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SISTEMA NERVOSO

CAPÍTULO 3 - SISTEMA NERVOSO


AUTÔNOMO E MEDULA ESPINHAL, SUAS
FUNÇÕES E PRINCIPAIS PATOLOGIAS.
Symara Rodrigues Antunes

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Introdução
Imagine a seguinte situação, você está sentado na sala da sua casa, relaxando após um dia de estudos e trabalho,
deitado em seu sofá. Sua atenção está voltada para a televisão, pois está assistindo a um de seus programas
preferidos. Tranquilidade e calma, era o que você estava sentindo, até que sente algo passando por sua perna
esquerda. Você olha rapidamente e, assim que seus olhos identificam que se trata de uma aranha preta e peluda
passando pelo seu pé, você imediatamente sacode sua perna e sai correndo. Você passa da condição de uma
pessoa calma e tranquila, que estava no sofá, para a condição de uma pessoa com respiração ofegante e coração
acelerado.
Na situação relatada, em uma velocidade impressionante, você saiu de um estado de repouso e relaxamento,
para um estado de agitação. Qual a explicação fisiológica para isso? De que maneira nosso corpo consegue
responder tão rapidamente, e mudar de forma tão drástica nosso estado?
Nesta unidade, você aprenderá sobre o reflexo de luta ou fuga, comandado e integrado pelo Sistema Nervoso
Central (SNC) e executado pelo Sistema Nervoso Periférico (SNP). Também iremos aprender como ocorrem os
comandos motores para executarmos as ações e movimentos. Afinal, você realizou um movimento rápido para se
livrar da terrível aranha, não foi mesmo? Aprenderemos que a medula espinhal (ou espinal) está relacionada
com a inervação motora e sensitiva de todo o nosso corpo e as consequências de lesões que ocorram nela.
Aprenderemos ainda sobre como o SNC, que é protegido pelas meninges e, também, como como ocorre a
vascularização de todo este maravilhoso sistema.

3.1 Sistema nervoso autônomo


O nosso organismo desempenha inúmeras funções ao mesmo tempo. Muitas dessas funções nós nem ao menos
nos damos conta de como ocorre o comando: o bombeamento de sangue pelos nossos vasos sanguíneos, as
trocas gasosas que ocorrem a nível pulmonar ou nossa transpiração quando fazemos uma atividade física. A
ocorrência desses processos no nosso corpo precisa ser feita de maneira coordenada, permitindo que nenhum
órgão sofra consequências danosas. Por exemplo, quando estamos transpirando devido a realização de uma
atividade física, nossos rins devem diminuir a excreção de água para que não haja perda em excesso de líquidos.
Esta coordenação entre as diferentes funções é realizada pelo Sistema Nervoso que pode ser dividido em: SNC,
que compreende o encéfalo e a medula espinhal; e em SNP, foco de estudo neste momento (Silverthorn, 2017).
A função prioritária do sistema nervoso autônomo é regular a homeostase, controlando os sistemas e órgãos
para que a mantenham. Observamos que, em repouso, há uma predominância do sistema nervoso autônomo
parassimpático enquanto que, quando estamos excitados ou estressados, há uma predominância do sistema
nervoso autônomo simpático. Essa alternância entre os dois sistemas faz com que haja um maior controle sobre
os órgãos efetores. Um excelente exemplo da alternância de controle entre estas duas subdivisões estão no
controle da frequência cardíaca. Para que haja um aumento da frequência cardíaca há um aumento dos disparos
de potenciais de ação dos neurônios simpáticos, enquanto que, ao mesmo tempo, há uma diminuição da
frequência de potenciais de ação nos neurônios parassimpáticos. Na figura seguinte, temos uma representação
das inervações dos órgãos pelas duas divisões do sistema nervoso autônomo (TORTORA; DERRICKSON, 2017).

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Figura 1 - Inervação dos diferentes órgãos do nosso corpo pelo Sistema Nervoso Autônomo, divisões simpática e
parassimpática.
Fonte: SILVERTHORN, 2017, p. 362.

Anatomicamente, é possível diferenciar essas duas subdivisões, mas funcionalmente acaba sendo mais difícil de
realizar essa diferenciação. Primeiramente, vamos analisar a estrutura anatômica. O SNPAS é composto por
nervos raquidianos, que tem a sua eferência da medula espinhal, especialmente dos que partem da região
torácica e lombar. A eferência é a sua “saída” e a aferência é a sua “chegada”. Já o SNPAS tem sua origem no
tronco encefálico e segmentos sacrais da medula espinal, conforme a primeira figura que apresentamos.
Os órgãos são inervados pelos dois tipos de fibras e, portanto, há atuação destes dois sistemas. A identificação
dos dois é, então, contrária, oposta. Contudo, podemos associar ações consideradas de “repouso e digestão” com
o sistema parassimpático, isto é, ações em que o órgão ou o sistema está mais relaxado ou os processos
digestivos, são associados com a atuação do parassimpático. No exemplo de abertura desta unidade, enquanto o
indivíduo estava relaxando assistindo ao seu programa, naquele momento o sistema autônomo periférico
atuante seria predominantemente o parassimpático.

Em contrapartida, o sistema simpático é mais associado a situações estressantes ou ações chamadas de “luta ou

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Em contrapartida, o sistema simpático é mais associado a situações estressantes ou ações chamadas de “luta ou
fuga”. Então, ainda no exemplo de abertura desta unidade, temos a atuação do simpático, quando o indivíduo
tem a reação de chutar a aranha e reagir ou correr com medo. Essa última reação é considerada de proteção ao
indivíduo. O corpo se prepara para proteger-se, para correr e se afastar do perigo. Há uma vasodilatação
periférica para que haja aumento de suprimento sanguíneo da musculatura, o fígado passa a liberar mais glicose
na corrente sanguínea e o sangue então é desviado para a periferia.
Nesses momentos, ações como a digestão são colocadas em segundo plano, pois são ações que deixam de ter
importância, uma vez que o corpo precisa resolver uma situação que foi analisada como sendo uma situação de
risco à integridade física (SILVERTHORN, 2017).

VOCÊ QUER LER?


“Uma viagem pelo cérebro: a via rápida para entender neurociência”, da autora Carla Tieppo,
lançado em 2019, traz uma abordagem extraordinária, surpreendente e de fácil entendimento
sobre um dos mais complexos sistemas do nosso corpo. De linguagem acessível, mas sem
perder sua capacidade de explorar com muita propriedade a neurociência, a autora entrega
um livro instigante e com conceitos fundamentais para entendermos as bases de
funcionamento da neurologia.

Essas respostas, contudo, não são lentas. Situações como um balão sendo estourado em uma sala de forma
inesperada gera um susto e reações corpóreas que provavelmente você já experimentou. Essas ações do sistema
simpático, como falado anteriormente, são facilmente observadas com o aumento da frequência cardíaca e todo
o deslocamento do fluxo sanguíneo. Os processos fisiológicos precisam ser integrados, havendo um equilíbrio
entre as ações do sistema simpático e sistema parassimpático.
De maneira resumida, podemos dizer que a ação do sistema parassimpático consiste em coordenar ações de
conservação de energia, eficientemente alocando e distribuindo recursos e energia. Já o simpático pode ser
atrelado à coordenação de ações energéticas, que requerem gastos de energia, com quebra de processos
homeostáticos equilibrados.
O sistema nervoso autônomo é utilizado, também, para controle de feedback através de informações sensoriais
provenientes de receptores situados em diferentes órgãos. Essas respostas às alterações de homeostase (
feedback) são processadas através de circuitos de controle do Sistema Nervoso Central que podem incluir a
medula espinhal ou outras regiões, como o hipotálamo (TORTORA; DERRICKSON, 2017).
Como já mencionado, temos receptores sensoriais em diferentes órgãos/tecidos que irão captar alterações tanto
de fora do nosso corpo quanto de dentro do nosso corpo. Por exemplo, temos fotorreceptores na retina que irão
perceber alterações no fornecimento de luminosidade; temos os chamados barorreceptores que irão perceber
alterações na pressão arterial; podemos ainda citar o exemplo dos termorreceptores, que percebem alterações
na temperatura corpórea (que pode ou não estar relacionada a alterações ambientais). Várias destas
informações chegam até o hipotálamo, que irão desencadear respostas através do sistema simpático
/parassimpático para regular o corpo e restaurar a homeostase (TORTORA; DERRICKSON, 2017).
As vias de comunicação do sistema autônomo com seus órgãos efetores são constituídas por dois tipos de
neurônios dispostos em série, que proporcionam a comunicação entre o SNC e o órgão efetor. A comunicação
destes dois neurônios é feita em estruturas periféricas chamadas de gânglios autônomos. O neurônio que parte
do SNC até o gânglio é chamado de neurônio pré ganglionar; e o neurônio que sai do gânglio para o órgão efetor
é denominado neurônio pós ganglionar.

Dessa forma, em cada gânglio podemos encontrar um terminal axônico pré ganglionar e corpos e dendritos pós

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Dessa forma, em cada gânglio podemos encontrar um terminal axônico pré ganglionar e corpos e dendritos pós
ganglionares, como ilustra a figura seguinte. Ainda podemos encontrar os chamados neurônios intrínsecos, com
função de modular as respostas encaminhadas ao órgão alvo.

Figura 2 - Representação das vias autonômicas.


Fonte: SILVERTHORN, 2017.

O sistema nervoso simpático pode ser chamado de sistema toracolombar do sistema nervoso autônomo. Isto se
deve ao posicionamento dos neurônios pré-ganglionares que o compõem, que emergem das regiões torácica e
lombar da medula espinhal. Os neurônios pré ganglionares surgem de uma região de substância cinzenta
denominada corno lateral ou coluna intermédia. Por sua vez, o sistema nervoso parassimpático pode ser
denominado de divisão craniossacral do sistema nervoso autônomo, por ter a origem de seus neurônios pré
ganglionares no tronco encefálico e região sacral (TORTORA; DERRICKSON, 2017).
Podemos também observar uma diferença nos tipos de neurotransmissores que são liberados. De maneira geral,
os nervos do sistema simpático tendem a liberar noradrenalina e, algumas vezes, adrenalina, enquanto no
sistema parassimpático possuem liberação de acetilcolina. Contudo, temos algumas regras sobre essa liberação
(SILVERTHORN, 2017), são elas:

todos os neurônios pré ganglionares, sejam eles simpáticos ou parassimpáticos, liberam acetilcolina, que atua
sobre receptores colinérgicos nicotínicos;
os neurônios pós ganglionares simpático, majoritariamente, secretam noradrenalina, que atua em receptores
adrenérgicos nas células alvo;
a maioria dos neurônios parassimpáticos pós ganglionares liberam acetilcolina, que atua sobre receptores
colinérgicos muscarínicos nas células alvo.

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Figura 3 - Inervação simpática e parassimpática e seus neurotransmissores e receptores.
Fonte: TORTORA; DERRICKSON, 2016.

As exceções a essas regras incluem os neurônios pós ganglionares simpáticos que inervam as glândulas
sudoríparas e que secretam acetilcolina ao invés de noradrenalina. Por esse motivo, são chamados de neurônios
simpáticos colinérgicos.
Outro pequeno grupo de neurônios autônomos não secretam nem acetilcolina e nem noradrenalina e são
conhecidos como neurônios não adrenérgicos e não colinérgicos. Podemos citar a substância P, a somatostatina,
a adenosina, o óxido nítrico e o ATP, como algumas substâncias liberadas por esses neurônios. Podem ainda ser
associados às divisões simpáticas ou parassimpáticas, de acordo com a origem das fibras pré ganglionares.

3.2 Medula espinal. Reflexos medulares. Traumatismo


raquimedular
A medula espinal pode ser definida como sendo um cilindro de tecido nervoso contínuo com a extremidade
inferior do encéfalo e protegida pela coluna vertebral. Dela partem os nervos espinais, que se ramificam em
pares e deixam a coluna vertebral entre duas vértebras adjacentes. São, no total, 31 pares de nervos, sendo que a

denominação de cada par é dada de acordo com o local de saída deles. Dessa forma, temos: oito pares de nervos

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denominação de cada par é dada de acordo com o local de saída deles. Dessa forma, temos: oito pares de nervos
cervicais (identificados de C1 a C8); doze pares de nervos torácicos (identificados de T1 a T12); cinco pares de
nervos lombares (identificados de L1 a L5); cinco pares de nervos sacrais (identificados de S1 a S5); e somente
um par de nervo coccígeo (identificado como C ) (TORTORA; DERRICKSON, 2017).
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Figura 4 - Representação da medula espinal e seus 31 pares de nervos.


Fonte: TORTORA; DERRICKSON, 2017, p. 256.

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Como podemos observar na figura, a medula espinal em adultos não se estende por toda a coluna vertebral,
tendo um comprimento que pode variar de 42cm a 45cm. Em uma visão externa, podemos observar ainda duas
intumescências: cervical e lombar. A primeira, superior, se estende da quarta vértebra cervical até a primeira
vértebra torácica. A inervação dos membros superiores deriva dessa região. A intumescência lombar localizada
na porção inferior da coluna, se estende da nona até a décima segunda vértebra torácica, sendo a inervação dos
membros inferiores derivados dessa região.
Devido ao comprimento da medula espinal ser menor do que o da coluna vertebral, os nervos que se originam na
região lombar, sacral e coccígea acabam por deixar a medula de uma região diferente do que a região que
emerge da coluna vertebral. Dessa forma, internamente, há uma angulação desses nervos para baixo, no canal
vertebral, que muitos associam como tufos de cabelos soltos. Esta formação é chamada de cauda equina.
Os nervos espinais são a comunicação entre a medula espinal e as diversas regiões do corpo. Cada nervo se
divide em dois feixes de axônios, chamados de raízes, que conectam a um segmento específico da medula, como
você verá na próxima figura. A raiz dorsal de cada nervo possui a característica de conduzir informações
sensoriais do corpo em direção ao SNC. Nos gânglios das raízes destes nervos encontramos corpos celulares de
neurônios sensoriais. As raízes ventrais são responsáveis pela informação que desce do SNC em direção aos
músculos e glândulas (SILVERTHORN, 2017).

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Figura 5 - Organização da medula espinal.
Fonte: SILVERTHORN, 201, p. 284.

Ao observarmos a medula espinal em um corte transversal, podemos observar que a substância cinzenta se
encontra interna, em forma de H, e a substância branca mais externa, ao redor dessa substância cinza. A
substância branca pode ser comparada a cabos de fibra ótica de companhias telefônicas. Podemos dividi-la em
diversas colunas, as quais são compostas por tratos e axônios responsáveis por transmitir informações para
cima e para baixo. Os tratos ascendentes são responsáveis por transmitir informações para o encéfalo. Os tratos
descendentes conduzem principalmente sinais eferentes motores do encéfalo para a medula.
A medula espinal pode funcionar como um centro integrador para reflexos espinais simples. Um reflexo é um
conjunto de ações rápidas e involuntárias que ocorrem em decorrência de um estímulo específico. Há alguns que
são inatos, como por exemplo a resposta de retirar sua mão quando esta encosta em uma superfície quente antes
mesmo de haver uma percepção consciente deste fato. Outros são aprendidos, como os reflexos utilizados
durante o ato de dirigir. É considerado um reflexo espinal, quando a integração ocorre na substância cinzenta da
medula espinal. A via que é percorrida para que ocorra um reflexo é chamada de arco reflexo.

VOCÊ O CONHECE?
Charles Scott Sherrington (1867 – 1952) foi um neurofisiologista e patologista britânico,
agraciado com um Nobel de medicina em 1932, pelas suas descobertas no campo das
neurociências. Seus estudos contribuíram para o entendimento sobre os mecanismos que a
medula espinal estava relacionada, o arco reflexo, explicando os reflexos espinais e o termo
sinapse. Muitas foram as suas contribuições que resultaram em seu Nobel, em 1932.

Um exemplo de arco reflexo é o reflexo patelar. Ao analisarmos como ele ocorre, podemos ter um mapeamento
dos constituintes de um reflexo espinal. Há a necessidade de existir um receptor sensorial, que responde a um
tipo de estímulo específico, gerando um ou mais impulsos nervosos. No exemplo do reflexo patelar, os fusos
musculares atuam como receptores sensoriais. Um neurônio sensorial, pelo qual os impulsos nervosos

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tipo de estímulo específico, gerando um ou mais impulsos nervosos. No exemplo do reflexo patelar, os fusos
musculares atuam como receptores sensoriais. Um neurônio sensorial, pelo qual os impulsos nervosos
disparados pelo receptor irão percorrer até chegar no SNC. Um centro integrador, que pode ser constituído de
uma única sinapse, como no caso do reflexo patelar, e ocorrer entre um neurônio sensorial e um neurônio motor.
Em outros reflexos, esse centro integrador pode incluir um ou mais interneurônios (TORTORA; DERRICKSON,
2017).

Figura 6 - Exemplo de um reflexo espinal. Na imagem está representado as vias e seus componentes de um
reflexo patelar.
Fonte: TORTORA.; DERRICKSON, 2017. p.260.

A medula espinal, portanto, é um importante componente do SNC, sendo responsável por receber as diversas
informações sensoriais do nosso corpo e transmitir respostas a elas. De fato, cada par de nervo espinal é
responsável por uma região do nosso corpo, chamada de dermátomo.

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Figura 7 - Representação dos dermátomo por par de nervos espinais.
Fonte: Alila Medical Media, Shuterstock, 2020.

Não podemos também esquecer que a medula espinal funciona como um grande condutor de informações
sensitivas e motoras. Havendo um trauma que gere uma lesão nessas vias de comunicação, a depender da
extensão da lesão, poderá ocorrer a interrupção parcial ou total desta passagem de informações.
O trauma raquimedular, como é denominado essa lesão, normalmente ocorre em indivíduos jovens do gênero
masculino, sendo muito associado a lesões automobilísticas, quedas de altura, acidente por mergulho em águas
rasas e ferimentos por armas de fogo. A lesão pode ter características de reversibilidade ou ser irreversível. Em
um acidente que acarrete neste tipo de lesão, ocorre rompimento de axônios, lesões de células nervosas e
rompimento de vasos sanguíneos. Em seguida, é desencadeado um processo hemorrágico e necrose da
substância cinzenta da medula espinal, com consequente formação de edema. Nos dias que se seguem, é
disparado um processo inflamatório que irá finalizar com um processo cicatricial (SISCÃO et al., 2007).
As consequências desta lesão para o paciente dependem da profundidade da lesão (completa ou incompleta) e
qual o nível de lesão neurológica, sendo o segmento mais caudal da medula a apresentar funções sensitivas e
motoras normais de ambos os lados.

Para ser considerada uma lesão completa, precisa haver perda de função motora e sensitiva nos segmentos

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Para ser considerada uma lesão completa, precisa haver perda de função motora e sensitiva nos segmentos
abaixo da lesão; e é considerada incompleta quando há preservação parcial das funções motoras abaixo da lesão.

3.3 Meninges e líquido cérebro espinal. Meningite e


hidrocefalia
O sistema nervoso central, compreendido pelo cérebro e medula espinal, constitui o principal sistema de órgãos
do nosso corpo, sendo ele nosso centro de comando. E exatamente por conta desta importância, há a necessidade
de se ter mecanismos de proteção eficientes, que o protejam das ações externas danosas. Para tanto, o SNC é
protegido pelas meninges e líquido cérebro espinal.
As meninges são membranas, em número de três, que revestem todo o cérebro, tronco encefálico. cerebelo e
medula espinal. As três camadas são: dura-máter, aracnoide e pia máter, conforme a seguinte figura.

Figura 8 - Representação da organização das meninges com os ossos. Observar que a dura máter se posiciona
mais externamente e a pia máter mais internamente. A aracnoide possui umas ramificações que lembram teias
de aranha, por isso a sua nomenclatura.
Fonte: Danilina Olga, Shutterstock, 2020.

Embora as meninges que protejam todo o SNC sejam contínuas, podemos denominar de meninges encefálicas
quando estão protegendo o encéfalo, e meninges espinais quando protegem a medula espinal. A camada mais
externa, a dura máter, é constituída de tecido conectivo denso não modelado. Ela é mais rígida e resistente,

fazendo a proteção das delicadas estruturas do SNC. Está associada a estruturas de drenagem de sangue do

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fazendo a proteção das delicadas estruturas do SNC. Está associada a estruturas de drenagem de sangue do
encéfalo (vasos ou cavidades) chamadas de seios. Na medula espinal, forma um saco desde o forame magno até a
segunda vértebra sacral, e continua com o epineuro, revestimentos dos nervos cranianos e espinais.

Figura 9 - Meninges espinais. Representação de como se dispõem as meninges revestindo a medula espinal.
Fonte: TORTORA; DERRICKSON, 2017. p. 255.

A membrana intermediária é a aracnóide máter. Ela apresenta projeções que se assemelham a teias de aranha,
daí que surge sua nomenclatura. Ela é frouxamente ligada à membrana mais interna, permitindo a formação de
um espaço, o espaço subaracnóideo, que é preenchido por líquido cérebro espinal. A membrana mais interna, a
pia máter, é a mais fina de todas, e se adere à superfície das estruturas do SNC.
Sendo o revestimento do SNC, as meninges acabam por ser um primeiro indício de que algo está afetando este
sistema. A chamada meningite, é uma inflamação das meninges, que requer uma atenção redobrada por parte do
corpo clínico que está acompanhando o indivíduo. Essa inflamação pode ser secundária a uma infecção, causada,
na maioria das vezes, por vírus ou bactérias. A sintomatologia da meningite inclui: febre, cefaléia, rigidez de
nuca, vômitos, confusão, letargia e sonolência. As causadas por bactérias são mais graves, necessitando de uso de
antibióticos e podem levar a óbito em pouco tempo. Já as virais tendem a ter um curso mais brando, muitas das
vezes sem tratamento específico e mais sintomatológico, podendo ter regressão espontânea em algumas
semanas. Independente da origem, toda meningite requer atenção, uma vez que afeta o conjunto de membranas

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vezes sem tratamento específico e mais sintomatológico, podendo ter regressão espontânea em algumas
semanas. Independente da origem, toda meningite requer atenção, uma vez que afeta o conjunto de membranas
que revestem o SNC e, portanto , está em contato íntimo com estruturas de comando de todo o nosso corpo
(GUYTON; HALL, 2017). Já temos disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS) as vacinas contra alguns tipos de
microrganismos causadores de meningite mais severas, auxiliando na imunização e controle da disseminação na
população.
Entretanto, não somente as meninges desempenham função de proteção do nosso SNC. Já foi mencionado nesta
unidade que há um líquido que preenche o espaço subaracnóideo, o líquido cérebro espinhal (também pode ser
chamado de líquido cerebrospinal – LCS). Ele é um líquido claro, incolor, estéril e formado essencialmente de
água. Desempenha função de proteção química e mecânica do SNC, em conjunto com as meninges. Também é
correlacionado com transporte de pequenas quantidades de oxigênio, glicose e outras substâncias de
importância para o bom funcionamento do SNC e suas células. Continuamente ele circula pelos espaços e
cavidades encefálicas e medulares, e ao redor destas estruturas no espaço subaracnóideo.
Juntamente com o líquido intersticial, o LCS forma o meio extracelular dos neurônios. O líquido intersticial
circula abaixo da pia máter, mas há comunicação entre estes dois líquidos nas junções permeáveis das
membranas da pia máter e pela camada de células ependimárias que revestem os ventrículos (GUYTON; HALL,
2017).

VOCÊ SABIA?
As células ependimárias são um tipo de célula da glia, que são responsáveis por desempenhar
funções de manutenção do SNC. As células ependimárias são do tipo cubóides ciliadas
derivadas do neuroepitélio imaturo. Elas revestem os ventrículos encefálicos, em
monocamada, sendo responsáveis por produzir e secretar continuamente o líquido
cerebrospinal (LCS). O processo de produção inclui filtragem do plasma do sangue com
posterior secreção no LCS do ultrafiltrado.

O LCS é constituído principalmente de água e sais minerais, sendo, portanto, uma solução salina. É produzido e
secretado continuamente pelas células ependimárias no plexo coróide. Essa estrutura é uma rede de capilares
nas paredes dos ventrículos que se assemelham ao tecido renal na função de filtragem do sangue. As células do
plexo coróide bombeiam seletivamente sódio e outros solutos do plasma para dentro dos ventrículos,
proporcionado a criação de um gradiente osmótico que passivamente puxa água em conjunto com os solutos,
formando o LCS, conforme a figura seguinte.

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Figura 10 - Representação do plexo coróide e detalhamento do sentido de filtração do sangue para a formação do
líquido cerebrospinal (LCS). Esta filtração permite a passagem de íons, água e vitaminas e nutrientes, mas barra
a passagem de muitas outras substâncias que podem ser potencialmente nocivas ao nosso SNC.
Fonte: TORTORA, 2016.

Este contínuo processo de filtração do sangue no plexo coróide é bidirecional. Desta forma, são retirados do LCS
metabólitos produzidos pelas células nervosas e lançados na corrente sanguínea. Desta forma, as células
ependimárias também atuam como sendo uma barreira hematoliquórica, permitindo a entrada de determinadas
substâncias no LCS, não permitindo outras, e protegendo o SNC de agressores potencialmente nocivos (GUYTON;
HALL, 2017).
Na Figura apresentada anteriormente, podemos observar a circulação do LCS no SNC. Nesse caso, ocorre uma
absorção de volta nas vilosidades especializadas da membrana aracnóide, permitindo a renovação de todo o
volume do LCS cerca de três vezes ao dia. Nessa circulação, observamos também que o SNC fica submerso no
LCS. Isso se torna importante para a diminuição do peso do encéfalo sobre estruturas como os vasos sanguíneos
e os nervos que são conectados ao SNC. Além disso, devido a pouca compressibilidade da água, o LCS serve como
colchão de amortecimento do SNC quando há choques mecânicos.
Para um melhor entendimento, você pode fazer um experimento simples. Pegue um pedaço de tofu (que irá
representar o encéfalo) e coloque em um recipiente com água e, em seguida, promova uma agitação. Depois, faça
o mesmo procedimento, mas em um recipiente sem água, somente o tofu. Agora imagine isso ocorrendo com o
nosso encéfalo.
Além dessa proteção mecânica, o LCS ainda promove um ambiente controlado quimicamente para os neurônios,
uma vez que há um processo de filtragem altamente regulado para sua formação. Além do que, sua interação
com o líquido intersticial promove a retirada dos metabólitos produzidos pela atividade neuronal e das células
da glia.

Exames executados no LCS indicam como está o ambiente químico e microbiológico do SNC, uma vez que a

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Exames executados no LCS indicam como está o ambiente químico e microbiológico do SNC, uma vez que a
presença de um único microrganismo pode indicar uma infecção neste ambiente altamente controlado. O seu
próprio volume também é controlado. Mas podem ocorrer situações que desencadeiam uma desregulação na sua
produção, tais como infecções, tumores ou malformações. O aumento de líquido no SNC é chamado de
hidrocefalia. As suas causas podem ser secundárias, devido à obstrução do seu fluxo ou taxas anormais de
produção e/ou reabsorção.
As consequências da hidrocefalia podem ser muito danosas, uma vez que pode levar à compressão de estruturas
neuronais importantes. Em bebês, devido à presença das fontanelas (pequenas aberturas ainda não calcificadas
entre os ossos do crânio) as consequências podem ser mais facilmente revertidas do que em adultos, cujas
chances de evolução rápida para óbito são maiores. Deve-se rapidamente identificar a causa da hidrocefalia e
tentar corrigi-la. Caso seja necessário, pode ser executado um procedimento chamado de ventriculostomia
endoscópica do terceiro ventrículo, a fim de drenar o excesso de LCS e, dessa maneira, aliviar a pressão
intracraniana (NASCIMENTO et al, 2018).

3.4 Vascularização do sistema nervoso central. Acidente


vascular encefálico
Os números impressionam: o encéfalo corresponde a aproximadamente 2% do peso corporal de um indivíduo,
mas consome cerca de 20% do suprimento de oxigênio deste mesmo corpo. A interrupção de fluxo sanguíneo
para o cérebro, mesmo que breve, pode resultar em um estado de inconsciência do indivíduo. Esta requisição
enorme de oxigênio também ocorre em outros nutrientes, especialmente com a glicose. Os neurônios, células
altamente especializadas, somente conseguem produzir ATP através da glicose, em reações que lançam mão de
oxigênio. Esta é a explicação para a intensa demanda de oxigênio e glicose (GUYTON; HALL, 2017).
Para demonstrar o quanto necessitamos de fluxo sanguíneo para o SNC, relembre das vezes que você levantou
muito rapidamente, e com isso o fluxo sanguíneo não conseguiu rapidamente se reajustar, e, como consequência,
experimentou um breve momento de confusão e desorientação. Estima-se que cortes de fluxos sanguíneos de 2 a
4 minutos já podem resultar em consequências danosas ao cérebro.

VOCÊ QUER VER?


Suzana Herculano-Houzel é uma neurocientista brasileira, de renome internacional. Em um
Ted talk a pesquisadora explana sobre como é feito nosso cérebro e como ele se organiza. Vale
a pena assistir, mas não esqueça de ativar as legendas em português nas configurações do
vídeo. Para acessar, visite o endereço: https://www.youtube.com/watch?v=_7_XH1CBzGw).

A necessidade de um intenso suprimento sanguíneo ao cérebro é nítida quando avaliamos a extensão da rede de
capilares e vasos sanguíneos: são estimados 640 km de comprimento. Esta rede de vasos cria a chamada barreira
hematoencefálica que, embora não seja uma barreira física propriamente dita, age regulando as substâncias que
passam através dos capilares em direção ao tecido sanguíneo.

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Figura 11 - Principais vasos sanguíneos de irrigação do Encéfalo representados por uma angiografia cerebral,
onde podemos ver os cerca de 640 km de vasos sanguíneos que fazem a função de levar suprimento sanguíneo.
Fonte: SILVERTHORN, 2017, p. 282.

Essa seletividade dos capilares sanguíneos do SNC se dá devido à presença de junções oclusivas das células
endoteliais. Essas junções são formadas, aparentemente, por sinais parácrinos dos astrócitos (células da glia, de
suporte do SNC) adjacentes, cujos pés envolvem os vasos sanguíneos. Dessa forma, podemos dizer que o próprio
tecido nervoso cria a barreira hematoencefálica. De forma resumida, substâncias hidrossolúveis tendem a ter
dificuldades de ultrapassar essa barreira e substâncias pequenas e lipossolúveis, mais facilidade de ultrapassá-la.
Um exemplo são os anti-histamínicos mais antigos, que eram constituídos de aminas lipossolúveis, as quais
facilmente atravessavam a barreira e chegavam no encéfalo agindo nos centros de controle do sono/vigília. Os
anti-histamínicos mais modernos são menos lipossolúveis e tem mais dificuldade de ultrapassar a barreira
hematoencefálica e, consequentemente, causam menos sono.
Essa enorme quantidade de vasos sanguíneos não está imune a ocorrências de eventos que levam à patologias.
Uma das mais comuns ocorrências é a do acidente vascular encefálico (AVE), que pode receber nomes como
apoplexia e derrame. A característica clínica de um AVE é o surgimento brusco e persistente de sintomas como
perda ou ausência de sensibilidade ou paralisia. Dentre as causas, as mais comuns envolvem hemorragia de
vasos sanguíneos da pia máter ou no próprio encéfalo, coágulos ou formações de placas ateroscleróticas.

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Conclusão
Concluímos a unidade sobre o Sistema Nervoso Autônomo (SNA) e medula espinhal, suas funções e patologias.
Agora, você já sabe como o SNA e a medula espinal se organizam, quais as suas funções, além de poder descrever
importantes patologias que os afligem.
Nesta unidade, você teve a oportunidade de:
• entender o que compreende o Sistema Nervoso Autônomo e suas subdivisões;
• saber que o sistema simpático e sistema parassimpático possuem diferenças anatômicas e funcionais
entre si;
• aprender que o sistema parassimpático está mais atuante quando estamos em repouso, em contraponto
ao sistema simpático, que atua mais fortemente em situações de estresse e agitação;
• entender a necessidade do organismo de balancear as ações dos sistemas simpáticos e parassimpáticos
para controlar a homeostase corpórea;
• estudar sobre as vias autônomas e seus constituintes;
• aprender que cada segmento da medula espinal está relacionado a um par de nervos espinais;
• saber que a informação sensorial é conduzida pelas raízes dos nervos na porção dorsal, enquanto as
raízes ventrais conduzem informações motoras de resposta;
• aprender que os reflexos espinais são integrados na medula espinal;
• descobrir que as meninges revestem o SNC, e são em número de três: dura máter, aracnóide máter e pia
máter;
• entender que o líquido cerebrospinal é produzido pelas células ependimárias no plexo coróide e banha
todo o SNC;
• estudar que o LCR é, assim como as meninges, responsável pela proteção e nutrição do SNC;
• descobrir que barreira hematoencefálica é responsável por evitar que substâncias nocivas ao SNC
adentrem o sistema, através de um efetivo sistema de filtração.

Bibliografia
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2017.
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Koogan, 2016. Tradução Ana Cavalcanti C. Botelho.

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