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Fome e Espera

O seu telefone tocou mais uma vez, João... Continue esperando, vejo que você está ansioso
pela chegada da sua vez. Espere, espere. Você tá com dor de cabeça, mas não saia agora, você
é o próximo a entrar. Como tem gente aqui, né, Seu João? Nossa... você deu sorte em ter saído
de casa às cinco e meia. A cidade tem um gosto diferente de manhãzinha, não é? Parece
aquele cheiro de garagem quando ligamos o carro e sobe aquela primeira fumaça tóxica do
escape. Foi até bom você, antes de sair de casa, tomar um copinho de café com dois pães
assados, só que mesmo achando que não era o suficiente, achava que te sustentaria durante a
parte da manhã, porque pensávamos que você seria atendido rápido... E eu, sua consciência,
lhe falo e não o deixo na mão. Mas olhe isso... Já são três e quarenta e cinco da tarde, você
com fome, com dor de cabeça; mas continua esperando para entrar, e deveria, porque era o
próximo da lista.

Sei que, nesse momento todo de espera, você já sonhava comendo um pastelzinho e caldo de
cana na feirinha próxima daqui. Sonhava também com um pratão de comida no self-service da
esquina e, também, sonhava com o carrinho do milho cozido que sempre passa esse horário.
Eu sei disso, eu sou sua consciência, João. Você tá pensando demais, essa é a verdade...

─ Seu João, sua vez.

Disse a secretária.

Assim que você ouviu a secretária, levantou de vez. Sabe o que acontece, né... Você caiu,
desmaiou. Pessoas te socorrendo. Eu ouvi o alvoroço que foi essa confusão e o vi cair no sono
muito rapidamente. Quando você acordou, estavam seu filho e sua esposa ao seu lado e uma
enfermeira preenchendo uma prancheta e fazendo alguns outros procedimentos, medindo e
observando o seu corpo. Você não estava conseguindo falar, mas percebia que a enfermeira
marcava com frequência e fazia sinal de positivo com a cabeça.

Após isso, chegou um médico com vários instrumentos e ele apontava pra a sua cabeça por
muitos momentos. Você já estava ansioso para saber o que havia acontecido com você. Até
que sua mulher sentou ao seu lado e, parecendo que sabia que você estava consciente, disse:

─ Oh meu bem, vai ficar tudo bem. Você só desmaiou e bateu com a cabeça no chão, mas o
médico disse que vai ficar tudo bem, você só precisa repousar.

Na noite do mesmo dia, você finalmente conseguiu abrir totalmente os olhos e falar. Seu filho
estava com você e, percebendo que você estava bem, ficou feliz; mas mesmo assim não
hesitou em perguntar o que você queria agora, e então ele perguntou:

─ Pai, o senhor está melhor? Diga-me tudo o que está sentindo agora.

Você, meio que no automático, disparou:

─ Almoço de pastel de milho, por favor.

(BRUNO LIMA BARROS, 2021)

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