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2º Workshop de Tecnologia de Processos e Sistemas Construtivos

28 e 29 de agosto de 2019

PRODUÇÃO DE PLACAS CIMENTÍCIAS COM BORRACHA DE


PNEU INSERVÍVEL PARA USO EM FORROS DE HABITAÇÕES
S. GARCIA DE FREITAS, Enilda Maria (1); S. TOSTA, Douglas (2); GÜTHS, Saulo (3); S.
MILANI, Ana Paula (4)
(1) Mestrado em Eficiência Energética e Sustentabilidade, UFMS, Campo Grande, MS,
enilda.msgfreitas@gmail.com;
(2) Engenharia Civil, UFMS, Campo Grande, MS, douglastosta85@gmail.com;
(3) Engenharia Mecânica, UFSC, Florianópolis, SC, saulo@lmpt.ufsc.br;
(4) Engenharia Civil, UFMS, Campo Grande, MS, ana.milani@ufms.br
Resumo: Em busca de ações mitigadoras para o problema de acúmulo indiscriminado de resíduos industriais,
o reuso de borracha de pneus inservíveis tem-se mostrado uma alternativa para a construção civil sob o
aspecto de contribuição de materiais construtivos mais sustentáveis. A partir disso, produtos cimentícios com
borracha de pneus inservíveis sem função estrutural tem ganhado versões para a aplicação em sistemas
construtivos devido à baixa condutividade térmica em vistas aos concretos e argamassas convencionais.
Assim, o presente trabalho buscou estudar argamassas compostas pelas matérias-primas cimento-areia-
resíduos de borracha de pneus inservíveis para a confecção de placas de vedação com características de
isolamento térmico de edificações. Após a caracterização física dos materiais e estudo de dosagem do
compósito cimentício com resíduos de borracha, foram realizados ensaios de resistência à flexão e
compressão, absorção de água, densidade e condutividade térmica; e verificados métodos de moldagem para a
fabricação de placas para uso como forro de cobertura de habitações. Foram encontrados resultados que
validam a utilização de traços de argamassa cimentícia com até 15% de adição de borracha de pneus
inservíveis, o que a torna um produto com menor massa específica, tecnicamente viável para aplicação como
placas pré-fabricadas e potencial desempenho térmico ao compará-lo com placas de argamassas cimentícias
convencionais.

Palavras-chave: placas cimentícias, isolamento térmico, argamassa com borracha de pneu, processo vibrado.

Área do Conhecimento: Engenharia civil, Materiais e componentes da construção, Tecnologia de


componentes para construção.

1 INTRODUÇÃO

No Brasil aproximadamente 60% dos pneus inservíveis são destinados ao coprocessamento, que consiste
na utilização de pneu triturado para fonte de calor em cimenteiras (IBAMA, 2017). O coprocessamento, embora
seja uma destinação ambientalmente correta, este manejo gera controvérsias, uma vez que não se sabe ao
certo se a queima do pneu, mesmo em alta temperatura de combustão não gera toxinas que podem afetar o
ambiente e a saúde humana (FIKSEL et al., 2010). Assim, o reuso de borracha de pneus inservíveis viabiliza
uma nova fonte de agregados para a construção civil e fornece uma metodologia limpa para destinação dos
pneus inservíveis, poupando recursos naturais.
Dessa forma, são necessárias investigações para o desenvolvimento de materiais de construção a partir da
incorporação da borracha de pneus inservíveis em compósitos cimentícios sem função estrutural. Dentre as
características físicas e mecânicas, destaca-se a diminuição na densidade quando comparado aos compósitos
com agregados naturais devido às partículas de borracha possuir massa específica menor que a brita e areia
natural, e consequentemente, aumento da porosidade do produto final (FLORES - MEDINA et al., 2013).
Apesar das consideráveis perdas de resistência mecânica com a incorporação de partículas de borracha de
pneus inservíveis em argamassa e concreto, foi constatada por Shah et al. (2014) e Turgut et al. (2008) o
aumento da resistência térmica destes compósitos com aumento do teor de borracha. Os referidos autores
atribuíram a melhor resistência térmica do concreto com borracha à baixa condutividade térmica dos agregados

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de borracha e ao aumento da porosidade do material.


Portanto, obter uma mistura e um processo de produção adequado de argamassa adicionada de borracha
de pneus inservíveis para a confecção de placas de forro com características de isolamento térmico de
edificações pode contribuir com os estudos de aplicabilidade de produtos alternativos para a eficiência
energética da construção civil.

2 MATERIAIS E MÉTODOS

Para a produção das argamassas foram utilizados cimento Portland CP V ARI, areia natural de Campo
Grande/Brasil e partículas de borracha de pneus inservíveis processadas em empresa recicladora deste
passivo ambiental, por meio de trituração mecânica de pneus, sem nenhum processo de lavagem ou
tratamento físico ou químico da superfície. Tem-se na Tabela 1, a caracterização física da areia e da partícula
de borracha utilizada na confecção das argamassas.
Tabela 1 – Características dos materiais
Diâmetro
Massa específica Massa unitária Módulo de
Materiais Máximo
(g/m³) (g/cm³) Finura
(mm)
Areia 2,65 1,54 0,60 1,16
Partículas de borracha de pneu 1,32 0,54 2,36 3,31
Fonte: Autores (2019)

2.1 Produção e caracterização das argamassas

O estudo de dosagem foi baseado na pesquisa realizada por Tosta et al. (2018) em argamassas com
borracha de pneu inservível e nos resultados obtidos por Benazzouk et al. (2008) que constatou perdas
significativas na resistência mecânica em compósitos cimentícios com adições de borracha acima de 20%.
Contudo, para atender o menor consumo de cimento aliado maior adição de borracha e a resistência de tração
na flexão mínima de 4 MPa de placas cimentícias para vedação apontada pela NBR 15498 (2016) foram
adotadas as dosagens apresentadas na Tabela 2. Sendo assim, os teores de borracha incorporado foram em
substituição ao volume de areia, correspondendo aos teores de 0%,10% e 15%.

Tabela 2 – Dosagem das argamassas adotadas


Traço unitário (em massa) Teor de Cimento Areia Borracha Relação a/c
(cimento:areia:borracha:água/cimento) borracha (kg/m³) (kg/m³) (kg/m³) água/cimento
1:3,94:0:0,70 (referência) 0% 396,39 1561,78 - 0,70
1:3,56:0,19:0,70 10% 396,89 1412,93 75,41 0,70
1:3,38:0,28:0,70 15% 396,85 1341,35 111,12 0,70

Fonte: Autores (2019)


Para cada traço de argamassa, no estado fresco das misturas, foram avaliadas teor de ar incorporado (AI)
e índice de consistência (IC) segundo normativas brasileiras. Já no estado endurecido, foram realizados os
ensaios físicos de absorção, índice de vazios, capilaridade e massa específica das argamassas conforme
descrições das normativas brasileiras.
A avaliação da resistência à tração na flexão foi realizado em placas de argamassas aos 7 e 28 dias de
cura úmida, sendo as mesmas produzidas nas dimensões de 30 cm de comprimento x 10 cm de largura x 3 cm
de espessura, a partir da NBR 13279:2005, com o vão adotado de 20 cm entre os apoios inferiores (2 cutelos)
da máquina de ensaio.
Como complementação da caracterização das argamassas, foi realizada a determinação da condutividade
térmica (λ) seguindo o procedimento da norma técnica ISO 8301:2010, a partir da moldagem de placas com
dimensões de 30 cm x 30 cm e com espessura de aproximadamente 6 cm.

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2.2 Processo de fabricação das placas


Para avaliar o efeito dos procedimentos de moldagem na resistência físico-mecânica das placas
cimentícias com borracha de pneus inservíveis, foram explorados três métodos no processo de fabricação das
placas com as argamassas a seguir. Em todos estes processos, a desmoldagem ocorreu após 24h e a cura
das placas foi via úmida com posterior aplicação, aos 7 dias, dos ensaios de resistência à tração na flexão de
forma análoga a caracterização das argamassas. A dosagem da Tabela 2 foi utilizada para a fabricação das
argamassas, ressaltando que para atender o processo de lançamento e de prensagem foi necessário o ajuste
da relação a/c.
Lançamento: o processo consistiu em lançar a argamassa no molde, preenchendo através do
espalhamento manual interno da fôrma e em seguida foi rasada a superfície. Entretanto, para adequar a
consistência mais fluida e garantir o espalhamento homogêneo no molde, foi necessário aumentar a relação
água/cimento para 0,8 (Figura 1, item a).
Vibrada: a metodologia consistiu na distribuição da argamassa na fôrma, realização do adensamento
mecânico através da mesa vibratória, sendo que o tempo de vibração foi controlado através do surgimento de
bolhas de ar a superfície da argamassa (Figura 1, item b).
Prensagem: o procedimento consistiu em introduzir e distribuir a argamassa em toda área da fôrma. Após a
moldagem foi aplicada a prensagem uniaxial em uma prensa hidráulica com carga média de 9 kN para o traço
de argamassa sem borracha de pneu e 7 KN para as argamassas com borracha de pneu. O tempo foi em
média 60 s e 74 s, respectivamente para os traços sem borracha e com borracha de pneu. E para melhor
conformação nos moldes, houve a redução da relação água/cimento para 0,23 (Figura 1, item c).

Figura 1 – Processos de fabricação das placas

a) lançamento b) vibrada c) Prensagem


Fonte: Autores (2019)

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
O comportamento físico das argamassas estudadas está apresentado na Tabela 3.
Tabela 3 – Comportamento físico das argamassas
Traço Unitário IC (mm) Teor de ar Absorção da Massa Índice
(cimento: areia: Incorporado água por específica vazios
borracha: A/C) (%) imersão (%) (g/cm³) (%)
1:3,94:0:0,70 216,20 9 10,21 1,84 18,79
1:3,56:0,19:0,70 226,17 11 11,10 1,73 19,20
1:3,38:0,28:0,70 242,17 16 11,80 1,69 19,92
Fonte: Autores (2019)

Foi possível constatar a partir da Tabela 3 uma maior incorporação de ar nos traços com maior quantidade
de partículas de borracha, ocorrendo o mesmo com o índice de consistência (IC). Quanto maior for o teor de ar
incorporado, menor será a densidade da argamassa e melhor será sua trabalhabilidade (CARASECK et al.,
2008). De modo geral, os traços com borracha de pneu apresentaram maior porcentagem de índice de vazios,
embora com diferenças não significativas nos resultados. Isto se deve ao incremento da porosidade na

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argamassa causada pelo o aumento de retenção de ar (SHAH et al., 2014).


Quanto ao ensaio de absorção de água por capilaridade das argamassas, os traços com borracha tiveram
melhor desempenho, quando comparados com o traço referência (0% borracha). Foi analisada a ascensão de
água por capilaridade das argamassas e foi verificada que as argamassas sem borracha obtiveram subida de
água em 100% no corpo de prova. O incremento na incorporação de ar na argamassa com borracha de pneu
cria microbolhas que interrompem os capilares, impedindo que a água percole por eles (MAIO et al., 2018).
Nota-se na Tabela 4, quando assumido o consumo máximo de 396,89 kg/m³, os traços adotados atingiram
valores superiores a 4 MPa na resistência a flexão aos 28 dias de idade, embora com redução de resistência
mecânica. Esta redução, independente do tipo do traço da argamassa, quanto maior o aumento de
incorporação de borracha, maior será o decréscimo nas resistências à compressão simples e a flexão, sendo
significativas tais reduções mecânicas (ANGELIN et al., 2017).
Tabela 4 – Comportamento mecânico das argamassas
Traço Unitário Compressão (MPa) Flexão (MPa)
(cimento:areia:borracha:a/c) 7 dias 28 dias 7 dias 28 dias
1:3,94:0:0,70 16,7 20,8 5,2 5,5
1:3,56:0,19:0,70 11,0 11,4 4,2 4,7
1:3,38:0,28:0,70 10,5 12,0 3,6 4,0

Fonte: Autores (2019)


Os resultados de condutividade térmica foram 1,17 W/mK para a argamassa referência (0% borracha),
0,955 W/mK para os traços com 10% de borracha e 0,922 W/mK para as argamassas com 15% de borracha;
havendo redução significativa de condução térmica da argamassa com borracha quando comparada a
argamassa tradicional. Isto se deve ao incremento de porosidade (macroporos) que favorece a diminuição da
condutividade térmica (SAHA, 2019).

3.1 Processo de fabricação das placas de argamassa


As moldagens das placas realizadas por meio de vibração e de lançamento apresentaram comportamento
físico-mecânico semelhante, independente do teor de borracha (Quadro 1). Já para as placas moldadas por
prensagem houve uma redução significativa dos valores de resistência à flexão. Para as placas prensadas foi
necessário a adoção da relação a/c de 0,23 para alcançar uma moldagem sem exsudação, e embora o
consumo de cimento aumentasse, a quantidade de água não foi o suficiente para garantir a sua hidratação.
Também, destaca-se que a perda de resistência nas placas prensadas quando comparadas aos demais
processos esta atribuída ao seu aumento dos índices de vazios, pois o adensamento mecânico vibrado permite
a saída do ar, facilita o arranjo interno dos agregados e consequentemente diminui os vazios internos da matriz.
Quadro 1 – Caracterização das placas
Teor Tipo de IC AI Absorção Massa específica Índice Flexão
borracha Moldagem (mm) (%) d’água (%) (g/cm³) vazios (%) (MPa)
Vibrada 216,20 11 10,21 1,84 18,79 5,2
0% Lançada 264,50 12 10,68 1,84 19,70 4,6
Prensagem - - 22,59 1,67 37,50 1,6
Vibrada 226,17 13,0 11,10 1,73 19,20 4,2
10% Lançada 267,23 13,5 11,65 1,73 20,16 3,8
Prensagem - - 26,22 1,53 40,04 0,7
Vibrada 242,17 13,0 11,80 1,69 19,92 3,6
15% Lançada 270,33 13,5 11,88 1,68 20,00 3,8
Prensagem - - 23,70 1,56 37,09 0,8

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Fonte: Autores (2019)

4 CONCLUSÃO

A argamassa com 15% de resíduo de borracha de pneu confere o valor de resistência à flexão pretendida
de 4 MPa e reduz cerca de 21% da condutividade térmica quando comparada a argamassa convencional,
trazendo assim, uma proposta de um material mais leve e com melhor resistência térmica. Portanto, forros de
placas cimentícias com 15% de borracha de pneu inservíveis fabricadas a partir do processo de vibração é um
componente que pode contribuir no desempenho térmico em moradias, e consequentemente na eficiência
energética da edificação. Ressalta-se que a realização de ensaios como resistência a abrasão e análise
microestrutural sobre a aderência entre partículas de borracha de pneu e matriz cimentícias são necessários
para a verificação da durabilidade deste material alternativo de vedação.

5 REFERÊNCIAS
ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15498: Placas de fibrocimento sem
amianto – Requisitos e métodos de ensaio. Rio de Janeiro, 2016.

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BENAZZOUK, A.; DOUZANE, O.; MEZREB, K.; LAIDOUDI, M.; QUÉNEUDEC, M. Thermal conductivity of
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Building Materials. v. 22. P. 573-579, 2008.

CARASECK, H. et al. Influência da Umidade nas Propriedades dos Revestimentos de Argamassa. Encontro
Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído, Fortaleza, 2008.

FIKSEL, J.; BAKSHI, B.; BARAL, A.; GUERRA, E.; DEQUERVAIN, B. Comparative life cycle assessment of
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FLORES-MEDINA, D.; MEDINA, N. F. Static mechanical porperties of waste rests of recycled rubber and high
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IBAMA. Dados estatísticos da reciclagem de pneus no Brasil. Brasília, 3p, 2017.

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SAHA, A. K.; SARKER, P. K.; GOLOVANEVSKIY, V..Thermal properties and residual strength after high
temperature exposure of cement mortar using ferronuckel slag aggregate. Construction and Building Materials.
v. 199, p. 601-612, 2019.

SHAH, S. F. A.; NASEER, A.; SHAH, A. A.; ASHRAF, M. Evaluation of Thermal and Structural Behavior of
Concrete Containing Rubber Aggregate. Arabian Journal for Science and Engineering, Saudi Arabia. 2014.

TOSTA, Douglas Sousa; FREITAS, Enilda Maria da Silva Garcia; MILANI; Ana Paula. Estudo de compósitos
cimentícios com resíduos de borracha de pneus inservíveis para fabricação de placas de vedação de
habitações. IntegraUFMS 2018, Campo Grande, 2018.

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TURGUT P.; YESILATA B; Physico-mechanical and thermal performances of newly developed rubber-added
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