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Universidade Federal Rural de Pernambuco

Departamento de História

Disciplina: História e Cultura Afro-Brasileira


Docente: Maria Emília Vasconcelos
Recife, 12 de abril de 2023
Discente: Marta Raquel Nascimento Oliveira

3ª Verificação de Aprendizagem

3- Discuta a partir de Elikia M’Bokolo sobre as formas de organização política, as principais


atividades econômicas e os aspectos culturais do Reino do Kongo.

M’BOKOLO, Elikia. África Negra: História e Civilizações. Salvador: EDUFBA;


SP:Casa das Áfricas, 2008. O Reino do Kongo, pp. 180-205

Elikia M’Bokolo é um historiador de grande relevância para historiografia


africana, tem seu foco de pesquisa sobre a História Moderna e Contemporânea da
África ao longo do tempo. Neste escrito a análise é do capítulo “O Reino do
Kongo” do seu livro “África Negra: História e Civilizações". M’Bokolo propõe a
construção de uma nova concepção para se enxergar o processo de fundação do
Reino do Kongo, buscando romper com a narrativa da história contada pela visão
colonial.

O historiador busca nas tradições orais a perspectiva local e linear para


analisar o reino do Kongo em conjunto com os aspectos sociopolíticos que
constituirão a base para formação desse reino. O autor apresenta muitas palavras
e termos mais particulares, mas sempre explica o significado e a relação por trás
de cada um. No contexto social, antes da fundação do reino, são expostos dois
sistemas: um baseado nas relações de parentesco ou de filiação, denominado
“Dikanda”, e outro baseado nas estruturas residenciais. Diante disso, precisa-se
pensar a fundação como um processo complexo e de variáveis versões.

M’Bokolo mostra também os aspectos econômicos ressaltando a importância


e a dinamicidade das zonas e as relações de troca em função de um comércio
ativo tanto no contexto local, como no regional. O historiador, diante do que foi
mencionado, propõe um questionamento em relação ao comércio desenvolvido, a
relevância das zonas e o mecanismo necessário para o surgimento do Estado.
Traz também os aspectos religiosos, e afirma a dificuldade de reconhecimento da
autenticidade da história religiosa devido ao processo de colonização.

A abordagem, na perspectiva da religião, mostra como as crenças estavam


divididas em duas partes opostas e na simbologia das cores branca e preta, na
qual o branco estava relacionada a morte e o mundo invisível, e o preto associado
aos vivos e o mundo “real”. Dessa visão de mundo surgiram três corpos de
crenças: uma ligada aos mortos; outra relacionada a umbumba e à fertilidade; e
uma última ligada aos espíritos demoníacos na relação do indivíduo e a sociedade
e do homem com a natureza.

Para M’Bokolo, essas diversidades , no que toca às questões de fé,


representam as diferentes organizações políticas que foram construídas antes da
formação do reino. Existiam as Kanda, que eram determinadas pelas relações de
parentesco e a ligação com os antepassados, além disso, o autor afirma que essa
estrutura estava inserida em um aspecto dinâmico, mas, contido em fatores de
permanências ou mudanças bruscas. Essas transformações refletiram
principalmente nas questões hierárquicas que não conseguiam se manter
totalmente solidificadas. Tinha-se também as chefeaduras, de essência religiosa,
que como a própria nomenclatura diz, associava-se o controle do território às
forças espirituais. No caso das chefeaduras, os bitoni seriam os responsáveis por
encarnar os poderes do macumba, e ficariam encarregados de manter a ordem na
população e de garantir a fertilidade para os homens, os animais e as plantas.

A simbologia dos bitomi estava associada ao fogo e ao ferro. Por está razão,
M’Bokolo afirma que os indivíduos que ocupavam essa posição eram ferreiros,
conduzindo para o período que o Reino já estava estabelecido, ele aponta que o
ferreiro ainda eram um ofício importante e, que em alguns casos, os reis Kongo
ainda eram associados a esse trabalho.

O autor vai informar que a concepção de bitomi não se estendia por toda parte,
em alguns outros lugares havia a predominância de outras instituições. Outra
organização política analisada pelo historiador são os chefados, que buscavam
sua legalidade nos antepassados e nos espíritos que os ajudassem na
manutenção da sua autoridade. Apesar da existência dessa organização, o autor
aponta que não significava necessariamente a formação de um Estado.

Para explicar a fundação do reino dois contextos foram analisados: o primeiro


tinha relação com o mito da fundação e se apoiava em narrativas ricas, mas que
para M’Bokolo não representavam a realidade em sua totalidade, pois se
apoiavam em um texto ideológico que buscavam fundamentar a formação de um
novo sistema político, mesmo com indivíduos em desacordo com tal situação.

A outra narrativa analisará a partir da origem de Nimi a Lukeni, considerado


fundador do reino. O autor irá reconhecer que é difícil estabelecer até onde vai o
mito e onde parte a história. Para ele, as fontes são tardias e raramente apontam
para um único caminho. Diante disso, precisa-se pensar a fundação como um
processo complexo e de variáveis versões.

A questão governamental no início do reino foi bem administrada, pois os


governantes conseguiram se estabelecer em um local estratégico e de grande
importância para o estabelecimento de um comércio com regiões periféricas,
entretanto, o historiador reconhece a existência de conflitos nessas áreas e o
pedido de ajuda do rei do Kongo aos portugueses recém chegados. De acordo
com M’Bokolo, a estrutura política existente conduziu para o desenvolvimento da
relação de províncias com o Reino Kongo.

Para Elikia M’Bokolo, o Estado Kongo estrutura suas bases em tradições


antigas, mas também em aspectos que visem a construção de um sistema
radicalmente novo. Economicamente falando, o Estado estava estabelecido em
uma condição diversificada, mas prevalecia o rudimentar sistema agrícola e o
artesanato dinâmico. Algumas fontes apresentadas são importantes para
reconhecer como era a composição da população deste reino. O autor apresenta
os indícios levantados por Bernardo da Gallo no século XVII e expõe para
existência de dois povos, um considerado imigrante e outros que já eram
pertencentes ao país.

No que diz respeito a permanências e mudanças, a análise feita por John


Thornton é um importante mecanismo para se compreender o sistema econômico;
no caso de continuidades são apontadas a economia aldeã e de modificações são
retratadas a economia urbana que se utilizava da mão de obra servil. Nesse
mesmo aspecto, M’Bokolo apresenta as questões referentes à realeza e
reconhece que eles tentaram administrar as tradições em conjunto com as
inovações, ao menos até o momento da cristianização do reino.

4- Discuta a partir de James Sweet sobre a demografia, distribuição e correntes da


diáspora para o Brasil.

SWEET, James. Recriar África: cultura, parentesco e religião no mundo afro


português (1441-1770). Lisboa: Edições 70, 2007. Cap.1: Demografia, Distribuição
e Correntes de Diáspora, pp. 29-48.

Formado em História, o professor James Sweet tem sua pesquisa voltada para os
aspectos sociais e culturais dos africanos e seus descendentes no mundo em geral.
Neste texto, que compõe o primeiro capítulo do livro “Recriar África: cultura, parentesco e
religião no mundo afro-português (1441-1770)”, refletindo sobre a demografia, distribuição
e correntes da diáspora para o Brasil.
No primeiro momento, é possível identificar como os escravos e as rotas demográficas
foram estabelecidas durante o tráfico de escravos no contexto colonial de Portugal nos
anos anteriormente citados, dando devida importância para os aspectos étnicos das
comunidades escravas que estavam estabelecidas no Brasil.
Sweet marca o início de sua obra narrando a captura de uma menina levada para
um navio negreiro com destino para o Brasil, evidenciando elementos da permanência
religiosa da menina, mesmo ela estando distante de seu lugar de origem e do contexto de
acusações feitas pelos (seus) senhores. O autor ainda mostra como se configurava as
relações de parentesco e os mecanismos culturais e religiosos dos escravos africanos já
estabelecidos na atmosfera luso-africana e, mesmo imersos num ambiente novo e com
situações conflitantes, eles preservavam suas origens e fortalecem seus valores diante
encontros de indivíduos pertencentes ao mesmo grupo.
Essas permanências eram muitas vezes utilizadas para provocar os
proprietários de escravos, ainda mais que determinados negociantes de escravos
fixaram sua atenção somente em uma região, fazendo com que ocorresse a reunião
de alguns indivíduos que compartilhavam os mesmos aspectos culturais. A atenção a uma
única região com escravizados pelos negociantes, possibilitava o encontro desses
indivíduos que se reconheciam devido seus aspectos culturais.
No entanto, Sweet ressalta numa análise a fim de compreender os aspectos étnicos
dos escravos que realizavam as diásporas, que na maioria das vezes os escravizados
acabam não compreendendo os aspectos étnicos do qual estavam relacionados. No
tópico “O tráfico de escravos no mundo colonial português 1441- 1770” é abordado as
diferentes fases do tráfico de escravos. Para o autor, essa e as demais fases têm relação
com o início de um novo século. A primeira fase iria de 1441 até 1521 e exportaria uma
quantidade significativa de indivíduos da costa da África para a Península Ibérica e as Ilhas
Atlânticas; a segunda fase começou por volta de 1518 e começa a redirecionar o comércio
de escravos que antes era da Europa e das Ilhas Atlânticas para as Américas. Essa
mudança na rota é vista como um instrumento importante para se ter mais lucros.
A terceira fase vai estabelecer os aspectos de predominância dos escravos da África
Central, que se tinha iniciado na fase anterior, aberta durante o século XVI e que teve sua
continuidade até o século XVIII. A expressiva participação de centro africanos no comércio
de escravos é apontada por Sweet como uma influência das guerras estabelecidas por
Portugal nessas regiões e a justificativa da venda dos prisioneiros como escravos.
Os aspectos que levaram para a última fase tem início num processo ocorrido no
final do século XVII que altera completamente essa dominância de escravos vindos da
África Central. A quarta fase ocorre do desvio de atenção da África Central para Costa da
Mina, por via Pernambuco e Baía, principalmente diante da descoberta de ouro em Minas
Gerais no século XVIII. Com a intensificação de tráfico de escravos da Mina é possível
afirmar uma alteração no contexto histórico da escravatura brasileira.
Com essas mudanças, Sweet reconhece que seria formado uma população africana no
Brasil, e enfatiza a necessidade em atentar para as mudanças demográficas, pois estas
não podem ser vistas como algo fixo, estático, mas deve-se considera as avaliações dos
processos de mudanças sociais e culturais que ocorreram ao longo do tempo e de maneira
gradual. Além disso, o historiador demonstra ter consciência sobre as diversidades
presentes nas populações africanas, entretanto, reconhece que essas diferenciações não
são obstáculos para a reinvenção de formas culturais africanas.
O autor explica detalhadamente, através da utilização de mapas e da sua pesquisa
como estavam organizadas as zonas culturais, quais eram suas delimitações territoriais e
os grupos que cada uma englobava. Apresenta a generalização feita pelos portugueses
ao tratarem todos os africanos como originários de um mesmo grupo ou como
representantes do grupo étnico que tinham sido comprados, quando não tinham suas
identidades criadas pelos europeus. No Brasil ainda buscou-se preservar as identidades
mais específicas, mas as designações mais regionais, como os indivíduos da África
Central e da Mina, ajudaram a elaboração de novas bases culturais nas comunidades
escravas.
Importante compreender que, até mesmo uma zona regional, tinha dezenas de
identidades e esse processo de edificação de uma identidade coletiva fazia referência à
situação migração forçada e do desenraizamento. Sweet evidencia o processo gradativo
de substituição dos indígenas escravizados por africanos escravizados, e deixa explícito
que não se deve entender que as transições acontecem da mesma forma para todos os
locais. Mesmo reconhecendo a importância das fontes observadas, Sweet crítica que
muitas delas escondem mais do que revelavam e que algumas, perante uma investigação
comparativa, eram bastante diferentes umas das outras.
Diante disso, o autor expõe a argumentação feita por Alden sobre as preferências de
compra dos jesuítas na década de 70 do século XVII, sugerindo que era preferível a
compra de escravos crioulos e mulatos, contudo, se debruça sobre as fontes para afirmar
que os registros da época mostravam outra coisa. Segundo os documentos, a presença de
escravos africanos nos engenhos era bem maior, e também, os preços desses eram mais
baratos do que os nascidos no Brasil.
James Sweet traça uma cronologia bastante explicativa sobre o tráfico de escravos no
Brasil e os grupos que se destacavam em cada período, além de trazer os aspectos da
“crioulização” e o papel das instituições religiosas. Acentuando a existência de uma maior
parcela de crioulos nas propriedades religiosas e afirmando que muitos crioulos eram
dados como esmolas ou heranças, identifica os religiosos como figuras participantes do
comércio de escravos, e como agentes que obtinham privilégios perante esse sistema de
doações e negociações.

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