cit., págs. 1.369 e segs. (falando em constitucionalismo global) ou GIOVANNI BIAGLlNI, op.cit., lac.cit.,
págs. 66 e segs. (aludindo à constitucionalização sem Constituição).
64 Cfr., sobre o problema, por exemplo, JoÃo LOUREIRO,"Desafios da Técnica. Trabalhos de Hermes (Cons-
titucionalismo, Constituição mundial e Sociedade de Risco)", in Nação e Defesa, n2 97, Primavera de
2001, págs. 43 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
65 "O Estado no Direito Constitucional internacional", in Revista de História das Ideias, vol. 26, 2005, págs.
351-352.
66 Sem esquecer, naturalmente, a presença em qualquer Constituição de normas de fundo, de compe-
tência e de forma sobre a vinculação jurídico-internacional do Estado e a condução da política exter-
na. Fala-se aqui em Direito constitucional internacional. Cfr., por exemplo, MIRKINE-GUETZÉVITCH,Droit
Canstitutionnellnternational, Paris, 1933; CELSOB. DE ALBUQUERQUEMELLO, Direito Constitucional In-
ternacional, Rio de Janeiro, 1994; HÉLENETOURARD,L'internationalisation des Constitutions nationales,
Pari5, 2000; ANNE LEVADEe BERTRANDMATHIEU, "L'internationalisation du Droit Constitutionnel, in Re-
vue Européenne de Droit Public, vol. 18, n2 1, Primavera de 2006, págs. 161 e segs.; Luís CLÁUDIOCONI,
"A internacionalização do poder constitutuinte", in Lições de Direito Constitucional, in Lições de Direito
Constitucional em homenagem ao Professor Jarge Miranda, Rio de Janeiro, 2008, págs. 491 e segs.
Parte 111I Constituição ••
que e vincule perante outrem e de vincular depois por ato unilateral; 2°) pelo intere se
fundamental, de egurança e certeza, de harmonização de ordens jurídica .67
m terceiro lugar, particularmente no domínio da proteção internacional dos direi-
to do homem, chega a haver Constituiçõe (por exemplo, a e panhola no art. 10°) que
preveem a interpretação da ua nonnas em conformidade com os tratados sobre essas
matéria ; as im como a jurisprudência con titucional dos países europeu parte da on-
venção de Roma de 1950 atende, em não poucas das suas deci ões, à jurisprudência do
Tribunal Europeu (é o ca o dajuri prudência constitucional portugue a).6
Em quarto lugar, há tratados que provocam a abertura de procedimento de revi ão
constitucional. omo, em geral, os tratado não prevalecem obre o Direito con titucio-
nal, quando se adotem normas convencionai di crepante de norma constitucionai,
apena pode haver ratificação dos re petivos instrumentos após revisão con titucional:69
tem ido o ca o do tratado da União Europeia e do estatuto de Roma institutivo do Tri-
bunal Penal Internacional.
m quinto lugar, por imperativo de egurançajurídica e de boa-fé na relaçõe inter-
nacionai ,qualquer E tado, depoi de vinculado por tratado, não pode invocar a mudança
da Constituição ou uma revi ão con titucional para se desonerar das obrigações por ele
a umidas. ó o pode fazer no termo gerais da denúncia (arts. 54° e segs. da Convenção
de Viena obre Direito do Tratado, de 1969), salva re pon abilidade internacional.
1-Os passo e tugado a caminho da União Europeia (de de o Tratado de Maa tricht
de 1992) têm levado alguns Autores a sustentar a existência já de uma Constituição euro-
peia; ou pelo meno de uma pré- onstituição ou de uma Con tituição tran nacionaL71
67 Sobre estes assuntos, cfr. Curso ..., cit., págs. 163 e segs.
68 Cfr. Manual ..., IV,cit., págs. 158 e segs.
69 Cfr. o art. 95º da Constituição espanhola: a celebração de tratados internacionais com cláusulas contrá-
rias à Constituição exige prévia revisão constitucional.
70 V. "A 'Constituição Europeia' e a ordem jurídica portuguesa", in O Direito, 2002-2003, págs. 9 e segs.; e
Curso ..., cit., págs. 162 e segs.
71 Sobre o problema da Constituição europeia, v., entre tantos, MARIO ALBERTINI, "L'unificazione europea
e il potere costituente", in 1/ Politico, 1986, págs. 199 e segs.; FRANCISCOLUCASPIRES, "A caminho de
uma constituição política europeia?", in Análise Social, nOs118-119, 1992, págs. 725 e segs., União Eu-
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
ropeia: um poder próprio ou delegado?, Coimbra, 1994, Introdução ao Direito Constitucional Europeu,
Coimbra, 1997, e "Os factores comunitários no Direito constitucional português", in Os 20 anos da
Constituição de 1976, obra coletiva, Coimbra, 2000, págs. 215 e segs.; PIETROGIUSEPPEGRASSO,"Di-
ritto Costituzionale e Diritto CEE", in Scritti in onore di Pietro Virga, obra coletiva, I, Milão, 1994, págs.
951 e segs.; ALEC STONE, "What is a Supranational Constitution? An Essay in International Relations
Theory", in The Review of Politics, págs. 441 e segs., Verão de 1994; MANUEL MEDINA, Hacio una Consti-
tución Europeia, Valhadolide, 1994; "Vers un droit constitutionnel européen. Quel droit constitutionnel
européen?, atas de colóquio, in Revue Universelle des Droits de I'Homme, 1995, págs. 357 e segs.;
MARIA LUISA FERNANDEZESTEBAN,La Corte di Giustizia quale elemento essenziale nella definizione di
Costituzione Europea, in Rivista Italiana di Diritto Pubblico Comunitario, 1996, págs. 221 e segs.; DIETER
GRIMM, Una Costituzione per I'Europa?, in 11 futuro della Costituzione, obra coletiva, Turim, 1996, págs.
339 e segs.; GIAN ENRICORUSCONI, Quale "democrazie costituzionale"? La Corte Federale nella politica
tedesca e iI problema della Costituzione Europea, in Rivista Italiana di Scienza Giuridiche, Agosto de
1997, págs. 273 e segs.; CARLA AMADO GOMES, A natureza constitucional do Tratado da União Euro-
peia, Lisboa, 1997; LORENZAVIOLlNI, "Prime considerazioni sul concetto di 'Costituzione Europea' alia
luce dei contenuti delle vigenti Carte Costituzionali", in Rivista Italiana di Diritto Pubblico Comunitario,
1998, págs. 1225 e segs.; JEAN-CLAUDE PIRIS, "L'Union européenne a-t-elle une Constitution? Lui en
faut-il une?", in Revue Trimestrielle de Droit Européen, 1999, págs. 599 e segs.; PETERHÃBERLE,"Per
una dottrina de lia costituzione europea", in Quaderni Costituzionali, 1999, págs. 3 e segs.; Nm MAC
CORMICK, "Democracy and Subsidiarity", in Diritto Pubblico, 1999, págs. 49 e segs.; JÜRGENHABERMAS,
Apres I'État-nation, trad., Paris, 1999, máxime págs. 104 e segs.; MIGUEL POlARES MADURO, "A crise
existencial do constitucionalismo europeu", in Coletânea de estudos em homenogem a Francisco Lucas
Pires, obra coletiva, Lisboa, 1999, págs. 201 e segs., e "O superavit democrático europeu", in Anólise So-
cial, nº' 158-159, Primavera-Verão de 2001, págs. 119 e segs.; ANA MARIA GUERRAMARTINS, A natureza
jurídica da revisão do Tratado da União Europeia, Lisboa, 2000; The birth of a European Constitutional
Order: the interaction of National and European Constitutional Law, obra coletiva editada por JÜRGEN
SCHWARZE,Baden-Baden, 2001; AGUSTINO CARRINO, Europa e iI futuro delle Constituzioni, Turim, 2002;
LUIS ORTEGA, La Constitución Europea, Ciudad Real, 2003; GÜNTHER FRANKBERG,Autoritiit und Integra-
tion. Zum Gramatik von Recht und Verfassung, 2003, trad. A Gramótica da Constituição e do Direito,
Belo Horizonte, 2007, págs. 73 e segs. e 98 e segs.; DIOGO FREITASDO AMARAL, Manual de Introdução
ao Direito, I, Coimbra, 2004, págs. 241 e segs.; PAULOFERREIRADA CUNHA, Novo Direito Constitucional
Europeu, Coimbra, 2005; CARLOSBLANCODE MORAIS, op. cit., I, págs. 45 e segs.; BRUNO GALlNDO, op. cit.,
págs. 227 e segs.
74 Neste sentido, MARIA LuíSA DUARTE,A teoria dos poderes implícitos e a delimitação de competências
entre a União Europeia e os Estados-Membros, Lisboa, 1997, págs. 213 e segs. e 357 e segs. Diversa-
mente, ANA MARIA GUERRAMARTINS, op. cit., págs. 627 e segs.
75 Conforme foi reconhecido pelo Tribunal Constitucional alemão ao apreciar a constitucionalidade dos
Tratados de Maastricht e de Lisboa e pelo Conselho Constitucional francês a propósito do primeiro
desses tratados e do Tratado de Amesterdão.
76 Porventura, só se atingiria um estádio constitucional, só haveria exercício de um poder constituinte em
nível europeu se, celebrado um novo tratado, não tivesse de haver unanimidade para a sua aprovação
e a sua ratificação, podendo ele entrar em vigor, inclusive, em Estados que não o tivessem aprovado
ou ratificado (assim, nos Estados Unidos, bastou a ratificação por parte de nove dos treze primeiros
Estados fundadores para que a Constituição federal entrasse em vigor).
Mas a Carta das Nações Unidas prevê formas de modificação do respetivo texto bem mais "constitu-
cionais" do que os processos de alteração previstos nos tratados europeus. Pois, sejam aprovadas em
Conferência Geral dos membros da Organização, sejam aprovadas pela Assembleia Geral, as alterações
à Carta, desde que ratificadas por dois terços dos Estados, incluindo os cinco Estados-membros perma-
nentes do Conselho de Segurança, obrigam todos os Estados, mesmo os que tenham votado contra (cfr.
arts. 108º e 109º). E ninguém diz que a Carta seja uma Constituição de tipo estatal.
77 Cfr., embora por certo com sentido diverso, FRANCISCOLUCASPIRES,O factor comunitório ..., cit., loc. cit.,
pág. 225: se a Constituição fala para baixo, também as Constituições nacionais falam para cima como o
confirma a alusão do Tratado da União Europeia às "tradições constitucionais nacionais".
78 GOMES CANOTILHO,Direito ..., cit., págs. 826 e 827.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
79 Cfr. o conceito de impulso legiferante em GOMES CANOTllHO, Constituição dirigente ..., cit., pág. 185, e
Teorio do Legisloção Geral e Teorio do Legisloção Penol, Coimbra, 1988, págs. 26 e 27.
80 V. Manual..., V, 3~ ed., Coimbra, 2004, págs. 249 e segs.
81 PAULOOTERO, Legalidade e Administração Pública, Coimbra, 2003, págs. 581 e 584. V. ainda págs. 460
e segs. e 60S e segs.
82 Ibidem, pág. 607.
83 Mais fecundo vem a ser outro passo da mesma obra deste segundo Autor: aquele em que observa que
o artigo 7º, n° 6, da Constituição portuguesa (introduzido em 1992, quando do Tratado de Maastri-
cht) envolve uma autolimitação decisória do Estado, inviabilizando que, em tais domínios (de poderes
transferidos ou delegados), ele aprove normas contrárias à normatividade comunitária (pág. 661).
Mesmo assim, cremos excessivo enxergar aí um caso de "receção formal indireta dos futuros tratados
modificativos do Direito comunitário primário (págs. 614-615), dotados de um valor paraconstitucional
ou de uma força hierárquico-normativa idêntica à da Constituição (pág. 615) com a consequente ina-
plicabilidade de normas constitucionais formais por superveniência de novas normas desses tratados e
vice-versa (pág. 616).
Tal corolário, conquanto não subsumível em mútua revogabilidade, acarretaria não só a desnecessi-
dade de revisão constitucional perante a celebração de novo tratado mas também a possibilidade de,
na vigência de um tratado, a superveniência de uma lei de revisão tornar inaplicável internamente a
norma comunitária. E, se a primeira consequência é desmentida pela prática e pela suscetibilidade de
fiscalização preventiva da constitucionalidade dos tratados europeus, a segunda teria um efeito perver-
so sobre a ordem jurídica comunitária pelas razões que se sabem.
84 Cfr. infro.
Parte 111I Constituição ••
11- Pela nossa parte, iríamos um pouco mais longe, distinguindo transconstitucionalismo como
conexão e interpenetração de princípios e institutos constitucionais e paraconstitucionais e intercons-
titucionalismo enquanto comunicação e diálogo constitucional.
85 Cfr. JosÉ Luís DA CRUZ VILAÇA e NUNO PiÇARRA, "V a-t-il des limites à la révision des traités
matérielles
instituant les Communautés Européennes", in Cahiers de droit européen,1993, págs. 3 e segs.; MARIA
LuíSA DUARTE,op. cit., págs. 369 e segs.; ANA MARIA GUERRAMARTINS, op. cit., págs. 504 e segs.
86 Cfr. Curso ..., cit., págs. 86 e segs.
87 Transconstitucionalismo, São Paulo, 2009, máxime págs. 23,43, 114 e segs., 209 e 223. Cfr., muito próxi-
mos, falando em rede transnacional, ANDREASHAMANN e HELENERUIZ FABRI,"Transnational networks and
constitutionalism, in International Journol of Constitutional Law, vol. 6, nº 3/4, Julho/Outubro de 2008.
Também sobretudo a propósito de integração europeia, aludindo a interconstitucionalidades, cfr. FRAN-
CISCOLUCASPIRES,Introdução ..., cit., págs. 18 e segs.; PAULOCASTRORANGEL,"Uma teoria da intercons-
titucionalidade (Pluralismo e Constituição no pensamento de Francisco Lucas Pires), in Themis, 2000,
págs. 127 e segs.; GOMES CANOTILHO,Direito ..., cit., págs. 1.409 e segs.
_ .. . Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
d) Direito constitucional de territórios com relação específica ou associação com outros (v.g.,
Macau entre 1976 e 1999, Porto Rico, Bermudas, Ilhas Anglo-Normandas).
3. Transconstitucionalismo a nível interno por efeito de fatores externos:
a) Limites heterónomos do poder constituinte;
b) Heteroconstituições.
4. Interconstitucionalismo:
a) Influência recíproca de certas Constituições;
b) Influência recíproca das jurisprudências constitucionais de uns países sobre as de outros
países.
§ 2º
Conceções gerais sobre a Constituição
Importa agora fazer referência - não tão alargada quanto eria p ível ou nece -
ário em obra doutra índole - à problemática da teorização da on tituição, ou eja, ao
e forço de elaboração e aprofundamento do eu conceito e de equacionação da que tõe
fundamentai da dogmática con titucional. 8
Para tanto, ituar- e-ão a po içõe que obre ela têm ido a umida no âmbito da
grande conceçõe jurídica ou jurídico-política contemporân a do con titucionali mo.
A eguir, mencionar- e-ão em particular alguma da tentati a de con trução mai inte-
re ante entre a quai a propo ta por autore portugu e e bra ileiro recente . Por
último, e boçar- e-á, em traço muito gerai ,a no a própria compreen ão.
ão urpreende que a Con tituição urja com natureza, ignificação, caraterí tica e
funçõe diver a con oante as diferentes corrente doutrinai que atra e am o éculo
XIX, XX e XXI:
89 Para uma exposição mais circunstanciada e crítica de algumas destas conceções, v. F. JAVIERCONDE,
Introducción 01 Derecha Palitico Actual, Madrid, 1953; MANUEL GARCIA PELAVO,Derecho Constitucional
Comparada, 8~ ed., Madrid, 1967, págs. 33 e segs.; BALLADOREPALLlERI,A Doutrina do Estado, trad.,
Coimbra, 1969, I, págs. 206 e segs.; COSTANTINOMORTATI, Costituzione ..., cit., loc. cit., págs. 104 e segs.;
FRANCISCOLUCASPIRES,O problema ..., cit., págs. 27 e segs., e Teoria ..., cit., págs. 47 e segs.; PABLOLUCAS
VERDU, "Constitución", in Nueva Enciclopedia Juridica, V, 1976, págs. 212 e segs., e La lucha contra el
positivismo juridico en la Republica de Weimar. La teoria constitucional de Rudol! Smend, Madrid, 1987;
MARCELOREBELODESOUSA, op. cit., págs. 17 e segs.; a obra coletiva La Politica dello Stato: Carl Schmitt,
Veneza, 1981; GOMES CANOTILHO, Constituição Dirigente ..., cit., pág. 141; ADRIANO GIOVANNELLI, Dot-
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
trina e teoria del/a Costituziane in Kelsen, Milão, 1983; MARIO DOGLlANI, ludirizzo politico - Riflessioni
su regole e regolarità nel Diritto Nápoles, 1985, págs. 141 e segs.; PAULOBONAVIDES,
Constituzionale,
Politica e Constituição, cit., págs. 183 e segs., e Curso de Direito Constitucional, 15~ ed., São Paulo,
2004, págs. 170 e segs.; SERGIOBARTOLE,"Costituzione materiale e ragionamento giuridico", in Scritti in
onare di Vezio Crisaful/i, obra coletiva, 11,Pádua, 1985, págs. 53 e segs.; ROBERTONANIA, 1/ Valore del/a
Costituzione, Milão, 1986, págs. 45 e segs.; o nQ 3, ano VI, de Dezembro de 1986, de Quaderni Costitu-
zionali; KLAUSSTERN,der Staatsrecht der Bundesrepublik Deutschland, trad. Derecho dei Estado de la
Republica Federal Alemana, trad., Madrid, 1987, págs. 202 e segs.; INOCÊNCIOMÁRTIRESCOELHO,"Cons-
tituição; conceito, objeto e elementos", in Revista de Informação Legislativa, nQ 116, págs. 5 e segs.,
outubro-dezembro de 1992; MARIO DOGLlANI, op. cit.., págs. 209 e segs.; JosÉ ANTONIO ESTÉVEZARAUJO,
La Constitución como proceso y la desobediencia civil, Madrid, 1994, págs. 41 e segs.; FRANCISCOCUM-
PLlDOLERECEDAe HUMBERTONOGUEIRAALLALA, Teoria dela Constitución, Santiago do Chile, 1994, págs.
17 e segs.; AFONSOD'OLlVEIRA MARTINS, "O fenomenologismo e a teoria constitucional", in AB VNO AO
OMNES - 75 anas da Coimbra Editora, obra coletiva, Coimbra, 1998, págs. 229 e segs., e "Instituição,
Estado e Constituição no pensamento de Maurice Hauriou", in Estado e Direito, 1998-2000, págs. 169 e
segs.; SANTIAGOSASTREARIZA, Ciencia juridica positivista e neoconstitucionalismo, Madrid, 1999; DAVID
DVZENHAUS,Legality and Legitimacy: CarlSchmitt, Hans Kelsen and Hermann HeI/e r in Weimar, Oxónia,
1999; BRUNO GALlNDO, Teoria intercultural da Constituição, Porto Alegre, 2006, págs. 59 e segs.; JosÉ
AFONSODA SILVA,Aplicabilidade ..., cit., págs. 21 e segs.
90 Über Verfassungswesen, 1862 (consultá mos a trad. castelhana Que es un Constitución, Barcelona, 1976).
Parte 111I Constituição
em finai do éculo XVIII, a par do princípio da ob rania nacional. E uma Con tituição
nacional é o e tatuto do tado con iderado como corporação e do eu membro, e -
tabelecido em nom da nação ob rana por um poder con tituinte e por uma operação
legi lati a de fundação gundo um proc o e pecial.
A on tituição compreende a on tituição política e a on tituição ocial. A pri-
mira er a obre a forma geral do tado e obre o pod re público. A egunda, ob
muito a peto mai imp rtante que a on tituição política, tem por objeto primacial o
direito indi iduai ,que tamb 'm alem como in tituiçõe jurídica objeti a .92
91 V. Teoria General dei Estado, trad., Barcelona, 1934, págs. 325 e segs., e Teoria Pura de Direito, 2~ ed.
portuguesa, Coimbra, 1962, 11,págs. 1 e segs. e 64 e segs.
92 Précis ..., cit., págs. 1, 74, 242 e 611 e segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
é anterior. A on tituição é uma deci ão con ciente que a unidade política, atravé do
titular do poder con tituinte, adota por i própria e e dá a i própria.
A e ência da on tituição não re ide poi , numa lei ou numa norma; re id na
deci ão política do titular do pod r con tituinte (i to é, do po o em democracia e do mo-
narca em monarquia).93
95 Verfassung und Verfassungsrecht (1928). trad. castelhana Constitución y Derecho Constitucional, Ma-
drid, 1985, máxime págs. 132 e segs.
96 La Costituzione in senso materiale, cit., máxime págs. 87 e segs. e 141 e segs.; Costituzione ..., cit., loc.
cit., págs. 129 e segs.; Istituzioni ..., I, págs. 30 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
o Direito con titucional é um Direito de lib rdade, em duplo entido: como ordena-
mento limitati o e como expre são de autonormação. Quando e põe em primeiro plano a
parte orgânica põe- e em cau a a ordem d alore d direito fundam ntai . Uma conce-
ção purament orgânica de on tituição acaba por er um re íduo do tado monárquico,
que pode ervir a democracia ab oluta, ma não a democracia con titucional.97
97 Op. cir., máxime págs. 56, 79, 80, 89, 102, 109, 140. A edição original desta obra é de 1942-1945.
98 Traité ..., IV,cit., págs. 2-3, 45, 139-140 e 192 e segs.
Parte 111I Constituição
ção de que e trata de uma ordem a realizar, atravé de ato de vontade (do implicado
no proce o con titucional).99
XliI - PETER HÃBERLE propõe uma teoria da Con tituição como ciência de cultura
poi a on tituição não se reduz a um documento jurídico' ela envolve todo um conjunto
cultural, é expre ão de uma ituação cultural dinâmica, meio de autorrepre entação cul-
tural de um po o, e pelho do eu legado e fundamento da ua e perança.
Uma on tituição i a, enquanto obra de todo o eu intérprete numa sociedade
aberta, patenteia, atravé da forma e do conteúdo, a informaçõe, a experiência e o
aber popular acumulado . E, por i o, cabe empre perguntar e o texto tem corre pon-
dência na cultura política d um po o e o cidadão e identificam com a ua parte
e pecificam nt jurídico-con titucionai . Um trecho con titucional de e er literalmente
cultivado para que re ulte numa on tituição.
on tituição ord m jurídica fundamental tanto do E tado como da ociedade,
deve er compreendida como uma realização cultural. 101
I- Entre os autores portugue es, que, no últimos etenta ano ,alguma atenção têm
pre tado à teoria da Constituição, o primeiro a considerar é A TÓ 10 Jo É BRA DÃO.
Parece firmar a sua noção num postulado geral acerca da vi ão da vida e do mundo:
a Con tituição é uma visão da vida e do mundo e a Constituição demoliberal a impo ição
a todos, governantes e governados, da vi ão da vida e do mundo demoliberal. Mas a e ta,
que reputa um falso triunfo da razão obre a hi tória, contrapõe a Constituição política
autêntica, que é a Constituição da Nação.
A Constituições nunca podem ser feitas pelos homen ,poi quem po ui uma
Con tituição é a Nação (porque vive sempre constituída). ó a Con tituição da ação e
toma o limite objetivo da "Razão do E tado". E, para o eu conhecimento, há que recorrer
à teoria da estrutura e à teoria das funções. 103
102 L'lnvalidità della Leegge, I, cit., máxime págs. 109 e segs. V. também "11 concetto di Costituzione", in
Scritti in anare di Castantino Mortoti, obra coletiva, I, Milão, 1977, págs. 197 e segs.
103 Sobre o conceito da Constituição Política, cit., máxime págs. 67 e segs.
Parte 1111Constituição ••
Há nece ariamente uma certa configuração caraterí tica de cada E tado, resultante
da condiçõe peculiare do povo e do território respetivo . Nenhuma Con tituição pode
pretender-se a palavra definitiva e a regra imutável da sociedade política; como mal an-
dará o Estado cuja Con tituição esteja a er con tantemente alterada, sem ao menos se
con ervarem o traço fundamentai da sua organização política. Ma , ao organizar o
E tado, o legislador não tem de se limitar a ob ervar a condições do povo que vai reger
e a estabelecer uma equação em que a certa condições corresponderão determinada
oluçõe. ão ó há certo princípio de Justiça e Segurança que devem e tar presentes
na elaboração de toda a lei (e, portanto, com mais forte razão, na das constitucionai )
como é dever do con tituinte procurar corrigir vícios, eliminar defeitos, aperfeiçoar
condiçõe melhorar in tituiçõe .104
A im, não e trata de juridificar a atividade de governo; trata-se de evitar a sub ti-
tuição da normatividade con titucional pela economicização da política e a minimização
da vinculação jurídica do fins político .\08
108 Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador, cit., máxime págs. 163 e segs.
A partir da 4! ed., cit., do seu Direito Constitucional (máxime págs. 71, 79 e 75-76), GOMES CANOTILHO
viria a mitigar a sua posição, ainda que sem abandonar a preocupação com otimizar as funções de
garantia e programática da lei constitucional.
Se a função estabilizante e integrante da lei constitucional ainda hoje é uma das finalidades que se pro-
põe uma Constituição, não se deve concluir que dessa função resulte necessariamente uma unidade
da Constituição imune a conflitos, tensões e antagonismos. A unidade é uma "tarefa" convencionada
com a ideia de compromisso e tensão, inerente a uma lei fundamental criada por forças político-sociais
plurais e antagónicas. Daí que a Constituição, ao aspirar a transformar-se num projeto normativo do
Estado e da sociedade, aceite as contradições dessa mesma realidade. E esta radical conflitualidade ou
permanência de contradições não exclui ou não tem de excluir uma "intenção de justiça" e "verdade"
na proposta normativo-constitucional. Todavia, a estrutura dinâmica de uma lei fundamental aponta
para a necessidade de abertura, pois, caso contrário, a excessiva rigidez do texto constitucional conduz
à distanciação das normas perante o "metabolismo social". E, se não deve falar-se de um grau-zero de
eficácia da Constituição, deve, contudo, abandonar-se a pretensão de uma predeterminação constitu-
cional exaustiva e a crença acrítica nos mecanismos normativos.
De todo o modo, é sempre necessário um conceito constitucionalmente adequado: a compreensão de
uma lei constitucional só ganha sentido útil, teorético e prático quando referida a uma situação consti-
tucional concreta, historicamente existente num determinado país.
Nas suas reflexões mais recentes (Direita Constitucional e Teoria da Constituição, 7! ed., págs. 1.435 e
segs.), o Autor prossegue por esse caminho, afirmando que a Constituição é uma ordem aberta, com
pretensão, simultaneamente, de estabilidade, na sua qualidade de "ordem jurídica fundamental", e de
dinamicidade, tendo em conta a necessidade de fornecer abertura para a mudança no seio do político.
Ao estabelecerem princípios e procedimentos socialmente estabilizados, os textos constitucionais pro-
curam a "segurança", "certeza", "vinculatividade" e "calculabilidade" indispensáveis a qualquer ordem
jurídica; ao introduzirem procedimentos de mudança (ex.: normas de revisão), as Constituições intro-
duzem no estatuto jurfdico do polftico horizontes temporais diferenciados que lhes permitem continuar
a assegurar um eventual consenso intergeracional e evitar uma insustentável distância entre a Consti-
tuição escrita e a Constituição material.
A Constituição é uma ordem-quadro, e não um código exaustivamente regulador. Mas ela pode e deve
fixar não apenas uma estadualidade juridicamente conformada mas também princfpios estabelecer
relevantes para uma sociedade aberta bem ordenada. A Constituição é sempre um processo público
que se desenvolve hoje numa sociedade aberta ao pluralismo social, aos fenómenos organizativos
supranacionais e à globalização económica. Sendo ordem parcial efragmentária, carece de uma atua-
lização concretizante quer através do "legislador" (interno, europeu e internacional), quer através de
esquemas de regulação informais, "neocorporativos", "concertativos" ou "processualizados", desenvol-
vidos em nível de vários subsistemas sociais.
A Constituição deve recolher as tensões da integração republicana e comunitária e o pluralismo social,
económico e político. Ela não tem capacidade para ser uma lei dirigente transportadora de metanormas.
O caráter dirigente de uma Constituição converter-se-á paradoxalmente em défice de direção se ela for
também uma lei com hipertrofia de normas programáticas articuladas com políticas públicas sujeitas
à mudança política democrática ou dependente de capacidade de prestação de outro sistema social.
Isso não significa, no entanto, que as Constituições não possam e não devem ter um papel de mudança
social, dentro dos limites da realidade e dos limites "reflexivos" inerentes à sua natureza de lei.
As Constituições servem para estabelecer mecanismos que assegurem a subsistência de um compro-
misso-consenso. Com elas, a sociedade e os indivíduos autovinculam-se, a fim de resolverem os pro-
blemas resultantes de uma racionalidade imperfeita e dos desvios das suas vontades. E, através delas,
exercem-se ainda funções de inclusividade, de autopoiese e de controlo.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
IX - Para Jo É CARLa VIEIRADEA DRAD,a Con tituição não' uma pura manife -
tação de pod r que e perpetue. a ua rigidez formal, ela tem uma intenção integradora
e a ua função principal é a criação e a manutenção contínua da unidade política e da
unidade do ordenamento jurídico-intenção tarefa que ó e cumprem atravé da ligação
con tante à realidade do momento presente.
Ma tal unidade política fundamental não poderá con tituir-se e não tiver um ig-
nificado material, e não poderá sub i tir se não tiver uma razão-de-dever- er-a sim. o
tocante, por exemplo, aos direitos fundamentai em face da on tituição portugue a de
)976, encontra- e uma unidade de entido, que é a dignidade da pe oa humana; e não
e trata de uma unidade puramente lógica ou funcional, mecânica ou i témica, mas uma
unidade axiológico-normativa.
Cfr. também "Da Constituição dirigente ao Direito comunitário dirigente", in Coletânea de estudos em ho-
menagem a Francisco Lucas Pires, Lisboa, 1999, págs. 143 e segs.
109 Direito Constitucional, cit., págs. 35-36, e Direito Constitucional-I, Relatório, Lisboa, 1986, pág. 33 (onde
fala em dimensões axiológica, estrutural, volitiva e normativa da Constituição).
110 Ciência Política, Lisboa, 1979, págs. 129 e segs.
Parte III I Constituição ••
x - egundo TÉR 10 SAMPAIO FERRAZ JúNIOR, uma Con tituição é um início, o co-
meço de algo novo, algo que não deve ser previsto a partir de alguma coi a que tenha
ocorrido ante. É princípio e realização; há-de ser tomado como começo, principiado por
agente ,e con ecução a que muito aderem, para levar a cabo um procedimento.
A autoridade da iniciativa e tá no ri co que e as ume, não na realização em si.
Esta depende de um contínuo instável e imprevisível de ações e reaçõe . Uma Consti-
tuição não deve er vi ta apena como um ato fundante ou um texto básico, ma como
uma prática que e renova a cada instante, na ua interpretação, na ua aplicação, na sua
observância. O verdadeiro "espaço" de uma Constituição não se itua na sua coisificação
num documento, ma na organização da comunidade, na convivência do cidadãos que
vivem junto .112
111 Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, Coimbra, 1983, máxime págs. 101, 107,
120, 127 e segs. e 222. Cfr. na 2~ ed., Coimbra, 2001, págs. 101 e segs. e 394.
112 "Legitimidade na Constituição", in TÉRCIOSAMPAIOFERRAZJÚNIOR,MARIA HElENA DINIZ e RITINHAA. STE-
VENSONGEORGALlKAS, Constituição de 1988 - Legitimidade, Vigência e Eficácia, Supremacia, São Paulo,
1989, págs. 23 e segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
XII - LE 10 LUIZ TR CK propõe uma man ira de r a on tituição aju tada a paí
de 'modernidade tardia", de certo modo r tomando adaptando a conceção de on ti-
tuição dirigente de GOME A OTILHO, em bu ca da efeti ação do direito ociai funda-
mentai .
A Constituição enquanto matriz pri ilegiada de entido do ordenamento, que une o
político e o jurídico, é o e paço (enquanto "como se") onde e "fundamenta" o entido ju-
rídico. Ocorre que e e entido "fundante" acontece a partir de uma manife tação prévia,
no interior do qual já exi te um proces o de compreen ão. A Con tituição. a im, funda,
em er "fundamento ", porque não é uma categoria ou uma hipótese a partir da qual e
po afazer "deduçõe ".
Daí que eja po í el afirmar que a noção de Con tituição é um paradoxo exata-
mente porque funda em er fundamento e, ao me mo tempo, con titui em con tituir
como houve e um ponto d partida. A on tituição é um paradoxo, na medida em
que temo que colocar um ponto de partida (por i o é ai oh, onde o "como e" de e r
entendido "como e apanhas e o todo da interação humana no mundo jurídico"), ma ao
me mo tempo ela frustra e a preten ão de er o começo, já que es e e dá empre de
novo e de vária forma na antecipação de sentido, a partir do modo prático de er-no-
mundo do intérprete.
A Con tituição não teria entido em a compreen ão pré ia do entido, ma não
teria sentido falarmo ne a compreen ão pré ia em que e ti é emo lidando com o
entido me mo da on tituição, no nível do cotidiano e da interação ocial. Daí qu a
on tituição de a er entendida como um exi tencial, ou ~a, não de a er apreendida
imple mente no plano ôntico-objetivi ta e, im, no plano ontológico-ex i tencial, i to
" como maniEi tação da própria condição exi tencial do er humano. e e sentido, a
on tituição emerge primariamente da própria exi tência e empre a ela remete.114
o paradigma que antecede à noção de on tituição programático-dirigente, o texto
con titucional era entendido como uma terceira coi a que e punha entre o ujeito (da
filo ofia da con ciência) e o objeto (a ociedade). A linguagem con tituinte da bu ca do
novo, da emancipação da ociedade, do re gate das promes as da modernidade, dramati-
camente onegada em paí e periférico como oBra il, pa a a ser, no interior do novo
paradigma, condição de po ibilidade de no o pela exata razão de que, na tradição
engendrada pela noção de E tado Democrático de Direito, o con titucionalismo já não
é mais o de índole liberal, ma, im, um con titucionali mo produto de um con tru to
que estabelece, em um novo-modo-de- er in tituído pelo pacto con tituinte, o limite do
mundo jurídico- ocial.
114 Jurisdição Constitucional e Hermenêutica - Uma Nova Crítico do Direito, Porto Alegre, 2002, págs. 122
e 123.
115 Uma teoria do discurso constitucional, São Paulo, 2002, págs. 180, 181, 182 e 261.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
116 V. Contributo pora umo teoria da inconstitucionalidade, cit., págs. 30, 62 e segs. e 101 e segs.; Ciência
Política e Direito Constitucional, policopiado, Lisboa, 1972-73, I, págs. 217 e segs., e 11,págs. 115 e segs.
e 125 e segs.; A Revolução de 25 de Abril e o Direito Constitucional, cit., págs. 20, 81 e 97; A Constituição
de 1976, Lisboa, 1978, págs. 57, 180 e segs., 203 e segs., 249-250, 348 e segs. e 473 e segs.; Relatório,
com o programa, os conteúdos e os métodos do ensino de Direitos Fundamentais, in Revista da Facul-
dade de Direito da Universidade de Lisboa, ano XXVI, máxime págs. 465 e segs.
117 A nossa posição geral sobre o Direito e a Constituição foi objeto de qualificação crítica por outros auto-
res. Disse-se dela que era "um jusnaturalismo com forte influência de um neopositivismo sociológico"
(MARCELO REBELODE SOUSA, Direito Constitucional, cit., pág. 28, nota, e, menos vincada mente, Direito
Constitucional-I, Relatório, cit., pág. 13); ou que era "um sociologismo remanescente conjugado com o
apelo à ideia de Direito (jusnaturalista ou fenomenologicamente caraterizado e determinado?)" (Go-
MES CANOTILHO,op. cit., 2~ ed., I, págs. 39-40, nota).
Nós próprios falámos em "jusnaturalismo temperado por um neoinstitucionalismo" (na 2~ ed., pág. 59,
nota). Mas hoje parece-nos menos relevante uma definição. Só importa salientar que não seria corre-
to apelidar de positivista uma obra como esta, em que se presta um significativo realce à Declaração
Universal dos Direitos do Homem e ao preâmbulo da Constituição, em que se afirma a existência de
limites materiais do poder constituinte, em que se salienta o papel conformador dos princípios consti-
tucionais, em que se reconhece na dignidade da pessoa humana o reduto insuperável de garantia dos
direitos fundamentais.
I
Parte 111 Constituição _
1Il - A eon tituição (ou como conceito mai den o e rico, a ord m con titucional)
não aglutina todo o valore , nem é, em si, valor supremo. ofrendo o influxo do valo-
res, nem e dilui nele, nem o ab orve. Uma relativa diferenciação de domínio exige-a a
con ideração qu r do alore humano mai precio o ,quer do papel no fim de conta ,
precário e tran itório de cada i tema po itivo' afigura- e ineliminável no mundo com-
plexo dividido e conflitual do no o dia' omente ela permite, no limite, conte tar o
comando con titucionai quando eja irredutível a incompatibilidade.
Ma a procura do alore não e confunde com qualquer ubjetivi mo; o alo-
re ó ão eficaze quando adquirem objetividade e duração. A ideia de Direito na qual
as enta a on tituição material urge nece ariamente como ideia comunitária, como
118 Cfr., por todos, BERTRANOBADIE, Culture et Politique, Paris, 1983, máxime págs. 43 e segs., 57 e 58 e
segs.; MARCELO NEVES, op. cit., págs. 76 e segs.; ou PETERHÃBERLE,Teorio de lo Constitución ..., cit.,
máxime págs. 34 e segs.
119 Cfr. GERHARDTLEIBHOLZ,La Rappresentazione nella Democrazia, trad., Milão, 1989, págs. 351 e segs.,
máxime 354: a inclusão da realidade política no interior do conteúdo de valor material da Constituição
tem os seus limites aí onde esta realidade tende a transformar o conteúdo da Constituição, que é um
conteúdo normativo.
120 Sobre a realidade constitucional, v., na doutrina portuguesa, ROGÉRIOSOARES,Direito Público e Socie-
dode Técnica, cit., págs. 19 e segs., máxime 30 e segs., Lições de Direito Constitucional, policopiado,
Coimbra, 1970-1971, pág. 86, e Constituição, cit., loc. cit., págs. 667 e 668; FRANCISCOLUCAS PIRES,
Teoria ..., cit., págs. 51-52; JORGEMIRANDA, Manual ..., IV, 3! ed., Coimbra, 2000, págs. 392 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
repre entação que certa comunidade faz da sua ordenação e do eu destino à luz do
princípios juridicos.121
Se toda a ideia de Direito se define por um entido de justiça, também aparece itua-
da e dependente do tempo e do lugar; e a refração há-de er tanto maior quanto maior for
o ativi mo e a ostentação da ideologia . Num contexto de contra te ideológico e até de
legitimidades (como foram o dos séculos XIX e XX) pode, por vezes, a ide ia de Direito
que con egue pa sar para a lei constitucional incluir dispo içõe e forma organizatória,
cujo distanciamento de te ou daquele princípio ético eja evidente para boa parte da
comunidade ou para a comunidade como um todo na ua camada mais profunda de
consciência; e pode ainda uceder que a própria ideia de Direito ou a legitimidade decla-
rada pelos detentores do poder, ape ar de se impor e obter o consentimento, acabe por não
obter a ade ão e venha a provocar, a prazo, a repul a.
O conceito de Constituição converteu-se, desde há 100 ano, como e lembrou já,
num conceito uficientemente elástico para na ua forma e enxertarem conteúdo po-
líticos, económicos e sociais divergente e para se projetar em tipos con titucionais ca-
raterizado . A Constituição concreta de cada povo, o e tatuto da ua vida política, não
é, porém - não pode ser - para o cidadão e para o juri ta, neutra, indiferente, isenta ou
insu cetível de apreciação.
Nem tudo que se apresenta como constitucional o merece ser ( e bem que não seja
pacífica a qualificação da eventual de conformidade e se bem que a recu a do cumpri-
mento da norma tenha de ser sempre ponderada com outro valores e interesses) e nem
tudo que e apresenta decretado como con titucional o con egue er efetivamente, por
inadequação, desequilíbrio, incapacidade de integração, contradição insanável com ou-
tra norma. Assim como o preceito constitucional pode padecer de inflexões de estatui-
ção, em virtude da dinâmica política nascida da execução ou à margem da execução da
Constituição.
Em último termo, uma Constituição só se torna viva, ó permanece viva, quando o
empenhamento em conferir-lhe realização está em consonância (não ó intelectual mas
obretudo afetiva e existencial) com o sentido es encial dos eus princípio e preceito ;
quando a vontade da Constituição (Ko RADHE E) vem a par do sentimento constitucio-
nal (PABLOLUCA VERDU).122
Ou, como escreve Gu TAVOZAGREBEL KY, a apo ta do con titucionalismo re ide in-
teiramente nisto: na capacidade da Constituição, estabelecida como lex, se tornar iu ; fora
da fórmula, na capacidade de sair da esfera do poder e das palavra fria de um texto
escrito para atrair para a esfera vital das convicções e das ideias dileta, em a quais não
e pode viver e à quais e adere calorosamente. 123
121 A ideia de Direito é a intenção axiológica da realização comunitária (CASTANHEIRANEVES, "O papel do
jurista no nosso tempo", in Boletim da Faculdade de Direito da Universidode de Coimbra, vol. XLIV, 1968,
pág. 127). V. também A redução político do pensamento metodológico-jurídico, Coimbra, 1993, págs. 33
e segs. Cfr., recentemente, "O "jurisprudencialismo" - uma proposta de uma reconstituição crítica do
sentido do Direito", in Revista de Direito e de Jurisprudência, Julho-Agosto de 2009, págs. 331 e segs.
122 V. LUCASVERDU, EI sentimiento constitucional, Madrid, 1985, máxime pág. 6; e, acerca das Constituições
do segundo pós-guerra, MARIO DOGlIANI, op. cit., págs. 315 e segs.
123 "A lei, o Direito e a Constituição", in Anuário Português de Direito Constitucional, 2003, pág. 48.
Parte 111I Constituição •.
124 Concorde-se ou não com LOEWENSTEIN, ao afirmar que, em sentido ontológico, o telas de qualquer
Constituição é a criação de instituições para limitar e controlar o poder político (Teoria ..., cit., pág. 251);
ou com C. J. FRIEDRICH, quando vê na Constituição moderna um sistema de freios (op. cit., págs. 64 e
segs.); ou ainda com MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, quando abrange em "padrões heterodoxos
da Constituição", a Constituição-balanço e as Constituições nominais e semânticas (Estado de Direito ...,
cit., págs. 86 e segs.).
Capítulo 11
FORMAÇÃO DA CONSTITUiÇÃO
§ lº
Poder constituinte e formação da Constituição
1 Sobre a teoria do poder constituinte, V., entre tantos, SANTIROMANO,L'instauraziane di fatta di un ardi-
namento castituzianale e la sua legittimazione, 1901 (in Scritti Minori, I, 1950, págs. 107 e segs.); GEOR-
GESBERLlA,"De la compétence des assemblées constituantes", in Revue du droit public, 1945, págs. 353
e segs.; COSTANTlNOMORTATI,La Costituente, 1945 (in Scritti ..., I, 1972, págs. 3 e segs.); EMILlO CROSA,
Variazioni su un tema di V. E. Orlando - Funzione costituente, legge costituzianale, garanzia, revisione
della Costituzione, in Scritti giuridici in memoria di V. E. Orlando, obra coletiva, Pádua, 1957, págs. 465
e segs.; PAOLOBARILE,"Potere Costituente", in Scritti di Diritto Costituzionale, Pádua, 1967, págs. 592 e
segs.; JosÉ ALFREDODEOLIVEIRABARACHO,"Teoria Geral do Poder Constituinte", in Revista Brasileira de
Estudos Políticos, nQ 52, págs. 7 e segs., janeiro de 1981; ANTONIO PORRASNADALES,"Notas sobre la teo-
ria dei poder constituyente y la experiencia espaiiola", in Revista de Estudios Politicos, nQ 24, págs. 175
e segs.; MARIE-FRANÇOISERIGAUX,La théorie des limites materielles à "exercice de la fonction consti-
tuante, Bruxelas, 1985, págs. 28 e segs.; MANOEL GONÇALVESFERREIRAFILHO,O Poder Constituinte, 2~
ed., São Paulo, 1985, págs. 91 e segs.; NELSONSALDANHA,O poder constituinte, São Paulo, 1986; PIETRO
GIUSEPPEGRASSO,"Potere costituente", in Enciclopedia deI Diritto, XXXIV, págs. 641 e segs.; IGNACIODE
Ono, op. cit., págs. 53 e segs.; MAURíCIO ANTÓNIO RIBEIROLOPES,Poder constituinte reformador, São
Paulo, 1993, págs. 13 e segs.; ANTONIO NEGRI, The Constituent Power, Mineapolis, trad. castelhana EI
poder constituyente, Madrid, 1994; LUZIACABRALPINTO,Os limites do poder constituinte e a limitação
material da Constituição, Coimbra, 1994; CLAUDEKLEIN, Théorie et pratique du pouvoir constituant,
Paris, 1996; PIERPAOLOPORTINARO,"11 grande legislatore e il custode dei costituzione", in 11futuro della
costituzione, obra coletiva, Turim, 1996, págs. 5 e segs.; ERNST-WOLFGANGBOCKENFORDE,"11 potere
costituente dei popolo: un concetto limite dei diritto costituzionale", ibidem, págs. 231 e segs.; MARIO
DOGLlANI,Potere costituente e revisione costituzionale nella lutta per la Costituzione, ibidem, págs. 253
e segs.; GAETANOSILVESTRI,"La para bola della sovranità. Asceso, declínio e trasformazione di un con-
cetto", in Rivista di Diritto Costituzionole, 1996, págs. 3 e segs.; ALESSANDROPACE,Potere costituente,
rigidità costituzionale, autovincoli legislativi, Pádua, 1997, págs. 97 e segs.; JUAN LUIs REQUEJOPALES,
Las normas preconstitucionales y el mito deI poder constituyente, Madrid, 1998; MARCOSWACHOWICZ,
Poder constituinte e transição constitucional, Curitiba, 2000; JORGEVANOSSI,Teoria Constitucional, I -
Poder constituyente, 2000; MIGUEL NOGUEIRADE BRITO,A Constituição constituinte - Ensaio sobre o
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
a) O fator determinante da abertura de cada era con titucional é, não a apro ação
de uma on tituição formal (ou a redação de uma on tituição in trumental),
ma o corte ou a contrapo ição frente à ituação ou ao r gim at' ntão igent,
em nome de uma nova ideia de Direito ou de um no o princípio de legitimidade,
eja por meio de re olução, eja por outro meio;
b) A entidade determinante do conteúdo fundamental de uma on tituição é a en-
tidade - força política ou ocial, mo imento militar ou popular, monarca outro
órgão ou grup02 - que a im ai infletir a ord m preexi tente a umir a ineren-
te re pon abilidade hi tórica;
c) Tal entidade, ora pode convocar ou e tabelecer uma a embleia, um colégio,
outro órgão com vi ta à elaboração da on tituição formal, ora, porventura er
ela logo a decretá-la;
d) O órgão que elabora e decreta a Con tituição formal é olidário da ideia de Di-
reito, do desígnio, do projeto corre pondente à rotura ou à inflexão e não poderia
contradizer ou alterar e a ideia, e e desígnio, es e projeto em no a rotura ou
inflexão, em se tran formar em entidade originária de uma diferente on titui-
ção material;)
e) Aliá me mo e a ideia de Direito é de democracia plurali ta, o órgão encar-
r gado de fazer a Constituição formal não goza de uma margem de liberdade
pl na; não ad trito, decerto, a um determinado e único i tema de direito fun-
poder de revisão constitucional, Coimbra, 2000; HUGO CÉSAR ARAÚJO DE GUSMÃO, "Poder constituinte:
uma categoria ainda válida em nossos dias?, in Revista Brasileira de Direito Constitucional, Julho-De-
zembro de 2005, págs. 95 e segs.; PASQUALE PASQUINO, "11potere costituente, il governo Iimitato e le sue
origini nel nuovo mondo", in Rivista Trimestrale di Diritta Pubblica, 2009, págs. 311 e segs.
Cfr., em obra gerais, por exemplo, A. ESMEIN, Élements de Drait Constitutionnel trançais et comparé, 7!
ed., Paris, 1921, págs. 571 e segs.; CARRÉ DE MALBERG, Contribution à la Théorie Générale de I'État, 11, Pa-
ris, 1922, págs. 483 e segs.; MAURICE HAURIOU, op. cit., págs. 246 e segs.; CARL SCHMITI, op. cit., págs. 86 e
segs.; GEORGES BURDEAU, Traité ..., IV, cit., págs. 181 e segs.; ROGÉRIO SOARES, Constituição ..., cit., loc. cit.,
págs. 661 e 668; SANCHEZ AGESTA, Principios de Teoria Politica, Madrid, 1960, págs. 329 e segs.; MARCELO
REBELO DE SOUSA, Direito Constitucional, cit., págs. 59 e segs.; KLAUS STERN, op. cit., págs. 311 e segs.;
GUSTAVO ZAGREBELSKY, Manuale Costituzionale, Turim, 1988, págs. 97 e segs.; CELSO RIBEIRO
di Diritto
BASTOS, Curso de Direito Constitucional, lO! ed., São Paulo, 1988, págs. 10 e segs.; AFONSO ARINOS, Di-
reito Constitucional, 2! ed., Rio de Janeiro, 1981, págs. 87 e segs.; JORGE VANOSSI, Teoria Constitucional,
Buenos Aires, 2000, págs. 5 e segs.; ERNST-WOLF GANG BéicKENFORDE, Le droit, I'État et la Constitution dé-
moera tique, trad., Paris, 2000, págs. 205 e segs.; ANDRÉ RAMOS TAVARES, Curso de Direito Constitucional,
São Paulo, 2003, págs. 27 e segs.; GOMES CANOTILHO, Direito ..., cit., págs. 65 e segs.; LoulS FAVOREAU et
alii, Droit Constitutionnel, 7! ed., Paris, 2004, págs. 98 e segs.; CARLOS BLANCO DE MORAIS, Justiça Cons-
titucional, I, 2! ed., Coimbra, 2006, págs. 16 e segs.; PAULO BONAVIDES, Curso de Direito Constitucional,
25! ed., São Paulo, 2010, págs. 141 e segs. RAÚL MACHADO HORTA, Direito Constitucional, 5! ed., Belo
Horizonte, 2010, págs. 1 e segs.; GILMAR FERREIRA MENDES, INOCÊNCIO MÁRTIRES COELHO e PAULO GUSTA-
VO GONET BRANCO, Curso de Direito Constitucional, 5! ed., São Paulo, 2010, págs. 257 e segs.; BERNARDO
GONÇALVES FERNANDES, Curso de Direito Constitucional, Rio de Janeiro, 2010, págs. 95 e segs.
a) ão ba ta, com a ci ilização da lei e crita e com o con titucionali mo, uma
qualquer ideia ou um qualquer conjunto de princípio para ficar definido o qua-
dro da ida coleti a; o e tatuto do tad04 car ce de uma on tituição formal;
traçar e te e tatuto comporta opçõ jurídico-política de importância central'
b) Quer a ideia de Direito (ou o de ígnio, o projeto, o caráter do regime) e de enhe
com muito igor e nitidez, quer e ofereça mai ou meno aga ou fluida, não
pode deixar de er interpretada, concretizada, convertida em regra de com-
portamento e de relação (relação entre o E tado e o cidadão, relação entre o
futuro órgão de poder), em regra que comp-em a Con tituição formal;
c) Até à on tituição formal o órgão de poder aparecem como órgão pro i ório
ou tran itório e o eu ato de deci ão política como tendo alidade ou eficácia
condicionada a futura confirmação ou con alidação;5 e, quando e trate de um
no o regime dem crático, a "grande reforma de fundo"6 de erão ituar- e no
âmbito de futuro órgão democraticamente con tituído;
d) e o Direito ordinário criado entre o momento da rutura ou da inflexão da or-
dem anterior e o da entrada em vigor da nova on tituição formal não pode er
ubmetido (por e tar ou ter de e pre upor que e tá de acordo com a nova ideia
de Direito) a tratamento igual ao do Direito editado no regime precedente, nem
por i o é meno eguro que ó a onstituição representa o no o fundamento do
ordenamento jurídico' 7
e) O p der con tituinte ou a oberania do E tado não e manife ta ó no momento
inicial ou no primeiro ato do proce o, nem ó no momento final de decretação
da on tituição formal; manife ta- e no enlac de todo o ato e no conjunto
de todo o órgão que nele intervêm.
[(- De te modo, como atrá de viu, di cemimo - a par da dupla per petiva, material
e formal obre a on tituição - um poder con tituinte material e um poder constituinte
formal; di tinguimo entre um poder de autoconformação do E tado egundo certa ideia
Poder con tituinte equi ale à capacidade de escolher entre um ou outro rumo, ne -
a circun tância . E nele con i te o conteúdo e encial da soberania (na ordem interna),
porquanto oberania ignifica faculdad originária de livre regência da comunidade polí-
tica mediante a in tituição de um poder e a definição do eu e tatuto jurídico.13
Já não erá tanto a im com a tran formação da oberania ou do território,20 por mai
radical que venha a er: o princípio é da continuidade do E tado. Ma a no a fa e da ua
hi tória que então e inaugura tem também de e apoiar numa ideia ou num projeto que
qualifique a alt ração ocorrida e catali e a energia jurídica coleti a .
Enfim, a m io caminho, itua- e a re tauração, com a qual n m mpre coincide
(por não er iável ou por terem obre indo no a conceçõe jurídico-política) a re tau-
ração da Con tituição previgente do E tado. 21
20 Sobre a transformação da Alemanha em 1990, cfr. JORG LUTHER, "Della Republlica federale tedesca
alia Republlica federale di Germania", in Quadermi Constituzional, 1991, págs. 139 e seg.; MARIA LÚCIA
AMARAL, "A Alemanha reunificada e a Lei Fundamental de Bona", in O Direito, 1991, págs. 623 e segs.;
nº 8, de 1991, da Revue française de droit constitutionnel; MONICA BONINI, li potere costituente dei
popolo 1991; JUAN CORAELOGARCIA, "Problemas constitucionales
tedesco, Milão, de la reunificación
alemana", in Revista de Derecho PoJitico, nº 40, 1995, págs. 31 e segs. Noutro plano, GÜNTHERGRASS,
fine weitfeld, 1995, trad. portuguesa, Um tipo histórico, Lisboa, 1998.
21 Cfr. HERBERTHART,O conceito de Direito, trad., Lisboa, 1986, págs. 130-131.
22 Cfr. LEONARDOMORLlNO, Come cambiano i regimi poJitici -Strumenti di anaJisi, Milão, 1980; ALAIN Rou-
QUIÉ, Changement politique et transformation des régimes, in Traité de Science PoJitique, obra coletiva,
11,Paris, 1985, págs. 599 e segs.; CLAUDELECLERCQ,"Les mécanismes juridiques de la disparation de la
République", in Revue du drait pubJic, 1986, págs. 1.015 e segs.; Transitions from Authoritarian Rule,
obra coletiva editada por GUILLERMOO'DONNELL, PHILlPPEC. SCHMITIER e LAURENCEWHITEHEAD, 5 vols.,
Baltimore e Londres, 1986. Recorde-se ainda e sempre o livro V da PoJitica de ARISTÓTELES.
23 Teoria ..., cit., págs. 109 e segs. e 115.
24 Cfr., de prisma diferente, o da correlação entre processo constituinte e processo de mudança social, a
distinção feita por um autor (PORRASNADALES,op. cit., loe. cit., págs. 190 e segs.) de algumas hipóteses
e sub-hipóteses: a) inversão radical do sistema de domínio; b) permanência das grandes linhas estru-
turais, mas modificação do grupo social dominante seja por meio de substituição radical ou rotura,
seja por ampliação dos setores dominantes (rotura patuada), seja ainda por transformação do sistema
existente (mudança controlada).
25 Cfr., a título comparativo, JosÉ JUAN GONZALEZENCINAR,JORGEMIRANDA, BOLlVAR LAMOUNIER e DIETER
NOHLEN, "EI proceso constituyente. Deduciones de quatro casos recientes: Espana, Portugal, Brasil y
Chile", in Revista de fstudios PoJiticos, 76, págs. 7 e segs., abril-junho de 1992.
Parte 111I Constituição _
26 A locução é de MIGUEL GALVÃOTELES(Constituição. cit., loc. cit., pág. 1.500). Cfr. K. C. WHEARE, op. cit.,
págs. 57 e segs.; GEORGESBURDEAU,op. cit., IV, págs. 226-227, nota; COSTANTINOMORTATI, Scritti ...• cit.,
I. pág. 35; RAYMOND GOY, "Sur I'origine extranationale de certa ines Constitutions", in Mélanges Patrice
Gélard, obra coletiva, Paris, 1999, págs. 37 e segs.; GIUSEPPEDEVERGOTIlNI, Diritto Costituzionale Com-
parato, 6~ ed., I, Pádua, 2004, págs. 133 e segs.
27 Sem esquecer, no plano puramente político, as Constituições surgidas por imposição de outros Esta-
dos: as Constituições das Repúblicas Helvética e Bátava do tempo da Revolução Francesa, a Constitui-
ção espanhola de 1808, as primeiras Constituições da Libéria e das Filipinas, a Constituição japonesa
de 1946, as Constituições das democracias populares do leste da Europa dos anos 40 e 50, a primeira
Constituição da Guiné Equatorial. E por imposição das Nações Unidas: as Constituições da Namíbia de
1990 e de Camboja de 1993.
28 Cfr. LAURENTPECH,"La garantie internationale de la Constitution de Bosnie-Herzegovine", in Revue fran-
çaise de droit constitutionnel, 2000, págs. 419 e segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
tuição e ta a na ordem jurídica donde proveio; com a ind pendência tran fere- e para a
ordem jurídica local, in e tida de poder con tituinte.29-30
Verifica- e poi , uma verdadeira novação do ato con tituinte31 ou (doutro pri ma)
uma de locação da regra de reconhecimento;32 e apena o te to que p r i ta - corre -
pondente a on tituição em entido in trumental - e liga à primiti a fonte, não o alor
inculati o da normas.
1- At' aos éculo XVII e XVIII, a re olução era tomada principalmente da ótica
do direito de re i tência coleti a ou r b lião: era considerada uma forma xtrema de re-
i tência contra o go ernante .33
Desde e a época - por cau a da Revolução france a e, em menor medida, da Re-
voluçõe portugue a de 1640, ingle a de 16 8 e americana, e por cau a da mudança de
mentalidade que a prepara ou acompanha - pa a a ser encarada não tanto pelo eu en-
tido negativo quanto pelo eu sentido po itivo. Pa a a er encarada não tanto como ub -
tituição de um governo por outro quanto como criação de uma ordem nova - o que e tá,
seguramente, ligado à prevalência da forma moderna de legitimidad legal-racional
obre a forma anteriore de legitimidade tradicional (na ac ção de MAXWEBER).34
Ma ó muito mais tarde a iência do Direito reconheceria nela um fenómeno con -
tituinte ou, imple mente, um fato ou ato normati o (conforme a per p ti a que e adote)
objeto de e tudo ex profe 0.35
29 Mesmo quando um Estado é criado por outro, o seu ordenamento jurídico tem de se basear na von-
tade do novo Estado - desde a sua formação, o novo Estado é que funda em si a sua validade (SANTI
ROMANO, L'instaurazione ..., cit., loc. cit., pág. 128).
30 A partir do momento da independência, as referências reversas passam a reportar-se à Constituição
como norma originária (MIGUEL GALVÃOTELES,"A Revolução portuguesa e a teoria das fontes do Direito",
in Portugal- O sistema político e canstitucional-1974-1987, obra coletiva, Lisboa, 1989, pág. 586).
31 Assim, GIUSEPPEDE VERGOTIINI, op. cit., pág. 135.
32 HERBERTHART,op. cit., pág. 132.
33 Cfr. ARISTÓTELES,Política, livro V (na versão portuguesa de 1998, págs. 349 e segs.).
34 V., por todos, HANNAH ARENDT,On Revolution, Nova Iorque, 1962, trad. portuguesa Sobre a Revolução,
Lisboa, 1971, máxime págs. 21 e segs. Os elementos do conceito moderno de revolução (conexo com o
sentido copernicano do termo - De revolutionibus orbium coelestium) são a novidade, o começo, a vio-
lência e a irresistibilidade (pág. 46) e a sua principal caraterística é o espírito revolucionário (págs. 44-45).
Cfr., por exemplo, JosÉ DuRÃo BARROSO,"Ensaio sobre a gramática política das revoluções", in Prospeti-
vas, nOS15-16,1983, págs. 79 e segs.; JORGEBORGESDE MACEDO, "Revolução", in Polis, V, págs. 540 e segs.;
ou GIANFRANCOPASQUINO,"Rivoluzione", in Dizionario di Politica, Turim, 1990, págs. 977 e segs.
35 V. SANTI ROMANO, Frammenti di un Dizionario Giuridico, Milão, 1953 (reimpressão), págs. 220 e segs.;
C. J. FRIEDRICH,op. cit., págs. 74 e segs. e 97 e segs.; HANS KELSEN,General Theory of Law and State,
Nova Iorque, 1961 (reimpressão), págs. 1.17-1.18, 219-220, 368-369 e 372, e Teoria Pura ..., cit., 11,
págs. 35 e segs.; NORBERTOBOBBIO, Teoria dell'Ordinamento Giuridico, Milão, 1960, págs. 203 e segs.;
MARIO A. CATIANEO, 1/ cancetto di revoluzione nel/a scienza dei diritto, Milão, 1960; MARCELWALlNE, "Les
Conséquences Juridiques des Révolutions", in Mélanges Alexandre Svolas, obra coletiva, Paris, 1961,
págs. 193 e segs.; FRANCOPIERANDREI,Scritti di Diritto Costituzionale, Turim, 1965, I, págs. 209 e segs.;
JULlEN FREUND,L'essence du politique, Paris, 1965, págs. 570 e segs.; KARLENGISCH,In tradução ao Pen-
samento Jurídico, trad., Lisboa, 1966, págs. 149-150 e 263 e segs.; GEORGESBURDEAU,op. cit., IV, págs.
Parte III I Constituição _
11- ada se afigura, na erdade, mai gerador de Direito do que uma revolução
nada há tal ez de mai eminentemente jurídico do que o fato ou ato revolucionário.
r olução não ' o triunfo da iolência; é o triunfo de um Direito diferente ou de
um di r o fundamento de validade do i tema jurídico po iti o do E tado. ão é antiju-
rídica; é ap na anticon titucional por opo ição à anterior on tituição - não em face da
on tituição injieri que, com ela ai irromp r.
A quebra do ordenamento em igor ó e torna po í el pela pre ença de alore, prin-
cípio critério que, afetando o até então reinante, êm, do me mo pa o, carregar de le-
gitimidad o fato ou ato re olucionário e de encadear efeito normati o múltiplo exten-
o e u cetí ei de, por eu turno adquirirem uma dinâmica própria. Tais valores podem
não er uficientemente valio o no plano do Direito natural e a I gitimidade que in piram
pode re elar- e precária; no entanto, ão ele, e ó ele que ju tificam a iragem política e
in titucional e que imprimem um cunho próprio à Con tituição a redigir de eguida.
orno e cre e, por exemplo, RGI TIA, a revolução opõe radicalmente força e
direito. Ma e a opo ição é apena inicial, e bem que nece ária (doutro modo, por que
uma revolução e e pud r mudar tudo atravé do Direito?). A força não é, com efeito,
enão o ponto de apoio da alavanca r volucionária que nem por i o deixa de er uma
ala anca jurídica: é nece ária uma norma para abolir, no todo ou em parte, o regime vi-
gente. Are olução procura privar o direito da ua força, ma para atingir e se fim ela co-
roa de direito a força revolucionária. E o que e diz acerca da fa e de trutiva vale também
para a fa e con truti a. A re olução ' uma força não regulada, ma im regulante. 6
O conflito re olucionário - diz A TA HEIRA EVE - põe-no diretamente perante a
função con tituinte do direito, no po í I apelo para a ua função ordinans. Intenção que el
ó p derá atuar con tituti am nt , não e id ntemente como objeto ("e ência") ma como
"ideia" ou princípio normati o. E daí que o direito e tenha de propor agora a tarefa d r-
con tituir a unidade normati a integrante em um ní el diferente daquele em que e manife -
tou o conflito, poi ne e nível foiju tamente e a unidade que por força do conflito dei ou
de exi tiro~ rá d el ar- àqu le m mo ní el intencional e axiológico em que o próprio
conflito cobra o eu entido ou que ele próprio, na ua me ma intencionalidade e pecífica,
não deixa tamb 'm de pre supor: no ní el dos fundamento último de alidade e, a im, da
inteligibilidade con tituinte (recon tituinte) de uma nova universalidade de entido.3?
581 e segs.; P. SZUCKA,Direito e luta de classes (1921), trad., Coimbra, 1973, págs. 167 e segs.; AFONSO
QUEIR6, "Revolução", in Verbo, XVI, págs. 511 e segs.; ANDRÉ VINCENT,Les Révolutions et le Droit, Paris,
1974; JORGE MIRANDA, A Revolução de 25 Abril e o Direito Constitucional, cit.; CASTANHEIRANEVES,A
Revolução e o Direito, Lisboa, 1976, máxime págs. 13 e segs., 171 e segs. e 215 e segs.; LOURIVALVILA-
NOVA, "Teoria Jurídica da Revolução", in Estudos em Homenagem ao Professor Afonso Arinos de Melo
Franco, obra coletiva, Rio de Janeiro, 1976, págs. 451 e segs.; HAROLD BERMAN, Law and Revolution,
Cantabrígia, 1983; MIGUEL GALVÃOTELES,O problema da continuidade ..., cit., e A revolução portuguesa
..., cit., loc. cit., págs. 561 e segs.; HERBERTHART,op. cit., págs. 129-130; GIOVANNI FIASCHI, "Rivoluzio-
ne", in Enciclopedia dei Diritto, XLI, 1989, págs. 68 e segs.; PAULOFERREIRADA CUNHA, "La Restauration
portugaise et sa Théorie constitutionnelle", in Quaderni Fiorentini per la Storia dei Pensiero Giuridico
Moderno, 1998, págs. 43 e segs.; PAULOOTERO, Lições de Introdução ao Estudo de Direito, I, 22 tomo,
Lisboa, 1999, págs. 332 e segs.
36 "La signification eschatologique du droit", in Rivista Internazionale di Filosofia dei Diritto, 1971, pág. 217.
37 A Revolução e o Direito, cit., págs. 171-172.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
III - ob este ângulo, afigura- e indiferente que o autor da re olução eja um go er-
nante em funçõe , o titular de um órgão de poder con tituído u urpando o p der con ti-
tuinte - é o que e chama golpe de Estado;39 ou que eja um grupo ou mo imento indo
de fora do podere con tituído - in urreição ou re olução tricto en u.
Tampouco importa que o eu objeti o - político ou político e ociai - ejam
algo re trito ou muito amplo .40Em qualquer hipóte e, a re olução p-e em cau a a inte-
gridade da ordem con titucional, rompe-a para a ter de refazer de im diato para, tendo
de a refazer, ter de fundar de novo todo o si tema jurídico e tata1.41
Pode con iderar- e também relativamente secundário que a r olução e de tine à
in tauração de um regime novo e inédito ou à re tauração de um regime anterior. Ela
repre enta empre uma rotura, e mesmo - na re tauração - uma dupla llce iva rotura,
com o efeito inerente (até porque ore tabelecimento do antigo Direito não pode nunca
ignorar a vigência do Direito intercalar).42
IV - Mai relevante para efeito de análi e do poder con tituint mo tra- e o modo
como e produz a rotura revolucionária. Ela ocorre mpre num momento determinado,
qua e in tantaneam nte, ma nem empre a no a ideia de Direito fica, de uma ez por toda ,
a ente ou afirmada, com nitidez. ão bem conhecido o ca o - de de a França de 17 9 a
1793 ou Portugal de 1974 a 1976 - em que e é ap na o momento inicial de um proce o
demorado complexo, com di erso interveniente, e não raro contraditório e conflitual.43
O derrube do regime precedente pode, poi, er seguido de um pro e o ou ciclo
re olucionário - uma veze relati amente homogéneo (ainda que com progre i a ra-
38 A revolução portuguesa ..., cit., loc. cit.. págs. 597-598. Fala num triplo papel da revolução -legitimador,
hermenêutico e constitutivo (págs. 601 e segs.).
39 Sobre o conceito de golpe de Estado, V. SANTI ROMANO, L'instaurazione ...• cit.. loc. cit., págs. 121 e
segs.; VINCENZOGUElLl, "Colpo di Stato", in Enciclopedia dei Diritto. VII, 1960, págs. 666 e segs.; MIGUEl
GALVÃOTElES, "Golpe de Estado", in Verbo. IX, pág. 715; CARLOSBARRÉ, "Colpo di Stato", in Dizionario
di Politica, obra coletiva, Turim, 1976, págs. 176 e segs.; MARCElLO CAETANO, Direito Constitucional,
cit., I, pág. 277; JAIME NOGUEIRA PINTO, "Golpe de Estado", in Polis, 111,1985, págs. 66 e segs.; VITIORIO
FROSINI,"La struttura dei colpo di Stato", in Diritto e Società, 2000, págs. 321 e segs.
40 A este propósito, C. J. FRIEDRICHdistingue revoluções limitadas e revoluções ilimitadas (op. cit.. págs.
101 e segs.).
41 Por isso, diz BOBBIO ("Fatto normativo", in Enciclopedia dei Diritto, XVI, 1967, pág. 994): a revolução é
um fato normativo complexo que modifica todo um ordenamento ou, pelo menos, afeta os seus pres-
supostos constitutivos todos de uma vez.
42 Cfr. SANTI ROMANO, L'instaurazione ..., cit., loc. cit.. págs. 164-165; MIGUEl GALVÃOTElES, O problema ...,
cit., págs. 32 e 33.
43 Cfr. JORGEMIRANDA, A Constituição de 1976, cit., págs. 17 e segs.; RUY RUBIN RUSCHEl, "O Poder consti-
tuinte e a Revolução", in Revista de Direito Constitucional e Ciência Política, nº 4, págs. 248-249. janei-
ro-junho de 1985; MIGUEl GALVÃOTElES, A revolução portuguesa ..., cit., loc. cit., págs. 568 e segs.
Parte 111I Constituição ••
44 Cfr., de certo modo, SANTI ROMANO, L'instaurazione ..., cit., loc. cit., pág. 110; GEORGJELLlNEK,Ver/as-
sungsiinderung und Verfassungswesandlung, Berlim, 1906, trad. castelhana Reforma y mutación de la
Constitucioni, Madrid, 1991, págs. 56 e 57; BISCARETIIDI RUFFIA,"Sui limitti della 'revisione costituzio-
nale"', in Analli deI Seminário Giuridico da Universidade de Catânia (vol. 111,1948-1949), Nápoles, 1949,
págs. 125, 142 e segs., 147 e segs. e 162 e segs.; ALF Ross, Ou Self-Reference and a Puzzle in Constitu-
tional Law, 1969 (consultá mos a trad. italiana Critica deI diritto e analisi dellinguaggio, Bolonha, 1984,
págs. 205 e segs.); MANOELGONÇALVES FERREIRAFILHO,O PoderCanstituinte, cit., págs. 32-33; PABLOLu-
CASVERDU,EI sentimiento constitucional, cit., pág. 112; JEAN-LoUISQUERMONNE,Les Régimes Politiques
Occidentaux, Paris, 1986, pág. 36; MARCOSWACHOWICZ,op. cit., págs. 74 e segs.; ELEONORACECCHERINI,
"Transizioni e processi costituenti", in Limitazioni di sovranità e processo di democratizzazione, obra
coletiva, Turim, 2004, págs. 75 e segs.; GOMESCANOTILHO,Direito ..., cit., pág. 80; CARLOSBLANCODE
MORAIS, op. cit., KI, págs. 24 e segs.
45 E o mesmo se diga, em plano concomitantemente de Direito constitucional e de Direito internacional,
da evolução do Império Britânico para o Commonwealth, com passagem de colónias a domínios e, de-
pois (com o Estatuto de Westminster de 1931), de domínios a Estados soberanos, alguns dos quais (o
Canadá a Austrália, a Nova Zelândia, etc.) em união pessoal, e não já união real, com a Grã-Bretanha.
46 Cfr. SERGEARNÉ,"La prise du pouvoir par le Maréchal Pétain (1940) et le Général De Gaulle", in Revue
du droit public, 1969, págs. 48 e segs.; CLAUDELECLERCQ, op. cit., loe. cit., págs. 1.039 e segs.; WILLY
ZIMMER, "La loi du 03 juin 1958: contribution à I'étude des actes pré-constituants", in Revue du droit
public, 1995, págs. 383 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
11- Na revolução há uma neces ária uce ão de Con tituiçõe - materiai e formais.
A rotura com o regime precedente determina logo o na cimento de uma nova on tituição
material, a que se segue, a curto, a médio ou a longo prazo, a adequada formalização.
Na transição ocorre sempre um dualismo. Pelo meno ,enquanto e prepara a no a
Constituição formal, ubsiste a anterior, a termo re olutivo; e nada impede que o mesmo
órgão funcione imultaneamente (foi o ca o do Bra il) como órgão de poder constituído
à sombra da Constituição prestes a desaparecer e como órgão de poder con tituinte com
vista à Constituição que a vai sub tituir.
O proces o de transição é, na maior parte da veze, in u cetível de configuração
a priori, dependente da circunstância histórica. Outra veze adota- e o proces o de
revi ão con titucional; e pode até suceder que a Constituição admita expressamente for-
ma agravada de revi ão para se alterarem princípios fundamentais da Constituição e,
portanto, para e tran itar para uma nova Constituição.
Em iência Política, fala- e em tran ição num sentido mai amplo, abrangendo
quai quer proce o de mudança de um regime para outro (mormente em sentido demo-
crático) e a inalam- e diferente modo de tran ição, segundo diver o critérios:
nova legitimidade ou ideia de Direito que obsta à arguição de qualquer vício no processo
e que, doravante, vai não só impor-se como fundamento de legalidade mas ainda obter
efetividade. 56
con tituinte.
Nem toda a norma-origem integra o sistema na sua coesão ... No ca o, porém, invo-
ca- e uma regra de calibração: o Congres o Nacional, bem ou mal, representa o povo ...
E ta regra de calibração é que permite integrar a norma-origem no si tema, o qual, a sim,
e mantém em funcionamento, trocando, porém, o eu padrão: do padrão-legalidade para
o padrão-efetividade.57
J - Estabelecida uma nova ideia de Direito, exercido o poder con tituinte material,
segue- e a formalização que se traduz ou culmina no ato de decretação da Con tituição
formal ou ato constituinte stricto sen u.
É raro a Constituição formal urgir imediatamente, conexa com a Constituição ma-
terial. Só a sim tem sucedido em Con tituições outorgadas pelo monarca (como a Con -
tituiçõe brasileira de 1824 e portugue a de 1826) ou em ituaçõe de total concentração
56 Assim se explica como, parafraseando MAURICE HAURIOU (op. cit., pág. 256), se passa do menos (por
exemplo, a revisão constitucional) para o mais (a Constituição nova): é porque aí está uma nova ideia
de Direito que o novo poder vem invocar.
57 "A convocação da Constituinte como problema de controle constitucional", in O Direito, 1988, págs. 7 e
segs., máxime 14, 15 e 16.
Parte 111I Constituição ••
de poder, eja um Pre idente qu faz golpe de E tado (o Bra il em 1937), eja como
mo imento re olucionário (Moçambique e Angola em 1975).
É muito mais fr quente abrir- e um proces o, varia elmente complexo e longo,
t ndente à ua preparação e à r dação do re peti o texto. E e te proce o não ó carece
de er regulamentado como - em ca o d revolução - implica a nece idade de organi-
zação pro i ória do tado até à entrada em funcionamento do órgão a instituir pela
on tituição formal.
li - hama- e pré- on tituição, Constituição provi ária ou, ob outra ótica, on-
tituição revolucionária ao conjunto de norma com a dupla finalidade de definição do
regime de elaboração e apro ação da on tituição formal e de e truturação do poder
político no interregno con titucional, a que e acre centa a função de eliminação ou er-
radicação de re quício do antigo regime. ontrapõe- e à on tituição definitiva ou de
duração indefinida para o futuro como pretende er a Con tituição produto final do pro-
ce o con tituinte.58
Por cau a de tai funçõe a normas da pré- onstituição adquirem valor reforçado
no confronto da demai norma não podendo ser alterada ou derrogadas por norma
po teriore a que não eja conferida função idêntica. poderão até receber valor de
norma formalmente con titucionai , r cortando- e então, com mai nitidez, dentro do
i tema jurídico: foi o que acontec u, por exemplo, em Portugal, a eguir a 25 de Abril de
1974, em que e epararam a lei con litucionai emanada "no exercício do podere
con tituinte a umido em con equência do Mo imento da Força Armada" (art. 13°,
nOI 1°, da Lei nO3/74 de 14 d Maio e art. 292°, nO2 da on tituição de 1976, no eu
texto inicial) da re tante I i da lei ordinária .59
Da on tituição pro i ória ou pré- on tituição de e di tinguir- e o fenómeno da
entrada em igor pro i oriamente de determinado princípio ou norma con titucionai
obj to de formação já durant o proce o con tituinte (a im a "Ba e da Con tituição'
apro ada em 1821 p la orte); de e ainda di tinguir- e a ub i tência pro i ória
de norma con titucionai anteriore não contrárias aos novo princípio con titucionai
(a im a norma da on tituição de 1933 re alvada pelo art. 1°, n° 3 da referida Lei
nO3/74).
11I- Por veze , a pré- on tituição define os princípios por que deve pautar- e a
Con tituição formal a elaborar ub equentemente: foi o ca o da França em 1958; ou da
África do ui, com a on tituição interina de 1993, com a qual foi depois confrontada a
Con tituição definitiva de 1996 pelo Tribunal Con titucional.60 E algo de parecido ocor-
58 Numa perspetiva de Ciência Política, classificando as circunstâncias em que as Constituições são feitas,
JOHN ELSTER,"Forces and mechanismus in the Constitution-making process", in Duke Law Journal,
1995-1996, págs. 364 e segs.
59 de 1976, cit., págs. 41 e segs.; e ainda, em geral, A Revolução de 25 de Abril, cito
V. A Constituição
60 Cfr. LUCIO PEGORAROe ANGELO RINELLA, "La nuova Costituzione della Republica dei Sudafrica", in
Rivista Trimestrale dei Diritto Pubblico, 1997, págs. 517 e segs.; MARIA JosÉ MORAIS PIRES, "O acórdão
de 'certificação' da Constituição da África do Sul, de 1996", in Estudos em homenagem aa Pra! Dautar
Armanda Marques Guedes, obra coletiva, Coimbra, 2004, págs. 171 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
reu em Angola com a lei con titucional de 1992 e a Con tituição de 20 IO, também com
preceito ubmetido à apreciação do Tribunal Constitucional.61
66 BRÁuLlo GóMEZ FORTES(op. cit., pág. 22) chega a afirmar que a maior parte das Constituições da se-
gunda metade do século XX foi elaborada pelos Executivos, sem eleições prévias.
67 Cfr. ANTONIO BAlDASSARE, "11 'Referendum Costituzionale"', in Quodemi Costituzionoli, 1994, págs. 235
e segs.
68 A aprovação popular configura-se então ou como aprovação verdadeira e própria (quando incida sobre
um projeto de Constituição) ou como ratificação ou sanção (quando se verifique uma dupla aprovação).
69 Caso particular foi o do Brasil, cuja Constituição de 1988 impôs a realização em 1993 de um plebiscito
para a escolha entre monarquia e república e entre sistema de governo parlamentar e presidencial: na
realidade, era uma espécie de poder constituinte diferido, a partir de um compromisso dilatório ...
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
I - Uma coi a é a forma jurídica, outra a realidade con titucional; uma coisa é a
legitimidade, outra a autenticidade do exercício do poder con tituinte.
Do pri ma político, a Constituições ão também de origem democrática ou auto-
crática. Ma ó e con ideram entre as primeira a que efetivamente ejam emanada
em condiçõe mínima de liberdade e participação do cidadão, e não impostas pelos
governantes. Não interessa a forma utilizada; o que interessa é a genuinidade da vontade
política do povo nela expre a.
Pela natureza do órgão, pode afirmar-se que uma Constituição elaborada em a em-
bleia constituinte, contanto que livremente eleita, é de origem democrática; e que ainda
mai democrática o será se tiver havido ante uma definição pelo povo, em referendo, do
entido do regime. Já a sujeição a referendo após a deliberação de assembleia con tituinte
70 Cfr. C. F. VON GERBER,Über offentliche Rechte, trad. italiana Diritto Pubblico, Milão, 1971, pág. 36; PAUL
BASTID, op. cit., loe. cit., págs. 164, 165 e 171; J. DE SOTO, La Constitution sénatoriale du 6 avri/1814,
ibidem, págs. 280 e segs.
GERBERescreve que uma Constituição pactícia não pode ter o valor de um contrato, mas exclusiva-
mente de uma lei de Direito público; o termo contrato apenas indica que na sua elaboração participou
outro fator do Estado além do monarca; e daí ser juridicamente admissível a sua abolição ou a sua
revisão unilateral por este.
Pelo contrário, BASTIDsustenta que tanto a Constituição outorgada como a pactícia cabem no mesmo
conceito de Constituição contratual, pois que, no fundo, ao outorgar a Carta, o Rei não exprime uma
vontade livre, dada a força popular ascendente.
71 Também em Inglaterra, o BiIIof Rights de 1689 correspondeu a um contrato de governo entre o Parlamen-
to e o Rei: assim, IAN LOVELAND,Constitutional Law-A Criticallntroduction, Londres, 1996, pág. 108.
72 Importa, porém, distinguir dois tipos de pactos: 1º) o pacto federal, celebrado (ou, eventualmente,
pressuposto) entre os Estados que hão-de tornar-se Estados federados; 2º) a Constituição federal do
Estado assim criado, obra do poder constituinte federal em conjugação com os Estados federados.
Parte 111I Constituição _
oferece menor margem ao povo, visto que a alternativa - entre ter uma Constituição ou
não ter nenhuma - leva, alvo rara exceções, ao voto favorável; trata-se então, obretu-
do, de obter um reforço da ba e política da Con tituição ou outros efeitos.73
O referendo, degradado a plebiscito (na aceção ligada ao plebi cito napoleónicos
e ao portuguê de 1933), pode, contudo, er não um instrumento de democracia, mas sim
de autocracia, quando, através dele, se chame o povo a aderir a textos constitucionais
preparado pelo hefe do E tado ou por governo ditatoriais, sem interferência de a sem-
bleia repre entativa do plurali mo das correntes ideológicas do paí e sem liberdade de
di cus ão. Muito frequente nos séculos XIX e XX, tal distorção da democracia direta ou
emidireta conduz, no limite, ao cesarismo.
Por outro lado, porque no século XX, a prática política gira em tomo dos partido
político em qua e todo o paí e ,a Con tituições sofrem um influxo decisivo dos par-
tido (e não ão me mo obra dele) - de vários partidos ou de um só. No primeiro caso,
a Con tituições compromissórias que assim se formam, corre pondem grosso modo à
Constituições pactícia do século XIX; no egundo, é como se o partido único viesse a
chamar a i o poder con tituinte, direta ou indiretamente.
(art. 174° a 178° e 142° a 144°, respetivamente), pareciam apontar para tal caráter pactí-
cio, e não exclusivamente monárquico; e algo de semelhante se terá passado com a Carta
Con titucional france a de 1814 (ape ar de nada estatuir obre a ua revi ão), poi que,
uma vez concedida, ela ficou a dominar a vontade do Rei, vinculando-o contratualmente
à Nação.74
Como ainda bem se sabe, a vici itude con titucional que, de ta ou doutra maneira,
e terá verificado, não terá ido sem reflexo no sistema de órgãos do poder. São diferente
a lógica interna de uma Constituição que repou e no princípio monárquico, a de uma
que repou e no princípio democrático e a de uma que apele para ambo : enquanto na
primeira o poder do Rei se estende a tudo quanto lhe não e teja e tritamente vedado, na
Con tituição unilateral democrática e na pactícia nenhuma autoridade pode prevalecer,
na ocorrência de dúvida ou de conflito, obre o povo ou o repre entante do pOVO.75
I - Escreveu SIEVE que o poder con tituinte haveria de e exercer de qualquer for-
ma. "Uma nação não pode e tar ujeita a uma Constituição"; "não pode adstringir-se a
formas constitucionais"; "é sempre senhora de reformar a sua Constituição"; "a sua von-
tade é empre legal, é ela própria a lei".76
A im é no sentido de poder constituinte originário, o qual compreende a revolução
(e, de resto, exatamente, a tese de SIEVE de tinava- e a legitimar uma revolução ou uma
transição de uma Con tituição a outra - a conversão dos Estados Gerais convocado por
Luí XVI, rei absoluto, em Assembleia Con tituinte e do 3° E tado em nação, em nação
oberana, equivalente ao povo como univer alidade do cidadãos).77
Já não eria de aceitar a afirmação, e com ela e pretendesse inculcar que a plura-
lidade (a priori indefinida) de formas de exercício do poder con tituinte material igni-
ficaria alheamento do Direito. Ou que o poder constituinte formal não careceria de uma
predeterminação de formas e processos vinda do poder con tituinte material. Muito pelo
contrário, como há pouco vimos: ele depende, pelo meno , do enquadramento impo to
pelo próprio princípio de legitimidade.78
Optar, em democracia, por formas repre entativas, direta ou mi ta é deci ão ori-
ginária no confronto da Constituição que vai er decretada, ma deci ão derivada em
face do momento inicial de emergência da nova ordem jurídico-política. E não pode, por
exemplo, elaborar- e e aprovar- e uma Constituição atravé de a embleia con tituinte
ou de referendo em uma legi lação reguladora da capacidade eleitoral e do ufrágio e
74 PAULBASTID,op. cit., loe. cit., págs. 164 e 171. Só numa perspetiva de superveniência ou transformação
constitucional se aceita a assimilação que propõe entre as Constituições outorgadas e as Constituições
pactícias.
75 Cfr. PAULBASTID,ibidem, págs. 168 e segs. (corolários jurídicos da outorga) e 172 (corolários jurídicos do
pacto).
76 Qu'est-ce que le tiers étot?, cit., págs. 182, 183, 187 e 180.
71 Cfr., por todos, PAULBASTID, Sieyes et 50 pensée, nova ed., Paris, 1970, págs. 359 e segs., 391 e segs. e
587 e segs.
78 Cfr. (segundo a sua conceção positivista) CARRÉDE MALBERG, op. cit., 11, pág. 500.
Parte 111I Constituição ••
em norma que e tatuam como há-de urgir a vontade con tituinte.79 Algo de emelhante
e diga a re peito do ato con tituinte bilateral. Ma até o ato con tituinte unilateral mo-
nárquico carece ainda de regra : a outorga tem, pelo meno , de e fundar na autoridade
real e de e tran mitir pela forma e pecífica do ato do Rei.
11- Que o órgão con tituinte formal- o órgão que, em nome do soberano (designa-
damente, em nome do povo) elabora a Con tituição - pos a modificar a regra preexi -
tente e e tabelecer outra e e' problema diferente.
ada impede que o faça, no limite da ideia de Direito ou do princípio de legiti-
midade que o habilita. ada ob ta a que uma a embleia con tituinte, eleita para fun-
cionar apena durante certo período, delibere prorrogar a ua e ão ou que, confinada
por norma anterior à tarefa d feitura da on tituição delibere assumir a plenitude do
pod re legi lativo do E tado. A regras de organização de uma as embleia con tituinte
ão preparatória e in trumentai do exercício do poder que lhe e tá cometido; logo, pode
alterá-Ia e e colher o meio mai adequado para o efeito entre o quai o prolonga-
mento do eu mandato; e, porque o poder con tituinte formal também precede e determi-
na os podere legi lati o e go emati o como podere con [ituído , bem pode também e
arrogar o seu e ercício. o
O que terá de haver empre ainda quando o órgão con tituinte altere a regra or-
gânica e proce uai que o precedem erá a inculação a regra de Direito e me mo à
regra que ele próprio enha a editar (a im, a inculação de uma as embleia constituinte
ao eu regimento e a outra norma interna da ua autoria). O que terá de haver empre
- alvo rotura ou re olução - rá o aju tamento de a regra e da forma de agir do
órgão con tituinte à ideia de Direito em que e firma e em face da qual deve conceber-
e como órgão con tituinte. E, a ta luz, a doutrina do poder constituinte acaba por se
reconduzir a uma doutrina de limitação do poder.
1Il - Diz- e, por eze que o poder con tituinte do po o aí onde e invoque uma
legitimidade democrática de e pre alecer empre sobre a on tituição exi tente; outra
eze , que o referendo, e pre ão imediata de e poder, não tem de e tar pre i to na
Con tituição para er admi í el vi to que, por definição ele e tá acima da Con tituição.
Importa e clarecer ta afirrnaçõe .
Decerto, enquanto faculdade e encial de auto-organização do E tado, o poder
con tituinte perdura ao longo da ua história e pode ser exercido a todo o tempo; e, na
medida em que prevaleça a oberania do povo como princípio jurídico-político, ao povo
cabe decidir obre a ub i tência ou não da Con tituição po itiva, a ua alteração ou a ua
ub tituição por outra.
79 Cfr. COSTANTlNOMORTATI, La Costituente ..., cit., lac. cit., págs. 136 e segs.; ou FRANCISCORUBlO LLOREN-
TE, "Minorias y mayorias en el poder costituyente", in Anuario de Derecho Constitucional y Parlamen-
tario, 1991, n2 3, págs. 31 e segs.
80 Cfr. Ono BACHOF(Verfassungswidrige Verfassungsnormen?, 1951, trad. Normas constitucionais incons-
titucionais?, Coimbra, 1977, pág. 51), afirmando que as leis preconstitucionais não podem obrigar o
titular do poder constituinte, o qual pode, a todo o tempo, contorná-Ias através de um ato constituinte
originário.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Daqui não decorre, porém, que o poder con tituinte equivalha a poder oberano ab-
oluto e que ignifique capacidade de emprestar à Con tituição todo e qualquer conteúdo,
em atender a quai quer princípios valore e condiçõe . Não é poder soberano ab oluto
- tal como o po o não di põe de um poder ab oluto obre a Con tituição - e i o tanto à
luz de uma i ão ju natural i ta ou na per peti a do E tado de Direito como na per petiva
da localização hi tórica concreta em que e tem de pronunciar o órgão nele in e tido. O
poder con tituinte e tá sujeito a limite .
Embora seja mai corrente na doutrina con iderar a exi tência (ou a po ibilidade
ou a nece idade de xi tência) de limite materiai do poder de revisão constitucional
- frequentemente tido por poder con tituinte derivado - importa outrossim considerar
a exi tência de limite materiai (em grau di er o, e e qui er) do poder con tituinte
erdadeiro e próprio e me mo do poder con tituinte material originário.
Intere ante é aqui referir a po içõe de algun autore portugue e obre o pro-
blema - coincidente na admi ibilidade de limites ao poder constituinte, se bem que
partindo de postulado bem diverso.
alienta Rogério oare:' A teoria clássica do poder con tituinte foi concebida para
fazer face à teoria do direito divino do rei e por i o também o apr enta em limite .
Ma hoje - na medida em que e aceita que o E tado não é mera organização do poder,
ma a ten ão por uma racionalidade ub tancial que conduza à limitação do poder -
acredita- e em que a 'magna latrocinia' de que falava Santo Agostinho não ão Estado ,
nem a imple regra técnica ba e da ua eficácia é uma Constituição." Daí "limites trans-
cendente " que põem em cau a "o dogma do ab oluti mo do poder con tituinte".83
"Acima de qualquer on tituição formal afirmam- e princípio con titucionai ma-
teriai apoiados na tradição de certa cultura e demon trado na ua experiência hi tórica.
e é certo que não há unanimidade na pormenorização do elenco des e princípio, a
verdade é que não pode deixar de reconhecer- e que todos decorrem duma ideia central
do primado da pe oa".84
Referindo-se ao princípio jurídicos fundamentais que formam "o núcleo es encial
da on tituição material" e cre e Afon o Queiró: "Uma comunidade política li re, em
que o povo eja realmente oberano, não contrariará pela deci ão con tituinte dos eu re-
pre entante e a on tituição material- e se repre entante trairiam o eu mandato, ou
excedêlo-iam e, deliberadamente, em algum ponto ou a peto, se desvia sem dela ... " 5
Por eu turno, diz Gome Canotilho que "o que e tá em causa é o problema do mo-
mento da validade material do direito, inelutavelmente presente empre que e trata do
problema da fonte do direito. 6 E daí que (ne te a peto eguindo Ca tanheira e e )
também o poder con tituinte e não po a de incular no momento da criação da on ti-
tuição, de certa objeti açõe hi tórica que o proces o de permanente 'de alienação do
homem vai introduzindo na con ciência jurídica geral".87
Ou (noutra fórmula) e o poder con tituinte e de tina a criar uma on tituição con-
cebida como organização e limitação do poder não e ê como e ta "vontade de on ti-
tuição" pode deixar de condicionar a vontade do criador. Por outro lado, e te criador, e te
ujeito con tituinte, e te povo ou nação é e truturado e obedece a padrõe e modelo de
conduta e pirituai , culturai ,ético e ociai radicado na con ci Anciajurídica geral da
comunidade e, ne ta medida, con id rado como ontade do po o".
E afirma Marcelo Rebelo de ou a: "Quer o poder con tituinte formal, quer o po-
der con tituinte material ão limitado pela e trutura política, ociai, económica
e culturai dominante da ociedade, bem como pelo alore ideológico de qu ão
portadore ."89
Finalmente, Manuel Afon o Vaz fala em princípio up flore que o poder con ti-
tuinte aceita e cuja validade pre supõ fundada noutro ní el, que não o da mera legalida-
de da norma con titucionai que o recolhe. É a e ta heteronomia decorrente do Dir ito
que de ignamo por re erva de Direito.90
em razão da raça ou em Portugal e no Bra il, pelo meno que re taura em a pena de
morte). E não é por aca o que a onstituição portugue a nuncia certo direito que,
me mo em e tado de ítio, não p dem er u pen o (art. 19°, nO6); e não ão o único
que corre pondem a limite tran cendente .
ARLO BLA o D MORAI pronuncia- e contra os limite tran cendente por care-
cerem de aceitação unívoca e implicarem uma pré-compreen ão teológica insu cetível de
in ocação perante aju tiça con titucional de um E tado laico como o portuguê .93
Quanto a nó ,con ideramo que negar a ujeição do poder con tituinte a determi-
nado alore jurídico equivaleria a de truir a ba e ética e con i enciai da própria
comunidade política. O Direito, ante de er lei, é alor, é ideia, é projeto assumido
comunitariamente. E, para o reconhecer, nem é nece ário equer apelar ao Direito
natural.
Por outro lado, não e trata de, em nome do limite tran cendente, ubmeter a
norma con titucionai originária a qualquer controlo de con titucionalidade admitin-
do que possam ser declarada inconstitucionai. O problema é de legitimidade, não de
validade con titucional - o que não ignifica que o tribunai e tejam de onerado de
a apreciar e, no limite, de a não aplicar, em irtude da ua própria função de "dizer o
Direito".94-95
96 Cfr. SIEYES,op. cit., pág. 188, que, mesmo ele, reconhecia: "Uma nação não pode decidir que não será
nação ou que só o será de uma maneira ... Assim como uma nação não pode estatuir que a sua von-
tade comum deixará de ser a sua vontade comum ... nem estatuir que os direitos inerentes à vontade
comum, isto é, à maioria, passarão à minoria. A vontade comum não pode destruir-se a si própria ..." V.
ainda uma referência ao Direito natural a pág. 180.
97 Nas Cortes Constituintes portuguesas de 1821-1822 discutiu-se a legitimidade da aprovação do art.
282 da Constituição em face do princípio da soberania nacional: cfr. JAIME RAPOSOCOSTA,A teorio da
liberdade - Período de 1820 a 1823, Coimbra, 1976, págs. 55 e segs.
98 Op. cit., págs. 35 e segs.
99 Cfr., em geral, CARLSCHMITI, ap. cit., págs. 81-82 e 85-86, e BISCARETIIDI RUFFIA, "Sull"agganciamento'
ad altri ordinamenti giuridici di taluni 'Iimiti' della 'rcvisione costituzionale"', in Scritti di Diritto Costitu-
zionale in momoria di Luigi Rossi, obra coletiva, Milão, 1952, págs. 19 e segs.
100 No mesmo sentido, mitigadamente, PAULOOTERO,Legalidade ..., cit., págs. 575 e segs. Divergindo, CAR-
LOSBLANCODE MORAIS, op. cit., I, pág. 37.
101 Cfr. JoÃo GRANDINO RODAS,"Alguns problemas do direito dos tratados relacionados com o direito cons-
titucional,à luz da Convenção de Viena", in Baletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coim-
bra, suplemento XIX, 1972, pág. 247; MARIE-FRANÇOISERIGAUX, ap. cit., págs. 157 e segs.; FAUSTODE
Parte 111I Constituição ••
§ 2Q
Fontes das normas constitucionais
QUADROS, A proteção da propriedade em Direito Internacional Público, Coimbra, 1998, págs. 531 e
segs. (falando num princípio da harmonia da Constituição com o Direito internacional, o que, com toda
a amplitude que lhe dá, parece bem excessivo); LUIS MARíA DIEZ-PICAZO,"Limites internacionales ai po-
der constituyente", in Revista Espanola de Derecha Constitucianal, nQ 76, págs. 9 e segs., janeiro-abril
de 2006; Luís CLÁUDIO CONI, op. cit., loc. cit., págs. 510 e segs.
102 Haverá aqui uma dupla valência dos limites - como imanentes e como heterónomos.
103 No Brasil, V. art. 34Q-VII da Constituição; e na doutrina, LEO FERREIRALEONCY,Controle de constitucio-
nalidade estadual, Brasília, 2007; RAÚL MACHADO HORTA, op. cit., 39 e segs. e 297 e segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
n - o si tema con titucional de qualquer paí aparecem pois, sempre normas vinda
de lei, de costume e de jurisprudência; o que variam são o grau e a articulação entre ela .105
A Con tituição em entido formal oriunda do éculo XVIII corre ponde a Con titui-
ção cuja fonte é a lei. Aliá , para lá de fatore e pecífico determinante, por toda a parte
e a i te então - em virtude da centralização do poder e do ju racionali mo - ao triunfo
da lei obre o co tume.
Pelo contrário, Con tituição a ente no co tume é, e ó ela, a britânica - por cau a
de condiçõe própria do eu i tema jurídico e porque m Inglaterra foi po í el pa ar
em rotura do E tado estamental para o E tado con titucional.
ão exi te nenhuma Con tituição urgida da prática judicial. Entretanto certa
on tituiçõe - a do E tado Unidos fornece o melhor exemplo - eriam incompre-
ensíveis sem o trabalho sobre os eus preceito e o eu princípio levado a cabo p lo
juízes; e vem a ser sobretudo esse trabalho que, como se mostrou no tomo I, mantém vi a
a onstituição norte-americana.
É pacífico que uma Con tituição con uetudinária não e reduz a elemento de ba e
con uetudinária - a im se vê olhando para a única Con tituição material con uetudiná-
ria, a inglesa, ou, mais para trá con iderando a Con tituiçõe in titucionai do Ancien
104 Sobre fontes de Direito em geral, lembrem-se, entre tantos, FRANÇOISGÉNY,Méthode de /'interpré-
tation et les sources en droit privé, 2~ ed., Paris, 1919, I, págs. 316 e segs.; NORBERTOBOBBIO,La con-
suetudine comme farta narmativo, Pádua, 1942; HANS KELSEN,Tearia Pura da Direita, cit., 11,págs. 83
e segs.; HENRYlÉVY-BRUHL,Socialagie du Droit, Paris, 1961, págs. 39 e segs.; JosÉ H. SARAIVA,Lições
de Introdução ao Direito, Lisboa, 1962-1963, págs. 309 e segs.; C. K. ALLEN,Law in the Making, 7~ ed.,
Oxónia, 1964; JosÉ DIAS MARQUES,ap. cit., págs. 197 e segs.; CASTANHEIRANEVES,"As fontes do Direito
e o problema da positividade jurídica", in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra,
1975 e 1976, págs. 115 e segs. e 95 e segs., respetivamente, e Fontes de Direito - Contributo para a
revisão do seu problema, ibidem, 1982, págs. 169 e segs.; MIGUEL REALE,LiçõesPreliminares de Direita,
Coimbra, 1982, págs. 155 e segs.; JoÃo BAPTISTAMACHADO,Introduçãa ..., cit., págs. 153 e segs.; MICHEL
TROPER,"Ou fondement de la coutume à la coutume comme fondement", in Droits - Revuefrançaise de
théorie juridique, págs. 11 e segs., 1986; DIOGO FREITASDO AMARAL, op. cit., págs. 343 e segs.; OLIVEIRA
ASCENSÃO,ap. cit., págs. 255 e segs.; FERNANDOJOSÉBRONZE,Lições de Introdução ao Direito, 2~ ed.,
Coimbra, 2006, págs. 683 e segs.
105 Cfr. a classificação dos sistemas constitucionais em essencialmente consuetudinários, semiconsuetudi-
nários e subsidiariamente consuetudinários de MARCELOREBELODESOUSA(op. cit., págs. 45 e segs.).
Parte 111I Constituição ••
Régime. E que uma on tituição juri prudencial não é enão uma on tituição legal
obj to d elaboração juri prudencial.
Muito meno pacífico é o lugar que ao elemento con uetudinários e jurispruden-
ciais pode caber ou er reconhecido numa onstituição de originária fonte legal - como
e verifica com a enorme maioria da on tituições contemporânea, entre as quai a
portugue a.
106 Sobre o costume constitucional, v. JELlINEK,Reformo ..., cit.; BENJAMINARKZIN, "La désuétude en droit
constitutionnel", in Revue du droit public, 1928, págs. 697 e segs.; JUlIEN LAFERRIERE,La coutume constitu-
tionnelle, ibidem, 1944, págs. 20 e segs.; CARMELOCARBONE,La consuetudine nel Diritto Costituzionale,
Pádua, 1948; FRANCOPIERANDREI,"La Corte Costituzionale e le 'Modificazione Tacite' della Costitu-
zione", in Scritti di Diritto Costituzionale, Turim, 1965, I, págs. 81 e segs., máxime 105 e segs.; CARLO
ESPOSITO,"Consuetudine (diritto costituzionale)", in Enciclopedia dei Diritto, IX,1961, págs. 456 e segs.;
JACQUESCHEVAlIER,"La coutume et le droit constitutionnel français", in Revue du droit public, 1970,
págs. 1375 e segs.; JEAN-CLAUDEMAESTRE,A propos des coutumes et des pratiques constitutionnelles:
/'utilité des Constitutions, ibidem, 1973, págs. 1275 e segs.; MAGED EL-HELw,La coutume constitution-
nelle en droit public français, Paris, 1976; DENIS LEVY,"De I'idée de coutume constitutionnelle à I'es-
quisse d'une théorie des sources du droit constitutionnel et de leu r sanction", in Recuei! d'études en
hommage à Charles Eisenmann, obra coletiva, Paris, 1977, págs. 81 e segs.; TEMISTOCLEMARTINES,op.
cit., loc. cit., págs. 812 e segs.; RENÉCAPITANT,"La coutume constitutionnelle", in Revue du droit public,
1979, págs. 959 e segs. (é texto de conferência proferida em 1929); ANNA CÂNDIDADA CUNHA FERRAZ,
Processos informais de mudança da Constituição, São Paulo, 1986, págs. 177 e segs.; CLAUDIOROSSANO,
La Consuetudine nel Diritto Costituzionale, Nápoles, 1992; BRUNOSÉRGIODEARAÚJOHARTS,"O costume
constitucionar', in O Direito Público em tempos de crise - Estudos em homenagem a Ruy Rubens Rus-
chi!, obra coletiva organizada por INGOWOLFGANGSARLET,Porto Alegre, 1999, págs. 49 e segs.; QUIRINO
CAMERLENGO,I fatti normativi e la certezza nell diritto costituzionale, Milão, 2002; GOMESCANOTlLHO,
Direito ..., cit., págs. 861 e segs.; OMAR CHIESA,"Cos'e la Costituzione? La vita dei testo", in Quademi
Castituzionale, 2008, págs. 41 e segs.; PIERREMOUZET,"La désuitude en droit constitutionnel, in Revue
du drait publique, 2009, págs. 1.381 e segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
po ui a força uperior que carateriza o Direito con titucional: mente a regra con a-
grada numa Con tituição e crita e tão re e tida de a força e pecial.I07
o me mo entido argumenta B RDEA , em nome não já do ignificado formal da
onstituição rígida, mas im do eu valor profundo. Poi a Con tituição é o e tatuto do
poder e não poderia er reconhecido ao agente do exercício de te poder a faculdade de a
tran formar ob qualquer pret to e fo e qual fo e a autoridade qu in o a em. on -
tituição de tina- a garantir o primado de uma ideia d Direito; e, quando a nação ob rana
( u o legi lador con tituinte) nela in cre e uma regra e edita a c ndiçõe em que pode er
modificada,obed ce a uma con icção jurídica exi tente no grup acerca da ua importância.
A fixação de um proce o de r vi ão indica a vontade de pr ferir à ela ticidade da regra que
e olui a rigidez de um princípio que tem por nece ário para certa egurança política.lo~
E ta tendência vem até ao no o dia em largo tore da doutrina do con titucio-
nali mo de tipo francê .10'l Do me mo modo, e ibia- e não meno igoro amente, na dou-
trina e na prática do paí com on tituiçõe o iético-mar i ta, b m que por um
motivo algo diferente - o oluntari mo ideológico extr mo que lhe e ta a ubjacent .
11- Uma tendência opo ta urgiria, porém, ainda na igência da 3" república na
França, ligada a certo po tu lado do po iti i mo ociológico e mpenhada em fazer
realçar o papel do co tum. im como, à margem dela, outra corrente têm indo a
realçar o papel do co tume e da efeti idade no Direito con titucional.
RE É APITA T não ó tenta a demon trar que a tr regra bá ica do i tema par-
A
lamentar de então eram co tumeira como afirma a, bem ao contrário de ARRÉ DE MAL-
BERG, qu o costume era e encialmente con tituinte e a on tituição, no us grau
upremo , nece sariamente con uetudinária. força con tituinte do co tum redundaria
num imple a p to da ob rania nacional. A nação não tem qu rei indi ar a ob rania,
ela po ui-a em todo o r gime - porque, pelo meno , é enhora da obediência , por
con eguinte, det' m a po iti idade do Direito."°
Mai mitigada vem a er a conceção de on tituição de ÉRGIO OlTA como ordem
ocial efeti a e coletivamente criada. A Con tituição não e compõe Ó de di po içõe
normati a ,compreende doi outro lemento, um anterior - a tradição (qu e exprime
em norma con u tudinária ) - e outro po terior - o comportamento d órgã go erna-
mentai e da oci dade no eu conjunto.11I
Também na doutrina portugue a há qu m u tente não ap na a e i tência de um
Direito público co tumeiro como até a ua upremacia frente à on tituição formal. ele
caberia determinar o modo de formação, a obrigatoriedade, a cau a de invalidade e a in-
terpretação da Con tituição, por não poder e ta regular originariamente tai matéria .112
107 Contribution ..., cit., 11,pág. 582, nota. V., também, La loi, expression de la volonté générole, cit., pág. 107.
108 Troité ..., cit., IV, págs. 286 e segs.
109 Por exemplo, JACQUESCHEVAlIER ou JEAN-CLAUDEMAESTREnos escritos citados; PEDRODE VEGA, La Re-
forma Constitucionol y la problemotica dei poder constituyente, Madrid, 1985, págs. 195 e segs.
110 La coutume ..., cit., loc. cit., págs. 959 e segs., máxime 968.
111 "La notion de Constitution dans ses rapports avec la réalité sociale", in L'ldée de Philosophie Politique,
obra coletiva, Paris, 1965, págs. 152 e segs.
112 EDUARDOCORREIABAPTISTA,Os limites materiais e a revisão de 1989. "A relevância do Direito Costumeiro",
in Perpetivas Constitucionais, obra coletiva, 111,Coimbra, 1998, págs. 67 e segs., máxime 72 e 75, nota.
Parte III I Constituição ••
124 Rejeitam-no: MAURICE HAURIOU, op. cit., págs. 260-261; BENJAMIN AKZIN, op. cit., loc. cit., págs. 697 e
segs.; JULlEN LAFERRIERE, op. cit., loc. cit., págs. 6 elO; FERRUCCIO PERGOLESI, Diritto Costituzionale, 11,
15! ed., Pádua, 1963, pág. 198; MAGED EL HELw, op. cit., págs. 113 e segs.; KLAUS STERN, op. cit., pág.
263; ANNA CÂNDIDA DA CUNHA FERRAZ, op. cit., págs. 184, 195, 196 e 234 e segs.; CRISTINA QUEIROZ,
O plano na Constituição de 1976, in Conselho Nacional do Plano - Boletim, n2 16, 32 quadrimestre
de 1988, pág. 127; KONRAD HESSE, Gründzuge des Verfassungsrecht der Bundesrepublik Deutschland,
1995, trad. Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha, Porto Alegre, 1998,
pág. 44; GOMES CANOTILHO, Direito ..., cit., pág. 862. Cfr. o parecer n2 33/80 da Comissão Constitucional,
de 20 de Novembro, in Pareceres, XIV, pág. 99.
125 Cfr., por todos, SANTI ROMANO, L'instaurazione, cit., loe. cit., págs. 151 e segs.; KELSEN, Teoria Pura ...,
cit., 11, págs. 38 e segs.; RUGGIERO MENEGHELLI, 1/ prablema dell'effettività nel/a teoria della validità
giuridica, Pádua, 1964, máxime págs. 171 e segs. e 185 e segs.; "Validità giuridica nel normativismo e
Parte 111I Constituição ••
virtual idade de ação. O seu lugar haverá de ser o que resultar da sua capacidade para
conformar situações de vida - ne te ca o, situaçõe da vida política, ituações con titu-
cionalmente ignificativa (sejam situações recíprocas dos órgãos de poder, sejam mesmo
relações entre o E tado e a pes oa ).
De nenhuma norma constitucional (da Constituição formal) aludir ao costume como
in trumento de produção jurídica quando muito ó poderia extrair-se uma ilação sobre
uma eventual po ição da fonte de Direito constitucional que é a lei constitucional, não a
posição da ordem constitucional no seu todo. Aproveitando o argumento clássico contra
o raciocínio formulado a partir das leis que ignoram ou até vedam o costume, dir-se-ia
que, a haver tal po ição, ela poderia vir a ser infirmada pela dinâmica jurídica, por meio
de costume de sinal contrário.126
O co tume possui, decerto, um relevo bem secundário no domínio do Direito cons-
titucional. A verificação mai elementar assim o comprova. Mas não porque o proíba a
Constituição em sentido formal, e sim porque a vocação de ta vem a ser a de regular a
totalidade da relações política e apenas onde ela não chega ou onde não é efetiva pode
entrar o costume.
A exi tência de Con tituição formal não determina a sua exclusividade; determina
(parafra eando HELLER) a primazia da normatividade constitucional. O que a Constitui-
ção formal implica não é a proibição de normas constitucionais criadas por outra via que
não a legal; é que tai normas se lhe refiram, nela entronquem e formem com ela, e sob a
sua égide, uma incindível contextura sistemática.
A esta luz, quando se e tipula que o poder é exercido nos termos da Constituição, tem
de e entender que on tituição abrange, em primeiro lugar, a Constituição formal escrita
e, em segundo lugar, as norma con uetudinárias que, de diversos modos, a venham com-
pletar. Constituição é tudo e é e a Constituição que os órgãos do poder têm de acatar. 127
O que acaba de er dito deve, de seguida, ser confrontado com os três tipos de costu-
me habitualmente distinguidos em face da lei - costume secundum legem, praeter legem
e contra legem.
nell'istituzionalismo", in Diritto e Società, 1991, págs. 1 e segs.; MARIO NIGRO, "Costituzione ed effettivi-
tà costituzionale", in Rivisto Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, 1969, págs. 1.967 e segs.
126 Cfr., por todos, OLIVEIRAASCENSÃO,op. cit., págs. 266 e segs., máxime 268 e segs. Mas não partilhamos
a ideia de que o costume éo modo de excelência de revelação do Direito.
127 Cfr. ANT6NIO VIEIRA CURA, "O costume como fonte de Direito em Portugal", in Boletim da Faculdade de
Direito da Universidade de Coimbro, 1998, pág. 269.
128 MARCelO REBelO DE SOUSA,op. cit., pág. 49.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
i tema, não são poucas as regra constitucionai que carecem de confirmação con uetu-
dinária para e imporem.'29
Nun e noutro ca os haverá co tume con titucional verdadeiro e próprio, contan-
to que o comando constitucional eja cumprido não por mera força da ua inserção na
Con tituição formal, ma por força de a me ma prática tida por obrigatória; 130e é
na m dida em que a norma acatada efetivamente e de prende, de certo modo, da Con -
tituição formal que pode haver relevância do co tume.
129 Assim, CARLO ESPOSITO, op. cit., loe. cit., págs. 463 e segs.
130 Não parece, por isso, correto dizer que o costume seeundum legem tem mero valor estático (como diz
PABLO LUCAS VERDU, op. cit., 11,pág. 504).
131 DENIS LEW, op. cit., pág. 85.
132 Neste sentido, CARMELO CARBONE, op. cit., págs. 33 e segs.
133 Cfr. GEORGES BURDEAU, op. cit., IV, págs. 286 e segs.
Parte 111I Constituição ••
VI-A norma criada p rco tumecon titucional tornam- e norma con titucionai
pela ua e pecífica referência à norma da on tituição formal. 139-140
Há um ó ordenamen-
134 Cfr., neste sentido, GEORGJELlINEK, Teoria ..., cit., pág. 406; Mc BAIN, The Living Constitution, cit., págs.
24-25.
135 CARMELOCARBONE,op. cir., pág. 88.
136 Cfr. o conceito de revisão constitucional apócrifa de VITAL MOREIRA ("A segunda revisão constitucional",
in Revisto de Direito Público, IV, nº 7, 1990, pág. 16).
137 Quer dizer: o costume constitucional forma-se quase sempre a partir de certos atos ou omissões; toda-
via, só aparece, em rigor, quando esses atos ou omissões deixam de ser interpretados como tais para
passarem a ser interpretados como elementos integrantes de algo qualitativamente diverso, de um
fato normativo.
138 O costume constitucional resulta, decerto, do comportamento dos órgãos fundamentais do Estado e
não é expressão de autonomia da coletividade organizada (FRANCO PIERANDREI,op. cir., loco cir., pág.
111). Mas isso não pode significar que passe inteiramente à margem da coletividade dos cidadãos, que
dependa só do Estado-poder.
139 Normas formalmente constitucionais (no sentido de dotadas de força jurídica específica de normas
constitucionais), mas não normas instrumentalmente constitucionais. Em contrapartida, quando nor-
mas caídas em desuso ainda apareçam na Constituição instrumental, verifica-se o máximo afastamento
possível entre esta e a Constituição formal.
140 Diferentemente, MARCELO REBELODE SOUSA,op. cir., pág. 49, para quem o costume é fonte de Direito
constitucional material, não de Direito constitucional formal.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
to con titucional, centrado na Con tituição formal; 141não doi i tema con titucionai ,142
um de origem legal, outro de origem con uetudinária.
Ela po uem, por con eguinte, valor upralegislati 0,143e ó podem er ub tituída
ou por lei con titucional ou por outro co tume con tituciona1.144 orno é próprio da norma
formalmente con titucionai , vêm a er u cetí ei de garantia atra é do mecani mo
de fi calização que e tejam pre i to .145a ua iolação implica incon titucionalidade;l46
e hou er leis ordinárias anteriore de ntido di crepante, ela ficarão r ogada ou tida
por incon titucionai upervenientemente (con oante e entender).
VIl - ão vale isto dizer, no entanto, que os requi ito d formação da norma
con uetudinária con titucionai tenham de er diferente do da formação da demai
norma con uetudinária. em e vê como pude e ha er proce o diferente para a
formação de costume reportado a norma constitucionai e para a formação de co tume
reportado a norma legais.
Não ob tante, há que reconhecer alguma particularidade do co tume con titu-
cional, determinadas não tanto pelas caraterísticas própria da norma con titucionai
quanto pela gravidade e pela publicidade do eu modo de formação. ão ela :
141 Contra, SÉRGIOCOITA, op. cit., loc. cit., págs. 166-167: a unidade da Constituição é uma unidade históri-
ca e dialética de normas legislativas e de tradições e comportamentos normativos, uma unidade entre
um elemento formal e um elemento material.
142 Cfr. CARLOESPOSITO,op. cit., loc. cit., pág. 457.
143 Contra: JUlIEN LAFERRIERE,op. cit., pág. 40.
144 Deve entender-se que é por novo costume, substitutivo de um anterior, que se verifica um eventual
renascimento de norma constitucional escrita antes caída em desuso. Sobre costume anterior e poste-
rior, v. EL HELW, op. cit., págs. 143 e segs.
145 Sobre as garantias do Direito não escrito, DENIS LEVY, op. cit., loe. cit., págs. 88 e segs.
146 Ainda que uma lei contrária a um costume constitucional possa ser, por sua vez, um grau ou momento
de formação de nova norma constitucional.
147 Sobre o tempo, v. TEMISTOCLEMARTINES, op. cit., págs. 312 e segs.
Parte 111 I Constituição ••
148 Cfr., por todos, MICHELEAINIS, "Sul valore della prassi nel diritto costituzionale, in Rivista Trimestrale di
Diritto Pubblico, 2007, págs. 309 e segs.
149 Cfr. A. V. DICEY,Intraductian to the Study ofthe Law ofthe Constitution, 10~ ed., reimpressão, Londres,
1965, págs. 417 e segs.; COSTANTlNOMORTATI,La Costituzione..., cit., págs. 175 e segs.; GIUSEPPETREVES,
"Convenzioni costituzionali", in Enciclopedia dei Diritto, X, 1962, págs. 524 e segs.; KARl LOEWENSTEIN,
op. cit., págs. 165 e segs.; IVORJENNINGS,The Law of the Constitution, 5~ ed., reimpressão, Londres,
1967, págs. 80 e segs.; ARMANDO MARQUESGUEDES,op. cit., pág. 359; GEORGESBURDEAU,op. cit.,
IV, págs. 28 e segs.; O. HOOD PHllllPS, "Conventions on the British Convention", in Scritti in onore di
Gaspare Ambrosini, obra coletiva, 111, Milão, 1970, págs. 1.599 e segs.; GIUSEPPEUGO RESCIGNO,Le
convenzioni costituzionali, Pádua, 1972; VINCENZOZANCARA, "Costituzione materiale e Costituzione
convenzionale", in Scritti in onore di Costantino Mortati, obra coletiva, I, págs. 337 e segs.; ASCENSIÓN
ELVIRAPERAlES,"Las convenciones constitucionales", in Revista de Estudios Politicos. págs. 125 e segs.,
setembro-outubro de 1986; GONZÁlEZTREVIJANO,"Convenciones constitucionales y regias de correc-
ción constitucional", in Revista de Derecho Publico, 1988, págs. 49 e segs.; PIERREAVRll, Lesconventions
de la Constitution. Normes non écrits du droit politique, Paris, 1997; IAN LOVELAND,op. cit.. págs. 331 e
segs.; QUIRINO CAMERlENGO,op. cit.. págs. 99 e segs.; GOMESCANOTllHO, Direito ...• cit., pág. 863-864;
JAIME VAllE, "As convenções constitucionais no quadro das fontes de Direito Constitucional, in O Direi-
to, 2010, págs. 169 e segs.
150 Cfr. SANTI ROMANO, "Diritto e correttezza costituzionale", in Scritti Minori, I, págs. 271 e segs.; A. TE-
SAURO."La consuetudine costituzionale e le norme di correttezza costituzionale". in Scritti giuridici in
memoria di V. E. Orlando, obra coletiva, Pádua, 1957, 11, págs. 489 e segs.; PABlO LUCASVERDU.op. cit.,
11, págs. 513 e segs.; ANTONIO REPOSO,"Le regole di correttezza costituzionale nel sistema delle fonti-
fatto", in Scritti in onore di Costontino Mortoti, I, págs. 259 e segs.; GONZÁlEZTREVIJANO,"Las regias de
corrección costitucional, los precedentes costitucionales y la praxis costitucional", in Revisto de Dere-
cho Publico. págs. 79 e segs., 1988; QUIRINOCAMERlENGO,op. cit., págs. 179 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
juri prudência pode er fonte d Dir ito con titucional, inclu i e m i tema d
tipo franc' , eja em molde de co tum , eja, e entualment ,a título de deci ão do tri-
bunal a que a lei confira força obrigatória geral.
ada impede que urja co tum juri prudencial con titucional a partir de uma inter-
pr tação ou de uma integração feita p lo tribunai . E, ob certo a peto , há quem a i-
mil a deci õe com eficácia geral obr matéria con tituci nai , como a declaraçõe
de incon titucionalidade ou de ilegalidade pronunciada por tribunai con titucionai ou
por outro órgãos jurisdicionais ou juri dicionalizado , a atos normati os. Isto tudo me -
mo em entrar na problemática geral da juri prudência e da ua autonomia perante a
normas de origem legaI.151-152
151 Cfr. FRANÇOISLUCHAIRE,"De la méthode en droit constitutionnel", in Revue du droit public, págs. 286 e
segs., 198!.
152 Cfr., por exemplo, a síntese de JoÃo BAPTISTAMACHADO, "Jurisprudência", in Polis, 111, 1985, págs. 842 e
segs.
Capítulo 111
MODIFICAÇÃO E SUBSISTÊNCIA DA CONSTITUiÇÃO
§ 12
As modificações constitucionais em geral
1 Cfr., por todos, TEMISTOCLEMARTINES, op. cit., loc. cit., págs. 799 e segs.; ANNA CÂNDIDA DA CUNHA
FERRAZ,op. cit., págs. 5-6; QUIRINO CAMERLENGO,op. cit., págs. 235 e segs.; Luís ROBERTOBARROSO,
"Mutação constitucional", in Estudo de Direito Constitucional em homenagem à Professora Doutoro
Mario Garcia, obra coletiva, 2~ ed., São Paulo, 2008, págs. 291 e segs.; JosÉ TARcíZIO DE ALMEIDA MELO,
Direito Constitucional do Brasil, Belo Horizonte, 2008, págs. 93 e segs.
2 MARIO NIGRO, op. cit., loc. cit., pág. 1708.
3 Cfr. WLADIMIR BRITO, "Tempo e Direito. O tempo de revisão constitucional", in Direito e Cidadania, n!!
16/17, págs. 219 e segs., setembro de 2002, máxime 242 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
A experiência que conhecemos dá-nos conta de tudo i to. Cabe, poi , agora, a partir
da sua observação compreensiva, proceder a uma tipologia das principais forma de mo-
dificação das Constituições.4
4 Cfr. o conceito de modificações constitucionais já nas nossas lições policopiadas de Ciência Política e
Direito Constitucional, Lisboa, 1972, I, págs. 249 e segs.
5 Cfr. GEORG JELlINEK, Reforma ..., cit., págs. 7 e segs.; RUDOLF SMEND, op. cit., págs. 201-202; CARL SCH-
MIn, op. cit., págs. 115 e segs.; COSTANTlNO MORTATI, La Castituzione ..., cit .• págs. 204 e segs., e Scritti ...•
cit., 11,págs. 180 e segs.; GEORGES BURDEAU, op. cit., IV, págs. 247 e segs.; KARL LOEWENSTEIN, op. cit..
págs. 162 e segs.; PABLO LUCAS VERDU, op. cit., 11,págs. 639 e segs.; MIGUEL GALVÃO TELES, O problema ...,
cit.; MARCELO REBELO DE SOUSA, op. cit., págs. 69 e segs.; ANTONIO HERNÁNDEZ GIL, EI cambio político
espanol y la Constitución, Madrid, 1982, págs. 24 e segs.; KONRAD HESSE. ap. cit.. págs. 25 e 87 e segs.;
FRANCISCO LUCAS PIRES, Teoria da Constituição de 1976, cit., págs. 149 e segs.; EDVALDO BRITO. Limites
da revisão constitucional, Porto Alegre, 1993, págs. 80 e segs.; JosÉ TARcíZIO DE ALMEIDA MELO, Direito
Constitucional Brasileiro, Belo Horizonte, 1996, págs. 89 e segs.; GIUSEPPE MORBIDELlI, "Le dinamiche
delle Costituzioni". in G. MORBIDELlI, L. PEGORARO, A. REPOSO e M. VOLPI, Diritto Costituzionale Italiano e
Compara to, 2ª ed., Bolonha, 1997, págs. 113 e segs.; ERIC VOEGlIN, A natureza do direita e outros textos
jurídicos, trad., Lisboa, 1998, págs. 82 e segs.; SERGIO DIAZ RICCI, "Introducción a las mutaciones consti-
tucionales", in Estado e Direito, 1998-2000, págs. 65 e segs.; RAÚL MACHADO HORTA, op. cit., págs. 97 e
segs.; OllVIER BÉAUD, "Les mutations de la Veme République ou comment se modifie une Constitution
écrite", in Pouvoirs, 99, 2001, págs. 19 e segs.; GIUSEPPE DE VERGOTIlNI, op. cit., I, págs. 161 e segs.
Em perspetiva de Ciência Política, cfr. Compara tive Políticas, obra coletiva editada por HARRY ECKSTEIN
e DAVID E. APTER, Nova Iorque, 1963, págs. 549 e segs.; LEONARDO MORlINO, Come cambiano i regimi
politici, Milão, 1980.
6 KARL LOEWENSTEIN fala em reformas e mutações constitucionais.
Parte 111I Constituição _
Il - A vici itude con titucionai expre as con tituem a grande maioria das vici i-
tudes; as entam numa ontade; afirmam- e como ato jurídico ; tanto podem er totai como
parciai ; e entre ela contam- e, de ignadamente a revi ão con titucional a derrogação con -
titucional a re olução, certas forma de tran ição con titucional e de rotura não revolucio-
nária. Já a ici itude tácita são nece ariamente parciai , ainda que de alcance geral e
ab trato; e englobam o co tume con titucional, a interpretação evolutiva e a revisão indireta.
Contudo, apena a vici itude parciai implicam rigorosamente modificaçõe
con titucionai . A vicissitude totais, es a correspondem à emergência de nova Consti-
tuição seja por via evolutiva (tran ição con titucional) ou por via de rotura (revolução).
Tamb 'm a ici itude de alcance geral e abstrato podem er totai ou parciai .
não a de alcance individual concreto ou excecional (derrogaçõe con titucionai ), por
definição empre parciai .
A ici itude em quebra de continuidade ão qua e toda parciai , determinam
mera modificaçõ . a ici itude com rotura (que podemos de ignar por alterações
con titucionai tricto en u) p rfilam- e qua e todas ao invés, como totai . Ma pode
ha er ici itude totais na continuidade - contanto que a nova Con tituição advenha
com re peito da regra orgânica e processuais anteriore - e vicis itudes parciai na
de continuidade - a rotura não revolucionárias.
As vici itude de efeito temporário ou suspensõe da Constituição podem er to-
tai ou parciai e feita no termo da on tituição ou em a ua ob ervância. A suspensão
total da on tituição redunda empre em revolução. A u pen ão parcial em ob ervância
da regra con titucionai em rotura não revolucionárias. A u pensão parcial de alcance
indi idual, concreto ou excecional em derrogação. ó a u pen ão parcial da Con titui-
ção de alcance geral e ab trato, na forma da própria Con tituição repre enta um conceito
autónomo, a integrar na categoria genérica da providência ou medida de neces idade.
7 Cfr. a contraposição formulada por AOOlF MERKl (citado por MIGUEL GAlVÃO TelES, O problema ..., cit.,
pág. 9) entre alterações constitucionais imanentes e transcendentes, consoante ocorram com ou sem
observância dos termos prescritos pela Constituição.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Vici situde
con titucionai Revolução
quanto ao objeto
To ta i
Transição con titucional
Vici itude
constitucionais De alcance geral e abstracto - Toda , menos a
quanto ao derrogação con titucional
alcance
I Temo, poi , como e p' cie de ici itude c n titucionai a re i ão con titu-
cional, a derrogação con titucional, o co tume con titucional a interpretação e oluti a
da on tituição, a revi ão indireta, a revolução, a rotura não revolucionária, a tran ição
con titucional e a u pen ão (parcial) da on tituição.
Importa caraterizá-I brev mente, para depoi dedicarmo maior atenção ao tipo
mai ignificati o na per p ti a da modificação da on tituição, e perante o qual o ou-
tro , de certo modo, e definem p r contrapo ição ou por exclu ão de parte a re i ão
con tituciona1.
8 Cfr. a direta afirmação do princípio no art. 792 da Constituição federal alemã e ainda nos arts. 822, §
22, da Constituição portuguesa de 1911, 1372, § 32, da Constituição de 1933 (em 1974) e 285º, nº 1, da
Constituição de 1976 (no texto atual).
9 Evidentemente, cada revisão constitucional em concreto prosseguirá mais ou menos uma ou outra des-
tas vertentes. Cfr. GAETANOSILVESTRE,
"Spunti di riflessioni sulia tipologia e sui limiti delia revisione costi-
tuzionale",in Studi in onore di P. Biscaretti di Ru/fi, obra coletiva, 11, Milão, 1987, págs. 1.187 e segs.
10 Assim, a Constituição argentina (art. 302), a austríaca (art. 442, n2 3), ou a suíça de 1999 (arts. 1922 e 1932).
11 Sobre revisão constitucional, v., além das obras gerais já citadas, GABRIELARNOULT, De la révision des
Constitutions, Paris, 1886; COSTANTINOMORTATI, "Concetto, limiti, procedimento delia revisione costi-
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
to agravada ou por meio de assembleia con tituinte a convocar para o efeito,'2 e então já
se está no campo da transição con titucional.
tuzionale", in Revista Trimestrale di Diritto Pubblico, 1952, págs. 29 e segs.; CARlO ESPOSITO,"Costitu-
zione, leggi di revisione della Constituzione e 'altri' leggi costituzionale", in Roccolto di Scritti in onore
di Arturo Carlo lemolo, obra coletiva, 111,Milão, 1963, págs. 191 e segs.; GIUSEPPECONTINI, La Revisione
della Costituzione, Milão, 1962, e "Le Revisione Constituzionale", in EnciclopediaXL, 1989,
dei Diritto,
págs. 134 e segs.; STEFANOMARIA CICCONETII, La Revisione della Costituzione, 1962; MAURICE-
Milão,
PIERRERoy, "L'application de I'article 89 de la Constitution de 1958", in Revue du droit public, págs. 687 e
segs., 1980; MANUEl CONTRERAS,"Sobre las transformaciones constitucionales y sus limites", in Revista
de Estudios Politicos, n2 16, págs. 165 e segs., julho-agosto de 1980; La Révision de la Constitution, obra
coletiva, Aix-en-Provence-Paris, 1993; JAVIERPÉREZRoyo, La reforma de la Constitución, Madrid, 1987;
AFONSO D'OllVEIRA MARTINS, La Revisión Constitucional y el Ordenamiento Português, Lisboa-Madrid,
1995; NELSONDE SOUSASAMPAIO, O poder de reforma constitucional, 3! ed., Belo Horizonte, 1996; Luc
HEUSCHlING, État de Droit, Rechtsstaat, Rule of Law, Paris, 2002, págs. 609 e segs.
12 Cfr. a Constituição brasileira de 1934 (art. 1782), a espanhola de 1978 (arts. 1672 e 1682), a búlgara de
1991 (art. 1582), a colombiana de 1991 (art. 3762), a russa de 1993 (art. 1352), ou a venezuelana de
1999 (arts. 3472 e segs.).
13 Cfr. uma noção diferente em VITTORIO ITAlIA, La Deroga nel Diritto Pubblico, Milão, 1977, máxime págs.
13-14, 86 e segs. e 93 e segs. Para este autor, a exceção é um preceito incompatível com outro; o ato
derrogante um preceito contrário, mas não incompatível com o ato derrogado (pág. 56).
14 CARl SCHMITT,op. cit., pág. 116.
15 FRANCOPIERANDREI,La Corte Constituzionale ..., cit., loc. cit., págs. 100 e segs.
16 Cfr. o art. 522 da Constituição de Ceilão (Sri Lanka) de 1972: "1. A Assembleia Nacional pode aprovar
uma lei que, em certos pontos ou sob certos aspetos, não seja compatível com uma disposição da
Constituição, sem modificar nem revogar esse preceito constitucional, desde que tal lei seja aprovada
pela maioria necessária para modificar a Constituição - 2. Uma lei aprovada nos termos do n2 1 não
será considerada modificativa das disposições da Constituição com as quais é incompatível". E o art.
912, n2 3, da Constituição holandesa de 1983: "Qualquer preceito de um tratado contrário à Cons-
tituição ou que implique uma contradição com a Constituição só pode ser aprovado por maioria de
dois terços de votos" (sobre o assunto, cfr. RUI MOURA RAMOS, A Convenção Europeia dos Direitos do
Homem - Sua posição foce ao ordenamento jurídico português, Coimbra, 1982, pág. 1.341).
Parte 111 I Constituição _
poder con tituinte originário (a chamada por certo autore , autorrotura da Con titui-
ção). Ma a legitimidade de tais norma derrogatórias tem ido conte tada: pelo meno
a admi ibilidade incontrolada de rotura de emboca na manipulaçõe con titucionai ,
conducente a um conglomerado de rotura (HE E), con titutiva de outra Con tituição,
ub tancialmente diferente da on tituição de enhada pelo poder con tituinte.17
Quanto a nó , em face de norma con titucionai excecionai há que distinguir con-
forme a d rrogação afeta um princípio fundamental da Con tituição ou não e, no primeiro
ca o, ainda e e trata de derrogação originária ou de derrogação uperveniente.
A derrogaçõe originária (como a do art . 30 o e 3090 da on tituição de 1976 no
texto inicial)' levantam problemas de legitimidade ou de ju tiça material, não de incon -
titucionalidade - por e tar em cau a o poder con tituinte.'9 Pelo contrário a derrogaçõe
uperveniente de princípio fundamentai devem ter- e por incon titucionai . As derro-
gaçõe de norma que não ejam princípio fundamentai e a parecem admi síveis.20
Às derrogaçõe constitucionais podem assimilar-se na prática as inconstitucionali-
dades materiai não objeto de invalidação ou de outra forma de fi calização eficaz.
17 GOMESCANOTllHO. Direito Constitucional. 4! ed., cit., pág. 760. Cfr. Direito ..., cit.. págs. 1.077-1.078.
18 Mas não a ressalva de casos julgados aplicadores de normas inconstitucionais (como pretende PAULO
OTERO.Ensaio sobre o caso julgado inconstitucional, Lisboa. 1993. pág. 89), pois do que se trata é da
prevalência de um princípio - o de segurança jurídica. inerente ao Estado de Direito (art. 22) - sobre
outro princípio.
19 Cfr. infra.
20 Sobre as derrogações ou roturas materiais da Constituição, v. ainda CARlO ESPOSITO.La Validità delle
Leggi (1934), reimpressão, Milão, 1964, págs. 183 e segs.; COSTANTlNOMORTATI,Scritti ..., cit., 11, págs.
191 e segs.; MARCElO REBElODESOUSA,op. cit.. págs. 85-86; VIEIRA DEANDRADE,op. cit., 1! ed .• pág.
320; PEDRODEVEGA. op. cit., págs. 166 e segs.; QUIRINO CAMERlENGO,op. cit.. págs. 242-243.
21 Sobre modificações tácitas da Constituição em geral. cfr. CARlO ESPOSITO,op. cit., págs. 180 e segs.;
FRANCOPIERANDREI.op. cit., loc. cit.; COSTANTINOMORTATI,Scritti ..., cit.. 11, págs. 189 e segs.; ROGÉRIO
SOARES.Constituição ...• cit., loc. cit., pág. 670 (que as designa por "transições constitucionais"); TEMIS-
TOClEMARTINES.op. cit., loc. cit., págs. 800 e segs.; KONRADHESSE,op. cit., págs. 87 e segs.; ANNA CÂNDI-
DADACUNHAFERREIRA,op. cit., págs. 19 e segs. e 177 e segs.; BISCARETIIDI RUFFIA.Diritto Costituzionale
Compara to, cit., págs. 692 e segs.; UADI LAMÊGO BUlUS, Mutação constitucional, São Paulo, 1997;
QUIRINO CAMERlENGO.op. cit., págs. 235 e segs. e 267 e segs.; ERNST-WOlFGANGBOCKENFORDE, Estú-
dios sobre el Estado de Derecho y la Democracia. trad., Madrid. 2000, págs. 181 e segs.; ANA VICTORIA
SANCHÉZURRUTfA,Mutación constitucional y fuerza normativa de la Constitución. "Una aproximación aI
origen dei concepto", in Revista Espai'iola de Derecho Constitucional, n2 58, págs. 105 e segs.• 2000. Cfr.
também PAULOJOSÉLEITEFARIAS."Mutação constitucional judicial como mecanismo de adequação da
Constituição económica à realidade económica", in Revista de Informação Legislativa, 133, págs. 213 e
segs., janeiro-março de 1997.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
22 Sobre o problema, cfr., por todos, EMllIO BETII, Irterpretazione della legge e degli atti giuridici, Milão,
1949, págs. 22 e segs.; GUSTAV RADBRUCH, Filosofia do Direito, 4! ed. portuguesa, Coimbra, 1961, I,
págs. 271 e segs.; MANUel DE ANDRADE, Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leis, 2! ed., Coim-
bra, 1963, págs. 14 e segs.; CASTANHEIRANEVES,"Interpretação jurídica", in Palis, 111,págs. 651 e segs.
23 KARl LOEWENSTEIN,op. cit., pág. 164. Mas as modificações da Constituição tem de ser compreendidas
"no interior" das suas normas, e, de modo algum, fora da sua normatividade (KONRAD HESSE,op. cit.,
págs. 106 e 109).
24 Este conceito não coincide com o de revisão indireta ou tácita, de que fala FRANCOPIERANDREI(op. cit.,
loc. cit., págs. 94 e 98).
25 Trata-se, pois, de uma rotura formal em contraposição à derrogação constitucional que é uma rotura
material. Mas por rotura formal pode também se fazer (ou tende mesmo quase sempre a fazer-se)
rotura material.
26 MIGUel GAlVÃO TelES, O Problema ..., cit., pág. 31. Este autor aponta a restauração como forma mista
entre a revolução e a rotura (pág. 33), pois ela nega a pretensão de validade do Direito imediatamente
precedente, mas reconhece a daquele que o antecedeu.
Parte 111I Constituição ••
27 Cfr. FRANCISCOLUCAS PIRES, Teoria ..., cit., págs. 125 e segs.; GOMES CANOTllHO, Direito ..., cit., págs.
1.073-1.074. Como este Autor sublinha, a abertura à evolução é um elemento estabilizador da própria
identidade; garantir a identidade reflexiva de uma Constituição significa dotá-Ia de capacidade de pres-
tação em face da sociedade e dos cidadãos.
28 V. Manual ...• I, cit., págs. 419 e segs. e Autores citados.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
29 Cfr., por agora, CARLSCHMITI, op. cit., pág. 116, e La Dictadura, trad., Madrid, 1968, págs. 221 e segs.;
PEDROCRUZ VILLALON, EI Estado de Sitio y la Constitución, Madrid, 1980, págs. 277 e segs.; JORGEBACE-
LARGOUVEIA, O estado de exceção, Lisboa, 1999; JORGEMIRANDA, Manual ..., IV, cit., págs. 342 e segs.;
GIUSEPPEDE VERGOTTINI,Diritto ..., cit., págs. 172 e segs.
30 Aparentemente eram flexíveis a Constituição romena de 1965, a alemã oriental de 1974 e as chinesas
de 1975 e 1978.
31 Cfr. supra e, em especial, KARLLOEWENSTEIN,Constitución - Derecho Constitucional, cit., loc. cit., págs.
120-121; BISCARETTIDI RUFFIA, "La revisione costituzionale negli 'Stati socialisti' europei; 'norme giuri-
diche' e 'norme convenzionali"', in Rivista Trimestrale di Diritto Publico, 1981, págs. 414 e segs.
Parte 111I Constituição ••
32 V. The American Commonwealth (1884). 2! ed. francesa La République Américaine, Paris, 1911, I, págs.
524 e segs., e "Flexible and Rigid Constitutions", in Studies in History and Jurisprudence, 1901 (na 2! ed.
castelhana, cit., págs. 19 e segs. e 94 e segs.).
33 V. Introduction to the Study af the Law of the Constitution (na lO! ed., cit., págs. 126 e segs.).
34 Sobre Constituições rígidas e flexfveis, v. também GEORGJElLlNEK,op. cit., págs. 403 e segs.; A. ESMEIN,
op. cit., I, págs. 564 e segs.; LÉONDUGUIT, Traité de Droit Constitutionnel, 3! ed., Paris, 1927, 111,págs.
687 e segs.; Mc BAIN, The Living Constitution, cit., págs. 16 e segs.; LUIGI ROSSI,"La 'elasticità' dello Sta-
tuto italiano", in Scritti giuridici in onore di Santi Romano, obra coletiva, Pádua, 1940, I, págs. 25 e segs.;
HOODPHILLlPS,Constitutional and Administrative Law, 4! ed., Londres, 1967, págs. 20-21; QUEIROZLIMA,
Teoria do Estado, 8! ed., Rio de Janeiro, 1957, págs. 265 e segs.; KARLLOEWENSTEIN, Teoria ..., cit., págs.
208-209; HAROLDLASKI,A Grammar of Politics, 5! ed., Londres, 1967, págs. 134 e segs. e 205 e segs.;
FRANCOMODUGNO, L'lnvalidita ..., cit., I, págs. 66 e segs., máxime 69 e segs.; C. F.STRONG,Modem Politi-
cal Constitutions, 8! ed., Londres, 1972, págs. 130 e segs.; HENCVAN MAARSEVENe GERVAN DERTANG,
op. cit., págs. 249 e 258-59; MARCElLOCAETANO,op. cit., I, págs. 399 e segs.; PONTESDEMIRANDA, Demo-
cracia, Liberdade, Igualdade, 2! ed., São Paulo, 1979, págs. 123 e segs.; KONRADHESSE,op. cit., págs. 24
e segs.; HERBERTHART,op. cit., págs. 82 e 83; IGNACIODE Ono, op. cit., págs. 59 e segs.; MARCElONEVES,
Teoria da inconstitucionalidade das leis, São Paulo, 1988, págs. 86 e segs.; NELSONDESOUSASAMPAIO,
op. cit., págs. 47 e segs.; JOAQUINVARELASUANZES,"Riflessioni sul concetto di rigidità costituzionale", in
Giurisprudenza Costituzionale, 1994, págs. 3.313 e segs.; MARIA PAOLAVIVIANI SCHLEIN,Rigidità costitu-
zionale, limiti e graduazioni, Turim, 1997; ALESSANDRO PACE,op. cit., págs. 1 e segs.; GOMESCANOTILHO,
Direito ..., cit., págs. 1.059 e segs.; CARLOSBLANCODEMORAIS, op. cit., I, págs. 57 e segs.
Mc BAIN contesta, porém, o valor da distinção entre Constituições rígidas e flexíveis, notando que as
Constituições escritas variam na medida da sua resistência à transformação. A flexibilidade de algumas
Constituições e a rigidez de outras derivam de fatores que largamente, senão na totalidade, se situam
fora do processo de revisão.
ROSSIacentua a ideia de elasticidade (aliás não estranha ao pensamento de BRYCE);afirma que uma
Constituição é rígida, não por ser imodificável pelo Parlamento, mas que não é modificável por ser
rígida; diz que a variabilidade e a incerteza das fontes de Direito são as caraterísticas das Constituições
flexíveis; enfim, para ele, a diferença entre um e outro tipo reside não só na forma como ainda na
substância. Cfr. as apreciações de GIUSEPPECHIARElLI("Elasticità de lia Costituzione", in Rivista Trimes-
trale di Diritto Pubblico, 1952, págs. 322 e segs.) e de FERRUCIOPERGOLESI ("Rigidità ed elasticità della
Costituzione italiana", in Rivisto Trimestrale di Dirirto e Procedura Civile, 1959, págs. 44 e segs.).
VAN MAARSEVENe VAN DERTANG, seguindo outro autor (WOLF-PHILlPPS),sugerem uma terminologia
diferente: que a contraposição se faça entre Constituições condicionais e não condicionais, sendo con-
dicionais aquelas que contemplam um especial processo de modificações e, portanto, as condições em
que tais alterações podem ser realizadas.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Para HART, a diferença entre um sistema jurídico em que o órgão legislativo ordinário está livre de li-
mitações jurídicas e outra em que o órgão legislativo a elas está sujeito surge como mera diferença da
maneira pelo qual o eleitorado soberano escolhe exercer os seus poderes soberanos.
Por seu turno, para GOMES CANOTILHO, não é a existência de um processo de revisão com exigências
específicas que carateriza a rigidez. Este caráter deve procurar-se em sede de poder constituinte.
Parte 111I Constituição
§ 2º
A revisão constitucional e o seu processo
gundo
Por a embleia Por a embleia
proce so
ordinária ordinária
Por proce sos legi lati o
apena de c mum
d mocracia
Por a embleia egundo
r pre ntati a Por a embleia ordinária proce o
especial reno ada para legi lati o
efeito da re i ã e pecial
Forma de
re isão
Por proc o
apena de Votação em a sembleia repre entati a,
democracia com referendo pos í el
repre entati a
de democracia Votação em a embleia repre entati a,
emidireta seguida de referendo nece ário
cumulativamente
I) Revi ão pela assembleia ordinária, pelo me mo processo de feitura das leis or-
dinária ;
2) Revi ão pela a embleia ordinária, em maioria diferente da requerida para a
lei ordinárias, ma com e pecialidade de outra ordem (v.g., quanto ao tempo e
à iniciativa);
3) Revi ão pela a embleia ordinária, com maioria qualificada;
4) Revi ão pela a embleia ordinária, renovada apó eleições gerai ub equente
a uma deliberação ou deci ão de abertura do proce o de revi ão, e com ou em
maioria qualificada;
5) Revi ão por a embleia ad hoc, por assembleia eleita especificamente e ó para
fazer re i ão (a que pode chamar- e convenção);
6) Revisão por assembleia ordinária (ou, eventualmente, por assembleia de revi-
ão), u cetível de ujeição a referendo, verificados certos pressupostos e em
termos ora de ratificação, ora de eto popular;
7) Revi ão por referendo que incide obre projeto elaborado pela assembleia ordi-
nária ou sobre lei de revi ão carecida de sanção popular;
8) Revisão peculiar da on tituições federai ,em que acre ce à deliberação pelo
órgãos do E tado federal a participação do Estados federados, por via repre en-
tativa ou de democracia emidireta, a título de ratificação ou de veto re oluti o.
JIl - A aprovação pelo Parlamento por maioria qualificada pode con iderar- e o
istema mai corrente de revi ão con titucional. O que varia é a maioria - ora ab oluta, e
não apena relativa, ora de doi terço (a mai u ual), ora de trê quarto, ou outra.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Quando a Con tituição e contenta com a maioria ab oluta, e tipula também que
deve haver dua sucessiva votaçõe no mesmo entido com certo intervalo entre ela :
a im, a Con tituiçõe pru iana de 1850 (art. 107°), colombiana de 1886 (art. 218°) ou
brasileira de 1891 (art. 90°) 1934 (art. 178°, quanto à re i ão parcial ou emenda), 1946
(art. 217°) e 1967 (art. 51°).
Pelo contrário, para a maioria de doi t rço ba ta qua e empr uma ó votação:
Con tituiçõe de Weimar (art. 76°), mongol de 1930 (art. 95°), oviética de 1936 (art.
146°) e 1977 (art. 174°), cubana de 1940 (art. 225°), birmane a de 1947 (art. 207°), norte-
coreana de 1948 (art. 124°, quando a iniciativa eja do membro do Parlamento) ai mã
federal (art. 79°), indiana de 1950 (art. 36 0, quanto a matéria não atinente à e trutura
federal), malaia de 1957 (art. 159°), turca de 1961 (art. 155°), ceilane a de 1972 (art.
51°), moçambicana de 1975 (art. 48°), portugue a de 1976 (art. 286°, hoje), argelina de
1976 (art. 193°), croata de 1990 (art. 138°), e lo ena de 1991 (art. 16 0), cabo- erdiana
de 1992 (art. 283° e egs.) ucraniana de 1996 (art. 155°), polaca de 1999 (art. 235°)
timoren e (art. 156°), a moçambicana de 2004 (art. 295°) a angolana de 20 I O (art. 234°).
Dua votaçõe parlamentare por maioria de doi terços exigem, porém, a Con tituição
tunisina de 1959 (art. 61°) e abra ileira de 1967, apó 1969 (art. 48°).
Maioria de trê quinto exigem a Con tituição bra ileira de 1988, em doi turno de 0-
tação (art. 60°, 2°) a checa de 1992 (art. 39°, nO4), ou a e lo aca de 1992 (art. 84°, nO3).
Maioria de três quarto con ta da on tituiçõe da República da China de 1946
(art. 174°), sul-vietnamita de 1956 (art. 90°), cambojana de 1956 (art. 118°), birmane a de
1974 (art. 194°) e argelina de 1976 (art. 193°, quanto à di po içõe obre re i ão consti-
tucional), búlgara de 1991, na trê primeira otaçõe (art. 155°).
Maioria agravada, variávei con oante a matéria, con tam da Con tituição ul-
africana de 1996 (art. 74°).
A on tituição de Listen taino exige - no que deve er um máximo de rigidez - a unani-
midade ou, na ua falta, trê quarto em duas e õe con ecuti a da a mbleia (art. 111°).
IV - A revi ão por a embleia ordinária reno ada após eleiçõe gerai con i te em
ligar a votação da revi ão pelo Parlamento a uma imediata eleição anterior, que, a im, a
condiciona e que conforma o seu sentido. É um sistema ainda de democracia repre enta-
ti a, ma em que avulta mai patentemente o ingredient democrático.
Di tinguem- e doi momento : o momento em que e reconhece a nece idade de pro-
ceder à revisão e o momento em que e faz a revi ão. Começa- e por elaborar uma propo ta
de alteração ou por definir o ponto ou o preceito a alterar e cabe depois à a sembleia re-
ultante da eleiçõe gerais eguinte (quer pelo termo da legi latura, qu r em con equência
de di olução) apro ar, por maioria qualificada ou não, definiti amente a modificaçõe .
É e te o i tema de on tituiçõe como a noruegue a d 1814 (art. 112°), a por-
tugue a de 1822, 1826 e 1838 (art. 28°,140° a 143° e 138° e 139°, re petivamente), a
bra ileira de 1824 (art. 174° a 177°), a belga de 1831 (art. 131°) a e panhola de I 56,
186ge 1931 (art .87°a 9°, 1I00a 112°e 125°,re peti amente) a romena de 1866 (art.
12 0) a luxemburgue a de 186 (art. 115°), abra ileira d 1934 (art. 174°, quanto à re i-
ão total), a i lande a de 1944 (art. 79°), a boliviana de 1967 (art. 230° e 231°), a grega
de 1975 (art. 110°), a peruana de 1979 (art. 306°), a holande a de 1983 (art. 137°). E com,
não já dua ,ma trê ou mais votaçõe parlamentares, o istema ainda da on tituiçõe
Parte 111I Constituição ••
france a de 1791 (título VII), e panhola de 1812 (art . 376° a 383°), finlandesa (art. 73°);
foi aliá, em França, que o i tema na ceu.
a) Referendo nece sário, prec dido dotação parlamentar, por maioria qualifica-
da ou não - Con tituiçõe uíça de 1874 (ar!. 120°, que pre ê ainda refer ndo
pré io para decidir, em ca o de conflito, há re i ã ), au tríaca (art. 44°, quan-
to à re i ão total), irlande a de 1937 (art. 46° e 47°), i land a d 1944 (ar!.
79°, quanto ao e tatuto da Igreja), japone a d 1946 (art. 96°), marroquina de
1962 (art. 106° e 107°), uI-coreana d 1962 (art. 119° e 121°), egíp ia d 1971
(art. 189°), birman a d 1974 (art. 194°, quanto ao princípio fundamentai
da Con tituição), cubana de 1976 (art. 141°, quanto ao órgão do poder e ao
direito e devere con titucionai), ul- or ana de 1980 (art. 131"), romena de
1991 (art. 146°e 147°);Constituiçõ s colombiana de 1991 (art.377°),e tonia-
na de 1992 (art. 162° e 163°), lituana de 1992 (art. 235°), ucraniana de 1996
(art. 156") polaca d 1997 (art. 235°), quanto a certa matéria; on tituição
uíça de 1999 (art. 140°).
b) Referendo n ce ário, pr c dido de dua otaçõ pariam ntare c eleiçõe ge-
rai entre ela - Con tituiçõe dinamarque a de 1953 (ar!. 88") e panhola de
1978 (art. 168", quanto ao princípio fundamentai );
c) R ferendo, em princípio, ma ua di pen a se a lei d re i ão for apro ada p r
certa maioria reforçada - Con tituiçõe france a de 1946 (art. 90"), do Gabão de
1961 (ar!. 69°), do Peru de 1993 (art. 206°).
54 Cfr. TANIA GROPPI, "La reforma constitucional en los Estados federales entre pluralismo territorial y no
territorial", in Revista de Derecha Politico, 54, págs. 115 e segs., 2002.
Parte 111I Constituição ••
de ratificação por r ferendo locai: on tituição au traliana de 1900 (art. 128°, quanto a
modificaçõe relati a ao e tatu to ou à po ição de qualquer Estado na federação).
outro ca o ,trata- e de eto, ainda que e ercido atra é de um órgão repre entativo
do E tado federado em ní el central: a im, a on tituição alemã de I 71 (art. 6 0).
outro ca o ainda, a intervenção do E tado federado faz- e apena atra é da
âmara alta deles repre entativa: a im a on tituição alemã de 1949 (art. 79°, nO2 e
51°, n° 2), que, exigindo maioria de doi terço em amba a âmara, no on elho Fe-
deral impõe o oto m bloco do repre entante de cada Land.
IX - Formas de revi ão atípica e anómala podem indicar- e, por mera curio idade,
entre outra :
55 Cfr. MARCELO REBELO DE SOUSA, o vaiar jurídica ..., cit., págs. 286 e segs., máxime 296; GOMES CANOTILHO
e VITAL MOREIRA, ap. cit., págs. 1056 e 1057; JORGE MIRANDA, Manual ..., V, cit., pág. 105.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
dela con quente.56 Para que haja revisão tem de e manife tar intenção ou finalidade de
ub tituir, uprimir ou aditar norma formalmente con titucionai (cfr. o art. 287°, n° I,
da Con tituição portugue a).
ão ba ta, em Con tituição rígida e a intenção. Po tula- e ainda a ob ervância do
termo con titucionais de exercício do poder de re i ão como pod r di tinto do poder
legi lati o ordinário; e é ela também que, ao cabo e ao re to, permite di cernir a re i ão
da rotura con titucional.
No atual Direito português, por exemplo, deve entender-se, por conseguinte, que, além da in-
tenção de revisão, são requisitos de qualificação da lei de revisão os seguintes:
a) O órgãa competente - só a Assembleia da República pode fazer leis de revisão, e não qual-
quer outro órgão (arts. 161º, alínea o, e 284º);
b) O tempo de revisão ou o competência em razão do tempo - a Assembleia só pode fazer re-
visão decorrido o prazo de cinco anos sobre a publicação da anterior lei de revisão ordinária
(art. 284º, nº 1) ou, antes de decorrido, quando tenha assumido poderes de revisão por
maioria de quatro quintos dos Deputados em efetividade de funções (art. 286º, nº 2);
c) A normalidade constitucional- não pode ser praticado nenhum ato de revisão constitucio-
nal na vigência de estado de sítio ou de estado de emergência - ou seja, com desrespeito
de limites circunstanciais de revisão (art. 289º), e, por conseguinte, fora do pleno exercício
dos direitos, liberdades e garantias (art. 19º, nº 8);S7-58
d) A maioria de revisão - as alterações da Constituição têm de ser aprovadas por maioria de
dois terços dos Deputados em efetividade de funções (art. 286º, nº 1).s9
56 MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, 11,lO! ed., Lisboa, 1973, pág. 423.
57 Cfr. a cominação de inexistência jurídica da dissolução da Assembleia da República, quando decretada
na vigência de estado de sítio ou de estado de emergência (art. 172º, nº 2).
58 Cfr. JORGEBACELAR GOUVEIA,"Os limites circunstanciais da revisão constitucional", in Revisto Jurídica,
n°S11-12, janeiro-julho de 1989, págs. 103 e segs.
59 Algo diferentemente, MARCELO REBELO DESOUSA,O valor jurídico ..., cit., pág. 293, nota, que reconduz a
falta de maioria qualificada a nulidade (atípica), e não a inexistência.
60 Nossos Contributo ..., cit., pág. 139; "Promulgação", in Verbo, XX, págs. 926-927; Manual ..., V, cit., págs.
281 e segs.
61 Cfr., quanto à Itália, STEFANO MARIACICCONETII, "Revisione Costituzionale", in Encic/opedia dei Diritto,
XL, 1989, págs. 134 e segs., máxime 139 e 140.
A falta de promulgação implica inexistência jurídica do ato (art. 140º) não apenas enquanto ato de
revisão como ainda, mais radicalmente, enquanto ato jurídico-público.
Parte 111I Constituição _
§ 3º
Os limites materiais de revisão constitucional
tituição de 1961), no Gabão (art. 70° da Con tituição de 1961) u no Burundi (art. 63° da
Con tituição de 1974) - ma também à forma monárquica - como na r' cia (art. 10 ° da
on tituição de 1951), em Marroco (art. 108° da Con tituição de 1962), no Afegani tão
(art. 120° da Con tituição de 1964) ou no Barém (art. 104° da on tituição de 1973); à
religião i lâmica - neste trê último paí ; à federação e à república - como no Bra il
(art. 17 0, 5°, da on tituição de 1934, art. 217°, 6°, da on tituição de 1946, art. 50°,
1°,da on tituição de 1967); ao dir ito fundamentai (art. 131° da on tituição nami-
biana de 1990); à caraterística enciai do E tado de Dir ito dem ráti o (art. 9°, nO2
da on tituição ch ca de 1992); ao ju cogen (art. 193°, n° 4, da on tituição uíça).
Encontram- e, entretanto, elenco mai ou meno longo: a organização da R públi-
ca m E tado federado, o princípio da interferência do tado na feitura da lei fe-
derai , o reconhecimento da dignidade da p oa humana, a in i labilidad a aplicação
imediata do direito fundamentai, o E tado fed ral, d mocrático e o ial, a eparação
do podere, o princípio da con titucionalidade e da I galidade e o dir ito de re i tên ia,
na República Federal da Alemanha (art. 79° da Con tituição de 1949);66a forma republi-
cana, a unidade e a integridade territorial do E tado e o princípio democráticos, no a-
marõ (art. 37° da Con tituição de 1972); a república parlamentar, o re peito e a proteção
da pe oa humana, a igualdade do cidadão, a garantia da liberdade pe oal, a liberdade
religio a e a eparação do podere, na Grécia (art. 110° da on tituição de 1975); a repú-
blica, o Estado d Direito laico e ocial, o direito do homem a integridade do t rritório
na Turquia (art. 4° da Con tituição de I 2); a forma federativa, o oto direto, ecreto,
uni r aI e periódico, a eparação do podere e o direito garantia indi iduai no
Bra il (art. 60°, § 4°);67o carát r nacional, independente, unitári e indi i í el do tado,
a forma republicana, a integridade do território, a indep nd "ncia da ju tiça, o plurali mo
político, a língua oficial e a liberdade e garantia do cidadão, na Rom 'nia (art. 14 0,
no' I e 2); o direito e lib rdade , a indep ndência e a integridade territorial, na crânia
(art. 157°); o princípio fundamentai e o i tema de re i ão (art. 162° da on tituição
e toniana); o princípio fundamentai e o número e a duração dos mandato pre id n-
ciai (art. 220° da Con tituição da república Democrática do ongo, de 2006).
Uma da on tituiçõe que parece ir mais longe na enum ração de limite é a on-
tituição portugue a de 1976, ao cont mplar no art. 290° a independência nacional e a
unidade do tado; a forma republicana de governo; a eparação da Igreja do E tado;
o direito, liberdades e garantia do cidadão; o direito do trabalhadore, da comi -
õe de trabalhadore e da a ociaçõe indicai; o princípio da apropriação coleti a do
principais meios de produção e solos, bem como dos recur os naturai , e a eliminação
dos monopólios e dos latifúndios; a planificação democrática da economia; o sufrágio
univer ai, direto, secreto e periódico na de ignação do titulare I ti o do órgão de
oberania, da regiõe autónoma e do poder local, bem como o i tema de repre entação
proporcional; o plurali mo de expre ão e organização política, incluindo partido polí-
66 Sobre o art. 792 da Constituição alemã, V., por todos, ERNST-WOLFGANGBOCKENFORDE,Estudios ..., cit.,
pág. 80; Luc HEUSCHLlNG,op. cit., págs. 618 e segs.; MICHEL FROMONT,"La révision de la Constitution et les
regles constitutionnelles intangibles en droit allemand", in Revue du droit public, págs. 89 e segs., 2007.
67 A forma republicana deixou de constar do elenco de limites materiais por causa do referendo sobre
monarquia ou república, mas indireta - e contraditoriamente - surge ainda a propósito dos Estados
federados (no art. 342, VII).
Parte 111I Constituição ••
68 Esta com a particularidade de, entre os limites, inserir a data da independência e a bandeira nacional.
69 Cfr., por exemplo, PIERFRANCESCO GROSSI,Introduzione od uno studio sui diritti inviolabili neJla Costituzio-
ne italiana, Pádua, 1972, págs. 137 e segs.; KLAUSSTERN,op. cit., pág. 353; A Constituição de 1976, cit.,
págs. 253-254; MARCELOREBELODESOUSA,Direito Constitucional, cit., pág. 108; VIEIRA DEANDRADE, Os
direitos fundamentais ..., cit., 1! ed., págs. 316-137, e 2! ed., pág. 328; GUSTAVOZAGREBELSKY, Manuale di
Diritto Costituzionale, I, Turim, 1988, págs. 103; GOMES CANOTILHOe VITAL MOREIRA, op. cit., pág. 1.061;
NELSONDESOUSASAMPAIO,op. cit., págs. 82 e segs.; GUSTAVOJUSTDACOSTAESILVA,Os limites da reforma
constitucional, Rio de Janeiro, 2000, págs. 231 e segs.; MIGUEL NOGUEIRADE BRITO, op. cit., págs. 312
e segs.; GOMES CANOTILHO,Direito ..., cit., pág. 1.069 e "Medidas de proteção de direitos, liberdades e
garantias", in Direito Penal Especial, Processo Penal e Direitos Fundamentais, obra coletiva (coordenada
por José de Faria e Costa e Marco António Marques da Silva), São Paulo, 2006, págs. 130 e segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Uma coi a é a regra, pre critiva ou proibitiva (conforme e entenda) de limite; ou-
tra coi a o limite em si me mo .
70 Cfr., à luz de certa conceção jurídica, a contraposição entre limites que afetam a "positividade" e limites
que afetam a "autorreferencialidade" feita por BENITOALÁEZCORRAL,Los Iímites ..., cit., págs. 223 e segs.
71 Cfr. FRITZFLEINER,"Le droit des minorités en Suisse", in Mélanges Maurice Hauriou, obra coletiva, Paris,
1929, págs. 291 e segs.; JEAN DARBELLAV,"L'initiative populaire et les limites de la révision constitution-
nelle", in Revue du droit publíc, 1963, págs. 633 e segs.; ANTOINE FAVRE,Droit Constitutionnel 5uisse, 2!
ed., Friburgo, 1970, págs. 445 e segs.
72 Cfr. TADAKAZUFUKASEe YOICHI HIGUCHI, Le constitutionnolisme et ses problemes ou Japon - Une appro-
che compara tive, Paris, 1984, págs. 134 e segs.; ou NORIKO OFUJI, "Tradition constitutionnelle et supra-
constitutionnalité", in Revue française de droit constitutionnel, págs. 621 e segs., 2004.
Parte 111 I Constituição
73 Cfr., para a Itália, PIERFRANCESCOGROSSI,op. cit., págs. 101 e segs., ou ÉUSE BESSON,"Les príncipes
supremes inviolables dans la jurisprudence de la Cour Constitutionnelle italienne", in Annuaire Inter-
natianale de Justice Constitutionnelle, 2005, págs. 11 e segs., e, para a Espanha, MANUEL CONTRERAS,
"Le Reforma de la Constitución", in Estudios sobre la Constitución Espanola de 1978, obra coletiva,
Saragoça, 1979, pág. 419.
74 COSTANTlNO MORTATI, "Appunti per uno studio sui rimedi giurisdizionali contro comporta menti om-
missivi dellegislatore", in Scritti ..., 111, cit., pág. 934, nota. Cfr. FRANCOMODUGNO, I "nuovi diritti" nella
giurisprudenza costituzionale, Turim, 1995, pág. 93.
75 PAOLOBARILE,Scritti di Diritto Costituzionole, Pádua, 1967, págs. 76-77.
76 Louls FAVOREAU,"Souveraineté et supraconstitutionalité", in Pouvoirs, nº 67, 1993, págs. 75-76.
77 Cfr. SERGEARNÉ, "Existe-t-if des normes supra-constitutionnels?", in Revue de droit public, págs. 459
e segs., 1993, máxime 474 e 475; ou VINCENT t.'HÔTE, "La 'forme républicaine de gouvernement' à
I'épreuve de la révision constitutionnelle", in Revue du droit públic, págs. 111 e segs., 2004.
78 RAÚLMACHADO HORTA, Direito Constitucional, cit., pág. 86.
79 Cfr. MESMIN SAINT-HuBERT, "La Cour Supreme de l'lnde, garant de la structure de la Constitution", in
Revue internationale de droit comparé, págs. 631 e segs., 2000.
80 Parecer da Câmara Corporativa sobre o projeto nQ 6/x, in Actas, 1971, pág. 683. Cfr. tomo I deste Manual.
81 ADRIANO MOREIRA, Ideologias Políticas, Lisboa, I.S.C.S.P.U., 1963-1964, pág. 75.
82 Aspectos de uma teoria da inconstitucionalidade, dissertação policopiada, Lisboa, 1964, pág. 191, nota (em-
bora acrescentássemos que, verdadeiramente, aí o problema era de validade da própria Constituição).
83 Ciência Político ..., I, pág. 251.
84 Ibidem, 11, pág. 93.
85 NUNO SÁ GOMES, Lições de Direito Fiscal, 11, Lisboa, 1985, págs. 171 e segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Por outro lado, a on tituição formal e tá ao erviço da Con tituição material. Re-
ê-la implica re peitar e ta on tituição material e, de d logo, re peitar o preceito
que, e plicitado numa proibição, denotam a con ciência da ideia de Direito, do projeto
ou do regime em que e corporiza.
A in uperabilidade do limite da revi ão não con i te em deter a ida do tado,
ma tão ó em bu car o critério para poder imputar a mutaçõe a certo ordenament
con titucional.95
uperioridade •• ub tancial" da on tituição pre upõe a exi tência de limite
"ab oluto " ao poder de re i ão, ainda que não haja norma con titucionai qualificada
plicitamente como irr r i i .96
Toda a on tituição tem uma lógica e uma ordenação i temáticas que não podem er
prejudicada, e i o não apena no plano formal ma , muito mai ,no a peto da intima cone-
ão material que lhe dá entido e que não pod er ultrapa ada na reforma do texto.97
em todo que eguem e ta orientação geral98 perfilham, contudo, o que parece er
o eu corolário: o reconhecimento não apena de limite expre o como ainda de limite
implícitos ou tácito .99
95 COSTANTINOMORTATI, Concetto, limiti, proccedimento dello revisione costituzionole, cit., loc. cit., pág.
45, nota.
96 OMAR CHIESA,Libertà fundamentale e teoria costituzionale, Milão, 2002, págs. 270 e segs.
97 ROGÉRIOSOARES,Constituição ..., cit., loc. cit., pág. 669.
98 Além dos autores já citados, v. A. ESMEIN,op. cit., 11,págs. 501 e segs.; MAURICEHAURIOU,op. cit., págs.
335-336; FRITZFLEINER,op. cit., loe. cit., pág. 291; PAOLOBARILE,La Costituzione come Norma Giuridica,
Florença, 1951, págs. 76 e segs.; GANSHOTVAN DER MEERSCH,op. cit., pág. 78; Ono BACHOF,op. cit.,
pág. 53; GOMESCANOTILHO,O problema da dupla revisãa na Constituiçãa Portuguesa, sep. da revista
Fronteira, e Direito ..., cit., págs. 1.067 e segs.; MARCELOREBELODE SOUSA,Direito Constitucional, cit.,
págs. 75 e segs.; ANTOINEM. PANTÉlIS,op. cit., pág. 206; PEDRODEVEGA,op. cit., págs. 240 e segs.; NEL-
SONDESOUSASAMPAIO,op. cit., págs. 82 e segs.; CARLOSAYRESBRlno, "A reforma constitucional e a sua
intransponível inabolibilidade", in Perpectivas Canstitucianais, obra coletiva, 11,Coimbra, 1997, págs.
77 e segs.; GIOVANNI VAGlI, "Nascita, evoluzione e significato dei limiti materiale espressi di revisione
nelia Costituzione portoghese", in Quademi Costituzionali, 1998, págs. 101 e segs., máxime 107, nota;
INGO SARLET,A eficácia dos direitos fundamentais, Porto Alegre, 1998, págs. 349 e segs.; ZENOVELOSO,
Cantrala judicial da constitucionalidade, 2! ed., Belo Horizonte, 2000, págs. 136 e 137; JosÉ ADÉRCIO
LEITESAMPAIO,A Constituição reinventada pela jurisdição constitucional, Belo Horizonte, 2002, págs.
405 e segs.; LUIz PINTO FERREIRA,op. cit., pág. 215; JORGEBACELARGOUVEIA, Manual ..., I, cit., págs.
643-644; MOEA VOSNY,"Le 'Parlement constituant' n'est pas souverain, in Revue du droit public, 2007,
págs. 793 e segs., máxime 803 e segs.; LOUISFAVOREAUet alii, Droit Constitutiannel, cit., pág. 116; PAULO
BONAVIDES,Curso..., cit., pág. 201.
99 Aceitam limites implícitos, entre outros, MAURICEHAURIOU,op. cit., pág. 469; COSTANTINOMORTATI,op.
cit., loc. cit., pág. 41; FRANCISCOLUCASPIRES,O problema ..., cit., págs. 68 e segs.; GERARDOMORELlI,
op. cit., págs. 267 e segs.; AFONSO QUEIR6, Uma Constituição ..., cit., pág. 20; J. VILAS NOGUEIRA, "La
Constitución y la reproducción dei orden politico fundamental", in Revista de Estudias Politicas, n2 12,
págs. 63 e segs., maio-junho de 1981; IGNACIODE Ono, ap. cit., págs. 63 e segs.; GOMES CANOTILHO,
Direita ..., cit., pág. 1.066. Recusam-nos, por exemplo, CARLOESPOSITO,La Validità ..., cit., págs. 168 e
segs.; PIERFRANCESCO GROSSI,op. cit., págs. 91-92; MOEA VOSNY,op. cit., loe. cit., págs. 732 e segs. Assim
como, ao invés, só aceita limites correspondentes ao Direito natural ou a um princípio de razoabilida-
de. JEANDARBELLAY, op. cit., págs. 732 e segs. Cfr. ainda JOHN RAWLS,Political Liberolism, 1993, trad. O
liberalismo político, Lisboa, 1996, págs. 231 e 232, sobre os direitos fundamentais consagrados no 12
Aditamento à Constituição dos Estados Unidos
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
100 Observa, contudo, SCHMITT (op. cit., pág. 106) que esta formulação contém não só o direito às revisões
constitucionais mas também o direito às supressões. Cfr. o art. 1º do título VII da Constituição de 1791.
101 MAGALHÃES COLLAÇO, Ensaio ..., cit., pág. 83. Cfr., duma perspetiva mais ampla, SILVESTREPINHEIRO-FER-
REIRA, Observações sobre o Constituição , cit., págs. 9-10.
102 JOSEPH BARTHÉLEMY e PAUL DUEZ, Troité , cit., págs. 225-226.
103 KARL LOEWENSTEIN, op. cit., pág. 192.
104 CODACCI-PISANELLI, cito por STEFANO MARIA CICCONETTI, op. cit., pág. 238.
105 JÓNATAS MACHADO, "Nós, o Povo 'Português' (Continuidade intergeracional e princípios de justiça), in
Nos 20 anos da Constituição de 1976, obra coletiva, Coimbra, 2000, pág. 77.
106 PAULO OTERO, Legalidade Pública ..., cit., pág. 559.
Parte 111 I Constituição ••
107 Cfr. ainda, com estes ou outros argumentos, FÉLIXMOREAU,Précis Élémentaire de Droit Constitutionnel, 7~
ed., Paris, 1911, págs. 428-429; lÉON DUGUIT, Traité ..., cit., IV, 2~ ed., Paris, 1924, págs. 539 e segs.; JULlEN
LAFERRIERE, Manuel de Droit Constitutionnel, 2~ ed., Paris, 1947, pág. 289; GUIDO lUCATElLO,"Sull'immu-
tabilità de lia forma repubblicana", in Scritti giuridici in memoria di V. E. Orlando, 11, págs. 25 e segs. e 42 e
segs.; SPAGNAMusso, op. cit., págs. 44 e segs.; GIUSEPPECONTINI, La Revisione Costituzionale in Italia, cit.,
págs. 279 e segs.; HERBERTHART,op. cit., pág. 87; GEORGESVEDEl, "Souveraineté et supraconstitutionalité",
in Pouvoirs, 1993, págs. 89-90; IVESGANDRADASILVAMARTINS,"Cláusulas pétreas", in Perspectivas Consti-
tucionais, obra coletiva, I, Coimbra, 1997, págs. 145 e segs.; PAULONAPOLEÃONOGUEIRADASILVA,Princípio
democrático e Estado legal, Rio de Janeiro, 2001, págs. 46 e segs.; ADRIANA ZAWAPAMELO, "A limitação
material do poder constituinte derivado", in Revista do Mestrado em Direito da UNIFEO, 2008, pág. 49.
108 ADRIANO SANT'ANA PEDRO,A Constituição viva - Poder político permanente e cláusulas pétreas, Belo
Horizonte, 2005, pág. 125.
109 EMILlO CROSA,Variazioni..., cit., loc. cit., pág. 486.
110 STEFANOMARIA C1CCONETII,La Revisione ..., cit., pág. 256. V. também Revisione ..., cit., loe. cit., págs. 148
e 152 e segs.
111 JOÃOBAPTISTAMACHADO, Participação e descentralização ..., cit., pág. 125.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
matéria intangível em virtude de uma regra constitucional anterior detém uma parcela da
oberania popular tão legitimamente como o poder constituinte ancionado. Garantindo
o re peito por todos os seus representante da regra fundamentai e tabelecida pelo
povo oberano, o órgão jurisdicional aumenta a efetividade dessa vontade popular. Toda-
via, nenhuma imutabilidade de princípio pode opor-se, de modo absoluto, à e olução do
Direito do E tado.I12-I13
112 MARIE-FRANÇOISERIGAUX, La Théarie les Limites Matérielles ..., cit., máxime págs. 254, 256 e 259. E
acrescenta (pág. 262): reconhecer a relatividade da validade dos limites materiais autónomos e da sua
força obrigatória é afirmar que o Direito é a expressão da tensão entre o equilíbrio e o não equilíbrio,
própria de qualquer sociedade que aspira à democracia.
113 Em sentido próximo ou de consequências próximas, a partir de diferentes perspetivas, v. GEORGESMO-
RANGE, "Valeur juridique des principes contenus dans les Oéclarations des Oroits", in Revue du droit
public, págs. 236 e segs., 1945; BISCARETII DI RUFFIA, Sui limiti della "revisione costituzionale", cit., loc.
cit., págs. 122 e segs., máxime 164 e segs., e Diritto Costituzionale Comparoto, cit., pág. 686, nota;
FRANCOMODUGNO, op. cit., I, págs. 76 e segs., máxime 78, nota; CARMEN LÚCIAANTUNES ROCHA,"Cons-
tituição e mudança constitucional: limites ao exercício do poder de reforma constitucional", in Revista
de Informação Legislativa, págs. 181 e 182, outubro-dezembro de 1993; MANOEL GONÇALVESFERREIRA
FILHO, "Significado e alcance das 'cláusulas pétreas"', in Revista de Direito Administrativo, 202, págs. 11
e segs., outubro-dezembro de 1995; EMíLIO KRAFTKOSTA,O constitucionalismo guineense e os limites
materiais de revisão, Lisboa, 1997, págs. 174 e segs. e 267 e segs.; BENITOALÁEZ CORRAL,op. cit., págs.
212 e segs.; BLANCODE MORAIS, op. cit., I, págs. 79 e segs. Cfr. ainda GREGORIO PECES-BARBA,Los Valores
Superiores, Madrid, 1984, págs. 104 elOS.
114 Aspectos..., cit., págs. 193, 195-196 e 198.
Parte 111I Constituição ••
ll- Foi a partir de ta e de outras afirmações que pôde qualificar- e a nos a po ição
como de ade ão à te e da dupla revi ão e que ela r ceb u crítica e reparo vindo de
di er o etore da doutrina.118
Porque con iderámo pertinente alguma de a crítica e porque julgámo nece-
ária alguma clarificação, mai tarde tentámo e quematizar melhor o no o pen amento
não apena ali ntando a nece idade de limite materiai ma também tentando apurar o
entido de uma cláu ula de limite e plícito como o art. 2 ° da Con tituição portugue a
ou o art. 60°, § 4°, da on tituição bra ileira.
A im, continuamo a entender que a natureza de te preceito é d clarati a e não
con titutiva (ele declaram, não criam limites materiai ); que a sua função é de garantia;
que re peitam a princípio e não a preceito ; que ão norma con titucionai como outra
115 Ciência Política ...• cit .• I. págs. 250 e segs.; e. quanto à cidadania. 11.pág. 93. No mesmo sentido. "Revi-
são constitucional". in Verbo, XVI. pág. 503; Decreto, Coimbra, 1974, págs. 109-110; Deputado. Coim-
bra, 1974. pág. 34.
116 As Constituições Portuguesas, Lisboa, 1976, págs. XLVII-XLVIII.
117 A Constituição de 1976 ..., cit., págs. 246 e 249.
118 V. ANDRÉGONÇALVESPEREIRA.Uma Constituição para os anos 80? e Compromisso impossível. cit., loc.
cit.; GOMESCANOTILHO.O problema da Dupla Revisão, cit., págs. 29 e segs.; MARCELOREBELODESOUSA.
Direito Constitucional, cit .• págs. 83 e segs.; AFONSOQUEIRÓ, Uma Constituição democrática, cit.. págs.
25 e segs.; MANUEL DE LUCENA,"Rever e romper (Da Constituição de 1976 à Constituição de 1989)", in
Revista de Direito e Estudos Sociais, págs. 62 e segs., 1991, nota.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
quai quer, obrigatórias enquanto vigorarem, ma revi ívei ; que, de re to, não é a altera-
ção ua, ó por i, que afeta o limite materiai da re isão; o que o afeta é atingirem- e
o princípio nucleare da Con tituição; que, em egundo proce o de revi ão, ob erva-
do o requi ito con titucionai de forma é po ível modificar e e me mo princípio,
ma que então não e e tará já a fazer revi ão, e tar- e-á a fazer uma tran ição con titu-
cional e uma no a Constituição material.l'9
orno e ê, e e tamo de acordo com a primeira corrente doutrinai quanto à noção
de revi ão e de poder de re isão, continuamo a atribuir à c1áu ula de limite explícito
um valor bem menor do que a generalidade do autore que nela e integram. ão defen-
demo uma te e intermédia ou de compromi o: u tentamo, im, que exi tem diferente
categoria de limite, afirmamo que tais cláusula têm de merecer uma interpretação
objetiva e atualista e, por outro lado, in i timo em que nada imp de que o proce o de
revi ão - não a revi ão - eja utilizada para uma tran ição con titucional. É o que iremo
agora justificar e desenvolver.
119 V. "Revisão constitucional", in Verbo, XX, pág. 1.039. E também "O regime dos direitos, liberdades e
garantias", in Estudos sobre a Constituiçãa, 111, págs. 95 e segs.; "A revisão constitucional- Consenso ou
confronto?", in Expresso, de 26 de Janeiro de 1980; 1! ed. deste tomo, págs. 491 e segs., e 2! ed., págs.
172 e segs.; "Os limites materiais da revisão", in Jurídica, nº 13/14, 1990, págs. 13 e segs.
120 Cfr. NORBERTOBOBBIO, Tearia de1J'ordinamento giuridico, Turim, 1960, págs. 46 e segs. (mas sem se
referir especificamente à revisão constitucional).
121 Cfr. o nosso Curso ..., cit., págs. 86 e segs. e Autores citados.
122 Por isso, não tem inteira razão ALFREDOGALLEGOANABITARTE,quando refere que a existência de pre-
ceitos intangíveis nas Constituições é uma indireta e curiosa confirmação da tese de autovinculação de
JELLlNEK(Constitución y Personalidad Jurídica dei Estado, Madrid, 1992, pág. 114, nota).
Parte 111I Constituição ••
co-política (até porque em on tituição f1exí el, por maioria de razão, nunca há limite
explícito ). A experiência ingle a comprova-o exuberantemente. 12)
Deparar- e-ia,inclu i e nodomínioda on tituiçãomarxi ta-Ienini ta,emquetoda a
norma são "gradualmente modificávei ,mas no entido da con trução do ociali mo".124
ão e e gota de re to no domínio da revi ão. Surge mutatis mutandis em qualquer
forma de modificação con titucional. Di emo-lo a re peito das derrogações con titu-
cionai : atravé de ta não podem ser vulnerada regra fundamentais da onstituição.
Devemo aduzi-Io a re peito das modificaçõe tácita: e o co tume praeter e contra
legem pode faz r mergir no a norma con titucionai , não pode criar um no o quadro
de alore nem rvir para o trân ito de uma Con tituição para outra.125Enfim, no a to
campo da alteraçõe con titucionai tricto en u, é a fidelidade ou não a certo princí-
pio ub tanciai recorde- e, que em última análi e, permite di tinguir a imple rotura
da revolução propriamente dita.
preceito definidore de limite materiai não têm de er ou não con eguem er exau ti-
o . Pode ha er outro limite afora os que lá e encontrem con ignado . Em contraparti-
da, tudo quanto con ta do art. 2 o de e er con iderado limite material, por ariado que
eja o regime aplicá el.
orma con titucionai como quai quer outra, a normas de limites materiai e-
tão, por outro lado, ujeita a uma interpretação evolutiva;'2 e a própria identidade não
123 V. a demonstração de LOURIVALVILANOVA, op. cit., loc. cit., págs. 466-467, e em FRANCOMODUGNO,
L'lnvolidità ..., cit., I, págs. 66 e segs., máxime 69 e segs. Cfr. também as observações sobre a Inglaterra e
os Estados Unidos de STEPHENHOLMES,"Vincoli costituzionali e paradissi deila democrazia", in lifuturo
dello Costituzione, págs. 167 e segs.
124 BISCARETIIDI RUFFIA, La revisione costituzionole, cit., loc. cit., págs. 433-434. Cfr. ADRIANO MOREIRA,
Poder ..., cit., loc. cit., pág. 137.
125 Neste sentido, FRANCOPIERANDREI,La Costituzionole ..., cit., loe. cit., págs. 109 e 118; e, dalgum modo,
ROGÉRIOSOARES,Constituição ..., cit., loc. cit., págs. 669-670.
126 Cfr. os tipos de limites, segundo MIGUEL NOGUEIRADE BRITO,op. cit., págs. 429 e segs.
127 Cfr. PETERHÃBERLE,L'Étot ..., cit., págs. 122 e segs.
128 Cfr. VEZIOCRISAFULLI,op. cit., I, pág. 104.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
132 Não entramos aqui na análise do conhecido "paradoxo de ALF Ross": como pode a norma reguladora
da revisão constitucional ser ela própria objeto de revisão? Parece-nos, porém, que, para lá de uma
eventual solução de lógica jurídica - a existência de um princípio superior à norma de revisão -, a
história e o Direito positivo têm dado resposta ao problema.
Cfr. ALF Ross, op. cit., págs. 205 e segs.; PETERSUBER,O paradaxa da autarrevisão no Direito Constitu-
cionol, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 1990, págs. 93 e segs.; ALESSANDRO
PACE,op. cit., págs. 136 e segs.; JosÉ Luís PÉREZTRIVINO, Los límitesjuridicos ai soberano, Madrid, 1998,
págs. 144 e segs.; JORGEVANOSSI,op. cit., págs. 236 e segs.; MIGUEL NOGUEIRADE BRITO, op. cit., págs.
235 e segs.; CLAUDEKLEIN, op. cit., págs. 123 e segs.; MIGUEL GALVÃOTELES,Temporalidade ..., cit., loc.
cit., págs. 46-47; JORGEVANOSSI,op. cit., págs. 236 e segs.; GIOVANNI RIZZA, Autoreferenzialità, decons-
truzione, cambiamento nella revisione costituzionale, in Diritto e Società, 2002, págs. 1 e segs., máxime
13 e segs.; MARCELLOPIAZZA, llimiti alia revisione costituzionale nell'ordinamento italiano, Pádua, 2002,
págs. 315 e segs.; LUCIO PEGORARO,Le garanzie costituzionali, in LUCIO PEGORAROet alii, Diritto Costitu-
zionale e Pubblico, Turim, 2002, págs. 387-388; JOAQUIM FREITASDA ROCHA,op. cit., págs. 781 e segs.
133 Cfr. MIGUEL NOGUEIRA DE BRITO, op. cit., págs. 273 e 428; e em sentido contrário, PAULO BONAVIDES,
Curso ..., cit., págs. 203-204.
134 Neste sentido também GOMES CANOTILHO,Direito ..., cit., pág. 1.052. Cfr. NELSONDE SOUSASAMPAIO,
op. cit., pág. 106.
135 Contra: FRANCOMODUGNO, op. cit., I, págs. 79 e 80 (mas parte da realidade da distinção entre rigidez
e flexibilidade).
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
istência do i tema frente ao poder legi lativo: ali, em Con tituição rígida, visando, em
especial, impedir que a maioria política ordinária mude norma con titucionai ; aqui, em
Constituição flexível, vi ando impedir que a maioria de certo momento, depoi de ter
fixado em norma o eu projeto, venha a obstar, através da dificultação da revi ão, à ua
ulterior modificação por idêntica maioria.13ó
É, numa per petiva histórica e ituada - mai uma vez se sublinha - que têm de er
compreendida a rigidez e a flexibilidade con titucionais.
136 Cfr. MIGUEL GALVÃO TELES, Temporalidade ..., cit., /oe. cit., págs. 48-49 (falando, respetivamente, em
sistema fundacional e em sistema não fundacional).
137 No Direito português, inconstitucionalidade por omissão da revisão constitucional teria sido a não ex-
tinção do Conselho da Revolução em 1982, na primeira revisão constitucional. O Conselho da Revolução
não poderia ter existido mais do que em curto período sem brigar com a estrutura democrático-repre-
sentativa do poder político instituído pela Constituição de 1976; e, se viesse a ficar para além dessa
revisão, tudo seria como se tal estrutura e, portanto, a Constituição material se transformasse noutra.
138 Pois, parafraseando aqui FRANCOMODUGNO (op. cit., I, pág. 76), a imutabilidade, enquanto positivamen-
te estabelecida, é sempre constituída, e nunca constituinte, sempre condicionada e não condicionante.
Parte 111I Constituição ••
II - Acerca de te ponto (em que nos afastamos mais da primeira corrente doutrinai
sobre limites materiais) têm ido apontado alguns contra-argumentos que não parecem
proceder.
Diz-se que o sentido da declaração de imutabilidade de uma norma é não só a fixi-
dez dessa norma como a da própria declaração de inalterabilidade; 139 que a edição de uma
norma de limite materiai ó tem sentido contanto que esta seja irreversível, de validade
ab oluta, ou enquanto norma que, em ca o algum, poderá ser modificada, sob pena de se
fru trar a intenção do legislador constituinte, o qual, doutro modo, a não teria decretado.
A regra de alteração de uma norma pertencem, logicamente, aos pressuposto
da me ma norma, colocam-se num nível de validade (eficácia) superior ao da norma a
modificar. 140
Tais argumentos levam con igo uma carga po itivi ta e conceitualista evidente. Im-
plicam uma hipo ta iação da lei constitucional e da sua autoqualificação, visto que os
limites materiais valeriam por terem sido con agrados ex professo e não porque devessem
valer como limites materiais (designadamente, quando se tratasse de limites transcenden-
tes) e valeriam me mo quando o legislador constituinte tivesse cometido um verdadeiro
abuso de poder, e tipulando limite desrazoáveis ou sem suficiente apoio na con ciência
jurídica coletiva.
Levam consigo também uma interpretação ubjetiva inaceitável. Não há que recons-
tituir qualquer intenção ubjetiva do legi lador constituinte; há apenas que compreender
e garantir a Constituição como istema de normas que perduram no tempo. Se existe uma
uperioridade ou prerrogativa do legislador constituinte (originário), é ó no sentido ob-
jetivo, ligado à expres ão da ideia de Direito ou da Con tituição material.
139 GOMES CANOTILHO, o problema ..., cit., loc. cit., pág. 30.
140 GOMES CANOTILHO, Direito ..., cit., pág. 1.068.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
I - Porém, como ucede com quai quer norma jurídicas, podem er preterido o
limite materiai da r i ão - ou eja, o princípio con titucionai que con tituam limi-
te materiai da re i ão - e o preceito que o e plicitem.
Podem er preterido gundo di er a hipóte e, e bem que toda e reconduzam a
doi polo : ou à incon titucionalidade da lei de re i ão (poi a preterição por lei ordinária não
merece r aqui e aminada) ou à ce ação da ua vigência. e tais princípio ou norma con-
ervam efetividade, a contradição que com ele e verifique por parte de qualquer lei de revi-
ã há-d er pre enida ou uprimida mediante o mecani mo de garantia da on tituição
qu exi tam. e, ao in . ,não con ervam efeti idade, outro princípio e Lhe hão-de ub ti-
tuir e, e tratar de limite d prim iro grau, outra on tituição material há-de obre ir.l46
Podem er preterido com cumprimento autêntico ou com cumprimento meramente
formal ou aparente da regra con titucionai d proce o (verifiquem- e ou não o pre-
upo to ou requi ito de qualificação). E também em ca o de incumprimento o doi
polo erão ou a incon titucionalidade formal ou a alteração con titucional.
Por último, pode designar-se por fraude à Constituição a preterição de limite ma-
teriais de primeiro grau, com observância apena externa da regra con titucionais de
competência e de forma e sub tituição por outras para o futuro (como e terá passado na
França em 1940 ou no Bra il em 1964).147Ne te caso, não existe, porém, utilização au-
tónoma do proces o de revi ão, uma vez que o órgão de revisão não faz enão formalizar
ou empre tar credibilidade, numa conjuntura de exceção, a uma operação política em
curso ou mesmo já consumada por parte dos reais detentore do poder.
147 V. LiET-VEAUX,"La 'Fraude à la Constitution"', in Revue du droit public, págs. 116 e segs., 1943, máxime
141 e segs. A construção deste autor baseia-se na conexão, que estuda, entre as formas de revisão e os
carateres dos regimes políticos; e salienta como o órgão de revisão não pode decidir o abandono total e
definitivo das regras de revisão em benefício de outras, porquanto tais regras traduzem o fundamento
filosófico do poder. Cfr. o que há pouco dissemos sobre os limites à modificação das normas processu-
ais de revisão.
148 Neste sentido, por todos, Ono BACHOF,op. cit., pág. 53. Numa perspetiva diferente, CARLOESPOSITO,op.
cit., pág. 211: as mutações de partes da Constituição e, em particular, do regime não têm de dar-se sem-
pre por forma extralegal e revolucionária; mas, para que se deem, não é suficiente a publicação de uma
lei, é necessário que a tentativa de operar a mudança tenha êxito e que a disposição se traduza em ato.
Parte 111I Constituição _
de ato (ou do re ultado de ato) destinados a modificá-la. 149Podem ser sindicados os ato
do proce o de ge tação das reformas constitucionais, não o seu resultado. 150
Tudo está, porém, quanto a nós, em compreender a função da revisão constitucional e a
ubordinação da competência para a levar a cabo à Constituição: se ela implica o preservar dos
princípio vitai da Lei Fundamental, é óbvio que tem de ser sempre ajuizada em face de es
princípios, e não em face desta ou daquela norma que os intente modificar ou substituir.151.152
A incon titucionalidade material da revi ão é fenómeno homólogo ao da ilegalidade
da lei (como a que pode dar- e hoje em Portugal, por violação de lei de valor reforçado). 153
ão é por a norma erem da mesma categoria ou do mesmo grau que não intercedem
relações de constitucionalidade ou de legalidade. O que importa é haver ou não uma di-
ferenciação de funçõe e de competência.
ão decorre, porém, forço amente, da admissibilidade da figura da inconstituciona-
lidade material da revi ão a admi ibilidade teórica ou prática da fiscalização. Tal depen-
derá de outros fatores, o primeiro dos quais vem a ser o istema de garantia, praticado ou
adotado em cada país. I 54
Têm ido vários o Supremo Tribunais e os Tribunais Constitucionais que se têm
declarado competentes para apreciar a con titucionalidade de leis de revisão constitu-
cional: o Supremos Tribunais dos E tado Unido, da Índia, do Brasil, de I rael e o
Tribunais Constitucionais da Alemanha e da Itália. Por sua vez, na França tem havido
alguma o cilação por parte do Con eLho Constitucional: se, em 1992, aceitou exercer
fi calização, já em 2003 recu ou-a.
a Roménia, a Con tituição de 1991 atribui ao Tribunal Constitucional o poder ex
officio de conhecer da constitucionalidade da revi õe con titucionais (art. 144°, alínea
a). E preveem também fi calização as Constituições da Costa Rica (art. 73°, alínea c), do
Chile (art. 81.1.1.), da África do Sul (art. 167°, nO4, alínea d) e, quanto ao procedimento,
da olômbia (art. 241°, 1°).155
149 Assim, FRANCOPIERANDREI,op. cit., loc. cit., págs. 102-103. E foi essa também a opinião por nós expen·
dida em Aspectos ..., cit., págs. 196 e segs., embora já não em Ciência Política ..., cit., 11,págs. 494-495.
150 BENITOALAÉz CORRAL,op. cit., pág. 389.
151 Por isso, MAURICEHAURIOUfala em legitimidade constitucional (op. cit., pág. 269). a qual está acima da
própria supra legalidade.
152 Cfr. GAETANOSILVESTRE,op. cit., loc. cit., pág. 1.198: a lei de revisão está para a Constituição como a lei
delegada para a lei de delegação.
153 Cfr. arts. 1122, n2 3, 2802, n2 2, e 2812 da Constituição.
154 Contra a fiscalização, FRANCOPIERANDREI,"Corte Constituzionale", in Enciclopedia dei Diritto, X, pág. 913;
JEAN DARBELLAY,op. cit., págs. 732 e segs. A favor da fiscalização, BISCARETTIDI RUFFIA, La Constitution
comme loi fondamentale ..., cit., pág. 58; nossa Ciência Política ..., cit., 11,pág. 509; PIERFRANCESCO GROSSI,
op. cit., págs. 131 e segs., máxime 135-136; AFONSOQUEIRÓ,Lições ..., cit., pág. 329; Ono BACHOF,op. cit.,
págs. 12 e 52; PEDRODEVEGA, op. cit., págs. 261 e 296 e segs.; CLAUDEKLEIN,op. cit., págs. 161 e segs.
155 Cfr. ~DOUARD LAMBERT, Le Gouvernement des Juges et la lutte contre la législation sociale aux États·
Unis, Paris, 1921, págs. 109 e segs.; MAURICE BAnELlI, "Autor du XVIII" Amendement à la Constitution
des ~tats·Unis", in Revue du droit public, págs. 227 e segs., 1933; FRANCESCOFINOCCHIARO,"La com·
petenza della Corte Costituzionale rispetto alie leggi costituzionali e alie leggi di esecuzione di trattati
internazionali", in Scriti in onore di Vezio Crisaful/i, obra coletiva, Pádua, 1985, págs. 345 e segs.; KLAUS
STERN,op. cit., págs. 342 e segs.; MARCELONEVES, Teoria ..., cit., págs. 91 e segs.; JOSAPHATMARINHO,
"A função de julgar e a Constituição", in Revista de Informação Legislativa, n2 123, págs. 5 e segs.,
julho-setembro de 1994; JACKSONBORGESDE ARAÚJO,O controle judicial de (in)constitucionalidade de
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
II - Que não tenham ido muito frequente - ma ó até há pouco - a oca loe em que
este fenómeno e tem produzido não eria moti o para o menosprezar. A im como eria, de-
certo, exagerado afimlar que a impre ionante regularidade, com que, em França, de de 1791,
o p d r con tituinte originário tem uplantado o órgão de re i ão empre que e tem pretendi-
do fazer uma nova onstituição revelaria a ua impo ibilidad ou in ero imilhança.157
, inegável que a ideia de on tituição e vincula à ide ia de e tabilidade e que,
quando ela muda con tantemente, perde o eu entido, ainda quando e ob ervem e tri-
tamente a forma .15 Assim como de e aceitar- e que a qualquer on tituição haja de
a egurar- e a po ibilidade de cumprir a ua tarefa,159 de d en oi er at' ao fim toda a
irtualidade que contém.
Ma i o não ignifica que, no âmbito da ua regra formai, nã po a er pro-
po ta ou definida uma no a normati idade; rá, parado almente ou nã ,outra maneira
de apro itar a me ma irtualidade organizar ela própria a ua uperação. Ba taria
lembrar aqui a on tituiçõe que preveem re i ão lola/.
Um único exemplo do vário atrá apontado, o da on tituição e panhola igente,
é elucidati o. Ia não ó regula a ua reforma ou re i ão parcial (art. 167°) como tam-
emendas à Constituição, Recife, 1995; GILMAR FERREIRAMENDES, Jurisdição constitucional, São Paulo,
1996, págs. 154-155; ÓSCARVILHENA VIEIRA, op. cit., págs. 141 e segs.; JORGEVANOSSI, op. cit., I, págs.
217 e segs.; VALÉRIOSOMALLO, Le droit d'amendement et le juge constitutionnel en France et en Iralie,
Paris, 2002; JosÉ PAULOSEPÚLVEDAPERTENCE,"O controle da constitucionalidade das emendas cons-
titucionais pelo Supremo Tribunal Federal", in Revista Brasileira de Direito Público, 2003, págs. 135 e
segs.; JosÉ ADÉRCIO LEITESAMPAIO, op. cit., págs. 388 e segs.; XAVIERMIGNON, "Quelques maux encore à
propos des lois de révision constitutionnelle", in Revue française de droit constitutionnelJe, págs. 595 e
segs., máxime 606 e segs., 2004; KEMAL GÕZLER,Judicial Review of Constitutional Amendments, Istam-
bul, 2008; RAÚL GUSTAVOFERREIRA,"Patologia dei Proceso de Reforma - Sobre la inconstitucionalidad
de una emenda en el sistema constitucional de la Argentina", in Revista Latino-Americana de Estudos
Constitucionais, nº 10, Novembro de 2009, págs. 351 e segs.; JosÉ TARcíZIO DE ALMEIDA MELO, op. cit.,
págs. 127 e segs.
156 Corrigimos algo do que escrevemos em A Constituição de 1976 ..., cit., págs. 246 e segs.
157 GEORGESBURDEAU, op. cit., IV, pág. 253.
158 WERNER KÃGI, op. cit., pág. 119.
159 GOMES CANOTILHO, Direito ..., cit., pág. 1.065.
Parte III I Constituição ••
bém e tabelece (art. 168°) uma tramitação para a revisão total ou para a revi ão parcial
que afete o título preliminar (donde constam, designadamente, a definição da Espanha
como E tado ocial e democrático de Direito e como monarquia parlamentar, o direito
à autonomia da nacionalidade e regiõe e a garantia do pluralismo partidário e dos
indicatos), a secção I do capítulo Jj do título I (relativa aos direito fundamentai e à
liberdade pública) ou o título li (relativo à Coroa).
Ora, enquanto para a reforma o proce o con i te em votação por maioria parlamen-
tar qualificada e em ujeição a referendo, apenas quando solicitado por uma décima parte
do membro de qualquer das Câmara, para a revi ão total e para a revisão parcial dos
preceito fundamentai (que é uma revi ão total em entido material) o proce so torna-
e muito mais complexo: aprovação do princípio da revisão por maioria de doi terço
de cada âmara e di olução da Corte, ratificação da deci ão de revisão pela nova
Corte e aprovação do novo texto constitucional por maioria de dois terços, finalmente
referendo obrigatório para ratificação da revi ão.
A experiência do último ano mo tra que já não ão em pequeno número as tran-
içõe con titllcionais felize . Além di o, agora no plano da política con titucional, pode
preferir- e - a ter de haver mudanças radicais ou de regime - que ela e desenrolem den-
tro de processo de revisão, e não à revelia de quaisquer proce o pree tabelecido com-
provado (até porque, a im, e evitam a oluçõe de continuidade e o custo e risco
inerentes às revolllçõe ); ou que, mantendo- e a legitimidade democrática, o povo tenha
empre meio proce uai adequado à livre reorientação dos seus projetos institucionais.
De re to, ainda em tese geral, acrescente-se que o não se fecharem os proces o
previstos na on titllição a grande tran [ormaçõe política e ociai acaba por er, não
um elemento de perturbação e in tabilidade, ma sim um elemento de conservação e es-
tabilidade - porque a formas têm a uas próprias exigências, canalizam e di ciplinam
o agentes de poder, de encorajam extremi mo , apontam para o compromi o com o
princípios até então dominantes.'6o
UI - Em última análi e, o que mo tra uma teoria dos limites materiais da revi ão
con tituciona! é como, por detrás do poder de revisão, se encontra sempre pre ente ou
latente o poder con tituinte material (originário).
O poder de revi ão vive empre em ten ão com o poder constituinte, num duplo
entido. e e mantém no eu e paço peculiar, respeitando os princípios fundamentais da
Con tituição aquando da adequação circunstancial dos preceitos que lhe cabe, aparece
enquadrado, condicionado e regulado pelo poder con tituinte (originário), autor da Con -
tituição. Se, diversamente, extrava a de e espaço, não re peitando os princípios con titu-
cionai ,e - em conjuntura política, ocia! e jurídica propícia -logra impor a ua obra, dei-
160 V., contudo, doutro prisma, CARLJ. FRIEDRICH,op. cit., págs. 116 e segs., máxime 122, onde, criticando
as cláusulas de limites materiais, sustenta que elas teriam o efeito político de privar o poder de revisão
de uma parte daquilo que é a sua função essencial: prevenir o aparecimento de um poder constituinte.
V. ainda KLAUSVON BEYME, "La difesa dei ordinamento costituzionale Federale)", in Quader-
(Germania
ni Costituzionale, 1984, pág. 387; ou FRANCESCORIMOU, Pluralismo e valori costituzionali, Turim, 1999,
págs. 201 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Capítulo I
Estrutura das normas constitucionais
1 J. HERMANOSARAIVA,A crise do Direito, Lisboa, 1964, pág. 52. V. também págs. 69, 75 e 76.
2 Cfr., por exemplo, as diferentes perspetivas de LOURIVALVILANOVA,As estruturas lógicas e o sistema da
Direito positiva, São Paulo, 1977, págs. 108 e segs. e 147, e de CAsTANHEIRANEVES,A unidade do siste-
ma jurídico: o seu problema e o seu sentida, Coimbra, 1979, págs. 205 e segs.
3 Cfr. NORBERTOBOBBIO, Teoria dell'ordinamento giuridico, 1982, trad. Teoria da Ordem Jurídica, 7i ed.,
São Paulo, 1996, págs. 75b e segs.; CLAUS-WILHELMCANARIS,Systen denken und systembegrif! in der
jurisprudenz, trad. Pensamento sistemático e conceito de sistema na Ciência do Direito, 3i ed. portu-
guesa, Lisboa, 2002, págs. 9 e segs.; MENEZESCORDEIRO,Ciência do Direito e Metodologia Jurídica nos
finais do século XX, Lisboa, 1989, pág. 4; KARLLARENZ,Methodenlehre der Rechtswissenschaft, 1991, 3i
ed. portuguesa, Metodologia da Ciência da Direito, Lisboa, 1997, págs. 661 e segs.; FREITASDOAMARAL,
op. cit., págs. 50 e segs.; FERNANDOJOSÉBRONZE,Lições ..., cit., págs. 608 e segs.
4 Independentemente de adesão às teses autopoiéticas, segundo as quais a unidade do sistema é autor-
referencial e circular. Cfr. GUNTHERTEUBNER,Rechts ais autopoietischen System, 1989, trad. O Direito
como sistema autopoiético, Lisboa, 1993, págs. 53 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
axiológico- ocial realização.5 A unidad não é algo de qu pura e impl mente e parta
ou predefina como um axioma, ma algo que se po tula como intenção e a que em
grande medida e procurará chegar, con tituindo-a.6
E ' no ní el do princípio, e enquanto ão ele a dir ta pre ão de e regulati o
diálogo normati o com a realidade hi tórico- ocial, que e de erá intencionar a unidad
de ordem que aquele diálogo pretende in tituir.7
Ma ,ob erva A ARI ,na de coberta do i tema tel ológico, não pode ficar p la
'deci õe de conflito" e d alore ingulare, ante e de endo a ançar at' ao alore
fundamentai mais profundo , portanto até ao princípio gerai duma ordem jurídica.
ó a im podem o valore ingulare libertar- e do eu i olamento aparente e recondu-
zir- e à procurada conexâo "orgânica" e ó a im e obtém aqu le grau de generalizaçâo
obre o qual a unidade da ordem jurídica e toma percetí el. O si tema d fine- e como
uma ordem axiológica ou teleológica de princípio gerai de Direito, na qual o elem nto
de adequação valorativa e dirige mai à caraterí tica de ordem teleológica e o da unidade
int ma à caraterí tica do princípio gerais.8
11- O princlplos não e colocam, pois, além ou acima do Direito (ou do próprio Di-
reito po itivo); também eles - numa i ão ampla, uperadora de conceçõe po iti i ta ,
literali ta e ab olutizantes da fonte legais - fazem parte do complexo ordenamental.
ão e contrapõem à norma, contrapõ m- e tão omente à regra ; a norma jurídica
é que e dividem em norma -princípio e em norma -regra .
e a im e afigura em geral,9 muito mai tem do er no âmbito do Direito con ti-
tucional, tronco da ordem jurídica e tatal, todo ele en 01 ido e pen trado p lo alore
10 Cfr., também, entre tantos, HERMANN HELLER,op. cit., págs. 302 e segs.; F. PEREIRADOSSANTOS,Un
État Corporatif - La Constitution Sociale et Politique Portugaise, 2~ ed., Porto, 1940, págs. 32 e segs.;
VEZIOCRISAFULlI,"I principi constituzionali dell'interpretazione delle leggi", in Scritti giuridici in onore di
Santi Romano, obra coletiva, I, Pádua, 1940, pág. 703, e La Costituzione e le sue dispozioni di principio,
Milão, 1952; GEORGESMORANGE,op. cit., loc. cit., págs. 229 e segs.; FRANCOMODUGNO, L'lnvalidità ...,
cit., I, págs. 217 e segs.; VITIORIO ITAlIA, Le disposizione di princípio stabilite dallegislature, Milão,
1970; General PrincipIes of the Constitutional adjudication: the political foundations of Constitutional
law - A symposium, obra coletiva editada por John Allen Winters, Nova Iorque, 1971, págs. 47 e segs.;
DOMENICOFARIAS,Idealità e indeterminatezza nei principi costituzionali, Milão, 1981, págs. 161 e segs.;
FRANÇOISLUCHAIRE,op. cit., loc. cit., págs. 284 e segs.; GARCIADE ENTERRIA,La Constitución , cit., págs.
97 e segs.; GOMES CANOTlLHO,Constituição dirigente ..., cit., págs. 277 e segs., e Direito , cit., págs.
1.159 e segs.; SERGIOBARTOLE,"Principi general i dei Diritto (Diritto Costituzionale)", in Enciclopedia deI
Diritto, XXXV, 1986, págs. 494 e segs.; MANUELARAG6N, "La eficacia juridica dei principio democratico",
in Revista Espanola de Derecho Constitucional, págs. 9 e segs., setembro-dezembro de 1988; RUI MA-
CHETE,OS princípios ..., cit., loc. cit., págs. 355-356; M. GARCIACANALES,"Principios generales y principios
constitucionales", in Revista de EstudiosPoliticos, n!! 64, págs. 131 e segs., abril-junho de 1989; ANTONIO
RUGGERI,Fonti enorme ne/l'ordinamento e su/l'esperienza costituzionole, Turim, 1993, págs. 75 e segs.;
Ivo DANTAS,Princípios constitucionais e interpretação constitucional, Rio de Janeiro, 1995; ANTONIO
D'ATENA,"In tema di principi e valori costituzionali", in Giurisprudenza Costituzionale, 1997, págs. 3.065
e segs.; Lezioni di Diritto Costituzionale, 2~ ed., Turim, 2006, págs. 15 e segs.; TERESANEGREIROS,Fun-
damentos para uma interpretação constitucional do princípio da boa-fé, Rio de Janeiro, 1998, págs. 97
e segs.; Ruy MANUEL ESPINDULA,Conceito de princípios constitucionais, São Paulo, 1999; MIGUEL No-
GUEIRADE BRITO,op. cit., págs. 312 e segs.; JORGEREISNOVAIS,As restrições não autorizadas a direitos
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
III - A doutrina tem a sinalado, de diferente ângulo e com diver o acento tóni-
co ,as eguinte caraterí ticas dos princípio :
fundamentais, Coimbra, 2003, págs. 322 e segs.; MARIA LÚCIAAMARAL, Afarma ..., cit., págs. 102 e segs.;
JORG LUTHER, "l'uso dei principi fondamentali nella giurisprudenza costituzionale", in Giurisprudenza
castituzionale e principii fondamentali, obra coletiva, Turim, 2005, págs. 969 e segs.; GIOVANNA RAZZA-
NO, "11 núcleo duro quale pressuposto de lia giurisprudenza costituzionale", ibidem, págs. 739 e segs.;
WllLlS 5ANTíAGOGUERRAJÚNIOR, "Teoria fundamental dos princípios jurídicos como teoria fundamental
do direito e garantismo penal", in Revista Mestrada em Direito de UNIFIEO (São Paulo, 2006, págs. 131
e segs.); PAULO BONAVIDES,Cursa ..., cit., págs. 255 e segs.; RICARDOGUASTINI, "Os princípios constitu-
cionais como fonte de perplexidade", in Interesse Pública, 55, 2009, págs. 157 e segs.; GllMAR FERREIRA
MENDES, INOCÊNCIOMÁRTIRESCOElHO e PAULOGUSTAVOGONET BRANCO,op. cit., págs. 96 e segs.
11 Op. cito Na edição francesa Prendre les droits à sérieux, Paris, 1995, págs. 79 e segs.
12 Op. cit., págs. 86 e 87.
Parte 111I Constituição ••
âmbito de aplicação. Os princípios não têm pretensão de exclu ividade, admitindo que
um mesmo efeito por eles preconizado seja, com consequências similares, alcançado por
fatores diferente, em com i o verem em perigo a sua identidade. 13
Só os princípio de empenham uma função "con titutiva" do ordenamento - diz,
por seu turno, Gu TAVO ZAGREBEL KV; as regras esgotam-se em si mesmas. Aos princípio
aderem- e; à regra obedecem- e. Os princípio dão-nos critérios para tomar posição
frente a situações a priori indeterminadas; a regra dizem-nos como devemo ou não
agir em determinadas situações. 14
A regra regem, o princípio valem - acre centa PAULOBONAVIDES. O valor que
nele e in ere e exprime em grau di tinto . O princípio ,enquanto valores fundamen-
tai , governam a Con tituição, o regime, a ordem jurídica. Não são apenas a lei, mas o
Direito em toda a sua extensão, substancial idade, plenitude, abrangência. 15
explícitas ou explicitáveis a norma que o legi lado con tituinte não qui ou não pôde
exprimir cabalmente.
ervem, depois, os princípio de elemento de con trução e qualificação: o con-
ceito bá ico de e truturação do sistema constitucional aparecem estreitament con xo
9
com o princípio ou através da pre crição de princípios.'
Exercem, finalmente, uma função pro petiva, dinamizadora e tran formadora, em
virtude da sua maior generalidade ou relati a indeterminação e da força expan iva que
pos uem (e de que e acham de provido o preceito, de de logo por cau a da ua
amarra verbais). Daí o pe o que revestem na interpretação evolutiva; daí a exigência que
contêm ou o convite que ugerem para a adoção d nova formulaçõe ou de nova norma
que com ele melhor se coadunem e que, portanto, mai e aproximem da ide ia de Direito
in piradora da Constituição ( obretudo, quando e trate de Con tituição programática).20
19 Recordem-se as regras de calibração de que fala TÉRCIOSAMPAIO FERRAZ,A Convocoção ..., cit., loe. cit.,
págs. 12 e segs.
20 Cfr. DOMENICO FARIAS,op. cit., págs. 166 e segs. Mais amplamente, sobre os princípios gerais de Direito
como diretivas de progresso, v. EMllIO BETII, Interpretazione delle Legge e degli Atti Giuridici, Milão,
1949, págs. 205 e segs.
21 Questão-de-focto ..., cit., pág. 553 (a respeito da referência à Moral e ao Direito no art. 4º da Constitui-
ção portuguesa de 1933). Cfr. A unidade ..., cit., págs. 105 e segs., e Fontes de Direito - Contributo para
uma revisão da sua problemática, cit., loe. cit., págs. 247 e segs.
22 Cfr. a distinção análoga feita por AFONSO QUEIRó (Lições ..., cit., págs. 291 e segs.) entre princípios jurí-
dicos fundamentais e princípios gerais de Direito administrativo.
Parte 111I Constituição 111
cionai que explicitam a valorações políticas fundamentai do legi lador constituinte'
aí e conden am a opçõe política fundamentai e e reflete a ideologia inspiradora da
on tituição; ão o cerne político da on tituição. o princípio con titucionai impo i-
ti o ub umem- e todo o princípio que impõem ao órgãos do E tado, obretudo ao
legi ladOt; a realização de fin e a execução de tarefa,. ão princípio dinâmicos, pro -
petivamente ori ntado . Por último, o princípio -garantia vi am in tituir uma garantia
do idadão,. é-lhe atribuída uma den idade de autêntica norma jurídica e uma força
determinante, po itiva e negativa.D
23 Direito..., cit., págs. 1164 e segs. Cfr. também págs. 1.173 e segs., onde se alude a princípios estru-
turantes, princípios constitucionais gerais e princípios constitucionais especiais.
24 Cfr. FRANCISCOLUCASPIRES,Teoria..., cit., págs. 188 e segs.; GOMES CANOTILHOe VITAL MOREIRA, Funda-
mentos da Constituição, Coimbra, 1991, págs. 67 e segs.; GOMES CANOTILHO,Direito ..., cit., págs. 243 e
segs.; MARIA LÚCIAAMARAL, A formo ..., cit., págs. 162 e segs.; JORGEREISNOVAIS, Os princípios consti-
tucionais estruturantes da República Portuguesa, Coimbra, 2004.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
E ta uma cla ificação po ível.25 Ma nada ju tifi aria con ertê-la em eparação
abi aI, poi há, em cada i tema con titucional, empre um grau maior ou menor de
comunicação e contato entre elemento di er o - um el mento con truti o tá pr ente
no princípio mai valorativo, e um elemento alorati o, no princípio aparentemente
mais técnico .26
IJI - Pela ua própria natureza e função, o principIo não carecem de ede fixa no
texto con titucional; os que lhe não ejam exteriore (ou anteriore ) podem dele er im-
pl mente induzidos. Rara êm a ser, no ntanto, a Con tituiçõe ,na quai ,em lugar
ariá eis, não apareçam explanado princípio de que terá ha ido con ciência quando
da ua elaboração ou a partir de algun do quai e terá pretendido me mo organizar o
i tema con titucional. A on tituiçõe portugue a e bra ileira abrem m mo o eu
articulado com a enunciação de "princípio fundamentai ", e, como e iu, a ele e
reportam, mai ou meno fielmente, a cláu ula de limite materiai de re i ão con titu-
cional ou cláu ula pátria (art. 288° e 60°, § 4°, re petivam nte).
25 Em Direito Constitucional - Introdução Geral, policopiado, Lisboa, 1978-1979, págs. 147 e 148, pro-
pusemos uma classificação diversa, segundo graus decrescentes de valorização e estabilidade e graus
crescentes de significação política e ideológica:
a) Princípios gerais de Direito (v.g., o princípio da proteção da pessoa ou o da proporcionalidade ou
racionalidade);
b) Princípios gerais de Direito constitucional ou, mais amplamente, princípios gerais de Direito público
(v.g., o princípio da fixação da competência pela norma jurídica ou o da tipicidade das formas de lei);
c) Princípios gerais do mesmo tipo constitucional de Estados (v.g., no Estado constitucional ou de Direi-
to ocidental, o princípio da tutela jurisdicional dos direitos ou o da representação política);
d) Princípios fundamentais específicos de cada Constituição positiva (v.g., na Constituição portuguesa
de 1976, o da independência nacional, o dos direitos fundamentais dos cidadãos, o da democracia, o
do Estado de Direito e o do socialismo).
26 Cfr. JOSEFESSER,op. cit., págs. 98 e segs., máxime 102, nota.
Parte 111I Constituição _
de grande tran formação político- ocialP O eu caráter depende des a circun tância e
de a intençõe bem como da ideologia a que apela o legi lador con tituinte.
E também a ua forma e a ua exten ão aparecem extremamente variá ei : de de
a ínte e lapidare d e tilo literário ao longo arrazoado à laia de r latório prelimi-
nare ou expo içõe de moti os; de de a invocação do nome de Deus28 ou do título de
legitimidade do poder con tituinte ao con pecto hi tórico; desde a alu ão a um núcleo de
princípio filo ófico-político à pre crição de determinado objetivo programático.
Encontram- e preâmbulo em algun do mai importante texto con titucionais
quer do primórdio do con titucionali mo, quer de épocas mai recente e de di er o
regime político. om intere e de igual aparecem em on tituiçõe como a do E ta-
do Unido (17 7),de Portugal (I 22,1911 e 1976),dalrlanda(1937) da França (1946
e 195 ) do Japão (1946), da República Federal da Alemanha (1949 e 1990) da Grécia
( 1975), da E panha (197 ), do Bra iI (198 ), da olômbia (1991), de abo Verde (1992),
da África do ui (1996), da Polónia (1997), da uíça (1999) de Angola (2010), etc.
1996. Sobre o da Constituição espanhola, RAUL MORODO, "EI preambulo de la Constitución Espanola",
in Perspetivas Constitucionais, obra coletiva, I, págs. 103 e segs.; JAVIERTAJADURATEJADA,EI preâmbulo
constitucionol, Granada, 1997. E sobre o da Constituição brasileira, CELSORIBEIROBASTOSe IVESGANDRA
DA SILVAMARTINS, Comentário à Constituição do Brosil, I, São Paulo, 1988, págs. 407 e segs.; ROSAHRus-
SOMANO, Curso de Direito Constitucional, 5~ ed., Rio de Janeiro, 1997, págs. 232 e segs.; JosÉ AFONSO
DA SILVA,Comentário contextual à Constituição, 3~ ed., São Paulo, 2006, ágs. 21 e segs.; JosÉ TARcíZIO DE
ALMEIDA MELO, op. cit., págs. 269 e segs.; GILMAR FERREIRAMENDES, INOCÊNCIOMARTINS COELHOe PAULO
GUSTAVOGONET BRANCO,op. cit., págs. 72 e segs. V. ainda a obra coletiva (editada por Antonio Torres dei
Moral e Javier Tajadura Tejada) Los preambulos constitucionales en Iberoamerica, Madrid, 2001.
39 Mas não foi assim em Portugal entre 1976 e 1982, com a referência ao Estado de Direito democrático.
40 AFONSOQUEIRÓ,Lições ..., cit., págs. 326 e segs.; HEINRICHEWALDHORSTER,op. cit., loc. cit., págs. 129-130.
41 Cfr. infra.
42 Cfr. por exemplo, em Portugal, JosÉ DIAS MARQUES, op. cit., cit., págs. lSl e segs.; J. HERMANO SARAIVA,
Lições de Introduçõo ao Direito, Lisboa, 1962-1963, págs. 247 e segs.; JoÃo BAPTISTAMACHADO, Intro-
dução ..., cit., págs. 93 e segs.; INOCÊNCIOGALVÃOTELES,Introdução ao Estudo do Direito, 11,1Oª ed.,
Coimbra, 2000, págs. 131 e segs.; OLIVEIRAASCENSÃO,op. cit., págs. S13 e segs.; e, especialmente para
o Direito administrativo, AFONSO QUEIRó, Liçães ..., cit., I, págs. 283 e segs. (o qual distingue normas de
conduta e de organização, de ação e de relação, internas e externas, materiais e instrumentais).
43 Cfr. as nove categorias de normas de comportamento, segundo NORBERTOBOBBIO (Teoria ..., cit., págs.
47-48): 1) normas que mandam ordenar; 2) normas que proíbem ordenar; 3) normas que permitem or-
denar; 4) normas que mandam proibir; S) normas que proíbem proibir; 6) normas que permitem proibir;
7) normas que mandam permitir; 8) normas que proíbem permitir; 9) normas que permitem permitir.
44 As normas de garantias institucionais (v.g. sobre contratação coletiva) mais do que prescritivas
são normas proibitivas, enquanto vedam ao legislador ordinário suprimir os institutos jurídicos a que
se referem. Cfr. Manual ..., IV, cit., págs. 72 e segs.
4S Como se sabe, as normas especiais são desenvolvimentos diferenciados de um mesmo princípio, e as
normas excecionais assentam em princípios opostos aos adotados pelo ordenamento jurídico.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
46 Sobre normas constitucionais de garantia, v. o nosso Contributo ..., cit., págs. 209 e segs.
47 Cfr. GIUSEPPECHIARELLI,Elasticità della Costituzione, cit., loc. cit., págs. 50 e segs.; IGNACIODE ano, op.
cit., págs. 28 e segs.; TÉRCIOSAMPAIO FERRAZJÚNIOR, Constituinte - Assembleia, Processo, Poder, cit.,
págs. 11 e segs. e 165 e segs.; KLAUSSTERN,op. cit., págs. 265 e segs.; LUIs ROBERTOBARROSO,a Direito
Constitucional e a efetividade das suas normas, 2~ ed., Rio de Janeiro, 1993, págs. 85 e segs.; MANUEL
ARAGÓN REYS,"Tipologia de las normas constitucionales", in Visión iberoamericana dei tema constitucio-
nal, obra coletiva, Caracas, 2003, págs. 253 e segs. GOMES CANOTILHO,Direito ..., cit., págs. 1.168 e segs.;
PAULOBONAVIDES,Curso ..., págs. 237 e segs.; GIUSEPPEDEVERGOTIlNI, op. cit., págs. 157 e 158.
48 Sobre normas de organização, v. NAZARENOSAlnA, Premesse per uno studio delle norme di organizza-
zione, Milão, 1965, e, em especial, sobre normas de competência, FRANCOPIERANDREI,"La Costituzione
e le sue norme di competenza", in Scritti ..., 11, cit., págs. 3 e segs.
49 Cfr. CARMEN LÚCIAANTUNES ROCHA,"Natureza e eficácia das disposições constitucionais transitórias", in
Direito Constitucional- Estudos em homenagem a Paulo Bonavides, São Paulo, 2001, págs. 377 e segs.
Parte 111I Constituição _
1lI - Importa alientar a diferença ignificati a que exi te entre a norma material
ou de fundo, por um lado, e a norma organizatória e procedimentai ,por outro lado.
sta são toda preceti a e com um conteúdo e trito de comandos de tudo ou nada
(para parafra ear Ow RKIN), ao pa o que entre a primeira encontram- e tanto norma
precetiva como programáticas e e observa um grau maior ou menor de abertura e inde-
terminação. É também por i o que o legi lador ordinário não e tá perante a Constituição
numa po ição idêntica àquela em que e encontra o poder regulamentar perante a lei e é,
a u re peito, que de e encarar- e a incompletude ou caráterfragmentário da on titui-
ção de que falam algun utore. 50
50 Assim, KLAUSSTERN,op. cit., págs. 261 e 224 e segs.; HANS PETERSCHNEIDER,Democracia y Constituci-
ón, trad., Madrid, 1991, pág. 49; ou KONRADHESSE,Escritos ..., cit., págs. 17 e segs., e Grundzüge des
Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland, 1995, trad. Elementos de Direito Constitucional da
República Federal da Alemanha, Porto Alegre, 1998, págs. 38 e segs.
51 É a posição que sempre temos perfilhado: assim, logo, Aspectos de uma teorio de inconstituciono-
lidade, cit., págs. 54 e segs.
52 Como se escrevia no parecer da comissão encarregada de indicar os artigos da Carta Constitucional,
cuja execução estava dependente de leis regulamentares (in Documentos para a História das Cortes
Gerois da Nação Portuguesa do barão de São Clemente, 11,Lisboa, 1884, pág. 467): "A comissão julgaria
ter cometido um sacrilégio se ousasse pensar que na Carta Constitucional havia artigos que não obri-
gassem desde já: aqui tudo é sagrado; todas as suas disposições obrigam desde que ela foi conhecida
e jurada ..."
53 Cfr., entre tantos, JEANRIVEROe GORGESVEDEL,"Les principes économiques et sociaux de la Constitu-
tion", in Droit social, Maio de 1947, págs. 14 e segs.; PAOLOBARILE,La Costituzione ..., cit., págs. 48 e
segs.; VEZIO CRISAFULLI,La Costituzione ..., cit., págs. 51 e segs.; lIvlo PALADIN,"Osservazioni sulla dis-
crezionalità e sull'eccesso di potere dellegislatore ordinario", in Revista Trimestrale di Diritto Publico,
1956, págs. 1017 e segs.; HANSKELSEN,Teoria Pura ..., cit., 11,pág. 68; STEFANROSMARYN,op. cit., págs.
99 e segs.; MICHALSTASKÓV,"Quelques remarques sur les 'droits économiques et sociaux"', in Essais sur
les droits de /'homme en Europe (deuxieme série), obra coletiva, Turim-Paris, 1961, págs. 48 e segs.;
GEORGESBURDEAU,op. cit., IV, págs. 131 e segs.; MIGUELGALVÃOTELES,Eficácia dos tratados ..., cit., págs.
167, nota, e 204 e segs.; AFONSOQUEIRÓe BARBOSADE MELO, "A liberdade de empresa e a Constitui-
ção", in Revista de Direito e Estudos Sociais, pág. 226, 1967; JORGEMIRANDA, Contributo ..., cit., págs.
73 e 173-174, nota, e A Constituição de 1976, cit., págs. 135-136 e 346-347; ROGÉRIOSOARES,Direito
Público ..., cit., págs. 29 e 88 e segs.; MARIO NIGRO,"Costituzione ed effettività costituzionale", in Rivista
Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, págs. 1.711 e segs., 1969; ROSAHRUSSOMANO,"Das normas
constitucionais programáticas", in As Tendências Atuais do Direito Público. Estudos em homenagem ao
Professor Afonso Arinos de Melo Franco, obra coletiva, Rio de Janeiro, 1976, págs. 267 e segs.; TEMIS-
TOCLEMARTINES,op. cit., loc. cit., págs. 803 e segs.; MARCELOREBELODESOUSA,Direito Constitucional,
cit., págs. 96 e segs.; GOMES CANOTILHO,Constituição dirigente ..., cit., págs. 166 e segs., 293 e segs.,
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Isto é verdadeiro tanto no plano do i tema con titucional quanto no plano de cada
norma tomada por i. No plano do sistema, na medida em que as norma programática
dele participam como quaisquer outra e para ele contribuem atravé do princípio, do
fin e do valore que incorporam; e, a im como recebem o influxo da norma preceti-
va , também as não podem deixar de influenciar. No plano de cada norma i oladamente
con iderada, poi nenhuma deixa de revestir - sejam quais forem o critério perfilhado
- força jurídica, pode haver até norma, em parte, precetiva e, em parte, programática.
313 e segs. e 317 e segs., e Direito ..., cit., págs. 1.176 e 1.177; Luís FREIREDE CARVALHO,"Normas pro-
gramáticas na Constituição", in Revista de Direito Público, nº 82, págs. 156 e segs .• abril-junho de 1987;
ROBERTOBIN, Atti normativi enorme programmatiche, Milão, 1988, págs. 179 e segs.; RUI MACHETE,
"Normas programáticas e liberdade do legislador", in Estudos de Direito Público e Ciência Palítica. Lis-
boa. 1991, págs. 590 e segs.; LUIS ROBERTOBARROSO,op. cit., págs. 109 e segs.; JosÉ AFONSO DA SILVA,
Aplicabilidade ..., cit., págs. 135 e segs.
Cfr., ainda, J. HERMANO SARAIVA,A crise ...• cit., págs. 59 e 73; ANDRÉ GONÇALVESPEREIRA,"Relevância
do Direito Internacional na Ordem Interna". in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lis-
boa, págs. 231 e segs., 1964; TEIXEIRARIBEIRO, Os princípios constitucionais da fiscalidade portuguesa,
Coimbra, 1966, pág. 20, nota; ARMANDO MARQUES GUEDES,op. cit., págs. 352 e 358; CARDOSODA COSTA,
Curso de Direito Fiscal, 2ª ed., Coimbra, 1969, págs. 85-86; VITAL MOREIRA. Economia e Constituiçãa, cit.,
págs. 128-129, nota, e 136 e segs.; MENEZESCORDEIRO,"A Constituição patrimonial privada", in Estudos
sobre a Constituição, obra coletiva, 111, págs. 369-370; ARMANDO DE CASTRO."Relações necessárias entre
as disposições económicas básicas da Constituição e os seus princípios programáticos", in Fronteira, nº
6, págs. 73 e segs., abril-junho de 1979; ANA PRATA,op. cit., págs. 123 e segs.; GERMAN BIDARTCAMPOS,
Las obligaciones en Derecho Constitucional, Buenos Aires, 1987. págs. 37 e 81 e segs.; CRISTINAQUEI-
ROZ, OS Atos Políticos no Estado de Direito, Coimbra, 1990, págs. 143 e segs.; MARCELO NEVES, Teoria
da inconstitucionalidade ..., cit., págs. 101 e segs.; ANTONIO D'ATENA, In tema ...• cit., loc. cit., págs. 307 e
segs.; PAULOOTERO, Lições de Introduçõo ao Estudo do Direito. I, 2º tomo, Coimbra, 1999, págs. 164 e
segs.; DIRLEYDA CUNHA JÚNIOR, Curso de Direito Constitucional, Salvador, 2008, págs. 149 e segs.; PAULO
BONAVIDES,Cursa ..., cit., págs. 244 e segs.; RAÚL MACHADO HORTA,op. cit., págs. 163 e segs.
nal, pelo que os direito que dela con tam, máxime o direito ociai, não têm
a natureza de direito ubjetivo plenos.58
ontudo, nenhum de se traços definidore (ou outro critérios que se utilizem para
a contrapo ição diante das normas precetivas) briga com a juridicidade das normas pro-
gramática:
58 Cfr. VIEIRA DEANDRADE, Os direitos fundamentais ..., 2ª ed., cit., págs. 194 e 195.
59 A expressão é de GOMES CANOTllHO, op. cit., 2ª ed., I, pág. 217.
60 Contributo ..., cit., pág. 76; e na 2ª ed. deste tomo, pág. 221. Cfr. a visão de GOMES CANOTILHO,Constitui-
ção dirigente ..., cit., págs. 453 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Hoje, propendemo para algo de diferent . Achamo que a di tinção entre nonna
preceti a e nonna programática é inerente ao E tado ocial d Direito à d mocracia
plurali ta; e que ela confere maleabilidade e adatabilidade ao i tema. Mai : admitimo
até, dentro de certo limite, ariaçõe de e trutura da nonna con oante a on titui-
çõ ,o tempo hi tóricos e a circun tância do paí e .
Ma e i tem, a par dela ,norma não exequívei por i me ma em que não e ve-
rifica tal nece idade. ão a norma permi i a dirigida ao legislador, a que lhe dão
a faculdade de fazer ou não fazer lei66 e cujo não exercício não envolve inconstituciona-
lidade por omi ão.
Ob iamente, endo e ta norma permi i a ou facultati a ,uma ua eventual não
realização não en 01 e nenhuma infração da onstituição.
130. Normas precetivas exequíveis, normas precetivas não exequíveis e normas pro-
gramáticas
66 Por exemplo, na Constituição portuguesa, o art. 152, n2' 4 e 5 (sobre capacidade eleitoral dos estran-
geiros em certas eleições) ou o art. 240, n2 2 (sobre iniciativa popular de referendo local).
67 Cfr. o art. 222 da Declaração Universal, ligando a efetivação dos direitos económicos, sociais e culturais
ao esforço nacional, à cooperação internacional e à organização e aos recursos de cada país.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
efetividade (ou eficácia) intrin eca da norma: I) norma precetivas exequíveis por si
me ma ; 2) norma precetiva não exequívei por i me ma ; 3) norma programáticas.
Será talvez interessante confrontar e ta tricotomia com a que Jo ÉAFO o DA ILVA
propõe, distinguindo normas con titucionai de eficácia plena, norma con titucionais de
eficácia contida e normas con titucionai de eficácia limitada ou reduz ida. 68
egundo este Autor, na primeira categoria incluem-se toda a norma que, de de a
entrada em vigor da eon tituição, produzem todos o seus efeitos essenciais (ou têm po -
ibilidade de o produzir): normas que contenham vedações ou proibições, que confiram
i ençõe ,imunidade ou prerrogativa , que não designem órgão ou proce o e peciais
de execução ou que não exijam a elaboração de novas normas legislativa que lhes com-
pletem o alcance ou fixem o conteúdo.
O segundo grupo constitui-se de normas que incidem imediatamente e produzem
(ou podem produzir) todo o efeito queridos, ma que têm a sua eficácia contida em
certo limites, dadas certas circunstância: a im, a norma re tritiva ou obre ordem
pública.
As normas do terceiro grupo são as que não produzem todos os seus efeitos essen-
ciais, porque o legislador constituinte não estabelece sobre a matéria uma normatividade
bastante. E englobam normas declaratórias de princípio institucionais e organizatórios e
normas declaratória de princípio programáticos.
Ora, verifica-se com relativa facilidade que as normas de eficácia plena de Jo É
Aro o DA ILVA correspondem à normas exequíveis de que acabámos de falar, a norma
declaratórias de princípio in titucionai e organiza tório corre pondem gros o modo às
normas precetivas não exequíveis e as normas declaratórias de princípios programáticos
às normas programática. ó as normas de eficácia contida ficarão à margem, embora
pareçam reconduzir- e ainda a norma precetivas.
Por seu lado, MA OELGo ÇALVEFERREIRA FILHO,depois de distinguir normas ime-
diatamente exequívei e norma não exequíveis por i me ma , ubdivide e ta em quatro
tipo : 1°) norma incompleta, regra que não pre cindem de outra que a de dobrem ou
"regulamentem"; 2°) norma condicionadas, regra que, embora completa, ficam condi-
cionadas pelo constituinte à futura edição de lei que propicie o início de sua execução; 3°)
normas programáticas, cuja execução reclama não ó uma complementação normativa
ma igualmente uma "terceira instância política, administrativa e material", sem o qual
ele não terão condições de efetivação no mundo real; 4°) normas de e truturação, que
preveem a in tituição de órgãos ou ente e tatais, ou o tratamento i temático e global de
um setor de atividade, mormente económico.69
E ainda outro Autor, UEDILAMMÉ BULO apre enta quatro nívei : norma de eficá-
cia ab oluta, norma de eficácia plena, normas de eficácia relativa restringível e normas
de eficácia relativa complementável pelo legislador.70
68 Aplicabilidade ..., cit., págs. 81 e segs. Cfr. MARIA HElENA DINIZ, Norma constitucional e seus efeitos,
2~ ed., São Paulo, 1992, págs. 92 e segs.; LUIs ROBERTOBARROSO,op. cit., págs. 81 e segs.; ou DIRlEY DA
CUNHA JÚNIOR, Controle judicial das omissões do poder público, São Paulo, 2004, págs. 79 e segs.
69 Comentários..., I, cit., pág. 7.
70 Manual de Interpretação Constitucional, São Paulo, 1997, págs. 9 e segs.
Parte 111 I Constituição ••
71 Há Constituições que o declaram expressamente, em geral: a búlgara (art. 5º, nº 2), a lituana (art. 6º),
a polaca (art. 82). Outras, apenas a respeito de direitos fundamentais: a portuguesa (art. 182, n2 1), a
brasileira (art. 5º, § 1º), a cabo-verdiana (art. 18º). V. ainda as Constituições alemã (art. 19º, nº 3) e a
espanhola (art. 532).
72 Cfr., na doutrina, por todos, GARCIA DE ENTERRfA,op. cit., págs. 49 e segs.; MARIA LÚCIA AMARAL, res-
ponsabilidade da Estado e dever de indemnizar do legislador, Coimbra, 1998, págs. 338 e segs.; PIER-
FRANCESCO GROSSI,Attuazione ed inattuazione della Costituzione, Milão, 2002.; ou GOMES CANOTllHO,
Direita ..., cit., págs. 1.178 e segs.
73 MIGUEl GAlVÃO TElES, Eficácia ..., cit., págs. 205-206, nota.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
a) ó por con tarem da Con tituição de em - tal como a norma exequí el por
i me ma - er tida em conta na procura do entido da re tant norma, por
via da interpretação istemática;
b) Atra é da analogia, podem contribuir para a integração de lacuna
c) Fixam critério para o legi lador no domínio obre que er arem - donde
ainda incon titucionalidad material - por de io de p der - quando haja afa -
tamento de es critério .75
III - O que acaba de ser dito tem a ua mai importante projeção no campo do
direito fundam ntai .
Os direito de liberdade e as garantia de segurança pes oal con tam, na sua grande
maioria, de norma precetivas exequívei por si mesmas, conquanto haja alguma que
não ão autoexequívei .
Por eu turno, no direito ociai, e a ua caraterí tica mai e pecífica é a de direi-
to po itivo , nem por i so deixam de conter, qua e todo ,uma ertente negati a ou de
defe a contra iolaçõe (como o direito à proteção da aúde e o direito da criança).
e ta ertente a re petiva norma ão tão direta e imediatamente aplicá ei como a
normas sobre direito, liberdades e garantia; e, na ertente po iti a aplicá ei mediata-
74 Cfr. Manual ..., IV, cit., págs. 435 e segs. Propendemos a seguir a distinção feita pelo Tribunal Constitu-
cional português no acórdão nº 509/2002, de 19 de Dezembro (Diária da República, i! série, nº 36, de
12 de Fevereiro de 2003): 1º) onde a Constituição contenha uma ordem de legislar, suficientemente
precisa e concreta, de tal sorte que seja possível determinar com segurança as medidas jurídicas ne-
cessárias para lhe conferir exequibilidade, a margem de liberdade do legislador para retroceder no grau
de proteção atingida é necessariamente mínima, já que só o poderia fazer na estrita medida em que a
alteração legislativa pretendida não viesse a consequenciar uma inconstitucionalidade por omissão; 2º)
noutras circunstâncias, porém, a proibição de retrocesso social apenas pode funcionar em casos-limite,
uma vez que, desde logo, o princípio da alternância democrática inculca a revisibilidade das opções
político-legislativas, ainda quando estas assumam o caráter de opções legislativas fundamentais.
Cfr. a formulação mais radical do princípio no acórdão nº 39/84, de 11 de Abril (Diário da República,
i! série, nº 104, de 05 de Maio de 1984) e as formulações mais moderadas presentes nos acórdãos n°S
148/94, de 08 de Fevereiro, e 509/2002, de 19 de Dezembro (ibidem, i! série-A, nº 102, de 03 de Maio
de 1994, e i! série, nº 36, de 12 de Fevereiro de 2003, respetivamente).
Na doutrina, em sentido favorável, MIGUEL GALVÃOTELES,Eficácia ..., cit., pág. 206, nota; GOMES CANO-
TILHO, Constituição dirigente ..., cit., pág. 374 AVELÃS NUNES, A garantia das nacionalizações e a deli-
mitação dos sectores público e privado no contexto da Constituição económica portuguesa, Coimbra,
1989, pág. 48. Mais recentemente, em sentido adverso, JORGEREIS NOVAIS, As restrições aos direitos
fundamentais não expressamente autorizados pela Canstituiçõo, Coimbra, 2003, págs. 138 e 139, nota;
TIAGO DE FREITAS,"O princípio da proibição do retrocesso social", in Estudos em homenagem aa Profes-
sor Doutor Marcella Caetano no centenário do seu nascimento, obra coletiva, 11, Coimbra, 2006, págs.
783 e segs.; JosÉ ALEXANDRINO,Direitas Fundamentais -Introdução geral, S. João do Estoril, 2007, pág.
148. Em visão mitigada, VIEIRA DE ANDRADE, Os direitos ..., cit., 2! ed., págs. 390 e segs.
75 Cfr. infra.
Parte 111I Constituição _
mente, na projeção sistemática desse direitos sobre outros direito (v.g., na Constituição
portugue a, o art. 64°, sobre habitação em face do art. 62°, sobre propriedade, ou o art.
66°, sobre ambiente em face do art. 61°, sobre iniciativa económica).
IV - Há, por' m, a petos diversos de regime e de força jurídica das normas preceti-
a não exequívei e da norma programática.
Quanto à primeiras:
76 V. Manual ..., VI, cit., págs. 299 e segs., máxime 309. No mesmo sentido, JORGEPEREIRADA SILVA,Dever
de legislar, proteção jurisdicional contra omissães legislativas, Lisboa, 2003, pág. 197 (falando em de-
ver de legislar sujeito a "condição suspensiva").
77 O que significa que aqui o órgão de fiscalização da constitucionalidade, máxime o Tribunal Constitu-
cional, deverá, no seu juízo, atender às situações de fato - justamente pela dependência das normas
programáticas dessas situações.
Capítulo II
INTERPRETAÇÃO, INTEGRAÇÃO E APLICAÇÃO
§ lº
Interpretação e integração das normas constitucionais
a leitura jurídica do te to con titucional, eja ele qual for. ó atra é dela a partir da letra,
mas em e parar na letra, e ncontra a norma ou o entido da norma. ão é po í el apli-
cação m interpretação tal como e ta ó faz pleno sentido po ta ao erviço da aplicação.
A de peito di to, a relevância e o alcance do trabalho interpretati o acu am ariaçõe
por demai conhecida. Ordenamento de tipo judicial i ta, como os anglo-saxónico , ou
on tituiçõe com di po itivo muito amplos e elá tico pre tam- e mai à elaboração juri -
prudencial do que ordenamento não judiciali ta ou Con tituiçõe em que e tenha preten-
dido verter a "reta razão" no re petivo pr cito . Uma atitude cogno citiva ou uma atitude
oluntari ta obre a on tituição em concreto que se tenha projetam- diferentemente no
re ultado da interpretação. onhece- e o debate entre "original i ta " e "con truti i ta "
no tado nido. Enfim, a po tura qu perante a problemática geral da interpretação
e adotem e pelham a difi rente orientaçõe doutrinai de juri ta e ju filó ofos.
Uma clara con ciência do intere e ou do intere e e pecífico da interpretação cons-
titucional não urgiu (como não urgiria acerca de outra questões) durante a época li-
beraI. Apareceu mai tarde, quando o progre o da teoria de interpretação jurídica em
geral também aqui e fizeram entir, repen ando o método vindo de AVIG v; quando,
para lá da exege e e do po itivi mo, e avançou na elaboração dogmática do Direito pú-
blico; e quando e fizeram entir o de en 01 imento trazido pelaju tiça constitucional
concentrada e e pecializada.
11- Exi te, poi , hoje o reconhecimento da importância da interpretação con titu-
cional. Ma e i te, ao me mo tempo, a noção da dificuldades ou (doutro ângulo) do
fatore de perturbação que e deparam ao eu operadore: un de origem endógena,
outros de origem exógena.
Entre o primeiro, a variedade de norma con titucionai quanto ao objeto e quanto
à eficácia (como acaba de e ver) e a incompleição ou a indeterminação de muita dela,
ou da ua linguag m; a inad quação, não raro, das técnica ub untiva ; a proximidade
do fato político e (na expre ão, que ale a pena aqui r petir, de MORT TI) e a "reb 1-
dia" de te perante o quadro puramente lógico da hermenêutica;2 em uma, a pre ença
da realidade con titucional em con tante mutação.
127 e segs.; ANTONIO PORRAS NADALES, Introducción a una teoria deI Estado postsocial, Barcelona, 1988;
págs. 181 e segs.; GAETANO SILVESTRI, "Linguaggio della Costituzione e linguaggio giuridico: un rapporto
complesso", in Quaderni Costituzionali, 1989, págs. 205 e segs.; HANS PETER SCHNEIDER, op. cit., págs. 53
e segs.; GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Fundamentos ..., cit., págs. 51 e segs.; MICHEL TROPER, Pour
une théorie juridique de /'État, Paris, 1994, págs. 293 e segs.; KARL LARENZ, Metodologia ..., cit., págs.
510 e segs.; MARIA LÚCIA AMARAL, Responsabilidade do Estado e dever de indemnizar do legislador,
Coimbra, 1998, págs. 387 e segs.; RUI MEDEIROS, A decisão de inconstitucionalidade, Lisboa, 1999, págs.
177 e segs.; JOSÉ ADÉRCIO LEITE SAMPAIO, op. cit., págs. 778 e segs.; Luís S. CABRAL DE MONCADA, Estudos
de Direito Público, Coimbra, 2001, págs. 435 e segs.; PETER HABERLE, L'État. .., cit., págs. 125 e segs.;
RAFAELCAIADO AMARAL, Peter Hiiberle e a hermenêutica constitucional, Porto Alegre, 2004; GOMES CA-
NOTILHO, Direito ..., cit., págs. 1.195 e segs.; LUIS ROBERTO BARROSO, Temas de Direito Constitucional, 111,
Rio de Janeiro, 2005, págs. 3 e segs.; JORGE BACELAR GOUVEIA, Manual ..., cit., págs. 657 e segs.; GIORGIO
BONGIOVANNI, Costituzione e teoria dei diritto, Roma-Bari, 2006, págs. 151 e segs.
2 Há também quem fale na localização das normas constitucionais "na fronteira do ordenamento jurídi-
co": FRANCISCO LUCAS PIRES, Teoria da Constituição de 1976, cit., pág. 54.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
III - Para atalhar a esta e a outra dificuldades e peculiaridade fala- e, por vezes,
no recurso renovado a um método bastante antigo - a tópica. Quai quer problema de
interpretação e aplicação eriam aqui ituado diante de tópico, lugare -comun ou argu-
mento a extrair de princípio gerai, de deci õe jurisprudenciais ou de crença e opini-
õe comun ; e, em vez de se procurarem a soluçõe em ab trato atravé de um raciocínio
dedutivo e i temático sobre as normas, elas haveriam de er en aiadas a partir do pró-
prios problema em concreto na circun tâncias em que urgem; a tópica é a técnica de
pensar por problemas (ou de pensar de baixo para cima, em termos dialético ).4
Sem negar o interesse da orientação a im propo ta, não parece que ela po a er acei-
te enão com re ervas e apena para completar ou comprovar re ultado adquirido doutra
forma. Nem o recur o à tópica e encontra tão experimentado que ju tifique mais do que
isso, nem pode meno prezar-se o ri co - no domínio constitucional, eventualmente, mais
do que em qualquer outro - de ele conduzir a uma pluralidade de sentido ou a uma casu-
í tica pouco fecunda. Até porque a interpretação con titucional vive paredes-meia com a
política é que a máxima objetividade possível deve ter- e como um escopo fundamental,
muito mais propiciada pela utilização dos instrumentos jurídico clá sico - o quais não
têm de e confundir, in ista-se, com pressupostos po itivi ta - do que pela formulação de
argumento para problemas específicos.5
Me mo um Autor como HE E, que enfatiza o caráter aberto e criador da interpre-
tação con titucional,6 em necessário contato com o problema,? entende que o método
tópico apenas pode ter um lugar limitado ne ta interpretação - tanto mai que o Direito
con titucional enquanto Direito fundamental da ordem global e concebido como ordem
de convivência não deve ser compreendido pontualmente a partir de um problema i ola-
do, como pode acontecer em Direito privado.8.9
3 Cfr., por exemplo, ANTONINO PENSOVECCHIOLi BASSI, "5ui critteri della interpretazione costituzionale in
relazione ai soggetti", in Scritti in onore di Gaspare Ambrosini, obra coletiva, 11,Milão, 1970, págs. 1.495
e segs., ou ANNA CANDIDA DA CUNHA FERRAZ,op. cit., págs. 64 e segs., 102 e segs. e 146 e segs.
4 V. a obra fundamental de THEODORVIEHWEG, Topik und Jurisprudenz, 1953 (consultámos a edição ita'
liana Topica e Giurisprudenza, Milão, 1962).
5 Cfr. CASTANHEIRANEVES,A unidade ..., cit., págs. 24 e segs.; VIEIRA DE ANDRADE, Os direitos fundamen-
tais ..., 1ª ed., cit., págs. 122 e segs.; MENEZES CORDEIRO,"Aplicação da lei", in Polis, 111,pág. 1.058, e
Ciência do Direito, cit., págs. 30 e segs.; KARL LARENZ, Metodologia ..., cit., págs. 201 e segs.; GOMES
CANOTILHO,Direito ..., cit., pág. 1.211.
6 Escritos ..., págs. 38 e segs.
7 Ibidem, págs. 44 e 45.
8 Ibidem, págs. 52-53.
9 Assim como há quem defenda que nas sociedades heterogéneas e pluralistas dos nossos dias a me-
todologia clássica tem de ser substituída ou modificada por regras interpretativas correspondentes a
conceções mais dinâmicas e que, ao mesmo tempo, reconheça que a invasão da Constituição pelos
"topoi" e a conversão dos princípios constitucionais e das próprias bases da Constituição em pontos de
Parte 111I Constituição _
vista à livre disposição do intérprete de certo modo enfraquecem o caráter normativo desses princípios
(PAULOBONAVIDES,Política e Constituição, Rio de Janeiro, 1985, págs. 130 e 132).
V.ainda, em geral, KLAUS-WILHELMCANARIS,op. cit., págs. 244 e segs.
10 Op. cit., pág. 15. V. também Wesensgehalgaranzie des art. 19 abs 2. Grundgesetz, 1983, Le libertà fan-
damentali nella Stato Costituzionale, trad., Roma, 1993, págs. 187 e segs.
11 Ibidem, pág. 14.
12 Ibidem, págs. 23-24.
13 Ibidem, pág. 24.
14 Ibidem, pág. 36.
15 Ibidem, pág. 37.
16 Op. cit., págs. 179-180.
17 Ibidem, pág. 181 (seguindo GUSTAVOZAGREBELSKY).
18 Ibidem, pág. 182 (seguindo FRANCISCORUBlO LLORENTE).
19 Ibidem, pág. 182 (seguindo KONRADHESSE).
20 Ibidem, pág. 183.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
trata já de interpretação, mas sim de uma permanente mutação con titucional criadora do
Direito sob a etiqueta de interpretação.21
A normatividade da Constituição, acre centa B KE F RDE, upõe a ua vlgencia e
esta se baseia numa ordem jurídica vinculante e(ou) numa expetativa real de comporta-
mento. Na medida em que a Con tituição eja "aberta" não pode pretender vigência; e
e a abertura e converte na "e trutura" da Con tituição, e ta fica ujeita a permanente
indeterminação e mutabilidade. E isso só se supera através de um con en o, exi tente ou
em formação, de um proce so primariamente político cujos titulares são a forças de fato
pública e politicamente relevantes; e não atravé da interpretação, enquanto proces o
primariamente argumentativo.22
Quanto a nó , por certo aceitamo o ace o do cidadão à Con tituição como de-
corrência do direito de ace o ao direito (art. 20° da Constituição portugue a) e exigência
do princípio da cidadania (art. 48°). No entanto, ainda que po amos ter por exagerada
as consequência negativa da te e hãberliana egundo B KE FORDE, temo que admitir
que a "sociedade aberta dos intérprete da Con tituição" pode conduzir a conflito de
interpretação insanávei , facilmente transformado em conflitos político-partidários.
Que qualquer cidadão ou qualquer órgão do Estado faça a ua leitura desta ou da-
quela norma con titucional é inevitável e legítimo. Porém, só os tribunais, como órgão
com competência para administrar a justiça em nome do povo (art. 202°), fazem interpre-
tação jurídico-con titucional vinculativa. Outra coi a é a alternativa entre um si tema de
controlo difu o e um i tema concentrado de controlo da constitucionalidade,23 aquele,
aparentemente, mais favorável à tese de HÃBERLE.
24 Cfr. KARl ENGISCH, op. cit., pág. 260; ou CAsTANHEIRA NEVES, A unidade ..., cit., págs. 97-98. Cfr., também,
por exemplo, DOMENICO FARIAS, op. cit., págs. 202 e segs.
25 Cfr., por todos, KONRAD HESSE, Escritos ..., cit., págs. 47 e segs.; JUAREZ FREITAS, op. cit., loe. cit., págs.
230 e segs.; GOMES CANOTllHO, op. cit., pág. 1.225.
26 Um caso paradigmático foi o da Constituição económica segundo o texto de 1976. V. o nosso estudo
"A interpretação da Constituição económica", in Estudos em homenagem ao Pro! Doutor Afonso Rodri-
gues Queiró, obra coletiva, I, Coimbra, 1984, págs. 281 e segs.
27 Cfr. KARlLARENZ, Metodologia ..., cit., pág. 517: ao Tribunal Constitucional incumbe uma responsabilida-
de política na manutenção da ordem jurídico-estatal e da sua capacidade de funcionamento; não pode
proceder segundo a máxima fiot justitia, pereat res publica.
28 V. Manual ..., I, cit., págs. 103 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
ou onde também e enxerga em muita eze anar dúvida acer a da ua verdadeira di-
men ão e colocação; não raro, reforça o alcance a atribuir a ele ou a qualquer da norma
jurídica , que o con tituam; não pode, porém, em qualquer ca o, contrariar um entido
indi cu ti elmente próprio do Direito po iti o de que e trata.29
29 "Notas para uma introdução ao Direito constitucional comparado", in O Direito, 1970, págs. 115-
116. Cfr., por exemplo, AlBRECHT WEBER, "La protección de la propriedade en derecho comparado", in
Civitas - Revista Espanola de Derecho Administrativo, pág. 490, 1991: só quando os outros parâmetros
constitucionais são comparáveis pode a comparação funcional funcionar como instrumento adicional
no trabalho de interpretação; ou MARIE-CLAIRE PONTHOREAU,Le recour à r "argument de droit compa-
ré" par le juge constitutionnelle, in L'interprétation constitutionnelle, obra coletiva, págs. 167 e segs.
30 GOMES CANOTllHO (na esteira de THOMA), Direito ..., cit., pág. 1.224.
31 Tenha-se presente o que escrevemos há pouco.
32 Ibidem, V, cit., págs. 57 e segs.
33 Cfr. supra a justificação.
34 Naturalmente, porém, do mesmo modo que seria absurdo interpretar a Constituição à luz da Constitui-
ção anterior, seria ilegítimo interpretá-Ia pensando numa Constituição futura almejada, com mais ou
menos subjetivismo.
35 A história do princípio da igualdade tem sido muitas vezes convocada para o demonstrar.
Cfr., quanto aos Estados Unidos, os autores citados no volume I deste Manual e, por exemplo, ainda
LAWRENCETRIBE e MICHAEl DURF (op. cit., págs. 147-148): a Declaração de Independência dizia que
todos os homens nasciam iguais; só que, por todos os homens, o Congresso Continental referia-se ape-
nas aos homens adequados, ou apenas aos homens livres ou apenas aos homens brancos, ou apenas
aos que pertencessem simultaneamente às três categorias; por uma questão de verdade histórica cada
um destes enunciados pode estar parcialmente correto, mas podemos argumentar, com DWORKIN e
Parte 111I Constituição _
outros, que, por detrás deles, estava e está o princípio da igualdade, a abstração da igualdade que se
tornaria a nossa legitimidade constitucional desde a Guerra Civil.
O que vale para a igualdade racial vale, como bem se sabe, para a igualdade de religiões ou para a
igualdade entre homem e mulher. Sem a interpretação evolutiva não seriam possíveis os progressos
alcançados, subsistindo a mesma ordem constitucional.
I - Tema próximo do da interpr tação con titucional embora dele di tinto, vem a
er o da interpretação da lei em face da on tituição ou, num s ntido muito amplo, da
interpretação conforme com a Con tituição - com a on tituição fonnal (abrangendo,
recorde- e, a Declaração Univer ai e o principio cooperativo).41
Trata- e, ante de mai , de conceder todo o rele o, dentro do elemento istemáti-
co da interpretação, à referência à Con tituição. om efeito cada nonna legal não tem
omente de er captada no conjunto da nonna da me ma lei e no conjunto da ordem
legi lati a' tem outro im de e con iderar no contexto da ordem con titucional; e i o
tanto mai quanto mais se tem dilatado a e fera de ação de ta como centro de energia
dinamizadora da demai normas da ordem jurídica po itiva.
O que e diz para a lei e para a demai fontes de Direito ordinário vale também
para a lei de re i ão con titucional ou emenda con titucionai ,em face do princípio
fundamentai da on tituição ertido ou não em cláu ula pétr a .
omente cabe fazer uma re ai a quanto à nonna de Direito internacional, de-
ignadamente de Direito internacional convencional por doi motivo: primo porque
o próprio Direito internacional formula cânone hennenêutico (os dos arts. 3 10 a 330
46 o problema tem sido suscitado noutros países, diante de disposições homólogas dos respetivos Có-
digos Civis: cfr., na Itália, FRANCOPIERANDREI,La Costituzione ..., cit., loc. cit., págs. 470 e segs.; P. M.
CHIERCHIA,op. cit., págs. 166 e segs.; AlESSANDROPIZZORUSSOL'interpretazione ..., cit., loe. cit., págs. 11
e segs.; e, na Espanha, ENRIQUEAlONSO GARCIA,op. cit., págs. 77 e segs.
47 Sobre o assunto, v., por exemplo, VOlKER HAAK, "Quelques aspects du contrôle de la constitutionnalité
des lois exercé par la Cour Constitutionnelle de la République Féderale d'Allemagne", in Revue interna-
tionale de droit comparé, 1961, págs. 78 e segs.; KARl ENGISCH,op. cit., págs. 120, 132, 134 e 135; JORGE
MIRANDA, Contributo ..., cit., págs. 246 e segs., máxime 250; GAETANOSllVESTRI,"Le sentenze normative
della Corte Costituzionale", in Giurisprudenza Costituzionale, 1981, págs. 1.684 e segs.; GARCIADE EN-
TERRIA,La Constitución ..., cit., págs. 95 e segs.; GOMES CANOTllHO, Constituição dirigente ..., cit., págs.
401 e segs., e Direito ..., cit., págs. 1.226 e 1.227; NUNO E SOUSA,A liberdade de imprensa, Coimbra,
1984, págs. 103 e segs.; KONRADHESSE,Escritos ..., cit., págs. 53 e segs.; DENIS BROUSSOllE, "Les lois
déclarées inopérantes par le juge constitutionnel", in Revue de droit public, 1985, págs. 763 e segs.;
PAULOBONAVIDES,Política e Constituição, cit., págs. 161 e segs.; PABlO LUCASVERDU, EI sentimiento
constitucional, cit., págs. 103 e segs.; MENEZESCORDEIRO,prefácio a CANARIS,Pensamento sistemótico ...,
cit., págs. CXI-CXII; VITAlINO CANAS,Introdução às Decisões de Provimento do Tribunal Constitucional, 2~
ed., Coimbra, 1994, págs. 81 e segs.; KARlLARENZ, Metodologia ..., cit., págs. 479 e segs.; RUI MEDEIROS,
A decisõo ..., cit., págs. 289 e segs.; EDUARDOFERNANDOApPIO, Interpretação conforme à Constitui-
ção, Curitiba, 2002; JOÃO ZENHA MARTINS, "Interpretação conforme com a Constituição", in Estudos
em homenagem ao Pro! Doutor Inocêncio Galvão Telles, obra coletiva, V, Coimbra, 2003, págs. 823 e
segs.; ANDRÉSALGADODE MATOS,A fiscalização administrativa da constitucionalidade, Coimbra, 2004,
págs. 188 e segs.; VIRGíLIOAFONSODASilVA, La interpretación conforme a la Constitución, in Questiones
constitucionales (Revista Mexicana de Derecho Constitucional), 2005, págs. 3 e segs.; CARLOSBLANCO
DE MORAIS,Justiça Constitucional, 11,Coimbra, 2005, págs. 326 e segs.; TÉRCIOSAMPAIOFERRAZJÚNIOR,
"Interpretação das normas constitucionais", in Bicentenário da Justiça Militar no Brasi/- Coletânea de
Estudos Jurídicos, obra coletiva, Brasília, 2008, págs. 447 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
ll- Além da aceção genérica acabada de indicar - se bem que com ba e nela - exi te
uma aceção e pecífica. ão é já uma regra de interpretação, ma um método de fi ca-
lização da con titucionalidade; e ju tifica- e em nome de um princípio de economia do
ord namento ou d máximo apro eitamento do ato jurídico , não duma pre unção de
con titucionalidade da norma.
A interpretação conforme com a Con tituição não con i te então tanto em e colher
ntre vário entido po ívei e normai de qualquer pr ceito o que ja mai conforme
com a Con tituição quanto em di cernir no limite - na fronteira da incon titucionalidade
- um entido que, mesmo quando não aparente ou não decorrente de outros elemento
de interpretação, eja o entido nece ário e o que e toma po íve! por irtude da força
conformadora da Lei Fundamental.49 E ão diver a a ia que, para tanto, e egu m
e di er o o re ultado a que e chega: d de a interpr tação e ten i a ou re triti a à
r dução (eliminando o elem nto incon titucionai do pr ceito ou do ato) e, porventura,
à conver ão (configurando o ato sob a ve te de outro tipo con titucional).
Da interpretação conforme com a on tituição em entido e trito di tingue- e aqui-
lo a que pode chamar- e interpretação integrativa da lei com a on tituição. Traduz- e
ta em interpr tar certa lei (com preceitos insuficiente e, ne sa medida, e entualm nte,
incon titucionai ) completando-a com preceito da Con tituição sobre e e objeto que
lhe são aplicáveis e porque diretamente aplicávei . Entra- e, aqui, na zona da deci õe
aditivas do tribunai con titucionai .
[lI - A interpretação conforme com a on tituição implica uma p ição ati a e qua
criadora do controlo con titucional e de relati a autonomia da entidade que a promo em
em face do órgão legi lati o. ão pode, no ntanto, dei ar de e tar ujeita a um requi-
ito de razoabilidade: implica um mínimo de ba e na letra da lei; e tem de e deter aí onde
o preceito legal, interpretado conforme com a on tituição, fique pri ado de função útil
ou onde, egundo o entendimento comum, seja inconte tável que o legi lador ordinário
acolheu critério e soluçõe opostos ao critério e oluçõe do legislador con tituinte.
onforme e lê em acórdão do Tribunal Con titucional portuguê , perante dua in-
terpretaçõe po ívei de uma norma legal - uma incompatí el com a on tituição e
48 Nesta linha, RUI MOURA RAMOS, A Convenção Europeia das Direitos da Homem, Lisboa, 1982, págs.
158 e segs.; e o nosso Cursa ..., cit., págs. 135-136. Cfr. GIUSEPPEBARILE,"La rilevazione dei parametro
di legittimità costituzionale delle norme di attuazione di um trattato emanate con legge ordinaria", in
Rivista di Diritto Internazionale, 1988, págs. 94 e segs.
49 Cfr. KONRAD HESSE(Escritos ..., cit., pág. 54): no domínio da interpretação conforme com a Constituição,
as normas constitucionais não são apenas normas - parâmetro; são também "normas de conteúdo" na
determinação do conteúdo das leis ordinárias.
Parte 111I Constituição _
outra que com ela se compatibiliza - o intérprete deve decidir- e por esta última. Questão
é que o teor verbal da norma interpretada con inta não apena o entido desconforme com
a Con tituição como também outro que a não contrarie. E esse sentido há-de captar- e no
conjunto do diploma legal a que pertence a norma interpretanda e ainda com referência
ao ordenamento jurídico global, ne te e incluindo, naturalmente, a Constituição a que há
que reconhecer uma grande capacidade irradiante.5o
Para fazer interpretação conforme a Constituição, o Tribunal Constitucional (ou o
upremo Tribunal Federal) tem de determinar quais as interpretações que invalidam a
norma e quai a que lhe garantem subsistência válida no ordenamento jurídico. Isto é,
declara, expre a ou implicitamente, algumas interpretações incon titucionai ou ilegais,
e outra não incon titucionais ou não ilegai .51
Não parece curial nem equer admissível que o Tribunal Constitucional proceda a
uma interpretação conforme a Con tituição que subverta, de forma clara e inequívoca, a
vontade pre um ida do legislador, aproveitando de uma norma tão s6 uma das suas partes
... quando, de acordo com aquela vontade presumida, e a me ma nonna é sub idiária de
outra que o Tribunal on titucional afinal rejeita.52
Para e proceder à interpretação de determinado preceito legal em conformidade
com a Con tituição não é razoável que o Tribunal Constitucional se baste com o fato de
e sa ser uma interpretação possível da norma em causa (possível no entido de ela caber
na letra do preceito). Nece sário é também que e te Tribunal pondere qual a interpretação
que desse preceito fazem, em geral, o tribunais, pois que, se e te adotarem em geral a in-
terpretação que se tem por incon titucional, o que então será mais curial é que o Tribunal
parta de a interpretação da norma (que a tome como um dado) e confirme ou revogue,
conforme os ca o , a de aplicação ou aplicação que dela fez a deci ão em recur 0,53-54
] - A lei con titucional não r gula tudo quanto dela d e r objeto. Ba ta pen ar no
co tume con titucional praeler legem, na expre a integração pela D claração Uni er ai
do Direitos do Homem (art. 16°, nO2, da Constituição portugue a) e na de olução para
a lei ordinária e para regra de Direito internacional da pr vi ão de direito fundamentai
afora o contemplado na onstituição (art. 16°, n° I, da on tituição portugue a, e art.
5° 2° e 3°, da Constituição bra ileira).
Ma nem equer lei con titucional, co tum con titucional, Declaração Uni er ai,
outra regra de Direito interno e de Direito internacional no eu conjunto e dotam de
plenitude de regulamentação. Não há uma plenitude da ordem con titucional, como não
há uma plenitude da ordem jurídica em geral. Há lacuna - intencionai e não intencionai ,
técnica e teleológica , originária e uperveniente - e há me mo ituaçãe extrajurídi-
ca (ou extracon titucionai ), por veze chamada lacuna ab oluta - corre pondente ,
no âmbito con titucional, a ituaçãe deixada à deci ão política ou à di cricionariedade
do legi lador ordinário. Não erão empre as me mas, poderão reduzir-se ou er tran-
itória e depender de circun tância em e olução ma parec mine itá ei .56 É o que
55 Sobre o problema suscitado por este preceito, v. Manual ..., VI, cit., págs. 73 e segs. e autores citados.
56 Cfr. SANTI ROMANO, "Osservazioni sulla completezza dell'ordinamento statale", in Scritti Minori,
I, págs. 371 e segs.; NORBERTOBOBBIO, Teoria..., cit., págs. 125 e segs.; MASSIMO CORSALE,"Lacune
dell'ordinamento", in Enciclopedia dei Diritto, XXIII, 1973, págs. 257 e segs.; CASTANHEIRANEVES,O
princípio da legalidade criminal, cit., págs. 132 e segs.; CLAUS-WILHELMCANARIS,op. cit., págs. 239 e
segs.; CARLOSFREDERICO MARÉSDESOUZAFILHO,"O Direito Constitucional e as lacunas da lei", in Revista
de Informação Legislativa, nQ 133, págs. 5 e segs., janeiro-março de 1997; OLIVEIRAASCENSÃO,op. cit.,
págs. 382 e segs. e 433 e segs.
Parte 111I Constituição _
Não con ideramos pertinentes tais dúvidas. O ser a Constituição formal um sistema
de norma di tinto dentro do i tema juridico global não confere a cada uma de a nor-
ma natureza excecional, com a forço a con equência de in u cetibilidade de analogia. E
certa norma, excecionai na per petiva global do ordenamento jurídico (como ucede
com a norma obre imunidade ), podem não o er, na per petiva e pecífica e meno
ampla do i tema con titucional.
Por i o mesmo a integração das lacunas de norma formalmente constitucionais
deve ser feita no interior da Constituição formal e à luz do valores da Constituição
material, sem recurso a normas de legi lação ordinária. E o critério de integração cons-
tantes do art. 10° do Código Civil português e do art. 4° da Lei de Introdução à norma
do Direito Bra ileiro aplicam- e pelas me ma razõe por que e aplicam o critério de
interpretação há pouco mencionado .
Em última análise, o reconhecimento da existência de lacunas serão tanto mais
quanto maior for a con ciência de que o procedimento político e acham ubmetido
ao Direito. Mas um bem melindro o papel cabe ao intérprete ao di cernir e qualificar,
ca o a ca o, as diferente ituações e ao propor soluçõe idóneas, tendo em conta a mu-
tável realidade constitucional.
S9 Cfr. a tese de JORGEPEREIRADA SILVA (op. cit., págs. 167 e segs.), segundo a qual a inércia do legislador
adquiriria a natureza, a função e os efeitos de uma norma negativa - uma norma implícita desenca-
deada pela conjugação de uma disposição constitucional não exequível atributiva de um direito funda-
mentai com a ausência de uma norma legal que lhe confira a exequibilidade necessária; e, recusando
então o tribunal da causa a aplicação dessa norma implícita, daí resultaria uma lacuna (análoga à que
resulta da não aplicação de uma norma expressa por inconstitucionalidade) - uma lacuna a integrar
pelo tribunal.
Aceitamos este entendimento no tocante às omissões parciais, violadoras do princípio da igualdade
e que podem ser ultrapassados por sentença aditiva. Não o aceitamos quanto às omissões totais e às
omissões absolutas e continuamos a ter sérias reservas quanto à utilização do art. 281º, nº 3, da Cons-
tituição para a passagem à fiscalização abstrata de inconstitucionalidade por omissão do art. 283º.
Parte 111 I Constituição _
§ 2º
A aplicação das normas constitucionais no tempo
60 Cfr. o art. 2932, nº 3, da Constituição portuguesa, prevendo, no texto original, um período de mais de um
ano para a adaptação das leis sobre direitos, liberdades e garantias às novas normas constitucionais; ou,
no Brasil, os arts. 4º, § 1º, in fine, 5º, 1Oº, 16º, 23º, 25º, 29º, 302, 34º, 35º, 36º, 37º, 38º, 52º, 88º.
61 Cfr., por todos, MARIA HELENA DINIZ, "Vigência e eficácia das normas constitucionais", in TÉRCIOSAM-
PAIO FERRAZ,MARIA HELENA DINIZ e RITINHA A. STEVENSONGEORGAKllOS, A Constituição de 1988 ..., cit.,
págs. 83 e segs.; CARMEN LÚCIA ANTUNES ROCHA, "O princípio do direito adquirido no Direito Constitu-
cional", in Revista de Informação Legislativa, nº 103, julho-setembro de 1989, págs. 147 e segs.; MIGUEL
GAlVÃO TELES,Temporalidade ..., cit., loc. cit., pág. 44.
62 Cfr. art. 12º do Código Civil português e art. 6º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
I - Antes de mais, uma on tituição nova re oga a on tituição ant rior. Por defini-
ção, não pode haver enão uma Con tituição - em entido material e em ntido formal;
em cada paí e em cada momento, ó pode pr valecer certa id ia de Direito; o poder
con tituinte ub titui a ordem con titucional criada a partir de anterior ato con tituinte
por uma diferente ordem con titucional.
E ta re ogação é uma revogação global ou de i tema,63 e não uma re ogação
tricto en u ou uma receção individualizada, norma a norma. ão cab indagar da com-
patibilidade ou não de qualquer norma con titucional anterior com a corre pondente nor-
ma con titucional nova ou com a nova onstituição no eu conjunto; ba ta a ua in erção
na anterior on tituição para que automaticamente - e pr a ou tacitam nte - fique ou
e entenda re ogada pela on tituição po terior.
O acontecimento re olucionário que na maior parte da e peri Ancia hi tórica ,
põem fim a um regime e abrem ou preparam outro regime podem obnubilar um pouco
e ta verificação. Todavia, na medida em que qualquer revolução e carrega de Direito,
Direito con titucional, deve dizer-se que, me mo aí, há revogação global: a on tituição
é revogada não tanto pela revolução quanto pelo Direito re olucionário.64
63 Sobre este conceito, v. CABRALDE MaNCADA, Lições de Direito Civil, 2! ed., Coimbra, 1954, págs. 105-
106, nota; e OLIVEIRAASCENSÃO,O Direito, cit., págs. 314-315.
64 O que se verifica então é não haver contiguidade entre a nova Constituição formal (definitiva) e a ante-
rior Constituição formal. Contiguidade só se verifica em caso de transição. Cfr. supro.
Parte 111I Constituição _
da norma que ão direta expre ão da nova ideia de Direito e que ficam endo o núcleo
da on tituição formal (em regra, ob a ve te da on tituição in trumental), perduram,
então, por re~ rência a ela ,outra normas constitucionais.
É o fenómeno da receção material atrá de crito.
v - Por último, certa norma con titucionai anteriore podem não deixar de i-
gorar com a entrada em vigor da nova Constituição; podem, simple mente, pa ar da
categoria de norma con titucionai a norma de direito ordinário. i to con i te a de -
con titucionalização.
A receção material e a de con titucionalização o tentam de comum uma tran mutação
intrín eca de preceito . Distinto ão o re ultados e, portanto, a qualidade: na primeira, ficam
endo ainda pr ceito con titucionai ó que a ente, doravante, em atos normativo que
reportam à no a on tituição; na egunda, nem i o, apena fica a ha er preceito legai .
A de con titucionalização (tal como a r ceção material) tem de er previ ta por uma
norma. ão pode e tribar- e em mera conceção teórica ou doutrinai; não é por certo pre-
ceito formalmente con titucionai não o erem materialmente ou p rtencerem a outro ramo
de Direito que ela erifica ou pod erificar- e - at' porqu , como di emo na altura
própria, toda a on tituição formal é on tituição material, qualquer preceito formalmente
con titucional é, de d logo, materialm nte con titucional. O que pode aventar- e é o objeto
da de con titucionalização: norma cujo entido de regulamentação e encontre edimenta-
do e eja independent de te ou daquele regime; norma con truti a ou técnica ; norma
ligada a uma exten ão do tratamento con titucional a matéria ante não abrangida e que
não e con erve na no a on tituição em que haja, depoi , lei ordinária obre ela .
Ma, e tem d ha er norma con titucional a e tabelecer a de con titucionalização,
não tem de er norma expre a ou norma con titucional formal' poderá tratar- e de nor-
ma de origem con uetudinária; erá, por exemplo, atravé de co tume que poderão er
explicado o vário ca o havido em França no éculo XIX, atenuando a in tabilidade
jurídico-política produzida por uce i a r oluçõe e on tituiçõe .65-66
65 Sobre a desconstitucionalização em França, cfr. A. ESMEIN, op. cit., I, págs. 580 e 581; J. BARTHÉLEMY e
P. DUEZ, op. cit., págs. 234-235; MARCEL WALlNE, Les conséquences juridiques ..., cit., loc. cit., pág. 200;
GEORGES BURDEAU, Traité ..., cit., IV, págs. 625 e segs.
66 Por outro lado, se aqui se trata de uma heterodescanstitucionalização, também pode haver hipóteses de
autadescanstitucianalização, como no art. 1442 da Carta Constituinte, a seu tempo examinado.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
I - Uma Con tituição nova não faz nunca tábua ra a do Direito ordinário anterior.
em sequer i so acontece aquando da fonnação originária do E tados67 ou na equência
de re oluçõe muito exten a e profunda, de revoluçõe "ilimitada", porque con tituir
ou recon tituir tudo de de a ba e eria e forço dema iado pe ado ou impo ível em curto
tempo e, entretanto, eria gra emente afetada a egurança jurídica. Há empre fatore de
continuidade - até na vida internacional6 - que obrele am o de de continuidade.
O que a uperveniência de uma on tituição pro oca é novação do Direito ordinário
interno anterior.69 Como toda e cada uma da norma - legi lativa , regulamentares e
outra - retiram a sua validade, direta ou indiretamente, da Con tituição,7° a mudança de
on tituição acarreta mudança de fundamento de validade: a norma, ainda que fonnal-
mente intocadas, ão novadas, no seu título ou na sua força jurídica, pela on tituição; e
istematicamente deixam de er a me ma .71
Há, a im, uma nítida diferença entre a ituação do Direito con titucional anterior
- o qual ce a com a entrada em vigor da nova Con tituição - e a do Direito ordinário
anterior - o qual continua, com novo fundamento da alidad e ujeito ao princípio
materiai da nova on tituição e que omente em ca o de contradição deixará de igorar.
E, enquanto a nonnas con titucionai que ub i tam ão recebida p la no a nonna
con titucionai , a nonna ordinária ão imple mente novada .72
A receção (a receção material, de que há pouco falámo ) equi ale à regulamentação
de certa matérias constitucionais não imediatamente pela nova onstituição, ma sim
por outra nonna; implica, de certa orte, uma autolimitação do poder con tituinte e, ao
me mo tempo, uma inserção de toda a nonna num i tema con titucional único. Já no
tocante ao Direito ordinário interno a on tituição não a ume, nem tem de a um ir a
regulamentação; a Con tituição tem apena d o penetrar, de o en 01 er do u alore
de o modular e, e nece ário, de o tran fonnar; e é ne ta medida que ele pode dizer- e
recriado ou novado.
73 Como têtes de chapitres (recordando PELlEGRINO ROSSI),os princípios constitucionais também mudam
e os que contam, em cada momento, são os atuais, e não os passados.
74 Contra este entendimento pronunciaram-se, porém, o Tribunal Constitucional português no acór-
dão n!! 408/89, de 31 de maio, in Diário da República, 2~ série, n!! 26, de 31 de janeiro de 1990, e RUI
MEDEIROS, "Valores jurídicos negativos da lei inconstitucional", in O Direito, 1989, págs. 522 e 523.
Segundo o Tribunal, uma revisão constitucional tanto pode ter efeitos negativos como efeitos positivos
sobre as normas infraconstitucionais anteriores, ainda que estes efeitos só valham para o futuro, não
para o passado (a revisão não convalida essas normas desde a sua origem, apenas as valida para o fu-
turo). Não se justifica continuar ad aeternum a considerar inconstitucionais normas que, tendo nascido
contrárias à Constituição, passam a ser com ela conformes.
De resto, pode a Lei Fundamental vir a incluir uma norma de teor exatamente idêntico ao da norma
legal, que era materialmente inconstitucional antes da revisão. Ora (disse ainda o Tribunal, criticando
a nossa opinião), a referida norma legal deveria continuar a ser considerada materialmente inconstitu-
cional, mesmo para o futuro, devendo, por isso, ser desaplicada pelos tribunais, os quais, todavia, em
vez dessa norma, seriam levados a aplicar diretamente a norma constitucional. O contrassenso estaria
à vista: não se pode considerar materialmente inconstitucional uma norma infraconstitucional de con-
teúdo idêntico a uma norma constitucional.
75 Uma postura intermédia - entre a que defendemos e a que sustentou o Tribunal Constitucional
- é a de MIGUEL GAlVÃO TELES,"Inconstitucionalidade pretérita", in Nos dez anos da Constituição, obra
coletiva, Lisboa, 1987, págs. 335 e 336. Em geral, não aceita a convalidação do ato nulo pelo termo
da vigência da norma constitucional desrespeitada, mas admite a possibilidade de uma específica in-
tenção convalidatória a apurar através de interpretação da vontade do legislador constitucional (que
poderá ter em vista "salvar" certas normas ordinárias, julgadas necessárias ou úteis).
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Relação e pecífica entre nonna constitucional nova e nomla ordinária velha que verse
obre a mesma matéria apenas se dá quando haja contradição. E aqui, im, não pode deixar de
e su citar incon titucionalidade superveniente como quando a Constituição acaba de na cer.
Continuação da nota 74
Também mais recentemente (no acórdão nº 246/2005, de 10 de maio, in Diário da República, 1~ série-
A, nº 117, de 21 de agosto de 2005), o Tribunal Constitucional defendeu a constitucionalização super-
veniente em caso de inconstitucionalidade material.
Quanto a RUI MEDEIROS, ele invoca a economia legislativa que aconselharia a convalidação da anulabi-
lidade com eficácia ex nunc e a circunstância de a fiscalização jurisdicional visar, unicamente, expurgar
do ordenamento os efeitos produzidos por normas inconstitucionais.
Mas tal significaria uma restrição dos efeitos de inconstitucionalidade para o futuro, sem base consti-
tucional, ao contrário do que sucede com a restrição do efeito para o passado, por razões de equidade,
segurança jurídica ou excecional interesse público (art. 282º, nº 4, da Constituição portuguesa, e art.
27º da Lei nº 9.868, de 10 de novembro de 1999. Nenhuma razão de pragmatismo ou de economia
legislativa pode prevalecer sobre as funções relativas da Constituição e da revisão constitucional ou
eliminar o risco de "revisões antecipadas" em fraude às normas constitucionais (cfr. GOMES CANOTlLHO
e VITAL MOREIRA, op. cit., 11, pág. 503).
Por outro lado, não há qualquer contrassenso na não aplicação para o futuro de uma norma legal de
conteúdo idêntico ao da nova norma constitucional (proveniente de revisão). Para que recorrer a ela,
precisamente, quando existe agora uma norma constitucional de conteúdo idêntico? Assim como para
trás (para antes da revisão) a norma legal não pode ser aplicada por contrariar a norma constitucional,
também para a frente (para o futuro) não precisa de ser aplicada, porque se aplica, desde logo, a norma
constitucional que, por coincidência, possui o mesmo sentido.
dado; e apenas os atos vão ser reportados ao novos tipos con titucionais, como diploma
equiparáveis,77 sujeitos, doravante, ao regime jurídicos que lhes couberem.78
De re to, me mo que as im não fos e, uma barreira in uperável se colocaria empre:
e tabelecer quai o órgão e quais os meio de fi calização da constitucionalidade à luz
da Con tituição anterior. Não podendo er o órgão e os meios de tinado a garantir a
Constituição atual, nenhuma forma haveria, na prática, de levar a cabo tal fiscalização.79
TV - Qu dizer de ta po ição?
Tudo e tá no ignificado a atribuir à atendibilidade do Direito con titucional e ordi-
nário anterior. Envolve tal atendibilidade que po a hoje se proceder perante um e outro
como e e e tive e perante o Direito atual? Parece-no claro que não. A vigência do
Direito anterior como vigência jurídica é um pres uposto da sua eventual ub i tência em
92 Muito mais longe vai RUI MEDEIROS(op. cit., loco cit., págs. 520 e 521), para quem se trataria também
de leis nulas e ineficazes.
93 V. já Manual ..., 11,2! ed., pág. 247, e RUI MEDEIROS,op. cit., loco cit., pág. 519.
Cfr. também o acórdão n!! 261/86 do Tribunal Constitucional, cit., loco cit., pág. 11.030: não se afigura
crível que haja estado nas intenções do legislador constituinte inconstitucionalizar a posteriori, por
motivos ligados exclusivamente à "forma" como foram estabelecidas, quaisquer figuras tributárias; não
é isso crível, atenta a sua preocupação de salvaguardar basicamente a continuidade do ordenamento
jurídico e atenta, em particular, a imprevisibilidade das consequências de tal solução, dados os seus
imediatos reflexos financeiros.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
11- O fenómeno da incon titucionalidade urge por cau a da contradição entre nor-
ma legai e regra e princípio con titucionai e, em face de cada situação ou ato, é fun-
ção do juízo de valor que e faça com ba e no comandos constitucionai vigente. Para
cada Con tituição um juízo de incon titucionalidade; e, para vária e uce iva época,
vário e uce sivo juízo. ão cabe pois, apelar para um critério de ordem cronológica
(/ex po terior ... ) com autonomia em relação a um critério dito hierárquico (lex supe-
rior ... ). É a própria função genética ou con tituti a do ordenamento jurídico que po ui a
on tituição que o e clui,já que a ua relação com a lei ordinária não pode er assimilada
à relação entre dua lei ordinária .
96 o tema foi especialmente estudado na Itália, na Alemanha, na Espanha e no Brasil, quando da entrada
em vigor das Constituições de 1947, 1949, 1978 e 1988. Na Itália, prevaleceu a doutrina enunciada pelo
próprio Tribunal em 1956, declarando-se competente para conhecer do Direito anterior; já na Alema-
nha foi oposta a jurisprudência; na Espanha adotou-se uma posição mista, de competência simultânea
do Tribunal Constitucional e dos demais tribunais; e no Brasil tem prevalecido a tese de revogação.
Sobre a discussão na doutrina italiana, v. PAOLOBARILE, La Costituzione..., cit., págs. 61 e segs.; CARLO
ESPOSITO,"leggi vecchi e Costituzione nuova", in Costituzione Italiana, págs. 283 e segs.; COSTANTINO
MORTATI, Abrogazione legislativa ..., cit., loc. cit., 11,págs. 45 e segs.; GIUSEPPEMUSACCHIA, "Gerarchia
e teoria delle norme sulla produzione giuridica nel sistema constituzionale delle fonti", in Rivista Tri-
mestrale di Diritto Pubblico, págs. 612 e segs., 1970; FRANCOPIERANDREI,Corte Costituzionale, cit., loc.
cit., págs. 908 e segs.; FRANCOMODUGNO, op. cit., I, págs. 14 e segs.; FELlCEDELFINO, La dichiarazione
di iIIegititimità costituzionale delle leggi, Nápoles, 1970, págs. 31 e segs. Na Espanha, por exemplo,
MANUEL ARAGÓN, "la sentencia dei Tribunal Constitucional sobre leys relativas ai regime local anterior
a la Constitución", in Revista Espanola de Derecho Constitucional, págs. 185 e segs., 1981. Na França,
JÉRÔMETREMEAU, "la caducité - les lois incompatibles avec la Constitution", in Annuoire International
de Justice Constitutionnel, 1990, págs. 219 e segs.; MICHEL JOEL, "les téchniques de substitution", in La
Cour de Cassation et le controle de la constitutionnalité, obra coletiva, Aix-en-Provence, 1995, pág. 71;
CHARLES-ÉDOUARDSÉNAC, "le constat juridictionnel de I'abrogation implicite d'une loi par la Constitu-
tion", in Revue du droit public, 2008, págs. 1.081 e segs. No Brasil, MARCELONEVES, Teoria..., cit., pág.
96; lUIs ROBERTOBARROSO,Interpretação e aplicação..., cit., págs. 64 e segs.; JosÉ AFONSO DA SILVA, op.
cit., págs. 216 e segs.; ANDRÉ RAMOSTAVARES,op. cit., págs. 160 e segs.
Já KELSEN(em "la garantie juridictionnelle de la Constitution", in Revuedu droit public, pág. 236, 1928)
se pronunciava pela inconstitucionalidade superveniente, e não pela revogação.
97 Cfr., diversamente, ANTONIO NADAIS, As relações entre atos legislativos dos órgãos de soberania, lis-
boa, 1984, págs. 18 e segs. (em favor de tese da revogação); GOMES CANOTILHO, Direito ..., cit., pág.
1.290 (falando em concurso de revogação e nulidade).
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
98 Afora os atos normativos, também poderão pôr-se questões de ilegalidade superveniente (reconduzí-
veis ou não a invalidade) tanto em relação a atos administrativos como em relação a atos jurídicos civis.
Cfr., sobre aqueles, ROGÉRIOSOARES,Interesse Público, Legalidade e Mérito, cit., págs. 381 e segs. e 393
e segs., e autores citados.
99 Sobre o conceito de revogação, em especial da lei, v., por todos, CARLOESPOSITO,La Validità delle Leggi,
cit., págs. 63 e segs.; SALVATOREPUGLlATII, "Abrogazione", in Enciclopedia dei Diritto, I, págs. 1.411 e
segs.; FRANCOMODUGNO, "Problemi e pseudo-problemi relativi alie c. d. revivescenza di disposizioni
abrogate da legge dichiarata inconstituzionale", in Studi in memoria di Carlo Esposito, obra coletiva,
Pádua, 1972, págs. 647 e segs.; JORGEMIRANDA, Decreto, cit., págs. 87 e segs.; CARLOSBLANCODE Mo-
RAIS,As leis reforçadas, Coimbra, 1998, págs. 329 e segs.; MIGUEL GALVÃOTELES,Temporalidade ..., cit.,
loc. cit., págs. 32 e segs.
100 Cfr., sobre o problema homólogo, mas não análogo, da relação entre lei nova e regulamento velho (não
análogo, porque entre lei e Constituição não há o nexo de acessoriedade que existe entre regulamento
e lei), Decreto, cit., págs. 89-90. Não mantemos hoje a totalidade das opiniões aí expostas.
Parte 111I Constituição _
çõe normativa e a me ma matéria pode pedir uma disciplina paralela em vário nívei ,
de ignadamente em ní el de Con tituição e em ní el de lei ordinária.lol
E ta conclu ão ale, inclu ive, para o ca o, porventura meno corrente, de lei anterior
contrária à norma con titucional programática - no molde mitigado há pouco expo to
- em que toma, aliá, mai fri ante qu e trata de caducidade e não de re ogação. Poi
a norma con titucional programática é norma jurídica como qualquer outra' e o eu entido
normati o corre pondente a princípio e alore da ordem constitucional, tem de pre alecer
obre o entido preceti o de qualquer norma legal feita depoi dela ou inda do pa ado.
101 Que haja Constituições que declaram revogar leis anteriores - como a belga (art. 1382), a luxem-
burguesa (art. 1172) ou a espanhola (disposição revogatória, § 32) - é relativamente indiferente. De
resto, em caducidade falava o art. 2932, n2 2, de 1976. Sobre a disposição espanhola, cfr. GARCIA DE
ENTERRIA,La Canstitución ..., cit., págs. 83 e segs.
102 Em contrapartida, uma disposição que, especificamente, venha revogar uma disposição revogatória
acarreta como efeito natural o efeito repristinatório; e já se tem afirmado que a lei revogatória de pre-
cedente lei revogatória assume per relationem o conteúdo da norma legal primeiramente revogada.
Sobre a repristinação (arts. 72, n2 4, e 2.3142, n2 2, do Código Civil), v., na doutrina portuguesa, CUNHA
GONÇALVES,Tratado de Direito Civil, Coimbra, 1929, I, págs. 156-157; JosÉ ALBERTODOS REIS, "Com-
petência internacional. ..", in Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 762, pág. 242; MANUEL DE
ANDRADE, "Fontes de Direito. Vigência, interpretação e aplicação das leis", in Boletim do Ministério da
Justiça, n2 102, pág. 149; JosÉ H. SARAIVA,Apostilha crítica aa projeto de Código Civil, Lisboa, 1966, pág.
71; PIRESDE LIMA e ANTUNES VARELA,Código Civil Anotada, I, Coimbra, 1967, pág. 44; MIGUEL GALVÃO
TELES,Eficácia ..., cit., págs. 165 e 196, nota; ALEXANDRESOUSA PINHEIRO, "Repristinação", in Dicionário
Jurídico da Administração Pública, VII, págs. 234 e segs.; RUI MEDEIROS, A decisão ..., cit., págs. 651 e
segs.; OLIVEIRAASCENSÃO,op. cit., pág. 299.
103 Diferentemente, no sentido de a inconstitucionalidade superveniente envolver também repristinação,
MARCELOREBELODE SOUSA, O valor ..., cit., pág. 190, nota; e pondo a dúvida sobre se, em caso de re-
vogação tácita por incompatibilidade, não poderia haver repristinação, por faltar identificação precisa
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Por outro lado e o re tituir a plena ação o antigo prec ito não p deria le ar a de -
truir ou modificar o cunho imprimido pela lei intermédia d gradada em incon titucional,
ria tranho ubmeter automaticamente fato e relaçõ a con tituir no futuro a uma lei
mai velha do que aquela a que ficariam ubmetido o anteriore já con umado ; não ó
e a lei, pre umivelmente, teria deixado de corre ponder à evolução ocial como ainda a
ua reaplicação poderia provocar, no limite, perigo a de igualdad
li-A sim:
a) A entrada em igor de uma nova on tituição não determina, nem deixa de de-
terminar no ação da norma intemacionai inculati a do E tado;
b) Em ca o de incon titucionalidade originária de norma con encional, a modifi-
cação da norma con titucional corre pondente, implicando a não de conformi-
dade, repõe aquela plenamente em igor ( em que po a falar- e em con titucio-
nalização superveniente);
c) Em ca o de inconstitucionalidade superveniente, nem equer e produz a ineficácia
de norma convencional, com a con equente não aplicação,l06 i to que tal ofende-
ria o princípio - e princípio dejus cogen - da boa-fé na relaçõe intemacionai .
e direta do objeto revogado, tudo dependendo então da atividade hermenêutica, RUI MEDEIROS, A
decisão ..., cit., págs. 659-660.
oE tado deverá, im, procurar renegociar o tratado ou acordo ou, se tal for possível,
denunciá-lo ou exercer o rece o. Não lhe é con entido de vincular- e unilateralmente.
I - Até agora temo falado em normas de Direito ordinário anterior ou em atos nor-
mativos. E que dizer de atos não normativos e, doutra banda, de ato jurídico-público
vi to do ângulo da sua forma ou da sua formação?
Tempu regi! actum.109 Nem poderia deixar de er es e o princípio também aqui, até
porque o contrário - ou seja, admitir que a modificação de regra de competência ou de
forma pude e afetar a con titucionalidade de ato praticado ante - redundaria em criar
problemas, não de inconstitucionalidade superveniente, ma de incon titucionalidade re-
troativa, das mais graves con equências para o funcionamento da in tituiçõe e para a
egurança jurídica gera\.1 10
lico nas escolas públicas, não foi chamado a sindicar as normas da Concordata de 1940, mas sim as do
Decreto-Lei nº 323/83, de OS de julho.
109 V. o princípio geral do art. 12º, nº 2, do Código Civil, e na doutrina, por exemplo, FRANCOPIERANDREI,
Corte Costituzionale, cit., loc. cit., X, pág. 908; ou ARMANDO MARQUESGUEDES,op. cit., págs. 355 e segs.
110 Cfr., por exemplo, parecer nº 8/77 da Comissão Constitucional, de 03 de março, in Pareceres, I, pág.
150; ou acórdão nº 447/91 do Tribunal Constitucional, de 28 de novembro, in Diário da República, 1ª
série-A, nº 3, de 11 de janeiro de 1992.
111 Assim, acórdão nº 344/92 do Tribunal Constitucional portuguesa, de 28 de outubro, in Diário da Repú-
blica, 2ª série, nº 63, de 16 de março de 1993.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
con titucional e, e não forem conforme com ela, o ato complexo final não
poderá er con iderado válido;
e) Em e p cial, quanto à con titucionalidade orgânica de ato legi lati o , e ta
de e er apreciada, não no momento em que e tornam obrigatória a norma
para o cidadão - o da publicação, tão ó requi ito de eficácia - e, im, no mo-
mento ou no momento em que intervêm ou ão chamado a intervir o órgão
com poderes relati amente à di er a fa e do re peti o pr cedimento ; 112
.f) e nada obriga nada também imped que o órgão comp tente egundo a
on tituição publiquem (ou promulguem e publiquem) ato pendente de publi-
cação (ou de promulgação e publicação) ao tempo da entrada em igor daqu la.
De dua uma: ou o con ideram conform com a norma da on tituição (e
com o intere e do paí ) e publicam-no; ou não o con ideram confornle e,
então, exercendo um erdadeiro veto ab oluto, não os publicam.l\)
§ 3º
A aplicação das normas constitucionais no espaço
112 Cfr., quanto aos decretos-leis feitos no uso de autorização legislativa, Manual ..., V, cit., págs. 318 e 319.
113 A Revolução de 25 de abril ..., cit., pág. 31.
114 Cfr., para uma visão geral, AFONSO O'OLlVEIRA MARTINS, "As Constituições e os seus espaços de relevân-
cia jurídica", in Homenagem ao Pro! Doutor André Gonçalves Pereira, obra coletiva, Coimbra, 2006,
págs. 201 e segs.
Parte 111I Constituição _
115 Recorde-se a obra fundamental de SANTI ROMANO, L'Ordinamento Giuridico, 2~ ed., Florença, 1951. Cfr.,
mais recentemente, por todos, FRANCOMODUGNO, "Pluralità degli ordinamenti", in Enciclopedia dei
Diritto, XXXIV,págs. 1 e segs.; Manual..., 111,cit., págs. 239 e segs.; MARQUES DOSSANTOS,"A aplicação
do Direito estrangeiro", in Revista da Ordem dos Advogados, págs. 647 e segs., 2000; A. SANTOSJUSTO,
Introdução ao Estudo do Direito, 2~ ed., Coimbra, 2003, págs. 385 e segs.; OLIVEIRAASCENSÃO,op. cit.,
págs. 571 e segs.
116 Cfr. supra.
117 Cfr. um caso no acórdão nQ 90/2003, do Tribunal Constitucional português, de 14 de fevereiro (in Diário
da República, 2~ série, nQ 73, de 27 de março de 2003), que, todavia, não chegou a conhecer da incons-
titucionalidade.
118 Cfr. TITO BALLARINO,Costituzione e Diritto Internazionale Priva to, Pádua, 1974; JoÃo BAPTISTAMACHADO,
Liçães de Direito Internacional Privada, Coimbra, 1974, pág. 244; RUI MOURA RAMOS, Direito Internacio-
nal Privada e Constituição, Coimbra, 1979; "O Tribunal Constitucional português e as normas de outros
ordenamentos jurídicos", in Estudos em memária do Conselheiro Luís Nunes de Almeida, obra coletiva,
Coimbra, 2007, págs. 781 e segs.; FERRERCORREIA, Discurso proferido em 18 de janeiro de 1979, in
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Por um lado, o Direito internacional privado do no o dia aparece como proj ção
do princípio fundamentai do corpu do Direito ci il;119e tá in adido por valoraçõ
materiai e aparece em muito etore m mo como um puro Direito material e oltado
também para a tarefa de modelação da ociedade ci il, em que o tado contemporâ-
neo compromete o eu ordenam nto jurídico.120 Por outro lado (ou ainda que a im não
fo ), há uma recíproca implicação i temática que e impõe: a r gra materiai têm d
er empre mediatizada pela regra d conflito, ma e ta têm de er int grada com a
regra materiai para que remetem.
Boletim do Ministério do Justiça, nº 283, págs. 17 e segs., e "A Revisão do Código Civil e o Direito Inter-
nacional Privado", in Estudos Vários de Direito, Coimbra, 1982, págs. 279 e segs.; JOSEESPINARVICENTE,
"Constitución, desarollo legislativo y Derecho Internacional Privado", in Revista Espanola de Derecho
Internacional, págs. 109 e segs., 1986; GIUSEPPEBARllE, Costituzione e Rinvio Mobile a Diritto Stranie-
ro, Diritto Canonico, Diritto Comunitario, Diritto Internazionale, Pádua, 1987; MARIA ERSILACORRAO,
"11giudizio sulla legittimità costituzionale delle norme di conflitto", in Rivista di Diritto Internazionale,
págs. 303 e segs., 1988; Norme de conflitto italiane e controllo di costituzionalità, obra coletiva editada
por BRUNO BAREl e BENEDETIO COSTANTINO,Pádua, 1990; LUIs ROBERTOBARROSO,Interpretação ..., cit.,
págs. 32 e segs.; MARQUES DOS SANTOS, "Constituição e Direito Internacional Privado", in Perspetivas
Constitucionois, obra coletiva, 111,págs. 367 e segs.; HelENA MaTA, "A aplicação no tempo da regra de
conflitos sobre o regime de bens e o controlo da sua (in)constitucionalidade", in Estudos em memária
do Professor Doutor Antánio Marques dos Santos, obra coletiva, I, Coimbra, 2005, págs. 239 e segs.
123 Assim, JoÃo BAPTISTAMACHADO (Lições..., cit., pág. 244) para quem a inconstitucionalidade não deverá
em regra ser declarada senão quando os tribunais ou um setor bem representativo da doutrina do
respetivo país estrangeiro se tenham pronunciado nesse sentido.
Cfr., igualmente, em resposta afirmativa, GAETANOMORELLI, "Controllo di costituzionalità di norme stra-
niere", in Rivista italiana per le scienze giuridiche, págs. 27 e segs., 1954; RODOLFODE NOVA, "Legge
straniera e controllo di costituzionalità", in Scritti di Diritto Internazionale Privato, 1977, págs. 427 e
segs.; LENIO LUIz STRECK,ap. cit., pág. 560.
PARTE IV
ATIVIDADE CONSTITUCIONAL DO ESTADO
Capítulo I
FUNÇÕES DO ESTADO
1 V., entre tantos, JUSTINODE FREITAS,Ensaio sobre as Instituições de Direito Administrativo Português,
Coimbra, 1859, págs. 51 e segs., 65 e 69 e segs.; C. F.VON GERBER,Grundzüge des deutschen Staatsre-
cht (1880), trad. italiana Diritto Pubblico, Milão, 1971, págs. 118 e segs.; MANUEL EMIDIO GARCIA,Plano
desenvolvido de um curso de Ciência Política e Direito Político, 3~ ed., Lisboa, 1885, págs. 33 e segs.; GE-
ORGJELLlNEK,AlIgemeine Staatslehre, trad. castelhana Teoria General dei Estado, Buenos Aires, 1954,
págs. 450 e segs.; ROCHASARAIVA,Construção Jurídica do Estado, 11, Coimbra, 1912, págs. 45 e segs.;
RAÚLCARMO, Distinção das funções do Estado, Coimbra, 1914; CARRÉDE MALBERG, Contribution à la
Théorie Générale de I'ttat, I, Paris, 1920, págs. 259 e segs.; LÉONDUGUIT,Traité de Droit Constitutionnel,
3~ ed., 11, Paris, 1928, págs. 151 e segs.; HANS KELSEN,AlIgemeine Staatslehre, trad. castelhana Teoria
General dei Estado, Madrid, 1934, págs. 300 e segs., e li primato dei Parlamento, trad., Milão, 1982,
págs. 79 e segs.; GEORGESBURDEAU,Remarques sur la classification des fonctions étatiques, in Revue
du droit public, 1945, págs. 202 e segs.; QUEIROZLIMA, Teoria do Estado, 8~ ed., Rio de Janeiro, 1957,
págs. 297 e segs.; KARLLOEWENSTEIN,Verfassungsrecht, trad. castelhana Teoria de la Constitución, Bar-
celona, 1964, págs. 62 e segs.; FRANCOMODUGNO, Funzione, in Enciclopedia dei Diritto, XVIII, 1969,
págs. 301 e segs.; FRANCOBASSI,Contributo alio studio delle funzioni dello Stato, Milão, 1969; M. C. J.
VILE, Constitution and the Separation of Powers, Oxónia, 1969, págs. 326 e segs.; COSTANTlNOMORTATI,
Istituzioni di Diritto Pubblico, 9~ ed., I, Pádua, 1975, págs. 295 e segs.; AFONSOQUEIRÓ,Lições de Direito
Administrativo, policopiadas, Coimbra, 1976, págs. 9 e segs.; MARCELLOCAETANO,Direito Constitucio-
nal, Rio de Janeiro, 1977, I, págs. 187 e segs.; ANTONIO RUGGERI,Gerarchia, competenza e qualità nel
sistema costituzionale delle fonti normative, Milão, 1977, págs. 16 e segs. e 61 e segs.; MARCELOREBELO
DE SOUSA, Direito Constitucional, Braga, 1979, págs. 235 e segs., e Lições de Direito Administrativo,
Lisboa, 1999, págs. 9 e segs.; MÁRIO ESTEVESDEOLIVEIRA,Direito Administrativo, I, Lisboa, 1980, págs.
10 e segs.; CASTANHEIRANEVES,O instituto dos "assentos" e a funçõo jurídica dos Supremos Tribunais,
Coimbra, 1983, págs. 315 e segs., 429 e segs. e 475 e segs.; JosÉ ALFREDOOLIVEIRABARACHO,Processo
Constitucianal, Rio de Janeiro, 1984, págs. 26 e segs. e 61 e segs.; FELlCIANOBENVENUTI,Semantica di
funzione, in Jus, 1985, págs. 3 e segs.; CELSOBASTOS,Curso de Direito Constitucional, 10~ ed., S. Paulo,
1988, págs. 135 e segs.; ANTÓNIO BARBOSADE MELO, Sobre o problema da competência para assentar,
policopiado, Coimbra, 1988, págs. 18 e segs.; NUNO PIÇARRA,A separaçõo de poderes camo doutrina e
princípio constitucional, Coimbra, 1989, máxime págs. 247 e segs.; PAULOFERREIRADACUNHA, Pensar o
Direito - Do realismo clóssico à análise mítica, Coimbra, 1990, págs. 238 e segs.; IRISDE PINTOTAVARES,
O conceito de funçãa e de órgão de exercício do poder, in Revista Brasileira de Estudos Políticos, Julho
de 1995, págs. 77 e segs.; Lufs PEREIRACOUTINHO,As duas subtrações. Esboço de uma reconstruçõo da
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
II- uma noutra aceçõe , exibe- e um elemento finalí tic : diretamente, na fun-
ção como tarefa; indiretamente, na função como ati idad .3
Atar fa mai não é qu um fim do E tado concretizado em certa época hi tórica, em
certa ituação político-con titucional, m certo r gime ou on tituição mat rial. Por eu
turno, a função enquanto ati idade (a de cobrir por ia de uma análi e e petral da obra
do E tado, do eu órgão ,agente e erviço) não em a er não um meio para atingir
e se fim, qualificado ob certo a peto; e, e a tarefa implica a ad trição de um comporta-
mento (po iti o e, em certos caso, n gati o), tão pouco a atividade exi te por i me ma.
III - Enunciam- corr ntemente como funçõe do E tado a legi lati a, a go ernati-
a, a juri dicional, a admini trati a e ainda a técnica.7 Importa, porém, di tinguir.
O stado tem ou tende a ter o monopólio da trê primeira e ó com eu con enti-
mento ou por ua delegação outra coletividade ou entidade dão corpo a atos cuja natu-
reza e reconduza a uma ou outra de a funções. Ao invé , no que concerne à função ad-
mini trati a e à chamada função técnica, o E tado não é enão um (embora, ainda hoje, o
de maior pe o e olume) do ujeito que a podem promo er. Ao lado do E tado, outra
IV - A Con tituição brasileira mantém a con ideração clá ica dos três podere do
Estado -legislativo, executivo e judiciário (arts. 44° e segs., 76° e eg . e 92° e segs.) - e
ó incidentalmente alude à função (a função juri dicional, no art. 127°).
Diferentemente, a Con tituição portugue a define e ta função (art. 202°); e falando
em competência política elegi lativas (arts. 161° e 197° e 198°), bem como em compe-
tência admini trativa (art. 199°), pressupõe as correspondentes funçõe .
8 Não por acaso fala-se cada vez mais, por exemplo, em Justiça Internacional, em Direito Administrativo
Glabal e em Direito Administrativo Europeu.
9 Cfr., por último, na doutrina portuguesa, PAULO OTERO, op. cit., págs. 24 e segs.; e o nosso Manual ..., 111,
6! ed., Coimbra, 2010, págs. 386 e segs. e autores citados.
10 Op. cit., págs. 461 e segs.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
IV - Para Kel en, porque o E tado e identifica com a ordem jurídica ou com a ua
unidade, a funçõe do E tado ão apena funçõe jurídica a função corr ponde a cada
um do grau ou modo de realização da ordem jurídica.
Há doi tipo de i tema de norma, o e tático e o dinâmico. 13 A ord m jurídica
tem e encialmente um caráter dinâmico: uma norma jurídica não vale porque tem um
determinado conteúdo, quer dizer, porque o eu conteúdo pode er deduzido pela via de
um raciocínio lógico de uma norma fundamental pre upo ta, ma porque é criada por
uma forma determinada.'4 A norma fundamental da ordem jurídica é a in tauração do
fato fundamental da criação jurídica e pode er de ignada como on tituição no entido
lógico-jurídico para a di tinguir da Con tituição em entido jurídico-po itivo. Ela é o
ponto de partida de um proce o: do proce o de criação do Direito po iti 0.15
aplicação do Direito é imultaneamente produção do Direito. É de acertado di -
tinguir ntre ato d criação ato de aplicação do Direito. om efeito, e deixarmo
de lado o ca o -limite - a pre uposição da norma fundamental e a execução do ato
coerci o - entre o quai de envolve o proce o jurídico, todo o ato jurídico é simulta-
neamente aplicação de uma norma uperior e produção, regulada por e ta norma, de uma
norma inferior. e considerarmo a ordem jurídica estatal sem ter em conta um direito
internacional que lhe e teja upraordenado, então a norma fundamental determina, de
fato, a criação da on tituição, em que ela própria eja, ao me mo tempo, aplicação de
uma norma uperior. Ma a criação da on tituição realiza- e por aplicação da norma
fundamental. Por aplicação da on tituição, opera- e a criação da norma jurídica ge-
rai atra é da I gi lação e do co tume; e em aplicação de ta norma gerai, realiza-
a criação da norma indi iduai atra é da deci ões judiciais e da re oluçõe admini -
trati a. omente a e ecução do ato coerci o e tatuído por e ta norma indi iduai - o
último ato do proce o de produção jurídica - e opera em aplicação da norma indi i-
duai que a determinam em que eja, ela própria, criação de uma norma.16
riação e aplicação do Direito devem er di tinguida da ob ervância do Direito. üb-
ervância do Direito é a conduta que corre ponde, como conduta opo ta, àquela a que o ato
co rcitivo da anção é ligado. É ante de tudo a conduta qu evita a anção o cumprimento
CRITÉRIOS
FUNÇÕES CRITÉRIOS FORMAIS CRITÉRIOS ORGÂNICOS
MATERIAIS
Liberdade ou discricionarieda-
de máxima, o que não significa
Definição primária - Órgãos (políticos ou governa-
Função não subordinação a regras jurí-
e global do interes- tivos) e colégios em conexão
política dicas (às da Constituição, antes
se público; inter- direta com a forma e o sistema
(legislativa e de mais); liberdade de escolha,
pretação dos fins de governo
governativa senão quanto ao conteúdo,
do Estado e escolha - Havendo pluralidade de ór-
ou política pelo menos quanto ao tempo
dos meios adequa- gãos, ausência de hierarquia e
stricto e às circunstâncias, ou não
dos para os atingir; apenas relações de responsabi-
sensu) havendo esta (v.g., promulga-
direção do Estado lidade política
ção obrigatória), ausência de
sanções jurídicas específicas
28 Imparcialidade significa que a Administração, porque prossegue o interesse público, não apoia, não
favorece, não auxilia nenhum interesse particular, assim como não tem de se lhe opor por razões di-
versas do bem comum (Manual ..., IV, cit., págs. 262-263, e Autores citados). Cfr. MARIA TERESADE MElO
RIBEIRO,O princípio da imparcialidade da Administração Pública, Coimbra, 1996.
29 V. a síntese dada no acórdão nQ 33/96 do Tribunal Constitucional, de 17 de janeiro, in Diário da Repú-
blica, 2ª série, de 2 de maio de 1996: tribunal é o órgão de que é titular um juiz ou um colégio de juízes
que, a requerimento de pessoa singular ou coletiva, através de um procedimento imparcial e indepen-
dente, decide, com força obrigatória para os interessados, os fatos integradores dos respetivos direitos
e obrigações, ou que fundamentam a acusação penal, aplicando-lhes o direito pertinente.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
Ill- À funçõe corre pondem o eguinte grandes tipo de ato do Etado de ato
jurídico-público :
Atos de conteúdo
não normativo j administrativos, outros atos da Administração
Bilaterais (convencionais)
vos (ou, mais amplamente,
- Contratos
contratos
administrati-
públicos)
30 Também é possível inserir aqui convénios ou protocolos entre entidades administrativas, pois tudo
corre ainda no interior da Administração.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Em e trito plano doutrinal- porque, como e mo trará na altura própria, outra pode
er a per peti a funcional ou ju po itiva - parece pre alecer a tendência no entido de
norma ignificar regra, critério, pre crição (como e qu ira) com caraterí ticas de gene-
ralidade e, na maior parte das vezes, de abstração. No entanto, múltiplas são a divergên-
cia ,reai ou aparente, acerca do que ejam e a caraterí tica .31
Generalidade qui ale a pluralidade de de tinatário ? A pluralidade indefinida? A
indeterminação ou a ind terminabilidade? A m ra não indi idualização? Refer - e a
uma categoria de p oa? on iste, afinal, em ab tração? E, por u turno, reconduz- e
ab tração a indeterminação de fato ou de situaçõe a regular? Ou a tipicidad ,ou a hipo-
teticidade, ou a futurabilidade, etc.?
ão cabe no e copo do pre ente livro a análi e de tão intrincada problemática, mai
do foro da Teoria Geral do Direito do que do Direito con titucional. Torna- indi p n á-
el ap ar di so, aduzir uma opinião, definir um entendimento qu irva de pre upo to
de ub equente con ideraçõe .
Ora, também para nó ,ato normati o é, em princípio, ato de conteúdo geral, b m
que a gen ralidade não eja dele exclu iva e e depare, outro im, no ato admini trati o
gera(32e, porventura até em certos ato político ou de governo.
3S Estamos raciocinando no âmbito dos atos do Estado. A norma de origem consuetudinária justificaria
outras reflexões.
36 Cfr. ANT6NIO BARBOSADE MELO, op. cit., págs. 28 e segs.
37 Sobre estes conceitos, v. Manual ..., 111,cit., págs. 277 e 330 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Recentemente, Jaime Valle u tentou que a direção política do tado não pod ria
er reconduzida a uma função autónoma e que de eria er entendida, ante , como uma
atividade incorporada no exercício das demai funçõe do tado, aI o ajuri dicional. A
individualização dos fins caberia tendencialmente à competência de ignada pela on-
tituição como política elegi lativa e a individualização do meio eria a egurada por,
al'm daquela, pela competência admini trativa, ma nem empre uccderia a im.43
É opinião a rejeitar. Que em qualquer função do E tado haja e colha a fazer - de de
o regulamento independente até ao ato admini trati o e juri dicionai - afigura- e
ób io. Tudo e tá em aber e todas ão da me ma natureza e do me mo grau. e colha de
fin e do tipo d meios a utilizar tem natureza primária, a d meio em concreto, natur za
ecundária e in trumental; ó a primeira entra na função política.
a função juri dicional define- e o Direito (juri dictio) em concreto, perante itu-
açõ da ida (litígio entre particulare , entre entidade pública entre particulare e
entidad pública, e aplicação de ançõe), e em ab trato, na apreciação da constitucio-
nalidade e da legalidade de ato jurídicos (máxime, de atos normativos).
Donde:
46 Cfr. Contributo ..., cit., pág. 223 (em relação a normas adjetivas). Ou acórdão nQ 104/85 do Tribunal
Constitucional, de 26 de junho (in Acórdãos do Tribunal Constitucional, v, pág. 639): ao passo que o me-
dium da jurisdição é a vontade da lei (concretizada no apuramento da conclusão decisória a partir das
premissas previamente enunciadas do silogismo judiciário); o medium da administração é a vontade
própria (o que pressupõe a possibilidade de agir sobre as várias alternativas propostas pela lei).
47 V. o nosso estudo As ossociações públicas no Direito português, Lisboa, 1985.
48 Cfr. ANDRÉGONÇALVESPEREIRA,Erro e ilegolidade no oto odministrativo, Lisboa, 1962, págs. 37 e segs.
49 Cfr., por todos, SÉRVULOCORREIA, Legalidade e autonomio contratual nos contratos odministrativos,
Lisboa, 1987, máxime págs. 188 e segs.
50 Cfr. ainda JosÉ MANUEl CARDOSODA COSTA,A jurisprudência constitucional portuguesa em motéria ad-
ministrativa, in Estudos em homenagem ao Pro/. Doutor Rogério Soares, obra coletiva, Coimbra, 2002,
págs. 177 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
a própria") e não de e re oi er sem ou ir todo o intere ado. Por outro lado, a própria
natureza de te proce o de agir exige que o órgão de e ecução ó atue quando lhe eja
pedido por um do intere ados, pelo meno . E ta regra ob er am-se me mo quando
o conflito e dê entre intere es representados pelo próprio Estado e outro quai quer: o
órgão competente para aplicar a lei também e há-de con iderar imparcial, comp tindo
a outro órgão (o Mini tério Público, geralmente) repre entar o intere e que o E tado
quer fazer aler.
Imparcialidade e pas ividade ão, poi ,a caraterí tica do proce o juri dicional da
execução da lei .
eguindo O art. 10 I o da Con tituição italiana), o que ignifica que o juiz e deve fazer
também intérprete da intenção jurídico- ocial da comunidade.59
Tampouco pode ignorar- e a ignificação política qu a umem muito do ato tan-
to da função admini trati a (quando pro eniente do Go emo ou de órgão eleti o de
entidade de centralizadas) como da função juri dicional (v.g., ato de fi calização ab -
trata, pre enti a ou uce i a, de con titucionalidade ou de juri dição relati a a crime
de re pon abilidade de titulare de cargo político). I to ainda em atender à pré-com-
preen õe , conotaçõe ou implicaçõ metajurídica a que nunca con eguem ubtrair- e
o titulare de órgão de uma e outra função.60
Por ignificativo que ejam e te ato, não ão ele que individualizam a funçõe do
E tado ou que afetam o núcleo esp cificador do órgão a que ão cometido . Do que se
trata é ou de aproveitar caraterí tica ,requi ito ou garantia formais de certa atividade em
nome de outro princípio político-con titucionai ,ou d proporcionar condições para o ca-
bal exercício de certa função, ou de praticar ato complementare de ato próprios de certa
função e a ela indi pen á ei .65 E, e identemente, uma coi a é a função; outra coi a a com-
petência de um órgão, na qual podem entrar faculdade decorrent de funçõ diver a .
11- ão ob tante, cumpre reconhecer que nem todo o atos e atividades do tado
e reconduzem à funçõe fundamentai ou clá sicas.
É o que ucede, obretudo com a atividade do Mini tério Público em proce o pe-
nal, que não e integra nem na admini tração - ape ar da iniciati a - nem na juri dição
- ape ar de ati idade e truturalmente conexionada com a do tribunai .66
om efeito, o Ministério Público não aparece aí como parte no entido de defender
um intere e contrapo to ao do arguido; ante , deve colaborar com o tribunal na desco-
berta da verdade e na realização do direito, obedecendo em toda a intervençõe pro-
ce uai a critério de estrita objetividade. E, dotado de e tatuto próprio e de autonomia
(art. 219 n° 2 da on tituição portugue a), ou de independência funcional (art. 127
0 0
64 Cfr. JORGEMIRANDA, Deputado, Coimbra, 1974, págs. 19 e 20, e autores citados; e Direito Constitucional
- 111- Direito Eleitoral e Direito Parlamentar,Lisboa, 2003, págs. 190 e 233 e segs.
65 Cfr. MARCEl WALlNE, tléments d'une théorie de la juridiction constitutionnelle en droit positif français, in
Revue du droit public, 1928, págs. 441 e segs.; SALVATORE CARBONARO,Nozione e limiti della interferenza
funzionale - analisi e sistema delle funzioni, Florença, 1950; ou, sobre a jurisdicionalização de determi-
nadas funções, J. J. GOMESCANOTILHOe VITAL MOREIRA, op. cit., pág. 793.
66 Assim, FRANCOBASSI, op. cit., págs. 207 e 208; FIGUEIREDODIAS, Direito Processual Penal, I, Coimbra,
1974, págs. 362 e segs., máxime 367 e 368; CUNHA RODRIGUES,Ministério Público, in Dicionário Jurídico
do Admínistração Pública, v, págs. 502 e segs., máxime 536 e segs., e Em nome do povo, Coimbra, 1999;
JosÉ EDUARDOSABO PAES,O Ministério Público perante os Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo, in
Revista de Informação Legislativa, n2 159, julho-setembro de 2003, págs. 199 e segs.; PAULOH. PEREIRA
GOUVEIA,A democracia e os poderes do Ministério Público português, in O Direito, 2006, págs. 921 e
segs. Diferentemente, EMERSONGARCIA,Ministério Público - Organização, atribuições e regime jurídi-
co, Rio de Janeiro, 2005, págs. 53 e segs.
67 O Ministério Público tem uma função de iniciativa condicionante da atividade dos tribunais (CUNHA Ro-
DRIGUES,Op.cit., loc. cit., pág. 541) e parece importante que a perseguição dos crimes ou a luta contra
a criminalidade não dependa necessariamente das opções políticas concretas feitas pelo Governo em
cada momento (Deputado ANTÓNIO BARBOSADE MELO, in Diário da Assembleia Constituinte, n2 100,
reunião de 6 de janeiro de 1976, pág. 3.241. Cfr. ANTÓNIO CLUNY,O Ministério Público e o Poder Judicial,
in Revista do Ministério Público, 1994, pág. 43) ou Luís ANTÓNIO FELGUEIRAS,O Ministério Público e a
autonomia, in Themis, n2 11, 2005, págs. 347 e segs.; JORGEDE FIGUEIREDODIAS, Autonomia do Minis-
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
I - Problema d algum modo ainda de limite - aqui entre a funçã legi lati a e a
juri dicional - era (em Portugal) o da natureza do a ento 68 do upremo Tribunal de
Ju tiça (b m como do Tribunal de onta).
om o a ento - in tituição introduzida m 1926, embora om antecedente lon-
gínquo no Direito portuguê - procura a- e re 01 er conflito d ori ntaçõe juri pru-
denciai de tribunai uperiore .69 Quando no domínio da me ma legi lação, r lati amen-
te à me ma que tão fundamental de direito fo em proferida dua d ci õ opo ta do
upremo Tribunal de Justiça (ou do tribunai da Relação), podia recorrer- e do último
acórdão para o upremo Tribunal de Ju tiça, funcionando em tribunal pleno (art . 763°
e eg . do ódigo de Proce so i il)?Oe a doutrina que fo e adotada adquiria força obri-
gatória geral como constava do art. 2° do ódigo Civil.
Ma o in tituto foi, ao longo do ano, dos mai contro er o . Di cutiu- e a ua
natureza jurídica,71 di cutiu- e a ua conformidade quer com a on tituição de 1933,
quer com a de 1976, discutiu-se a ua conveniência. O Tribunal on titucional veio a
propender pela inconstitucionalidade daquele preceito do ódigo ivil e o art. 4°, nO2,
tério Público e seu dever de prestar contas à comunidade: um equilíbrio difícil, in Revista Portuguesa
abril-junho de 2007, págs. 191 e segs. V. também acórdão nº 581/2000, de 20 de
de Ciência Criminal,
dezembro, do Tribunal Constitucional, in Diário da República, 2~ série, de 22 de março de 2003.
68 Assento, do verbo assentar: fixar, estabelecer, firmar. O termo (também de ressonâncias antigas) foi
adotado desde o Código de Processo Civil de 1939.
69 V. uma resenha histórica em ARMINDO RIBEIROMENDES, Os recursos em processo civil, 2~ ed., Lisboa,
1994, págs. 273 e segs.
70 Quanto aos assentos do Tribunal de Contas, v. arts. 6º e segs. da Lei nº 8/82, de 26 de maio.
71 Além dos autores citados em Contributo ..., cit., pág. 197, nota, pronunciavam-se no sentido da natureza le-
gislativa dos assentos, A. CAsTANHEIRA NEVES,O instituto ..., cit., máxime págs. 315 e segs.; Assento, in Polis, I,
págs. 417 e segs., e O problema da constitucionalidade dos assentos, Coimbra, 1994; J.J. GOMESCANOTILHO,
anotação ao acórdão nº 359/91 do Tribunal Constitucional, in Revista de Legisloção e de Jurisprudência, nº
3.811, fevereiro de 1992, págs. 318 e segs., e Direito Constitucional..., cit., pág. 938; ARMINDORIBEIROMEN-
DES,Op.cit., pág. 295; ANTÔNIOMENEZESCORDEIRO,Da inconstitucionalidade da revogação dos ossentos, in
Perspetivas Constitucionais - Nos 20 anos da Constituição de 1976, I, obra coletiva, Coimbra, 1996, pág. 801
(mas fundamentando os assentos em costume constitucional); INOCÊNCIOGALVÃOTELLES,Introdução ao Es-
tudo do Direito, 11~ ed., Coimbra, 1999, pág. 142; FERNANDOJOSÉBRONZE,Lições de Introdução ao Direito,
2~ ed., Coimbra, 2006, págs. 703 e segs. No sentido da natureza jurisdicional, pronunciavam-se AFONSO
QUEIRô, Lições ..., cit., págs. 386 e segs.; JosÉ DIASMARQUES,Introdução ao Estudo do Direito, Lisboa, 1986,
pág. 99; JosÉ DEOLIVEIRAASCENSÃO, Os Acórdãos com Força Obrigatória Gerol ..., cit., loc. cit., pág. 262, e O
Direito -Introdução e Teoria Geral, 9~ ed., Coimbra, 1995, págs. 316 e segs.; ANTÔNIOBARBOSADEMELO,Sa-
bre o problema ..., cit.; MARCELOREBELODESOUSA,Estado, cit., loc. cit., pág. 222; HELENACRISTINATOMÁS,Em
torno do regime dos assentos em processo civil, Lisboa, 1990, págs. 101 e segs.; MARCELOREBELO DESOUSAe
SOFIAGALVÃO,Introdução ao Estudo do Direito, Lisboa, 1991, pág. 106; ANTUNESVARELA,anotação ao acór-
dão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de março de 1986, in Revista de Legislação e de Jurisprudência,
nº 3.813, abril de 1992, págs. 373 e segs.; DIOGOFREITASDO AMARAL,Manual de Introdução ao Direito, I,
Coimbra, 2004, págs. 462 e segs. (invocando o art. 122º, hoje 119º, nº 1, alínea g, da Constituição).
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado ••
II - Dada a importância que a matéria teve (e que pode, quiçá, ainda voltar a ter)
não queremo deixar de recordar e de reiterar a no a opinião sobre a natureza da figura,
remetendo a po ição obre a sua con titucionalidade para quando anali armo o art. 112°
da Lei Fundamental.
empre entendemo 74que o assento revestia natureza jurisdicional. E, em resumo,
por três razõe bá ica :
lll- Numa primeira fa e, e crevemo que o a ento po uía uma eficácia geral em
ser normativa; que aí se executava uma norma; que não havia um limite que urgi e
novo, havia uma que tão que e decidia à luz do Direito já exi tente. Depois abandoná-
mos es a maneira de ver, para, pura e implesmente, de cortinarmos nele um ato norma-
tivo da função juri dicional.78
Não e tratava de normas legislativas nem de interpretação autêntica em aceção pró-
pria; faltava-lhe o irrecu ável elemento político que ne ta empre e exibe. Tratava- e,
sim, de normas juri prudenciai , o que explicava a ua nece ária acessoriedade perante
a lei a que corre pondiam, bem como as limitações da sua emanação. Nem se outorgava
ao tribunal pleno, por fixar doutrina, um poder de direção do tribunais contrário à ua
independência; ele não procedia enão à formulação de uma proposição - não de toda a
prepo içõe do juízo juri prudencial.
TIl - Supomo que estas considerações valem também mutatis mutandis para a
úmula vinculantes.
§ 1º
Conceito e elementos
1 C. F. VON GERBER,op. cit., págs. 149 e segs.; GEORGJELLlNEK,System der subjectiven offentlichen Re-
chts, 1892 trad. italiana Sistemo dei diritti pubblicci subbietivi, Milão, 1912, págs. 245 e segs., e Teoria
General dei Estado, cit., págs. 409 e segs.; LÉON MICHOUD, Lo théorie de la personnalité morale, Paris,
1906, I, págs. 128 e segs.; ROCHASARAIVA,op. cit., 11,págs. 55 e segs.; CARRÉDE MALBERG, op. cit., 11,
Paris, 1922, págs. 143 e segs.; LÉONDUGUIT, op. cit., 11, págs. 539 e segs.; HANS KELSEN,Teoria General
dei Estado, cit., págs. 341 e segs.; Teoria Pura do Direito, cit., I, págs. 286 e segs., e 11, págs. 183 e segs.;
General Theary of Law and State (trad. portuguesa Teoria Geral do Direito e do Estada, São Paulo, 1990,
págs. 100 e segs.); SANTI ROMANO, Organi, in Frammenti di um Dizionario Giuridica, Milão, 1953, págs.
145 e segs.; QUEIROZ LIMA, Teoria do Estado, 8~ ed., Rio de Janeiro, 1957, págs. 297 e segs.; MANUEL DE
ANDRADE, Teoria Geral da Relação Jurídica, I, Coimbra, 1960, págs. 115 e segs.; ALF Ross, On the concept
of "state organs" in Constitutional Law, in Scandinavian Studies in Law, 5, 1961, págs. 113 e segs.; SAL-
VATOREFODERARO,Personalità interorganica, Pádua, 1962; NAZARENOSAITIA, Premesse per uno studio
delle norme di organizzazione, Milão, 1965; MARCELLOCAETANO, Manual de Direito Administrativo, I,
cit., págs. 203 e segs., e Direito Constitucional, cit., I, págs. 219 e segs.; GIUSEPPINOTREVES,Organi e
soggettività dei organo, in Studi in memoria di Carlo Esposito, obra coletiva, 111, Pádua, 1973, págs. 1739
e segs.; COSTANTINOMORTATI, Instituzioni di Dirito Publico, 9~ ed., Pádua, 1975, I, págs. 188 e segs.;
MASSIMO SEVEROGIANNINI, Organi (Teoria Generale), in Enciclapedia dei Diritto, XXXI, págs. 37 e segs.;
GIOVANNI MARONGIO, Organa e afficia, in Jus, 1988, págs. 78 e segs.; SERGIOAGLlFOGLlO, Officio (diritto
amministrativo), in Enciclopedia dei Diritta, XLV, págs. 669 e segs.; REINHOLDZIPPELlUS,AIIgemeine Sta-
atslehre 3~ ed. portuguesa Teoria Geral da Estado, Lisboa, 1997, págs. 124 e segs.; ~L1SECARPENTIER,
L'organe, racte et le conflicte constitutionnel, in Annuaire Internationale de Justice Constitutionnelle,
2004, págs. 57 e segs.; DIOGO FREITASDO AMARAL, op. cit., I, págs. 759 e segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
con trução (contanto que e não caí e, como por eze ucedeu, num reducioni mo ou
num preten o reali mo de matiz biológico).2
Relati amente cedo, a noção d pr nd r- -ia da ua marca doutrinai d origem
eria acolhida e reinterpretada por outra corrente à luz da ua per peti a própria (do
po iti i mo Kel eniano ao in titucionali mo à t oria da int gração de M D); Ó o po i-
ti i mo ociológico a repeliu. Da ciência publicí tica pa aria para a ciência do Direito
internacional, com adataçõe , e, em menor medida para a ciência ju pri atí tica .
O conceito de órgão aparece hoj muito e treitamente a ociado à teoria da per-
onalidade coletiva. Ma não a implica n ce ariamente: pode admitir- e que, para o
exercício da ua atividade, grupo e ente não per onalizado (ou o E tado quando e
adota e uma te e negativi ta) di ponham de órgão; e pode configurar- e a organização
à margem de quai quer con ideraçõe normati a ou técnico-jurídica no domínio da
ociologia, da ciência da admini tração e de outra di ciplina .
II - Representação (de Direito privado) e imputação ão, portanto, coi a bem di-
ver a . O órgão não repre enta a pe oa coletiva; o órgão é a pe oa coleti a e esta não
pode ter outra dinâmica jurídica enão a que lhe vem do órgão.
Como e creve MA EL DE A DRADE, ao pa o que o repre ntante con erva uma
indi idualidade autónoma diferente da do repre entado a ontade do órgão é referida ou
imputada por lei à pe oa coleti a, con tituindo para o Direito a própria ontade de a
pe oa; enquanto a vontade do repre entante é a ontade dele me mo (embora, numa
certa medida, venha a produzir efeito, de de logo, na e fera jurídica do repre entado), o
ato do órgão valem como ato da própria pe soa coleti a.lo
9 v., por todos, SANTI ROMANO, op. cit., loco cit., págs. 166 e segs.; MANUEL DE ANDRADE, op. cit., I, págs.
118 e segs.; KELSEN,Teoria Puro do Direito, I, cit., págs. 334 e segs. (e, também, sobre a imputação em
geral, págs. 150 e segs.); MARCELLOCAETANO,Direito Constitucional, I, cit., págs. 221 e segs.
10 Op. cit., I, pág. 118. Cfr., diversamente, MARQUES GUEDES,A concessão, Coimbra, 1954, pág. 148 (para
quem a representação, no sentido da teoria geral, e não no da representação voluntária de direito
privado, pode abranger as relações entre a pessoa coletiva e o órgão).
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
Por isso, não é nece ário distinguir, a re peito da natureza dos órgãos, entre os
órgão como instituiçõe no âmbito da teoria da organização admini trativa e como in-
divíduos no âmbito da teoria da atividade administrativa.11 Não são os indivíduos, sem
mai , que praticam os atos administrativos ou os atos jurídico-con titucionais; nem ão
as instituiçõe, em o indivíduo. ão o indivíduos enquadrados na in tituições ou as
in tituiçõe neces ariamente corporizadas através dos indivíduos.12
Por i o ainda, o problema do vício da vontade no tocante a ato do Estado não
pode colocar- e no me mo molde em que é posto em relação ao negócio jurídico.13
v - om i to, tão pouco, tem que ver o instituto da representação política, pre su-
po to fundamental da forma de governo representativo. É ó por cau a da repre entação
política que e fala em órgão repre entativo , mas estes não o são por representarem ou
deixarem de repre entar o E tado; ão repre entativo , porque os seus titulares represen-
tam o po o, os cidadão , enquanto recebem a repre entação política dele por meio de
eleição (ou, por outra vias, eventualmente). 14
A imputação refere- e ao ato jurídico e ao eus efeito , a repre entação política
ao titulare dos órgãos e ao sentido ou conteúdo político que imprimem aos ato
I - O conceito de órgão revela- e indi pen ável para explicar as relações jurídicas
que se e tabelecem e de envolvem entre o Estado e o cidadão (bem como entre o Esta-
do e outra pe oas coletiva públicas, privadas e de Direito internacional). Todavia, não
há apena ato de eficácia externa; há, outro im, atos com eficácia interna - com eficácia
intraorgânica, nuns ca o , e com eficácia interorgânica noutros - atos cuja relevância e
exaure (aparentemente) no interior do aparelho de poder e tata\.
Há ato com eficácia intraorgânica, ejam ato de auto-organização ou decorrente
de auto-organização (v.g, aprovação de regimento ou eleição de mesa de órgão colegial),
sejam ato interlocutório no proce o ou procedimento de formação da vontade do órgão.
Há atos de um órgão que e projetam em ato de outro órgão, eja porque e requeira a
colaboração de ambo para o emitir do ato final do Estado (v.g, a aprovação parlamentar
da lei e a promulgação pelo Presidente da República), seja porque se confira a um órgão
umafaculté d'empêcher em face dafaculté de tatuer doutro (v.g, o poder de veto - po-
lítico ou por inconstitucionalidade - ou o de recu a de ratificação de decreto -leis).15 E,
11 Assim, DIOGO FREITASDO AMARAL, Curso ..., I, cit., págs. 761 e 762.
12 Neste sentido, ROGÉRIOSOARES,Direito Administrativo, cit., pág. 240: os órgãos, sendo figuras abstratas
de fixação de competências, tornam-se atuantes através do concurso de pessoas físicas.
13 O que tem implicações importantíssimas no tocante à responsabilidade por atos ilícitos. Como não é
admissível o contrato de mandato para objeto ilícito, só através da imputação pode conseguir-se explicar
que a pessoa coletiva responda por atos ilícitos (ou de que resultem prejuízos ou violação de direitos) de
titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes (cir. art. 222 da Constituição e art. 1652 do Código Civil).
14 Cfr. JORGEMIRANDA, Manual..., 111, cit., págs. 371 e segs., e Autores citados.
15 Cfr., mais desenvolvidamente, SALVATORE
FODERARO,op. cit., págs. 124 e segs.), que aponta relações de coo-
peração, de colisão e de supremacia entre os órgãos; ou SÉRVULOCORREIA,Noções ..., cit., págs. 62 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
16 VEZIO CRISAFULLI,
Alcune considerazioni sulla teoria degli argani dello Stata, Modena, 1938, págs. 22 e segs.
17 SALVATOREFODERARO,op. cit., págs. 197 e segs.
18 J. J. GOMES CANOTILHO,Direito Constitucional ..., cit., 3ª ed., Coimbra, 1999, pág. 509.
19 SANTI ROMANO, op. cit., loe. cit., pág. 163.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
20 Sobre órgãos das organizações internacionais, cfr., por exemplo, ALFREDVERDROSS,Derecho Internocionol
Publico, 4~ ed. castelhana, Madrid, 1963, págs. 250 e segs.; MARIO GIULlANO, TULLlO SCOVAZZIe TULLlO
TREVES,Diritto Internazionale - parte generale, Milão, 1991, págs. 143 e segs.; ANDRÉGONÇALVESPEREIRA
e FAUSTODE QUADROS, Manual de Direito Internacional Público, Coimbra, 1993, págs. 436 e segs.; JEAN
COMBACAUe SERGESUR, Drait International Public, Paris, 1993, págs. 734 e segs.; DIEZ DE VELASCO,Las
Organizaciones Internacionales, 8i ed., Madrid, 1994, págs. 91 e segs.; MARGARIDA SALEMA D'OLlVEIRA
MARTINS e AFONSOD'OLlVEIRA MARTINS, Direito das Organizações Internacionais, I, 2~ ed., Lisboa, 1996,
págs. 230 e segs.; NGUYEN Quoc DINH, PATRICKDAILLlERe ALAIN PELLET,Droit International Public, 6i
ed., Paris, 1999, págs. 608 e segs.; EDUARDOCORREIABAPTISTA,Direito Internacional Público, 11,Coimbra,
2004, págs. 258 e segs.; WLADIMIR BRITO,Direito Internacional Público, Coimbra, 2008, págs. 417 e segs.
21 Cfr. o art. 72, n2 2, da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados.
22 Assim, o art. 52 do projeto da Comissão de Direito Internacional sobre responsabilidade do Estado por
fatos ilícitos.
23 Cfr. ALFREDVEDROSS,op. cit., págs. 250 e segs.; FRANCISPÉAK,Organs of State in their ExternaI Relations,
in Manual of Public International Law, obra coletiva dirigida por Max Sorensen, Londres, 1968, págs. 381
e segs.; CELSODE ALBUQUERQUEMELO, Curso de Direito Internacional Público, 11,8~ ed., Rio de Janeiro,
1986, págs. 925 e segs.; BENEDETTOCONFORTI,Diritto Internazionale, 3~ ed., Nápoles, 1988, págs. 331 e
segs.; JORGEMIRANDA, Curso de Direito Internacional Público, 4i ed., S. João do Estoril, 2009, págs. 66.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Por outro lado, haverá sempre que ter em devida conta o princípio da efetividade.
Tal como, em ituação de nece idade - por exemplo, em ca o de ocupação e trangeira ou
de guerra civil- adquire esp cial relevância o instituto do reconhecimento de Governo.
Finalmente, ocorrendo alteraçõe con titucionai que afetem, não já o titulare do
órgãos, ma im o próprio órgão (como ucede quando muda o regime político ou a
forma de governo, com a inerente implicaçõe no nível dos órgão da função política),
a regra jurídico-internacional da identidade e continuidade do E tado não pode deixar de
prevalecer.
] - O conceito de órgão implica quatro elementos (in epará eis, mas que cabe dis-
tinguir):
24 Cfr., designadamente, MAURICE HAURIOU, Précis de Droit Constitucionel, 2~ ed., Paris, 1929, págs. 72 e
segs.; SANTI ROMANO, op. cit., págs. 156 e segs.; JosÉ DE OLIVEIRAASCENSÃO,O Direito ..., cit., págs. 33 e
segs. E ainda SMEND, op. cit., pág. 152 (o órgão é uma realidade espiritual que, no processo de integra-
ção, se perpetua e renova).
25 Nas organizações internacionais, não raro nas sociedades comerciais e, por vezes, em certas associa-
ções há pessoas coletivas investidas na qualidade de titulares de órgãos, mas, em última instância,
elas tornam-se presentes através das pessoas físicas titulares dos seus órgãos ou agentes ou que as
representam.
26 JOÃo BAPTISTAMACHADO, op. cit., págs. 17-18. Cfr. OTA WEINBERGER,Les théories institutionna/listes du
droit, in Controverses autour de rOntologie du Droit, obra coletiva, Paris, 1989, pág. 75: "A pessoa au-
torizada a agir em nome da instituição funciona como uma inteligência programada pela ideia diretriz
da instituição."
27 Não se confunda cargo com ofício, na aceção que a doutrina italiana liga ora ao órgão, ora ao serviço
ou aparelho.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado ••
28 Cfr. JEAN-LoUISQUERMONNE,Les régimes politiques occidentaux, Paris, 1986, pág. 132 (refere-se à ma-
gistratura como suporte institucional dado ao exercício de um poder político personalizado ou indivi-
dualizado, como sucede com o Chefe do Estado ou com o Chefe de Governo).
29 Cfr. ARNALDODEVALLES,Competenza e ufficio, in Studi di Diritta Pubblica in onore di Ores te Ranelletti,
Pádua, 1931, I, págs. 323 e segs.; PIETROGASPARI,Competenza amministrativa, in Enciclopedia deI Dirit-
to, VIII, pág. 33; MARCELLOCAETANO,Manual de Direito Administrativo, I, cit., págs. 211 e segs.; AFONSO
QUEIRÓ,Competência, in Dicionário Jurídico da Administração Pública, 11, págs. 524 e segs.; COSTANTINO
MORTATI,op. cit., I, pág. 196; MARCELOREBELODE SOUSA, Os partidas políticos ..., cit., pág. 531, nota;
MARIANO BAENA DELALCÁZAR,Competencias, funciones y potestadas en el ordenamiento juridico es-
panol, in Estudios sobre la Constitucion espanola - Hamenaje el Profesor Eduardo Garcia de Enterria,
obra coletiva, 111, Madrid, 1991, págs. 2.453 e segs.; J. J. GOMESCANOTILHOe VITALMOREIRA,op. cit., pág.
495; JORDIFERRER BELTRAN,Las normas de competencia - Un aspecto de la dinamica juridica, Madrid,
2001; J. J. GOMESCANOTILHO,Direito Constitucional ..., cit., págs. 546 e segs.; DIOGO FREITASDOAMARAL,
op. cit., I, págs. 776 e segs.
30 Cfr. MARCELLOCAETANO,Manual ..., I, cit., págs. 202 e 203; AFONSOQUEIRÓ, Atribuições, in Dicionário
Jurídico ... I, cit., págs. 587 e segs.
31 AFONSOQUEIRÓ,Competência, cit., loc. cit., pág. 525.
32 Cfr., por todos, JosÉ DIAS MARQUES, Teoria Geral do Direito Civil, I, Coimbra, 1958, pág. 223.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
33 Cfr. AFONSO QUEIRó, Os limites do poder discricionário das autoridades administrativos, in Estudos de
Direito Administrativo, Coimbra, 1968, págs. 10 e segs.
34 Cfr. art. 30Q do Código do Procedimento Administrativo português.
35 Cfr. supra.
36 Se o conflito se dá entre órgãos administrativos e jurisdicionais, fala-se em conflitos de jurisdição. E
se ocorre entre órgãos de diferentes pessoas coletivas públicas (da Administração), em conflitos de
atribuiçães.
37 Sobre poderes funcionais, cfr. MARCElLO CAETANO, Tratado Elementar de Direito Administrativo, I,
Coimbra, 1944, pág. 169; JEAN DABIN, Le Droit Subjectit, Paris, 1952, págs. 217 e segs.; SANTI ROMANO,
op. cit., loc. cit., págs. 179-180,200 e 203; JORGEMIRANDA, Poder paternal e assistência social, Lisboa,
1969, págs. 17 e segs.; MENEZESCORDEIRO,Tratado de Direito Civil Português, I, tomo I, 3~ ed., Coimbra,
2005, págs. 349-350.
38 MARCelO REBelO DE SOUSA, O valor jurídico do ato inconstitucional, Lisboa, 1988, pág. 116.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado ••
I - endo a competência definida pelo Direito objetivo, o órgão não pode ter outra
competência além da que a norma estipula. ão pertence ao próprio órgão fazer eu
podere que lhe não ejam atribuídos; e nenhuma autoridade do Estado pode praticar ato
que não se reconduzam a competência pree tabelecida ; a im como não pode di por
dela, tran miti-la a outra autoridade ou conformá-Ia de modo diferente.
ore peitante ao órgão con titucionai ignifica i to que eles ão dotado tão omen-
te de poderes con tituídos39 - con tituído p la on tituição - e que e e podere de em er
nt ndido no eu plano i temático e exercido no re pito p la respeti a norma.
11- O princípio da pre crição normati a da competência40 é, numa ordem con titucio-
nal de E tado de Direito, manife tação de dua ideia mai funda: a de limitação do p der
público como garantia de lib rdade das pe soa e a da eparação e articulação do órgão
do E tado entre i e entre ele e o órgão de quai quer entidade ou in tituiçães pública.
Ao pa o que em Direito privado e em Direito con titucional, no tocante ao direito
fundamentais, o princípio é o da liberdade ou da autonomia, no tocante ao órgão é o da
competência. a conceção do con titucionali mo moderno (ma anterior, aliá, a e te, e
vinda de de o Direito romano), o indivíduo podem ter todos o direito que não con-
trariem o direito do outro ,a onstituição e crita não e gota o direito fundamentai
(art. 16°, nO I, da on tituição portugue a e art. 5° 2°, da on tituição brasileira) e a
liberdade ó tem por limite o que a lei e tabelecer; porém, o órgão do E tado - que
não alem por i, ma enquanto in tituiçães ao serviço da finalidade coletivas - ap na
podem agir com o podere que a norma a eles relativa lhes confiram e no termos por
ela traçado .
competência traduz- e numa autorização ou legitimação para a prática de ato
jurídico (a peto po iti o) e num limite para e a prática (a peto negati o).
um órgão do E tado praticar um ato que não recaia na ua competência e e ato
erá in álido, irregular ou ineficaz por incompetência (ou, conforme o ca o , incompe-
tência tricto en u, u urpação d poder ou, ainda de certa ótica, de io de poder).
111 - A competência em da norma' não e pre ume.41 ontudo, tanto pode er ex-
plícita quanto implícita. Quer dizer tanto pode a entar numa norma que, explicitamente,
a declare como a entar em norma cujo entido omente eja de coberto atravé de técni-
ca interpretativa e que urja como con equência de outra norma ou nela esteja contida.
ão há difer nça de natureza entre podere explícito e implícito; há omente difer nça
d grau de leitura.42
39 V., por todos, HAMILTON, MADISON e JAY,The Federalist, trad. portuguesa O Federalista, Brasília, 1984,
págs. 575 e segs.
40 Quanto aos órgãos administrativos, v. art. 292 do Código do Procedimento Administrativo.
41 Cfr., porém, falando em debilitação do princípio da legalidade da competência, PAULOOTERO,Legalida-
de ..., cit., págs. 862 e segs.
42 E pode, inclusive, haver cláusulas expressas de poderes implícitos, como a secção VIII, in fine, do art. 12
da Constituição dos Estados Unidos ou o art. 2352 do Tratado sobre o Funcionamento da União Euro-
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
A afirmação de podere implícito de certo órgão é muita ezes feita para aumen-
tar a ua influência ou a sua competência em detrimento de outro órgão. Tal intuito
afigura- e, evidentemente, inadmi sível.
O poderes implícitos de um órgão não podem brigar com o podere - explícito e
implícito - de quaisquer outros. E também aqui a interpretação tem de ser i temática,
levando a conjugar a interpretação de qualquer preceito definidor de competência com,
pelo menos, os re tantes preceito que preveem competência do demais órgãos.
E ão de conceber, em órgãos con titucionai ,podere criado ou derivado dire-
tamente da lei ordinária e não da Con tituição? Tai poderes ão legítimos, desde que
entronquem em poderes con titucionais; desde que, exatamente mediante interpretação
i temática de todos os preceito con titucionais de competência, po am er entendido
como podere implícitos neles contidos; desde que tenham "base con titucional".
peia, de 2007 (correspondente ao art. 235º do Tratado de Roma, institutivo da Comunidade Económica
Europeia). Cfr. MARIA LuíSA DUARTE,A teoria dos poderes implicitos e o delimitoção de competêncios
entre o União Europeio e os Estodos membros, Lisboa, 1997, págs. 25 e segs.
43 Poderia falar-se aqui em prerrogotivo, um pouco na linha da prerrogativa da Coroa inglesa (cfr., por
último, IAN LOVELAND, Constitutional Law - A Criticallntroduction, Londres, 1996, págs. 102 e segs.).
Mas o termo também é usado para abranger todas as garantias pessoais, organizatórias e funcionais
dos órgãos (assim, GIAN FRANCOC1AURRO,Prerogative Costituzionoli, in Enciclopedia dei Diritto, XXXV,
1986, págs. 1 e segs.).
44 Ainda que regulamentados por normas legais. Cfr. o acórdão nº 254/92 do Tribunal Constitucional
português, de 2 de julho (in Diário da República, 1ª série-A, de 31 de julho de 1992).
45 Entretanto, às vezes torna-se difícil distinguir entre poderes constitucionais regulamentados por lei e
poderes de origem legal.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado ••
163. Os titulares
I- a órgão carateriza- e tanto pela permanência e pela continuidade que lhe trazem
a in tituição, a competência e o cargo quanto pela precariedade inerente ao titular.
a titular é sempre temporário: pelo menos, por força da duração limitada da vida
humana ou da capacidade fisica e mental para o exercício do cargo; e também por virtude
de regra jurídicas, variá eis consoante o i tema e a circun tância hi tóricas.
e, por definição, o Estado como forma de organização política impede a apropriação
pessoal de qualquer cargo, o princípio democrático é o da renovação periódica por via, direta
ou indiretamente, de eleição pelo povo, e o princípio republicano (enquanto princípio demo-
crático qualificado)46 exige me mo a limitação do mandato. É o que a Constituição portu-
guesa e tatui em geral (no art. 118°); e, no concernente ao Presidente da República, com a
proibição de terceiro mandato consecutivo ou de terceiro mandato iniciado no quinquénio
imediatamente ub equente ao termo de segundo mandato con ecutivo (art. 123°); e quanto
ao juízes do Tribunal on titucional com a proibição de recondução (art. 222°, nO3).
I1l - a
modo de designação dos titulare do órgão de E tado são variadíssimos,
quer no pa ado quer no presente. Não é po sível aqui senão propor uma classificação,
olhando à experiência hi tórica:
46 V. o nosso estudo Princípio republicano e poder local, in O Direito, 1992, págs. 451 e segs.
47 Cfr. Manual ..., IV, págs. 70 e segs. e Autores citados.
48 O sorteio teve larga difusão na Grécia antiga (v. ARISTÓTELES,Constituição de Atenas, trad. de Delfim
Ferreira Leão, 2ª ed., Lisboa, 2009, págs. 26, 93, 102, 103, 106, 121, 122). Mas foi quase abandonado
nos tempos modernos. No constitucionalismo português só a Constituição de 1822 o contemplou para
a escolha do 13º Conselheiro de Estado entre cidadãos da Europa ou do Ultramar (art. 162º). Sobre o
sorteio, cfr. GIUSEPPETRIPOLl, Osservazioni sul principio maggioritorio e sui limiti, in Rivista Internazio-
1983, págs. 643 e segs.; ou JosÉ RIBEIRO FERREIRA,A Democracia na Grécia
nale di Filosofia dei Diritto,
Antiga, Coimbra, 1990, págs. 193 e 194; e recordem-se as reflexões de MONTESQUIEU (De /'Esprit des
Lois, livro 11,2) e de ROUSSEAU(Ou Contrat Social, livro IV, capo 111).
49 Inerência é a atribuição a alguém da titularidade (ou do exercício) de um cargo por virtude da titulari-
dade de outro cargo: v. JORGEMIRANDA, Inerência, in Verbo, x, pág. 1.370.
50 Cfr. KARLLOEWENSTEN,Kooptation und Zuwahl über die Autonome Bildung Priviligierter Gruppen, 1973
(trad. italiana Le Forme della Cooptazione, Milão, 1990).
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
§ 2º
Categorias de órgãos
51 Cfr. JORGEMIRANDA, Deputado, cit., págs. 13 e segs., e Lei reguladora de incompatibilidades de cargos
públicos, in O Direito, 1992, págs. 262 e 263.
52 Cfr., por exemplo, COSTANTINOMORTATI, op. cit., I, págs. 207 e segs.; ou DIOGO FREITASDO AMARAL, Cur-
so ..., I, cit., págs. 763 e segs.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
53 Cfr. GIUSEPPEFERRARI,GIi Organi Ausiliari, Milão, 1956; JORGEMIRANDA, Conselho de Estado, Coimbra,
1970, págs. 9 e segs., e Autores citados.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
S4 Assim, são órgãos vicários, no nosso Direito constitucional atual, e aliás em termos diversos, o Presi-
dente da Assembleia da República em relação ao Presidente da República (art. 1322), o Presidente da
Assembleia Legislativa regional quando substitui o Representante da República para a região autóno-
ma (art. 2302, n2 4) e a Comissão Permanente da Assembleia da República (art. 1792).
SS O Governo éo órgão superior da Administração pública (art. 1822). O Supremo Tribunal de Justiça e o
Supremo Tribunal Administrativo são os órgãos superiores da hierarquia dos tribunais judiciais e dos
tribunais administrativos e fiscais respetivamente, sem prejuízo da competência própria do Tribunal
Constitucional (arts. 2102, n2 1, e 2122, n2 1).
S6 Cfr., por exemplo, PAULOOTERO, Direito Constitucional Português - 11 - Organização do Poder Político,
Coimbra, 2010, págs. 29 e segs.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado
57 Cfr. GIAN FRANCOC1AURRO,Ordine dei giorno, in Enciclopedia dei Diritto, XXX, 1980, págs. 1.018 e segs.
58 Conforme noticia MAGALHÃESCOLLAÇO(A Constituição e o Quorum, Coimbra, 1916, pág. 7), quorum é
um termo vindo do Direito parlamentar inglês e derivado da linguagem processual que, para designar o
número de juízes cujo concurso era considerado indispensável para a validade dos atos e julgamentos,
empregava a fórmula: "quorum aliquem vestrum ABC ... unum esse volumens."
59 Cfr., por exemplo, ALESSANDROPIZZORUSSO,Minorauze e maggioranze, Turim, 1993, págs. 11 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
não contando as abstençõe para o apuramento da maioria (art. 116°, nO3, da Con tituição
portugue a).
I) As votações60 e as sua diver as forma - por e crutínio ecreto, por votação no-
minal, por levantados e sentado , por divi ão, por votação eletrónica, etc. - e a
exigência do e crutínio secreto em ca o de eleiçõe ou de deliberações relativa
à apreciação do comportamento ou da qualidade de qualquer pe oa (art. 24°,
nO2, do Código do Procedimento Admini trativo portuguê ).61
60 A votação - em que cada titular de órgão emite um voto e os votos todos são apurados, discernindo maio-
ria e minoria - é o mais importante dos processos de formação da vontade em órgãos colegiais e o mais
conforme com os princípios do Estado de Direito democrático. Outros são o consenso e a aclamação.
61 Apreciação de pessoas, de comportamentos, não de resultados (v.g., dissertações ou provas académi-
cas públicas) em que deve prevalecer um juízo objetivo (v. a nossa nota Sobre o regime de admissão à
prestação de provas de doutoramento, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa,
1992, págs. 627 e segs.).
62 Cfr., por todos, MARCELlO CAETANO,Direito Constitucional, cit., I, págs. 260 e segs.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado ••
Il - Ora, qual é a natureza jurídica do colégios eleitorai? erão também ele ór-
gão - do E tado, da regiõe autónoma, da autarquia locai? E que con equência
ad irão do ne o entre eleição política e referendo?
em entrar numa análi e pormenorizada do problema (extremamente difícil e tam-
bém e tr mamente fa cinante), reiteramo a opinião há muito por nó defendida de que a
eleição é um ato político, quer como ato de ignati o, quer, obretudo, pelo eu ignifica-
do d opção política fundamental e de que o colégio eleitoral é verdadeiro órgão. A maio-
ria que e forme ou que re ulte de cada eleição tem um indi cutível sentido político. ão
ó a eleição geral traz consigo a e colha da política que o povo pretende eguir como, em
certo momento (v.g., em ca o de di olução do Parlamento ou de renúncia do Pre iden-
te da República), qui ale a uma v rdadeira arbitragem ou deci ão popular.68
Daqui não e deduz, porém forço amente, que o colégio eleitoral como órgão do
E tado eja um órgão idêntico ao Pre idente ou a A sembleia da República e que a elei-
ção e re i ta da caraterí tica de ato unitário própria de um decr to daquele ou de uma
lei de ta. conclu ão afirmati a ou negati a dependerá do conceito com que e lidar
e da ub unção qu nele e e ti er habilitado a fazer, embora pos a ir a ter corolário
deci ivo ,inclusi e na interpretação das lei leitorai.
III - Por um lado, falta ao colégio eleitoral autonomia diante do povo: o colégio
eleitoral não é enão uma expre ão jurídica qualificada do povo, seja qual for o modo
de entender a relação entre um e outro termo (colégio eleitoral, idêntico ao povo' colégio
eleitoral, órgão do po o; colégio eleitoral, repre entante do po o; colégio eleitoral, ge tor
de negócio do po o, etc.).
Por outro lado, algun ponto de contra t entre o colégio eleitoral o órgão qua
tale enunciado na on tituição parecem er: 1°) o colégio eleitoral admite infixidez na
ua compo ição efetiva' o órgão do E tado, da regiõe autónoma e de poder local po -
tulam unidade e continuidade do titulares, sempre em número certo; 2°) o colégio elei-
toral é de funcionamento intermitente; o órgão são de funcionamento permanente ou
prolongado durant um período exten o; 3°) o membro do colégio eleitoral, o eleitore
66 Mas haverá que discernir: colégio eleitoral potencial (conjunto de cidadãos com direito de sufrágio);
colégio eleitoral real (conjunto de cidadãos eleitores alistados ou inscritos no recenseamento eleito-
ral); colégio eleitoral efetivo (conjunto de cidadãos eleitores que efetivamente venham a votar em
certa eleição).
67 V. os nossos Colégio eleitoral, in Dicionário Jurídico do Administração Pública, 11,págs. 464 e segs.; A Cons-
tituição de 1976 - Formação, estrutura, princípios fundamentais, Lisboa, 1978, págs. 364 e segs.; Colégio
Eleitoral, in Verbo, XXI, págs. 343 e segs.; Manual ..., VII, cit., págs. 341 e segs. E também, na doutrina
portuguesa, EDUARDOCORREIABAPTISTA,A soberania popular em Direito Constitucional, in Perspetivas
Constitucionais - Nos 20 anos da Constituição de 1976, obra coletiva, I, Coimbra, 1996, págs. 793 e segs.
68 Para maior desenvolvimento, v. Manual ..., VII, cit., pág. 351.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
§ 3º
Vicissitudes dos órgãos
69 As assembleias de voto são meras organizações administrativas, por áreas geográficas, onde os eleito-
res vão votar.
70 Era o caso do ditador na República Romana.
71 Cfr. MARTIM DE ALBUQUERQUE,As regências na história do direito público e das ideios políticas em Por-
tugal, Lisboa, 1973.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
75 Cfr. JORGEMIRANDA, Deputado, cit., págs. 23, 24 e 64 e segs., e Notas sobre a renúncia do Presidente
da República, in Revista do Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 2004, págs. 295 e segs., e
PAULOOTERO,A renúncia do Presidente da República, Coimbra, 2004.
76 Cfr. JAMESW. CARNER,La révocation des agents publics par le peuple aux Etats-Unis, in Revue du droit
public, 1920, págs. 510 e segs.; MARIA BENEDITAURBANO,O referendo, Coimbra, 1998, págs. 79 e segs.
77 Cfr. a nossa síntese e a de CARDOSODA COSTA,respetivamente em Verbo, XXIX,págs. 1605 e segs., e in
Polis, 11,págs. 628 e segs. A bibliografia especializada é imensa: V., por todos, MAUROVOLPI, Lo sciaglia-
menta antecipato dei Parlamento e la classificazione dei regime contemporanei, 1983.
78 Sobre dissolução, v. a nossa síntese e a de CARDOSODA COSTA,respetivamente, in Verbo, XXIX,págs.
1.605 e segs., e in Polis, 11,págs. 628 e segs. A bibliografia especializada noutros países é imensa: V., por
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
s ici itude indi iduai temporária a ub tituição do Pre idente pelo Vi-
ce-Pre idente, em república pre idenciai (no Bra il, art. 79° da on tituição);
a ub tituição do titular pelo titular de outro órgão (em Portugal, do Pre idente
da República pelo Pre idente da A embleia da República, egundo o art. 132°
da on tituição); ou, tratando-se de parlamentar, pelo candidato a eguir na li ta
de candidatura ou, em certos paí e , pelo candidato uplente.79
ici itude indi iduai definiti as, a uce ão pelo herdeiro do trono (em monar-
quia), a uce ão pelo Vice-Pre id nt em república pre idencial; ou a ub tituição
interina até no a eleiçõe, com pod re reduzido (arts. 132° e J 39° da on titui-
ção portugue a, quanto ao Pre idente da República); e, quanto ao parlamentare, a
ub tituição em termo idêntico à que ocorre em caso de vici itude temporária.
todos, MAURO VOLPI, Lo scioglimento antecipato dei Parlamento e la c1assificazione dei regimi cantem-
poranei, Rimini, 1983.
79 Na França, com sistema maioritário uninominal para a eleição da Assembleia Nacional, cada Deputado
tem um suplente, cuja situação se avizinha da do Vice-Presidente nos Estados Unidos.
80 Cfr., por todos, DIOGO FREITASDO AMARAL, Governos de Gestão, 2~ ed., S. João do Estoril, 2002.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
81 É juridicamente inexistente a dissolução de um órgão colegial sem marcação de novas eleições, a rea-
lizar nos sessenta dias seguintes e pela lei eleitoral vigente ao tempo da dissolução (art. 113º, nº 6, da
Constituição portuguesa); bem como a da Assembleia da República nos seis meses posteriores à sua
eleição, no último semestre do mandato do Presidente da República e na vigência do estado de sítio ou
de emergência (art. 172º, nO'1 e 2). Mas, se um desses órgãos for dissolvido no respeito destas regras e
depois não ocorrerem as eleições nos sessenta dias seguintes (ainda art. 113º, nº 6), o órgão em causa
deverá entender-se que continuará em funções até que as eleições finalmente se venham a realizar.
82 Cfr. ANTONIO AUGUSTO ROMANO, La Praragatio negli Organi Castitucionali, Milão, 1967; TEMISTOCLES
MARTINES,Prime osservazioni sul tempo nel diritto costitucionale, in Scritti in onore di Salvatore Pugliat-
ti, obra coletiva, 111, Milão, 1978, págs. 832 e segs.; G. O'ORAZIO, Proraga delle Camere, in Encic/opedia
dei Diritto, XXXVII, 1988, págs. 415 e segs.; PAULOOTERO, O poder ..., 11, págs. 452 e segs.; FRANCESCO
SAVERIOMARINI, 11principi di continuità degli organi castituzionali, Milão, 1997; LUIS AGUIAR DE LUQUE,
Una nueva reflexión sobre la prorogatio de los órganos constitucionales, in Revista Espaiíola de Derecho
Constitucional, nº 85, janeiro-abril de 2009, págs. 83 e segs.
83 Noutros países, v. o art. 77 da Constituição italiana (reunião das Câmaras dissolvidas para efeito de
conversão de decreto-lei) ou o art. 28-A da Constituição húngara, após 1989 (convocação das Câmaras
em estado de guerra, de perigo de guerra ou de situações de emergência).
Capítulo 111
ATOS JURíDICO-CONSTITUCIONAIS
§ 1º
Atos jurídico-constitucionais em geral
1 Cfr. MARCelO REBelO DESOUSA, o valor jurídica ..., cit., pág. 106; ANDRÉ RAMOSTAVARES,Curso de Direito
Constitucional, São Paulo, 2003, págs. 121 e segs.; CARLOSBLANCODE MORAIS, Curso ..., I, cit., págs. 63
e segs.
2 Cfr., por todos, DIOGO FREITASDO AMARAL, Curso ..., I, cit., págs. 149 e segs.
3 MIGUel GALVÃOTelES, Direito Constitucional ..., cit., pág. 68.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
I - Tal como no demai ato jurídico , na análise de qualquer ato jurídico-con titu-
cional p dem er con iderado pre upo to I mento ainda requi ito .
O pres upostos vêm a er condiçõe prévia e exteriore ao ato, de que dep nde a
ua exi tência ou a sua formação. Os elemento ão parte integrante do ato, definidora
do eu modo de er ou da ua e trutura. O requi ito , finalmente, ão o pre upo to e
o el mento tomado não tanto da per peti a da e trutura quanto dada ua conformidade
com a norma jurídica e da apreciação que e ta faz obre ele.
abe- e bem, toda ia, como e oferecem algo ariá ei a terminologia e a pró-
pria concetologia quer em Direito privado, quer em Direito público.7
4 Cfr. ANTONIO M. GARcíA QUADRADO,Aproximación a una teoria de los "atos constitucionales", in Revista
de Derecho Público, n2 46, 1999, págs. 39 e segs., ou LUIGI VENTURA, Motivazione (degli atti costituzio-
nali), in Digesto delle Discipline Pubblicistiche, X, págs. 30 e 31.
5 Donde a separação de águas entre o Direito constitucional, por um lado, e, por outro lado, o Di-
reito administrativo, o Direito judiciário e o Direito processual.
6 Pode haver atos da função administrativa e da função jurisdicional inconstitucionais. Na prática, serão
raras as hipóteses de inconstitucionalidade (direta) e, quando ocorram, os mecanismos de fiscalização
serão, de ordinário, os mecanismos gerais do contencioso administrativo e dos recursos, não os pró-
prios da garantia da constitucionalidade. Problema grave é apenas o das decisões judiciais inconstitu-
cionais, relativamente às quais, esgotados os recursos ordinários, de jure condendo deveria admitir-se
recurso para Tribunal Constitucional, como propusemos em Ideia para umo revisão constitucional em
1996, Lisboa, 1996, pág. 29. Sobre atos da função administrativa, v. DINAMENE DE FREITAS,O ato admi-
nistrativo inconstitucional, Coimbra, 2010.
7 Cfr. na doutrina, considerando ora os atos jurídico-públicos em geral, ora especificamente os atos ad-
ministrativos, FEZASVITAL, Do oto jurídico, cit., págs. 86 e 138 e segs., e Direito Constitucional, cit., págs.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado
a) A vontade - uma vontade forço amente funcional (in i ta- e), o que tem como
con equência a nece sidade de, pelo meno ,eventuai ICIO na ua formação
(como o erro ou a coação) não poderem de enhar- e em molde idênticos aos
do ício do negócio jurídico; 10
8 Cfr., algo diversamente, MARCELOREBELODESOUSA(O valor jurídico ..., cit., págs. 115 e segs.), que distin-
gue um pressuposto subjetivo (a existência do sujeito autor do ato); um pressuposto subjetivo-objetivo
(a sua competência); e pressupostos objetivos (abarcando aqui as situações de fato de cuja ocorrência
depende a possibilidade de praticar o ato ou de o praticar com determinados contornos conforme os
pressupostos são da liberdade de atuação ou da própria liberdade de conformação de elementos do
ato, e estes pressupostos objetivos podem ser ou não considerados relevantes pelo Direito conforme
os tipos de atos considerados).
9 Quanto à lei, recorde-se a análise de PAULLABAND, Le Droit Public de I'Empire Allemand, trad., 11,Paris,
1901, págs. 264 e segs.
10 V., por exemplo, MASSIMO SEVEROGIANNINI, L'iIIegittimità degli atti normativi e delle norme, in Rivista
italiana per le scienze giuridiche, 1954, págs. 59 e 60; ou COSTANTINOMORTATI, La Volontà e la Causo
nell'Atto Amministrativo e nella Legge, in Scritti, 11, Milão, 1972, págs. 473 e segs., máxime 567-568 e
586 e segs.; JORGEMIRANDA, Manual ..., VI, cit., págs. 109-110. Cfr. MARCELOREBELODE SOUSA,O valor
jurídico ..., cit., págs. 106 e segs. e 314.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
11 Cfr. MASSIMO SEVEROGIANNINI, L'iIIegittimità ..., cit., loc. cit., pág. 65 (o fim da norma faz parte da nor-
ma, há uma coincidência absoluta entre a vontade querida e o resultado concreto - o que é caraterís-
tica essencial da vontade); ou COSTANTINOMORTATI, La Volontà ..., cit., loc. cit., págs. 569 e 596 e segs.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
to li re e atos devido;
to unilaterai e ato plurilaterai
to imple e ato compl xo ,n te obre aindo o ato colegiai
12 Cfr. a distinção entre validade e regularidade nos arts. 1132, n2 7, e 2232, n2 2, alínea e, da Constituição
portuguesa.
13 V., para mais desenvolvimentos, Manual ..., VI, cit., págs. 96 e segs.
14 Cfr. COSTANTINOMORTATI, Istituziani ..., I, cit., págs. 253 e segs.; ou GIANNI FERRARA,GIi aerti costituzio-
nali, Turim, 2000. Este segundo Autor distingue quatro categorias: atos pré-constitutivos (votações,
nomeações), atos propulsivos da dinâmica constitucional (marcação de eleições, propostas), atos de
vigência monocráticos (mensagens, devoluções de leis ao Parlamento) e atos de órgãos complexos e
colegiais (deliberações).
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
- Decisões e deliberações.
Quanto ao objeto:
Quanto à forma:
18 Sobre a fundamentação dos atos jurisdicionais, cfr., por exemplo, o acórdão nº 310/94 do Tribunal
Constitucional, de 24 de março, in Diário do República, 2~ série, de 29 de agosto de 1994.
19 Naturalmente, uma fundamentação pode sempre depreender-se dos debates parlamentares relati-
vos a qualquer lei ou a qualquer decreto legislativo regional ou constar do preâmbulo de qualquer
decreto-lei.
20 À luz do princípio tempus regit octum: cfr. supra.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
III - Tem-se ob ervado, entretanto, que não ão a imilávei a forma da função juris-
dicional e a das outra funções do Estado, em virtude de aquela e dirigir - ao contrário
da outra - ao cumprimento ou à realização do Dir ito, com a con equente necessidade
de uma regulamentação mais pormenorizada, den a, preci a, rígida e ritualizada.
A im, por exemplo, Rogério oares escreve que a prática de vário ato ao longo
de um certo período, com a intenção de ervirem a produção de um re ultado único, pode
assumir duas formas bem diferente. Uma é aquela em que a gradual produção do ato fi-
nal se desenvolve segundo uma tramitação, i to é, egundo um conjunto de ato nece á-
rio e minucio amente fixado , egundo fórmulas rígidas de agir; e é para e te modo que
e u a a expre ão proce o. Já no procedimento, o resultado é um modelo mai fluido, há
um desenvolvimento, uma ucessão que adquire sentido como uma unidade vista a partir
do ato final. E, o Dir ito é para o procedimento do funcionário pre upo to e limite
da ua atuação, para o proce o do juiz é o fim primário.25
Por i o, para tomar mai claro o contra te, tende- e a adotar o termo procedimento
para de crever a formação do ato da função administrativa, bem como a do ato da
função legislativa e da função govemativa, deixando a palavra processo para a função
juri dicional. Ou adota-se agora um conceito lato de procedimento aplicável a ato de
qualquer função, independentemente dos fin , e contrapõe- e processo a procedimento
em entido e trito.26-27O ódigo do Procedimento Admini trativo, publicado em Portu-
gal, m 1991, confirma e a orientação.28
Por outro lado, realça- e o ignificado do procedimento no contexto global do i-
tema. Para além d uma maior adequação à e trutura própria da vontade funcional,29
a ocia- e-lhe o reforço da tran parência e da publicidade da decisõe do E tado.30 Ele
re ela- e impre cindível para a participação e a democracia participati a, quando não
(na linha de IKLA LUHMA ) para a legitimação dos ato ou do próprio poder.J1 E eria
25 A propósito dum projeto legislativo: o chamado Código do Processo Administrativo Gracioso, in Revista
de Legislação e de Jurisprudência,nº 3.703, fevereiro de 1983, págs. 295 e 296.
26 Cfr., classicamente, ALDO M. SANDULLI, 1/ procedimento amministrativa, 1940, reimpressão, Milão,
1965; FELlCIANOBENVENUTII, Funzione amministrativa, procedimento, processo, in Rivista Trimestrale
di Diritto Pubblico, 1952, págs. 118 e segs.; SERIOGALEOTII, Contributo 0110 teoria dei procedimento
legislativo, Milão, 1957, págs. 13 e segs.; ou ainda ROBERTALEXY,Theorie der Grundrechte, 1986, trad.
castelhana, Teoria de las Derechos Fundamentales, Madrid, 1993, págs. 456 e segs. E, entre nós, ANT6-
NIO BARBOSADEMELO, O vício de forma no ato administrativo (algumas considerações), dissertação iné-
dita, Coimbra, 1961, págs. 19 e segs.; e, mais recentemente, PAULOFERREIRADACUNHA,O procedimento
administrativo, Coimbra, 1987, máxime págs. 57 e segs. e 96 e segs.; J. J. GOMES CANOTlLHOe VITAL
MOREIRA,Fundamentos da Constituição, Coimbra, 1991, págs. 182 e segs.; VASCOPEREIRADA SILVA,op.
cit., págs. 301 e segs.; PEDROMACHETE,A audiência dos interessados no procedimento administrativo,
Lisboa, 1995, págs. 47 e segs.; JoÃo LOUREIRO,O procedimento administrativo entre a eficiência e a
garantia dos particulares, Coimbra, 1995, págs. 17 e segs. e 39 e segs.; DAVID DUARTE,Procedimento,
participação e fundamentação: para uma concretização do princípio da imparcialidade, Coimbra, 1996,
págs. 19 e segs.; MÁRIO ESTEVESDE OLIVEIRA, PEDROCOSTAGONÇALVESe JOÃO PACHECODO AMORIM,
Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª ed., Coimbra, 1997, págs. 33 e segs.; CoLAÇO
ANTUNES,O procedimento administrativo de avaliação de impato ambiental, Coimbra, 1998, págs. 107
e segs.; J. J. GOMESCANOTILHO,Direito Constitucional ..., cit., 3ª ed., págs. 899 e segs., e 7ª ed., págs. 545
e 1.169-1.170; MARCELOREBELODESOUSAe ANDRÉSALGADODE MATOS,op. cit., 111,págs. 56 e segs.
27 De resto, mesmo em Direito processual há muito se distingue entre processo e procedimento. Cfr. MA-
NUELDEANDRADE,Noçães Elementares de Processo Civil, I, Coimbra, 1956, pág. 6: o processo (em senti-
do jurídico) é um verdadeiro procedimento, traduzido num encadeamento de atos destinados a desem-
bocar em certo fim. Ou TEIXEIRADESOUSA,Introdução do Processo Civil, Lisboa, 1993, págs. 12 e segs.
28 Depois de, numa primeira fase, ter chegado a ser elaborado um projeto de Código do Processo Admi-
nistrativo Gracioso.
De observar, desde logo, o art. 12, para o qual procedimento administrativo é a sucessão ordenada de
atos e formalidades tendentes à formação e manifestação da vontade da Administração Pública ou à
sua execução e processo administrativo o conjunto de documentos em que se traduzem esses atos e
formalidades. ~ este um conceito instrumental do processo.
29 Sobre função e procedimento, v., por todos, FRANCOBASSI,op. cit., págs. 120 e segs., máxime 136.
30 Cfr., por todos, VIEIRA DEANDRADE,O dever ..., cit., págs. 313 e segs.
31 Legitimation durch Verfahren, 1969, trad. portuguesa Legitimação pelo procedimento, Brasília, 1980.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
me mo, doutro pri ma, um in trumento para a conver ão da on tituição (con iderada
tradicionalmente, de uma forma e tática, como ordem jurídica fundamental do E tado)
na ordem dinâmica da comunidade.32
V - eja como for, um ponto afigura- e eguro: cada ato in erido no procedimento ou
no proce so legi lativo ou político tem de er apreciado, quanto à ua alidade e à sua regu-
laridade, de per i; não há que apreciar ó o re ultado final ou o ato em que e t e traduz.
Importa, contudo, di tinguir aqui entre o atos dos órgão do E tado e o ato do co-
légio eleitoral ou do povo ati o - eleição e referendo. Conforme re ulta da juri prudência
do Tribunal on titucional portuguê ,não pode er a m ma a r le ância da impugnação
da validade num e noutro ca o.
Uma ordem con titucional democrática, como diz o Tribunal, pre up-e a ob ervância
de todo o proc dimentos pre iamente e tabelecido e regulado. o tocante ao ato le-
gi lativo do Parlamento, a otação na generalidad a otação na p cialidad e a otação
final global não con tituem um iter uce i o d formação d ontad m qu o momento
po teriore pude em, em mai ,elidir o anterior ; e, por i o, não é de aceitar a po ibi-
lidade de anação da votação da e p cialidade por força da otação final global.34-35
Pelo contrário, na eleiçõe e no referendo - por envol erem múltiplo ato pra-
ticado por órgão diver o em fa e relati amente indep nd nte ou em a embleia
diver a em certa fa e - já erifica um fenómeno de preclu ão. Qualquer ato é im-
pugnável; ma , não o tendo ido ou tendo ido indeferida a reclamação ou não provido o
recur o obre ela, não mai poderá er conte tado no futuro.
O processo eleitoral, nota ainda o Tribunal Con titucional, de envolve- e em cascata,
de tal modo que nunca é po ível pa ar à fa e eguinte em que a fa e anterior e teja defi-
nitivamente con 0lidada.36 E daí decorr o princípio de aquisição progre i a do ato, por
32 GOMES CANOTlLHO, Direito Constitucional ..., cit., 3~ ed., pág. 900. V. também, deste Autor, Tópicos de
um Curso de Mestrado sobre Direitos Fundamentais, Procedimento, Processo e Organização, Coimbra,
1990.
33 V. o problema em PEDROMACHETE, op. cit., págs. 55 e segs.
34 Acórdão n2 289/92, de 2 de setembro, in Diário da República, 2~ série, de 19 de setembro de 1992. Cfr.
o nosso comentário, favorável, in O Direito, 1994, págs. 279 e segs.
35 O Tribunal reiteraria esta doutrina no acórdão n2 868/96, de 4 de julho, in Diário da República, 1~
série-A, de 16 de outubro de 1996.
36 Acórdão n2 262/85, de 29 de novembro, in Diário da República, 2~ série, de 18 de março de 1986.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
fonna que o diver o e tágio ,depois de consumados e não conte tado no tempo útil para
tal concedido, não po am ulteriormente, quando já se percorre uma fase diver a do iter
eleitoral, vir a er impugnados. A não ser assim, o proce so eleitoral, delimitado por uma
calendarização rigoro a, acabaria por er ubvertido mercê de decisões extemporâneas,
que, em muitos ca o ,determinariam a impo ibilidade de realização dos atos eleitorai .37
ll- Mas há abstenções ou atitudes de nonfacere que o Direito trata doutro modo,
valorando-as negativamente como comportamento omi ivo ou omissões. E aquijá não
no encontramos diante de ato jurídico-con titucionais,39 embora as omissões possam
elas própria provocar a produção de novo ato jurídico-con titucionais.
Com efeito, a exi tência de omissões juridicamente relevantes é um fenómeno que
se encontra em diver o setore do ordenamento e, em particular, no Direito con titucio-
na!. Ela verifica- e empre que, mandando a norma reguladora de certa relação ou itua-
ção praticar certo ato ou certa atividade nas condiçõe que estabelece, o destinatário não
o faça, não o faça no termo exigidos, não o faça em tempo útil, e a e e comportamento
se liguem con equências mais ou meno adequadas.
Relativamente a quai quer funções do Estado, não custa surpreender manife taçõe
po ívei - e não apena teórica - de comportamento omi ivo, ejam omis õe de
ato normativo, ejam de ato de conteúdo não normativo ou individual e concreto.
uc de i to com a função legi lativa e com a função gov rnativa, e até com a re i ão
constitucional; ucede i to com a função admini trati a e pode uceder até com a função
juri dicional. Tai comportamento vêm, a im a er incon titucionai ou ilegai , con 0-
ante o ca o , e podem ainda tornar- ilícito .40
Pode ha er incon titucionalidade por omi ão dato legi lati o (ou o que, para
aqui, ale o m mo, por omi ão de norma I gi lati a ): por e mpl, quando p rante
norma con titucionai não exequí ei por i me ma , o legi lador não edite a lei ne-
ce ária para Ih conferir concretização.
Pode ha er incon titucionalidade por omi ão de ato político ou de governo. ntre
outra hipót e p n - e na não marcação do dia da eleiçõe, na não de ignação d
titulare de cargo con titucionai ou na não promulgação de lei quando de ida ou na
falta de referenda ministerial, identicamente, quando devida, etc.
m uma, ituaçõe de fato, comportamentos aparentement iguai adquirem enti-
do jurídico diferente con oante o critério da norma jurídica ora como ato tácito
ora como omi õe inconstitucionai - o que mo tra, mai uma vez, como o tado e a
sua atividade e movem no âmbito do Direito e têm de e compreender à ua luz.
O poder con tituinte material tem a marca do tempo hi tórico em que e exerce;
m geral, a interpretação e oluti a da on tituição formal, a formação do co -
tum , obretudo a edimentação, o de en oI imento a tran fi rmação da in-
tituiçõe po tulam período de tempo mai ou meno longo ;
o tempo e produzem o ato de formação proc dimental;
A aplicação da norma tem uma dimen ão de âmbito temporal, produzindo
efeito quer em relação a norma ordinária po teriore quer em relação a nor-
ma anteriore (donde a di tinção entre incon titucionalidade originária e in-
con titucionalidade upervenient);
40 Cfr. a tentativa de teoria geral (embora centrada no Direito administrativo e na jurisprudência francesa
e sem falar em inconstitucionalidade por omissão) de PIERREMONTANÉ DE LA ROQUE, L'lnertie des Pou-
voirs Publics, Paris, 1950; ou, sobre a efetivação dos comandos constitucionais e legislativos no tempo,
a perspetiva de EMANUELE TUCCARI, L'attuazione legislativa, in Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico,
1982, págs. 363 e segs.
41 V. COSTANTINOMORTATI, Istituzioni ..., I, cit., págs. 233 e segs.; TEMISTOCLEMARTINES, op. cit., loe. cit.,
págs. 795 e segs.; PAOLOClOCOLl NACCI, 1/Tempo nel/a Costituzione, Pádua, 1984; MARILlSA D'AMICO,
Riflessioni sulla nozione di tempo nel Diritto Costituzionole, in Jus, 1992, págs. 39 e segs.; CARMEN LÚCIA
ANTUNES ROCHA, Conceito de urgêncio no Direito Público Brasileiro, in Revista Trimestral de Direito
Público, 1993, págs. 233 e segs.; AFONSO D'OLlVEIRA MARTINS, Para uma teoria dos adquiridos cons-
titucionais, in Estudos em homenagem ao Prof Doutor Rogério Soares, obra coletiva, Coimbra, 2001,
págs. 1.049 e segs.; WLADIMIR BRITO, Tempo e Direito. A propósito de umo revisão constitucional, in
Thenis, nº 8, 2004, págs. 79 e segs.; 1I0R BARSHACK,Time ond Constitution, in International Journal of
Constitutional Law, 2009, págs. 553 e segs.; FABIANA MARION SPENGLER,Tempo, Direito e Constituição,
Porto Alegre, 2008. Cfr., em perspetiva mais ampla, JEAN-LouIS BERGEL,Théorie Générale du Droit, 4~
ed., Paris, 2004, págs. 121 e segs.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
Também a incon titucionalidade por omi são só se verifica passado certo tempo
apó a emanação da norma con titucional (sempre se a norma é programática,
quase sempre se é precetiva não exequível por i me ma).
§ 2º
Atos legislativos
a) A lei como norma jurídica, como ordenamento jurídico po itivo ou até como
Direito;
b) A lei como fonte intencional unilateral de Direito44 - criação (ou, doutra óti-
ca, revelação) de normas jurídica por ato de autoridade dirigido a e e fim
42 Como se sabe, os fatos jurídicos distinguem-se dos atos jurídicos (entre os quais os atos jurídico-cons-
titucionais) por, independentemente de qualquer manifestação de vontade, determinarem efeitos ju-
rídicos.
43 Cfr. TEMISTOCLE MARTINES, op. cit., loc. cit., pág. 815.
44 Sobre fontes de direito, v., entre tantos, C. K. ALLEN, Law in the making, 7~ ed., Oxónia, 1964; CAS-
TANHEIRA NEVES, As Fontes de Direito e o problema da positividade jurídica, in Boletim da Faculdade
de Direito da Universidade de Coimbra, 1976, págs. 95 e segs., e Fontes de Direito, in Pólis, 11, págs.
1.512 e segs.; ANTONIO RUGGERI, Gerarchia..., cit., págs. 80 e segs., e Fonti enorme nell'ordinamento e
nell'esperienza costituzionale, I, Turim, 1993; JoÃo BAPTISTA MACHADO, op. cit., págs. 153 e segs.; IGNA-
CIO DE ano, Derecho Constitucional- Sistema de Fantes, Barcelona, 1987, págs. 69 e segs.; GUSTAVO
ZAGREBELSKY, Manuale do Diritto Costituzionale, I, Pádua, 1988, págs. 3 e segs.; TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ
JÚNIOR, Introdução ao Estudo do Direito, São Paulo, 1988, págs. 200 e segs.; MIGUEL REALE, Fontes e
Modelos de Direito, São Paulo, 1994; L1vlo PALADIN, Le Fonti deI Diritto Italiano, Bolonha, 1996, págs.
15 e segs.; PIER FRANCESCO GROSSI, Considerazioni intraduttive per uno studio sulfa fonti, 4~ ed., Roma,
1999; LUCIO PEGORARO e ANGELO RINELLA, Lefonti nel Diritto Comparato, Turim, 2000; J. J. GOMES CA-
NOTILHO, Direito Constitucional ..., cit., págs. 693 e segs.; ANTÓNIO SANTOS JUSTO, Introdução ao Estudo
do Direito, 2~ ed., Coimbra, 2003, págs. 187 e segs.; DIOGO FREITAS DO AMARAL, Manual de Introdução
ao Direito, Coimbra, 2004, págs. 343 e segs.; JosÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito ..., cit., pág. 255 e
segs.; FERNANDO JOSÉ BRONZE, Liçõesde Introdução ao Direito, 2~ ed., Coimbra, 2006, págs. 683 e segs.;
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
45 É neste sentido que o art. Iº, nº 2, do Código Civil considera "leis todas as disposições genéricas pro-
vindas dos órgãos estaduais competentes" e "normas corporativas as regras ditadas pelos organismos
representativos das diferentes categorias morais, culturais, económicas ou profissionais, no domínio
das suas atribuições, bem como os respetivos estatutos e regulamentos internos". Cfr. MÁRIO BIGODE
CHORÃO, Temas Fundamentais de Direito, Coimbra, 1986, págs. 207 e segs.; PIRESDE liMA e ANTUNES
VARELA,Código Civil Anotado, I, 4ª ed., Coimbra, 1987, págs. 51-52; PAULOFERREIRADA CUNHA, Princi-
pios ...• cit., págs. 329 e 331 (numa aceção muito ampla); DIOGO FREITASDO AMARAL, Revisão dos artigos
12 a 13º do Código Civil, in Themis, nº 1, 2000, pág. 12.
46 V. JORGEMIRANDA, Resolução, in Dicionário Jurídico da Administração Pública. VII. págs. 241 e segs.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
h) A lei como ato ob forma de lei, recortado não tanto p lo conteúdo quanto p lo
proce de formação e pela forma final implicando a forma determinada
força jurídica - a força de I i - ha endo di er a forma de lei con oante a
tramitaçõe que a lei igam ou o órgão que a editemY
11- ompul ando, por exemplo, uma on tituição como a portugue a, verifica- e
que me mo aí a referência a "lei' ão múltipla e plurí oca .
Tanto e trata de lei no 6° entido (art. 4°, 5°, n° 2, 15°, n 2 e 4, 18°, 199°, alínea c,
266°, nOI), como de lei no 1° entido (art. \30 ou 203°), no 3° (art. 3°, nO3) na 4" aceção
e, pro a elmente, na 8" (art. 3°, nO2, 199°, alínea/, 202°, nO2, 219°, nOI, 272°, nOI) ou
na 7" aceção (art. 112°, nOI 134°, alínea b, 166°, nOS2 e 3).
ão aparece, entretanto, referida a 2" aceção, nem con agrada a 5". A Con tituição
epara, com nitidez, a lei como ato normativo de eficácia externa (ou predominantemente
externa) do regimento da A embleia da República, do on elho de E tado e da A -
embleia Legi lativa regionais (arts. 119°, nOI, alínea/, 144°, nOI, 156°, alínea g, 175°,
alínea a, 176°, 177°, 178°, 232°, n° 3). ó aparentemente e a tal aceção se encontra nos
art . 198°, nO2, 161°, alín a d, in fine, 162°, alínea c, e 169°, n° I, ao e tabelecer- e uma
competência legi lativa exclu i a do overno re peitante à ua organização e ao eu
funcionamento; regimento é apena o do on elho de Mini tro .
111- 4", a 5" e a 6" aceçõe corre pondem à habitualmente chamada lei em entido
material; a 7", à I i em entido orgânico-material, enquanto traduz um duplo princípio
de eparação d podere e de repre entação política; a ", à lei em entido formal ou
orgânico-formal.
É br a 6", a 7" e a ,. aceçõe que ai er ar a análi e do pre ente capítulo e do
guinte . O 1° e o 2° entido cabem de pleno na Teoria G ral do Direito (embora não
eja po í el compreender a lei como ato legi lati o de ligado do entendimento dado ao
Direito objeti o em geral). O 3° itua- e no âmbito da Teoria Geral do Direito Público; e
o 4° também no da Teoria da on tituição. Quanto à norma regimentai, apena terão
de er tida em linha de conta (o que, aliás, não erá pouco) no âmbito do e tudo do pro-
cedimento legi lati o parlamentar.
1- A lei como ato da função legi lativa - ou, tanta veze, em alcance conexo com
ela, como Direito decretado pelo tado - con titui um do tema recorrentes da ciência
ju publicí tica e, ante e para além de ta, da filo ofia política e jurídica.
De de a antiguidade clá ica têm ido objeto de indagação con tante a ua e ência,
o eu fundamento e o eu limite a ua relação com o bem comum ou com o princípio
da unidade política e a autoridade donde deve emanar. Amai ignificati a conceçõ
A lei, ordenação da razão (S. TOMÁ DEAQulNO e, de certo modo, ainda UAREZ);
A lei, vontade do soberano (ROSSE );
A lei, garantia da liberdade civil e da propriedade (Lo KE);
A lei ligada à divi ão do poder e ao equilíbrio das instituições (Mo T SQUI );
A lei, expres ão da vontade geral (Rou EA );
A lei, vontade racional (KA T);
A lei, instrumento para a utilidade e a felicidade geral (SE THAM);
A lei, manifestação imediata do poder soberano (Au TI );
A lei, instrumento do domínio de cla e (MARX, E GEL );
A lei, e calão de normas imediatamente a seguir à Constituição (K LS );
O conceito político de lei (S HMITI).48
48 Cfr. JÜRGENHABERMAS,Mudança estrutural da esfera pública, cit., págs. 70 e segs. e 211 e segs.; ROQUE
CABRAL,Lei, in Verbo, XI, págs. 1.662 e segs.; GUIDO FASSO,Legge (teoria generale), in fnciclopedia dei Di-
ritto, XXIII,1973, págs. 783 e segs.; CHRISTIANSTARCK, Der Gesetzesbegrif! des Grundgesetzes, trad. castelha-
na fi concepto de la ley en la Constitucion Alemana, Madrid, 1979, págs. 159 e segs.; CASTANHEIRA NEVES,
O instituto ..., cit., págs. 492 e segs.; JEAN-MARtETRIGEND,Le procéssus législatif: élements de philosophie
du droit, in Archives de Philosophie du droit, 1985, págs. 245 e segs.; FRANCESC DECARRERAS, La ley en el
constitucionalismo y en la Constitución espanola, in Diez anos de desarollo constitucional- fstudios em
homenaje 01 Profesor Luis Sanchez Agesta, obra coletiva, Madrid, 1989, págs. 289 e segs.; MARIA RaSARIA
DONNARUMMA,La nozione di legge nella cultura francese, in Diritto e Società, 1990, págs. 467 e segs.; JosÉ
ADELlNOMALTEZ,Princípios gerais de Direito, policopiado, 11,Lisboa, 1991-1992, págs. 156 e segs.; MANUEL
AFONSOVAZ, op. cit., págs. 75 e segs.; MANOEL GONÇALVESFERREIRAFILHO, Do Processo Legislativo, 3ª
ed., São Paulo, 1995, págs. 21 e segs.; LUISPRIETOSANCHIS,Ley, princípios, derecho, Madrid, 1998; PAULO
OTERO,Legalidade ..., cit., págs. 45 e segs.; Luís S. CABRALDEMaNCADA, Lei e regulamento, Coimbra, 2002,
págs. 31 e segs.; J. J. GOMESCANOTILHO,Direito Constitucional ..., cit., págs. 713 e segs.; ARTHURKAUFFMANN,
Rechtsphilosophie, 1957, trad. portuguesa Filosofia do Direito, 2004, págs. 209 e segs.
49 "A forma de governo depende do poder supremo que é o poder legislativo. Sendo impossível conce-
ber-se que o poder inferior prescreva ao supremo ou que outro qualquer que não o poder supremo
faça as leis, conforme se coloca o poder de fazer leis assim também é a forma da comunidade" (Second
Treatise of Government, capo Xl.
50 "No corpo político distinguem-se a força e a vontade; esta sob o nome de autoridade legislativa, a outra
sob o de autoridade executiva ... O poder legislativo pertence ao povo ... O governo é um corpo interme-
diário que não existe senão pelo soberano" (Ou contrat social, capo I do livro 111).
51 "Quando, na mesma pessoa ou no mesmo corpo de magistrados, o poder legislativo se encontra reu-
nido ao poder executivo, não há liberdade; porque pode temer-se que esse monarca ou esse senado
faça leis tirânicas para as executar tiranicamente" (De I'Esprit des lois, capo VI do livro XI).
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado ••
I- cada tipo hi tórico de tado corre ponde uma certa configuração da lei no
âmbito da orden jurídica po iti a (em interação com a corr nt doutrinai pre a-
lecente ). E em cada uma da grande fa e de de en 01 imento de cada tipo hi tórico
oferece ainda a lei caraterí tica incontomá ei .
11- Tal como a re peito do fenómeno con titucional, obre ai aqui a contrapo Iça0
entre o período anterior ao lIumini mo e à Revolução France a e o período ub equente.
ão, no e encial, a me ma a cau a do aparecimento da eon tituição material e for-
mai e da metamorfo e da lei.53
Ante do ilumini mo e da Re olução France a, o pe o da lei era (a de peito do e -
forço centralizador do E tado ab oluto) relativamente pequeno;54 lei e Direito objetivo
não e confundiam, não ó devido ao papel de empenhado pelo co tum ma também
de ido à aceitação de certo princípio ético-jurídico ; eram e te ,mai do que a lei, que
conforma am ociedade alicerçada em hierarquias de cla se e funçõe ; a autoridade
da lei ou era pre upo ta ou e triba a- e na legitimidade tradicional do monarca; e era
tanto mai r peitada quanto mai antiga.
Di er amente, a partir do con titucionali mo, a lei tende a dominar todo o ordena-
mento jurídico e tataI e chega a querer- e r duzir a tarefa do juri ta à ua exege e; a
oci dade ão agora ociedade em mo imento com múltipla vici itude, não raro re-
olucionária que a lei acompanha nun ca o e determina (ou supõe- e que detennina),
52 o instituto ..., cit., pág. 479. Cfr. também, por exemplo, LEONEL SEVERO ROCHA, Epistemologia Ju-
rídica e Demacracia, São Leopoldo, 1998, págs. 101 e segs.; ou PLÍNIO SARAIVAMECCARÉ,Juridicidade:
sua compreensão político-jurídica a partir do pensamenta moderno-iluminista, Coimbra, 2003, máxime
págs. 49 e segs.
53 Cfr. Manual ..., 11, cit., págs. 11 e segs., e Autores citados.
54 Cfr., quanto a Portugal - sem esquecer as Ordenações, Afonsinas, Manuelinas e Filipinas - ANTÓNIO
MANUEL HESPANHA,A perspetiva histórica e sociológica, in A Feitura das Leis, obra coletiva (coord. de
Jorge Miranda e Marcelo Rebelo de Sousa), 11, Oeiras, 1986, págs. 65 e segs.; MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA
COSTA,História do Direito Português, 3" ed., Coimbra, 1996, págs. 191 e segs., 256 e segs. e 294 e segs.;
PEDROBARBASHOMEM, A "Ciência da Legislaçõo". Conceptualização de um modelo jurídico no final do
Ancien Régime, in Legislação, n!116, abril-junho de 1996, págs. 15 e segs., Introdução histórica à teoria
da lei - época moderna, ibidem, n!1 26, outubro-dezembro de 1999, págs. 41 e segs., e A lei da liberda-
de, Lisboa, 2001, págs. 51 e segs.; CARLOSBLANCODE MORAIS, As leis reforçadas pelo procedimento no
âmbito dos critérios estruturantes das relações entre atos legislativos, Coimbra, 1998, págs. 26 e segs.
e 539 e segs.; S[LVIAALVES,O espírito das leis - para uma teoria da interpretação da lei no século XVII/,
in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 2001, págs. 106 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
55 No sistema de direito comum só se recorria à lei quando o rei tinha que ofender direitos adquiridos
(ANTÓNIOMANUEL HESPANHA,op. cit., loc. cit., pág. 69). E, se no despotismo iluminado há um aumento
da cadência de produção legislativa, é mais por razões simbólicas do que propriamente por razões
regulativas (ibidem, pág. 73).
Sobre a lei na Inglaterra e na França, cfr., por todos, MAURICEHAURIOU,Précis de Droit Constitutionnel,
2ª ed., Paris, 1929, págs. 224 e segs. e 232 e segs.
56 Sobre a lei no Estado liberal, cfr. CARLSCHMITI, Verfossungslehre, trad. castelhana Teoria de la Cons-
titución, México, 1966, págs. 161 e segs., e Legalitiit, Legitimitiit, trad. francesa Légalité, légitimité,
Paris, 1936, págs. 59 e segs.; CARRÉDE MALBERG,La loi, expression de la volonté générale, Paris, 1931
(há reimpressão de 1984); GEORGESBURDEAU,Essai sur la notion de la loi en droit français, in Archives
de Philosophie du Droit et de Sociologie Juridique, 1939, págs. 7 e segs., e Traité de Science Palitique,
2ª ed., VI, 1971, págs. 340 e segs.; CASTANHEIRANEVES,O instituto ..., cit., págs. 526 e segs.; GUSTAVO
ZAGREBELSKY, op. cit., pág. X; NUNO PIÇARRA,A separação de poderes como doutrina e princípio consti-
tucional, Coimbra, 1989, págs. 155 e segs.; EDUARDOGARCIADEENTERRfA,La lengua de los derechos. La
formación dei Derecho Publico tras la Revolución Francesa, Madrid, 1994, págs. 75 e segoe 114 e seg.;
ROBERTOBLANCOVALDES,La supremacia de la ley y sus consequencias en la teoria constitucional de la
Revolucion francesa, in Anuario de Derecho Constitucional y Parlamentaria (Múrcia), n!! 6, 1994, págs.
77 e segs.; VASCOPEREIRADA SILVA,op. cit., págs. 48-49; BLANCODE MORAIS, op. cit., págs. 30 e segs.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
tingentes nos mai variado etore da vida social, económica e cultural. A complexidade
torna-se inelutável, nem equer se e gota na conhecida dicotomia lei-regra (Rechtsgesetz)
e lei-medida (Massnahmengesetz)57 e entremostram- e fluida a fronteiras entre legi la-
ção e admini tração.
A dilatação de campos, a e pecialização por diversos objetivos e procedimentos e a
pulverização deci ioni ta - conduzindo àquilo a que se tem chamado inflação legislativa
e às lei omniblls (GAR IA DE E TERRíA) - a im como as deficiência da formulação ou
de legí tica forma(58 e a "análise económica do Direito"59 não reforçam a autoridade da
lei. E a i o acre cem a tendência mais recentes de de centralização de poderes norma-
tivo , de participação e até de contratualização no procedimentos60 e de descodificação,
de legalização e de regulação.61
Tudo sem e quecer a retração da lei perante o Direito internacional convencional e o
Direito próprio da organizaçõe internacionais ou entidades afins, em e pecial o Direito
da União Europeia.62
57 Cfr. outras distinções: entre lei de garantia e lei de programa (Contributo ..., cit., págs. 70 e segs., máxi-
me 81 e 83) ou entre lei de arbitragem e lei de impulsão (MANOEL GONÇALVESfERREIRAfiLHO, op. cit.,
págs. 249 e segs. e 258 e segs.).
58 Sobre qualidade de lei, cfr. o nQ 50, de outubro-dezembro de 2009, de Legislação. E sobre a ava-
liação legislativa em Direito comparado, os nQs 33-34, janeiro-junho de 2003.
59 Enquanto pode inculcar uma visão puramente economicista da produção legislativa, mesmo quando
tal não seja a intenção dos que se lhe dedicam (cfr. Manual ..., I, 8ª ed., Coimbra, 2009, pág. 37).
60 Cfr. VITALlNO CANAS, Os acardos religiosos ou a generalização da fórmula concordatória, in Estudos
em memória de Luís Nunes de Almeida, obra coletiva, 2007, págs. 281 e segs.
61 Ambivalente pode ser a prática de experimentações legislativas: cfr. o acórdão nQ 69/2008, de 31
de janeiro, do Tribunal Constitucional, in Diório da República, 2ª série, de 4 de julho de 2008.
62 Sobre a lei nos séculos XX e XXI, cfr. HERMANN HELLER,Der Begriff des Gesetzes in der Reichsverfassung,
1927, trad. italiana 1/concetto di legge nella Costituzione di Weimar, in La sovranità ed altri scritti sulla
dottrina dei Diritto e dello Stato, Milão, 1987, págs. 303 e segs.; GARCIAPELAYO,Derecho Constitucional
Comparado, 8ª ed., Madrid, 1967, págs. 68 e segs.; JORGEMIRANDA, Contributo ..., cit., págs. 80 e segs.;
GEORGESBURDEAU,Traité ..., 2ª ed., VIII, 1974, págs. 451 e segs.; MÁRIO BIGOTIE CHORÃO,Lei, in Polis,
111,págs. 1.042 e segs.; SILVANOLABRIOLA, Crisi della legge e principio di rappresentanza, in Diritto e
Società, 1983, págs. 723 e segs.; A. CASTANHEIRANEVES,O instituto ..., cit., págs. 583 e segs.; GUNTHER
TEUBNER,Aspetti, limiti, alternative della legislazione, in Sociologia dei Diritto, 1985, págs. 7 e segs.;
MANOEL GONÇALVESfERREIRAfiLHO, op. cit., págs. 21 e segs., e Estado de Direito e Constituição, São
Paulo, 1988, págs. 19 e segs.; Luís S. CABRALDE MONCADA, A problemática jurídica do planeamento
económico, Coimbra, 1985, págs. 174 e segs.; ROGÉRIOSOARES,Sentido e limites da função legislativa
no Estado contemporâneo, in A feitura das leis, 11,págs. 431 e segs.; GUSTAVOZAGREBELSKY, op. cit., págs.
XI, XII e 156 e segs., e li Diritto Mite, Turim, 1992, págs. 43 e seg.; PORRASNADALES,Introducción a le
teoría dei Estado postsocial, Barcelona, 1988, págs. 203 e segs.; fRANCESCDECARRERAS, op. cit., loc. cit.,
págs. 293 e segs.; NUNO PiÇARRA,A separação de poderes ..., cit., págs. 253 e segs.; fRANCO MODUGNO
e DAMIANO NOCILLA,Crisi della legge e sistema delle fonti, in Diritto e Società, 1989, págs. 411 e segs.;
J. J. GOMESCANOTILHO,Relatório sobre o programa, os conteúdos e os métodos de um curso de teoria
da legislação, Coimbra, 1990, págs. 43-44 e 48 e segs.; MANUEL AFONSOVAZ, op. cit., págs. 147 e segs.;
MARCELOREBELODESOUSA,A lei no Estado contemporâneo, in Legislação, nQ 11, outubro-dezembro de
1994, págs. 5 e segs.; GIANDOMENICOMAJONE, L'État et les problémes de la réglementation, in Pouvoirs,
nQ 70, 1994, págs. 133 e seg.; VASCOPEREIRADA SILVA,op. cit., pág. 83; CLEMERSONMERLlN CLEVE,A lei
no Estado contemporâneo, in Génesis - Revista de Direito Administrativo Aplicado, 1996, págs. 346 e
segs.; CARLOSBLANCODE MORAIS, As leis reforçadas ..., cit., págs. 69 e segs. e Manual de Legística, lis-
boa, 2007, págs. 79 e segs.; Trasformazione della funzione legislativa. Crisi della legge e sistema della
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
fonte, obra coletiva (org. Franco Modugno), Milão, 2000; FRANCESCOBILANCIA, La crisi deI/' ordinamento
giuridico dello stato rappresentativo, Pádua, 2000, págs. 3 e segs.; PAULO OTERO, Legalidade..., cit.,
págs. 137 e segs.; JOAQUIM FREITASDA ROCHA, Constituição ..., cit., págs. 533 e segs.
Vale a pena transcrever um passo do artigo de CLEMERSONMERLlN CLEVE(pág. 352): "Instrumento de
conservação ou de reforma, a lei é também um instrumento de integração da sociedade. A lei conforma
um corpo simbólico que integra as pessoas que habitam determinado território. - Numa sociedade plu-
ralista, a lei veicula uma vontade política provisória. Provisória, porque decorrente de compromissos e
negociações alcançados no seio do Parlamento e do Poder Executivo. A lei configura então o último mo-
mento de um processo: o da cristalização da condensação das relações de força que se fazem representar
no seio do Estado. Por sua vez esta relação de forças é sempre provisória e instável." Ou atentar no que,
mais pessimista, diz JosÉ DE OLIVEIRAASCENSÃO(O Direito ..., cit., pág. 414): "Atrevo-me a perguntar de a
legislação de emergência não passou a ser hoje a maneira normal de satisfação da função legislativa."
63 Cfr. supra.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
11- É corrente e tab lecer- e corre pondência entr E tado liberal e conceito mate-
rial de lei e entre a ituação do 'culo XX ( eja qual for a natureza do regime político) e
o domínio de um conceito meramente formal.
Tal maneira de er de e r, porém, con iderada com alguma re erva .
Em primeiro lugar, a di tinção - e mai do que a di tinção, a di ociação - do dois
entido remonta já ao éculo XIX (lançada pela doutrina alemã da época, embora muito
marcada pelo condicionali mo da monarquia limitada).64.65
m egund lugar, não faltam Autores bem identificado com a conceçõe do libe-
rali mo e do po iti i mo jurídico que definem a lei com apelo exclu ivamente a elemen-
to formai e ao princípio da ua upremacia frente a quai quer outro ato .66
Em terceiro lugar, além da te e da generalidade, outro ntendimento materiai de
lei têm ido propo to , com mai ou meno êxito, entre o quai o da regra de direito, o
da no idade, o da interferência na e fera d liberdade e propriedade da p oa, o da
execução imediata ou da concretização da on tituição.
Em quarto lugar, a ab tração enquanto caraterí tica da lei em endo po ta em
cau a ou abandonada, obretudo de ido à emergência da lei -medida , nem por i so a
generalidade deixa de continuar a aparecer, enão como propriedade e encial, pelo me-
no (na expre ã de LABA D,67 eguido por tantos outro Autores68 como propriedade
natural da lei.
Em quinto lugar, e a exigência de generalidade e compagina hi toricamente com
a conqui ta do princípio da igualdade perant a lei e a ua crítica vem a er formulada
hoje com frequência em nome de uma igualdade efeti a e r ai, aberta a diferenciaçõe
e a di criminaçõe po iti a , não meno eguro é que em E tado ocial de Direito não
64 Cfr. LABAND (op. cit., págs. 345-346): entre lei em sentido material e lei em sentido formal não há uma
relação de género e espécie, ou de sentido restrito e subordinado e sentido lato; são dois conceitos
essencialmente diferentes, cada um com caraterísticas próprias - um diz respeito ao fundo, outro à
forma da declaração de vontade.
65 Sobre a doutrina dualista alemã, v. CHRISTIANSTARCK,op. cit., págs. 117 e segs., e, entre nós, RUI MA-
CHETE,Contencioso administrativo, cit., loc. cit., págs. 691 e segs.; J. J. GOMES CANOTlLHO,A lei do orça-
mento na teoria da lei, Coimbra, 1979, págs. 7 e segs.; MANUEL AFONSOVAZ, op. cit., págs. 113 e segs.;
CARLOSBLANCODE MORAIS, As leis reforçadas ..., cit., págs. 47 e segs.; MARIA LÚCIAAMARAL, Responsabi-
lidade do Estado e dever de indemnizar do legislador, Coimbra, 1998, págs. 238 e segs.
66 Cfr. a doutrina francesa da 3~ república, em especial CARRÉDE MALBERG, La loi ..., cit., máxime págs.
38-39.
67 Op. cit., 11,pág. 262.
68 Cfr., entre nós, FEZASVITAL, A noção de lei no direito constitucional português, in Revista de Legislação
e de Jurisprudência, ano 55, págs. 401 e segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
há antagoni mo entre as duas v rt ntes; muito pelo contrário, ela completam- e numa
ten ão dialética, em que e interp netram igualdade e proporcionalidade.6907o
JII - O fenómeno das lei concreta e gerai (indep ndent m nte do que eja aí a
generalidad ) não e dá apena com a lei -medida. Ele manife ta- e há muito com a
lei orçamentai, a lei de amni tia e a de declaração d tado de ítio e de outro e-
tado de exceção.
Ma a lei -medida (Ma nahmenge elze, leggi-provvedimenlo) e tão ligada à
complexidade cada ez maior da ida hodierna e à ua aceleração, ao alargamento da
tarefa do E tado e à diver idade de veículo de comunicação entr a ociedade e o poder.
ão lei de intervenção em ituaçõe concreta para preci o efeito e que e traduzem,
poi ,em medida ou providência dirigida à re olução d te ou daquele problema m
tempo útil; ou, numa fórmula conhecida,?' leis em que a aclio dir- e-ia uplantar a ralio
ou a con litutio.72
69 V. Manual ..., IV, cit., págs. 36 e segs. e 239 e segs., e Autores citados.
70 Sobre lei material e lei formal, V., designadamente, L. DUGUIT, op. cit., 11, págs. 160 e segs.; HERMANN
HELLER,Der Begrif! des Gesetzes in der Reichsverfassung, 1927, trad. italiana 1/concetto di legge nelfa
Costituzione di Weimar, in La Sovranità ed altri scritti, Milão, 1987, págs. 303 e segs.; HENRYDUPEY-
ROUX,Sur la générolité de lo loi, in Mélanges R. Carré de Malberg, obra coletiva, Paris, 1933, págs. 137
e segs.; GUSTAVOINGROSSO,Sulfa distinzione fra leggi in senso materiale e leggi in senso formale, in
Studi in onore di Francesco Commeo, obra coletiva, I, Pádua, 1933, págs. 701 e segs.; CARLOESPOSITO,
La Validità delfe Leggi, Pádua, 1934 (há reimpressão de 1964), págs. 77 e segs.; CARLSCHMITI, Teoria ...,
cit., págs. 170 e segs.; BALLADOREPALUERI,Appunti sulfo divisione dei poteri nelfa vigente Costituzione
italiana, in Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico, 1952, págs. 811 e segs.; VEZIO CRISAFULU,Atto nor-
mativo, in Encic/opedia deI Diritto, IV, 1959, págs. 245 e segs., e Lezioni di Diritto Costituzionale, 2! ed.,
11, Pádua, 1971, págs. 18 e segs.; KELSEN,Teoria Pura ..., 11, cit., págs. 78 e 79; FRANCOBASSI,op. cit.,
págs. 12 e segs.; FRANCOMODUGNO, L'involidità delfa legge, I, Milão, 1970, págs. 157 e segs., e Legge,
in Encic/opedio dei Diritto, XXIII, pág. 885, nota; MARCELLOCAETANO,Direito Constitucional, I, cit., págs.
198 e segs.; ANTONIO RUGGERI,Gerorchia ..., cit., págs. 13 e segs., e Fonti e norme ..., I, cit., págs. 29 e
segs.; DIETRICHJESCH,Gesetz und Verwaltung, trad. castelhana Ley y Administración, Madrid, 1978;
CHRISTIANSTARCK,op. cit., págs. 41 e segs. e 272 e segs.; DOMENICOFARIAS,Idealità e indeterminatezza
dei principi costituzionali, Milão, 1981, págs. 3 e segs. e 26 e segs.; MIGUEL REALE,Lições Preliminares
de Direito, lO! ed., Coimbra, 1982, pág. 163; IGNACIODEano, Derecho Constitucional, cit., págs. 162 e
segs.; JoÃo BAPTISTAMACHADO, Introdução ..., cit., págs. 91 e segs.; A. CASTANHEIRANEVES,a instituto ...,
cit., págs. 315 e segs., 399 e segs., 475 e segs. e 590 e segs.; LUISMARíA DIEZ-PICAZO,Concepto de ley y
tipos de leyes, in Revista Espanola de Derecho Constitucional, setembro-dezembro de 1988, págs. 47 e
segs.; GUSTAVOZAGREBELSKY, op. cit., págs. 8 e segs. e 191 e segs.; MANUEL AFONSOVAZ, op. cit., págs.
17 e segs.; CLÉMERSONMERUN CLEvE, Atividade do poder executivo no Estado contemporâneo e na
Constituição de 1988, São Paulo, 1993, págs. 43 e segs., e A lei no Estado contemporâneo, cit., loc. cit.;
EUVALDA SILVARAMOS, op. cit., págs. 15 e segs.; MARTIM DEALBUQUERQUE,Da igualdade -Introdução
à jurisprudência, Lisboa, 1993, págs. 33 e segs.; GARCIADE ENTERRíAe TOMÁSRAMÓN-FERNANDEZ,Curso
de Derecho Administrativo, 6! ed., I, Madrid, 1993, reimpressão de 1994, págs. 105 e segs.; J. J. GOMES
CANOTILHO,Direito Constitucional..., cit., págs. 715 e 716.
71 Difundida por FORSTHOFF.
72 Assim, em Portugal, por exemplo, a Lei nº 2/2010, de 16 de junho (reconstrução da Madeira após a
intempérie de Fevereiro) ou a Lei nº 12-A/2010, de 30 de junho, sobre medidas adicionais de consoli-
dação orça mental.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado _
IV - Pode outro sim haver lei individuai, lei real ou aparentemente individu-
ai , contanto que, por detrá deste ou daquele comando aplicável a certa pe oa, possa
encontrar- e uma pre crição ou um princípio geral e que não e criem privilégio ou
di criminações.78
Tudo reside em saber e a razão de ser da medida concreta e individual que se decre-
ta (tal como a da lei po ta perante a Con tituição flexível) leva con igo uma intenção de
generalidade, se corre ponde a um sentido objetivo ou a um princípio geral, por virtude
do qual se alarga o âmbito da lei de maneira a abranger aquela medida; ou se, pelo con-
trário, e e gota em si mesma, de in erida de qualquer no o juízo de valor legal.79
Uma coi a é então a lei individual ainda reconduzível ao cerne da generalidade, im-
plícita ou indiretamente; 0-81 outra coi a o ato admini trativo ob forma de lei, imple
deci ão de um ca o concreto e individual e que deve (ou deveria) er simple aplicação de
regra preexi tente e ó válido e com ela se conforma. Entretanto, a distinção nem sempre
é fácil e nem sempre é feita.
O que, em Estados de Direito, em caso algum, podem er admitida ão lei individuai
privativa ou restritivas de direitos. A haver tai leis (quando a Constituição as autorize), a ge-
neralidade tem de con tar da re petiva previ ão, tem de e oferecer imediata e inequívoca. 2
78 De resto, se há leis formal ou aparentemente individuais que, no fundo, são gerais, também há leis
aparentemente gerais que, no fundo, ditadas por certa occasio, acabam por ser individuais. Cfr., por
todos, JosÉ DE OLIVEIRAASCENSÃO,A violação da garantia constitucional da propriedade por disposição
retroativa, Porto, 1974, pág. 37; e J. J. GOMES CANOTILHO,Direito à emanação de normas legais indivi-
duais?, in Revista de Legislação e de Jurisprudência, nQ 3.847, fevereiro de 1995, págs. 290 e segs.
79 Cfr., entre tantos, BALLADORE PALLlERI, op. cit., loc. cit., págs. 819 e segs.; Decreto. cit .• pág. 125;
GASPARARINO ORTIZ, Leyes singulares y leyes de caso unico, in Revista de Administración Publica, 1989,
págs. 57 e segs.; NUNO PiÇARRA,A reserva ..., cit., págs. 20 e segs.; JOSEANTONIO MONTILLA MARTOS, Las
leyes singulares en el ordenamiento costitucional espanhol, Madrid, 1994.
80 \I.g., atribuição de pensões ou condecorações a personalidades eminentes, reparação de certas
injustiças, concessão extraordinária de benefícios fiscais.
81 Daí a necessidade de distinguir as leis individuais do jus singulare (que, na linha do Direito romano. é
aquilo que contradiz princípios fundamentais de Direito e se identifica como Direito excecional). Cfr.
SANTI ROMANO, Diritto singolore, in Frammenti ..., cit., págs. 87 e segs.; FRANCOMODUGNO, Norme sin-
golari, specioli, eccezionali, in Enciclopedia dei Diritto, XXVIII, 1978, págs. 507 e segs.; JosÉ DE OLIVEIRA
ASCENSÃO,O Direito ..., cit., págs. 439 e segs.
82 Cfr., por todos, GASPARARINO ORTIZ, op. cit., loe. cit., págs. 71 e 77.
83 GEORGESBURDEAU,Remarques ...• cit., loc. cit., pág. 224.
84 A. CASTANHEIRANEVES,O instituto ..., cit., pág. 481 (v. também pág. 487).
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado ••
teúdo adequado ou apropriado à forma de lei há-de ter, em princípio, e pecial relevância
para o particulares e/ou para a comunidade.85
Por isso, os regulamentos não podem ser leis em sentido material.86 E tão pouco o
podem ser a declaraçõe de inconstitucionalidade e de ilegalidade de normas jurídica
com força obrigatória geral; ou o podem er as súmulas vinculantes.
A im, a relação entre lei em sentido material e lei em sentido fonnal deve estabe-
lecer- e na base de doi círculo concêntrico
lei em sentido
material
regulamento
Il - Pode ha er, por con eguinte, lei g rai e concr ta ou lei -medida, de de
que não ejam obre direito fundamentai como o do art. 240 e eg . da on tituição
portugue a e do art. 50 da Con tituição bra ileira ou obr a aplicação de ançõ ,de ig-
nadamente penai (de resto, dua da esfera nucleare da 'lei jurídica ").
E a Con tituiçõ s consente tamb 'm a exi Cncia d lei indi iduai ,de de que não e-
jam puro ato admini trativos, lei individuais na aceção há pouco referida de lei que obede-
çam a critério gerai de normação, ape ar de formulada para certo ou certo de tinatário .
Tanto as lei -medida como a lei indi iduai têm de obter uma legitimação con -
titucional e pecífica89 ou, no mínimo, de não colidir com o princípio da igualdade;90 não
podem abrir diferenciaçõe arbitrária ; não pod m impor ncargo a un cidadão e não a
outro ;91não podem ubmeter o cidadão ao capricho do poder admini trati o à margem
de uma ordem normati a;92têm de po uir um conteúdo "materialmente geral" - ou ja,
têm de re peitar atualizando-o o princípio con titucionai r levante no ca 0;93e o
legi lador fica vinculado a atribuir o mesmo efl ito a uma ituação igual ju tificati a da
di ciplina anterior.94
Ou ainda: o ato formalmente legislativo não podem ubtrair-se à exigência que
decorrem da garantia gerai do admini trado , no âmbito do procedimentos admi-
ni trati o , como o direito de audiência pré ia, o de fundamentação expre a do ato
admini trativo e o limite à revogação do ato con tituti o de direito .95
87 Como entendem RUI MEDEIROS, Ensaio ..., cit., pág. 18, e BLANCO DE MORAIS, As leis..., cit., pág. 125.
88 Neste sentido, contestando a aplicação aqui do argumento a contrario sensu, INOCÊNCIOGALVÃOTELES,
op. cit., I, págs. 71-72.
89 Neste sentido, parecer nº 16/79 da Comissão Constitucional portuguesa, de 21 de junho, in Pareceres,
VIII, pág. 218.
90 Parecer nº 3/78 da Comissão Constitucional, cit., loc. cit., págs. 221 e segs. V. igualmente parecer nº
13/82, cit., loc. cit., pág. 168; e acórdão nº 26/85 do Tribunal Constitucional, cit., loc. cit., pág. 3.873.
91 JosÉ DE OLIVEIRAASCENSÃO,A violação ..., cit., pág. 36.
92 Por maioria de razão, reiteramos, pois, o que escrevemos em Decreto, cit., pág. 125. No mesmo senti-
do, MANUEL AFONSOVAZ, op. cit., págs. 202 e segs. e 511 e segs.
93 NUNO PiÇARRA,A separação ..., cit., pág. 258.
94 DAVID DUARTE, op. cit., loc. cit., pág. 347.
95 RUI MEDEIROS,A decisão ..., cit., págs. 100 e segs.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado ••
Porque a função legi lati a e a função admini trativa têm de realizar no quadro
material do E tado de Direito,96 é à luz do cânone e da exigência ética de te que em
última análi e, êm a er aferida a lei gerai e concreta e a lei indi iduai .
Pelo contrário, aquilo que é e tritamente indi idual, concreto e imediato, aquilo que
contende com uma relação jurídico-admini trativa, aquilo que e traduz na conformação
da ituação do admini trado pela dmini tração, não pode deixar de er antecedido -
cronologica ou logicamente - por um comando legi lati 0.97
11- i t ,poi ,uma erdad ira re erva de Con tituição no domínio da comp tên-
cla legi lati a da forma e da força d lei.
Uma coi a em a er a preterição por um ato em concr to do pre upo to e requi ito
no re peito do quai de eria er emanado. Outra coi a, bem difer nte e bem mai gra e, o
e tabel cimento por uma norma infracon titucional de diferent pr upo to e requi ito ,
ainda que a propó ito de uma ingular ituação concreta. Uma coi a é a iolação de uma nor-
ma con titucional de competência ou de forma. Outra coi a o afa tamento da regra con ti-
tucionai - materiai - de definição do órgão legi lati o ,da forma e da força de lei.
Pod rá na egunda hipóte e di i ar- e ainda um fenómeno de incon titucionalidade
orgânica ou formal. Ma obre ele projeta- e e con ome-o um fenómeno de incon titu-
cionalidade material - a rebeldia do legi lador ordinário, arrogando-se a prerrogati a,
exclusiva do legislador constitucional, de definir quai o órgão legi lati o , quais a
forma de lei e qual a força jurídica que lhe corre ponde.
100 Cfr. LABAND, op. cit., 11,págs. 353 e segs.; FEZASVITAL, A noção de lei ..., cit., loe. cit., ano 55, pág. 354, e
ano 56, pág. 34; CARRÉDE MALBERG, op. cit., págs. 41 e segs.; CARLOESPOSITO,La Validità delle Leggi,
1934, Milão, reimpressão de 1964, págs. 49 e segs.; ALDO M. SANDULLI, Legge, forza di legge, valore di
legge, in Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico, 1957, págs. 269 e segs., e Fonti dei Diritto, in Novissi-
mo Digesto Italiano, VII, págs. 526 e segs.; R. E. CHARLlER, Vicissitudes de la loi, in Mélanges oflerts á
Jacques Maury, obra coletiva, li, Paris, 1960, págs. 307 e 316; FRANCOBASSI,op. cit., págs. 39 e segs.;
FRANCOMODUGNO, Legge, cit., loc. cit., págs. 890 e segs., e L'lnvalidità della Legge, cit., 11,págs. 3 e segs.
e 10 e segs.; MARCELLOCAETANO,Direito Constitucional, cit., I, págs. 206 e 211; ANTONIO RUGGERI,La
gerarchia ..., cit., págs. 35 e segs., e Fonti ..., cit., págs. 109 e segs. e 222 e segs.; MICHEL-HENRY FABRE,
La loi expression de la souveraineté, in Revue du droit public, 1979, págs. 341 e segs.; FRANCISCORUBlO
LLORENTE,Op. cit., loc. cit., págs. 417 e segs.; IGNACIO DE Ono, op. cit., págs. 149 e segs.; DIEZ-PICAZO,
op. cit., loc. cit., págs. 67 e segs.; RUI MEDEIROS, Valores jurídicos negativos da lei inconstitucional, in O
Direito, 1989, págs. 500-501; AGUSTIN DE ASIS ROIG, La ley como fuente dei derecho en la Constitución
Espanola - Homenaje ai Profesor Eduardo Garcia de Enterría, obra coletiva, I, Madrid, 1991, págs. 198
e segs.; GIOVANNI QUADRI, La forza di legge, Milão, 1992; CARLOSBLANCODE MORAIS, As leis ..., cit., págs.
90 e segs. e 127 e segs. e Curso ..., I, cit., págs. 251 e segs.; FLORENCECRUZ, L'acte législatif en droit
comparé français-portugais, Paris, 2004, págs. 181 e segs.
JosÉ DE OLIVEIRAASCENSÃO(O Direito ..., cit., pág. 581) escreve que com o termo "força de lei" estamos
no domínio das imagens. É o mesmo que falar em força de direito subjetivo para significar que ele não
pode ser violado por estranhos. Mas, de qualquer modo, exprime-se assim figurativamente a confor-
midade do pretenso fato normativo a uma regra sobre a graduação jurídica. Sendo assim, ele é eficaz:
a ordem jurídica outorga-lhe efeitos jurídicos.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado ••
aturai mente, porém, a força de lei não se confunde com a obrigatoriedade da nor-
ma eu conteúdo: a obrigatoriedade da norma legi lativa para o de tinatário não impli-
ca nem mai nem meno do que a de qualquer outra norma jurídica.
11- Alguma doutrina (principalmente italiana) epara força de lei e valor de lei: ao
pa o que o primeiro conceito diz respeito à particular potência da lei , traduzida em capa-
cidade de inovar na ordem jurídica preexi tente, o egundo envolveria o regime típico do
ato legi lativos, o tratamento a ele conferido pela ordem jurídica e que consistiria em eles
Ó poderem er afetado por lei subsequente ou por decisão do Tribunal Constitucional.101
ão enxergamo interes e na di tinção em face da Constituição portuguesa. Esta
não apena não in titui um regime semelhante ao da Constituição italiana como até pare-
ce entrecruzar os dois conceito ao referir- e a lei de valor reforçado nos arts. 112°, nO3,
280°, nO2, alínea a, e 28 J n° J, alínea b. ão há força de lei que não pressuponha valor,
0,
nem valor de lei que não acarrete uma corre pondente força.
III - A força de lei é um conceito relacional, que e decompõe num duplo alcance
material e formal, como capacidade de di por, po itiva ou negativamente, originária ou
upervenientemente, obre a relaçõe e situações da vida, e como capacidade de agir ou
reagir frente a outros atos jurídico-públicos.
Força de lei material positiva (ou originária) consi te na capacidade de di por ori-
ginariamente (ou, como por vezes, se diz, de inovar) obre toda a matéria, sobre quais-
quer relações e ituaçõe da vida.
Força de lei material negativa (ou uperveniente) con i te na capacidade de modifi-
car u pender, revogar ou impedir a ubsistência da regulamentação de qualquer matéria
por lei anterior.
Força de lei formal po itiva con i te na capacidade de modificar, suspender, re-
vogar, de truir, eventualmente invalidar atos de outra natureza (ou de outra função do
E tado) e, em certos ca os, outras lei .
Força de lei formal negativa con i te na capacidade de re i tir ou reagir a atos
doutra natureza (ou doutra função do Estado) ou, em certos casos, a outra lei, não e
deixando modificar, u pender, revogar ou de truir por eles.
A força de lei material e a força de lei formal positiva reconduzem-se a força de
lei ativa' a forma de lei formal negativa, a força de lei passiva. A força de lei material e
101 ALDO M. SANDULLI,Legge ..., cit., loco cit., págs. 272 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
a força de lei formal positiva referem- e ao ato legi lati o em i me mo' a força de lei
formal negativa refere- e mai à norma por ele criada .
I - A lei, que tem um conteúdo típico, apre enta- e igualmente ob uma forma cara-
terística. E pode presumir-se que à forma, sinal da lei, corre ponda ( ai a as di tinçõe
conhecida) um conteúdo legi lativo.
Tanto no con titucionali mo moderno como em qualquer outro período da hí tória
do E tado a lei distingue- e do demais ato jurídico-público por elemento formai
pr e tabelecido ,que e reportam, un ,ao eu modo de r elação e, outro ,ao eu modo
de produção - quer dizer, ao diploma donde con tam a norma e à competência e ao
proce o de ua formação.
A forma de lei é, ante d mai, uma forma con titucionalmente definida: cabe à
Con tituição e, na medida em que ela o permita, à lei com a funçõe e a regimento
de a s mbleia legi lati a regulá-Ia em qualquer de e a peto .
11 - À partida, o legi lador con tituinte pode optar ou por uma ó forma de lei ou por
uma pluralidade de forma: por uma única forma, em virtude da unidade fundamental da
função legi lativa; por vária forma, em conexão com a diver idade de fin e entido
po ív i ,de competência e de articulaçõe com outro ato .
O critério predominante vem a er, por toda a parte, o da competência. E e há um
único órgão nela inve tido, em princípio depara- e uma única forma de lei; e se há mai
de um (sejam doi ou mais órgão em nível central, sejam também órgão regionai por
cau a de autonomia política territorial) ão di tinta a forma que e lhe agregam.
Em Portugal, no Era il e no demai paí e com pluralidad d órgãos legi lati o ,
re erva- e o termo lei para a lei di manada do Parlamento. Ma e e é (como já di emo)
um entido meramente nominal. O ato pro eniente do outro órgão ão outro im
lei em entido formal.
103 Cfr. V. N. LUHMANN (op. cit., págs. 155-156): as sessões públicas plenárias do Parlamento conservam
uma função essencial, embora as decisões se afastem delas; essa função não reside na transmissão da
verdade, mas sim na apresentação do conflito político com a ajuda de argumentos e motivos de deci-
são, com os quais se identificam posições políticas controversas - isto é, de forma semelhante à funda-
mentação da sentença judicial, etapa necessária do processo, cuja antecipação ideológica o estrutura.
104 E, por seu lado, JÜRGEN HABERMAS (Faktizat und Geltung. Beitrage zur Diskurstheorie des Rechts und
des Demokratischen Rechtstaats, 1992, trad. francesa Droit et Démocratie - Entre faits et normes,
Paris, 1997, pág. 296): segundo a conceção republicana, a formação da opinião e da vontade política
no espaço e no Parlamento não obedece às estruturas do mercado, mas sim às estruturas autónomas
de uma comunicação política que procura realizar o entendimento; para a política no sentido de uma
prática de autodeterminação cívica, não é o mercado, mas o diálogo que constitui o paradigma.
Ou ainda JEREMYWALDRON (Representação em grandes assembleias legislativas, in Ideias e políticas
para o nosso tempo, obra coletiva, Braga, 2004, págs. 89 e 94): a lei tem de colocar a sua pretensão
de autoridade não apenas entre uma diversidade de interesses mas também entre uma diversidade
de pensadores; a pretensão de autoridade legítima que as nossas leis possam ter depende, em grande
parte, da nossa capacidade de dizer que elas foram aprovadas por procedimentos (de voto) justos num
contexto de deliberação entre todos os pontos de vista rivais.
É a tese que desde sempre temos advogado: v. Contributo ..., cit., pág. 83. Cfr. também ROGÉRIOSOARES,
Sentido e limites do função legislativa ..., cit., loc. cit., págs. 441-442; Luís PEREIRACOUTINHO, Regime
orgânico de direitos, liberdades e garantias e determinação normativa, in Revistajurídica, nº 24, abril
de 2001, págs. 543 e segs.; ou MARIA BENEDITAURBANO, Representação política e Parlamento, Coimbra,
2009, págs. 29 e segs. Diversamente, PAULOOTERO, O desenvolvimento da lei de bases pelo Governo,
Lisboa, 1997, págs. 83-84.
105 E até regimes autoritários lhe fazem apelo quanto a matérias politicamente mais sensíveis.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
repre entativo clá ico, monarquia limitada,l06 etc.; o i tema de go erno - parlamentar,
pre idencial, etc.; a exi tência de uma ó ou de duas Câmara' a con agração ou não do
referendo e de outro in tituto d democracia emidireta.
o .culo :xx hou e que proceder a adaptaçõe e m mo a atenuaçõe ignificati a
em face da acelerada exigência de intervenção no domínio conómico, ociai e cul-
turai , da cópia de I i tornada nece ária ou convenientes e do pe o da tecnocracia.
E houv por i o que reconhecer ao Go erno , explícita ou implicitamente, faculdade
legiferante (embora, em compen ação, também ti e em ido, em muita on tituiçõe ,
dilatado e r forçado os podere de fi calização pariam ntar e de int rferência na de ig-
nação d titulare de outro órgão). A mesma tendência r gi ta no éculo XXI.
IIJ - Em grau decre cente de con i tência do poder legi lati o do Parlamento cab
apontar o eguinte istemas:
106 Cfr. sobre a doutrina do comando e do conteúdo de lei na Alemanha oitocentista, Contributo ...• cit .•
págs. 46 e segs., e Autores citados.
107 Cfr. infro.
108 É o sistema da Constituição da 5~ república francesa, em que o art. 34!! enumera as matérias de lei e o
art. 37!! estipula que revestem caráter regulamentar as que não sejam do domínio da lei (podendo as
leis que versem sobre tais matérias ser modificadas pelo Governo, se o Conselho Constitucional decla-
rar que possuem caráter regulamentar).
109 É o regime dos decretos-leis na Itália e na Espanha (arts. 77!! e 86!! das respetivas Constituições).
110 É o regime das "medidas provisórias" no Brasil e dos decretos legislativos presidenciais provisórios de
Angola (arts. 62!! e 126!! das respetivas Constituições).
111 Estado de necessidade legislativa é a situação prevista na Constituição federal alemã (arts. 68!! e 81!!),
na hipótese de rejeição de voto de confiança pedido pelo Governo ou de rejeição de proposta de lei
relativamente à qual também tenha sido suscitada a questão de confiança; o Conselho Federal substi-
tui-se então à Assembleia.
Parte IV I Atividade Constitucional do Estado ••
112 Para uma visão comparativa, cfr. ENZO CHElI, L'ampliamenta dei poteri normativi dell'Esecutivo nei prin-
cipali ordinomenti occidentali, in Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico, 1959, págs. 463 e segs.; MARCEL
WAlINE, Les rapports entre loi et reglement avant et apres la Constitution de 1958, in Revue du droit
public, 1959, págs. 699 e segs.; C. K. ALLEN, op. cit., págs. 426 e segs. e 531 e segs.; MICHel AMElLER,
Parlements, 2~ ed., Paris, 1966, págs. 149 e segs.; K. C. WHEARE, Legislatures, 2~ ed., Londres, 1968,
págs. 97 e segs.; ANTOINE FAVRE, Droit Constitutionnel 5uisse, 2~ ed., Friburgo, 1970, págs. 449 e segs.;
CHRISTIAN STARCK, op. cit., págs. 47 e segs.; JEAN-LoUIS PEZANT, Loi/reglement. La construction d'un nou-
vel équilibre, in Revuefrançaise de science politique, 1984, págs. 922 e segs.; PAULO BONAVIDES, op.
cit., págs. 349 e segs.; DENIS VAN MECHElEN e RICHARD ROSE, Patterns of Parliamentary Legislation,
Aldershot, 1986; ARMANDO MARQUES GUEDES, A Lei em Direito Constitucional Comparado, in A Feitura
das Leis, obra coletiva, 11, págs. 35 e segs.; o nº 2 de 1986 e o nº 1 de 1996 de Quoderni Costituzionali;
SÉRVULO CORREIA, Legalidode..., cit., págs. 38 e segs.; ElISABETIA PAlICI DI SUNI, La regole e /'ecezione.
Instituzioni parlamentori e potestà normative dell'Executivo, Milão, 1988; PABLO SANTOLAYA MACHETII,
EIregimen constitucional de los decretos-Ieyes, Madrid, 1988; Law in the Making, obra coletiva editada
por Alessandro Pizzorusso, Berlim-Heidelberga, 1988, págs. 131 e segs.; FRANCISCO FERNÁNDEZ SEGADO,
EIsistema constitucional esponol, Madrid, 1992, págs. 618 e segs.; JEAN GICQUEL, Droit Constitutionnel
et Institutions Politiques, 14~ ed., Paris, 1995, págs. 717 e segs.; MANOel GONÇALVES FERREIRA FILHO, Do
processo..., cit., págs. 157 e segs. e 230 e segs.; CATHERINE HAGHENEAU, Le domaine de la loi en droit
français et en droit anglais, in Revuefrançais de droit constitutionnel, 1995, págs. 247 e segs.; CLEMER-
SON MERlIN CLEvE, Atividade legislativo ..., cit., loc. cit., págs. 123 e segs.; ERIC BÜlOW, La legislación,
in Manual de Derecho Constitucionol, obra coletiva, trad., Madrid, 1996, págs. 727 e segs.; DIAN SCHE-
FOlD, Gli atti legislativi dei Governo e i rapporti fro i poteri nel diritto tedesco, in Rivisto di Diritto Costi-
tuzionale, 1996, págs. 191 e segs.; Luís S. CABRAL DE MONCADA, "Rule of Law'; procedimento normativo
e legalidade; uma perspetiva comparada, Lisboa, 1996; DMITRI-GEORGES LAUROFF, Le droit constitutio-
nnel de la 11'''''' république, 2~ ed., Paris, 1997, págs. 635 e segs. e 654 e segs.; nº 32, de 1997, da Revue
française de droit constitutionnel; Executive Decree Authority, obra coletiva ed. por JOHN M. CAREY e
MATIHEW SOBERG SHUCART, Cambridge, 1998; LEUOMAR AMORIM DE SOUSA, A produção normativa do
poder executivo, Brasília, 1999; FRIEDRICH MÜLLER, As medidos provisórias no Brasil diante do pano de
fundo das experiências alemãs, in Direito Constitucionol- Estudos em homenagem a Paulo Bonavides,
obra coletiva, São Paulo, 2001, págs. 337 e segs.; PIERRE BON, Lessubstituts à la loi: les actes législatifs
de /'exécutif, in Annuaire Internationale de Justice Constitutionnel, 2003, págs. 472 e segs.
PARTE V
INCONSTITUCIONALIDADE E GARANTIA DA
CONSTITUiÇÃO
Capítulo I
Inconstitucionalidade em geral
§ 1º
Inconstitucionalidade
1 V., entre tantos, RUI BARBOSA, Os atas incanstitucionais da Cangressa e do Executivo ante a Justiça
Federal, Rio de Janeiro, 1893; MAGALHÃES COLLAÇO,Ensaio sobre a inconstitucionalidade das leis no
Direita português, Coimbra, 1915; HANS KELSEN,La garantie juridictionnelle de la Constitution (sepa-
rata da Revue du Droit Public), Paris, 1928 (com tradução portuguesa, Sub Judice, 20/21, págs. 9 e
segs., janeiro-julho de 2001 e em Jurisdição Constitucional, São Paulo, 2003, págs. 119 e segs.), e Reine
Rechtslehre, 2ª ed. portuguesa, Tearia Pura do Direito, Coimbra, 1926, 11, págs. 328 e segs.; CHARLES
EISENMANN, LaJustice Constitutionnelle et la Haute Caur Constitutionnelle d'Autriche, Paris, 1928 (reim-
pressão de 1986); CARLa ESPOSITO,La Validità delle Leggi, Milão, 1934; MASSIMO SEVEROGIANNINI,
"L'illegittimità degli atti normativi e delle norme", in Rivista italiana per le scienze giuridiche, págs. 39
e segs., 1954; MIGUEL GALVÃOTELES,Eficácia dos tratados na ordem interna partuguesa, Lisboa, 1967,
págs. 115 e segs., Direito Canstitucional Português Vigente, sumários policopiados, Lisboa, 1970, págs.
88 e segs., e "Inconstitucionalidade pretérita", in Nos dez anos da Constituição, obra coletiva, Lisboa,
1987, págs. 265 e segs.; JORGEMIRANDA, Contributo para uma teoria da inconstitucionalidade, Lisboa,
1968, e Decreto, Coimbra, 1974, págs. 101 e segs.; FRANCOMODUGNO, L'lnvalidità della Legge, 2 vols.,
Milão, 1970, e "Legge (vizi della)", in Enciclopedia dei Diritto, XXIII, 1973, págs. 1.000 e segs.; FEUCE
OELFINO, La dichiarazione di iIIegitimità costituzionale delle leggi, Nápoles, 1970; MARCELO REBELODE
SOUSA,O valor jurídico do ato inconstitucional, Lisboa, 1988; MARCELONEVES,Teoria da inconstituciona-
lidade das leís, São Paulo, 1988; RUI MEDEIROS, "Valores jurídicos negativos da lei inconstitucional", in
O Direíto, 1989, págs. 485 e segs., e A decisão da inconstitucionalidade, Lisboa, 1999; GILMAR FERREIRA
MENDES, Controle de inconstitucionalidade, São Paulo, 1990; JosÉ JUAN MORESO MATEOS, "Sobre nor-
mas inconstitucionales", in Revista Espanola de Derecho Constitucional, págs. 81 e segs., maio-agosto
de 1993; PAULOOTERO, Ensaío sobre o caso julgado inconstitucional, Lisboa, 1993; EUVAL DA SILVARA-
MOS, A inconstitucionalidade da lei, São Paulo, 1994; MARIA FERNANDAPALMA, "Constitucionalidade e
justiça", in Themis (revista da Universidade Nova de Lisboa), 1, 2000, págs. 21 e segs.; GOMES CANOTl-
LHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª ed., Coimbra, 2004, págs. 919-920 e 947 e segs.;
Luís ROBERTOBARROSO,O Controle de Constitucionalidade no Díreíto brasileiro, São Paulo, 2004, págs.
11 e segs.; BLANCODE MORAIS, Justiça Constitucional, I, 2ª ed., Coimbra, 2006, pág. 132.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
fi - Uma fórmula como esta oferecer-se-ia, porém, dema iado ampla, por abarcar,
tanto açõe e omissões dos órgãos do poder político quanto açõe e omi õe do particu-
lares e por envolver, em con equência, regime jurídico muito diver os.
Naturalmente, aqui apenas é relevante o não cumprimento de norma con titucionai
pelo E tado, tal como ó pode ser operativo um conceito conexo com um regime próprio de
Direito constitucional. Importa, por i so, anali ar o fenómeno com o nece ário cuidado.
Há empre uma norma violada, e não outra. Pela inconstitucionalidade, tran gride-
e uma norma con titucional uma a uma, não se transgridem toda ao me mo tempo
e de igual modo. Pode a im ficar afetado todo um in tituto ou capítulo que, nem por
i o - subsistindo a Con tituição e di pondo ela de meio de garantia da sua integridade
- deixa de ser atravé de qualquer das sua norma (ou de egmento de norma) que a
incon titucionalidade e manife ta. Um comportamento enquanto tal contrário a toda a
Constituição, juridicamente ignificativo, só poderia er uma revolução.3
6 Sobre a vinculação das entidades privadas aos preceitos atinentes a direitos fundamentais, v. Manu-
al..., IV, 4ª ed., Coimbra, 2008, págs. 298 e segs., e Autores citados.
7 Diversamente, MARCELOREBELODE SOUSA,O valor jurídico ..., cit., págs. 333 e 334.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
a) Uma relação direta, uma relação que afete um ato ou uma omi ão, ou uma nor-
ma que e teja ou venha a estar em relação direta com a on tituição.
À partida, não é de excluir que qualquer ato jurídico-público, qualquer ato de exer-
cício de uma função do E tado, qualquer ato do poder público, d de que ujeito a uma
norma con titucional ob qualquer a peto - pr upo to, elemento, requi ito - enha a
infringi-Ia. a prática e até por definição (tendo em conta o papel da on tituição), a
incon titucionalidade tend a cingir- e ao ato jurídico-con titucionai', ao ato cujo
e tatuto pertence, a título principal, ao Dir ito con titucional, ao ato regulado (não
ap na previ to ,embora não necessariamente regulado até ao fim) por normas da on-
tituição, a ato provenientes d órgãos constitucionai e com a sua formação dependente
de normas constitucionai 9
b) Uma relação direta, porqu e traduz numa infração direta d uma norma con -
titucional.
8 Cfr. Curso de Direito Internacional Publico, 3~ ed., S. João do Estoril, 2006, págs. 157 e segs.
9 Cfr. infra.
10 MARCELLOCAETANO,Tratada Elementar de Direito Administrativo, I, Coimbra, 1943, pág. 390.
11 Cfr. ANDRÉ GONÇALVESPEREIRA,Erra e Ilegalidade no Ata Administrativa, Lisboa, 1962, págs. 21 e 38 e
segs.
12 Cfr. Contributa ..., cit., págs. 77 e segs.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição ••
13 V. a decisão do Tribunal in Constitutional Law Reports (Butterworths, Durban), 1996, págs. 1252 e segs.;
cfr. crónica de XAVIER PHILlPPE, in Revue française de droit constitutionnel, págs. 163 e segs., 1997; e
MARIA JosÉ MORAIS PIRES,"O acórdão de 'certificação' da Constituição da África do Sul", in Estudos em
homenagem ao Pro! Doutor Armando M. Marques Guedes, obra coletiva, Coimbra, 2004, págs. 17 e
segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
con entir tamb 'm exceções ao direito que e tabelece. Diferentement, e uma norma da
Con tituição infringir outra norma con titucional que po itive direito upralegal, tal nor-
ma erá não apena contrária ao direito natural como incon titucional: a "incorporação
material" (IP E ) do alore upremo na on tituição faz com que toda a infração do
direito upralegal apareça, nece ária e imultaneamente, como iolação do conteúdo
fundamental da on tituição. E, de igual orte, no terceiro ca o, embora com dú ida,
con idera B H F que e oferece incon titucionalidade, poi o direito upralegal em a
er imanente a toda a ordem jurídica que e rei indique legitimament de te nom
portanto em primeira linha, a toda a ordem con filuciona! que qu ira er inculati a.14
A me ma tendência reconhece- e em parte da doutrina italiana, da e panhola ou da
grega: a im, por exemplo, partindo de um conceito de Con tituição que nvol e norma
metae tatai e partindo da exi tência de limite ao poder con tituinte ex rcido pelo po o
G RARDOMOR'LU afirma a po ibilidade de contradição de certa norma con titucionai
com o princípio e valore da Con tituição, embora não ponha a hipóte e de impugnação
direta de tai norma (poi ela não ão obj to do controlo de con titucionalidade).'5.'6.'7
Em Portugal, já antes de 1974, o problema não era desconhecido. Designadamente,
ROGÉRIO OAR ,assentando num conceito de on tituição como "equilíbrio realizado
do valores fundamentais duma comunidade", admitia a po ibilidade d ,e entualmente,
erem recu ado preceito con titucionai que urgi em "em manife to de acordo com o
imbricamento g ral".' E também VITALMOR IRA e lhe referia. 19
Ma foi obretudo após a entrada em igor da on tituição de 1976 e obretudo em
face do eu art. 309° (depoi 294°) e da Lei n° /75, de 25 d julh ,que o problema foi
colocado. e preceito e essa lei foram conte tado por incon titucionalidade, por e
afa tarem do princípio e alore de uma erdadeira ordem con titucional, por (admitin-
do a retroati idade de lei penal incriminadora quanto a agente e re p n á ei da polícia
14 Normas constitucionais inconstitucionais?, trad., Coimbra, 1977, máxime págs. 54 e segs., 62 e segs.
e 67-68. Também ADOLFO SÜSTERHENN("L'avenement du droit supra·positif dans I'évolution du droit
constitutionnel allemand", in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, vol. XXXVI,
1955, págs. 168 e segs., máxime 185-186) associa a ideia de normas constitucionais inconstitucionais à
receção do Direito natural pela Constituição.
Cfr., algo diferentemente,J. ESSER(Principio y norma en lo elaboración jurisprudencial deI derecho pri-
vado, trad., Barcelona, 1961, págs. 90 e 91), considerando "normas constitucionais de grau superior"
as bases da organização de determinada forma estatal.
15 li diritto noturale nelle costituzioni moderne, Milão, 1974, máxime págs. 217 e segs., 273 e segs. e 311
e segs.
16 Cfr., sobre o assunto, na Espanha, PABLOLUCASVERDU, Cursode Derecho Politico, 11, Madrid, 1974, págs.
698 e segs.; na Grécia, GEORGESMITSOPOULOS,"Problemes de la validité du droit", in Studi in onore di
Enrico Tullio Liebman, obra coletiva, I, Milão, 1979, págs. 313 e segs.; ou no Brasil, PAULOBONAVIDES,A
Constituição Aberta, Belo Horizonte, 1993, págs. 279 e segs., e "O Art. 45Q da Constituição Federal e a
inconstitucionalidade de normas constitucionais", in Revista da Faculdade de Direito da Universidade
de Lisboa, págs. 5 e segs., 1995; e ZENO VELOSO, Controle jurisdicional de constitucionalidade, 2~ ed.,
Belo Horizonte, 2000, págs. 209 e segs.
17 Cfr. também de KARLLOEWENSTEIN,Verfassungslehre, 1959, trad. Teoria de
a nota de direito comparado
la Constitution, Barcelona, 1964, págs. 192 e segs.
18 Constituição, in Dicionário Jurídico da Administração Pública, 11, pág. 672.
19 Economia e Constituição, Coimbra, 1974, págs. 148 e segs., em particular sobre conflitos entre a Cons-
tituição económica diretiva (programática) e a Constituição económica estatutária.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição ••
política do anterior regime autoritário) e tarem "em contradição com princípio funda-
mentai que a me ma on tituição aceita e tão olenemente proclama (art. 29° e 13°), ao
me mo tempo em que violam valore capitais que igualmente enformam o seu substrato
axiológico-político e que na própria letra e assumem (arts. 1°,2°, etc.)".20
Por outro lado, atribuindo-se caráter upracon titucional à Declaração Univer aI
do Direito do Homem, entende- e que, na medida em que haja colisão entre ela e a
Constituição e, portanto, valorações diferentes (não podendo er executadas ao mesmo
tempo) deve dar- e primazia à Declaração, pelo meno e e quando esta seja mai aberta,
genero a e liberal que a no a Con tituição.21 E afirma-se que, no ca o de alguma norma
da Constituição contrariar a Declaração, tal norma será incon titutionalY
111- Também nó perfilhamos uma "axiologia tran positiva que não está na di -
ponibilidade do po itivo constitucional ou de que não é titular sem limite o poder
con tituinte";23 e, por con eguinte, temo afirmado a existência de limites tran cenden-
tes que corre pondem a imperativos de Direito natural, tal como, em cada época e em
cada lugar, este e refrange na vida social.24
Todavia, não cremo que, a dar- e qualquer forma de contradição ou de violação
de a axiologia, estejamos diante de uma que tão de inconstitucionalidade; estamo, im,
diante de uma que tão que a ultrapas a,25 para ter de er encarada e olucionada em
plano diverso - no da on tituição material que é adotada ou no do tipo con titucional ao
qual pertence. Preci amente, por estarem em cau a limite tran cendentes, declarado e
não con tituído , no extremo poderá haver invalidade ou ilegitimidade da Con tituição.
O que não poderá haver erá incon titucionalidade: seria incongruente invocar a própria
Con tituição para ju tificar a desobediência ou a in urreição contra as suas normas.
20 CASTANHEIRA NEVES,A Revolução e o Direito, Coimbra, 1976, pág. 7. Na mesma linha, AFONSOQUEIRÓ,
Lições de Direito Administrativo, Coimbra, 1976, págs. 295 e segs., máxime 307; RUI MOURA RAMOS,
Direito Internacional Privado e Constituição, Coimbra, 1979, pág. 181, nota; CAVALEIRODE FERREIRA,
Direito Penal Português, I, Lisboa, 1981, pág. 92; MENEZESCORDEIRO,Da Boa Fé no Direito Civil, Lisboa,
1984, pág. 1275, nota; NUNO SÁ GOMES, Lições de Direito Fiscal, 11,Lisboa, 1985, págs. 21 e segs. Mais
atenuadamente, SOARESMARTINEZ,Manual de Direito Fiscal, Coimbra, 1983, págs. 100-101; VIEIRADE
ANDRADE,Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa, 1ª ed., Coimbra, 1983, págs. 128-129,
nota; MANUELAFONSOVAZ, Lei e Reserva da Lei, Porto, 1992, págs. 210, 233 e segs., 239 e segs. e 289;
JORGEBACELARGOUVEIA, O Estado de Exceçõo no Direito Constitucional, Lisboa, 1998, págs. 1.489 e
segs. Cfr. ainda a consideração do preceito como violador do jus cogens em CORREIABAPTISTA,Direito
Internacional Público, I, Lisboa, 1998, págs. 432 e segs.
21 AFONSOQUEIRÓ,Lições ..., cit., págs. 325-326.
22 PAULOOTERO,"Declaração Universal dos Direitos do Homem: a inconstitucionalidade das normas cons-
titucionais", in O Direito, 1990, págs. 612 e segs. (não aceitando a inconstitucionalidade de normas
constitucionais por violação de princípios ou normas transcendentes; a desconformidade de normas
da Constituição com a Declaração Universal reconduz-se a um fenómeno de desconformidade entre
duas estruturas de Direito positivo). Cfr., em perspetiva algo diferente, O poder de substituição no Di-
reito Administrativo, Lisboa, 1995, págs. 46, nota, 126, 127 e 557, nota.
23 Na expressão de CASTANHEIRA NEVES,A Revolução e o Direito, cit., pág. 230.
24 Cfr. Manual ..., 11,cit., págs. 134-135.
25 Cfr. KARLENGISCH,Introdução 00 PensomentoJurídico, trad., Lisboa, 1966, págs. 257, 265 e segs. e 274,
máxime 268.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Incon titucionalidade envolve um juízo de valor a partir dos critérios con titucio-
nais, sejam estes quais forem. e o critério con titucionai englobarem - como é de-
ejável que englobem - valore de justiça, liberdade, olidariedade, dignidade da pe oa
humana, também a incon titucionalidade terá de er aferida em face desse valore . Ma
não é eguro que eles sejam sempre acolhido com a me ma inten idade ou acolhido
da mesma forma. Nem se verifica unanimidade quanto à conceçõe filo ófico-jurídicas
ubjacente à Con tituiçõe , longe dis o. Não concordamo , pois, com BA H F quando,
reivindicando para toda e qualquer ordem constitucional valores supralegai , daí retira
su cetibilidade de incon titucionalidade. Ainda que aceitemos que em toda e qualquer
ordem jurídica se encontram aquele valore ,nem empre ele alcançam força ufici nte
para conformarem a Con tituição e, portanto, para determinarem con titucionalidade ou
inconstitucionalidade dos atos jurídico-público.
No interior da mesma Con tituição originária, obra do mesmo poder con tituinte
formal, não divisamos como pos am urgir norma incon titucionai .26 Nem vemo
como órgãos de fi calização in tituído por e e poder eriam competente para apreciar
e não aplicar, com base na Constituição, qualquer das ua norma .27-28' um princípio
de identidade ou de não contradição que o impede.
Pode haver incon titucionalidade por oposição entre normas constitucionai pree-
xi tente e norma con titucionai uperveniente, na medida em que a validade desta
decorra daquela (como no ca o referido da África do ui); não por oposição entre nor-
ma feitas ao me mo tempo por uma mesma autoridade jurídica. Pode haver incon ti-
tucionalidade de norma de Con tituições de Estados federado frente à Constituição
federal. Pode haver inconstitucionalidade da revi ão con titucional,29 porque a revi ão
funda-se, formal e materialmente, na Constituição; não pode haver inconstitucionalidade
do poder con tituinte (originário).
e a Con tituição como conjunto de regra e princípios tem de er tomada como um
todo hannónico, haverá que procurar definir a relações entre ele (em termos de regra e
exceção, de regra geral e especial ou como e entender); e apena ,quando pelo proce o
26 Cfr. MARCELO REBELO DESOUSA,o valor jurídico ..., cit., págs. 128 e segs., para quem existe uma inter-
penetração absoluta entre Constituição formal e Constituição material, sendo impensáveis disposições
formalmente constitucionais opostas à Constituição material.
27 Ou como o aplicador individual da Constituição poderia substituir-se ao próprio poder constituinte na
tarefa de valoração dos princípios fundamentais da Constituição (GOMESCANOTllHOe VITALMOREIRA,
Fundamentos da Constituição, Coimbra, 1991, pág. 45).
28 A jurisprudência constitucional portuguesa por duas vezes encarou a questão da inconstitucionalidade
de normas constitucionais: no parecer nº 9/79 da Comissão Constitucional, de 27 de março (in Pare-
ceres, VIII, págs. 8 e 9), e no acórdão nº 480/89 do Tribunal Constitucional, de 13 de julho (in Diário da
República, 2ª série, nº 26, de 31 de janeiro de 1990); naquele em mera referência, neste implicitamen-
te tomando posição.
Estava em causa no acórdão um recurso em que era arguida a constitucionalidade da norma consti-
tucional de proibição do lock-out (art. 57º, nº 3), por contrária ao princípio da igualdade (art. 13º). O
Tribunal não deu provimento ao recurso, considerando não haver tal contradição. Mas, assim fazendo,
reconheceu-se implicitamente o poder de apreciação da constitucionalidade de normas constitucio-
nais, quando o legislador constituinte originário infringisse uma axiologia suprapositiva e inscrevesse
no texto constitucional normas que fossem não direito.
29 Mesmo em Constituição flexível: assim, já, Decreto, cit., pág. 110.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição _
30 Cfr., por exemplo, F. CARNElUTII, Teoria General dei Derecho, trad., Madrid, 1955, págs. 108 e segs.;
KELSEN,Teoria Pura ..., cit., 11,págs. 27 e segs.; J. HERMANO SARAIVA,A crise do direito, Lisboa, 1964, págs.
73-74; K. ENGISCH,op. cit., págs. 254 e segs.
31 Cfr. OLIVEIRAASCENSÃO,O Direito -Introdução e Teoria Geral, 13~ ed., Coimbra, 2005, págs. 425 e segs.;
ou FERNANDOJOSÉBRONZE,Lições de Introdução ao Direito, 2~ ed., Coimbra, 2006, págs. 916 e segs.
32 Implicitamente, PAULOOTEROnão anda longe deste raciocínio, ao considerar que a fiscalização da cons-
titucionalidade de normas constitucionais frente à Declaração Universal é apenas a concreta e difusa,
e não também a abstrata (op. cit., loc. cit., págs. 618-619).
33 Cfr., por exemplo, BARBAS HOMEM, "Reflexões sobre o justo e o injusto: a injustiça como limite do
Direito", in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, nº 2, págs. 587 e segs., 1998.
34 Cfr., numa perspetiva jurídico-administrativa, ROGÉRIOSOARES,Interesse público, legalidade e mérito,
Coimbra, 1955: mérito é o merecimento do ato em vista do fim que se propõe, o seu valor, a sua utili-
dade, é o sentido do ato como bem (pág. 207).
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
35 Cfr., por todos, SÉRVULOCORREIA, Legalidade e autonamia contratual nos contratos administrativos,
Lisboa, 1987, págs. 190 e segs., ou Manual ..., IV, cit., págs. 195 e segs.
36 Sobre o confronto dos princípios da constitucionalidade e da legalidade na administração, V., por exem-
plo, o nosso Contributo ..., cit., págs. 79 e segs.; ou LOUISFAVOREU,"Legalité et constitutionnalité", in Les
Cahiers du Consei! Constitutionnel, 3, 1997, págs. 75 e segs.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição
ada ob ta a que outro ato ai' m do ato legi lati o e do político enham também
a ficar dir tamente subordinado a norma constitucionai ,p lo m no por algum do u
pre upo to ou do eus elemento (in i timo ), por não e interpor norma legal em qu r-
pou em - e, de igual modo, nada há a priori que impeça qu à r guiam ntação con titucio-
nal do ato legi lati o ,por eze, acre ça uma regulamentação d ri ada de outra lei .
Poderá portanto, ter de e reconhecer a incon titucionalidade de ato não legi lati-
o ou infralegai (a par da ilegalidad de certa lei). Tudo re id m que eja po í el
indi idualizar uma relação imediata e autónoma de de conformidade entre tai ato ou a
norma d le dimanada e certo pr ceito con titucional- como ucede e um regulamen-
to iola re erva de lei ou é publicado miei habilitante.40-41
40 Cfr. MARQUES GUEDES,Direito Administrativo, lições policopiadas, Lisboa, 1957-1958, págs. 381-382.
41 Tirando este caso, um regulamento, porque acessório de lei, não pode ser impugnado autonomamen-
te; só o pode ser por referência à lei que executa.
42 Além de KELSEN,Teoria Pura, cit., 11,págs. 62 e segs., V., entre outros, ROGERBONNARD, La théorie de la
formation du droit par degrés dans /'oeuvre d'Adolf Merkl, in Revue du drait public, 1928, págs. 668 e
segs.; CARRÉDE MALBERG, Confrantaôon de la théorie de la forma tion du drait par degrés, Paris, 1933;
MARCELWALlNE, Observations sur la gradation des normes juridiques établie par M. Carré de Malberg,
in Revue du drait public, 1934, págs. 522 e segs.; GUIDO ZANOBINI, Gerarchia e parità tra le fonti, in
Studi in onore di Santi Romana, obra coletiva, I, Pádua, 1939, págs. 589 e segs.; CARLODI MAJO, "Norme
costituzionale e gerarchia delle fonti dei Diritto", in Studi in onore di Ernesto Eula, obra coletiva, I, Milão,
1957, págs. 373 e segs.; VEZIO CRISAFULLI,"Gerarchia e competenza nel sistema costituzionale delle fon-
ti", in Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico, págs. 775 e segs., 1960; ENZO CHELI, Potere regolamentare
estrutura costituzionale, Milão, 1967, págs. 193 e segs.; GIUSEPPEMUSACCHIA, "Gerarchia e teoria delle
norme sulla produzione giuridica nel sistema costituzionale delle fonti", in Rivista Trimestrale di Diritto
Pubblico, págs. 172 e segs., 1960; FRANCOMODUGNO, op. cit., I, págs. 135 e segs.; ANTONIO RUGGERI,
"Norme e tecniche costituzionali sulla produzione giuridice", in Politica dei Diritto, 1987, págs. 175 e
segs.; MARCELONEVES,op. cit., págs. 27 e segs.; ALFONSORUIZ-MIGUEL, "EI principio de jerarquia norma-
tiva", in Revista Espanola de Derecho Constitucional, nº 24, págs. 135 e segs., setembro-dezembro de
1988; ALESSANDROPIZZORUSSO,"Cultura e politica nella produzione ed applicazione dei diritto", in Qua-
derni Costituzionali, 1990, págs. 83 e segs.; Ono PFERSMANN, "Carré de Malberg et la hiérarchie des
normes", in Revuefrançaise de drait canstitutionnel, págs. 481 e segs., 1997; PAULOOTERO, Legalidade
..., cit., págs. 543 e segs.; PAULAMSELEK, "Une fausse idée c1aire: la hierarchie des normes juridiques",
in Renouveau du drait constitutionnel- Mélanges en /'honneur de Louis Favoreu, obra coletiva, Paris,
2007, págs. 983 e segs.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição ••
orno quer que seja, não é pr ci o entronizar a te es da Teoria Pura para reconhe-
cer que a fonte e a norma e di tribuem por níveis ba tante di er o . Ape ar de ó no
éculo XX di o e ter tomado perfeita con ciência, a upremacia da on tituição decor-
re da ua função no ordenamento o ato que lhe ficam im diatamente ubordinado
não podem dei ar de ter força uperior ao que por ela não ão regulado . Tal como a
norma obre produção jurídica hão-de pr ai cer obre a norma d produção jurídica
ou o ato normati o obre o ato concr to (e indi iduai ) que regem, a lei obre
o regulamento e o ato juri dicionai , ou o ato de função política obre o ato da
função admini trati a, etc. E, ac ite o primado do Direito intemacional, também o ato
intemacionai (v.g., tratado) têm preferência obre o ato de Direito intemo (v.g., lei ).
o entanto, a hierarquia não tem alor por i, exprime coerência intra e intersi temá-
tica, liga- e à ordenação explícita ou implícita de in tituiçõe , funçõe ,órgão e forma
no i tema. Por i o, de e er i ta ba icamente como "regra con trutiva' e po tulado de
lógica formal mai ou menos arquitetado obre o Direito po itivo e dependente de dado
variá ei em cada paí e momento. Por i o, não há incon titucionalidade ou ilegalidade
ó por ela não er acatada, nem o problema de invalidade do ato jurídico -público e
reconduz à ua violação.
111- m egundo lugar, eria profundamente erróneo supor que qualquer ato jurídi-
co-público ó eria inválido quando ofende se uma norma de grau uperior. Muito pelo
Escassas são as tentativas de elaboração entre nós: FEZASVITAL,"Hierarquia das Fontes de Direito", in
Revista da Ordem dos Advogados, págs. 12 e segs., 1943; JosÉ H. SARAIVA,Lições de Introdução ao Di-
reito, cit., págs. 338 e segs.; JosÉ DIASMARQUES,Introdução ao Estudo do Direito, 4~ ed., Lisboa, 1972,
págs. 329 e segs.; AFONSOQUEIR6, Lições ..., cit., págs. 513 e segs., e "A hierarquia das normas de Direito
administrativo", in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 1982, págs. 775 e
segs.; SÉRVULOCORREIA,Noções de Direito Administrativo, Lisboa, 1982, pág. 91; BLANCODEMORAIS,As
leis reforçadas, Coimbra, 1998, págs. 250 e segs.; GOMESCANOTILHO,Direito Constitucional ..., cit., págs.
700-701 e 781; OLIVEIRAASCENSÃO,O Direito, cit., págs. 579 e segs.
43 Cfr. MIGUELGALVÃOTELES,Eficácia ..., cit., págs. 104-105, nota; RUI MACHETE,op. cit., loc. cit., 11, pág. 782,
nota.
Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
contrário: pode certo ato, po terior a outro, de igual grau, em ez de o re ogar ou d rro-
gar, de er ter- e por in álido in ficaz ou irr guiar, por er d le di crepant .
À lei de alor reforçado pre ente no ordenam nto p rtuguê 44 a que há pouco
aludimo liga- e uma po ição de proeminência funcional - não hi rárquica - relati a-
mente a outro ato legislativo, a qual e traduz numa e pecífica força formal n gati a
- na impo ibilidade de erem afetada por lei po teriore que não ejam dotada da
m ma função, com afa tamento do princípio lex po terior ... E, e e a proeminência
decorre, no tocante à relaçõe de vinculação e p cial, de um intuito d di i ão de tarefa
de racionalização do istema legi lativo, já no tocant à relaçõe de inculação geral
pro gu outro im objeti o materiai próprio (o equilíbrio orçam ntal, u a defe a da
autonomia da r giõe autónoma ou a pre ervação de certo in tituto). ão e i lum-
bra um entido de preferência hierárquica.
A noção d on tituição flexível merece igualmente r chamada à colação. Para
nó (e clareça- e ou ublinhe- e de no o), la é hierarquicam nte uperior à lei, porquan-
to con tilui a ordem jurídica e contém a ba e da autoridade do E tado.45 Ma a opinião
tal ez prevalecente pronuncia- e em molde diverso ; e, no entanto, tem de reconhecer
ca o tanto de inconstitucionalidade orgânica e formal quanto de incon titucionalidad
mat rial. Ba ta pen ar numa lei não aprovada pelo Parlamento, ou qu ub rta o prin-
cípio do regime e da forma do go emo ou, e entualm nt , que abra um d io a uma
r gra g ral, em que haja intenção ou cau a de modificação con titucional.
A natureza do regimento da a embl ia política e tá longe d r pacífica.46
eja ela qual for, a própria a embleia pod rão modificar a norma regimentai
quando lhe aprouver, não poderão di pen ar- e de a cumprir enquanto ti r m em
igor. Quando o Parlamento ota uma lei, ou uma re olução, o objeto da deliberação é o
projeto ou a propo ta e não o regimento; es a deliberação tem d e fazer no termo que
e te pre creve e não pode reve tir o entido de modificação "tácita" ou implícita da ua
r gra . E coi a semelhante se diga a respeito da ação legi lativa do Poder Executivo, o
qual também não pode eximir- e de ob ervar a norma que a regulam, ape ar de pode-
rem provir da ua la ra (art. 198°, nO2, na Con tituição portugue a).
O princípio que aqui e projeta para além do princípio hierárquico' empre o d
qu o órgão qu pode modificar a lei ob que i e de e, pelo meno ,fazê-lo p cífica
diretamente. Doutro modo, fru trar- e-ia a mi ão ordenadora do Direito comprometer-
e-ia a própria ideia de institucionalização jurídica do poder.
44 As leis de autorização legislativa em relação aos decretos autorizados, as leis de bases em relação aos
decretos de desenvolvimento, as leis orça mentais e os estatutos das regiões autónomas em relação a
quaisquer outras leis, etc.
45 Cfr. Contributo ..., cit., págs. 39 e segs.
46 Cfr. supra.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição _
47 Cfr. DURÃO BARROSO,"O recurso para a Comissão Constitucional", in Estudos sobre a Constituição,
obra coletiva, 111,Lisboa, 1979, pág. 709; VITALlNO CANAS,Introdução às decisões de provimento do
Tribunal Constitucional, 2ª ed., Lisboa, 1994, págs. 89 e segs.; RUI MEDEIROS,A decisão ..., cit., págs.
413 e segs.; GOMESCANOTllHO, Direito Constitucional ..., cit., pág. 959; BLANCODE MORAIS,Justiça ...,
I, págs. 160 e segs.
48 Cfr. PEDROMONIZ LOPES,"Sobre as sentenças de inconstitucionalidade parcial qualitativa", in As sen-
tenças intermédias da justiça constitucional- Estudos luso-brasileiros de Direito Público, obra coletiva,
Lisboa, 2009, págs. 477 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
49 Sobre o juízo de inconstitucionalidade, V., no que toca à norma constitucional, Contributo ..., cit., págs.
237 e segs., e, no que respeita ao ato normativo, M. S. GIANNINI, Alcuni caratteri della giurisdizione di
legittimità delle norme, cit., loc. cit., págs. 513 e segs., ou A. M. SANDULlI, "lIegitimità delle leggi e rapo
porti giuridici", in Stato Sociale, ano X, nº 2, fevereiro de 1966. págs. 95 e segs.
50 Cfr. GUSTAVOZAGREBELSKY,La Giustizia Costituzionale. Bolonha, 1977. págs. 36 e segs.; ou o acórdão
do Tribunal Constitucional federal alemão de 11 de junho de 1987. in Boletin de Jurisprudencia Cons·
titucional, nº 74, junho de 1987, págs. 717 e segs.
51 Estes conceitos não coincidem com os de Direito administrativo. Cfr. FREITASDO AMARAL, Curso de Di·
reito Administrativo, 11,Coimbra, 2001, pág. 387.
52 Cfr. o conceito não totalmente coincidente, de inconstitucionalidade deslizante, em RUI MEDEIROS.A
decisão ...• cit., págs. 542 e segs., e em JORGEPEREIRADA SILVA,Dever de legislar e prateção jurisdicional
contra omissões legislativas, Lisboa, 2003, págs. 59 e segs.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição ••
a) lncon titu ionalidade pre ente ou atual como incon titucionalidade perante
norma con tituciona! em igor e incon titucionalidade pretérita ou pó tuma
como incon titucionalidade perante nonna qu já não e encontra em igor;
b) lncon titucionalidade pre ente como incon titucionalidade de norma infracon -
tituciona! em vigor e incon titucionalidade pretérita como incon titucionalidade
de nonna infracon titucional que já não e encontra em vigor (por ter ido revo-
gada ter caducado ou, porventura ter caído em de u o).
obre a prim ira contrapo ição,já no pronunciámo , u tentando que ó procede rela-
ti amente à re i ã con titucional, não r lati amente à emergência de no a on tituição.53
egunda di tinção não le anta quai quer dú ida . O Tribunal Con titucional por-
tuguê tal como o tribunai de outro paí e (e ante, a omi ão on titucional), tem
muita eze conhecido da incon titucionalidade de norma legai já não em igor, por
ha er utilidade ne e conhecimento - derivada da regra da eficácia retroativa, ex tunc da
e entual declaração de incon titucionalidade e da circun tância de, me mo depois do eu
período de vigência, a norma poderem continuar a produzir efeito jurídico. Voltare-
mo ao a unto mai à frente.
53 Cfr. supra.
54 Cfr. FRANCESCONOVARESE,"L'illegittimità costituzionale derivata", in Rivista Trimestrale de Diritta Pub-
blica, págs. 1.160 e segs., 1970; FULVIOFENUCCI,"Giuridicato implicito ed impliciti effetti della dichiara-
zione di i1egittimità costituzionale delle leggi sugli atti amministrativi", in Giurisprudenla Castitulionale,
1981, págs. 1.989 e segs.; ANGELO COSTANZO,"Questioni di costituzionalità connesse", in Giurispruden-
la Costitulionale, 1994, págs. 1.441 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
I - Afigura- e que existem doi ício quanto ao conteúdo do ato legi lati o (em
paralelo com o ícios do ato admini trati o ): violação de lei con titucional e de vio
de poder legislativo - aquela patenteada atra é da pura e imple contradição de cont -
údo tal como con tam do texto e e ta atravé da contradição entre o fin da norma e
do ato e o fin da norma constitucional; aquela apurando- e, por con eguinte, por mera
ub unção e e ta exigindo uma ponderação. 58
55 A esta luz, qualquer inconstitucionalidade ou ilegalidade, em última análise, tem mesmo caráter
material. Consiste na não realização daquilo que a Constituição ou a lei permitem ou exigem, no incum-
primento do que prescrevem, na frustração da vontade normativa.
56 La Garantie ..., cit., págs. 5 e segs., máxime 10; e ainda, entre outros, CHARLESEISENMANN, op. cit., págs.
12 e segs.; AGOSTINO ORIGONE, "Costituzionalità", in Nuovo Digesto Italiano, IV, 1938, pág. 381; e, até
certo ponto, SALVATOREBARTHOLlNI, La Promulgazione, Milão, 1955, págs. 373 e segs.
57 Desde Aspectos de uma teoria da inconstitucionalidade, policopiado, Lisboa, 1964, pág. 173. Também
criticamente, entre nós, J. H. SARAIVA,A crise..., cit., págs. 69 e segs. ou BLANCODE MORAIS, Justiça ..., I,
pág.148.
58 MARCELOREBELODE SOUSA (O valor ..., cit., pág. 124) vai um pouco mais longe, distinguindo dois vícios
respeitantes às relações entre o conteúdo e o fim do ato: desvio de poder e excesso de poder. O desvio
de poder traduziria uma inadequação entre o conteúdo e o fim do ato e os fins do ordenamento cons-
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição
orno e cre ia já FEZA VITAL, o de io de poder não é ício pri ati o do ato pra-
ticado por agente admini trati o . O Parlamento, órgão legi lati o por xcelência, pode
também exceder o eu podere, u ando das faculdade que a on tituição lhe confere
na realização de fin diver o dos que a me ma on tituição tinha em vista ao conceder-
lhe a competência. O ato jurídicos não podem apreciar- e de ligando-o do fim que os
determinou, ejam ou não ato do Parlamento.59-60
ó recorrendo à noção de de vio de poder legi lati o pode aperceber- e o que eja
a iolação do princípio con titucionai como o da igualdade e o da proporcionalidade;
ou a iolação de norma programática' e, em geral, d norma não exequí ei por i
me mas, a quai não apena proíbem a prática de comportamento contrário como fi-
am direti a para o legi lador ordinário. Ó atra é da noção de de io de poder legi la-
ti o pode indicar- e o u o da autorizaçõe con titucionai de re triçõ e de u pen ão
de direitos fundamentai. Ó atra é dela pod indicar- e o respeito pelo Parlamento da
obrigação de definir ba e gerai, regimes gerais ou enquadramento de certa matéria
ou a obrigação de definir o entido das delegações ou autorizações legi lativa .61
titucional, com violação do princípio da proporcionalidade global. O excesso de poder traduziria uma
inadequação entre o conteúdo e o fim concreto do ato, sem que os fins globais do ordenamento fossem
questionados, havendo apenas uma violação do princípio da proporcionalidade concreta. E, embora em
termos diferentes, também faz essa distinção BLANCODEMORAIS,A justiça ..., I, cit., págs. 145 e segs.
111- Há ainda quem u tente que o juízo de con titucionalidade ( obretudo em face
do princípio da igualdade) não pode deixar de en olv r a con ideração da razoabilidade
da norma ou da olução.
o entanto, razoabilidad é algo que pod ser entendido de diferente maneira. P de
equi aler a adequação à rafio Con fifufioni ,a harmonia de aloraçõe, a proporcionalidade,
a r peito do proce o equitati o (due proce oflaw). Ou pode ignificar não já adequação
teleológica, ma im adequação lógica, co rência interna da lei, razoabilidade imanente.
62 Cfr., por todos, as perspetivas de HESSE,Escritos de Derecho Constitucional, trad., Madrid, 1983, págs.
17 e segs., e de GOMES CANOTILHO, "A concretização da Constituição pelo legislador e pelo Tribunal
Constitucional", in Nos dez anos da Constituição, obra coletiva, Lisboa, 1987, págs. 347 e segs., máxime
364 e segs.
63 ANDRÉ GONÇALVESPEREIRA,Erro e ilegalidade ..., cit., pág. 217.
64 Como escreve GOMES CANOTILHO(Constituição dirigente ..., cit., págs. 262 e 263), os princípios jurídico-
constitucionais afirmam-se positivamente como determinantes heterónomos comandando a satisfação
dos fins constitucionais através dos atos legislativos. A legitimidade substancial das leis não dispensa a
averiguação dos pressupostos justificativos, dos motivos primários invocados e dos resultados obtidos,
como elementos vinculados da validade das normas legais.
65 Sob pena de se expropriar a função ordenadora da Constituição, degradando-a a mero sistema de
normas orgânicas (como escrevemos em "Inviolabilidade de domicílio", in Revista de Direito e Estudos
Sociais, pág. 415, 1974).
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição ••
§ 2º
Consequências da inconstitucionalidade
Mai do que qualquer outro a peto torna- e aqui pat nte como o juízo de incon ti-
tucionalidade não e reduz a algo de lógico-formal ou ilogí tico; como e toma ainda
indi pen ável apreciar o ato frente à norma con titucional, bem como à relaçõe e i-
tuaçõe da vida que vi a conformar. E tal juízo ainda mai complexo se recorta, quando
recai obre um ato normativo - então a norma, que é um de er er ou um alor, é tamb 'm
objeto de um juízo de alor.
zionole nel processo civile, cit., págs. 37 e segs. e 84 e segs., e 1/control/o giudiziario de/la legge in diritto
comparoto, Milão, 1970, págs. 105-106; ALFREDO BUZAID, Da ação direta de declaração da inconstitucio-
nalidade no Direito brasileiro, São Paulo, 1958, págs. 128 e segs.; KElSEN, Teoria Pura ..., cit., 11,págs. 159
e segs.; FRANCO PIERANDREI, Corte Costituzionale, Milão, 1962, págs. 898 e segs.; BIAGGIO DE GIOVANNI,
La nu/lità ne/la lógica dei diritto, Nápoles, 1964; JORGE MIRANDA, Aspecto de uma teoria da inconstitu-
cionalidade, policopiado, Lisboa, 1964, págs. 210 e segs.; ERNST FRIESENHAHN, Die Verfassungs gerichts-
barkeit in der Bundes Republik Deutschland, 1963, trad. La giurisdizione costituzionale ne/la Repubblica
Federale Tedesca, Milão, 1965, págs. 76 e segs.; MIGUEl GAlVÃO TELES, Eficácia de tratados ..., cit., págs.
196 e segs., Direito Constitucional Português Vigente, cit., págs. 101 e segs., e Inconstitucionalidade pre-
térita, cit., loc. cit., págs. 310 e 326 e segs.; FElICE OElFINO, La dichiarazione di i/legittimità costituzionale
de/le leggi, Nápoles, 1970, págs. 101 e segs.; MARCEllO CAETANO, Direito Constitucional, Rio de Janeiro,
1977, I, págs. 406 e 407; VEZIO CRISAFUlll, Lezioni di Diritto Costituzionale, 11-2, Pádua, 1978, págs. 349 e
segs.; MARCElO REBElO DE SOUSA, Direito Constitucional, Braga, 1979, págs. 381 e 391 e segs., e O valor
juridico ..., cit., págs. 144 e segs.; MARCElO NEVES, op. cit., págs. 74 e segs.; RUI MEDEIROS, "Os valores
jurídicos negativos da lei inconstitucional", in O Direito, 1989, págs. 485 e segs., e A decisão ..., cit., págs.
37 e segs. e 138 e segs.; REGINA FERRARI, op. cit., págs. 82 e segs.; RAUL BOCANEGRA SIERRA, "Sobre el
alcance objetivo de las sentencias dei Tribunal Constitucional, in Estudios sobre la Constitución Espano-
la - Homenaje ai Pro/esor Eduardo Garcia de Enterria, obra coletiva, I, Madrid, 1991, págs. 527 e segs.;
JORGE BACELAR GOUVEIA, O valor positivo do ato inconstitucional, Lisboa, 1992, págs. 28 e segs., e Manu-
al ..., 11,cit., págs. 1306 e segs.; PAULO OTERO, Ensaio ..., cit., págs. 113-114; VITAlINO CANAS, Introdução ...,
cit., págs. 125 e segs.; GOMES CANOTllHO, Direito Constitucional ..., cit., págs. 947 e segs.; Luís ROBERTO
BARROSO, op. cit., págs. 15 e segs.; BLANCO DE MORAIS, Justiça ..., I, cit., págs. 156 e segs.
70 Cfr., por todos, RAÚl VENTURA, Valor jurídico do casamento, Lisboa, 1951; PONTES DE MIRANDA, Tratado
de Direito Privado, IV, 2ª ed., Rio de Janeiro, 1954, págs. 8 e segs.; PAULO CUNHA, Teoria Geral da Relação
Jurídica, 11,policopiado, Lisboa, 1959-1960, págs. 242 e segs.; RUI DE ALARCÃO, A confirmação do negócio
anulável, I, Coimbra, 1971, págs. 33 e segs.; MOTA PINTO, Teoria Geral do Direito Civil, 2ª ed., Coimbra, 1983,
págs. 591 e segs.; CARVALHO FERNANDES, Teoria Geral do Direito Civil, 11,2ª ed., Lisboa, 1996, págs. 377 e
segs.; INOdNCIO GAlVÃO TEllES, Manual dos Contratos em Geral, 4ª ed., Coimbra, 2002, págs. 355 e segs.;
MENEZES CORDEIRO, Tratado de Direita Civil Português, I, tomo I, 3ª ed., Coimbra, 2005, págs. 853 e segs.
71 Cfr., por todos, ROGÉRIO SOARES, Interesse público ..., cit., págs. 259 e segs.; MARCElLO CAETANO, Manual
de Direito Administrativo, I, 10ª ed., Lisboa, 1973, págs. 512 e segs.; SÉRVULO CORREIA, Noçães de Direi-
to Administrativo, I, Lisboa, 1982, págs. 350 e segs.; FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administra-
tivo, 11,Coimbra, 2001, págs. 342 e segs.; JoÃo CAUPERS, Introdução ao Direito Administrativo, 7ª ed.,
Lisboa, 2003, págs. 187 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
72 Ainda que seja uma decisão do Tribunal Constitucional. No mesmo sentido, PAULO OTERO, Ensaio
..., cit., Ensaia ..., cit., págs. 113 e segs. Contra, em nome da posição específica ou privilegiada do Tribu-
nal na fiscalização da constitucionalidade, RUI MEDEIROS,A decisão ..., cit., págs. 142 e segs. e CARLOS
BLANCODE MORAIS, Justiça ..., I, cit., págs. 209 e 210. Este último Autor fala em caso julgado do Tribunal
Constitucional, que se pronuncie pela existência jurídica. Mas, alguma vez, este Tribunal se pronuncia
pela existência jurídica ou pela constitucionalidade? E, não havendo julgamento ou decisão positiva
de constitucionalidade no Direito português, como podem os tribunais comuns estar adstritos a uma
decisão negativa ou de não provimento do Tribunal Constitucional?
73 Sobre a situação da lei inconstitucional antes da declaração, cfr. GUSTAVOZAGREBEZSKY,
op. cit., págs.
175 e segs.
74 Observe-se que a doutrina portuguesa (como a de outros países) não coincide inteiramente no elenco
dos valores jurídicos negativos da inconstitucionalidade. Assim, MARCELO REBELODE SOUSA (O valor
jurídico ..., cit., págs. 155 e segs.) enuncia inexistência, invalidade, nulidade atípica, irregularidade e ine-
ficácia; RUI MEDEIROS (Os valores ..., cit., loe. cit., págs. 496 e segs.), anulabilidade, nulidade, ineficácia
e irregularidade; BLANCODE MORAIS (Justiça ..., I, cit., págs. 188 e segs.), inixistência jurídica, invalidade
e irregularidade; GOMES CANOTILHO(Direito Constitucional ..., cit., págs. 952 e segs.), inexistência, inva-
lidade, ineficácia e irregularidade.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição _
pagar impo to que não ejam criado no termo da Con tituição (art. 106°, nO3);75 ou
e tende-a me mo à inexi tência de identificabilidade material mínima a ituaçõe de
de conformidade total em relação à on tituição material.76 Toda ia, não cremo hoje
po í el acolher e ta po tura.77
a erdade, a inexi tênciajurídica de enha- e em face do ato jurídico-público como
expre ão d ontade imputável ao E tado; não tem que er com o eu conteúdo ou en-
tidoo O que importa para o ato existir juridicamente, produzindo ou não certo efeito, é
que haja uma ontad ub umí el na pre i ão de uma norma con titucional; não é que
e a ontade e conforme ou oriente de ta ou daquela maneira.
A ultam ainda outro moti o , tal ez mai importante, a impelir-no para a re-
jeição: 1°) o con eito de on tituição material é um conceito doutrinai, cuja única ba e
firme encontra na on tituição formal; alargar a violação do cerne da Constituição
material à in xi tência jurídica seria exces i o e perigoso para a egurança e a certeza do
Direito; 2°) também o âmbito do direito, liberdade e garantia e oferece tão vasto em
on tituiçõe como a portugue a ou abra ileira que acabar- e-ia por consumir na inexi -
tência jurídica praticamente toda e qualquer infração de dezena e dezena de preceito
con titucionai , com con equência ab urda ; 3°) o direito de resi tência, ape ar de reve-
lar uma alorização, con i tência ou força jurídica mai inten a do direito e liberdade,
não er e de alternati a ou de ucedâneo à declaração juri dicional.
75 MIGUEL GALVÃOTELES,Eficácia ..., cito, págso 135-136, e Direita Constitucional Português Vigente, cit.,
págs. 101-102; GOMESCANOTILHO,Direito Constitucional..., cit., pág. 955; e também nós próprios em
Aspectos de uma teoria ..., cit., págs. 236 e segs., e em Ciência Política ..., 11, cit., pág. 520.
76 MARCELOREBELODESOUSA,O valor jurídico ..., cit., págs. 168 e segso(contra, contudo, em Direito Cons-
titucional, cit., págso 391 e segso)o
77 No mesmo sentido, BLANCODE MORAIS,Justiça ..o,I, cit., págs. 193 e segso
78 Justiça ..o,I, cit., págs. 240 e segso, e 11, págs. 783 e segso
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
79 E tanto é assim que o próprio BLANCO DE MORAIS reconhece que a decisão determina repristinação
da norma anterior, embora não como consequência necessária (págs. 811 e segs., já atrás citadas).
80 Mantemos a posição que defendemos desde 1964 (cfr. Aspectos de umo teorio da inconstitucionalida-
de, policopiado, Lisboa, 1964, págs. 241 e segs).
81 V. Manual ..., V, cit., pág. 388.
82 V. Curso ..., cit., págs. 136 e segs.
83 Para uma introdução teórica geral, é clássico o estudo (de 1935) de COSTANTINOMORTATI, "la volontà e
la causa neil'atto amninistrativo e nella legge", in Scritti, li, Milão, 1972, págs. 473 e segs., máxime 558
e segs. Cfr. ainda MASSINO SEVEROGIANNINI, L'i1egittimità ..., cit., loe. cit., pág. 59.
84 Neste sentido, MARCELOREBELODE SOUSA, O valor ..., cit., pág. 314.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição ••
que, por cau a de e ato, tenha um eu direito ou interes e ofendido e sofra um prejuízo,
pa ível (me mo e não patrimonial) de avaliação pecuniária.
E tá- e, ne ta altura, a raciocinar não tanto do pri ma da invalidade quanto do pri -
ma da ilicitude: a incon titucionalidade erá um pre upo to de re pon abilidade ci il a
acre cer a outro, entre o quai um e pecífico de er de atuação (ou de não atuação) por
parte do E tado. E não é de excluir qu , limitando o Tribunal on titucional o efeito
da incon titucionalidade, o direito a indemnização e re ele um ucedâneo neces ário da
plena produção de efeitos.
Mai grave eria ainda a reaprovação ou reprodução de norma declarada incon titu-
cional com força obrigatória geral em ter mudado a norma parâmetro. eria um ca o, e
não de doi ,pelo meno de culpa do legi lador.
O fenómeno da re pon abilidade ci il do E tado deri ado de incon titucionalidade
tem aqui a ua manife taçõe mais int re ante. Ma não e e gota ne ta função. Pode
ha er outro im r p n abilidade por ato de função admini trativa e da função juri di-
cional: quando a Admini tração ou um tribunal aplique norma declarada incon titucional
com força obrigatória geral.85
par da re pon abilidade por ato incon titucionai ,e mais ou menos conexa com
ela, pode ha er re p n abilidade ci il do E tado por omi õe incon titucionais, máxime
p r omi õe legi lati a .
a primeira, inerente à democracia repre entati a e efeti ada ou, difu amente,
atra é da ujeição à crítica do cidadão no e ercício da liberdade fundamen-
tai ou, e pecificam nte, em eleiçõe no final do mandato dos titulare eleito
ou por outro procedimento ;
a egunda, integrada no mecani mo próprio de certo i tema (como o par-
lamentar ou o emipre idencial), em que a sub i tência do Governo depende do
Parlamento.86
85 Sobre o assunto, cfr. AFONSOQUEIRó, Teoria dos Atos do Governo, Coimbra, 1948, págs. 181 e segs.; RUI
MEDEIROS,Ensaia sobre a responsabilidade civil do Estado por atos legislativos, Coimbra, 1992; MARIA
LÚCIAAMARAL, Responsabilidade do Estado e dever de indemnizar do legislador, Coimbra, 1998; JORGE
MIRANDA, Manual ..., IV, cit., págs. 293 e segs.
86 Cfr., por exemplo, A. H. BIRCH,Representative and Responsible Government, Londres, 1964; ou GIUSEPPE
UGO RESCIGNO,La Responsabilità Politica, Milão, 1967; JORGEMIRANDA, Manual ..., VII, cit., págs. 78 e
segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Aqui intere a a re pon abilidade - a repre entação (poi que não en olvem re pon-
abilidade-fi calização a ançõe con titucionai a que atrá aludimo).
Os titulares do cargos político re pondem pela ações e omi ões que pratiqu m
no exercício das ua funçõe (art. 1170 nO I, da Con tituição portugue a). Re pondem
perante o povo, a quem pert nce a oberania, e também por açõe ou omi õe incon-
titucionai - independentemente do de envol imento ou não do meio, juri dicionai
e não juri dicionai de controlo e da e entual declaração d incon titucionalidad p lo
Tribunal on titucional.
Capítulo 11
GARANTIA EM GERAL
§ lQ
Garantia e fiscalização
1
omi ão do poder político, ão acompanhada por norma con titucionai adjetiva. À
incon titucionalidade corre ponde a garantia da con titucionalidade.2
1 Normas adjetivas a qualificar de materialmente constitucionais, ainda que formalmente possam não o ser.
2 Cfr. JELLlNEK,AlIgemeine Staatslehre, trad. Teoria General dei Estado, Buenos Aires, 1954, págs. 591 e
segs.; MAURICE HAURIOU, Précis de Droit Constitutionnel, 2! ed., Paris, 1929, págs. 266 e segs.; KELSEN,
La Gorantie ..., cit., e La Giustizia Costituzionale, cit., 1981; C. SCHMITI, Teoria ..., cit., págs. 131 e segs., e
Der Hüter der Verfassung, trad. castelhana La Defensa de la Constitución, Barcelona, 1931 e trad. por·
tuguesa O guardião da Constituição, Belo Horizonte, 2007; JosÉ CARLOSMOREIRA, Fiscalização Judicial
da Constituição, cit., loc. cit., págs. 1 e segs. e 354 e segs.; GIUSEPPECHIARELLI,"Appunti sulle Garanzie
Costituzionali", in Studi in onore di Emilio Crosa, obra coletiva, I, Milão, 1960, págs. 527 e segs.; SALVA-
TOREROMANO, L'ordinamento giuridico ed iI sistema positivo della giurisdizione in generale e della giu-
risdizione costituzionale in particolare, Milão, 1961; EUGENEROSTOW,The Sovereign Prerogative, New
Haven e Londres, 1962; GIUSEPPEFERRARI,"Guarentigie Costituzionali", in Enciclopedia dei Diritto, VIII,
págs. 44 e segs.; ano BACHOF,Grundgesetz und Richtermacht, trad. Jueces y Constitución, trad., Ma-
drid, 1963; THEMISTCLESBRANDÃOCAVALCANTI,Do controle da constitucionalidade, Rio de Janeiro, 1966;
JORGE MIRANDA, Contributo ..., cit., págs. 209 e segs.; GEORGESBURDEAU, Traité de Science Politique,
IV, 2! ed., págs. 365 e segs.; PABLO LUCASVERDU, "Garantias constitucionales", in Nueva Enciclopedia
Juridica, X, 1976, págs. 541 e segs.; GUSTAVOZAGREBELSKY,
La giustizia costituzionale, cit.; PHILlP BOBBIT,
Constitutional Fate-Theory of the Constitution, Nova lorque-Oxónia, 1982; KLAUSSTERN, Derecho dei
Estado de la Republica Federal Alemana, trad., Madrid, 1987, págs. 366 e segs.; Luís ROBERTOBARROSO,
O Direito Constitucional e a efetividade de suas normas, 2! ed., Rio de Janeiro, 1993, págs. 115 e segs.;
Contrai in Constitutional Law, obra coletiva editada por CARLA M. ZOETHOUT,GER VAN DER TANG e PIET
AKKERMANS, Dordrecht, 1993; LÉNlo LUIz STRECK,Jurisdição constitucionol e hermenêutico, 2! ed., Rio
de Janeiro, 2004; GOMES CANOTILHO,Direito Constitucional ..., cit., págs. 887 e segs.; BLANCODE MORAIS,
A justiça ..., I, cit., págs. 13 e segs.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição _
11- ntr tanto, da garantia da con tilucionalidade como garantia da efeti idade de
norma con titucionai (de toda e de cada uma dela) importa di tinguir a garantia da
Con tituição no eu conjunto ou deste ou daquele in tituto em que con i tem asformas
de defe a da Con tilllição, por um lado, e a sançõe con titucionai , por outra banda.
orno forma de defl a ou garantia preventiva refiram- e, entre outra , o jura-
mento de titular de cargo público, a edação de a ociaçõe ou partido contrários à
on tituição,J o e tado de exceção ou de nece idade e regra de organização adequada
na igência de te e tado.
ançõ con titucionai ou garantia repre i a atingem os titulare de órgão
do poder p la prática de ato ilícito ou, pelo meno incon titucionai ou ilegai , no
exercício da ua funçõe: re pon abilidade civil e criminal em geral, perda do cargo de
Pre idente da República por au ência indevida do território nacional (art. 129 da on- 0
10 Cfr. supra.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
tomar no proces 0.13 Diz- e principal a fi calização em que a garantia é o fim principal ou
único e a incon titucionalidade é elevada a que tão principal, a objeto do proce o.
Ob erve- e que uma coi a é falar em que tão prejudicial, outra coi a - noutro plano
- falar em incidente de incon titucionalidade. A que tão de incon titucionalidade não é
uma questão incidental ou de Direito processual é uma que tão prejudicial ou de Direito
con titucional ub tantivo; ma é u citada incidentalmente em proce o que tem por
objeto uma que tão diferente.'4
1Il - Pode er também di tinta a forma proce ual: há fi calização por ia de exce-
ção e fi calização por ia de ação.
exceção é uma iniciativa enxertada num proce o já em cur o, eja um meio de
defe a indireta propiciado ao réu (ou ao autor recon inte) para obter a improcedência do
pedido (ou da recon enção), eja (ainda de certa orte) um in trumento ao di por do Mi-
ni tério Público; IS a ação la/issimo sen u é a tradução proce ual do direito ou do poder
de de ncadear um proce o com vi ta a determinado fim.16
Para lá de ta di tinção, fica o conhecimento oficio o da incon titucionalidade pelo juiz.
a maior parte do ca o , a fi calização incidental corre ponde a fi calização por
ia de exceção, e a principal a fi calização por ia de ação. Ma pode haver fiscalização
incidental de encadeada por ação: 'po ível alguém dirigir- e a tribunal, invocando um
direito fundamental eu, e u tentar o eu pedido na incon titucionalidade da norma le-
gi lati a e no princípio geral da tutela juri dicional de direito .n
De todo o modo ne ta hipóte e, a que tão principal é a relati a ao direito con titu-
cionalment garantido e a que tão prejudicial a r lati a à incon titucionalidade da norma
legi lativa - a im como a deci ão do tribunal no entido da incon titucionalidade ó
produz efeito na cau a no ca o concreto. O juiz limita- e a declarar o direito invocado
aplicando a norma con titucional, a qual prevalece obre a norma infracon titucional.
aturalmente, pode ainda a lei admitir que a que tão de incon titucionalidade eja
u citada na fa e de r cur o .
13 Cfr., por todos, MIGUEl TEIXEIRA DE SOUSA, "Prejudicialidade e limites objetivos do caso julgado", in
Revista de Direito e Estudos Sociois, págs. 304 e segs., máxime 306, 1977.
14 Cfr. MAURO CAPPElLETII, Lo pregiudizialità costituzionale nel pracesso civile, Milão, 1957; JORGEMIRAN-
DA, Contributo ..., cit., págs. 257 e segs.; VEZIO CRISAFULLI,"In tema di instaurazione dei giudizi incidentali
di costituzionalità delle leggí", in Studi in memoria de Carlo Esposito, obra coletiva, IV, págs. 2790 e segs.;
GIROLANOMONTElEONE, Giudizio incidentale sulle leggi e giurisdizione, Pádua, 1984, págs. 1 e segs.
15 Cfr., por todos, EDUARDOCOUTURE,Introduçõo ao Estudo da Processo Civil, trad., Lisboa, 1952, págs. 25
e segs., e Contributo ..., cit., págs. 260 e segs.
16 Cfr., por todos, JoÃo DE CASTROMENDES, O direito de açõo judicial, Lisboa, 1959; JOAQuíN BRAGECAMA-
ZANO, La acción de inconstitucionalidad, México, 1998.
17 Cfr. ALECSTONE,"Qu'y a-t-il de concret dans le contrôle abstrait aux États-Unis?", in Revue française de
droit castitutionnel, págs. 227 e segs., 1998.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
18 Cfr., por exemplo, FERNANDO BERMUDEZ, La Procédure l'Amparo contre les Actes et les Lois contraires
à la Constitution du Méxique, Paris, 1914; MAURO CAPPELLETTI,La giurisdizione costituzionale della
libertà, reimpressão, Milão, 1976; GARCIA RUIZ, fi recurso de amparo en el derecho espanol, Madrid,
1980; ADELE ANZON, 11ricorso individuale di costituzionalità in Germania Federale, Austria e Spagna,
in Politico dei Diritto, 1989; HECTORFIX-ZANUDIO, fnsayos sobre el Derecho de Amparo, México, 1993;
ALLAN R. BREWER-CARIAS, fi amparo a los derechos y garantias constitucionales, Caracas, 1993; O
direito de amparo em Macau e em Direito Comparado, número especial da Revista Jurídica de Ma-
cau, 1999; WLADIMIR BRITO, "O amparo constitucicnal", in Direito e Cidadania, n2 7, págs. 9 e segs.,
julho-outubro de 1999; PETERHABERLE, "O recurso de amparo no sistema germânico de justiça cons-
titucional", in Sub Judice, 20/21, 2001, págs. 33 e segs.; PABLO PEREZTREMPS, fi recurso de amparas,
Madrid, 2004.
19 Exemplo de Constituição que a prevê: a colombiana de 1991, no seu art. 2422; cfr. ERNESTOREYCANTOR,
"Acción popular de inconstitucionalidad", in fstudios Constitucionales, Universidade de Talca, Santiago
do Chile, 2003, págs. 343 e segs.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição ••
II - Mai do que um autor tem conte tado a pre ença no conhecimento difu o de
uma ideia ou função de garantia da constitucionalidade, reduzindo-a, por exemplo, ora
a uma ituação de nece idad perante um conflito de norma, ora a um pre supo to da
ati idade juri dicional, ora a uma genérica tutela.lo
unca perfilhámo tal po tura negativi ta até porque o i temas jurídico po iti-
o incluindo o portuguê e obra ileiro, demonstram a importância da atribuição ao
tribunai do poder de apreciar e não aplicar norma incon titucionai e como o eu apare-
cimento repre enta uma mudança qualitativa na hi tória do E tado de Direito.
ão pode contudo, deixar de e admitir que - independentemente da vantagen e
do inconveniente, dos avanços e do ri cos que comporte - é apena em fiscalização con-
centrada que a garantia a ulta em plenitude e chega a recortar- e (como não raro, e diz)
como um erdadeiro poder do E tado a par do demai podere, com todo o problema
que i o acarreta; é aí que pode falar- e emju tiça con tituciona/ em entido e trito. E i to
ocorre ainda com maior nitidez quando a concentração e dá em tribunal con titucional e
e te em fi calização ab trata, declara a incon titucionalidade com força obrigatória geral.
Qual eja a natureza de ta deci õe do tribunal con titucional é outrossim contro-
ertido. K L E U tenta er ela legi lativa, poi anular umél lei eria ainda editar uma
norma geral editá-la com inal negativo.ll É po ição a que não podemo aderir poi
tudo e dá em aplicação da on tituição e o podere do preten o legi lador negativo
encontram- e aí completamente definido .
20 São as teses, respetivamente, de SCHMln, ESPOSITOe CHIARELLI,que examiná mos em Contributo ..., cit.,
págs. 214 e segs.
21 La Garantie ..., cit., págs. 28-29 e La giustizia ..., cit., págs. 172 e segs. Com esta explicação, julga também
KELSENafastar o risco de a justiça constitucional conduzir um órgão judicial a interferir em atos de um
órgão legislativo: seriam ambos órgãos legislativos, o fiscalizado e o fiscalizador, só que o segundo com
estatuto jurisdicional. Cfr., entre outros, CARLOCERETI,"Funzione legislativa e controllo di legittimità",
in Studi in onore di Emilio Crosa, obra coletiva, I, Milão, 1960, págs. 495 e segs., IGNACIO DE Ono, Oere-
cho Constitucional- Sistema de Fuentes, Barcelona, 1987, pág. 286, ou ADRIANO GIOVANNELLI,"Alcune
considerazioní sul modello della Verfassungsgerichtbarkeit kelseniana nel contesto dei dibattito sulla
funzione 'política' della Corte Costituzionale", in Scritti in onore di Vezio Crisa/ulli, obra coletiva, págs.
445 e segs. E também a respeito do Conselho Constitucional francês há quem defenda a sua natureza
legislativa: JEANCHRISTOPHEBALAT,La nature juridique du contrôle de constitutionnalité des lois dans de
cadre de /'article 61 de la Constitution de 1958, Paris, 1983.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
22 o que não significa que não suscite problemas jurídico-processuais: cfr., por exemplo, Contributo ...,
cit., págs. 253 e segs.
23 Na doutrina portuguesa, as obras gerais de consulta são as de VITALlNO CANAS, Os processos de
fiscalização da constitucionalidade e do legalidade pelo Tribunal Constitucional, Coimbra, 1988, e o
vol. 11da Justiça Constitucional, de CARLOSBLANCODE MORAIS; Coimbra, 2005. Além delas, citem-se
DURÃO BARROSO,O recurso para a Comissão Constitucional, cit., loc. cit., págs. 707 e segs.; ARMINDO
RIBEIROMENDES,"A jurisdição constitucional, o processo constitucional e o processo civil em Portugal",
in Estudos em memória do Pro! Doutor Castro Mendes, obra coletiva, Lisboa, 1994, págs. 81 e segs., e
Recursos em processo civil, Lisboa, 1994, págs. 317 e segs.; MIGUEL LOBOANTUNES,"Fiscalização abstra-
ta da constitucionalidade: questões processuais", in Estudos sobre jurisprudência do Tribunal Constitu-
cional, obra coletiva, Lisboa, 1993, págs. 397 e segs.; INÊSDOMINGOSe MARGARIDAMENERESPIMENTEL,
O recurso de inconstitucionalidade (espécies e respetivos pressupostos), ibidem, págs. 427 e segs.; GUI-
LHERMEDA FONSECAe INÊSDOMINGOS, Breviário do Direito Processual Constitucional, 2ª ed., Coimbra,
2002; BLANCODE MORAIS, Direito Constitucional 11- Sumários Desenvolvidos, Lisboa, 2004, págs. 48 e
segs.; MIGUELTEIXEIRADESOUSA,"Legitimidade e interesse no recurso da fiscalização concreta de cons-
titucionalidade", in Estuau~ •.. rI Homenagem ao Pro! Doutor Armando Marques Guedes, obra coletiva,
Coimbra, 2004, págs. 947 e segs.; JORGEBACELARGOUVEIA, Manual de Direito Constitucional, 11,Coim-
bra, 2005, págs. 1.336 e segs.; JosÉ MANUELCARDOSODACOSTA,A jurisdição constitucional em Portugal,
Coimbra, 2007, págs. 63 e segs.; CARLOSLOPESDO REGO,Os recursos de fiscalização concreta na lei e
na jurisprudência do Tribunal Constitucional, Coimbra, 2010. Na doutrina brasileira, v. JosÉ ALFREDO
DE OLIVEIRABARACHO,Processo Constitucional, Milão, 1957; ANNA CÂNDIDACUNHA FERRAZ,"Princípios
fundamentais do processo constitucional", in Revista do Mestrado em Direito da UNIFIEO, São Paulo,
2006, págs. 181 e segs.; MANOELGONÇALVESFERREIRAFILHO,"Os princípios do processo constitucional",
in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 2008, págs. 325 e segs.; PAULOROBERTO
DE GOUVEIA MEDINA, Direito Processual Constitucional, 4ª ed., Rio de Janeiro, 2010. Na doutrina de
outros países, cfr., entre tantos, SALVATORE VILLARI, 11processo costituzionale, Milão, 1957; MASSIMO
LUCIANI, Le decisioni processuali e la logica dei giudizio costituzionale incidentale, Pádua, 1984; JORG
LUTHER,Idee e storie di Giustizio Costituzionale nel/'ottocento, Turim, 1990, págs. 3 e segs.; PEDROCRUZ
VILLALONet alii, Los procesos Constitutionales, Madrid, 1992; ANTONIO SAnA, Leogica e retorica nella
motivazione delle decisioni della Corte Costituzionale, Milão, 1996; FRANCISCOCAAMANO DOMINGUEZ,
Jurisdicción y procesos constitucionales, 2ª ed., Madrid, 2000; DOMINGO GARCIA BELAUNDE,Derecho
Procesal Constitucional, Bogotá, 2001; PETERHÃBERLE,"EI Derecho Procesal Constitucional como De-
recho Constitucional concretizado frente a la juridición dei Tribunal Federal Constitucional alemão",
in Revista Iberoamericana de Derecho Procesal Constitucional, nº 1, págs. 15 e segs., janeiro-junho de
sobre Derecho Procesal Constitucional, obra coletiva, Lima, 2006.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição ••
24 Na esteira de MIGUEL TEIXEIRADE SOUSA,Introdução ao processo civil, 2~ ed., Lisboa, 2000, págs. 51
e segs. Cfr. MANUEL DEANDRADE,Noçães Elementares de Processo Civil, I, Coimbra, 1956, págs. 359 e
segs., ou JoÃo DECASTROMENDES,Manual de Processo Civil, Lisboa, 1963, págs. 37 e segs.
25 JOÃo DECASTROMENDES,op. cit., pág. 39.
26 Cfr. MANUELDEANDRADE,op. cit., págs. 559 e segs.
27 Ibidem, págs. 91 e segs.
28 Direito Constitucional ..., cit., págs. 971 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
§ 2º
As decisões de fiscalização
I - u citada de qualquer forma a que tão de incon titucionalidade por ação, o re-
ultado pode er po iti o ou negati o, pode traduzir- e num juízo de incon titucionalida-
de ou num juízo de não incon titucionalidade.
A e e juízo corre pondem, contudo, deci õe de natur za di er a con oante e
trate de fi calização concreta ou de fi calização ab trata:
Podem r deci ões interpretativa - ou de fixação de uma int rpr tação (vincu-
lati a ou não para os re tante tribunai), máxime de uma interpretação confor-
me com a on tituição que e ite o juízo de incon titucionalidade;
Pod m er deci õe limitativa - limitativa de efeito da deci ão de incon titu-
cionalidade ou até da própria incon titucionalidade;
Podem er deci õe aditiva ou modificativas, quando, con iderando incon titu-
cional o entendimento da norma eu objeto ó com certo conteúdo ou alcance,
lhe acre centam (e, por con eguinte, modificam-na) um egm nto que permite a
ua ub i tência à luz da Con tituição.29
2ª ed., São Paulo, 1990; Effetti temporali delle sentenze della Corte Costituzionale enche con riferimento
alie esperienza straniere, obra coletiva, Milão, 1989; GIUSTINO D'ORAZIO, "Le sentenze costituzionali ad-
ditive tra esaltazione e contestazione", in Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico, págso 61 e segso, 1992;
PAULO OTERO, Ensaio sobre o caso julgado inconstitucional, Lisboa, 1993, págso 110 e segso; VITALlNO
CANAS, Introdução às decisões de provimento do Tribunal Constitucional, 2ª edo, Lisboa, 1994; La Cour
de Cassation et la Constitution de la République, obra coletiva, Aix-en-Provence, 1994, págso 265 e
segs.; Mo DE LOS ANGELES GUTIERREZ lARGA, "Las sentencias interpretativas y aditivas dei Tribunal Cons-
titucional Espano!", in Revista de Derecha Procesal, nQ 3, 1995; GILMAR FERREIRA MENDES, Jurisdição
Constitucianal- O controle abstrata de normas na Brasil e na Alemanha, São Paulo, 1996, págs. 187
e segso; FABRIZIO POLITI, GIi effetti nel tempo delle sentenze di accoglimento della Corte Castituzianale,
Pádua, 1997; THIERRY DI MANNO, Le Juge Canstitutiannel et la téchnique des décisians "interprétatives",
en France et en Italie, Aix-en-Provence, 1997; JAVIER JIMÉNEZ CAMPO et alii, La sentencia sobre la costi-
tucionalidad de la ley, Madrid, 1997; Las tensions entre el Tribunal Constitucional y ellegislador en la
Europa actual, obra coletiva editada por ELlSEO AJA, Barcelona, 1998; JosÉ JULIO FERNÁNDEZ RODRfGUEZ,
"Typologie des dispositions des Cours Constitutionnelles", in Revue Belge de Droit Constitutionnelle,
págso 333 e segso, 1998; GIAN PAOLO DOLSO, "Le sentenze additive di principio", in Giurisprudenza Cos-
tituzionale, 1999, págs. 40111 e segso; RUI MEDEIROS, A decisão de inconstitucionalidade, Lisboa, 1999,
págso 289 e segso, 413 e segso e 533 e segs.; MARKOS GONZÁLEZ BEILFUSS, Tribunal Constitucional y re-
paración de la discriminación normativa, Madrid, 2000; FRANCISCO JAVIER DIAZ REVORIO, Las sentencias
interpretativas dei Tribunal Costitucional, Valladolid, 2001; GINEVRA CERRINA FERON, Giuridizione costi-
tuzionale e legislatore nella Repubblica federale tedesca, Turim, 2002; HÉCTOR LÓPEZ BOFILL, Decisiones
interpretativas en el control de costitucionalidad de la ley, Valência, 2004; THIERRY DI MANNO, "Les
décisions de constitutionnalité précaire en Italia et en France", in Liber Amicorum Jean-C/aude Escar-
ras, obra coletiva, Bruxelas, 2005, págso 2003 e segso; BLANCO DE MORAIS, opo cit., I, págso 177 e segso;
CARDOSO DA COSTA, A jurisdição ..o, cit., págso 85 e segso
30 Cfro Lufs NUNES DE ALMEIDA, O Tribunal ..., cito, loc. cit., págs. 955-956; VITALlNO CANAS, Introdução ..., cit.,
págso 89 e segso
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
a) Esgota- e no ca o;
b) É eficácia apenas inter partes, não erga omnes;
c) Só aí faz caso julgado (ca o julgado forma!). 35
31 Sobre repristinação, cfr. supra, assim como ALEXANDRESOUSA PINHEIRO, "Repristinação", in Dicionário
Jurídico da Administração Pública, VII, 1996, págs. 234 e segs., e RUI MEDEIROS,A decisão ..., cit., págs.
651 e segs.; BLANCO DE MORAIS, Justiça ..., I, cit., págs. 802-803.
32 Em qualquer caso é ainda a própria norma da Constituição violada pela norma julgada inconstitucional
que recebe aplicação e é porque a aplico que o tribunal desaplica a norma inconstitucional. Assim
(como escrevemos em Contributo ..., cit., pág. 229), o ato de garantia substitui o ato de criação da nor-
ma de grau inferior, enquanto, devido a ele, a norma constitucional que, antes fora postergada, passa
a ser observada.
33 Cfr. infra.
34 Cfr. VITAlINO CANAS, Introdução ..., cit., págs. 58 e segs.; ALEXANDRESOUSA PINHEIRO, op. cit., loc. cit.,
pág. 236; BLANCO DE MORAIS, Justiça ..., I, cit., págs. 811 e segs.
35 Sobre caso julgado formal e caso julgado material, cfr., por todos, MANUEl DEANDRADE, op. cit., I, págs.
289 e segs.; CASTROMENDES, Manual ..., cit., págs. 457 e segs.; TEIXEIRADE SOUSA,O objeto da sentença
e o caso julgado material, Lisboa, 1983; ANTUNESVARELA,J. MIGUEl BEZERRAe SAMPAIO E NORA, Manual
de Processo Civil, Coimbra, 1985, págs. 683 e segs.; ISABEl ALEXANDRE,"O caso julgado na jurisprudên-
cia constitucional portuguesa", in Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da
Costa, obra coletiva, Coimbra, 2003, págs. 11 e segs.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição ••
III - enhum problema e pecífico le anta a deci ão de aplicação de norma não jul-
gada incon titucional. Rele ante podem ir a er, porém, a regra relativa ao recur o
que caibam d a deci ão.
Não por acaso à deci ão atribui- e "força obrigatória geral" (art. 282°, nO I, da Con -
tituição portugue a) e, noutra per petiva, ela pode ser reconduzida não só a coi a julgada
formal como a coi a julgada material.38-39
IV - RUI MEDEIRO u tenta, pelo contrário, que o legi lador não ficaria vinculado à
declaração de inconstitucionalidade, podendo reproduzir normas com conteúdo idêntico
àquela que tive sem ido declaradas incon titucionai e até con olidar retroativamente
atos praticados à sua ombra ou alterar o efeitos da declaração de incon titucionalidade.40
Fá-lo em nome da abertura da Constituição, por temer consequência bloqueadora e
fossilizadoras,4\ por não estar aí em cau a (ao contrário do que ucede noutra área) um direi-
to fundamental do particulare à tutela jurisdicional efetiva42 e por nenhum outro órgão con-
trolar o Tribunal Constitucional ou corrigir a sua deci õe .43Fá-lo com base na legitimidade
política dos órgão legi lativo ,o quai e encontram em subordinação imediata à Constitui-
ção e não em subordinação mediata atravé da interpretação vinculante de outro órgão.44
R I MEDEIROS admite apena que, e o legi lador per istir teimo amente na ua ati-
tude, ignorando sem motivo ju tificativo o entido da jurisprudência constitucional, não
erá difícil, numa ação de re pon abilidade civil pelo ilícito legi lativo, demon trar a ua
cen urabilidade.45
38 O caso julgado formal só obsta a que no mesmo processo se altere o conteúdo da decisão. Com o caso
julgado material aquilo que fica indiscutível e imutável não é a decisão enquanto ato continente, mas
a decisão enquanto conteúdo ou matéria, o decidido, a situação fática ou jurídica tal como a sentença
o representou (CASTROMENDES, Manual ..., cit., pág. 459).
39 O instituto da coisa julgada ou do caso julgado responde a um conflito, também presente nos proces-
sos de fiscalização abstrata, entre a preocupação com a correção da decisão e o objetivo de paz e de
segurança jurídicas (RUI MEDEIROS, A decisão ..., cit., pág. 797). Contra: VITALlNO CANAS, Introdução ...,
cit., págs. 173 e segs.
40 A decisão ..., cit., págs. 819 e segs. e 843 e segs.; em sentido próximo, mas mitigada mente, Luís NUNES
DEALMEIDA, "Les effets des arrêts du Tribunal Constitutionnel", in La Justice Constitutionnelle au Portu-
gal, obra coletiva, Paris, 1989, pág. 398. Contra, GOMES CANOTlLHOe VITAL MOREIRA, Constituição ..., cit.,
pág. 1.044; PAULOOTEROEnsaio ..., cit., págs. 139 e segs. (mas excetuado as decisões inconstitucionais);
VITALlNO CANAS, Introdução ..., cit., págs. 172 e 173; PAULODE CASTRORANGEl, O legislador e o Tribunal
Constitucional, in Direito e Justiça, 1997,2, págs. 217 e segs.; GOMES CANOTILHO,Direito Constitucio-
nal ..., cit., págs. 1.010 e segs.
41 Ibidem, pág. 826.
42 Ibidem, pág. 823.
43 Ibidem, págs. 827 e segs. e 837.
44 Ibidem, págs. 830 e 831.
45 Ibidem, pág. 840.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição _
46 Cfr .• assim, GOMES CANOTILHOe VITAL MOREIRA, Constituição ...• cit., pág. 1.044.
47 De resto, algo contraditoriamente, RUI MEDEIROS aponta um dever da Administração de revogação
invalidatória de atos baseados na normação declarada inconstitucional (op. cit.. pág. 800).
48 Referida a pág. 839.
49 Também MIGUEL NOGUEIRADE BRITO,JOAQUIM PEDROCARDOSODA COSTAe ANT6NIO DEARAÚJOescrevem
que não há norma constitucional que imponha a renovação de normas declaradas inconstitucionais ("A
execução das decisões do Tribunal Constitucional pelo legislador", in Sub Judice, 20/21. pág. 118. janeiro-
junho de 2001), mas acabam por reconhecer que o respeito pela razão pública (no sentido de JOHN
RAWLS)justifica a inibição do legislador (pág. 123); só naqueles casos em que estejam em causa questões
de evidentes contornos ético-políticos elas devem permanecer sempre em aberto (págs. 124-125).
50 Embora quanto ao caso concreto, através do qual a questão suba ao Tribunal Constitucional, a decisão
produza efeitos ex tunc. Cfr., por todos, GUSTAVOZAGREBELSKY, La Giustizia ..., cit., pág. 169.
51 Ou o art. 2802, n2 3. da Constituição cabo-verdiana quanto a normas constantes de tratados.
52 Para mais informação, v. JosÉ ADÉRCIO LEITE SAMPAIO, A Constituição reinventada pela jurisdição
constitucional, Belo Horizonte, 2002, págs. 233 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
53 CASTANHEIRANEVES, O instituto dos "assentos" e a função jurídica dos Supremos Tribunais, Coimbra,
1983, págs. 612-613.
54 OLIVEIRA ASCENSÃO, "Os Acórdãos com Força Obrigatória Geral do Tribunal Constitucional como
fonte de Direito", in Nos dez anos da Constituição, obra coletiva, Lisboa, 1987, pág. 261. Cfr., também,
AFONSO QUEIRÓ, "A função administrativa", in Revista de Direito e Estudos Sociais, 1977, págs. 29-30.
55 GOMES CANOTILHO, "A Concretização da Constituição pelo Legislador e pelo Tribunal Constitucio-
nal", in Nos dez anos ..., cit., pág. 353.
56 RUI MEDEIROS,A decisão ..., cit., pág. 803.
57 Nem sequer se, por revisão constitucional, for suprimida ou modificada a norma que serviu de fun-
damento à decisão. Simplesmente, a força formal passiva desta - reagindo contra lei oposta àquela
norma - cessará.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição
III - Por eze, diz- e que força obrigatória geral quivale à força de lei60ou à for-
ça afim d força de I i, ju tamente por cau a d a deci ão atingir ato legi lativo .
Atinge-o , por certo; ma em moldes e com uma intensidade diferente do molde
e da inten idade que e regi tam na relações entre ato legislativos. A força obrigatória
geral não e limita a tomar ineficaz um ato normativo incon titucional' toma-o, pura e
imple mente, nulo in alidando o eu efeito .61
Por outro lado, a declaração não tem de er ar apena obre ato legi lati os. Pode
er ar também, como se abe, obre outro ato jurídico-público - ora upralegi lati-
o ,como a lei de re i ão constitucional, ora infralegislati o ,como certo regulamen-
to .62E i to não meno confirma a natureza juri dicional da deci ão.
3/93). E a deci ão definitiva do upremo Tribunal Federal produz eficácia contra todo e
efeito inculant r lati amente ao demai órgão do Poder Judiciário à Admini tração
pública direta e indireta em toda a e fera da F deração (art. 102, 2°; na er ão da
Emenda Con titucional nO45/2004), embora não relati am nte ao próprio upremo e ao
Poder Legi lati 0.67
Voltado para a certeza do Direito e a economia proc ual, o in tituto bra ileiro
apre enta- e ba tante ulnerável: de de logo, porque, para tanto ba taria atribuir força
obrigatória geral à não declaração de incon titucionalidade; depoi , porque diminui o
campo de fi calização difusa; e, sobretudo, porque o eu entido útil acaba por e traduzir
num acré cimo de legitimidade, numa e pécie de anção judiciária a m dida legi lativa
proveniente do órgão (aI o o Procurador-Geral da República) a quem e re erva a
iniciati a. ão admira que eja controvertido.
Mas, ainda mai ,foi-se a ponto de, por I i ordinária (a Lei n° 9. 6 ,de 10 de no em-
bro de 1999), e tatuir que, em ca o de não procedência d ação direta d incon titucio-
nalidade, eria proclamada a con titucionalidade da di po ição ou da norma impugnada
(art. 23° e 24°) - quer dizer, foi- e a ponto de, a im, uma ação propo ta com certa fina-
lidade converter-se em ação com resultado opo to.
65 RUI MEDEIROS (A decisão ..., cit., pág. 838), ainda a propósito da proibição de reprodução de normas
declaradas inconstitucionais, afirma que ela não é compatível com a recusa de atribuição de força obri-
gatória geral às declarações de constitucionalidade, pois também uma errada declaração de inconsti-
tucionalidade viria como que a adquirir força constitucional por nunca poder ser reformada. Tudo está,
quanto a nós, na opção entre a primazia da Constituição e a do legislador. Se se opta pela primeira
- como é a tendência dominante após 1920 ou 1945 - compreende-se bem que só à declaração de
inconstitucionalidade se atribua força obrigatória geral, deixando-se sempre em aberto aos cidadãos e
aos juízes em geral recolocar a questão na hipótese de não inconstitucionalidade.
66 V. GILMAR FERREIRAMENDES, Jurisdição ..., cit., págs. 243 e segs.
67 V. GILMAR FERREIRAMENDES, "O controle de constitucionalidade das leis na atualidade", in Estudos em
homenagem ao Pro! Caio Tácito, obra coletiva, Rio de Janeiro, 1997, págs. 253 e segs.; MARISA FERREIRA
DOS SANTOS, "O poder do Supremo Tribunal Federal e a ação declaratória de constitucionalidade", in
Revista da AJUFE - Associação dos Juízes Federais, n!! 61, págs. 15 e segs., abril-junho de 1999; ZENO
VElOSO, op. cit., págs. 281 e segs.; CLEMERSONMERLlN CLEVE,A fiscalização abstrata da constituciona-
lidade no Direito Brasileiro, 2ª ed., São Paulo, 2000, págs. 272 e segs.; RICARDOALESSIDElFIM, Ação
declarativa de constitucionalidade e os princípios constitucionais do processo, São Paulo, 2001; ROGER
STIEFElMANN LEAL, O efeito vinculante na jurisdição constitucional, São Paulo, 2006, págs. 138 e segs.
Cfr. TANIA GROPPI, La "ação declaratória de constitucionalidade": una novità nel sistema brosileiro di
giustizia costituzionale, 1994, págs. 109 e segs.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição _
II - Em Portugal, o art. 80°, nO3, da lei do Tribunal Con titucional estipula que, no
ca o de o juízo de con titucionalidade ou de legalidade obre a norma que a deci ão recorri-
da tiver aplicado, ou a que tiver recusado aplicação, se fundar em determinada interpretação
da me ma norma, e ta deverá er aplicada com tal interpretação no proces o em causa.70
E o próprio Tribunal u tenta, num do eus acórdãos, que, funcionando como últi-
ma in tância de recur o de con titucionalidade da lei não pode er cerceado nos eu
poderes cognitivos por decisão anterior não transitada em julgado, proferida no proce -
68 Cfr., por todos, CLÁUDIO DE OLIVEIRA SANTOSCOLNAGO, Interpretação conforme a Constituição - Deci-
sões interpretativas do STF em sede de controle da constitucionalidade, São Paulo, 2007; EDGARCARPIO
MARCOS, "Interpretación conforme con la Constitución y las sentencias interpretativas (con especial
referencia a la experiência alemana)", in La Ciência dei Derecho Procesal Constitucional- Estudios em
homenaje a Hector Fix-Zamudio, obra coletiva, VI, México, 2008, págs. 155 e segs.
69 Sobre a doutrina do "Direito vivo", acolhida na Itália e segundo a qual, perante jurisprudência conso-
lidada, mormente dos tribunais superiores, no sentido da inconstitucionalidade, o Tribunal Constitu-
cional deve abster-se de fazer interpretação conforme com a Constituição, cfr., por exemplo, ANDREIA
PUGIOnO, Sindacato di costituzionalità e "diritto vivente", Milão, 1994; RUI MEDEIROS,A decisão ..., cit.,
págs. 406 e segs. (considerando-a irrelevante em Portugal); CATERINASEVERO,La doctrine du droit vi-
vant, Paris, Aix, 2003.
70 No Brasil, a lei n2 9.868, comina também o efeito vinculante da interpretação conforme com a Consti-
tuição (art. 28º, parágrafo único).
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
79 o próprio RUI MEDEIROStem consciência desta dificuldade (op. cit., págs. 369-370).
80 Cfr. ainda Luís NUNES DEALMEIDA, D Tribunal Constitucional ..., cit., loc. cit., págs. 953 e segs.; MÁRIO DE
BRITO, "As decisões interpretativas do Tribunal Constitucional", in Revista do Ministério Público, nQ 62,
págs. 57 e segs., 1995, e "Ainda sobre as decisões interpretativas do Tribunal Constitucional", in Estudas
em homenagem à Professora Doutora Isabel de Magalhães Col/aça, 11, págs. 725 e segs.
81 Cfr. a noção de "situações constitucionais imperfeitas" em GOMES CANOTlLHO, Direito Constitucional ...,
cit., pág. 955.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
naturalmente como e o tribunai toma em como ponto de partida o pre umível re ultado
da sua decisão e pa a sem por cima da Con tituição e da lei em atenção a um re ultado
de ejado. Ma a verdade é que um resultado inju to, ou por qualquer outra razão duvido o,
é também em regra - embora nem empre - um resultado juridicamente errado.82
11- Por ordem crescente de inten idade da limitação, as deci õe limitati a podem
consi tir em:
o Direito bra ileiro, di põe o art. 27° da Lei nO9. 6 ,de 19 de novembro de 1999:
"Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razõe de
egurançajurídica ou de excecional intere e ocial, poderá o upremo Tribunal Federal,
por maioria de doi terço de eu membro, restringir o efeitos daquela declaração ou
decidir que ela ó tenha eficácia a partir de eu trânsito em julgado ou de outro momento
que venha a r fixado". 5
alvo ne ta hipóte e ,não e acham autorizada e por con eguinte, de em ter- e
por inadmi í ei quai quer outra decisõe 6 ao contrário do que ucede por irtude de
norma constitucionai ,legai ou con uetudinárias, noutros países. 7
perativo da on tituição. E então, o órgão de fi calização acre centa (e, acre centando,
modifica) e e elemento que falta.90
Uma lei, ao atribuir um direito ou uma vantagem (v.g., uma pen ão) ou ao ad tringir
a um dever ou ónus (v.g., uma incompatibilidade), contempla certa categoria de pes oa
e não pre ê toda a que e encontrem na me ma ituação, ou acolhe diferenciaçõe in-
fundada . Que fazer: eliminar o preceito que, qualitativa ou quantitati amente, iolem
o princípio de igualdade? Ou pelo contrário, in ocando o alore e intere e con titu-
cionai que e projetam ne a ituaçõe re tabelecer a igualdade? D ci õe aditi a ão,
em e pecial, a que adotam o egundo termo da alternativa.
Na deci õe redutiva ou de incon titucionalidade parcial há um egm nto de nor-
ma que cai para ela er salva. a deci õe aditiva há um egmento ou uma norma
que se acre centa com idêntico fim.91 E ni to, por eu turno, e denota algo de comum
à deci õe limitati a e, dalguma orte, me mo à deci õe int rpretativa : toda ela
pre upõem um i tema de fiscalização que longe de e fi char obre i, aparece in erido
no contexto global de Con tituição e que portanto, reconhece ao respetivo órgão um
papel ativo de realização dos princípio constitucionais.
têm deixado de er con iderada problemática por certo Autore 9S e combatida com
forte argumento .96-97
Tai deci õe brigariam, e creve R I MEDEIRO , com o princípio democrático e com
o da eparação de podere . Ainda que se admiti e que a proibição do retrocesso pude e
impedir a deci ão de incon titucionalidade de uma lei que concretizasse em termos dis-
criminatório uma norma con titucional, daí não se retiraria uma legitimidade geral de -
a deci õe ,poi não e vi lumbraria como uma lei inconstitucional poderia condicionar
a atuação futura do legi lador legitimado democraticamente.9 Substituindo a vontade do
legi lador por outra, elas só em ca o excecionai eriam de aceitar e deveriam er limi-
tada na medida do po ível.99
De resto, a modificação da lei propo ta pelo Tribunal on titucional não eria vin-
culati a para o tribunal a quo na fi calização concreta e na fi calização ab trata não bene-
ficiaria da força obrigatória geral da declaração de incon titucionalidade.'oo
ão seguimos e ta po ição. Embora reconhecendo a nece sidade de divisas estreitas
e de e não meno prezarem os condicionalismos financeiro à luz do po tulado da "re-
erva económica do possível" \0\ não vemo como recusar esse tipo de decisões perante
di criminaçõe ou diferenciaçõe infundada frente à quai a extensão do regime mais
favorável e oferece, imultaneamente, como a decisão mais imediata para a sensibilida-
de coletiva e a mais próxima dos alore con titucionai .\02 Há imperati o materiai que
e obrepõem a con ideraçõe orgânico-funcionais.
O órgão de fi calização não se comporta aqui como legi lador, poi que não age por
iniciativa própria, nem egundo critérios políticos; age em processo instaurado por outrem
núbil para os indivíduos do sexo feminino inferior à fixada para os indivíduos do sexo masculino). No
Brasil, não há muito, o Supremo Tribunal Federal proferiu duas importantíssimas decisões aditivas;
uma sobre fidelidade partidária, no sentido de os parlamentares que mudem do partido por que te-
nham sido eleitos perderem o mandato; e outra, sobre a greve na função pública, estendendo-lhe o
regime da greve em geral. Cfr. PAULOA. CASSEB,"O ativismo judicial no Supremo Tribunal Federal brasi-
leiro - casos concretos, in As sentenças intermédias ..., págs. 117 e segs.
1 Vale a pena transcrever DICEY,traduzido por RUI BARBOSA (op. cit., págs. 41-42): "A expressão incons-
titucionol aplicada a uma lei tem, pelo menos, três aceções diferentes, variando segundo a natureza da
Constituição a que aludir. - Empregada em relação a um ato do Parlamento inglês, significa simplesmen-
te que esse ato é, na opinião do indivíduo que o aprecia, oposto ao espírito da Constituição inglesa; mas
não pode significar que esse ato seja infração da legalidade e, como tal, nulo. - Aplicada a uma lei das
câmaras francesas, exprimiria que essa lei ampliando, suponhamos, a extensão do período presidencial,
é contrária ao disposto na Constituição. Mas não se segue necessariamente daí que a lei se tenha por
vã; pois não é certo que os tribunais franceses se reputem obrigados a desobedecer às leis inconstitu-
cionais. Empregada por franceses, a expressão, de ordinário, se deve tomar como simples termo de
censura ... Dirigido a um ato do Congresso, o vocábulo "inconstitucionar' quer dizer que esse ato excede
os poderes do Congresso e é, por consequência, nulo. Neste caso a palavra não importa necessariamen-
te reprovação. O americano poderia, sem incongruência alguma, dizer que um ato do Congresso é uma
boa lei, beneficia o país, mas, infelizmente, peca por inconstitucional, isto é, ultra vires, isto é, nulo".
2 Sobre toda esta matéria, v. Contributo ..., cit., máxime págs. 77 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
II - O con titucionali mo liberal europeu não po uiu uma clara con ciência da
nece idade de garantia con titucional por quatro razõe principai :
III - Ao invé , no século XX não ó perde o otimi mo liberal acerca da Con ti-
tuição e e adquire a convicção de que ela ó poderá er ir de garantia - de garantia do
direitos fundamentais ou da ordem social e política - e for garantida como algun pode-
rosos fatores elevam a inconstitucionalidade a núcleo de toda a problemática do Direito
con titucional e, quiçá, do Direito público.
As im, erificam- e:
3 Cfr. ANTONIS MANITAKIS, "Fondement et légitimité du contrôle juridictionnel des lois en Grece", in Revue
internatianale de droit camparé, 1988, págs. 39 e segs.
4 Cfr. MARIO BATIAGlINI, Cantributi 0110storia deI controlla di castituzionalità delle leggi, Milão, 1957; ou
JORG LUTHER, Idee e storie giustizia costituzionale nel/'ottocento, cit., pág. 26.
5 V. Contributo ..., cit., págs. 53 e segs.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição ••
Duas linha de força vão conduzir à formação e à difu ão, na Europa (e também fora
da uropa) de istema de fi calização juri dicional ou juri dicionalizada da validade da
lei e de outro ato jurídico-público.
Uma, endógena, re ulta do de en 01 imento do in tituto e meios do E tado de
Direito, cre centemente aperfeiçoado, de maneira a eliminar ou a diminuir as imunida-
de do poder e a permitir o controlo tanto concreto como ab trato das normas jurídica .
outra, exógena, liga- e ao incremento da tarefa do E tado e da demais entidade
pública, à pa agem do E tado liberal para o Estado social e à re po ta à violaçõe ou
à tentativa de violação de direito ,liberdade e garantias; e prende- e ainda à exigência
de forma de olução de conflito jurídico em ordenamento plurilegi lativos (regionai
e federai ).
IV - Não quer isto dizer, no entanto, que o princípio da fi calização juri dicional
não tenha enfrentado e não enfrente ainda dificuldades ou re i tência por e temer o
"go erno de juíze ou, pelo meno , a politicização da ju tiça em vez da judicialização
da política.
Ba ta recordar, entre vária , a atitude de S HMITT - para quem a essência da on-
tituição é a deci ão política;9 a de LOEWE TErN- e entrega ao tribunais o direito
de fru trar uma deci ão política do Governo ou do Parlamento, corre- e o perigo ou de a
deci ão do tribunai não er acatada ou de a deci ão política do Governo ficar ub tituída
por um ato judicial que, embora reve tido jurídico-constitucionalmente, não é senão um
ato político de pe oa em mandato democrático;1O a de BURDEA - a autoridade com
poder de fi calização é quem fixa o conteúdo de uma política atravé da interpretação
da on tituição; a onstituição não é feita para os juízes, é feita para os governantes; a
política do juiz ó pode er negativa· II ou a de ALFREDGRO ER- é dificil a posição do
6 Cfr. supra.
7 Cfr., quanto à estrutura escalonada, mais uma vez, KELSEN,La Garantie ..., cit.; quanto à revivescência
jusnaturalista, por exemplo, o. BACHOF,Jueces ..., cit., págs. 25 e segs.; ou, doutra perspetiva, GEORGES
VEDEL,"Le Conseil Constitutionnel, gardien du droit positif ou défenseur de la transcendance des droits
de I'homme", in Pouvoirs, 1988, n2 45, págs. 149 e segs.; e, quanto à passagem de uma Constituição
"proclamatória" a uma Constituição "paramétrica", ANDRÉ SALGADODE MATOS, op. cit., págs. 83 e segs.
8 Mesmo na Grã-Bretanha já tem sido suscitado o problema da introdução de mecanismos de fiscali-
zação. Cfr., por exemplo, Nm H. ANDREWS, "Should England adopt an entrenched BiII of Rights with
Judicial review of primary legislation?", in Annuaire International de Justice Constitutionnelle, 1989,
págs. 15 e segs.
9 Verfassungslehre, 1927, trad. castelhana Teoria de la Constitución, Madrid e México, 1934 e 1966 págs.
23 e segs.
10 Verfassungslehre, 1959, trad. Teoria de la Constitución, Barcelona, 1964, págs. 321 e segs.
11 Troité de 5cience Politique, 2~ed., IV, Paris, págs. 370 e segs. e 481 e segs.
•• Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
ão e modelo:
1°) O modelo de fi calização política, dito habitualmente de tipo francê (por ligado
ao dogma do con titucionali mo francê - e, portanto, europeu continental -
do éculo XVIII e XIX);
2°) O modelo de fiscalização judicial (judicial review) de en 01 ido no E tado
Unido de de 1 03;
3°) O modelo defi calizaçãojuri dicianal concentrada em Tribunal Constitucional
ou au tríaco (por ter por paradigma o tribunal in tituído pela onstituição au -
tríaca de 1920) ou europeu (por hoje e ter e tendido a qua e toda a Europa).
a) Fi calização pelo próprio Parlamento, pelo órgão legi lativo qua tale - é o que
e encontra, primeiro, em qua e todos os paí e europeus no século XIX e ainda
hoje na Holanda,15-16depoi no constitucionalismo marxista-Ieninista do écu-
lo XXI7 e em algun Estados da Ásia e da África sob influência deste ou com
con titucionali mo embrionário como ucedeu no paí e africano de língua
portugue a logo apó a independência;
b) Fi calização por órgão político e pecialmente con tituído para o efeito - seja
ligado ao Parlamento ( omitê Constitucional francê de 1946 a 1958, Comi -
ão on titucional romena de 1965 a 1989 Comitê de upervi ão Con titucio-
nal criado na União oviética em 1989) 18 eja dele independente ou órgão a
e Guria constitucional de ieye, enado Conservador napoleónico, on elho
on titucional de 195 ).19
BLANCODE MORAIS, Justiça ..., I, cit., págs. 265 e segs.; Luís FERREIRALEITE, O Tribunal Constitucional e
o sistema político, Lisboa, 2007; Ono PFERSSMANN,"Classification organicocentrique et c1assification
normocentrique de la justice constitutionnelle", in En hommage à François Delperée, obra coletiva,
Bruxelas-Paris, 2007, págs. 1.153 e segs; FRANCISCOFERNÁNDEZSEGADO,La Justicia Constitucional: una
visión de Derecho Comparado, 3 vols., Madrid, 2009.
Desde 1985, a Universidade de Aix-en-Provence e Marselha edita um Annuaire International de Justice
Constitutionnel fundado por LOUIS FAVOREU;e desde 1996 o Centro de Estudos Políticos e Constitucio-
nais de Madrid publica um Anuario Iberaamericano de Justicia Constitucional, agora sob a direção de
FRANCISCOFERNÁNDEZSEGADO.
15 Cuja Constituição proíbe expressamente os juízes de apreciar a constitucionalidade das leis e dos trata-
dos (art. 1202).
16 E até 1999 na Finlândia.
17 Cfr. HENRYROUSSlllON, "Le probleme du contrôle de la constitutionnalité des lois dans les pays socia-
listes", in Revue du droit publíc, 1977, págs. 55 e segs.; JINGZHOU TAO, Le contrôle de constitutionnalité
des lois en République Populaire de Chine, ibidem, 1987, págs. 579 e segs.
18 Cfr. PATRICEGÉLARD, "L'actualité constitutionnelle en URSS", in Revue française de droit constitu-
tionnel, n2 6, 1991, págs. 355 e segs.
19 Cfr., recentemente, LUCIENJAUME, "Sieyés et le sens du Jury constitutionnaire: une réinterprétation", in
Pouvoirs, n2 36, 2003, págs. 115 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Como tribunais con titucionais mais ignificativo e com papel mai ativo na con-
fonnação e na realização das próprias Constituições, mencionem-se também os da Itália
(Constituição de 1947) e da República Federal da Alemanha (Constituição de 1949).32
De existência efémera ou precária foram o tribunais con titucionais da Checo 10-
váquia (Constituição de 1921), da Espanha (Constituição de 1931), de Chipre (Con ti-
tuição de 1960), da Turquia (Constituição de 1961) e o que e esboçaram, em regimes
marxistas-Ieninistas, na Iugo lávia (Con tituições de 1963 e 1974) e na Polónia (Con ti-
tuição de 1985).
Mas o retomo a regimes democrático pluralista, a ua conquista ou a ua congre-
gação com os princípios do Estado de Direito eriam acompanhado , no final do éculo
XX, por toda a parte, pelo aparecimento de tribunais constitucionais ou de órgão homó-
logo:
32 Cfr., entre tantos, WALTERLEISNER,"La conception du "politique" selon la jurisprudence de la Cour Consti-
tutionnelle allemande", in Revue du droit public, págs. 754 e segs., 1961; ERNSTFRIESENHAHN,op. cit.;
SERGIOORTINO, L'esperienzo delle Corte Costituzionale di Karlsruhe, Milão, 1966; LUIZ AFONSO HECKE,O
Tribunal Constitucional e o desenvolvimento dos princípios constitucionais, Porto Alegre, 1995; GILMAR
FERREIRAMENDES,Jurisdição Constitucional, 4~ ed., São Paulo, 2004; CHRISTIANSTARCK,"La Cour Consti-
tutionnelle Fédérale", in Renouveau ..., obra coletiva, págs. 455 e segs.; KONRADHESSEe PETERHÃBERLE,
Estúdios sobre la jurisdicción constitucional, trad., México, 2005.
33 Cfr., por exemplo, PIERREBON e Y. RODRIGUEZ, La Justice Constitutionnelle en Espagne, Paris, 1984;
FRANCISCOFERNÁNDEZSEGADO, La jurisdicción constitucional en Espana, Madrid, 1984; La jurisdicción
constitucional en Espana, obra coletiva, Madrid, 1995; FERNANDOALVESCORREIA,"A justiça constitucio-
nal em Portugal e em Espanha. Encontros e divergências", in Revista de Legislação e de Jurisprudência,
nOS3.891,3.892 e 3.893 (1998), págs. 162 e segs., 198 e segs. e 234 e segs.
34 Cfr. I Conferência da Justiça Constitucional da Ibero-América, Portugal e Espanha, obra coletiva, Lisboa,
1997; EDUARDOFERRERMAC-GREGOR, Los tribunales constitucionales en Iberoamérica, México, 2002.
35 Cfr. a obra coletiva Giustizia costituzionale e sviluppo democratico nei paesi del/'Europa centro-orien-
tale, Turim, 2000, ou HERMAN SCHWARTZ,The Struggle for Constitutional Justice in Post-communist Eu-
rope, Chicago, 2000. E, em especial, ANNE GAZIER, "Justice Costitutionnelle et fédéralisme en Russie",
in Pouvoirs, págs. 1359 e segs., setembro-outubro de 1999; e LASZLOSOLVOMe GEORGBRUNNER,Cons-
titutional Judiciary in a New Democracy - The Hungariaun Costitutional Court, Universidade de Michi-
gan, 2000; ANGELA DE GREGORIO,La giustizia costituzionale in Russia - Origini, modelli, giurisprudenza,
Milão, 2004; GENOVEVAVRABIE, "La Cour Constitutionnelle de Roumanie", in Anuario Iberoamericano
de Derecho Constitucional, 2005, págs. 547 e segs.; LECHGARLlSKI, "Vingt ans du Tribunal Constitution-
nel polonais", in Renouveau ..., obra coletiva, págs. 191 e segs.; ELENATANASESCU,"La protection de la
Constitution entre I'arbitrage du Chef de l'État et la garantie de la Constitution par la Cour Constitution-
nelle", in Les rapports entre les pouvoirs de J'État, obra coletiva, IASI, págs. 127 e segs.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição
2°) fi calização difu a pode ser criada em diferente i tema políticos (pelo me-
no , teoricamente) e é sempre uma salvaguarda potencial da constitucionalida-
de, ma a fi calização concentrada apena tem entido num i tema de divi ão
do poder político, do qual vem a er uma da peças mais rele ante .
3°) De cendo à prática, encontram- e elemento de aproximação entre o modelo
norte-americano e o modelo austríaco ou comum europeu ub equente a 1929 e
a 1949 (ba ta recordar que com a regra tare decisis e obtém nos Estado Uni-
do uma eficácia geral dos aresto do upremo Tribunal e que na fi calização
concreta enxertada em tribunal con titucional o tribunai da cau a de empe-
nham empre um papel indi pen á el).41
4°) Todavia, ó a fi calização por tribunal constitucional ou por órgão homólogo
permite o exercício de funçõe jurídico-política cada vez mais neces ária na
no a época como a egurar o equilíbrio do órgão de poder ou o equilíbrio
entre poder central e poderes periféricos, racionalizar o procedimento legi la-
tivos e contribuir para o de envolvimento constitucional.42.43
- À duração de funçõe :
Vitalício;
- Com limite de idade;
Por períodos certo, com ou sem possibilidade de recondução.
- Ao estatuto:
V - Quanto ao objeto:
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição _
a fi calização abstrata:
a fiscalização concreta:
I1I - O istema português46 carateriza- e por trê nota principai: 1°) a pluralidade
de modalidade de controle - de incon titucionalidade por ação e por omi ão, concreto e
45 Constituição de 1822, arts. 1022-11e 1182-IV; Carta Constitucional, arts. 152, § 72, e 1392; Constituição
de 1838, arts. 372-11 e 382
46 Para uma visão geral do regime português de fiscalização, v. GOMES CANOTILHO. Direito, direitos - Tri-
bunal, tribunais. in Portugal - O sistema político e constitucional, obra coletiva, págs. 901 e segs., e
Direito Constitucional ..., cit., págs. 916 e segs.; La Justice Constitutionnelle au Portugal. obra coletiva,
Paris, 1989 (mormente a 1! parte, de PIERREBON, págs. 21 e segs.); JosÉ MANUEl CARDOSODA COSTA.
A jurisdição constitucional em Portugal, cit.; ARISTIDE CANEPA. Modalità strutturali ed organizzative
del/'organo di giurisdizione costituzionale come elementi di tutela della sua indipendenza: osservazioni
sul caso portoghese, in L'organizzazione e iI funzionamento della Corte Costituzionale, obra coletiva,
Turim, 1996, págs. 540 e segs.; RUI MEDEIROS,A decisão...• cit., págs. 17 e segs. e 90 e segs.; ANTÓNIO DE
ARAÚJO e JOAQUIM CARDOSODA COSTA,Relatório português à 111Conferência de Justiça Constitucional
da Ibero-América, Portugal e Espanha, Lisboa, 2000; FERNANDOALVESCORREIA, Direito Constitucional
(A Justiça Constitucional), cit.; ANTÓNIO DE ARAÚJOe TElES PEREIRA.A justiça constitucional nos 3D anos
da Constituição portuguesa: nota para uma aproximação ibérica, in Jurisprudência Constitucional, n2 6,
abril-junho de 2005. págs. 15 e segs.; BLANCODE MORAIS, A justiça constitucional. 2 vols., cit.; ROMANO
ORRU, La giustizia costituzionale in azione e iI paradigma comparato: I'esperienza portoghese, in Corte
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição _
Costituzionole e comparazione giuridica, obra coletiva, Nápoles, 2006, págs. 1 e segs.; ALESSANDRO
PIZZORUSSO,"Concretezza" e "Astrattezza" nel sistema italiano e nel sistema portoghese di controllo de
costituzionalità delle leggi, in Themis, 2006 - 30 anos da Constituição, págs. 171 e segs.; JORGEMIRAN-
DA, Manual ..., VI, cit., págs. 168 e segs.
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
Uma egunda fa e abrir- e-ia com a Emenda Con titucional nO 16, de 26 de no-
vembro de 1965 Uá com o regime militar), ao adicionar um mecani mo de fi calização
ab trata: a repre entação contra incon titucionalidade de lei ou ato de natureza norma-
ti a, federal ou e tadual, encaminhada pelo Procurador-Geral da República perante o
upremo Tribunal Federal (nova alínea k do art. 101, inci o I, da on tituição de 1946,
formalmente ainda mantida em vigor). E ele pa aria para a on tituição de 1967 (art.
114-1, alínea /, art. 119-1, alínea /, apó 1969).
Finalmente, a Constituição de 19 8, recolhendo toda a experiência anterior, procu-
raria aperfeiçoar e desenvolver o sistema e completá-lo com novo instituto de controlo
de incon titucionalidade quer por ação, quer por omi ão, e tanto de controlo concreto
quanto de controlo ab trato. eria o começo de uma terceira fa e, a atual.47
47 Cfr. ÓSCAR DIAS CORREA, o Supemo Tribunal Federal, Carte Constitucional do Brasil, Rio de Janeiro, 1987;
SACHA CALMON NAVARRO COELHO, O contrale da constitucionalidade das leis e do poder de tributar, Belo
Horizonte, 1992; DIRCÉO TORRECILLAS RAMOS, O contrale de constitucionalidade por via de ação, São Paulo,
1994; e Direitos fundamentais e controle do constitucionalidade, São Paulo, 1998; Ivo DANTAS, O Valor da
Constituição, Rio de Janeiro, 1996; ADHEMAR FERREIRA MACIEL, Observaçães sobre o controle da constitu-
cionalidade das leis no Brasil, in O Direito, 1998, págs. 165 e segs.; CLEMERSON MERLlN CLEVE, A fiscaliza-
ção abstrata da constitucionalidade no Direito brasileiro, 2ª ed., São Paulo, 2000; ZENO VELOSO, Controle
judicial da constitucionalidade, 2ª ed., Belo Horizonte, 2000; MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, Curso de
Direito Constitucional, 27ª ed., São Paulo, 2001, págs. 38 e segs.; JosÉ ADÉRCIO LEITE SAMPAIO, op. cit., págs.
309 e segs., 451 e segs. e 564 e segs.; LÉNIO LUIZ STRECK, op. cit., págs. 415 e segs.; LUIS ROBERTO BARROSO,
op. cit., págs. 57 e segs.; DIRLEY DA CUNHA RODRIGUES, Curso de Direito Constitucional, Salvador, 2008, págs.
253 e segs.; ANNA CÂNDIDA DA CUNHA FERRAZ, "20 anos da Constituição de 1988: a evolução da jurisdição
constitucional no Brasil", in Anuário iberoamericano de justicia constitucional, 2009, págs. 137 e segs ..
48 E continuando a ter o Senado o poder de suspensão da execução de lei declarada inconstitucional (art.
52-X), con vista à generalização dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade (mas em que consista
esta intervenção do Senado é tema hoje muito discutido). Cfr. PAULO NAPOLEÃO NOGUEIRA DA SILVA, O
controle da constitucionalidade e o Senado, 2ª ed., Rio de Janeiro, 2000; SERGIO RESENDE DE BARROS,
A função do Senado na contraio difuso da constitucionalidade, in Revista da Faculdade de Direito da
Universidade de Lisboa, 2002, 1, págs. 577 e segs., ou GILMAR FERREIRA MENDES, O papel do Senado
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição _
fi calização concreta difusa (art. 129°) com recur o da decisõe dos tribunais
para o Tribunal on titucional (art. 149°).52
fi calizaçãopre entiva(art . 145°e 146°);
fi calização uce ivaab trata (arts. 147°e 150°);
fi calização da incon titucionalidade por omi ão (art. 148°).
III - a Guiné-Bissau (Con tituição de 1993, alterada em 1995 e 1996), exi te:
fiscalização difusa (art. 120°), com recur o da deci õe para o upr mo Tribu-
nal de Justiça (art. 152°);
fi calização preventiva (art. 149°);
- fiscalização sucessiva ab trata (art. 150°);
- fiscalização da incon titucionalidade por omis ão (art. 151°).
- fi calização difu a (art. 214°), com recur o para o on elho on titucional (art.
247°);
fi calização preventiva (art. 246°);
- fiscalização uce siva (art. 245°).53
53 Podendo requerê-Ia, além de órgãos do Estado, dois mil cidadãos (art. 245º, nº 2, alínea g).
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição _
de urna lei votada pelo Parlamento ou pelo próprio povo? Corno compreender que ele
acabe por conformar não ó negativamente (pela deci õe de incon titucionalidade) mas
também po iti amente (pelo outro tipo de decisõe ) o ordenamento jurídico? Corno
conciliar, na prática a fi calização juri dicional concentrada e o princípio da con titucio-
nalidade com o princípio de soberania do pOVO?54Por outro lado, corno evitar o ativis-
54 Cfr., entre tantos, ALDO SANDULlI, Sulla "posizione" dello Corte Costituzionale nel sistema degli organi
supremi dello Stato, in Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico, 1960, págs. 705 e segs.; PAOLOBARILE,
La Corte Costituzionale organo sovrano, in Studi in onore di Emilo Crosa, obra coletiva, I, Milão, 1960,
págs. 527 e segs.; GEHRARDTLEIBHOLZ,EI Tribunal Constitucional de la Republica Federal de Alemania
y el problema de la apreciación judicial de la politica, in Problemas fundamentales de la democracia
moderno, trad., Madrid, 1971, págs. 147 e segs.; ano BACHOF,Estado de Direito e Poder Político: os
Tribunais Constitucionais entre o Direito e a Política, trad., Coimbra, 1980; GARCIADE ENTERRIA,La po-
sición juridica dei Tribunal Constitucional en el sistema espanol; posibilidade y perspectivas, in Revista
Espanola de Derecho Constitucional, 1981, págs. 35 e segs.; GARCIAPELAVO,EI ((status» de Constitucio-
nal, ibidem, 1981, págs. 11 e segs.; JAVIERSAlAS, EI Tribunal Constitucional Espanol y su competencia
desde la perspectiva de la forma de gobierno, ibidem, 1982, págs. 141 e segs.; PAOLOCAREnl e ENZO
CHElI, Influenza dei valori costituzionali sulla forma di governo: il ruolo della giustizia costituzionale,
in Quaderni Costituzionali, 1984, págs. 24-25 e 36; ALESSANDROPACE,Corte Constituzionale e "altri"
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loc. cit.; CARLOSS. NINO, Lafilosofia dei control judicial de constitucionalidad, in Revista dei Centro de
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zur Diskurstheorie des Rechts und des Demokratischen Rechtstaats, 1992, trad. Droit et démocratie,
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l'interprétation, in Rapports Généraux - XIVeme Congres International - Académie Internationale de
Droit Comparé, Atenas, 1994, págs. 597 e segs.; Legitimidade e legitimação da justiça constitucional,
obra coletiva, Coimbra, 1995; EIVINOSMITH, "The legitimacy of judicial review of legislation - A compa-
rative approach", in Constitutional Justice under Old Constitutions, obra coletiva, Haia, 1995, págs. 363
e segs.; PAULOCASTRORANGEl, O legislador e o Tribunal Constitucional, cit., loc. cit., págs. 195 e segs.;
Louls FAVOREU,La notion de Cour Constitutionnelle, in Perspetivas Constitucionais, obra coletiva, 111,
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ré: les enseignements de /'expérience américaine, in Revue internationale de droit cmparé, 1999, págs.
243 e segs.; CRISTINAQUEIROZ,Interpretação constitucional e poder judicial, Coimbra, 2000, págs. 313 e
segs.; CARDOSODACOSTA,Algumas reflexões em torno da justiça constitucional, in Perspetiva do Direito
no início do século XXI, obra coletiva, Coimbra, 2000, págs. 113 e segs.; ANTÓNIO DE ARAÚJOe PEDRO
COUTINHOMAGALHÃES,A Justiça constitucional: uma instituição contra as maiorias?, in Análise Social,
nOS154-155, verão de 2000, págs. 207 e segs.; JosÉ ADÉRCIOLEITESAMPAIO,op. cit., págs. 60 e segs.;
CÉSARSALDANHASOUZAJÚNIOR,O Tribunal Constitucional como poder, São Paulo, 2002; LUIs ROBERTO
BARROSO,op. cit., págs. 501 e segs.; ANDRÉRAMOSTAVARES,Teoria..., cit., págs. 491 e segs.; LARRVKRA-
MER,"Au nom du peuple. Qui a le dernier mot en matiere constitutionnelle?", in Revuedu droit public,
2005, , págs. 1027 e segs.; aMAR CHIESSA,Corte Costituzionale e trasformazione della democrazia plu-
ralicistica, in Corte Costituzionale e processi di decisione politici, obra coletiva, Turim, 2005, págs. 17 e
segs., máxime 46 e segs.; WALBERDEMOURAAGRA,A reconstruçõo da legitimidade do Supremo Tribunal
Federal, Rio de Janeiro, 2005, máxime págs. 107 e segs. ; ANDRÉRAMOSTAVARES,Teoria da Justiça Cons-
titucional, São Paulo, 2005, págs. 491 e segs.; MARCVERDUSSEN,Un proces constitutionnellégitime, in
_ Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
mo judiciário que pode fazer dos Tribunai con titucionai ub titutos ou u urpadore
do órgão legi lativos democraticamente con tituído ?55
O que John Rawl 60 refere a propó ito do upremo Tribunal do E tado Unido
como 'paradigma da razão pública" pode er e tendido mulali mulandi ao Tribunai
Con titucionais:
um i tema de governo con titucional, o poder último, ou fundamental, não pode
er atribuído ou deixado à A embleia Legi lativa ou me mo ao upremo Tribunal de
Ju tiça, que é apenas o intérprete judicial mai ele ado da Con tituição. O poder último
55 Cfr., por todos, EUVAL DA SILVA RAMOS, Ativismo judicial, São Paulo, 2010; Luís ROBERTOBARROSO,"Ju-
dicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática", in Estudos em homenagem ao Professor
Gilmar Mendes, obra coletiva, Rio de Janeiro, 2010, págs. 241 e segs.
56 Cfr. Manual ..., IV, cit., págs. 209 e segs.
57 A bibliografia é imensa. V. o resumo em Manual ..., VII, Coimbra, 2007, págs. 92 e segs.; ou, doutra ótica,
em GOMES CANOTlLHO, Direito Constitucional ..., cit., págs. 1.409 e segs.
58 Manual ..., VII, págs. 85 e segs.
59 Cfr. ANTÓNIO DEARAÚJOe PEDROCOUTINHO MAGALHÃES,A Justiça Constitucional: uma instituição contra
a maioria?, in Análise Social, nQ 154-155, verão de 2004, págs. 207 e segs.
60 Political Liberalism, 1993, trad. O liberalismo político, Lisboa, 1996, págs. 225 e segs.
Parte V I Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição _
ou fundamental é detido pelos trê poderes numa relação devidamente e pecificada entre
eles, sendo cada um respon ável perante o povo. ( ... )
Ao aplicar a razão pública, o Supremo Tribunal evita que a lei seja corroída pela
legi lação de maiorias passageiras ou, com maior probabilidade, por intere ses parciai ,
organizados e influente ,que e mostrem particularmente capazes de levar a sua avante.
e o upremo assumir este papel e o desempenhar com eficácia, será incorreto dizer
que é manife tamente antidemocrático. É, com efeito, antimaioritário no que respeita à
legi lação corrente, dado que um Supremo Tribunal, com a sua prerrogativa de revisão
de juízo, pode considerar e declarar qualquer lei ordinária inconstitucional. No entan-
to, a autoridade superior do povo apoia essa competência. O Supremo Tribunal não é
antimaioritário em relação à lei fundamental quando as decisões da maioria concorrem
razoavelmente com a própria Constituição e com as suas emendas e interpretações poli-
ticamente mandatada .
O papel do Supremo não é meramente defensivo. Com efeito, ao servir como pa-
radigma institucional da razão pública, o seu papel é o de a realizar e assegurar o seu
contínuo efeito. I to ignifica, em primeiro lugar, que a razão pública é a única razão que
o Supremo exerce. É o único órgão do Estado em que visivelmente se manifesta a razão
pública e apenas ela. O cidadãos e os legisladores podem votar apropriadamente as suas
mai abrangentes per petivas quando os elementos con titucionai e senciais e a justiça
bá ica não estão em jogo; não necessitam de justificar o sentido do seu voto através da ra-
zão pública ou tomar consistentes os fundamentos desse voto e articulá-los dentro de uma
per petiva con titucional coerente que cubra o conjunto completo das suas deci ões.
Interessante é também, por seu lado, a visão proposta por Peter Hãberle acerca do
papel do Tribunal Constitucional Federal alemão, não enquanto regulador do processo
con titucional, mas, obretudo, das relações entre Estado e sociedade; e enquanto in tru-
mento de garantia e atualização da Constituição como contrato social.61
61 fi Tribunal Constitucional como poder político, in Revista de fstudios Políticos, n!! 125, Julho-Setembro
de 2004, págs. 9 e segs., máxime 23 e segs. Aproximada, mas algo diferente, é a visão de GOMES CANO-
TILHO e VITAL MOREIRA (op. cit., pág. 834): o Tribunal Constitucional como órgão constitucional autóno-
mo de regulação.
Teoria do Estado e da Constituição I Jorge Miranda
corre pondente ao i tema de governo consagrado - que ele podem in alidar ato com
a força de lei. É por ele ,embora por via indireta, pro irem da m ma origem do titula-
re de órgão político que por e te con eguem fazer- e acatar.
a membro do Tribunal Con titucional não e tomam r pr ntante do órgão
qu o elegem ou nomeiam, não e tão ujeito a nenhum ínculo repr entati o. Muito
pelo contrário, uma vez de ignado, ão completamente independente beneficiam de
garantia e incompatibilidade idêntica à do demai juíze ; para garantia de a inde-
pendência, o eu mandato não coincidem com o do titular do órgão de de ignação,
ão mai longo e, por princípio, insu cetí ei de reno ação; e, quando de eleição parla-
mentar, de ordinário requer- e maioria qualificada (o que obriga a compromi o e e ita
escolha fora do ' arco con titucional").62
um Tribunal Constitucional ou em órgão homólogo podem e devem coexi tir di-
ver a corrente jurídicas e jurídico-políticas; e, mesmo s ,em órgão parlamentar, e dá
a interferência do partido na candidatura (porque, quer e queira quer não, a demo-
cracia atual é uma democracia de partido ou com partido ), e a corrente atenuam- e
e, aparentemente, diluem-se, em virtude do fatores objetivo da interpretação jurídica e,
obretudo, do fenómeno de institucionalização que cria uma dinâmica e uma autonomia
do órgão.63
isto tudo (insista-se) reside a e pecificidade da figura (ou, e e preferir, a ua am-
bivalência): uma legitimidade de título a imilável à do titulare do órgão de função
política do Estado' uma legitimidade de exercício equipará el à do juíze do tribuna i
comun ,por o juízes dos Tribunais Con titucionai , para além de po uírem a garantia
e a incompatibilidade de todo o juíze , deverem empre fundamentar juridicamente
a ua deci õe e erem por ela avaliado pela comunidade do juri ta .
62 Cfr. PEDROCOUTINHO MAGALHÃESe ANTÓNIO DE ARAÚJO,A justiça constitucional entre o direito e a polí-
tica: o comportamento judicial do Tribunal Constitucional português, in Análise Social, n!! 145, 1998 -I,
págs. 18 e segs. (salientando, designadamente, o direito de veto de cada um dos partidos proponentes
a candidatos propostos pelo outro partido).
63 Cfr. JACQUESCHEVALlER,Le juge constitutionnel et /'effet Becket, in Renouveau ..., obra coletiva, págs. 83
e segs.