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O Crime da Galeria

de Cristal: e os dois
crimes da mala, São
Paulo, 1908-1928
João Pedro Ferreira dos Santos
Boris Fausto
Historiador, também formado em direito, professor aposentado
do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo
(USP) e membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC). Nascido
em 1930, em São Paulo, onde ainda reside, o pesquisador tornou-se
uma grande referência em estudos de história que envolvam a
criminalidade.

Entre as obras de destaque do historiador estão A Revolução de


1930 – historiografia e história, publicada pela primeira vez em
1970, e História geral da civilização do Brasil, escrita em parceria
com Sérgio Buarque de Holanda, uma coleção em 11 volumes,
publicada nos anos 1990, sobre a história do país, desde a colônia
até 1964.

Últimas Obras

O crime do restaurante chinês: Carnaval, futebol e justiça na


São Paulo dos anos 30, Companhia das Letras, 2009.
Memórias de um historiador de domingo, Companhia das
Letras, 2010.
O Brilho do Bronze, Cosac Naify, 2014.
O crime da galeria de cristal, Companhia das Letras. 2019.
Vida, morte e outros detalhes, Companhia das Letras. 2021
O Crime da Galeria de Cristal:
e os dois crimes da mala, São
Paulo, 1908-1928
Editora: Companhia das Letras;

Ano, 2019;

O livro é separado em duas partes:

O Crime da Galeria Os dois crimes da


de Cristal Mala

Dentre tantas possibilidades de crimes. Por


qual motivo esses?

Posição de dastaque das mulheres, assim


como de imigrantes;
Instituição de júri popular;
Papel da imprensa.
Os dois Crimes da Mala
Por qual motivo 'Crime da Mala'?

O Primeiro Crime da Mala (1908) O Segundo Crime da Mala (1928)

Assassinato de seu empresário pelo 20 anos após o primeiro crime;


funcionário;
Marido mata a esposa;
Amor do funcionário pela esposa do patrão;
Possível traição;
Algumas dúvidas sobre a veracidade de um
romance; População muito divida em relação ao
assassino;
Empatia pelo assassino.
Questão em torno dos imigrantes = violência.
Romantização do crime

Ora a mulher agente passivo, ora agente ativo do crime.


Contexto da conjuntura de São
Paulo
Belle Époque: período precedente a
Primeira Guerra;

Aceleração do ritmo da vida;

Expansão rápida da demografia de São


Paulo

imigração e descontrole social

"Em 1872, a cidade tinha apenas cerca de 31


mil habitantes, chegando a quase 240 mil na
virada do século. Quinta cidade do país em
1890, atrás de Rio de Janeiro, Salvador, Recife
e Belém, São Paulo passou ao segundo lugar Inauguração de bonde no Bom Retiro, em 1900.
em 1900" (p. 12).
Imagens de São Paulo na primeira década do
século XX

v
Cine Bijou Theatre, na rua de São João, por volta de 1911.
Rua João Brícola, sede de jornais, entre 1915 e 1920.
Acima, ao fundo, o Fanfulla, órgão da colônia italiana. No
topo da página, O Estado de S. Paulo, 1904
Os principais personagens do
Crime da Galeria de Cristal

Albertina Barbosa Arthur Malheiros Elizário Bonilha


(22 anos) (25 anos) (21 anos)
Professora Advogado Professor
O desenrolar do Crime da Galeria
de Cristal
Terça-feira, 24 de fevereiro dia de Carnaval;

Elizário Bonilha encontra Arthur Malheiros na rua, e


o convida para ir ao Hotel Bella Vista para falar de
negócios;

"Os dois moços subiram o lance de escadas e pararam diante do


quarto 59. A porta do quarto estava apenas encostada, e
Bonilha fez um gesto delicado, quase uma mesura, convidando
Malheiros a entrar. De repente, o jovem bacharel se viu diante
da figura de Albertina [...] a moça tinha nas mãos um revólver
apontado na direção dele [...] Tratou de virar-se em direção à
porta, mas ouviu dois estalidos. Teve uma sensação muito
dolorosa na cabeça e mais nada, ao cair sobre um tapete do
quarto. Não sentiu nem mesmo a dor produzida pelo riscar de
uma faca, com a qual alguém tentava seccionar sua garganta"
(FAUSTO, 2019, p. 19)

Hotel Bella Vista (1909)


Imagens do crime

Cena imaginária do crime: Albertina atira de frente. O Reconstrução da cena. Edição de O Commercio de São
Commercio de São Paulo, 25 de fevereiro de 1909 Paulo de 27 de fevereiro de 1909.
Imagens do crime

v
Malheiros no necrotério. Revista Careta, 6 de março de
1909.
Eliziário Bonilha se encaminha ao carro de presos. O
Malho, 6 de março de 1909.
O que motivou o crime?
"A cena sangrenta do quarto 59 do Hotel Bella
Vista foi o desfecho de uma longa história iniciada
quatro anos antes, na casa de Rosa da Silva Oliveira, mãe
de Albertina, na rua Bento Freitas, próxima à praça da
República. Separada do marido, para manter-se ela
alugava um dos quartos da casa a um hóspede, de nome
Antônio Malheiros. A certa altura do ano de 1904, este
precisou mudar-se para o Rio de Janeiro, e indicou para
ficar em seu lugar um sobrinho, Arthur Malheiros,
apresentado como “um moço muito distinto”. O moço
podia ser muito distinto, mas a distinção não ia ao
ponto de ser infenso às atrações do sexo. Seu interesse
logo se voltou para Albertina, que, sem ser bela, tinha seus
encantos. Os dois se aproximaram, passaram das mãos
dadas aos afagos, destes aos beijos ardentes e, por fim, às
relações sexuais. Anos mais tarde, Albertina lembraria
ainda a data de seu defloramento, ocorrido na noite de
12 para 13 de agosto de 1904, segundo ela." (p. 30)

Ambição desenfreada de Arthur Malheiros;


Gravidez - roda dos expostos;
Ferimento da honra e questões familiares, afasta-se de
casa e roda o interior paulistano dando aulas e acaba Pensão da rua Bento Freitas, onde Albertina e Malheiros
conhecendo Elizário em Batatais (SP) em 1909. começaram um romance. Revista Careta, 6 de março de 1909
A vendetta de Albertina
Albertina e Elizário estabelecem um relacionamento e casam no mesmo ano
de 1909;

Necessidade de salvar a honra;

Duas versões do crime

A versão de Albertina expõe o A versão de Elizário expõe Albertina


desagrado de Elizário ao saber do relato, como um agente ativo, que a vontade de
cogitando cancelar o casamento. Logo, é matar Arthur Mlaheiros partiu
necessário retomar sua honra. totalmente dele e ele apenas acatou.

Inversão dos papéis de genêro


O papel coadjuvante de Elizário prestabelecidos
ajuda a construir o crime.
Imagens do enterro de Arthur Malheiros

v
Comoção das elites - Cortejo fúnebre e enterro de Malheiros. Revista Careta,
6 de março de 1909.
A importância da imprensa
Vital para a construção da obra;

Imprensa formadora de opinião;

O Correio Paulistano, O Estado de São


Paulo, O Commercio de São Paulo, além
de mencionar o jornal O Paiz do Rio de
Janeiro;

Jornais extremamente políticos VS ascensão


dos Fait Divers - cinematógrafo;

Disputa de narrativas - até mesmo


gerando conflitos entre estados

"O censo nacional de 1920 revelou que a


população letrada do estado de São Paulo
não passava de 30%, número que se elevava
bastante na capital, chegando a 58%" (p. 10).
Charge do jornal carioca O Paiz sobre a “onda de
crimes em São Paulo”, 10 de março de 1909.
A imprensa e o júri popular
Divisão do processo de Albertina e Elizário;

Instituição de um júri: homens da elite

Sensacionalismo e cobertura total do


crime assim como do processo;

Polarizações e comoções;

Ser mulher: Júlia Lopes de Almeida e


Carmen Flores;

Ataques a integridade feminina da


acusada - as duas gravidezes de Albertina;
Presídio Tiradentes. Mais tarde, o local abrigou
Jornais seguiam de acordo com as presos políticos.
aprovações do júri. (conservadores x liberais).
Ainda sobre o processo
Albertina passa por 5 julgamentos
(1909-1911): Alega-se Estado de perturbação dos
1 - absolvição por unanimidade; sentidos e da inteligência.
2 - condenação de 25 anos e 6 meses;
3 - absolvição A paixão é clinicamente vista como
4 - absolvição por empate uma patologia.
5 - absolvição por unanimidade.

Elizário, foi julgado apenas uma vez (1911);

Absolvido com 7 votos - não foi reconhecido como co-réu do crime;

Pela falta de empatia gerada em torno de sua figura, a decisão foi criticada
pelo Correio Paulistano.
Considerações finais
'[...] honra ou vingança são valores
próprios de seu próprio tempo (p. 73-
74);

UM ASSASINATO SEM CULPADOS;

A lembrança e o poder da opinião


popular, como agentes importantes;

Importância da micro-história

Paralelo com nossa realidade, nossa


atual conjuntura.
Presídio Tiradentes. Mais tarde, o local
abrigou presos políticos.
Referências Bibliográficas:
FAUSTO, Boris. O crime da Galeria de Cristal: e os
dois crimes da mala São Paulo, 1908-1928. São Paulo:
Companhia das Letras, 2019.
LESZCZYNKI, Taynara; BORBAR, Maria Salete.
História, literatura e criminalidade: um olhar sobre O
Crime da Galeria de Cristal, de Boris Fausto. Outra
Travessia 30: PPGH-UFSC, Santa Catarina, 2023. pp.
191 - 197.

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