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Slide 1: Importância das Narrativas Orais na Identidade Africana

Título: Narrativas Orais e Construção da Identidade Africana


● Introdução à relevância das narrativas orais na literatura africana.
● Transmissão de conhecimentos, valores e cultura através da oralidade.
● Impacto da colonização na cultura e a busca pela reconstrução.

Slide 2: Vozes da Tradição: Preservação Cultural


Título: Narrativas Orais como Guardiãs da Cultura Africana

Cresci nesse ambiente de mestiçagem, escutando os velhos contadores de histórias. Eles


me traziam o encantamento de um momento sagrado. [...]
Eu queria saber quem eram os autores daquelas histórias e a resposta era sempre a
mesma: ninguém. Quem criara aqueles contos haviam sido os antepassados, e as histórias
ficavam como herança dos deuses. [...]
COUTO, Mia. "Águas do meu princípio." In: Pensatempos: textos de opinião. Lisboa:
Caminho, 2005. p. 147-151.

Slide 3: Oralidade na Literatura Contemporânea

Título: Adaptação da Oralidade na Literatura Escrita

● Incorporação de elementos orais por escritores em suas obras.


● Relação entre narrativas orais e construção de identidade literária.
● Preservação da autenticidade cultural através da escrita.
● Angola é composta por nove grandes grupos étnico-linguísticos, rica diversidade se
manifesta na oralidade em diversas classes principais: Misosso, Maka, Ma-Lunda ou
Mi-Sendu, Ji-Sabu, Mi-Imbu e Jl-Nongo Nongo.

Slide 5: Desafios, Resgate e Preservação da Identidade Cultural

Título: Literatura Nacional e Unidade Nacional

● Oralidade como veículo de identidade cultural.


● Em 2005, o índice de analfabetismo em Moçambique corresponde a 53,50% da
população. Em Angola, a 33,20%
● Relação entre literatura oral e escrita em meio a desafios como o analfabetismo.
● Transformação das vozes populares em literatura como resgate da identidade
autêntica.
A Importância das Narrativas Orais na Construção da Identidade Africana na
Literatura

Fruto da oralidade, forma tradicional do povo africano passar de geração a geração seus
conhecimentos, a literatura africana em língua portuguesa nasceu como uma espécie de
“grito ao mundo”, grito de um povo vitimado e abandonado pelo processo de colonização.
Nasceu também, como um meio de se reconstruir culturas que durante muito tempo
mantiveram-se desenraizadas, fragmentadas e coibidas pela lógica perversa da
hierarquização cultural, característica fundante do imperialismo europeu.

Para os povos africanos, a tradição das narrativas orais é muito importante. Por meio dos
mitos, das lendas, dos contos que passam de geração a geração, os costumes e valores
dessas culturas são transmitidos e reforçados. Quando as ex-colônias portuguesas
conquistam sua independência, torna-se necessário criar textos literários que "narrem" as
novas nações. É no repertório das narrativas orais e na história dos anos de opressão que
os escritores vão buscar os elementos essenciais para definir a identidade desses povos.

O marpingando lembranças

A cidade era governada pelas marés. E as marés eram mandadas por pássaros.
Assim se dizia, um passarito cinzento chamava a enchente. Outro, maior, de asas
brancas, convocava a baixa-mar. Me encantava essa crença, o poder de singelas
criaturinhas comandarem o imenso oceano. Eu, menino, não era guiado por relógio.
Vivia como essas aves que esperam as ondas. [...]
Agora, em meu sono, já não há paisagem sem mar. [...]
As pequenas canoas - os conchos e as almadias - vencem as águas lamacentas do
esquecimento. O Índico
ficou margem da minha alma. Nesse lago eu nasci. Nasci tanto que, agora, os meus
sonhos são anfíbios. O passado é um litoral onde tudo se converte em espuma. [...]
Sou moçambicano, filho de portugueses, nasci em pleno sistema colonial, combati
pela Independência, vivi mudanças radicais do socialismo ao capitalismo, da revolução à
guerra civil. Vim à luz num tempo de charneira, entre um mundo que nascia e outro que
morria. Entre uma pátria que nunca houve e outra que está nascendo. [...]
Cresci nesse ambiente de mestiçagem, escutando os velhos contadores de histórias. Eles
me traziam o encantamento de um momento sagrado. [...]
Eu queria saber quem eram os autores daquelas histórias e a resposta era sempre a
mesma: ninguém. Quem criara aqueles contos haviam sido os antepassados, e as histórias
ficavam como herança dos deuses. [...]
COUTO, Mia. "Águas do meu princípio." In: Pensatempos: textos de opinião. Lisboa:
Caminho, 2005. p. 147-151.

Neste trecho, Mia Couto explora a relação entre as narrativas orais e a construção da
identidade moçambicana. Ele descreve como a cidade era governada pelas marés, um
conceito transmitido por meio das narrativas orais. A crença de que os pássaros
controlavam as marés simboliza a conexão entre a natureza, os mitos e a vida cotidiana. Ao
mencionar que os antigos contadores de histórias eram fundamentais para sua formação,
Couto realça como as histórias transmitidas oralmente influenciaram sua visão de mundo e
identidade.
O escritor moçambicano aborda a reconstrução linguística de seus textos, ou como diz, de
sua escrita desarrumada, expressão que dá título à entrevista. Sobre a forte presença da
oralidade em sua obra, primeiramente ele declara que a oralidade o invade e desarruma a
escrita em tudo até o limite. O escritor esclarece que o desvio linguístico com relação à
norma portuguesa faz parte da oralidade de seu país, de onde ele nutre seu universo
ficcional. Ele se apercebe desses desvios como qualquer coisa que pode introduzir beleza
ou que interrogue aquilo familiar no universo moçambicano. Outra função dada ao uso da
linguagem oral é a de operar ao nível real, mostrando como as pessoas estão se
expressando. Há, portanto, para ele, uma fratura com relação à língua oficial que tem de ser
descoberta, tem de ser revelada, e os desvios linguísticos são sinais que podem mostrar
isso. Essa linguagem “despedaçada” espelha a dificuldade que as pessoas têm, quanto ao
português padrão, para expressarem o seu mundo.

Qual então o fio da história?

O cão? A toninha? O mar? Luanda?


Ou tudo isso é que afinal era a vida
boa daqueles tempos pouco depois
da independência [...], em que a
vida estava na pedra de cada muro,
no buraco de cada rua, na coragem
toda nova das pessoas de olharem
para o fundo dum beco sem saída
e encontrarem força de sorrir? [...]
PEPETELA. "O cão e os caluandas." Lisboa: Dom Quixote, 1985. p.179.

Neste fragmento, Pepetela explora a ideia de que as narrativas orais são o fio condutor da
história de um povo após a independência. Ele questiona o que constitui a verdadeira
essência da vida naqueles tempos de independência e sugere que a vida estava nas
pequenas coisas, nas histórias transmitidas oralmente. O autor sugere que a coragem das
pessoas em sorrir em meio às adversidades é uma demonstração da força que as
narrativas orais e a tradição cultural conferem à sociedade.

A oralidade na obra de Paulina Chiziane

Paulina Chiziane nasceu em Monjacaze, província de Gaza, sul de Moçambique. Ela é


considerada uma das primeiras mulheres a escrever um romance em seu país. No
entanto, Chiziane afirma não escrever romances e, sim, estórias. Nas palavras da
autora: “sou contadora de estórias e não romancista. Escrevo livros com muitas estórias,
estórias grandes e pequenas. Inspiro-me nos contos à volta da fogueira, minha
primeira escola de arte.” (CHIZIANE, 2002, contracapa). Sua “contação” de histórias
está no sangue, herança de sua avó, que pertencia ao grupo étnico macagandane.
Atualmente, a escritora mora e trabalha na Zambézia, norte do país.

A escritora escreveu A balada de amor ao vento (1990), Ventos do Apocalipse (1995) e O


sétimo juramento (1999), entre outros. No entanto, é analisado neste trabalho o romance
Niketche: uma história de poligamia (2002), cujo nome deriva de uma dança sexual
feminina, aprendida pelas meninas durante os rituais de iniciação, para afirmarem ao
mundo que são mulheres. A dança macua é originária da Zambézia, região norte de
Moçambique. Nessa perspectiva, a autora, no corpo da narrativa, explicita sobre esse
ritual:

Da fala para a escrita

Angola é composta por nove grandes grupos étnico-linguísticos, cuja rica diversidade se
manifesta na oralidade em diversas classes principais:

● Misosso: Essas são histórias tradicionais que frequentemente envolvem animais


falantes. Através desses contos, são transmitidos ensinamentos sobre a inteligência,
astúcia e outras qualidades desejáveis. Os animais são usados como
personificações para ilustrar lições de vida importantes e valores culturais.
● Maka: Essa classe de narrativas inclui histórias verdadeiras ou contadas como se
fossem verdadeiras, muitas vezes com uma lição moral ou um propósito
educacional. Elas podem ser utilizadas para exemplificar a conduta adequada,
reforçar valores culturais e apresentar modelos de comportamento.
● Ma-Lunda ou Mi-Sendu: Estas são crônicas históricas transmitidas oralmente pelos
mais velhos a alguns membros da classe dominante ou de prestígio. Elas
desempenham um papel importante na preservação da história e memória coletiva,
transmitindo eventos passados e a sabedoria acumulada ao longo do tempo.
● Ji-Sabu: Os provérbios são expressões curtas e impactantes que encapsulam a
sabedoria e os valores culturais de uma sociedade. Eles são frequentemente usados
para fornecer conselhos práticos, transmitir conhecimento e refletir sobre a vida.
● Mi-Imbu: Esta classe engloba a poesia e a música, frequentemente interligadas.
Através dessas formas artísticas, as emoções, histórias e experiências são
expressas de maneira criativa. Muitas vezes, a poesia e a música são usadas para
celebrar eventos, honrar figuras importantes e compartilhar alegria ou tristeza.
● Jl-Nongo Nongo: As adivinhas são enigmas em forma de perguntas que desafiam a
mente dos ouvintes. Elas são uma forma interativa de comunicação que estimula o
pensamento criativo e o engajamento com o conhecimento tradicional.

A partir de 1948, um grupo de estudantes, incluindo Antonio Jacinto e Agostinho Neto,


empreende a revisitação das lendas, provérbios, adivinhas e toda a tradição presente na
oralidade angolana. Isso marca o movimento "Vamos descobrir Angola", com o objetivo de
resgatar a oralidade silenciada pelo colonizador, incorporando-a à escrita e deixando para
trás as tradições europeias impostas por anos de repressão. Assim, os sentimentos e
aspirações do povo angolano encontram voz na literatura.

A África que conta histórias

A literatura nacional é vista como indispensável para a consolidação da independência, pois


é um veículo de situações, modos de vida e de pensamento dentro do país. A literatura é
um fator que contribui para aumentar a unidade nacional ao mostrar ao povo a sua própria
identidade.
"Creio que a literatura nacional é elemento indispensável, tão importante como outro
qualquer, para a consolidação da independência. É um fator que ajuda a aumentar a
unidade nacional, por ser veículo de situações, modos de vida e de pensar, dentro do país
[...]. Afirmo que não há, não pode haver, a criação de um país verdadeiramente
independente sem uma literatura nacional própria, que mostre ao povo aquilo que o povo
sempre soube: isto é, que tem uma identidade própria."

PEPETELA. Citado por HILDEBRANDO, Antonio. Pepetela: A parábola do cágado velho -


construindo pontes. In: SEPÚLVEDA, Maria do Carmo; SALGADO, Maria Teresa. África e
Brasil: letras em laços. São Caetano do Sul: Yendis Editora, 2006. p. 317. (Fragmento).

A imagem de um imenso tronco de árvore, do qual nascem novos galhos enquanto outros
morrem, é evocada para simbolizar o repertório de narrativas de uma cultura. Esses galhos
representam as elaborações e recriações da tradição oral e escrita de um povo. Nas
culturas predominantemente literárias, a oralidade desempenha um papel imenso na
construção da identidade cultural. A literatura oral, incluindo lendas, romances, contos,
provérbios, entre outros, compõe um repertório imenso que se renova de geração em
geração, alimentando o imaginário popular.

Tradição Oral e Ficção Escrita: Encontros Necessários

Segundo um relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, divulgado


em 2005, o índice de analfabetismo em Moçambique corresponde a 53,50% da população.
Em Angola, a 33,20%, O fato de tantas pessoas não saberem ler ou escrever não significa
que não produzam cultura. Também não significa que a literatura não seja uma parte
importante de suas vidas. É no âmbito da oralidade que essas pessoas constroem
suas histórias.

É destacado o contraste entre o mundo da escrita e dos livros e a realidade africana, onde o
analfabetismo persiste. Nos países africanos de língua portuguesa, o alto índice de
analfabetismo é uma herança do período colonial. Após a independência, países como
Angola e Moçambique enfrentaram anos de guerra civil que prejudicaram o sistema
educacional já incipiente. No entanto, mesmo em meio a essas dificuldades, a cultura e a
literatura continuam a ser partes importantes da vida das pessoas. A oralidade se torna uma
forma valiosa de construção de histórias.

A Transformação das Vozes Populares em Literatura

No contexto de uma cultura em que a oralidade é crucial, a literatura e a tradição oral se


aproximam naturalmente. Os escritores, conscientes da importância da identidade do povo,
buscam na tradição oral temas que inspirem as narrativas que estão escrevendo. Ao fazer
isso, eles transformam suas obras em espaços de resgate das vozes populares que
resistiram à repressão colonial. Essas vozes, muitas vezes excluídas dos meios oficiais de
divulgação cultural, representam uma autenticidade que se enraíza na identidade do povo.

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