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INFLUÊNCIA DO TIPO DE CIMENTO NAS CARACTERÍSTICAS MECÂNICAS

DA BRITA GRADUADA TRATADA COM CIMENTO

Verônica Janaína Melo Barreto Nunes


Fernando Silva Albuquerque
Universidade Federal de Sergipe

RESUMO
A necessidade de estruturas de pavimentos que suportem maiores volumes e cargas de tráfego tem levado ao
desenvolvimento de novos materiais e metodologias de execução. Em vias com altas solicitações de tráfego, as
bases e sub-bases de brita graduada tratada com cimento (BGTC) são uma alternativa para aumentar a
capacidade de carga da estrutura e diminuir as deformações. Entretanto, essas misturas são caracterizadas por
ruptura frágil e podem apresentar processo de fissuração prematuro por fadiga. Assim, o presente estudo teve por
objetivo analisar a influência do tipo de cimento nos parâmetros mecânicos da BGTC. Foram avaliadas misturas
com dois tipos de cimento, CP-II-F-32 e CP-IV-32 RS, para dois teores do ligante, 3,0% e 5,0%. Os resultados
demonstram que a substituição do CP-II pelo CP-IV resulta no aumento das resistências à compressão e tração,
além do aumento dos módulos flexural, elástico e dinâmico, com possíveis ganhos em vida de fadiga.

ABSTRACT
The need for pavement structures that support greater volumes and traffic loads has led to the development of
new materials and execution methodologies. On roads with high traffic demands, the bases and sub-bases of
cement treated crushed stone (CTCS) are an alternative to increase the load capacity of the structure and reduce
deformations. However, these mixtures are characterized by fragile rupture and may present a premature
cracking process due to fatigue. Thus, this study aimed to analyze the influence of the type of cement on the
mechanical parameters of the CTCS. Mixtures with two types of cement, CP-II-F-32 and CP-IV-32 RS, were
evaluated for two binder contents, 3.0% and 5.0%. The results demonstrate that the replacement of CP-II by CP-
IV results in an increase in compressive and traction resistance, in addition to an increase in flexural, elastic and
dynamic modules, with possible gains in fatigue life.

1. INTRODUÇÃO
Para compor a estrutura dos pavimentos, está disponível uma variedade de materiais e
metodologias de execução, com indicações apropriadas de utilização. Em vias com alto
volume de tráfego, Bernucci et al. (2006) destacam o uso da brita graduada tratada com
cimento (BGTC) nas camadas de base e sub-base de pavimentos. A BGTC é o produto
resultante da mistura, em usina, de pedra britada, cimento Portland, água e, eventualmente,
aditivos, em proporções determinadas experimentalmente (DER/SP, 2005).

Segundo Andrade et al. (2015), a água acrescida à mistura da BGTC, além de facilitar a
compactação, tem a função de hidratar o cimento que se mistura à fração granular fina.
Assim, é obtida uma pasta que se liga pontualmente aos agregados graúdos, mas não os
envolve totalmente como ocorre no concreto de cimento Portland. Essa característica
proporciona certa quantidade de vazios na mistura, denominados poros.

Desse modo, apesar das vantagens para utilização de materiais cimentados em estruturas de
pavimentos, Balbo (2006) adverte sobre o problema da porosidade e processo de fissuração
em camadas cimentas, seja por fadiga ou em decorrência do processo de retração durante a
cura do material. Mecanicamente, após fissurar, a base de material cimentado funciona como
um conjunto de blocos que fornece incontáveis entalhes para a abertura de fissuras e sua
posterior propagação ascensional na camada do revestimento asfáltico (Balbo, 2006).

Nesse sentido, o presente estudo analisou comparativamente misturas de BGTC contendo dois
tipos de cimento, CP-II-F-32 e CP-IV-32 RS, a fim de observar a influência do tipo de

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cimento no comportamento mecânico das misturas investigadas.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
A necessidade de pavimentos que atendam o volume mais intenso do tráfego, com a
circulação de veículos mais pesados, motiva pesquisadores a avançarem nos estudos sobre o
tema, com indicações de novos critérios de dosagens, utilização de adições que promovem
reforço na capacidade estrutural ou mesmo desenvolvimento de novos métodos de execução.

No que diz respeito à BGTC, algumas pesquisas já foram conduzidas com o objetivo de
melhorar o desempenho mecânico desse tipo de material para pavimentos, os quais
certamente contribuirão com o novo Método de Dimensionamento Mecanístico-Empírico de
Pavimentos Asfálticos, em desenvolvimento pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de
Transportes (DNIT).

Klinsky e Faria (2015) estudaram a influência da energia de compactação no comportamento


mecânico da brita graduada tratada com cimento e concluíram que o incremento da energia de
compactação, de intermediária para modificada, produz ganhos nos parâmetros mecânicos do
material.

Prado et al. (2020) avaliaram as propriedades mecânicas da BGTC a partir da variação de


alguns fatores, entre eles a faixa granulométrica. Na pesquisa, foram utilizadas duas faixas
granulométricas, uma segundo a especificação técnica ET-DE-P00/009 (DER/SP, 2005) e
outra com base no Manual de Engenharia de Pavimentos da África do Sul (SAPEM, 2014),
denominadas faixas A e B, respectivamente. O estudo concluiu que a faixa B, com maior teor
de areia, tem grandes possibilidades de conferir melhores respostas aos esforços que a
estrutura é submetida no pavimento.

Os avanços tecnológicos e, consequentemente, o desenvolvimento de equipamentos e


metodologias de análise, possibilitaram monitorar o desempenho de brita graduada tratada
com cimento em camadas do pavimento, como é observado no trabalho de Nascimento e
Albuquerque (2018). Os autores avaliaram o processo de degradação por fadiga da BGTC em
laboratório, por meio dos ensaios de vida de fadiga, e em campo, através do levantamento das
condições estruturais de um trecho monitorado na BR-101/SE, sendo possível definir um fator
laboratório-campo e desenvolver um modelo de previsão desempenho à fadiga. Nesse estudo
a avaliação estrutural do pavimento foi realizada por processo não destrutivo, no qual foram
levantadas bacias deflectométricas utilizando deflectógrafo digital (Viga Benkelman
eletrônica) e Falling Weight Deflectomer (FWD).

A utilização de adições que promovem reforço na capacidade estrutural na mistura foi tema
de estudo de Bacelar (2019). O autor analisou o comportamento da BGTC com a adição de
quatro tipos de fibras: fibras de vidro, de aço, de polietileno e polipropileno. Os resultados
apresentados evidenciam ganhos significativos na resistência à tração, especialmente na
flexão, destacando-se as misturas com fibras de polipropileno que atingiram valores de
resistência à tração na flexão 52% superiores a misturas sem adição de fibras. O autor
comenta que após atingir a carga de ruptura cada fibra atuou até o seu arrancamento,
denotando a atuação das fibras após a ruptura da matriz, fornecendo maiores resistência
residual e deformação.

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Os estudos sobre BGTC apontam a granulometria, a umidade, o teor de cimento, as adições e
método de compactação como alguns dos fatores que influenciam no comportamento
mecânico do material. No entanto, pesquisas em outras áreas demonstram que o tipo de
cimento também exerce papel relevante na determinação das características das misturas com
o ligante. Castro et al. (2011), por exemplo, afirmam que as características do cimento
influenciam as propriedades dos concretos, sendo observados comportamentos distintos para
misturas produzidas com diferentes tipos cimento.

Atualmente, o mercado brasileiro dispõe de algumas opções de cimento Portland, que diferem
entre si pela proporção de clínquer, sulfatos de cálcio, materiais carbonáticos e adições, como
escórias, pozolanas e calcário, acrescentadas no processo de moagem. As adições ao cimento
melhoram certas características do ligante, tornando-o mais vantajoso ou recomendável para
determinadas aplicações.

3. MATERIAIS E MÉTODOS
Essa pesquisa possui caráter experimental, na qual foram realizados ensaios de caracterização
e mecânicos. A normatização usada nos métodos de ensaio para determinação dos parâmetros
avaliados é listada a seguir:
• Determinação da composição granulométrica dos agregados, conforme NBR NM 248
(ABNT, 2003);
• Determinação da absorção e massa específica do agregado graúdo, com base na norma
rodoviária DNER-ME 195 (DNIT, 1997);
• Determinação do índice de forma do agregado graúdo pelo método do paquímetro,
utilizando as especificações da NBR 7809 (ABNT, 2019);
• Compactação utilizando amostras não trabalhadas, seguindo a metodologia
apresentada em DNIT 164-ME (DNIT, 2013);
• Determinação da resistência à compressão simples, determinada segundo a NBR 5739
(ABNT, 2018a), com moldagem do corpo de prova conforme a norma DNIT 181-ME
(DNIT, 2018b);
• Determinação da resistência à tração por compressão diametral, com os procedimentos
apresentados pela norma DNIT 136-ME (DNIT, 2018a) e número de golpes
determinado conforme a norma DNIT 181-ME (DNIT, 2018b);
• Determinação da resistência à tração na flexão, utilizando os métodos de ensaios
descritos em C78/78M (ASTM, 2021), AP-R462 (AUSTROADS, 2014), Report 789
(NCHRP, 2014) e NBR 12142 (ABNT,2010);
• Determinação do módulo dinâmico, com as especificações da norma internacional
C215 (ASTM, 2019);
• Determinação do módulo de elasticidade, conforme metodologia de ensaio
apresentada na NBR 8522 (ABNT, 2017);
• Determinação do módulo flexural, com base nos procedimentos descritos no Report
789 (NCHRP, 2014) e AP-R462 (AUSTROADS, 2014).

3.1. Materiais
Foram utilizados agregados de origem gnáissica, coletados em uma pedreira localizada no
povoado Cajaíba, no município de Itabaiana, em Sergipe. Para atender a composição
granulométrica estabelecida pelo Manual de Engenharia de Pavimentos da África do Sul
(SAPEM, 2014), houve a necessidade de aquisição de areia fina no comércio local. Assim,
foram utilizados sete tipos de agregados nas misturas de BGTC. A Figura 1 apresenta a curva

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granulométrica de cada um deles.

Figura 1: Curva granulométrica dos agregados

Os agregados graúdos foram caracterizados com base no índice de forma, absorção e massa
específica, como mostra a Tabela 1.

Tabela 1: Caracterização do agregado graúdo


Absorção Massa específica Índice de
Agregados
(%) seca g/cm³ forma
Brita 25 0,26 2,697 2,01
Brita 19 0,29 2,700 2,28
Pedrisco 0,55 2,697

Nas misturas, foram utilizados dois tipos de cimento: CP-II-F-32 e CP-IV-32 RS. Os corpos
de prova de referência foram moldados utilizando o cimento do tipo CP-II-F-32 , ou seja,
cimento Portland composto com material carbonático e classe de resistência de 32 MPa, de
fácil aquisição no comércio local e muito utilizado na construção civil. Para fazer uma análise
comparativa foram moldados corpos de prova com CP-IV-32 RS, isto é, cimento Portland
pozolânico resistente a sulfato, com classe de resistência de 32 MPa. O CP-II-F-32 possui em
sua composição 75% a 89% de clínquer mais sulfatos de cálcio e 11% a 25% de material
carbonático, enquanto o CP-IV-32 RS possui 45% a 85% de clínquer mais sulfatos de cálcio,
15% a 50% de material pozolânico e 0% a 10% de material carbonático (ABNT, 2018b).

A água potável usada estava livre de materiais orgânicos, óleos ou outras substâncias
prejudiciais à hidratação do cimento.

3.2. Dosagem das misturas


Tendo em vista os resultados e conclusões apresentadas por Prado et al. (2020), a
granulometria das misturas atendeu aos limites estabelecidos no Manual de Engenharia de
Pavimentos da África do Sul (SAPEM, 2014), constituída por 11,0% de brita 25; 15,0% de
brita 19; 19,0% de pedrisco; 31,0% de pó de pedra 1; 7,5% de pó de pedra 2; 12,5% de areia;
e 4,0% de material de enchimento. Na Figura 2 é possível observar a curva granulométrica
usada nas misturas de BGTC.

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Figura 2: Curva granulométrica da BGTC

Na pesquisa, foram utilizados dois teores de cimento, 3% e 5%, para cada tipo de cimento,
totalizando, portanto, quatro dosagens (tratamentos) possíveis. A curva granulométrica indica
a proporção de cada agregado utilizado na mistura, porém, esse percentual foi ajustado em
função do teor de cimento adicionado, ou seja, houve uma substituição em percentual de
massa para inclusão do cimento, conforme Equação 1.
m% = m* x (100% - cim%) (1)
em que: m% = percentual em massa do agregado “m” na mistura com cimento (%);
m*= proporção em massa do agregado sem o cimento (decimal);
cim% = percentual de cimento que se deseja adicionar (%).

Para determinar a umidade ótima das misturas, foi realizado o ensaio de compactação na
energia Proctor modificada, obtendo-se uma massa específica seca máxima de 2,417 g/cm³ e
umidade ótima igual a 5,2% para um teor de 3,0% de cimento. Já para 5,0% de cimento,
foram encontradas massa específica seca máxima e umidade ótima correspondentes a 2,317
g/cm³ e 5,8%, respectivamente.

As moldagens foram realizadas com mecanismos de compactação e em moldes específicos


para cada ensaio. Concluída a moldagem, o conjunto (molde e material compactado) foi
embalado em filme de policloreto de vinil (PVC), para conservar a umidade, e levado à
câmara úmida com temperatura e umidade relativa do ar controladas em 30 ± 2ºC e 85%,
respectivamente, onde permaneceu por um período de 24 horas. Decorrido esse tempo, o
corpo de prova foi desmoldado e novamente embalado em filme de PVC. Então, a amostra
retornou à câmara úmida para conclusão do período de cura de sete dias, quando foram
realizados os ensaios propostos.

3.3. Ensaios mecânicos


As propriedades mecânicas foram avaliadas aos sete dias de cura a partir do ensaio de
resistência à compressão simples (RCS), resistência à tração por compressão diametral
(RTCD), resistência à tração na flexão (RTF), módulo flexural (MF), módulo de elasticidade
(E) e módulo dinâmico (E*) longitudinal, transversal e torcional.

Utilizando a metodologia de moldagem da norma DNIT 181-ME (DNIT, 2018), que


apresenta as condições de compactação de misturas de BGTC em corpo de prova em cilindro

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tripartido, foram moldados os corpos de prova para a determinação da resistência à
compressão simples, módulo de elasticidade e módulo dinâmico. Os corpos de prova foram
moldados em cilindros com 10 cm de diâmetro e 20 cm de altura, em 10 camadas iguais, com
aplicação de 21 golpes por camada, através de um soquete com 4,53kgf, caindo a 45,70 cm,
garantindo uma compactação mínima de 100%. O controle do grau de compactação foi
realizado a partir da relação entre o peso específico aparente seco máximo da amostra
compactada e o peso específico aparente seco máximo determinado no ensaio de compactação
para o teor de cimento analisado.

Na determinação da resistência à tração por compressão diametral, os corpos de prova foram


moldados em cilindros com 10 cm de diâmetro e 6 cm de altura, sendo aplicados 62 golpes
em camada única, por meio de um soquete com massa de 4.540 g e altura de queda livre de
45,72 cm.

A resistência à tração na flexão e o módulo flexural foram determinados utilizando corpos de


prova prismáticos, confeccionados em moldes com dimensões 10x10x40 cm³. A compactação
foi realizada por amassamento, prensagem estática, em três camadas com igual quantidade de
material. Nessa etapa, foram feitas marcações no molde, a fim de dividir sua espessura em
três partes iguais para nortear o processo de compactação. As camadas foram prensadas com
uma força de compressão variável e crescente até que fosse atingida a altura pretendida para
cada camada. Como descrito no Report 789 (NCHRP, 2014), a superfície entre as camadas foi
escarificada até uma profundidade de 0,6 mm para garantir uma boa adesão. Compactada a
última camada, fez-se o acabamento da superfície por um processo conhecido como
rasamento, no qual o material é retirado com o auxílio de uma régua biselada e substituído por
um material mais fino.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
A Tabela 2 apresenta os resultados dos ensaios de resistência à compressão simples (RCS)
após sete dias de cura em câmara úmida.

Tabela 2: Resultados de resistência à compressão simples


Tratamentos RCS (MPa) Média (MPa)
3 % CP-II-F-32 4,73 4,73 4,73
5 % CP-II-F-32 7,91 8,52 8,21
3% CP-IV-32 RS 5,10 5,26 5,18
5% CP-IV-32 RS 10,92 9,47 10,19

Observa-se na Tabela 2 um aumento na resistência à compressão simples (RCS) ao substituir


cimento do tipo CP-II-F-32 pelo CP-IV-32 RS nas misturas de BGTC. Constata-se ainda que
para o teor de 5% (maior teor de cimento estudado) o ganho de resistência à compressão em
decorrência da substituição do cimento se torna mais significativo. A Figura 3 ilustra o
aumento percentual da RCS resultante da substituição do tipo de cimento na mistura.

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Figura 3: Aumento percentual da RCS com a substituição do CP-II pelo CP-IV

A resistência à tração por compressão diametral dos corpos de prova ensaiados é indicada na
Tabela 3, na qual é perceptível uma influência do teor e do tipo de cimento na RTCD.

Tabela 3: Resultados de resistência à tração indireta


Média Intervalo de confiança
Tratamentos RTCD (MPa)
(MPa) (MPa)
3 % CP-II-F-32 0,47 0,42 0,43 0,44 0,48 0,40
5 % CP-II-F-32 1,00 1,06 0,97 1,01 1,11 0,91
3% CP-IV-32 RS 0,65 0,58 0,59 0,61 0,67 0,55
5% CP-IV-32 RS 1,17 1,19 1,30 1,22 1,34 1,10

O crescimento percentual da RTCD em decorrência da substituição do tipo de cimento é


demonstrado na Figura 4, a qual evidencia ganhos superiores a 20%, com crescimento mais
expressivo para menor teor de cimento.

Figura 4: Aumento percentual da RTCD com a substituição do CP-II pelo CP-IV

A resistência à tração também foi avaliada na flexão aos sete dias de cura, por meio de corpos
de prova prismáticos. Observou-se comportamento semelhante ao observado com a RTCD,
com ganho de RTF com a substituição do cimento tipo CP-II pelo CP-IV (Tabela 4). Na
Figura 5 é observado o crescimento percentual de resistência à tração na flexão, com maior
aumento percentual para menores teores de cimento, convergindo para os resultados de
resistência à tração por meio da compressão diametral, ou resistência à tração indireta.

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Tabela 4: Resultados de resistência à tração na flexão
Cimento RTF (MPa) Média (MPa)
3 % CP-II-F-32 - 0,34 0,32 0,33
5 % CP-II-F-32 0,98 0,97 1,03 0,99
3% CP-IV-32 RS 0,46 0,48 0,61 0,52
5% CP-IV-32 RS 1,47 1,28 1,67 1,47

Figura 5: Aumento percentual da RTF com a substituição do CP-II pelo CP-IV

Com base nos resultados, fica evidente que a resistência da BGTC é influenciada pelo tipo de
cimento e teor do ligante na mistura. Essa influência pode ser explicada pelo fato de cada tipo
de cimento possuir uma curva específica de evolução da resistência ao longo do tempo, em
decorrência das diferenças significativas na composição e, consequentemente, nas
características físicas e químicas nos estágios iniciais de hidratação. Porém, era prevista uma
superioridade das propriedades mecânicas do CP-II-F-32 nas primeiras idades de hidratação
do cimento, aos sete dias.

Segundo a NBR 12653 (ABNT, 2014), a interação física e química de materiais pozolânicos
com o cimento Portland modifica a reologia de concretos, argamassas e pastas no estado
fresco e conferem propriedades especiais relacionadas à durabilidade e ao desempenho
mecânico no estado endurecido. Esses materiais reagem com o Ca(OH)2 da hidratação do
cimento, formando silicato de cálcio hidratado (C-S-H) adicional. Quando comparados a
cimento sem uso de materiais pozolânicos ou com menor proporção do material, os cimentos
Portland pozolânicos conferem ao concreto, argamassa e pastas um aumento da resistência à
compressão e à flexão, em idades avançadas, apesar de uma diminuição nas primeiras idades;
redução da porosidade e permeabilidade; aumento da resistência a sulfatos; aumento da
resistividade à difusibilidade de íons cloreto; mitigação da reação álcali-agregado; redução da
ocorrência de eflorescência; e aumento da resistividade elétrica.

No cimento Portland, as resistências iniciais serão altas se o cimento contiver grandes


quantidades de C3S e C3A e apresentarão baixa resistência inicial se o cimento for composto
por uma proporção elevada de C2S. Por outro lado, a resistência final, em idades mais
avançadas, de um cimento rico em C2S deverá ser maior do que a de outro cimento com baixo
teor desse componente mineral (Mehta e Monteiro, 1994). A Tabela 5 apresenta resultados de
resistência à compressão de cimentos brasileiros, em função do tempo de hidratação do
cimento.

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Tabela 5: Resultados de resistência à compressão dos cimentos brasileiros, em função da
idade (IBRACON, 2010)
Tipo de Resultados de resistência à compressão, em MPa, em função da idade
cimento 1 dias 3 dias 7 dias 28 dias 63 dias 91 dias
CP-II-E-32 9,4 22,1 30,5 41,2 44,4 48,9
CP-II-F-32 12,7 26,9 32,4 39,7 42,1 44
CP-II-E-40 - 28,9 37,3 47,2 51,4 56,6
CP-II-Z-32 12,7 24,9 30,5 38,2 40,1 42,6
CP-III-32 6,5 16,3 27,2 41,8 48,4 51,4
CP-III-40 10,5 21,4 33,4 48,2 51,3 56
CP-IV-32 9,6 21,5 28,6 39,9 43,6 46,3
CPV-ARI 24,5 37,4 42,7 48,5 48,8 52,5
CPV-ARI RS 19 33,1 40,2 47,2 49,9 52,4

A Tabela 5 indica que o cimento CP-II-F confere maior resistência à compressão nas
primeiras idades de hidratação do cimento, em comparação ao CP-IV. Todavia, aos 28 dias,
percebe-se maiores resistência no cimento CP-IV. A partir dos resultados obtidos, percebe-se
que para as proporções de cimento, água e agregados utilizados na presente pesquisa, há uma
antecipação da curva de evolução da resistência para o CP-IV.

Além das análises acerca dos parâmetros de resistência, foram adicionados parâmetros
relacionados à deformabilidade da BGTC, determinando os módulos flexural estático, elástico
e dinâmico (longitudinal, transversal e torcional) dos tratamentos analisados. A Tabela 6
apresenta os resultados obtidos.

Tabela 6: Resultados dos ensaios de módulo flexural, de elasticidade e dinâmico


Tratamento MF (MPa) E (GPa) E*long (GPa) E*trans (GPa) E*tor (GPa)
3 % CP-II-F-32 239,65 6,17 19,42 17,93 6,36
5 % CP-II-F-32 573,93 16,20 27,17 27,66 9,33
3% CP-IV-32 RS 688,62 13,54 23,89 23,49 8,26
5% CP-IV-32 RS 1428,66 27,74 32,41 32,22 11,36

A partir dos resultados desses ensaios observa-se que a utilização do CP-IV nas misturas foi
responsável pelo aumento de todos os parâmetros apresentados na Tabela 6, em comparação
às misturas com CP-II.

Apesar de ser possível determinar o módulo de elasticidade da BGTC por meio do seu
comportamento elásticos (E) ou dinâmico (E*), El-Newihy (2013) explica que a vantagem de
usar o módulo dinâmico para monitorar as propriedades de um material cimentado é que ele é
sensível a mudanças dentro do compósito, como rachaduras, adições minerais e porosidade,
que fornecem propriedades cruciais para desempenho do material em serviço. Esse parâmetro
de rigidez é especialmente relevante para análise dinâmica experimental da rigidez de
elementos de concreto submetidos à danificação progressiva até a ruptura (ALMEIDA, 2005).

O ganho de rigidez, observado na Tabela 6, por si só não garante um bom desempenho à


mistura de BGTC com uso do CP-IV. Segundo Bernucci et al. (2006), em estruturas de

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pavimentos é esperado que as misturas apresentem baixa rigidez, a fim de evitar elevada
absorção de tensões que levem ao trincamento prematuro. Por outro lado, espera-se também
alta resistência à tração, pois a maior resistência na ruptura, de modo geral, é também
associada a uma maior resistência à fadiga. Assim, a razão entre o módulo dinâmico e
resistência à tração na flexão pode ser um indicador da vida de fadiga das misturas, pois
agrega informações de rigidez e resistência, sendo melhor quanto menor for tal razão. Na
Tabela 7 observa-se a razão entre os módulos dinâmicos e a resistência à tração na flexão dos
tratamentos avaliados.

Tabela 7: Razão entre módulo dinâmico e RTF


E*long E*trans E*tor
Tratamento
(MPa/MPa) (MPa/MPa) (MPa/MPa)
3 % CP-II-F-32 59165 54626 19376
3% CP-IV-32 RS 46148 45375 15956
5 % CP-II-F-32 27365 27858 9397
5% CP-IV 32 RS 21979 21850 7704

A partir dos valores apresentados na Tabela 7 se observa que a razão entre os módulos obtidos
na forma dinâmica e a resistência a tração na flexão é sempre menor para as misturas com CP-
IV-32 RS, em comparação com as misturas com CP-II-F-32 com mesmos teores de cimento.
Esse resultado sugere que a substituição do CP-II pelo CP-IV em misturas de BGTC poderia
melhorar o comportamento mecânico no que diz respeito à vida de fadiga da mistura. Na
Figura 6 e Figura 7 é possível comparar graficamente a razão entre módulo dinâmico e a RTF
para cada uma das misturas analisadas.

Figura 6: Gráfico percentual da razão entre E* e RTF para cada mistura investigada

Figura 7: Razão entre E* e RTF para cada mistura investigada

A simples substituição do tipo de cimento nas misturas de BGTC, baseada nos ganhos de

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comportamento mecânico observados, não seria racional sem que se avaliasse também o
aspecto econômico. A disponibilidade do tipo de cimento varia conforme a região. Em
Aracaju, Sergipe, o cimento CP-II-F-32 é encontrado com facilidade no comércio local, com
preço médio do saco com 50 kg custando em torno de R$ 31,00 (trinta e um reais), enquanto o
CP-IV-32 RS não é de fácil aquisição na região, podendo ser adquirido nos Estados vizinhos
com custo adicional do deslocamento da mercadoria. Já em Alagoas, o saco com 50 kg do
cimento tipo CP-IV-32 RS pode ser encontrado por R$ 28,00 (vinte e oito reais) e o cimento
CP-II-F-32 tem um custo médio de R$ 30,00 (trinta reais). Portanto, a viabilidade econômica
depende de uma avaliação particular de cada caso, levando em consideração as especificações
do projeto, as vantagens em termos de comportamento mecânico, o teor de cimento utilizado,
a espessura da camada, a extensão da via, além do valor e disponibilidade de cada tipo de
cimento na região de interesse.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A substituição do cimento do tipo CP-II-F-32 pelo CP-IV-32 RS resultou em ganhos nos
parâmetros mecânicos, com aumento da resistência e valores de módulos elásticos, seja pelos
métodos de obtenção estáticos ou dinâmicos, demonstrando a influência do tipo de cimento
nessas propriedades.

Para um teor de 3% de cimento, foi constatado um aumento de 9,51% de RCS, 38,64% de


RTCD e 57,58% de RTF ao utilizar o CP-IV nas misturas de BGTC, em comparação às
misturas com CP-II. Com 5% de cimento a RCS, RTCD e RTF das misturas com CP-IV
foram 24,12%, 20,79% e 48,48% superiores, respectivamente.

No que diz respeito aos parâmetros de deformabilidade (módulos obtidos estaticamente ou


dinamicamente), foi observado que a substituição do CP-II pelo CP-IV resulta em um
crescimento do módulo flexural, elástico e dinâmico, demonstrando maior rigidez das
misturas com CP-IV. Entretanto, é importante destacar que as razões entre os módulos
dinâmicos e a RTF das misturas, que pode fornecer um indicador qualitativo de melhor
desempenho à fadiga dos materiais, sinalizaram um provável desempenho superior das
misturas com CP-IV.

Desse modo, os resultados indicam que o CP-IV-32 RS pode ser uma boa solução em
misturas de BGTC, proporcionando melhor desempenho do material enquanto camada de
pavimento. Vale ressaltar, que é necessário um estudo mais aprofundado dessas misturas,
analisando quantitativamente a vida de fadiga e o comportamento da BGTC para tempos de
cura superiores ao analisado nessa pesquisa, a fim de melhor avaliar a viabilidade técnica e
econômica do uso do CP-IV em misturas de brita graduada tratada com cimento.

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Verônica Janaína Melo Barreto Nunes (vjanainamelo@academico.ufs.br)


Fernando Silva Albuquerque (albuquerque.f.s@academico.ufs.br)
Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, Universidade Federal de Sergipe
Av. Marechal Rondon, s/n – Jardim Rosa Elze, São Cristóvão – SE

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