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SALVADOR QUARTA-FEIRA 16/8/2023
CADERNO 2
caderno2@grupoatarde.com.br
Letrux: poemas
de Sylvia Plath
e Hilda Hilst,
canções de
Bethânia e PJ
Harvey no set list
LITERATURA Com convidados de peso, ‘Feira Literária de Mucugê’
une ‘Música e Literatura’ ao homenagear o poeta Capinam
Para ler e
para ouvir
TIAGO FREIRE*
A Feira Literária de Mucugê, a
Fligê, começa hoje na Chapada
Diamantina. Unindo ‘Literatu-
ra e Música’ tema deste ano,
ela vai até domingo (20), ocu-
pando diversos espaços da pe-
quena cidade baiana. Com di-
versos espaços e programação
variada, a Fligê vem com me-
sas literárias, oficinas, espetá-
culos, exposições, sessões de
autógrafos, projetos pedagó-
gicos, mostra de cinema e pro-
gramação infantil.
Tudo isso é divido entre di-
ferentes áreas e com cada uma
delas tendo sua programação
– veja no site da Fligê.
Como é de costume em
eventos do gênero, um grande
nome da literatura é home-
nageado – na Fligê, o esco-
lhido foi o poeta baiano José
OBITUÁRIO
Morre, aos 90 anos, a atriz Léa Garcia
DA REDAÇÃO* E
AGÊNCIA BRASIL
A atriz Léa Garcia, de 90 anos,
morreu ontem, em Gramado,
Rio Grande do Sul, onde seria
homenageada hoje com o Tro-
féu Oscarito, a mais tradicional
honraria concedida, desde
1990, pelo Festival de Cinema
da cidade. A morte foi divul-
gada na conta oficial da atriz no
Instagram. Em nota de pesar,
o Festival de Gramado infor-
mou a causa: “De acordo com
o Hospital Arcanjo São Miguel,
a causa da morte foi um infarto
agudo do miocárdio”.
Léa Garcia tem uma história
antiga com Gramado, conquis-
tando Kikitos com Filhas do
Vento (2004) e os curta-me-
tragens Hoje Tem Ragu (2008)
e Acalanto (2012). A artista
tinha no currículo mais de 100
produções, incluindo cinema,
teatro e televisão.
Ao lado de nomes como Ru-
th de Souza e Zezé Motta, Léa
Garcia foi uma das primeiras
atrizes negras da televisão bra-
sileira. Com uma célebre tra-
jetória nas artes, foi indicada
ao prêmio de melhor interpre-
tação feminina no Festival de
Carlos Capinam.
Musicalidade na literatura
Uma série de apresentações
musicais de alto nível ajuda a
compor a sua programação.
Uma das apresentações mais
aguardadas é Línguas & Poe-
sia, da cantora carioca Letrux,
no qual ela declama poemas
próprios ou de autoras e au-
tores que admira.
A cantora, que apresenta-se
sexta-feira, 22h30, comenta
as mudanças na sua apresen-
tação – sempre mantendo a
essência. “Fazemos esse show
desde 2019, de lá pra cá mudei
alguns poemas, mas o reper-
tório de canções é mais ou me-
nos o mesmo: músicas brasi-
leiras e estrangeiras que me
formaram, referências impor-
tantes para eu ser quem sou.
Os poemas mudam conforme
Cannes em 1957 por sua atua-
ção no filme Orfeu Negro que,
em 1960, ganharia o Oscar de
melhor filme estrangeiro, re-
presentando a França.
No teatro, uma das peças de
destaque que fez no início de
sua trajetória foi Orfeu da Con-
ceição (1956), de Vinicius de
Moraes. A estreia na TV foi no
Grande Teatro da TV Tupi, nos
anos 1950. Na mesma emis-
sora, participou também de
Vendem-se Terrenos no Céu,
em 1963. O convite para tra-
balhar na Rede Globo ocorreu
em 1970, quando ela integrou
o elenco de Assim na Terra co-
mo no Céu, de Dias Gomes.
O maior sucesso da carreira
foi a novela Escrava Isaura
(1976), fenômeno de audiên-
cia no Brasil e no exterior. Em
entrevista no programa Con-
versa com Bial, concedida no
ano passado, ela contou que
chegou mesmo a ser agredida
na rua, tamanha a antipatia
que sua personagem, a escra-
vizada Rosa, inspirava no pú-
blico. Mulher de índole terrível
que chega a se aliar ao senhor
de escravos Leôncio (Rubens
de Falco) para prejudicar a mo-
cinha Isaura (Lucélia Santos),
a apresentação, mas sempre
tem gente brasileira e contem-
porânea, acho importante.
Mas também louvo alguns
clássicos”, detalha Letrux.
“O fio é a língua, a palavra.
Sou apaixonada por lingua-
gens, traduções, jeitos de falar
em determinadas línguas, ex-
pressões. E isso está presente
na música também. Isso me
guia sempre: a palavra. Já as
músicas que eu canto fazem
parte do meu caldeirão de in-
fluências. Sou compositora e
autora, mas também amo can-
tar músicas de outros autores
e autoras. Fui anotando algu-
mas músicas que eu percebia
que amava cantar”, pontua.
No repertório, além de au-
torais, Letrux interpreta Bethâ-
nia, Edu Lobo, Kevin Johansen
e PJ Harvey, entre outros.
Além de Letrux, o Palco Prin-
Rosa marcou a carreira de Léa
Garcia para sempre.
“Apanhei muito. Eu sou uma
mulher que gosta de fazer feira
e mercado. Então, eu fui à feira
quando morava no [bairro]
Flamengo. Uma criatura pe-
gou um peixe enorme e bateu
nas minhas costas porque eu
estava sendo perversa com a
Isaura. Apanhei também, levei
um beliscão de lágrimas des-
cerem dos olhos”, relatou.
Léa Garcia na Bahia
Uma das últimas aparições de
Garcia em público foi há pouco
mais de um mês, aqui em Sal-
vador, durante a mostra Lugar
de Mulher É no Cinema, que a
homenageou. Diretora e idea-
lizadora da mostra, Hilda Lo-
pes Pontes relembra a breve
convivência.
“Quando a gente olha para
a trajetória de Dona Léa, é bem
nítido o quanto ela foi impor-
tante para o cinema nacional,
para a dramaturgia brasileira.
Ela foi (e é) verdadeiramente
um ícone. Mas eu acho que é
muito mais importante ressal-
tar duas coisas. Ela falou para
mim que estava vivendo o mo-
mento mais importante da car-
É best-seller e é da Bahia: Itamar Vieira Jr. lança ‘Salvar o Fogo’
reira dela. E falou o quanto ela
achava importante ser home-
nageada em vida. Então, toda
essa celebração da carreira de-
la trouxe momentos muito im-
portantes, tanto para ela
quanto para todas as mulheres
e pessoas negras que fazem
arte no Brasil, que estão re-
sistindo”, relata.
“Ela tinha uma presença
muito marcante. Praticamente
uma coisa de realeza, sabe? De
ter um humor, um sarcasmo. E
também muita sabedoria. En-
tão, eu estava meio sem jeito
falando que eu era diretora da
A FERA DO CHORINHO
Carlinhos do Bandolim e Gente
do Choro, hoje, 18h30, no Palco
do Cruzeiro do São Francisco
Tetê Marques / Divulgação
Divulgação
Renato Parada / Divulgação
Ag. Brasil
mostra, e ela falou: ‘Hilda, vo-
cê está fazendo uma coisa im-
portante. Você é uma pessoa
importante. Você está empo-
derando outras mulheres. Vo-
cê está fazendo essa roda girar.
Você está aqui e eu estou aqui’.
Então, eu nunca vou esquecer
do momento em que ela me
tirou de certa insegurança. De
eu ter coragem, mesmo, sa-
be?”, acrescenta.
Para Hilda, o que “Dona
Léa” deixa é um legado que
ainda está por ser dimensio-
nado. “Um legado muito forte,
muito potente. Todos os tra-
C1
cipal de Mucugê receberá ain-
da shows de outros grandes
nomes: Chico César, Pedro
Luís, Lazzo Matumbi, Ana Bar-
roso e Grupo Pau de Arara.
A Fligê recebe ainda outro
grande nome que atravessa a
música e a literatura: Arnaldo
Antunes, que faz uma Conver-
sa Literária com a jornalista
Bianca Ramoneda nesta quin-
ta-feira, no Centro Cultural.
Outro grande destaque da
programação é a volta do es-
critor baiano Itamar Vieira Ju-
nior ao evento, lançando seu
novo livro, Salvar o Fogo. É no
sábado, 16h, em bate-papo
com Glicéria Tupinambá e me-
diação de Jamile Borges.
Uma feira de homenagem
O tema deste ano veio a calhar
para o homenageado deste
ano, o poeta e compositor Ca-
pinam. O escritor já havia hon-
rado a Fligê com sua presença
em 2016, quando abordou a
‘Poesia na Música Popular Bra-
sileira’. Na Sessão de Home-
nagem, que acontece na sex-
ta-feira, 18, às 20h, no Centro
Cultural, diversos participan-
tes farão homenagens. Um de-
les é o poeta Aleilton Fonseca,
que declamará uma Ode a Ca-
pinam. “Capinam é um grande
poeta, letrista e intelectual do
nosso país. Essa homenagem
destaca a importância de sua
obra, seu talento, sua presença
constante no cenário musical,
como um grande nome do Tro-
picalismo e da MPB de todos os
tempos. Na sua obra, a poesia
e a música se entrelaçam, se
ajustam com maestria abso-
luta”, elogia o poeta.
“Capinam é um poeta mu-
sical por excelência. A Ode é
uma louvação à sua arte e à
sua trajetória intelectual, co-
mo um reconhecimento afe-
tivo de sua contribuição cul-
tural”, detalha Aleilton.
Além das altas expectativas
com as homenagens, Fonseca
também elogia a força que o
evento tem na promoção da
cultura e na mobilização que a
festa acarreta. “Participo da Fli-
gê com entusiasmo e expec-
tativa, pois o evento promove
cada vez mais a literatura, o
pensamento e as artes, num
grande encontro cultural que
mobiliza as pessoas, valoriza a
leitura e demonstra que as ar-
tes e a literatura têm um diá-
logo constante e muito pro-
dutivo”, conclui Fonseca.
FLIGÊ - FEIRA LITERÁRIA DE MUCUGÊ / A
PARTIR DE HOJE (16) ATÉ DOMINGO (20
DE AGOSTO) / MUCUGÊ E IGATU, NA
CHAPADA DIAMANTINA / GRATUITO /
INFORMAÇÕES: FLIGEMUCUGE.COM.BR
* SOB A SUPERVISÃO DO EDITOR CHICO
CASTRO JR.
Léa atuou no primeiro
programa em cores da
TV no Brasil, o Caso
Especial ‘Meu Primeiro
Baile’ (TV Globo, 1972)
balhos, toda a luta, toda re-
sistência. Era uma mulher mui-
to política, que sabia falar mui-
to bem sobre todos os temas.
Estava sempre atualizada. Foi
uma honra incrível conhecer
Dona Léa”, finaliza Hilda.
Em uma nota de pesar, o
Festival de Gramado valorizou
o papel de Léa Garcia na con-
solidação da atuação das mu-
lheres negras na dramaturgia
nacional: “Atuando em produ-
ções para televisão, cinema e
teatro, Léa consolidou uma
carreira de papéis marcantes
em produções como Selva de
Pedra, Escrava Isaura, Xica da
Silva e O Clone. Foi peça fun-
damental na quebra da bar-
reira dos personagens tradicio-
nalmente destinados a atrizes
negras. Tornou-se, assim, uma
referência para jovens atores e
admirada pela qualidade de
suas atuações. Dona Léa se-
guia ativa nas artes cênicas. Em
2022, atuou nos longas Barba,
Cabelo e Bigode, Pacificado e O
Pai da Rita. Ontem (14) havia
confirmado negociações com a
TV Globo para atuar no remake
da novela Renascer”.
* COLABOROU JOÃO PAULO BARRETO