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CO L A B O R AT I VA S O B R E
C U L T U R A L AT I N O A M E R I C A N A
~
EDICAO Nº 20 I FEVEREIRO 2017
NANDUTI FRONTEIRIZO
LINEAS EN LA ARENA: NAZCA
U N I L A PE L A D I V E R S I DA D E L I N G U I STI C A
O M U N D O CO N T R A U M A P L A N TA M I L E N A R
TRÂNSITO
MICHELE DACAS
08. 10.
linguística instituições
cynthia jazmin,
20.
Jaqueline azevedo
luna montalbetti,
12. ellen schneider
16.
aquí es donde
24. 26.
alabê ôni: quando
soam os tambores,
+ PÔSTE R
quando o corpo é
reza
guilherme cruz
28.
Equipe
Diagramação: Sarah Scholz Dias, roger dourado, ALEXANDRE NUNES DE MOURA E SOUZA E
Adolfo Delvalle, Andrés Carvajal, Anitta Delvalle, Cynthia Jazmin Luna Montalbetti,
Denise Rodrigues, Diana Canales Arana, Ellen Schneider, Fran Rebelatto, Guilherme Cruz,
Isaac Souza de Jesus, Jaqueline Azevedo, Jéssica Amoreira, João Pedro de Melo Porto,
Michele Dacas, Nícollas Cayann, Renan Pinna, Renan Xavier, Romildo Marques.
Realização:
Mais
e d i tor i al
Cultura na
fronteira:
possibilidades
e identidades
em trânsito
por Michele Dacas1
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uma revista colaborativa sobre a cultura latino-americana
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REVISTA PEABIRU
fazeres, crenças, artes e costumes, que atribuem signi- força dos estudantes e profissionais da educação que
ficado ao ser humano como membro de uma sociedade. integram a Instituição. No entanto, embora por um lado
Portanto, pensar que não há cultura em algum lugar é a Universidade e tudo o que ela representa em termos
assumir uma perspectiva etnocêntrica própria da Euro- de diversidade impulsionem a cena cultural da cidade
pa capitalista em meados do século XVIII e XIX, que a e da região, por outro lado ela entra em choque com
tomavam como sinônimo de progresso (CHAUÍ, 2008), ca- o local ao alterar as modalidades e os padrões de vida
tegorizando tudo o que fosse distinto do seu modelo de existentes.
civilização, baseado no estado, no mercado e na escrita,
Mesmo em um local como Foz do Iguaçu, reconheci-
como falta de cultura, justificando práticas de domínio e
do por haver o convívio entre tantas raças e etnias, exis-
expansão territorial como o colonialismo.
tem barreiras entre toda essa pluralidade ainda descone-
A recente efervescência da cultura na cidade e xa de diferentes culturas. Observa-se, aqui, uma vocação
também na região é um aspecto que chama a atenção intercultural ainda incipiente e um conservadorismo que
de quem chegou há cinco anos no local, não porque perpetua o racismo, a xenofobia, a homofobia, o precon-
não havia cultura, mas a visibilidade e o alastramento ceito social e a violência contra a mulher, repudiando
de grupos, indivíduos, agentes criadores, produtores, toda e qualquer diferença. Grande parte das pessoas que
atuantes no campo da cultura são crescentes e vêm to- constituem a UNILA é um pouco de tudo isso que ques-
mando os espaços. Isso ocorre menos ainda por conta tiona os ideais normativos da sociedade. E essas pessoas
de uma iniciativa empresarial ou governamental, mas circulam, colocam-se em contato com quem está em
pelo encontro que a fronteira oferece entre as referên- trânsito, com quem reside, atravessam os outros lados,
cias de quem aqui chega e a memória dos que aqui já es- convergem, recriam e ocupam espaços. E são nessas re-
tão. Esses encontros formam um cenário potencializado lações que se constitui o unileiro, como uma identidade
pela articulação em rede, pelo avanço e disseminação em contraponto a toda a unidade de significados tradi-
das novas tecnologias e as possibilidades de desenvol- cionais que representam as estruturas da cidade. Assim,
vimento de conteúdos digitais e difusão de ações varia- o unileiro emerge mais como “o produto da marcação da
das. Ainda tem a motivação advinda da instalação de diferença e da exclusão do que o signo de uma unidade
uma universidade pública como a UNILA, pois seus alu- idêntica, naturalmente constituída” (HALL, 2012).
nos e professores propõem irradiar para além das estru-
Mesmo a contrapelo, é notável a contribuição da
turas acadêmicas o pensamento crítico, a interculturali-
UNILA para essa mudança de cenário. Essas conexões e
dade e a diversidade que constituem a Universidade, por
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uma revista colaborativa sobre a cultura latino-americana
hecidos por moradores e turistas que chegam à zona CHAUI, Marilena. Cultura e democracia. En: Crítica y
emancipación: Revista latinoamericana de Ciencias Sociales.
fronteiriça. Essa festa amplia a visão e a apropriação Año 1, no. 1 (jun. 2008- ). Buenos Aires: CLACSO, 2008
sobre a cidade, além de promover a mobilidade entre EAGLETON, Terry. A ideia de Cultura. São Paulo: Ed. Unesp 2005
produtores e consumidores de bens e serviços cultu- HALL, S. Quem precisa de Identidade? In: SILVA, Tomaz Tadeu (org.);
HALL, Stuart; WOODWARD, Kathryn. Identidade e Diferença: a
rais na fronteira. Já em Puerto Iguazú, na Argentina, tem perspectiva dos estudos culturais. 11ª ed. Petrópolis: Vozes, 2012.
o Festival Internacional de Cine de las Tres Fronteras5, LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito
antropológico. Rio de Janeiro: Zahar, 1986.
que traz, em sua curadoria e identidade visual, valores
SOUSA DOS SANTOS. Emilena. Cultura e cidadania: políticas
e referências missioneiras e, em 2016, apresenta sua culturais de base comunitária. In: Extraprensa: Cultura,
Território e Novos Sujeitos Políticos. USP: v. 9, n. 2 (2016)
segunda edição.
Imagens: Marcos Labanca, Cine Tres Fronteras e Fran Rebelatto
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REVISTA PEABIRU
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uma revista colaborativa sobre a cultura latino-americana
por Chaska
En una tierra rodeada de dunas, de arena blanquísima que El misterio que guardan estas líneas en
refleja el radiante sol donde el desierto se une con el mar en el relación a su significado, ha llevado a
litoral peruano, se encuentra un enigmático arte plasmado a
través de líneas en la arena. innumerables teorías que van desde los
comentarios más fantásticos hasta las
Se trata de los trazos realizados en las Pampas de Jumana, de carácter científico. Algunas son el
localizados entre las ciudades de Palpa y Nasca en la calendario astronómico, el cual señala
costa del Perú y a 450 km del sur de Lima. Estos diseños
gigantescos de animales, personas y figuras geométricas,
que las líneas tienen relación con las
fueron realizados con suma precisión y detalle. Son alrededor constelaciones. O que son epicentros de
de 10.000 líneas diseñadas sobre un enorme lienzo de arena actividad ritualista, donde se congregaban
de 350 km² de área.
culturas vecinas de la Cultura Nasca
En su mayoría representan líneas rectas de varios
kilómetros de extensión, las cuales dan vida a diversas
para adorar a los dioses. También se piensa
formas triangulares, rectangulares y trapezoidales. Entre las que estas líneas direccionan a puntos
figuras zoomorfas, se encuentra la de la Araña, que mide
específicos de la capa freática donde existe
aproximadamente 45 metros de largo. La figura de la Orca
es de 30 metros, siguiendo la del Colibrí de 97 metros. Ya la agua en el subsuelo o que fueron hechas
figura del Mono mide 142 metros de largo y la del Lagarto es para conducir a la persona hacia la ciudad
de 200 metros, por citar las más famosas. También existen
figuras fitomorfas y, en menor medida, antropomorfas. De
de los Nascas, llamada Cahuachi.
éstas últimas la más conocida es una figura llamada El
Astronauta que mide 30 metros de longitud. Otro detalle importante es que estas
líneas hayan sobrevivido al paso del tiempo.
Se desconoce su fin, motivo por el cual muchas personas
Esto se debe al clima y terreno favorables de
alrededor del mundo también creen que fueron hechas por
la región desértica, con pocas precipitaciones
seres extraterrestres. O tal vez por alguno capaz de volar, ya
y vientos. Como se puede imaginar, la escala
que para hacer estos trazos se necesitaría de una visión de
a la que fueron hechos estos diseños es
pájaro para saber cómo direccionar el trazo. Sin embargo,
extraordinariamente grande, lo que lleva a
el misterio fue develado gracias al trabajo de científicos
observarlas a partir de una determinada altura,
nacionales e internacionales, entre los que se destaca
ya sea sobrevolándolas o desde un mirador.
María Reiche (1903-1998), arqueóloga germano-peruana más
conocida como la dama del desierto. Gracias a su labor y Si bien el fin de estas líneas es incierta,
la de otros estudiosos, actualmente se sabe que su origen lo que se sabe es que continuarán atrayendo
evoca a una cultura milenaria del Antiguo Perú, la cultura la curiosidad de muchas personas alrededor
Nasca. Los hombres y mujeres de esta cultura, desarrollada del mundo y que el legado de estas culturas
hace más de veintiún siglos atrás, realizaron dibujos con antiguas perdurará siempre que se mantenga
suma precisión. Así, demostraron que poseían capacidades vivo el interés por explorar más acerca de
especiales de pensamiento abstracto, lo que llevó a que nuestra enigmática América Latina.
estas personas desarrollaran conocimientos de aritmética,
geometría y topografía, además de otras manifestaciones de
representación artística. Fontes:
http://elcomercio.pe/vamos/peru/ica-cahuachi-piramides-
desierto-noticia-1600978
https://es.wikipedia.org/wiki/Cultura_nazca
http://www.edhistorica.com/pdfs/Lineas_de_Nazca.pdf
ilustração: Roger Dourado
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REVISTA PEABIRU
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uma revista colaborativa sobre a cultura latino-americana
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REVISTA PEABIRU
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por Jaqueline Azevedo
Estudante de Economia,
Integração e desenvolvimento
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REVISTA PEABIRU
A cultura do estupro
e o patriarcado
violador: nosso
corpo versus
vossas instituiçoes
por Ellen Scheneider, Cynthia Jazmin
e Luna Montalbetti
Artigo escrito por Ellen Schneider, doutora em Sociologia e professora de Ciência
Política e Sociologia, da UNILA; e Cynthia Jazmin Luna Montalbetti, graduanda de
Ciência Política e Sociologia, da UNILA.
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REVISTA PEABIRU
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Das terras
sem
aos males
sem terras
por Renan Pinna
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sistimos escondidos. Eu vi, eu vi, mataram tudo! Abriam memória guarani se tece em sua cultura, assim como em
a barriga com facão e jogavam depois nas Cataratas seus artesanatos, tudo com muita paciência, força e luta.
(do Iguaçu)”1. Nas repressões do Regime Civil Militar de Os guarani contam com a ajuda dos espíritos e de Nhan-
1964-1986, era comum o uso de caminhonetes fretadas derú (deus), para, assim, continuar a viver à sua manei-
por militares, para levarem vários guarani ao Paraguai, ra, esperando a demarcação de seu território para quem
ameaçando-os de morte, caso quisessem voltar. sabe, um dia, voltar a viver em uma terra sem males.
o esbulho de dezenas de aldeias guaranis. Segundo o 2. Foi a primeira reserva delimitada em 1982, pela Funai.
projeto original, a construção da Usina alagou cerca de Fotos: João Pedro de Melo Porto
Reserva Oco'y
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REVISTA PEABIRU
A Ilha do Brasil
Um ensaio sobre a latinidade brasileira
A construção da ideia de América Latina trata de um publicado em “El Correo de Ultramar”, em fevereiro de
processo que se estende por três séculos e que grava 1857, e diz (trecho):
marcas em diferentes épocas e em diferentes esferas,
De acordo com Sampaio Goes, no livro “Navegan-
promovendo, assim, certa identidade nos povos que
tes, Bandeirantes, Diplomatas”, de 1991, existia uma
compõem essa parte do continente americano. Esse
ideia de “Ilha do Brasil” no começo de seu descobri-
processo instigou debates no âmbito cultural, linguís-
mento. Tanto que em muitos mapas, antigos cartógra-
tico, político, social – assim como em outros níveis –, e
fos e geógrafos desenhavam o território brasileiro com
continua em vigor e em transição, e não poderia ser, de
um apêndice, uma ilha, e não como parte integral do
forma alguma, diferente.
Novo Mundo, como, por exemplo, no mapa-múndi3 do
O famoso cartógrafo alemão, Martín Waldseemü- inglês John Rotz, de 1542. Invoco essa lembrança por-
ller, designou como América, no seu mapa2 de 1507, o que, a olhos nus, o Brasil é mesmo um arquipélago
território até então identificado como o Novo Mundo, próximo à ideia de América Latina, pois essa veio para
e não se imaginava que os Estados Unidos do norte substituir aquilo que se conhecia como América His-
da América iriam arreba- pânica, termo esse que não
tar o nome América para si, englobava o Brasil. O gigante
no século XIX. O constructo "La raza de la américa latina lusófono demorou um pouco
de América Espanhola ou para fixar sua latinidade.
“Hispanoamérica” vem com Al frente tiene la sajona rasa, No meu trabalho “De
força na primeira metade do
século XIX, e essa nova de-
Enemiga mortal que ya amenaza América Hispânica à Latina:
O Brasil como parte da ideia
nominação se deu devido à
tentativa abrupta de união
Su libertad destruir y su pendón." de América Latina” (disponí-
vel na biblioteca digital da
das ex-colônias originárias
UFPEL), desenvolvo mais de-
da coroa espanhola no continente americano. A Amé-
talhadamente os três eixos de pertencimento do Bra-
rica Hispânica surgiu como uma tentativa de reforçar a
sil Latino, que são: 1) quando o norte global começou
identidade das ex-colônias espanholas perante o medo
a ver o Brasil como parte da ideia de América Latina;
da imperialista e expansionista América do Norte, que
2) quando os intelectuais da América Hispânica, agora
reclamou o nome América para si no começo do sé-
Latina, começaram a aceitar o Brasil como irmão lati-
culo XIX. Vale lembrar que os Estados Unidos ficaram
no-americano; 3) quando o próprio Brasil começou a se
visivelmente mais imperialistas depois de 1823, com
posicionar como latino-americano. É demasiadamente
a doutrina Monroe de “América para os americanos”
complexo delimitar o percurso da latinidade brasilei-
– leia-se norte-americanos. A América Hispânica co-
ra afirmando um acontecimento ou fato histórico, pois
meça a ser substituída pela América Latina no início da
são evidências que envolvem mais de uma esfera de
segunda metade do século XIX. De acordo com Arturo
pesquisa. Todavia, é notório que, no período que com-
Ardao, o poema feito por José Maria Torres Caicedo –
preende o final da Segunda Guerra Mundial e o início
jornalista, crítico e poeta colombiano –, intitulado “Las
da Guerra Fria, existe uma aproximação maior do Bra-
dos Américas”, é o registro gráfico mais antigo do uso
sil com a sua faceta latina. Datam desse período ani-
da expressão “América Latina”. Escrito em 1856, quan-
mações da Disney (financiadas pelo Office of the Coor-
do Torres Caicedo residia em Paris, o longo poema foi
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FRONTEIRIZO
por Juliana Adylin
Com quantas vidas justapostas, tecidas, con- suas próprias tramas. Então, a anciã cria para
juga-se uma história? Quais são as cores, re- seu filho um gracioso e resistente Ñanduti, di-
mendos e texturas compreendidos no confec- ferente da efêmera e frágil tecitura da aranha,
cionar dos dias? Qual o lugar, nessas linhas exposta na moldura das árvores.
tênues, entre o rústico e o delicado, o frágil e
o eterno?
Há muitos anos, essa lenda inspira a produção
deste artesanato paraguaio, bordado por mui-
Formamos teias... tas mulheres que, desde a infância, criam, com
uma diversidade de pontos, esta renda multi-
colorida. A produção acontece principalmente
O Ñanduti – compreendido como teia, em gua-
na cidade de Itauguá, também famosa pelo
rani – é um tradicional artesanato paraguaio
Festival do Ñanduti, realizado desde os anos
produzido a partir do encontro de muitas lin-
1970 para difundir e dar visibilidade a este ar-
has, que, por meio de mãos inquietas, majo-
tesanato, considerado um dos patrimônios de
ritariamente de mulheres, formam arranjos
la artesanía y del folklore do Paraguai.
florais e geométricos que comunicam mitos de
sua origem ligados a amores e à natureza.
Feito tal como flores caleidoscópicas, nascidas
Cada nó coloca-se como presságio de nova na- de olhos atentos e pacientes. De encaixes e en-
rrativa, ora expandindo, ora retraindo, sempre laces de fios manipulados delicadamente que
emaranhando-nos em outros, movendo-nos a podem contar-nos metáforas do encontro, dos
cantos distintos e, como é de se imaginar, pro- nós, das redes, das teias, das bordas. Remen-
duzindo os mais híbridos, assombrosos e belos dos e das tantas vidas caseadas e soltas destes
desenhos. pontos até o porvir.
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Aquí es don de
Welcome to Tijuana! Con el coyote no hay
aduana. Uma cidade onde o hedonismo en-
contra-se com o selvagem e o desconheci-
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separa, ele cria separação. Torna diferente O rio é canalizado, e, nas partes rasas do canal, milhares de
o que é igual. A areia da praia e do deserto pessoas encontram sua morada. Ali constroem suas barracas ou
é a mesma. Mas quem caminha por ela, em criam seus “quartos”, em cavernas formadas pelas secas galerias
cada lado, não é. Lá é militarização e con- de circulação fluvial. São migrantes deportados que, não tendo
trole. Aqui é gente. perspectiva de vida no “novo” país onde foram despejados, ficam
por ali, às vezes esperam uma hora certa de cruzar novamente, às
É o muro de toda a América Latina. É lá
vezes apenas ficam. Segundo dados do Colégio da Fronteira Norte
onde se sente mais a pressão de tudo que
(Colef), essa população tinha, em outubro de 2013, entre 700 e mil
vem de todo o Sul, desde a Terra do Fogo.
pessoas. Setenta por cento delas são detidas pela polícia ao me-
Era essa pressão que levavam Pancho Villa
nos uma vez por semtana, pelos crimes de “não ter identidade”,
e seus 1.500 soldados quando invadiram os
“perambular” e ter um “aspecto” ruim.
Estados Unidos, em 1916.
...Y si los hombres pudiéramos volar... Assim escreveram nas
A história se repete a cada dia. Mui-
grades do muro. Termino este ensaio inspirado pela metáfora da
tos “Pancho Villa”, movidos pela necessida-
“gente-pássara”, trabalhada pela antropóloga Kolar Aparna e pela
de material de sobrevivência, cruzam, com
artista Amaranta Caballero, mulheres de luz que tive a honra de
papéis ou sem papéis, para o lado de lá,
conhecer em Tijuana. “Essa gente com sua capacidade interminável
invadindo o lugar com sua latino-america-
de auto-organização, de imaginação que não se limita por grades
nidade e mostrando que são os verdadeiros
ou paredes, sempre voa”.
donos da terra, pois, como dizem os Tigres
del Norte, “yo no crucé la frontera, la fron- ** Referências
tera me cruzó”. MOREIRA, Júlio da Silveira. Tijuana: a esquina da América Latina. Notas sobre a vida
transfronteiriça e as deportações massivas. In: DURÃES, Telma Ferreira Nascimento et al
Um desses “Panchos” me marcou. Caía (orgs.). Tráfico Internacional de Pessoas e outros trânsitos. Goiânia: Editora Espaço Acadêmi-
a tarde feito um viaduto, e a multidão de co / Editoria PUC Goiás, 2014.
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tinha! Sopapo. Para mim e para todos, sopapo era algo é a primeira dimensão do ser no mundo, na diáspora é o
que ninguém desejava - um tapa. Esse era o único signifi- caco e o elemento potente para a resiliência das presen-
cado do sopapo. Mas não foi difícil entender o porquê do ças negro-africanas. É nessa perspectiva de uma ontolo-
nome, pois era 'tapeando' que se tocava o instrumento", gia das populações negro-africanas na diáspora que pen-
relata na apresentação da tese o Doutor em Música pela samos os tambores, entes encarnados que, a partir do
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). transe inscrevem outras textualidades", comentou Rufi-
no. Essa tradução de resistência, e constante renovação
Visão de pesquisa que encontra similaridade de saberes e conhecimento traz um pensamento que
dentro da Epistemologia das Macumbas, uma proposta trata sobre sabedorias projetadas pela cosmovisão
desenvolvida em conjunto pelo historiador Luiz Antonio negro-africana, e seu transbordar para definir corpo,
Simas, autor de Pedrinhas Miudinhas: Ensaios sobre transe, conhecimento e identidade. A Epistemologia das
ruas, aldeias e terreiros, e por Luiz Rufino, autor de Histó- Macumbas tem sido apresentada em oficinas e cursos,
ria e Saberes de Jongueiros, e Doutorando em Educação principalmente em um terreiro, e os autores preparam
pelo PROPED/UERJ. "No que versamos como Epistemolo- um livro sobre o tema.
gia das Macumbas os tambores transcendem a dimen-
são de artefatos culturais para se manifestarem como O sopapo, como elemento e força central no Ala-
entes. Tambor é corpo e corpo é tambor, para nós o corpo bê Ôni, conduz um espetáculo que mistura cantos de
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INTEGRE SE
S I T E : R E V I S TA P E A B I R U . W I X . C O M / R E V I S TA P E A B I R U
FA N P A G E : FA C E B O O K . C O M / R E V I S TA P E A B I R U
U N I L A , F O Z D O I GU A Ç U , P A R A N Á , B R A S I L
E - M A I L : R E V I S TA . P E A B I R U @ G M A I L . C O M
Mais