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Tudo o que é belo tende a ser simples. Afirmação generalizada? Não sei. O
que sei é que a beleza anda de braços dados com a simplicidade. Basta
observar a lógica silenciosa que prevalece nos jardins. Vida que se ocupa de
ser só o que é.
Não há conflito nas bromélias, não há angústia nas rosas, nem ansiedades
nos jasmins. Cumprem o destino de florirem ao seu tempo e de se despedirem
da vida quando é chegada a hora. São simples.
Já dizia o poeta: “Simplicidade é querer uma coisa só”. Eu concordo com ele.
O muito querer nos deixa complexos demais. Queremos muito ao mesmo
tempo, e então nos perdemos no emaranhado dos desejos. Há o risco de que
não fiquemos com nada, de que percamos tudo.
Aquele que muito quer corre o risco de nada ter, porque o empenho e o
cuidado é que faz a realidade permanecer. O simples anda leve. Carrega
menos bagagem quando viaja, e por isso reserva suas energias para apreciar
a paisagem. O que viaja pesado corre o risco de gastar suas energias no
transporte das malas. Fica preso, não pode andar pelo aeroporto, fica privado
de atravessar a rua e se transforma num constante vigilante do que trouxe.
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Dar presentes aos complicados é um desafio. Não sabemos o que eles
gostam, porque só na simplicidade é possível conhecer alguém. Só depois
que as máscaras caem pelo chão e que os papéis são abandonados a gente
tem a possibilidade de descobrir o outro na sua verdade.
Eu gostaria de me livrar de meus pesos. Queria ser mais leve, mais simples.
Querer uma coisa só de cada vez. Abandonar os inúmeros projetos futuros
que me cegam para a necessidade do momento. Projetos futuros valem a
pena, desde que sejam simples, concretos e aplicáveis. Não gostaria que a
morte me surpreendesse sem que eu tivesse alcançado a simplicidade. Até
para morrer os simples têm mais facilidade. Sentem que chegou a hora, se
entregam ao último suspiro e se vão.
Nossa oração revela nossa maneira individualista na relação com Deus, onde
percebemos a carência de uma vida mais comunitária, de relações sinceras
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para com o próximo. Há escassez de intercessão pelo próximo, pede-se para
si mesmo, não há espaço para inclusão do outro.
John Piper comenta: “Ora, o que este versículo aparentemente simples nos
diz? Entendo que a palavra tesouro significa “o objeto amado”. E a palavra
“coração” entendo que significa “o órgão que ama”. Por isso, leio assim este
versículo: “Onde estiver o objeto que você ama, ali estará o órgão que ama”.
Se o objeto de seu amor é Deus, que está no céu, o seu coração estará com
ele no céu. Você estará com Deus. Todavia, se o objeto de seu amor é o
dinheiro e as coisas da terra, o seu coração estará na terra. Você estará na
terra, separado de Deus.”
Em nossa relação com pai eterno não somos privados de planejar e viver de
forma digna e até viver de forma estável financeiramente. No entanto, a
prioridade é que faz o diferencial. Nosso coração deve estar enraizado nos
valores do Reino, na prática da justiça, simplicidade e verdade.
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Por fim, devemos optar por uma vida mais simples. Viver como Jesus viveu,
andar como ele andou. Que possamos aborrecer a soberba da vida, o
ajuntamento de bens, o individualismo, valorizar a vida comunitária, na
partilha, na busca e cultivo das coisas mais simples da vida. Que o
contentamento seja nosso árbitro. “Porque nada trouxemos para este mundo,
e manifesto é que nada podemos levar dele” (1 Tm.6.7).
“Porque zelo por vós com zelo de Deus; visto que vos tenho preparado para
vos apresentar como virgem pura a um só esposo, que é Cristo. Mas receio
que, assim como a serpente enganou a Eva com a sua astúcia, assim também
seja corrompida a vossa mente e se aparte da simplicidade e pureza devidas
a Cristo” (2 Coríntios 11:1-3).
Para Jesus deixar o céu e vir habitar entre os homens, ele se tornou simples,
esvaziando-se de toda a glória que possuía junto ao Pai. Declinou de aparecer
entre os homens como Deus, embora ele fosse igual a Deus. Renunciou a
posição que ocupava na glória do Pai, para se tornar na terra um simples
servo, que se dispôs a lavar os pés de homens que ambicionavam ser os mais
importantes em seu grupo. Deixou de apresentar-se como um que é
semelhante a Deus, para tornar-se “em semelhança de homens”. Não se
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apresentou como Filho de Deus, mas, sim, como filho do homem. Quando
poderia governar e ser o mais forte, tornou-se o obediente Filho, mesmo que
isso viesse a lhe levar à morte, e morte de cruz.
Desde o seu nascimento até a morte, Jesus foi um homem simples. Ao nascer,
teve por berço uma manjedoura em um humilde estábulo emprestado aos
seus pais. Viveu em um lar humilde. Não ambicionou as coisas materiais, nem
mesmo todos os reinos da terra, na oferta que Satanás lhe fez. Ao homem que
queria segui-lo, falou: “As raposas têm seus covis, e as aves do céu, ninhos;
mas o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça” (Luc. 9:58).
Em certa ocasião, Jesus chamou o povo para ver o que eles não viam ao seu
redor: “Considerai como crescem os lírios do campo: eles não trabalham, nem
fiam. Portanto, não vos inquieteis, dizendo: Que comeremos? Que
beberemos? Ou: Com que nos vestiremos?” (Mateus 6. 28, 31). Com essas
palavras, ele trouxe o maior ensino sobre a fé em Deus. Após, enuncia, em
uma simples frase, a lei áurea do viver em simplicidade: “buscai, pois, em
primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão
acrescentadas” (v 33). Nós não precisamos nos esforçar para buscar o reino,
ele nos é oferecido. Não precisamos construir esquemas, fórmulas, sistemas
ou planejamentos para alcançá-lo. É só recebê-lo. Em outras palavras, Jesus
diz: “Sejam simples, não compliquem as coisas, apenas ponham o reino em
primeiro lugar nas suas vidas e as demais realidades necessárias virão com
ele”. Assim, a primeira atitude para alcançar uma vida abundante é buscar o
reino de Deus em primeiro lugar, ou seja, colocar-se sob o governo de Deus.
Esse é o segredo que Jesus nos revela em poucas e simples palavras.
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O salmista mostra simplicidade diante de Deus, dizendo: “Senhor, não é
soberbo o meu coração, nem altivo o meu olhar; não ando à procura de
grandes cousas, nem de cousas maravilhosas demais para mim” (Salmo
131.1). A vida cristã é simples, o evangelho cristão é simples, a fé cristã é
simples, nós é que os complicamos. Muitas vezes, andamos atrás de grandes
espetáculos e queremos ver grandes maravilhas. Deus não está interessado
em apresentar shows e encenações ao público. Ele age de acordo com suas
determinações, que, em geral, são bem simples.
Jesus ensinou com toda a sobriedade. Nunca ele fez para seus ouvintes
reflexões teológicas ou filosóficas do mais alto teor. Um dia, na companhia dos
discípulos, ele passou por uma figueira que secara desde a raiz. “Então,
Pedro, lembrando-se, falou: Mestre, eis que a figueira que amaldiçoaste
secou. Ao que Jesus lhes disse: Tenha fé em Deus” (Mar. 11:20-22). E, assim,
pelo ato feito e pela palavra simples, Jesus deixou a grande lição sobre a fé e
de onde ela se origina. Exemplo de simplicidade pedagógica!
A Igreja primitiva, tal como encontramos em Atos dos Apóstolos, era bem
simples, não possuía templos para instruir o grande número de novos
convertidos sobre como viver, em cada dia, a nova vida em Cristo. Ela
dispunha, apenas, das casas dos discípulos, e ali, num pequeno grupo, era
repartido o ensino recebido. Eles “partiam o pão de casa em casa” (Atos 2:46).
Não buscavam grandes sermões. Simplesmente “perseveravam na doutrina
dos apóstolos” (v 42). Perseveravam, também, “na comunhão, no partir do pão
e nas orações”. Então, ocorria que “muitos prodígios e sinais eram feitos por
intermédio dos apóstolos” (v 43). A vida dos discípulos era extremamente
despojada: “Vendiam as suas propriedades e bens, distribuindo o produto
entre todos, à medida que alguém tinha necessidade” (v 45). E o grande
testemunho sobre a maneira deles viverem está em Atos 4.32: “Da multidão
dos que creram era um o coração e a alma. Ninguém considerava
exclusivamente sua nem uma das cousas que possuía; tudo, porém, lhes era
comum”.
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Impressiona-nos a revelação que Paulo possuía das verdades eternas.
Entretanto, ele as transmitia com humildade. Ele mesmo testemunha a forma
como a expunha: “Eu, irmãos, quando fui ter convosco, anunciando-vos o
testemunho de Deus, não o fiz com ostentação de linguagem ou de sabedoria.
Porque decidi nada saber entre vós, senão a Jesus Cristo e este crucificado.
E foi em fraqueza, temor e grande tremor que eu estive entre vós. A minha
palavra e a minha pregação não consistiram em linguagem persuasiva de
sabedoria, mas em demonstração do Espírito e de poder, para que a vossa fé
não se apoiasse em sabedoria humana e sim no poder de Deus” (1 Cor. 2:1-
5).
Deus não nos quer pobres ou miseráveis, remediados ou ricos, Deus quer que
vivamos em simplicidade de vida sob qualquer situação, miseráveis, pobres
ou ricos. Por quê? Porque é na simplicidade de vida que estaremos livres de
inúmeros problemas. Exemplo: a ansiedade. Ela vem ao coração do pobre e
do remediado, como vem ao coração do rico. A atitude que revela que vivemos
em simplicidade é a de receber tudo como um dom de Deus e ser a ele
agradecidos e nele confiar, e nele nos regozijar. Precisamos viver pela graça,
mesmo quando se trata do “pão nosso de cada dia”. Se Deus tem elementos
simples para nos dar, como a água, o ar, a luz solar, como não nos dará com
eles tudo o mais de que necessitarmos? Precisamos confiar sempre no
gracioso cuidado de Deus para conosco. O profeta ensina: “Bendito o homem
que confia no Senhor e cuja esperança é o Senhor” (Jer. 17:7).
Deus tem valores para enriquecer nossas vidas e eles são simples. Por
exemplo: o amor. O amor, vindo de Deus, é simples. Mas, quando agregamos
a ele outras coisas, como desejos carnais, paixão, egoísmo etc., ele perde seu
valor positivo de simplicidade e cai na lista dos pecados que não podemos
esconder dos olhos de Deus. Paulo, escrevendo aos romanos, adverte-os: “O
amor seja sem hipocrisia” (Rom. 12:9). Hipocrisia é um adendo que, se
colocado junto ao amor, fere a sua maior expressão.
A igreja, hoje mais do que nunca, precisa ser simples. Ela, que nasceu
simples, precisa voltar à simplicidade inicial. Há muitas coisas que atestam
como a igreja complicou-se no decorrer dos anos. Trago apenas um exemplo:
o preparo dos seus obreiros. As denominações constroem grandes
Seminários, Faculdades de Teologia e, até mesmo, agrega-os às
Universidades. Para isso necessitam construir grandes prédios, arregimentar
teólogos com doutorado para formar o corpo docente etc. etc. e assim fogem
da simplicidade do ensino de Jesus, que encontramos em Mateus 9.38:
“Rogai, pois, ao Senhor da seara que mande trabalhadores para a sua seara”.
Rogar ao Senhor da seara é uma atitude de simplicidade, mas a única capaz
de arregimentar os que serão exímios servos na seara do nosso Senhor.
Irmãos, poderíamos continuar vendo muitas coisas mais que precisam ser
mudadas para sermos simples como Jesus o foi em sua vida e em seu
ministério terreno. É preciso se, pessoalmente e coletivamente como Igreja,
como ele foi. Encerro, dizendo que a maior e a mais extraordinária verdade
anunciada no mundo, a verdade das verdades, maior do que ela não existe
em todo o universo, foi enunciada em uma forma extremamente simples:
“Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito,
para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (João 3.16).
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3. VIDA SIMPLES NOS DIAS DE HOJE
Quando olho para Jesus, o vejo sensível aos miseráveis, pobres, cegos e nus.
Jesus sempre se importou com os párias da sociedade. Ele curou aleijados,
cegos, leprosos, perdoou a adultera arrependida, ressuscitou mortos, pregou
o evangelho do Reino, ensinou que o amor supera tudo, inclusive o
preconceito que existe em tantas igrejas chamadas evangélicas onde
maltrapilhos não entram. Jesus não tolerava os ‘almofadinhas’ da religião: os
escribas, saduceus e fariseus. Ele os condenava veementemente e os
chamava de sepulcros caiados e hipócritas. Eram bem trajados, bonitos por
fora, mas por dentro eram podres, malcheirosos. Como precisamos aprender
com o Mestre a ser humildes e mansos de coração; a chorar com os que
choram; a levar as cargas e não os cargos uns dos outros; a abençoar os que
nos amaldiçoam; a amar os que nos odeiam; a repartir o pão, o espaço, a fé,
a alegria com os mais necessitados; a verdade com os que vivem no erro; a
convicção com quem vive de opinião; a mostrar o caminho com quem está
perdido. Sim, Jesus era simples. A Sua vida era uma vida de autenticidade.
Vida de integridade.
Jesus nos ensinou que devíamos ser simples como as pombas e prudentes
como as serpentes, isto é, sermos como Ele. Como nos ensina João, “a
andarmos como Ele andou” (1 João 2.6). O Pai se agrada muitíssimo quando
buscamos a semelhança com o Seu Filho Jesus, quando vivemos a Sua
simplicidade neste mundo ‘sofisticado’ e ‘alienado’. Sim, vivermos a
simplicidade que ama, perdoa, abençoa, encoraja, edifica, fortalece, reparte,
inspira, motiva, alimenta, ora, enfim, faz tudo o que Ele ensinou. Sigamos e
sirvamos a Cristo com a Sua simplicidade. Busquemos uma vida simples, uma
vida cheia de atitudes e ações que realmente valem a pena. As pessoas no
mundo precisam ver Cristo, a Sua simplicidade e o Seu amor em nós. Sejamos
como Ele. O Pai pelo Espírito tem todo o poder para nos fazer assim. Que
realmente assim seja para a Sua Glória!
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