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O JULGAMENTO DE

CAPITU
Inspirado no romance Dom Casmurro, Machado de Assis
ELENCO DO JÚRI

Capitolina (ré) -
Dom Casmurro (requerente) –
Advogada de acusação –
Advogada de acusação-
Advogado de acusação-
Advogada de defesa –
Advogada de defesa-
Advogado de defesa-
Promotoria –
Juíza –
Tio Cosme (1ª testemunha de acusação) –
Dona Glória (2ª testemunha de acusação) –
José Dias (3ª testemunha de acusação) –
Sancha (testemunha de defesa) –

ELENCO DE APOIO

Escrivã -
D. Fortunata –
Guarda -

ROTEIRO (Roteiro baseado na obra dom Casmurro, Machado de Assis)


JULGAMENTO DE MARIA CAPITOLINA SANTIAGO

(as personagens que estarão em cena será a promotora, a escrivã e os jurados. As testemunhas estarão na
plateia.) (toque vivo da campainha para iniciar a sessão)

1. FALA DA PROMOTORIA: (promotora levanta-se dando sinal para que todo no recinto façam a
mesma coisa)

- Fiquemos todos de pé para acolher a Excelentíssima Senhora Juíza Queysia Vitória.

(A juíza entra. Faz sinal para que todos se sentem. Senta-se. Todos se sentam)

PROMOTORIA:

- Peço a atenção dos senhores para a chamada dos jurados. Proceda a sra escrivã, à chamada dos jurados. À
medida que forem chamados, os Srs. jurados respondam presente.

2. ESCRIVÃ: nomes dos jurados

3. FALA DA JUÍZA:

- (olha para os jurados e faz sinal para eles levantarem) Levantem-se todos! Após o proferimento das
seguintes palavras, vocês devem responder: ―Assim o prometo!‖

- Srs. Jurados, em nome da lei, concito-vos a examinar esta causa com imparcialidade e a proferir a vossa deci-
são de acordo com a vossa consciência e os ditames da justiça.

JURADOS:

- ―Assim o prometo!‖

(a juíza sinaliza para que eles sentem)


JUÍZA:

-―Será submetido a julgamento o processo nº 148. 217, que o Sr. Bento de Albuquerque Santiago move contra
sua esposa, a Srª Maria Capitolina Santiago, por infração ao art. 250. Secção III, Capítulo II referente aos
crimes contra a segurança da honra. Dos crimes contra a segurança Individual, PARTE TERCEIRA Dos crimes
particulares do Código Penal. O qual julga que ―A mulher casada, que cometer adultério, será punida com a
pena de prisão com trabalho por um a três anos. A mesma pena se imporá neste caso ao adultero.” Declaro
aberta a sessão do Tribunal do Júri. Determino, portanto, o pregão das partes.

4. ENTRADA DE TODOS: ADVOGADOS E DOM CASMURRO (todos entram e se acomodam)

5. ENTRADA DA RÉ:

JUÍZA: - Que entre também a ré.


CAPITOLINA (entra Capitu acompanhada de um guarda)

6. PROMOTORIA:

- Recolham-se as testemunhas a lugar de onde não possam ouvir os debates, nem as respostas umas das outras.
Separadas as de acusação das de defesa. (as testemunhas levantam-se e se retiram para uma sala isolada)
- Chamaremos agora o Sr. Bento Santiago, requerente, para depoimento.

7. DEPOIMENTO DO REQUERENTE:

JUÍZA
BENTO
PROMOTORIA

PROMOTORIA: O senhor jura dizer a verdade, somente a verdade e nada mais que a verdade?
BENTO: Eu juro.

(promotoria faz sinal para que ele se sente)

JUÍZA: Senhor Bento, por favor, conte-nos sobre seu relacionamento com dona Capitolina.
BENTO: Desde criança vivíamos juntos. Meus pais ajudaram a família do Pádua durante a enchente e eles
passaram a morar conosco, na casa ao lado que mais parecia uma extensão da minha. Eu sempre gostei de
Capitu, sempre pensei que o que tínhamos era amizade, até ouvir uma conversa do José Dias. Ele falava que
vivíamos muito próximos e que talvez isso prejudicasse a promessa de minha mãe. Ela prometeu que, se tivesse
um filho saudável, ele seria padre. Foi por causa daquela conversa que comecei a pensar melhor no que sentia
por Capitu, comecei a refletir sobre nossas conversas e percebi que qualquer que fosse o sentimento que eu
tinha por ela, ela também o tinha por mim. Lembro-me de quando me elogiava, por vezes me chamava bonito,
dizia que meus cabelos eram bonitos... Tanto pensei que cheguei a conclusão: Eu amava Capitu. Capitu me
amava. E não há prova maior do que o que foi talhado no muro do quintal: dois nomes, abertos ao prego...

JUÍZA: E como era dona Capitolina?


BENTO: Ahh... E os olhos... ―Vocês já repararam nos olhos dela? São assim de cigana oblíqua e dissimulada‖.
O José dias disse que são olhos dados pelo diabo. Que seja... mas era curiosa, os cabelos feitos duas tranças e
atadas as pontas uma a outra... Eu sempre elogiava seus cabelos... Para mim seus olhos eram de ressaca.
Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se
retira da praia, nos dias de ressaca.
JUÍZA: No início da relação de vocês, você sentia segurança? Ou também suspeitava de traição?
BENTO: Logo no começo eu tinha plena certeza do amor dela, embora... tinha aquele preto que vendia
cocadas... (fala em tom hesitante). Ela sempre se mostrou tão desejosa de mim. Veja, sempre maquinou ideias
para que pudéssemos ficar juntos. Às vezes, me envergonho disso, mas penso que ela era mais dedicada ao
nosso amor do que eu mesmo. Eu, de certa forma, me acomodei a obedecer, ela era mais destemida...
JUÍZA: Como era sua relação com Escobar no seminário?
BENTO: Nós nos tornamos muito amigos. Acho que pelo fato de nenhum dos dois ter vocação para o
sacerdócio. Com o tempo éramos como irmãos. Nas férias ele ia a minha casa. Todos lá gostavam muito dele.
Mamãe amava-o como a um filho.
JUÍZA: Se Escobar era como um irmão, o que te faz pensar que ele te traiu com dona Capitolina?
BENTO: Pela maneira como eles se olhavam. Ela sempre tentava disfarça, como tudo o que fazia, desde
criança era assim, disfarça as coisas com uma naturalidade que eu nunca vi na vida. Lembro-me dos bailes,
como ela gostava de se arrumar, enfeitar-se, e os braços... Ah... Ela gostava de os deixar à mostra e atrair
olhares. Escobar mesmo era um deles.
8. PROMOTORIA:
- Que entre, por favor, a primeira testemunha de acusação: Cosme de Albuquerque, advogado e tio do
requerente.

9. TESTEMUNHA DE ACUSAÇÃO:

PROMOTORIA
A.D: ADVOGADO DE DEFESA
TIO COSME

PROMOTORIA: O senhor jura falar a verdade, somente a verdade e nada mais que a verdade?

COSME: Juro!

(Promotoria sinaliza que ele pode sentar-se. Tio Cosme senta-se)

A.D.: Como você descreve dona Capitolina?


COSME: Ela sempre foi muito bonita, sempre muito esperta. Muito amiga do nosso Bento. Ela quem sempre
inventava as brincadeiras, acho que sempre teve um ar de liderança, ao contrário de Bento. Bentinho sempre foi
mais recatado e do lar. Sempre obediente à mãe. Quando Capitu nos visitava sempre aparentava ser um doce.
Nunca ouvimos reclamações de sua mãe e sempre foi muito carinhosa com mana Glória. Mas sempre foi muito
dissimulada, pois que mesmo depois de tê-lo beijado, e já os dois se gostando e tendo ela mandado-o falar com
José Dias para que persuadisse mana Glória a desistir do seminário, quando o garoto chegava em casa nas férias
ela ficava dizendo que ele iria ser o padre que a iria casar, e que também batizaria seus filhos. Sendo que ela
não queria que ele se tornasse padre. Mas ela falava com uma naturalidade Se mentia assim antes, imagina
agora?
JUÍZA: O senhor não pode levantar especulações.
COSME: Perdão. Mas é que esse comportamento dela levanta muitas suspeitas. E prima Justina? A mulher era
um azedume só, e nem gostava da Capitu, e a danada sabia e mesmo assim ficava cheia de dengos com a velha,
pura falsidade. Antes acreditávamos que ela era excelente para nosso Bento, mas agora, Receamos de termos
sido enganados a vida toda.
A.D.: O que você acha o relacionamento dela com Bento?
COSME: Como disse, eles sempre foram amigos. Certo que não imaginei que eles pudessem se casar, mas
Bentinho nunca teve vocação para o sacerdócio. Não tinha como ele ser protonotário. A vocação dele era
outra.... E digo isso porque, se ele realmente quisesse seguir a vocação não teria mulher no mundo que lhe
entortasse o caminho. Por isso posso dizer que a relação deles sempre foi mais forte do que amizade, mesmo
que nem eles percebessem isso.
A.D.: O que você pode dizer de Ezequiel?
COSME: Um bom menino. Tem muito do gênio da mãe e pouco do nosso Bentinho. Mas não sei dizer se a
criança é fruto de traição. Não sei dizer se Capitu seria capaz de fazer isso, mas competência tem, mentirosa,
ardilosa, manipuladora e dissimulada ela é. Poderia muito bem ter traído.
A.D.: Como você descreveria Bento?
COSME: Um homem invejável, sempre muito dedicado à família, amado pela mãe, um exemplo de filho.
Mesmo sem querer estava disposto a cumprir a promessa da mãe, só para não entristecer a mana Glória. Um pai
como nenhum outro haverá e com certeza um magnífico marido.
A.D.: Isso é tudo, Meritíssima.
JUÍZA: O senhor está dispensado.
10. PROMOTORIA:
- Que entre, por favor, a segunda testemunha de acusação: Dona Glória de Albuquerque Santiago, mãe do
requerente e sogra da ré.

(entra dono Glória ao som de Westworld Main Theme, e espera no púlpito, de pé, a fala da promotoria)

11. TESTEMUNHA DE ACUSAÇÃO:

PROMOTORIA
DONA GLÓRIA
A.D.: ADVOGADO DE DEFESA

PROMOTORIA: A senhora jura falar a verdade, somente a verdade e nada mais que a verdade?
DONA GLÓRIA: Juro!

(Promotoria sinaliza que ele pode sentar-se. Dona Glória senta-se)

A.D: - Como a senhora pode definir o seu filho, o Sr. Bento?

D. GLÓRIA: - Bentinho sempre foi um santo. Ele até ia ser padre. Eu fiz uma promessa, sabe, se Deus me
desse a graça de ter um filho, a vida dele seria dedicada à igreja. E ele até gostava, quando criança vivia
brincando de rezar a missa.
A.D: - Como era o relacionamento de Bento e Capitolina na infância?
D. GLÓRIA: - Ahhh... Os dois viviam juntos, eram muito amigos sabe! Quer dizer, eu achava que era só
amizade, mas como vemos, era mais que isso. Bem que José Dias me avisou que eles viviam muito tempo
juntos, escondidos, cochichando... Foi aí que ele começou com ideias de desistir do seminário.
A.D: - Como a senhora se sentiu quando Bento assumiu não ter vocação para o seminário?
D. GLÓRIA: - Foi um choque. Como disse, eu tinha feito a promessa. Não dava pra acreditar. Pensei na época
que o motivo fosse a falta de vocação, de certa forma foi mesmo... Mas imaginar que meu filho estava abrindo
mão do possível título de Protonotário apostólico, para ter uma vida comum.
A.D: - Como a senhora avalia Capitolina?
D. GLÓRIA: - Ela sempre foi muito amável. Você acredita que ela sempre me pedi a benção mesmo sem eu
ser nada dela? Nem madrinha, nem tia, nada. Fazia isso pelo respeito que tinha a mim. Com os pais era do
mesmo jeito, sempre ajudando a mãe nas atividades de casa, como toda boa menina deve fazer, para poder se
tornar uma boa esposa. Inclusive, acho que ela seja uma ótima esposa para meu Bento, sempre zelosa no lar,
muito cuidadora, nunca deixou faltar nada, nunca foi de fazer questão por nada e é ótima mãe, o menino a
adora.
A.D: - Como a senhora via o relacionamento de Bento com Capitolina?
D. GLÓRIA: - De certa forma, para mim, era uma tristeza, por causa da promessa. Foi um pouco
surpreendente também, porque eu sempre os vi como amigos, crianças apenas. Mas bem que José Dias me
avisava que ela era sorrateira. Bentinho sempre foi muito obediente, ela deve ter feito a cabeça dele...
A.D: - Como a senhora se sente em relação ao seu neto?
D. GLÓRIA: - O menino realmente se parece um pouco com o finado Escobar, principalmente o ar de
esperteza. Mas eu não quero acreditar que Capitu fosse capaz de fazer... de trair o meu filho. Ela cresceu sob os
meus olhos, conheço desde a infância.
A.D.: Isso é tudo, Meritíssima.
JUÍZA: A senhora está dispensada.
12. PROMOTORIA:
- Que entre, por favor, a terceira testemunha de acusação: José Dias, boticário, agregado na casa de Dona
Glória desde que seu marido ainda era vivo.

13. TESTEMUNHA DE ACUSAÇÃO:

(José Dias entra ao som de Westworld Main Theme, e espera no púlpito, de pé, a fala da promotoria)

PROMOTORIA
A.D: ADVOGADO DE DEFESA
JOSÉ DIAS

PROMOTORIA: O senhor jura falar a verdade, somente a verdade e nada mais que a verdade?
JOSÉ DIAS: Juro!

(Promotoria sinaliza que ele pode sentar-se. José Dias senta-se)

A.D.: Como o senhor descreveria o sr. Bento?


JOSÉ DIAS: Ahhh... Ele sempre foi um garotinho muito obediente. Devotado à mãe. Esforçava-se para não se
causar nenhum desgosto. Seu maior prazer era a alegria da mãe. Tanto que estava disposto a seguir o sacerdócio
mesmo sem querer, só para não deixar a mãe triste.
A.D.: E como era o relacionamento dele com dona Capitolina?
JOSÉ DIAS: Ahhhhhh.... Eles eram muito próximos na infância, tanto que comecei a desconfiar, inclusive
alertei dona Glória de que talvez o seminário não saísse devido a essa ―amizade‖ (faz o sinal das aspas com as
mãos). Inclusive, depois de um tempo, ele até veio me pedir para que intercedesse por ele junto a sua mãe para
que ela desistisse da promessa, porque ele queria ser advogado. Como tenho muito carinho por ele, acabei
ajudando. Acho que foi por minha causa que eles acabaram juntos. Eu sou o cupido deles. Um cupido
eficientíssimo. Durante o casamento eles sempre pareceram muito bem. Ela sempre foi muito animada e
Bentinho muito sisudo, mas Capitu sempre demonstrou que seria uma ótima esposa e mãe. Ela sempre foi
ótima com as atividades domésticas, inclusive, sempre que podia, ia ajudar dona Glória ou ficavam tricotando e
bordando.
A.D.: O que o senhor pode dizer de dona Capitolina?
JOSÉ DIAS: Sempre muito esperta, alegre, barulhenta, mas não um barulho ruim. É daqueles barulhos que
quando você escuta você reconhece a pessoa, e de imediato há um preenchimento de um vazio que até aquele
momento, você não sabia que existia. Ahhh... E os olhos. Vocês já repararam nos olhos dela? Os olhos que
Deus lhe deu são assim, de cigana oblíqua e dissimulada.
A.D.: E como era o relacionamento dela com Escobar?
JOSÉ DIAS: No início Escobar era amigo só de Bentinho, do seminário. Capitu não gostava muito dele, pelo
menos era o que demonstrava quando o via. Com o tempo, acho que por insistência de Bentinho, ela acabou se
acostumando, e depois do tempo que Bento passou no estrangeiro estudando direito eles acabaram se
aproximando. Ela tinha que aceitar e compartilhar a amizade com Escobar, afinal Bentinho não tinha outros
amigos, e logo ele se aproximou de Sancha, amiga de Capitu. Era como se eles todos fossem uma grande
família, todos irmãos.
A.D.: O senhor chegou aqui como testemunha de defesa, mas até agora só tem feito elogios a minha cliente.
Deve o júri e todo o tribunal acreditar que o senhor não tem provas de nenhuma traição?
JOSÉ DIAS: Acho que o senhor não entende o que se passa aqui. O fato de uma pessoa ser boa, carinhosa e
prestativa, não anula sua capacidade de ser falsa, enganadora e mentirosa. Ela pode muito bem ter traído o
Bentinho. O próprio Bentinho já contou que ela já xingou dona Glória de tal forma que ele mesmo se assustou.
Num acesso de raiva ela disse que coisas que normalmente não diria, então quem garante que num acesso de
raiva de Bentinho, por vingança, ela não o traísse? Ele sempre foi mais introvertido e ciumento, o oposto dela,
ela pode muito bem ter se cansado disso tudo. Escobar tinha o mesmo espírito desbravador que ela.
A.D.: Isso é tudo, Meritíssima.
JUÍZA: O senhor está dispensado.

(José Dias se retira)

14. PROMOTORIA:
- Que entre, por favor, a testemunha de defesa da ré: Sancha de Souza Escobar, esposa do melhor amigo da
família, Escobar, e amiga do casal.

15. TESTEMUNHA DE DEFESA:

(Sancha entra ao som de Westworld Main Theme e espera no púlpito, de pé, a fala da promotoria)

9. TESTEMUNHA DE ACUSAÇÃO:

PROMOTORIA
A.A: ADVOGADO DE ACUSAÇÃO
SANCHA

PROMOTORIA: A senhora jura falar a verdade, somente a verdade e nada mais que a verdade?
SANCHA: Juro!

(Promotoria sinaliza que ele pode sentar-se. SANCHA senta-se)

A.A: Como era a relação da senhora com a senhora Capitolina?


SANCHA: Nós nos conhecíamos desde a época do colégio. Estudávamos juntas e criamos amizade. Eu
frequentava a casa dos Pádua, papai gostava que eu tivesse amigos. Também frequentava a casa de Bento.
Capitu sempre foi uma boa amiga, sempre pareceu ser uma pessoa muito fiel, paciente, compreensiva, amorosa.
Lembro-me de quando fiquei doente e Capitu cuidou de mim. ela não dormia, passou dias em casa de papai, só
se foi quando eu melhorei. Nós erámos como irmãs, tanto que Escobar a chamava de ―cunhadinha‖. Sempre foi
muito dedicada às pessoas que amava. Quando dei a luz à Capituzinha ela me foi ajudar, não me saiu do pé da
cama. e eu, ao nascimento do Escobarzinho, fiz o mesmo. Éramos uma família, todos juntos, em todos os
momentos.
A.A.: Como era a relação de Bento e Capitu?
SANCHA: Desde nossa juventude notei o quanto os dois eram próximos, mesmo eu sabendo que Capitu era
dada a afetos e sempre dedicada aos seus, sempre achei que eles dois eram íntimos demais. Depois meu
Escobar ajudou os a trocarem cartas, ele foi como um cupido. Ele sempre me pareceu muito dedicado à esposa,
bem como ela a ele. Lembro-me de como sofreram juntos por não conseguirem ter um filhinho e de como
ficaram radiantes quando Escobarzinho nasceu. Mas acho que ele dava pouco espaço a ela. Veja Capitu sempre
foi muito dona de si, independente, tinha suas próprias ideias, ela não vivia à sombra, não era mulher de falsa
modesta, ela era exuberante. Eu queria ser um pouco mais como ela, mais independente e forte... Acho que isso
pode incomodar um pouco o Bentinho, pois a personalidade dela é o oposto da dele, na verdade, ele sempre foi
o mais apático, parece um pouco comigo... De qualquer forma, é um fato, e deixo claro que não estou fazendo
especulações, que nenhum homem gosta de uma mulher que se sobreponha a ele. Eles sempre procuram ou, até
mesmo, inventam algo para inferiorizá-la.
A.A.: O que você pode dizer da relação entre Bento e Escobar?
SANCHA: Eles eram amigos desde o seminário. Como irmãos, assim como Capitu e eu. Foi Bentinho que teve
a ideia de Escobar ficar levando e trazendo as cartas dele e Capitu, pois ninguém desconfiaria de Escobar. No
começo Capitu nem gostava de Escobar e desconfiava dele. Não julgo. O romance dela com Bentinho sempre
foi muito complicado e alguém de fora poderia complicar ainda mais, mas no final deu tudo certo. Eles sempre
foram tão próximos... Acho inadmissível que Bentinho desconfie de Escobar, pelo amor de Deus, isso seria
uma monstruosidade.
A.A.: Isso é tudo, Meritíssimo.
JUÍZA: A senhora está dispensada.
16. PROMOTORIA:
- Daremos início agora ao interrogatório da ré, Srª. Maria Capitolina Santiago, esposa de Bento de Albuquerque
Santiago.

17. INTERROGATÓRIO DA RÉ

PROMOTORIA
CAPITU
A.A: ADVOGADA DE ACUSAÇÃO

PROMOTORIA: A senhora jura falar a verdade, somente a verdade e nada mais que a verdade?
CAPITU: Juro!

(Promotoria sinaliza que ele pode sentar-se. SANCHA senta-se)

A.A: Quando a senhora começou a conviver com Bentinho?


CAPITU: Desde que Dona Glória, com seu coração de ouro, acolheu a mim e a minha família em sua casa, em
Matacavalos, depois de termos perdido tudo. Convivi com Bentinho durante toda a infância. Sempre soube da
promessa de dona glória para que Bentinho fosse padre, e fui a primeira a saber quando ele, percebeu que,
talvez, essa não fosse sua vocação...
A.A: Quando vocês começaram a se relacionar?
CAPITU: Sempre gostei de Bentinho... seu jeito tímido. Sempre fomos muito unidos, até mesmo quando me
distanciei devido o colégio. Quando voltei, não nos separávamos nunca. Era tudo tão natural que quando dei
por mim, percebi que não sabia, nem nunca tinha feito outra coisa em minha vida que não fosse amar Bentinho.
Mesmo que isso pudesse contraria sua família. Lembro-me, até hoje, do dia em que ele me pediu para trançar os
cabelos... foi ali que demos nosso primeiro beijo...

A.A: O que impedia o relacionamento de vocês?


CAPITU: Dona Glória havia feito uma promessa, para que Bentinho se tornasse padre. Ele sempre foi
extremamente obediente à mãe e isso quase impediu o nosso romance porque ele não tinha coragem de dizer a
mãe que não queria mais seguir o sacerdócio.
A.A: Como vocês resolveram esse impasse?
CAPITU: Pedimos apoio a José Dias, pois dona Glória sempre o ouvia. Dissemos que Bentinho queria ir para a
Europa, e José Dias era apaixonado pela Europa, isso o motivou a nos ajudar. Fora o fato de Bento ter assumido
não ter vocação.
A.A: Como era o relacionamento de Bento e Escobar?
CAPITU: Eles se conheceram no seminário e nenhum tinha vocação para o sacerdócio, acho que por isso
ficaram tão amigos. Escobar queria ser comerciante e Bento advogado. Eles sempre viviam juntos, tanto que
quando firam passar as férias em Matacavalos, Bento só queria ficar passeando com Escobar.
A.A: Como você se sentia diante da amizade dos dois?
Embora a relação deles fosse muito próxima, isso não me incomodava. Bento não tinha muitos amigos, sempre
vivia na saia da mãe. Era bom ele ter um outro homem, da sua idade, com as mesmas ideias, para conviver.
A.A: Como é o casamento de vocês?
CAPITU: No começo as mil maravilhas, mas como passar do tempo e, principalmente, após o nascimento de
Ezequiel, ele começou a ficar estranho, cismava com tudo, parecia sempre desconfiado, inseguro e um pouco
paranoico.
A.A: Como você justifica a aparência de Ezequiel com Escobar?
CAPITU: Ele não se parece com Escobar. Bento fala que o menino tem olhos claros, mas eu também tenho
olhos claros. Fala que o menino é igual a Escobar, que caminha como ele, mas o menino só gosta de imitar as
pessoas. ele imita todo mundo. É uma graça! É fase, toda criança faz isso.
A.A: Como você se sentiu com a morte de Escobar?
CAPITU: Foi um choque. Uma grande perda. Ele era nosso amigo há muito anos. Fiquei abalada. Bento me
acusa, mas que não lamenta a morte de um amigo, ainda mais de alguém que o próprio Bento considerava como
um irmão? Eu que fico admirada com a frieza dele.
A.A: Sua dissimulação sempre foi clara, como já foi exposta anteriormente nos termos ―cigana oblíqua
e dissimulada‖. A senhora tende a mascarar seus sentimentos, por quê?
CAPITU: Não sou dissimulada, mas veja, amei alguém que estava destinado a ser padre. Eu não poderia ficar
gritando isso aos quatro ventos. Dissimulada é quem finge. Nunca fingi ser o que não sou, sempre fui a mesma,
intensa, verdadeira e dona de mim.

A.A: Para mim isso é o suficiente, Meritíssima.


JUÍZA: A senhora está dispensada.

12. DEBATE ORAL:

PROMOTORIA
A.A.
A.D.

PROMOTORIA: Daremos início agora aos debates. Com a palavra a acusação. Vossa Excelência terá até uma
hora e meia para a acusação.

1º ADVOGADA DE ACUSAÇÃO:
- Excelentíssima senhora Juíza presidente, Ilustre promotora, diletos colegas de defesa, primorosos servidores
da Justiça, gloriosa polícia militar, familiares da vítima, familiares da ré (cumprimento à ré e por último aos
jurados sorteados). Venho aqui mostrar-lhes que a Srª Maria Capitolina enganou não apenas a Bento Santiago,
meu cliente, como também a toda sua família, fazendo-os acreditar que ela era apenas uma jovem doce e
ingênua, quando na verdade, desde a tenra idade, ela já corrompia o meu cliente.
- Desde jovem já tinha um comportamento inadequado. Posso provar isso através de um diálogo entre Dona
Glória, o Sr. Cosme e o Sr. José Dias, exibido aqui (ergue o livro Dom Casmurro na mão), capítulo 3, página
14-15, no qual José Dias adverte Dona Glória através das seguintes palavras: ―Não me parece bonito
que o nosso Bentinho ande metido nos cantos com a filha do Tartaruga, e esta é a dificuldade, porque se eles
pegam de namoro, a senhora terá muito que lutar para separá-los.‖ E ainda acrescentou que sua opinião não
vinha de mera suposições, dizendo: ―creia que não falei senão depois de muito examinar...‖. É tanto
verdade que, posteriormente, o casal pede ajuda ao próprio José Dias para que ele convença dona Glória a
desistir de por Bento no seminário. E toda a sequência é incitada por Capitu que pressiona Bento a falar
com o José Dias, como comprovado no capítulo 32, página 68: ―Eu já nem sei se José Dias poderá influir
tanto... Você teime com ele, Bentinho!‖. Como se já não bastasse ela ser manipuladora, ainda exigia isso do sir.
Bento.
- Também podemos provar que desde tenra idade dona Capitolina sempre apresentou-se ser bastante
dissimulada, fingindo situações e mascarando sentimentos e reações, como foi retratado no episódio do
penteado, página 71, no qual, enquanto o jovem Bento ainda estava atordoado por ter-lhe dado o primeiro beijo,
ela, por sua vez, ao ver a mãe aproximar-se fingiu, com calma descontração, que nada havia acontecido, como
podemos perceber no trecho: ―Capitu compôs-se depressa, tão depressa que, quando a mãe apontou à porta,
ela abanava a cabeça e ria. Nenhum laivo amarelo, nenhuma contração de acanhamento, um riso espontâneo e
claro‖.
- Senhores jurados, quem aqui não lembra o primeiro beijo? E como alguém poderia ignorar tão prontamente
esse momento se não fosse justamente pela ausência de amor e respeito e um excesso de cinismo? O próprio
José Dias já dissera ―Olhos de cigana oblíqua e dissimulada‖. O que são os ciganos senão, um povo,
historicamente conhecido por serem traiçoeiros e enganadores? Pois, é com respaldo histórico que lhes indago,
se ela pôde dissimular o primeiro beijo, o que mais não poderia, uma vez que, ao longo dos anos, adquirira
prática no ato do fingimento?
- Quanto à criança, Ezequiel, sabemos que crianças têm o hábito de imitar os adultos, mas não os olhos, os
cabelos... Como nos é mostrado no capítulo 116, suas imitações de Escobar apareciam de forma natural, como
se fosse uma herança: ―Alguns dos gestos já lhe iam ficando mais repetidos, como os das mãos e pés
de Escobar; ultimamente, até apanhara o modo de voltar a cabeça deste, quando falava, e o de deixá-la cair,
quando ria.‖
- Quero ainda lembrar-lhes do dia do teatro, apresentado a nós no capítulo 113, no qual dona Capitolina, fingiu-
se de doente para ficar em casa e quando meu cliente retornou ao lar encontrou, para seu espanto, Escobar. ―Era
tarde para mandar o camarote a Escobar; saí, mas voltei no fim do primeiro ato. Encontrei Escobar à porta do
corredor. Capitu estava melhor e até boa. Confessou-me que apenas tivera uma dor de cabeça de nada, mas
agravara o padecimento para que eu fosse divertir-me. Não falava alegre, o que me fez desconfiar que mentia,
para me não meter medo, mas jurou que era a verdade pura.‖

- Ela mentiu. Não era a primeira vez, como já apresentei aqui. Provavelmente para marcar um encontro com
Escobar, que foi arruinado por Bento, pois ele resolveu voltar mais cedo para casa. A noite não é hora de se
visitar ninguém, Escobar poderia muito bem ter aparecido no dia seguinte, mas porque ir justamente à noite?
Dessa forma, mostro a vocês uma mulher que está acostumada a ter tudo a seus pés, e um homem inteiramente
apaixonado que está em choque ao ver que a mulher que ele amou durante a vida inteira, seu primeiro e único
amor, não lhe é recíproca, que, o coração e o corpo foram de outro homem. Que ambos ridicularizaram o meu
cliente embaixo do seu nariz e que o tornaram um homem com uma carga psicológica traumática.
- Senhores, espero ter sido clara quanto a posição humilhante do meu cliente e sobre como essa mulher pode ser
traiçoeira. Espero que os senhores tomem a decisão correta. Isso é tudo Meritíssimo. (senta-se)

PROMOTORIA: É dada a palavra à defesa. Vossa Excelência terá até uma hora e meia para a acusação.

2º ADVOGADA DE DEFESA
- Excelentíssima senhora Juíza presidente, Ilustre promotora, diletos colegas de defesa, primorosos servidores da Justiça,
gloriosa polícia militar, familiares da vítima, familiares do réu, (cumprimento ao réu e por último os jurados sorteados)
venho por meio deste mostrar-lhes que minha cliente, a senhora Maria Capitolina Santiago é inteiramente inocente,
uma vez que não há nenhuma prova contra ela e todos os depoimentos foram baseados em especulações. Onde
estão as fotos provando a traição? O próprio sr. Bento assume diversas vezes que é ciumento. Quem garante
que o ciúme não o fez imaginar todas essas situações? Ele mesmo assume isso no capítulo ―UMA PONTA DE
IAGO‖, página 113-114 e no capítulo ―EMBARGOS DE TERCEIRO‖, pág. 186. (ler o grifo do livro)
- Quanto à insistência de minha cliente, ainda durante a infância, de que eles ficassem juntos era completamente
válida, uma vez que o próprio Bento tenha confessado a ela que não queria ser padre, que não queria ir para o
seminário, como ele assumiu no cap. 18, pág. 38. (ler grifo na pág.)
- Quanto ao comportamento de Ezequiel, por favor, já nos foi revelado em diversas partes do texto que a
criança parecia-se muito com os demais parentes de ambas as famílias: os olhos claros como de dona
Capitolina, assim descrito, a princípio pelo próprio Bento, e depois mudado, provavelmente devido ao seu
ciúme; o espírito animado tal qual o do avô, o Tartaruga.
- Além disso, o próprio Bento acreditava que o filho era dado a imitações. E todos sabemos que existem
pessoas que nascem com esse dom, sabem imitar os outros com perfeição. Não o bastante, o pai também já
considerou o fato de Ezequiel e a pequena Capitolina formarem um casal e virem a casar-se. Como nos é
mostrado no cap. ―AMIGOS PRÓXIMOS‖, PÁG. 193. Se ele duvidava de sua paternidade porque levantaria
tal ideia? Que ser monstruoso levantaria a hipótese de ver dois irmãos casados?
- Senhores, espero ter sido clara quanto a posição humilhante da minha cliente e sobre como esse homem é
possessivo, dominador, inseguro e manipulador, porque ele manipula os fatos a seu favor, distorcendo a
mensagem e criando uma personalidade para a minha cliente que não faz jus a quem ela realmente é. Espero
que os senhores tomem a decisão correta. Isso é tudo Meritíssimo. (senta-se)

13. INTERVALO DO JÚRI

JUÍZA
- "Dar-se-á um intervalo de 10 minutos pra se proceder ao julgamento. Retirem a acusada. Convido o público
em geral que deixem o recinto. Convido os srs. Jurados, escrivão, oficiais de justiça e drª. Promotora, a se diri-
girem comigo à sala secreta."

(os jurados se retiram, juntamente com a juíza e a promotoria.)2

14. JUIZ PROCLAMA A SENTENÇA DO JÚRI


JUIZA
CAPITU

(retorno da corte e da acusada para o veredicto. todos tomam os seus assentos.)

SE INOCENTE:

JUÍZA - Este tribunal declara a srª Maria Capitolina Santiago inocente, tendo em vista que não há provas
relevantes para uma condenação, uma vez que todas as acusações estão baseadas em especulações das
testemunhas e no imaginário do requerente. Podendo ainda o Tribunal levantar uma ação contra o requerente
por manipulação de fatos e por exigir um julgamento aberto em uma causa perdida. Agradeço aos srs. Jurados a
presença e o cumprimento do dever. Os srs. Jurados estão dispensados.

CAPITU: (levanta-se e segue em direção a Bentinho) Nunca pensei que você pudesse ser tão baixo e
mesquinho. Depois de tudo que vivemos, depois de tanto tempo, amor e paciência que dediquei a você... Uma
vida toda guardando o mesmo amor... Mas não se preocupe, não guardarei mágoas ou ressentimento, mas o
meu amor por você está acabado, seco e sem vida, você não é merecedor nem de pena.

SE CULPADA:

JUÍZA - Este tribunal declara a srª Maria Capitolina Santiago culpada e condenada por adultério, sendo
sentenciada a um período de prisão de 3 anos. Podendo a condenada, dentro de um prazo de 10 dias, recorrer da
decisão desse Tribunal, caso esteja inconformada com a decisão que lhe foi inferida. Agradeço aos srs. Jurados
a presença e o cumprimento do dever. Os srs. Jurados estão dispensados.

CAPITU: (levanta-se e segue em direção a Bentinho) Nunca pensei que você pudesse ser tão baixo e
mesquinho. (começa a falar com a voz fraca e chorosa) Depois de tudo que vivemos, depois de tanto tempo,
amor e paciência que dediquei a você... Uma vida toda guardando o mesmo amor... Eu esperei por você quando
foi estudar fora, se eu quisesse te trair, teria feito naquela época, não depois de casados... Mas isso não importa
mais, minha alma, meu corpo e minha honra estão ofendidos... Não preciso mais viver, porque o que já foi
vivido foi uma ilusão, não preciso continuar nessa vida de desenganos...

(Capitu desmaia e é socorrida pelo “amante” (Escobar dos flashbacks) que a leva nos braços. O júri congela.
Entra o teatro, apenas com Bentinho.)

BENTINHO: Meus caros, eis o homem que por não dar ouvidos aos versos de um poeta que o acaso me
trouxe, recebeu a alcunha Dom Casmurro, sentença que carrego juntamente com outros infortúnios trazidos
pela existência. Ao fim de tudo, só o ciúme me foi companhia após o muito penar em minha própria insanidade,
a qual sinto ter contaminado a minha primeira amiga e a todos os que me cercavam. Contudo, não creio assim e
vocês hão de concordar comigo; a Capitu menina e aquela a quem votei matrimônio estavam uma dentro da
outra, como a fruta dentro da casca. Só me resta dizer o quão arrependido estou dadas as acusações levantadas
por mim e que por tal injustiça é remorso o que sentirei até o último suspiro meu.

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