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DOM Casmurro si fude aliás isso é um roteiro de teatro

Elementos de Lingüística II (Universidade de São Paulo)

A Studocu não é patrocinada ou endossada por nenhuma faculdade ou universidade


Baixado por Thays Rocha dos Santos (thaysrochadossantos63@gmail.com)
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ATO I

CENA 1

PERSONAGENS EM CENA:
• DOM CASMURRO (NARRADOR)
• DONA GLÓRIA;
• TIO COSME;
• JOSÉ DIAS;
• PRIMA JUSTINA;

ALÉM DO BENTINHO QUE VAI FICAR “ESCONDIDO” EM ALGUM CANTO.

DOM CASMURRO (NARRADOR) - Uma noite encontrei no trem um rapaz, que recitou uns
versos dele. Eu estava cansado, cochilei umas três ou quatro vezes. Ele ficou chateado e no dia
seguinte começou a me chamar de “Dom Casmurro”. Hoje muita gente me chama assim. O
“Dom” veio por ironia, para me atribuir algo de nobre, e o “Casmurro” por eu ser um homem
calado e pensativo (ri). Tudo por estar cochilando! Sem querer o poeta do trem deu um nome
para esta história que eu vou apresentar para vocês. Prazer, meu nome é Bento Santiago. (Tira o
chapéu e faz uma reverência para a platéia)
(Dom Casmurro chama os personagens, que a medida que estes vão sendo apresentados,
se sentam em uma mesa, que estará disposta no centro do palco).

DOM CASMURRO (NARRADOR): Esta é a Prima Justina (Prima Justina entra em cena e se
senta em um cadeira). ela diz na cara da pessoa tudo que pensa, e pelas costas também. Vive
procurando defeito nos outros. Já passou dos quarenta faz tempo e desde que ficou viúva vive
aqui de favor. Esta é Dona Glória, minha mãe, (Dona Glória entra em cena e se senta à mesa),
tem 42 anos mas está bem conservada, como vocês podem ver. Este é o Tio Cosme (Tio Cosme
entra em cena e se senta à mesa) é advogado, trabalha no crime, suas defesas orais são
perfeitas, mas parece estar sempre com sono. É viúvo também. Esta é a casa dos três viúvos. E
este (Bento balança a cabeça com saudade), este é o José Dias (entra em cena, porém não
se senta à mesa, ficando ao lado de Dona Glória): chegou aqui em casa fingindo-se de médico
e se agregou até hoje, e tio Cosme tem ele como secretário. Primeiro ele foi contra o meu
casamento com Capitu. Estamos em 1857, na minha casa da rua de Matacavalos. Este rapaz
aqui, sou eu (Bentinho entra em cena se escondendo atrás de alguma coisa, pois está
ouvindo a conversa dos parentes). Capitu é minha vizinha, que, futuramente, vai se tornar
minha esposa. (dirige-se para a platéia) Não estranhem: eu ainda não morri. (abre os braços
se dirigindo diretamente para a platéia) Um dia vocês também ficarão velhos como eu e
imersos em nostalgia e amargura! (fala em um tom um pouco mais exaltado). Estas são
minhas memórias (volta ao tom de narração calmo). Quero recapitular minha vida. Mas chega
de enrolação, vamos mergulhar na minha agridoce juventude.

(senta-se na platéia ou no palco, e observa atentamente o elenco atuar)

JOSÉ DIAS - Dona Glória, se quer colocar nosso Bentinho no seminário, já está passando da
hora e pode haver dificuldade.

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GLÓRIA - Que dificuldade?

JOSÉ DIAS - Uma grande dificuldade (olha ao redor, para ver se tem alguém escutando.
Volta e confidencia) Os nossos vizinhos...

GLÓRIA - Nossos vizinhos? A família do Pádua?

JUSTINA - Sempre achei que havia algo de errado com essa gente.

COSME - (lendo o jornal) Justina, faça-me o favor! Qual a sua implicância com o Pádua, José
Dias?

JOSÉ DIAS - Há algum tempo eu estou para dizer isto: Bentinho anda apaixonado pela filha do
Pádua, a Capitolina.

JUSTINA - Eu sabia! Sabia que aquela menina não ia dar para boa coisa. Aqueles olhinhos dela
nunca, nunca me enganaram. Aquele jeitinho dela de...de...

COSME - Oblíqua e dissimulada (completa a frase de Justina). E Você não se cansa de ficar
falando mal dos outros?

JUSTINA - Capitu não presta, tão jovem e já é uma dissimulada. Ela se finge de boazinha, para
dar o golpe porque Bentinho é rico e ela é pobre. A verdade é essa. O pai está passando por
dificuldades financeiras e é um vagabundo. Aquela menina tem sangue ruim. Eu não confio nela.

COSME - Justina, por favor, economize seu verbo. (volta-se para o jornal, desinteressado da
conversa)

GLÓRIA- Mas eles só amigos de infância. Bentinho quer ser padre, e há de ser!

JOSÉ DIAS - Os dois vivem de segredinhos, pelos cantos, sempre juntos. Bentinho quase não
sai de lá!

JUSTINA - E a menina é uma desmiolada...

JOSÉ DIAS - E a família dela? Pior ainda, finge que não vê.

JUSTINA - Quer que a filha engravide, provavelmente. Imagine se o neto sair igual ao pai dela:
baixo, gordo, pernas e braços curtos, parece uma tartaruga.

GLÓRIA - (repreende Justina, porém ri) Justina!

JOSÉ DIAS – Dona Glória, para a senhora todos parecem bons...

GLÓRIA - Tenho visto os dois brincando e nunca vi nada que tenha me deixado desconfiada.

JUSTINA - Bentinho tem 15 anos, Capitu completou 14 a semana passada ...

GLÓRIA - São crianças. Não acha, Cosme?


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COSME - Eles são amigos de infância. O que há de errado nisso? José Dias, deixe de loucura!

JOSÉ DIAS - Creia que eu não falei senão depois de muito analisar.

GLÓRIA - Meu filho vai ser padre. Eu fiz uma promessa antes dele nascer. A ida dele para o
seminário já está acertada.

COSME - Olhe, Glória, há mesmo necessidade de colocar o menino no meio dos padres? Você
não precisa cumprir uma promessa desse tipo.

GLÓRIA - Se eu não tivesse feito a promessa (faz um gesto emocionado), talvez ele nem
tivesse nascido.

JUSTINA - Calma, calma. Nós vamos dar um jeito nisso. Não se preocupe.

(Um por um, os personagens saem da cena)

(Bentinho sai correndo do lugar em que estava escondido, indo contar tudo para Capitu)

ATO II

CENA 2

PERSONAGENS EM CENA:
• DOM CASMURRO (NARRADOR);
• BENTINHO (JOVEM)
• CAPITU (JOVEM)

(Aparece Capitu. Dom Casmurro levanta-se e diz para a platéia)

DOM CASMURRO (NARRADOR) - Esta é Capitu: Minha primeira namorada, minha esposa e
mãe do menino que eu pensei que era meu filho.

(Capitu está no palco. Bentinho vai ao encontro de Capitu)

BENTINHO – Capitu! Capitu! Eu tenho uma coisa para lhe contar.

CAPITU - Hoje você está mais bonito do que nunca. Que cabelos lindos.

BENTINHO – Pare com isso. O que tenho para lhe falar é muito sério.

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CAPITU - Eu sonhei com você novamente esta noite, estávamos dançando na lua...E apareciam
uns anjos que perguntavam nossos nomes para dar a outros anjos que acabavam de nascer.

(pega nas mãos dele. Senta-se em uma cadeira e entrega para Bento uma escova e ele
começa a pentear-lhe os cabelos).

DOM CASMURRO (NARRADOR) - Eu acordava pensando em Capitu, tremia quando ouvia seus
passos, até na missa eu só pensava nela.

CAPITU - Vamos ver o grande cabeleireiro (ela se vira para ele e o abraça)
(Enquanto Bentinho penteia seus cabelos)

CAPITU - Você disse que ia me contar alguma novidade. O que te aflige tanto?

BENTINHO - É sobre a minha ida para o seminário.

(Capitu vira o rosto para Bentinho e se levanta, com raiva)

CAPITU - Não quero nem saber! Já pensou você ...um padre? Rezando missa? Não dá para
acreditar. E eu? Onde é que eu fico nessa história?

BENTINHO - José Dias disse a mamãe que estamos namorando, e que isso pode atrapalhar
minha carreira de padre.

CAPITU – (ri e zombando, imitando um padre) Não entre para o convento, meu filho. Case e
gere mais um pecador. E para purgar seus pecados reze mil ave-marias!

BENTO - Capitu! Já está tudo combinado. O que eu posso fazer?

CAPITU - Covarde! É o que você é. Um covarde grudado na mãezinha! Só agradar sua mãe é o
que interessa, não é? Pois se é assim, é melhor mesmo que a gente nunca mais se veja! Eu juro.
Nunca mais vou olhar sua cara. Seu falso! Eu lhe dou o melhor que eu tenho e você? Hein? Você
o que dá em troca? Hein? Você...

BENTINHO – Fique calma. Vou demorar só dois ou três anos ...

CAPITU - Não vou gastar minha juventude esperando você. Ah, isso não. Cansei de
ficar esperando, Bentinho.

BENTINHO - Mas preciso ir para o seminário pela minha mãe, a promessa que ela fez, você
sabe...

CAPITU - Ela nem se lembrava mais. Você é quem fica insistindo. Parece que é doido.

BENTO - Foi José Dias.

CAPITU - Aquele pobre agregado. Ele nunca foi com a minha cara.

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BENTO - É como se fosse da família. Além do mais, tem a Prima Justina que vive lembrando a
promessa que mamãe fez e o Tio Cosme, esse nem tanto, mas a Prima Justina, meu Deus, que
mulher insuportável!

CAPITU - Uma "promessazinha" feita num momento de desespero!

BENTO - Não é bem assim. Minha mãe tinha perdido um filho e não tinha esperanças de ter
outro. Estava doente...
CAPITU - Aí ela fez uma promessa para você cumprir, sei.

BENTO - Prometeu entregar um padre ao mundo.

CAPITU - E o agregado José Dias, que é que ele acha disto tudo?

BENTO - Vou pedir a ele para tentar convencer mamãe de que eu não tenho vocação religiosa.

CAPITU - A troco de quê?

BENTO – Vou dizer a ele que quero estudar direito na Europa, ele adoraria me acompanhar, você
sabe como ele é. Mamãe pagaria tudo.

CAPITU – E ...(bem dramática e chantagista) se eu... morrer? De saudades talvez... ou de


alguma doença.

BENTO - Nem assim eu colocaria alguém no seu lugar...

CAPITU - Nem a Sancha?

BENTO – Sancha? (ri) Capitu: Eu não tenho o menor interesse pela sua colega de escola. Não
me diga que você tem ciúmes de mim com aquela menina?!

CAPITU - Pois tenho mesmo. Vejo você de conversinhas com ela...

BENTO - Nada disso. Cada minuto que eu passar no convento será pensando em você.

CAPITU - Depois das surras que você vai levar, você vai me esquecer, certeza.

BENTO - Surras? Que surras?

CAPITU - Dizem que os padres aplicam castigos para os que profanam os sagrados
mandamentos. Se eu fosse rica, tenho certeza de que fugiria comigo para a Europa.
BENTO – E se eu confessar que não tenho vocação para ser padre?

CAPITU – Só isso não vai adiantar nada. Quando for falar com ele, fale sem medo, demonstre
que quer ser o futuro senhor dessa casa. Lhe faça elogios, ele gosta muito de ser bajulado.
Lembre que ele serve Dona Glória, mas também serve o filho da dona da casa.
BENTO – Não acho, Capitu.

CAPITU – Então vá para o seminário. É isso que você quer mesmo!


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BENTINHO – Isso não.


CAPITU – Você sabe que basta ser da vontade de José Dias que ele faz um discurso para
convencer sua mãe. Olhe, diga que está pronto para estudar direito.
BENTINHO – Capitu, dizem que ainda não temos idade para nos casar, mas dois ou três anos
passam depressa. Você jura uma coisa? Jura que só vai casar comigo?
CAPITU – Juro. Ainda que você case com outra, cumprirei meu juramento.

BENTINHO — Também juro! Vamos nos casar, haja o que houver.


(Bentinho e Capitu dão as mãos)

CENA 2

• PRIMA JUSTINA ENTRA EM CENA

JUSTINA – Bentinho! (resmunga) Ah, meu Deus lá estão aqueles dois se agarrando de novo.
Isso não vai acabar bem. Bento Santiago!

BENTINHO - Já vou, prima!

JUSTINA - Mas o quê? Não sabe que têm obrigações para cumprir? E além disso, já está bem
grandinho para ficar de namorinho no quintal. E tu, Capitu, pensa que não te vejo? Te vejo e
muito bem! Não penses que me engana, não! Estou de olhos bem abertos! (Abre um olho com a
ponta do dedo indicador)

BENTINHO - Então nos vemos depois...

CAPITU - Sim! Escreva para mim. Até logo, Bentinho, Dona Justina!
(CAPITU SAI DE CENA. FICAM SÓ BENTINHO E PRIMA JUSTINA NO PALCO)

BENTINHO – Prima Justina, posso lhe pedir um favor?

JUSTINA – Diga, o que é?


BENTINHO – Suponhamos que eu não queira ser padre e ...

JUSTINA – (INTERROMPE A FALA DE BENTINHO) Isso não. Prima Glória já tem essa ideia a
muito tempo, e nada nesse mundo fará ela mudar de ideia. Se ela me pedir opinião algum dia
darei minha resposta, mas não vou falar com ela sem ser chamada, isso eu não faço

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ATO III

CENA 1

PERSONAGENS EM CENA:

• Bentinho;
• José Dias;
• Tio Cosme;
• Prima Justina;
• Dona Glória

BENTO - José Dias, o senhor só quer a minha felicidade, não é?

JOSÉ DIAS - Sim, meu filho. Devo muitos favores a sua família. Gostava muito do seu pai, tenho
você como um filho.

BENTO - Então, posso lhe pedir um favor?

JOSÉ DIAS - Um favor? Ordene, o que é?

BENTINHO - Mamãe...

JOSÉ DIAS - O que tem sua mãe?

BENTINHO - Mamãe quer que eu seja padre, mas eu não posso ser padre. Não posso, não tenho
jeito, não gosto da vida de padre. Estou pronto para o que ela quiser. Mamãe sabe que eu faço
tudo que ela manda. Estou pronto para ser o que for que ela quiser, até condutor de ônibus.
Padre não, não posso ser padre. A carreira é bonita mas não é para mim. Conto como senhor
para me salvar.

JOSÉ DIAS - Mas o que posso eu fazer?

BENTINHO - Se o senhor quiser, pode me ajudar. Todos lá em casa dizem que você é uma
pessoa maravilhosa...

JOSÉ DIAS – Não faço mais do que minha obrigação (faz um gesto lisonjeado). Se eu quiser?
Mas que outra coisa eu quero, senão te servir?

BENTINHO - Estou pronto para tudo, se ela quiser que eu estude leis vou para a Europa ou São
Paulo.

JOSÉ DIAS - Para te provar que não há falta de vontade, irei falar com sua mãe. Não prometo
vencer, mas lutar. Pode ir para Pernambuco, São Paulo. Mas, de fato, podemos ir mais longe!
(tem uma ideia). Por que você não pede para estudar na Europa? Eu podia ir junto, para tomar

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conta de você. As leis são lindas (fala isso com ar sonhador) Estamos a bordo! A Europa nos
espera!

CENA 2

(Entra tio Cosme)

COSME - José Dias, você podia me arrumar um pouco de remédio para o fígado? Acho que
exagerei no vinho ontem.

JOSÉ DIAS - Claro meu senhor, claro. Isso me faz lembrar de quando cheguei a esta casa. Eu
era um charlatão. Mas graças ao meu bom Jesus me recuperei daquela farsa que tive de inventar
para sobreviver. Mas a verdade é que às vezes meus remédios funcionam muito bem.

(Tio Cosme se senta em uma cadeira)

JUSTINA – (entrando e ajeitando a toalha da mesa) Vocês dois não param de falar. Que coisa.
Onde está a Glória?

JOSÉ DIAS - Dona Glória está no seu quarto.

(Dona Glória entra em cena)

GLÓRIA - Você tem comido tão pouco, meu filho. Está se sentindo mal?

BENTINHO - Não tenho fome. E não sou mais nenhuma criança.

GLÓRIA - Que isto não lhe impeça de comer. Não fique triste, Bentinho, você vai ter uma bela
carreira religiosa.

BENTINHO - Não tenho vocação.

GLÓRIA - Vocação vem com o tempo. Temos que cumprir a promessa, devemos fazê-lo padre.
Prometi um padre a Deus.

JOSÉ DIAS - Nem o Papa faria a senhora esquecer esta promessa, Dona Glória?

GLÓRIA - Mas o Papa nunca viria a esta casa.

JOSÉ DIAS - Um sacerdócio sem vocação não é bom.

GLÓRIA - Há de se comprovar a vocação do meu filho. Adorava missa quando era pequeno.

BENTINHO - Coisas de criança, mamãe. Vou de rezar mil padre-nossos e mil ave-marias,
pedindo a Deus que me livre de ser padre.

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GLÓRIA - Pare de falar besteira, menino!

BENTINHO - Mesmo contra minha vontade, o que a senhora quiser que eu faça, eu farei,
mamãe. (Bentinho diz, cabisbaixo)

JUSTINA - Vamos apressar o jantar, Glória.

(Saem de cena)

CENA 3

COSME - Bentinho, você não quer ir para o convento por causa de Capitu, não é?

BENTINHO - O que o senhor acha de Capitu?

COSME - Acho que ela daria uma boa esposa... no futuro. E você, José Dias?

JOSÉ DIAS - Quer a verdade?

COSME – Por favor, José Dias.


JOSÉ DIAS - Ela tem os olhos oblíquos... dissimulados...

BENTINHO - Para mim parecem olhos de ressaca, de quando o mar bate na praia... uma força
que arrasta tudo para dentro. Eu estou apaixonado. Sim!

COSME - Para tudo tem um jeito. Se não tem vocação, é melhor que não seja padre.
(Entram Glória e Justina)

CENA 4

GLÓRIA - Por que a conversa parou quando entramos?

BENTINHO - Nada, mamãe. Nada mesmo.

COSME - José Dias, fiel secretário, amanhã temos audiência no tribunal.

JOSÉ DIAS – Sim, senhor! Adoro ser lhe útil, tira-me o peso de ser um agregado.

GLÓRIA – Deixe de formalidades, você é como um parente.

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JOSÉ DIAS - Obrigado! Me sinto lisonjeadíssimo.

BENTO - Mamãe, posso ir para o meu quarto?

GLÓRIA - Sim, meu filho. E faça sua malas. Amanhã vai para o seminário.
BENTINHO – Mas, mamãe ...

TIO COSME – Estou certo que você vai aprender a ter vocação pra ser padre. Vá por um ano, se
perceber que não gosta da carreira, é porque Deus não quer. Nesse caso, o melhor caminho é
estudar leis, assim como eu.
DONA GLÓRIA – Vá, meu filho! E volte papa. (tom emocionado)

(TODOS OS PERSONAGENS SAEM DE CENA, DEIXANDO SOMENTE BENTINHO E JOSÉ


DIAS NO PALCO)
JOSÉ DIAS – Aguente um ano, até lá tudo estará pronto para o seu retorno. (coloca a mão no
ombro de Bentinho, consolando-o)

ATO IV

CENA 1

PERSONAGENS EM CENA:
• DOM CASMURRO NARRADOR;
• BENTINHO JOVEM;
• ESCOBAR

(Bentinho está ajoelhado junto de Escobar, onde fingem rezar, já no seminário)


ESCOBAR – Para entrar neste seminário, deixei meu pai e minha irmã e meu pai em Curitiba.
Meu pai é advogado, mas é muito religioso e quer que eu seja padre. Tenho também uma irmã
mais nova, que é um anjo! Não só na beleza, mas na bondade! E você, caro amigo, deixou
alguém esperando lá fora?
BENTINHO – Uma pessoa? Meu coração não pertence a Deus, ele já foi conquistado pela
criatura mais bela de todo esse mundo: A Capitu. Quero sair daqui o mais rápido possível para
me casar com ela.
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ESCOBAR – Meu amigo, seu caso é realmente sério, mais como você pretende convencer sua
família a deixá-lo sair daqui?

BENTINHO – Na ultima vez que José Dias me escreveu, me prometeu que sairia daqui direto
para a faculdade de direto. Mas não sei se posso confiar nele.

ESCOBAR – Já sei! É simples Bentinho! Sua mãe fez promessa de dar a Deus um sacerdote,
não é? Pois bem, um sacerdote que não seja você. Ela pode adotar algum mocinho órfão e tornar
ele padre. Eu também não quero ser padre. Quero ser comerciante, isso é o que eu quero.

BENTINHO – Sim, é isso!

ESCOBAR – Saímos juntos! Você para os braços de sua Capitu, e eu para o mundo do comércio.
(SE BENZEM E SAEM DE CENA)

CENA 2

DOM CASMURRO (NARRADOR) - (vai para o centro do palco) Eis aqui outro seminarista:
Ezequiel de Souza Escobar. Ele era dessas pessoas que não olha dentro do olho de ninguém,
não fala claro nem seguido. Dá aquele tipo de aperto de mão que mal toca a outra, desconfiado.
Vocês conhecem gente assim, não conhecem? Outra coisa: ele tinha um sorriso instantâneo. E
gostava de nadar (risada irônica). Naquela época eu ainda não era “Dom Casmurro”. Minha mãe
hesitou um pouco, mas acabou cedendo. Adotamos um órfão e o encaminhamos ao seminário.
Foi fácil. Lá estou eu aos 17 anos: metade homem, metade menino. A petulância e o atrevimento
estavam no meu sangue. As meninas me achavam lindo. Mas vamos apressar esta história 18,
19, 20, 21. Aos 22 anos, eu já era bacharel em direito e também, noivo de Capitu.

(Dom Casmurro narrador retorna para a plateia/palco)

ATO V (PASSAGEM TEMPORAL DE 5 ANOS)

CENA 1

PERSONAGENS EM CENA
• BENTINHO NARRADOR
• BENTINHO
• DONA GLÓRIA;
• JOSÉ DIAS;
• PRIMA JUSTINA;
• TIO COSME;

DONA GLÓRIA – José Dias, Você tinha razão, o Bentinho nunca seria um bom padre.

JOSÉ DIAS – A profissão não podia ser melhor. Bacharel em direito!


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JUSTINA - Olhe, lá vem ele! (Bento entra em cena)

COSME - O Dr. Bento Santiago!

JOSÉ DIAS - Formado em Direito na Faculdade de São Paulo!

JUSTINA - Parece que foi ontem que era uma criança; agora, um advogado.

COSME - Você está ficando velha, Justina.

GLÓRIA - Meu Deus! Há 5 anos! Estou velha de tanta saudade. Cosme, ele não está a cara do
pai?

COSME - Sim, tem os olhos, o rosto. É o pai, um pouco mais moderno. E diga, Glória: não foi
melhor que ele não quis ser padre? Veja se este menino daria um padre que preste! Venha, me
dê um abraço, meu sobrinho. (Abraçam-se)

BENTO - E como vai o meu substituto? O menino que mamãe adotou para transformá-lo em
padre?

JOSÉ DIAS - Dará um ótimo sacerdote.

GLÓRIA - Se Deus quiser, será ordenado padre.

TODOS - Viva o Dr. Bento Santiago! Viva!

JOSÉ DIAS - Já viram como o tempo passa rápido? Sabe quem se casou com a Sancha?

JUSTINA - O Escobar! Sempre achei que ele tinha olhos cima dela. E pensar que ele já esteve
interessado na sua mãe, Bentinho!

(OS PERSONAGENS PRESENTES RIEM DO COMENTÁRIO)

GLÓRIA – O que é isso, Justina?

JUSTINA - E não foi mesmo?

COSME - Bom menino, o Escobar...

JOSÉ DIAS – É uma pessoa esplêndida! Em 5 anos fez fortuna considerável.

BENTO - E minha noiva?

GLÓRIA - Capitu só quer lhe ver no dia do casamento. Mas não se preocupe. Vocês serão muito
felizes juntos, que orgulho de você, meu filho! (Dona Glória abraça o filho)

CENA 2
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(Todos saem de cena, dando espaço para Dom Casmurro/narrador)

DOM CASMURRO (NARRADOR) - Escobar negociou com café, aproveitando o dinheiro que
mamãe emprestou e ele restituiu logo que pôde e casou-se com Sancha, aquela amiga da minha
esposa. Até prima Justina pensou em se casar novamente! Foi com um tal João da Costa,
também viúvo. Casei em 1865, numa tarde de março. Chovia. Fomos passar nossa lua de mel no
alto da Tijuca.

(Capitu e Bentinho, de braços dados, recém-casados, atravessam o palco)

Pobre mamãe. Acho que ela desconfiava que minha esposa não seria fiel por muito tempo. O céu
recolheu a chuva e acendeu as estrelas. Capitu quis voltar para a cidade. Ela queria que o resto
mundo também soubesse. O tempo ia passando e nós não tínhamos um filho. Escobar e Sancha
tiveram uma filha e colocaram o nome dela Capitolina, em homenagem à minha esposa. Algum
tempo depois Capitu engravidou. Eu agradeci à Deus. E coloquei o nome do meu filho o mesmo
de Escobar: Ezequiel. Não sabia os infortúnios que esse nome me trariam.

ATO VI

CENA 1

PERSONAGENS EM CENA:
• CAPITU;
• SANCHA;
• BENTO

(Capitu e Sancha conversam à mesa)

CAPITU - Pois eu morria de inveja de você, Sancha. Você e o Escobar, tão felizes, levando a
filhinha ao passeio. Mas finalmente Deus me abençoou e agora eu tenho o meu filhinho, que já
está com 5 anos. (Ri) Ah! Foi uma alegria para o Bento. O Ezequiel está impossível! Sancha, nem
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te conto.

CAPITU - Olhe Sancha, eu não queria nem falar. Mas como você é minha amiga, vou contar: É o
Bento. Ele anda muito esquisito!

SANCHA - Como assim?

CAPITU - Você sabe que o nosso filho Ezequiel tem mania de imitar os outros.

SANCHA - Coisa de criança.

CAPITU - Pois é, mas Bento já cismou de gritar com o menino, por imitar tão bem o Escobar...

SANCHA - Por isso é que você acha que ele está esquisito? Ora, vai ver que ele está ocupado...
nervoso, porque está trabalhando muito, Capitu. Deve ser isso.

CAPITU - Não sei, não. Ele já não é mais o mesmo. Me trata com desconfiança.

SANCHA - Você está exagerando, Capitu.

CAPITU - Se as casas dos casais fossem como as pirâmides, resistindo ao tempo... (TOM
DRAMÁTICO)

SANCHA - Bento diz que você é um anjo.

CAPITU - Mas ele tem ciúmes até do próprio reflexo!

(Sancha olha para o relógio, interrompendo o assunto)

SANCHA - Como o Escobar está demorando, não? Já estou preocupada.

CAPITU – Se acalme, não é nada. Como vai a Capituzinha?

SANCHA - Ah, nem te conto! Uma gracinha! Faladeira e curiosa. O Escobar pensa em casá-la
com seu filho! (ri). Mas mudando de assunto, esta demora de Escobar está me inquietando. Vou
embora. Se ele aparecer diga que o espero para o almoço.

CAPITU - Aonde ele foi?

SANCHA - Inventou de nadar. Um velho hábito dele. Pelo menos está acostumado, é bom
nadador, mas o mar está tão agitado...

CAPITU – Talvez ele já esteja em casa, Sancha!

SANCHA - Mas marcamos de nos encontrar, precisávamos ir às compras.

CAPITU - Vou mandar um empregado acompanhar você.

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(SANCHA SAI DE CENA COM UM EMPREGADO/FIGURANTE)

(Entra Bento, pensativo, que se senta na cadeira desocupada)

CENA 2

BENTO - Não pode ser... Eu não quero acreditar... ela não teria sido capaz, nem ele. (senta-se e
coloca as mãos na cabeça)

CAPITU – Bentinho! Sancha acabou de sair daqui e...

BENTO - Você notou como mamãe tem tratado você ultimamente? E a indiferença ela vem
tratando o nosso filho Ezequiel?

CAPITU - Talvez ela esteja doente.

BENTO - Não seria motivo. E ela vem tratando mal também o Escobar. Há algo de estranho
nisso.

CAPITU - De que você está falando?

(Sancha entra em cena, com expressão de desespero)

CENA 3

SANCHA – Escobar...

CAPITU - O que é que tem o Escobar? O que aconteceu?

SANCHA - Ele...as ondas... estava nadando...quase não conseguiram retirar o corpo


do...mar...meu marido. Eu não acredito...morreu afogado. Escobar... Ai meu Deus... Não! Não!
Meu marido está morto!

(Sancha se ajoelha e começa a chorar. Capitu e Bento a consolam, saindo de cena)

DOM CASMURRO NARRADOR - Sempre gostei muito de teatro. Mas o velório de Escobar me
deu náuseas. O jeito que Capitu chorou. O interesse. Os olhos de ressaca perdidos, distantes.
Lembro de uma história chamada ”Otelo”, em que o marido mata a esposa por ciúmes, mas ela
era inocente. Capitu? (Ri amargamente). Capitu era culpada. Uma noite voltei e encontrei
Escobar na minha casa. Lembrei de Ezequiel: era em tudo parecido com ele. Os gestos, o
corpo...

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CENA 4

PERSONAGENS EM CENA:

• Ezequiel;
• Bento Santiago;
• Capitu

BENTO – Meu filho, já tomou café?


EZEQUIEL – Já, papai. Vou até a estação com mamãe.

BENTO – Tome mais um pouco! Só mais um gole (BENTO ENTREGA A XÍCARA/COPO/TAÇA


PARA EZEQUIEL)

EZEQUIEL – (FAZ A MENÇÃO DE TOMAR A BEBIDA)


(BENTO DERRUBA O COPO DA MÃO DE EZEQUIEL)

EZEQUIEL – O que houve, papai?


(CAPITU ENTRA EM CENA)

CAPITU – Ezequiel, filho! Vamos levar Sancha e Capituzinha na estação e (É INTERROMPIDA


PELOS GRITOS DE BENTO)

BENTO – NÃO! EU NÃO SOU TEU PAI!


CAPITU – Ezequiel, vá me esperar na sala (EZEQUIEL SAI DE CENA. CAPITU SE DIRIGE A
BENTO). EXPLIQUE O QUE EU ACABEI DE OUVIR!

BENTO - Você é inocente, Capitu?

CAPITU - O que você tem? Você está me assustando!

BENTO – Esse menino não é meu filho e, por isso, talvez seja necessário que algum de nós
morra.

CAPITU — Pare com isso, pelo amor de Deus!

BENTO – Falo sério: Comprei veneno, coloquei no café, não tive coragem de tomar.

CAPITU - Você pensou em se envenenar? Está louco?

BENTO — Ezequiel entrou na hora em que eu ia beber o veneno. Eu já estava me despedindo do


mundo. Tentei dar o veneno para o seu filho.

CAPITU — Eu não acredito (chora) O que houve? Você está louco? Queria matar nosso filho
(grita). O que é que está acontecendo?
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BENTO — O que está acontecendo? Você ainda pergunta? Não lhe parece óbvio demais? Eu
descobri tudo, Capitu.

CAPITU — Do que você está falando? Me explique!

BENTO — Não negue, Capitu. Eu já descobri tudo. (diz friamente)

CAPITU — Não estou entendendo.

BENTO — Pois eu vou explicar: esta criança que eu crio como filho não é meu filho. Ezequiel é
filho do Escobar. Não é do meu sangue!

CAPITU — O quê?

BENTO — Quando ele foi gerado? É o que eu me pergunto. Quando? Minha mãe bem que
desconfiava. Acabemos com isso, o garoto é a cara do Escobar! Eu que fui tão amigo dele. Como
vocês tiveram coragem?

CAPITU — Diga logo tudo, depois do que eu ouvi, posso muito bem ouvir o resto. Que é que lhe
deu esta certeza? Ande, Bentinho. Fale! Fale! Termine nosso casamento aqui, agora, mas me
diga tudo primeiro!

BENTO — Tem coisas que não se dizem.

CAPITU — Que não se dizem só a metade! Mas já que disse metade diga tudo, conte o resto
para que eu me defenda! Eu lhe peço desde já nossa separação, não posso mais!

BENTO — Nossa separação já é coisa decidida.

CAPITU — (Ri) Eu? Com o Escobar? Você tem ciúmes de um defunto? Acha que seu filho se
parece com seu melhor amigo... Foi Deus quem quis assim... Não acredita na vontade de Deus?!
É melhor que eu não diga mais nada. (Abaixa a cabeça e levanta-a transfigurada) Estou às
suas ordens.

BENTO — Você vai para a Suíça. Lá o menino será educado. Tenho dinheiro para isso.
Levaremos uma professora para ele daqui, do Brasil, lá ele aprenderá o resto. Eu estou pensando
em tudo. Visitarei vocês de vez em quando. Fingiremos que estamos casados, para os daqui.

CAPITU — Um casamento de aparências. É isso que me resta? (Vai até Bento. Tenta pegar na
sua mão. Ele a rejeita. Capitu sai, triste)

(Batem na porta. José Dias entra em cena)

CENA 5

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JOSÉ DIAS — Boa tarde, meu jovem. A notícia que trago não é boa. (diz, tristemente)

BENTO — Parece que uma desgraça vai abrindo as portas para outras desgraças.

JOSÉ DIAS — Sua mãe...

BENTO — Está morta?

JOSÉ DIAS — Está morta.

BENTO — A tristeza a levou... Ela sabia de tudo... ela desconfiou primeiro.

JOSÉ DIAS — Eu pensava que ia morrer antes, vejam como são as coisas...

BENTO - E o tio Cosme e a prima Justina? Como receberam a notícia?

JOSÉ DIAS - O Cosme está "naquela", não é meu filho? A Justina eu não sei, não tivemos tempo
nem de encomendar o velório da sua mãe ainda, tive que avisar você primeiro e decidi vir
pessoalmente...

BENTO - Cuidarei de tudo.

JOSÉ DIAS - Ela nos deixou a todos órfãos...

BENTO - Quero que se inscreva na lápide de minha mãe o seguinte: "Uma santa".

JOSÉ DIAS — "Uma Santa". Eram muitas as virtudes que ela possuía na vida, inclusive a
modéstia, por isso não ficaria bem colocar o nome da sua mãe na lápide.

BENTO – Muito obrigado, José Dias. Aliás, estamos planejando levar o Ezequiel para estudar na
Suíça, lá ele ficará com a mãe dele durante alguns anos. Você gostaria de visitar a Europa?
Lembro que você queria muito na época em que eu estava no seminário. Lembra?

JOSÉ DIAS - A Europa que eu vou agora é outra, meu filho.

BENTO - Você pode pelo menos me ajudar no escritório.

JOSÉ DIAS – Não mude de assunto, meu filho. Eu sei que está tentando aliviar sua tristeza.
BENTO - Estou tentando entender a dor, vou me ocupar bastante para afogá-la no fundo do
peito. Vamos. Vamos fazer o que tem de ser feito... (saem de cena)

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ATO VII

CENA 1

PERSONAGENS EM CENA:
• DOM CASMURRO NARRADOR;
• EZEQUIEL

DOM CASMURRO (NARRADOR) – Capitu seguiu para a Suíça junto de Ezequiel. José Dias
morreu alguns anos depois, após uma agonia curta. O céu estava lindo e ele pediu que
abríssemos a janela. Olhou para fora e disse “Lindíssimo!”. Foi a última palavra que proferiu neste
mundo. Chorei por ele. Prima Justina, antes de morrer quis ver Ezequiel, mas não teve o gosto de
confirmar suas suspeitas: faleceu antes. (Ezequiel entra no palco). Esse é Ezequiel, que durante
alguns anos pensei ser meu filho. Vejam se ele não é a cara do Escobar? E agora adulto então...
Juro eu preferia que este menino tivesse morrido também. Por mim ele podia pegar lepra.

(EZEQUIEL ESTÁ SENTADO A MESA, ESPERANDO. O DOM CASMURRO (NARRADOR)


DEIXA DE NARRAR E ENTRA EM CENA PARA ATUAR, AGORA COMO O BENTO
SANTIAGO VELHO)

CENA 2

EZEQUIEL - (Se levanta para abraçar o pai). Boa tarde, papai. Como vai o senhor?

BENTO – Estou bem. Chegou quando ao Brasil? Resolveu me fazer uma surpresa?

EZEQUIEL - Precisava vê-lo. Sua lembrança estava desaparecendo da minha memória, a última
vez que lhe vi eu tinha 6 anos. Mamãe falava tanto no senhor, dizia que era o homem mais puro
do mundo. O mais digno de ser querido. Mesmo depois de velha... ela ainda estava bonita. Deus
a tenha em bom lugar!

EZEQUIEL – Acabei de formar, agora sou arqueólogo. Cheguei agora do Egito. A expedição foi
um sucesso. Estamos partindo depois para a Palestina, promessa feita para umas pessoas.

BENTO - Mulheres?

EZEQUIEL – Nada disso! Estou hospedado na casa de amigos.

BENTO – Precisa de recursos para suas viagens?


EZEQUIEL – Ficaria muito agradecido, meu pai.
BENTO – Sabe de uma coisa, Ezequiel?(Bento se levanta) Eu nunca esqueci sua mãe. Nenhuma
outra mulher tinha os olhos de ressaca como os de Capitu.
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EZEQUIEL - Eu sei, meu pai, eu sei. Nem ela o esqueceu.

(BENTO E EZEQUIEL SE DESPEDEM)

BENTO - Adeus, Ezequiel.

EZEQUIEL – Adeus, papai.

(Ezequiel sai de cena)

CENA 3

DOM CASMURRO NARRADOR - Ezequiel morreu um ano depois daquele encontro. Morreu de
febre tifoide em Jerusalém e lá foi enterrado. Em sua lápide a inscrição tirada do profeta Ezequiel
foi escrita em grego: "Tu eras perfeito nos teus caminhos desde o dia da tua criação". Conheci
outras mulheres depois disso. Nenhuma me fez esquecer a primeira amada do meu coração.
Talvez porque nenhuma tinha os olhos de ressaca, nem os de cigana oblíqua e dissimulada. A
mulher que eu amava e o meu melhor amigo, tão queridos, que o destino os juntou para me
enganar. A terra lhes seja leve! E vamos embora que já está ficando tarde. Obrigado a todos
vocês pela atenção!

FIM

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