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Resumo: O presente artigo discute a questão da utilização das histórias em quadrinhos nos
livros didáticos de história, a partir do conceito de cultura de massa. Procura demonstrar como
esse recurso didático aparece e qual a sua função, percebendo o mercado de livros didáticos
do Brasil como o maior do mundo e a influência que estas obras têm no ensino. Compreendo
o diálogo destas ferramentas com as novas abordagens históricas como imprescindível para
uma melhora na educação no Brasil, de modo a tornar atrativo o ensino para o discente e
ajudar o docente a dinamizar sua prática, visto as dificuldades que a carreira de professor
enfrenta no atual contexto brasileiro.
Palavras-chave: Livro Didático. Cultura de Massa. Ensino de História.
Abstract: This article discusses the question of Comics in didactic history books, being of
concept mass culture. Search to show how this didactical recourse appears and which they
function, noticing the Brazilian didactics book market as the biggest of the world and the
influence of these books have on teaching. Understanding the dialogue of this tools with the
new historiographical approaches as indispensable for improvement in the education of
Brazil, in order to become attractive the instruction for the student and help teachers
streamline they practice, seen the difficulties the career of teacher face in the current Brazilian
context.
Keywords: Didactical books. Mass Culture. Teaching of History
O livro didático de história tem sido objeto de constantes estudos. Essa afirmação
torna-se compreensível mediante apresentação de algumas informações. Tendo em vista que
possuímos o maior programa de livros didáticos do mundo1; uma ascensão da classe média,
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com maior poder de aquisição e um acesso ao ensino básico em massa; a precarização das
instituições escolares, que não estão preparadas para receber tantos alunos; desestímulo da
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FURG
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LUCA, Tânia Regina. Livro didático e Estado: explorando possibilidades interpretativas. In: ROCHA,
Helenice; REZNIK, Luis; MAGALHÃES, Marcelo (org.). A história na escola: autores, livros e leituras. Rio de
Janeiro: FGV, 2009.
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carreira docente e/ou má preparação nos cursos de licenciatura; entre outros fatores, nos
mostram a importância que o livro didático assume na sala de aula e o porquê desta
ferramenta ser constantemente problematizada e revista por aqueles que se preocupam com a
qualidade do ensino nas escolas do país. A partir de uma perspectiva histórica, portanto,
analisamos a construção do livro didático, de destacada importância na formação de muitos
brasileiros, e como a renovação das teorias e métodos de ensino e pesquisa historiográficos
estão sendo acompanhados.
Neste artigo em específico, pretendo discutir a utilização das histórias em quadrinhos
(HQ’s) nos livros didáticos de história. Compreendo estes dois objetos convergentes pelo
conceito de cultura de massa desenvolvido pelo sociólogo Umberto Eco, ou seja, produtos
lançados ao mercado para uma sociedade de massa, um modelo simplificado ou uma
reinvenção de aspectos culturais, principalmente europeus, que dialogue com os saberes e
conhecimentos de uma classe popular sem condições de acesso à dita “cultura erudita” e, ao
mesmo tempo, ávida por consumi-la. Em suma, uma cultura de mercado, para vender,
objetivando sempre estimular o consumismo exacerbado, em consonância com o sistema
capitalista.
Para essa tarefa, utilizei duas coleções de livros didáticos com propostas semelhantes
(História Integrada) e presentes no catálogo do mesmo ano (2011). Um terceiro livro, este
volume único, foi também utilizado a nível de uma maior abrangência do público atendido
(este, destinado ao Ensino Médio, antigo 2º grau, e as duas coleções anteriores voltadas para o
estágio final do ensino fundamental), da espécie de livro (enquanto os anteriores são séries de
livros, este engloba a História em somente um) e da metodologia e visões teóricas
empreendidas na elaboração da obra.
Assim, divido este artigo em três capítulos. O primeiro discute as Políticas
Curriculares Nacionais (PCN’s) e o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD); também
aborda a questão do livro didático e as HQ’s como cultura de massa. No segundo, parto para a
análise das obras em si, sob a luz da Análise de Conteúdo. Por fim, as considerações finais a
respeito do que foi exposto.
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Necessário é ressaltar o caráter incipiente desta pesquisa, tanto pelo tempo (pouco
mais de 3 meses) quanto pelo material analisado (e que devo agradecer, principalmente, ao
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essencialmente, é suscitar o debate sobre este aspecto pouco analisado nos livros didáticos de
história.
didático como um produto de massa, inserido na lógica de mercado, feito para atingir o maior
público possível e, assim, vender mais.
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Temos como início dos quadrinhos desenhos, separado por linhas retilíneas e de duas
ou mais divisões, presentes nos jornais dominicais norte-americanos do fim do século XIX.
Segundo Vergueiro, “os quadrinhos eram predominantemente cômicos, com desenhos
satíricos e personagens caricaturais.” (VERGUEIRO, 2009, pg.10). Ou seja, já surgem em um
veículo de massa por excelência – o jornal – como uma crítica à sociedade de então. No
século XX, com a popularização das histórias de aventura, passam principalmente para o
papel de difusor de uma ideologia, seu apogeu com o sucesso do Superman e sua luta contra o
mal, em defesa da justiça. Seu surgimento, durante a Segunda Grande Guerra, é substancial.
No período pós-guerra encontra-se uma resistência ao crescimento do mercado dos
quadrinhos. Ligando essa produção à distúrbios psicológicos entre os jovens, Frederic
Wertham, formou gerações de educadores resistentes à inclusão das HQ’s no espaço de
ensino e desestimulou os pais a incentivarem seus filhos a lerem gibis, revistas ou charges,
com medo dos malefícios. A influência do psicólogo alemão foi tal que levou a Comics
Magazine Association of América criar um Comics Code, estabelecendo regras para a criação
das histórias. Isso foi seguido por outros países do mundo, inclusive o Brasil, cujo primeiro
código é de 1974.
O redescobrimento das HQ’s se dá nos anos 80, com a maior difusão de meios de
comunicação e pesquisas no campo da psicologia, que vão desmistificando as acusações de
Wertham. Circulando entre os mais variados meios da sociedade, direcionado á massa, com
um grande alcance principalmente entre os jovens, as histórias em quadrinhos emergem como
elementos na formação do indivíduo no século XXI.
1.3 – Convergência masscult: livros didáticos e HQ’s.
Os quadrinhos aparecem nos livros como recurso didático. Seja para facilitar a leitura
de um período, ilustrar um conceito, sátira etc. Ou seja, uma linguagem a ser vista, decifrada e
problematizada pelo aluno, com fins de lançar um olhar diferenciado sobre a representação
histórica. Dialoga, assim, com o movimento de renovação proposto por Vesentini nos anos 80
e apontado por Selva: “[...] renovação dos conceitos e as explicações; pela seleção de
documentos; pela renovação da linguagem.” (VESENTINI In FONSECA, 2006, pg. 56).
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Por trás do emprego das HQ’s na didatização, está também o caráter de massa:
destinar ao público (no caso, os discentes) um material que seja aceito por eles. Não obstante,
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o livro tem de passar pelo crivo do Estado e do professor antes de chegar ao aluno. Por
motivos que apontamos antes, no que se destaca a democratização do saber, o manual que
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Pela popularização das HQ’s, nota-se a identificação dos jovens com os ícones da
cultura de massa, sendo essas ferramentas utilizadas no ensino também um modo de despertar
o interesse do aluno. A cautela é necessária. O uso das HQ’S não deve ir além de mais uma
ferramenta. É a conjunção de variados materiais que permitirão ao professor uma aula rica e
que atenda às demandas da sociedade brasileira.
2. As coleções: uma análise de conteúdo.
Partindo do exposto anteriormente, passamos à análise dos livros. Mesclando textos,
imagens e dados, pretendo ampliar o leque de possibilidade de entendimento do texto, bem
como apresentar o maior número de informações possível.
A primeira coleção que analisei denomina-se “Projeto Radix”. Elaborado por Cláudio
Vicentino, aparece no guia 2011 da PNLD, editado pela Scipione, ligada ao Grupo Abril e
destinado do sexto ao nono ano do ensino fundamental. Apresenta-se com a proposta da
“História Integrada”, qual seja:
Outro fator que merece destaque, segundo o guia, é o projeto gráfico da coleção, que
torna-o uma “situação convidativa ao estudo de História”. Isso se deve, provavelmente, ao
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intenso trabalho de manejo com desenhos, pinturas, fotos e documentos que o livro realiza, de
modo a facilitar e ao mesmo tempo instigar a decodificação das mensagens por parte do leitor.
Porém, não de modo excessivo, sem a caricaturização do saber histórico.
A segunda coleção analisada chama-se “Para entender a História”, de João Tristan
Vargas e Divalte Garcia Figueira, editado pela Saraiva e destinado ao público estudantil do
sexto ao nono ano do ensino fundamental. Também trabalha com a proposta de História
Integrada. Porém, o que o diferencia do Projeto Radix é justamente o projeto gráfico da obra e
a metodologia de elaboração: esta coleção preza pelo texto cronológico e sequenciado, com
fatos e pinturas apenas a nível de ilustração. Isto torna o conteúdo maçante para o discente e
de difícil manuseio pelo professor, sem muitas atribuições como ferramenta didática além do
fornecimento de alguns dados. Porém, não necessariamente o livro exclua atividades inter e
transdisciplinares: ao fim de cada livro, há um manual para o professor, explicando como
utilizar outros materiais – cinema, música, televisão, jornal e história em quadrinhos (todos
produtos de massa) - , além de, durante o texto, usar como ilustração HQ’s e charges. O uso
destas dialoga, em forma e conteúdo, com o Projeto Radix, no entanto em menor quantidade.
Nota-se o fator de proximidade teórica das duas coleções. Isto será melhor demonstrado no
tópico seguinte.
O terceiro livro, “História Global: Brasil e Geral”, de Gilberto Cotrim, editado pela
Saraiva, aparecendo no guia de 2009 do PNLEM (variante do PNLD para o Ensino Médio),
também trabalha na perspectiva da “História Integrada”, porém de forma diferente dos outros
dois. Por tratar-se de volume único, tem de transcrever, em uma tarefa hercúlea, toda a
história da humanidade. Isto mina a possibilidade de um texto que instigue o aluno à reflexão,
não escapando ao puro relato dos fatos sob uma ótica materialista. Os exercícios propostos
pelo livro também recorre à métodos tradicionais, ou seja, o aluno deve responder de acordo
com o que aprendeu até aquele momento – em outras palavras, o que o livro didático lhe
ditou. Não apresenta HQ’s em momento algum da obra.
2.1 – Quantificação: Mafalda, Asterix e André Diniz.
O Projeto Radix destaca-se na pluralidade de técnicas e opções que oferta ao
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professor. No que refere-se aos quadrinhos, o livro do 6º ano utiliza-os desde o primeiro
capítulo. Analisemos esta tirinha do cartunista Quino:
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Figura 1: Mafalda, de Quino. No quarto quadrinho, Mafalda "lembra" o carneiro, contando mais
alto, que ele deve pular a cerca.
É proposta uma atividade em cima desta HQ, sobre o processo de alienação que a
televisão causa. Ao longo do livro, diversas charges e cartuns desempenham semelhante
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função: uma sátira a determinada época. Assim, o aluno desprende-se do campo político e/ou
econômico, refletindo sobre a história, decifrando a mensagem que o autor que passar através
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comentário, dispara críticas ácidas à sociedade moderna (as primeiras tiras são dos anos 60)2
e, especialmente, à ditadura militar na Argentina.
Semelhante papel cumpre “Asterix e Obelix”. Este aparece também na coleção “Para
Entender a História”. Nas duas coleções, o tema abordado é a “Idade Antiga” (no caso do
“Projeto Radix”, os povos da Mesopotâmia; em “Para Entender a História”, o Império
Romano). A HQ abaixo é a presente no Projeto Radix:
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Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Mafalda, acesso em 29/07/2013.
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Figura 3: Asterix e Obelix, de Albert Uderzo e René Goscinny. Nesta tirinha, os gauleses, em
viagem pelo deserto da Mesopotâmia, encontram vários povos em conflito.
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Além disso, é proposto pelo livro uma atividade em cima desta HQ. Um dos
questionamentos feitos ao aluno é se os povos representados na tira – assírios, hititas, acádios
– poderiam realmente ter habitado tal região – o deserto da Mesopotâmia. Segundo Vilela, “os
quadrinhos, por exemplo, podem ser utilizados pelos professores para trabalhar o conceito de
tempo e suas dimensões: sucessão, duração e simultaneidade” (VILELA, 2009, pg. 107).
Além de ilustrar aspectos da vida social de comunidades passadas, uma atividade que
proponha leitura mais profunda das HQ’s pode ajudar o aluno a perceber que, também, o
autor da HQ transmite uma mensagem, e a História que ali aparece, mesmo sendo uma
representação de uma época anterior à que o autor viveu, sempre trará informações sobre o
tempo contemporâneo que o desenho foi feito. Isto é particularmente presente em Asterix e
Obelix, onde os povos antigos da Europa são caricaturas dos emergentes Estados Nacionais
europeus dos séculos XIX e XX.
Dentre outras HQ’s que aparecem, escolhemos essas duas como exemplos para
mostrar o que é feito quando HQ’s e livros didáticos convergem em um mesmo espaço.
Por fim, gostaríamos de destacar a referência à André Diniz, cartunista brasileiro que
elaborou uma coleção de HQ’s contando momentos da história mundial. No “Projeto Radix”,
há a indicação, como material de leitura complementar para o aluno, duas das obras de Diniz,
sobre a Revolta de Canudos e outra sobre a Primeira Guerra Mundial. Estas indicações
aparecem no livro destinado ao 9º ano. 842
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3. Considerações Finais.
Por se tratar de uma pesquisa incipiente que deve ser continuada, não apresentamos muitas
respostas, talvez mais perguntas. Porém, podemos notar que os livros mais recentes estão
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aprendendo a lidar com essas novas abordagens historiográficas, cometendo alguns deslizes,
necessários para o aperfeiçoamento da utilização dessa ferramenta.
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Referências Bibliográficas:
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