Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.

Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
Abrir
rir portas onde
ond
de sse
e erguem muros
muro Director: Manuel Carvalho Domingo,
go, 28 de Março de 2021 • Ano XXXII • n.º 11.293 • Edição P
Porto • Assinaturas 808 200 095 • 1,80€

Fu
Futebol Plágio
Se
Selecção empata A Póvoa acordou
co
com a Sérvia em para o real valor
jog
jogo polémico da sua camisola
Desporto, 28/29
Des Local, 20/21
GABRIEL SOUSA

Moçambique
Série especial Dia sangrento
Para onde vamos? em Palma com
centenas a
A habitação numa aguardar resgate
encruzilhada Jihadistas que controlam vila em
P2 Cabo Delgado atiraram contra civis
e Æzeram vários mortos Mundo, 12

Covid-19
Perto de 30 mil
professores
vacinados
no primeiro dia
Foram poucos os que faltaram à cha-
mada no primeiro grande teste à vaci-
nação em massa Destaque, 2 a 5

Entrevista
“O Ministério
da Saúde não
pode ser tão
autocrático”
Presidente e das
dias
Misericórdias
diz que o Estado
har
está a falhar

Falta de condições ameaça

res
com os lares
Sociedade, e,
16/17

museus públicos e põe em Saúde

Pandemia fez

risco maior colecção do país disparar oferta

de serviços
de telemedicina
Directores avisam para calamidade e temem pelas suas obras • Arte Antiga e Azulejo Novos registos de unidades de tele-
medicina cresceram mais de 2800%
vivem situação mais grave • Marcelo recebe carta de alerta Cultura, 26/27 e Editorial num só ano Sociedade, 18
ISNN-0872-1556
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
2 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021

Destaque A educação em tempos de pandemia

Vacinação
do pessoal
das escolas: “Para
mim, é um alívio”
Milhares de professores e pessoal não docente do ensino
pré-escolar e do 1.º ciclo estão a ser vacinados neste
Äm-de-semana. Em Valongo, o processo decorreu “tranquilo”
— a palavra mais utilizada por quem lá passou
esperar ali mesmo, enquanto não questionário com várias perguntas
Reportagem se aproxima a hora agendada para sobre alergias, sintomas ou
a sua vacina. “Está marcado para as medicação que tomem. Quando
10h, mas vim mais cedo, porque saem do posto de vacinação para
Patrícia Carvalho Texto
não sabia onde era e só tenho uma pausa de 30 minutos, numa
Nelson Garrido Fotos
autocarro de hora a hora”, diz. nova zona de espera (para

P
ouco depois das 9h30 da
manhã de ontem, as
cadeiras colocadas no
pátio da antiga fábrica de
Valongo, onde está
instalado um centro de
vacinação contra a covid-19,
estavam vazias. Ainda há pouco
várias delas estavam ocupadas por
professores e outros funcionários
das escolas do pré-escolar e do 1.º
ciclo do concelho, chamados a ser
vacinados logo cedo. Com o
processo a funcionar sem
problemas, os elementos de apoio
tinham encaminhado para o
interior, numa nova zona de
espera, quem ali estava, pelo que
quando Albertina Loureiro chegou
tinha o sol e as cadeiras só para ela.
Moradora em Ermesinde, chegou
ao centro de vacinação com mais
de meia hora de antecedência, mas
tranquila e sem receios por ir
tomar a vacina da AstraZeneca,
que, nas últimas semanas, andou
nas bocas do mundo por causa de
dúvidas relacionadas com a sua
responsabilidade no aparecimento
de efeitos secundários graves. “Lá
na escola algumas pessoas
mostraram alguns receios, mas, em
princípio, acho que vêm todos
vacinar-se”, disse, declarando-se
“tranquila”.
A palavra é repetida por quem já
acabou de tomar a vacina e
também por quem a aplica. E, no
interior do espaço, com duas salas
de espera prontas, tranquilidade é
despistar eventuais efeitos
adversos), já levam na mão um
papel com a data em que deverão
comparecer para a segunda dose.
“Tenho de cá estar a 19 de Junho
de novo. Não conseguiram ainda
deÆnir a hora, mas dizem que deve
ser mais ou menos a mesma de
hoje”, diz Dulce Martins, 54 anos,
professora do 1.º ciclo de Valongo,
num intervalo da conversa com
uma colega, sentada ao seu lado.
Ambas já foram vacinadas e
estão apenas a aguardar a
autorização para irem embora. O Esperar, vacinar. No centro de esquecimentos, a lembrar o local e
post-it amarelo que entregaram a vacinação de Valongo, o dia a hora. Achei muito bem. Foi tudo
Dulce Martins tem escrito à mão a decorreu sem problemas muito pacíÆco”, diz.
hora a que pode deixar o centro:
9h20. Com a máscara obrigatória a “Veio toda a gente”
esconder-lhe parte do rosto, a Na escola, aÆrma, houve conversas

A auxiliar da Escola Básica de
Sampaio é uma das cerca de 600
pessoas que ali seriam vacinadas
até às 20h. Em todo o país,
espera-se que mais de 70 mil destes
proÆssionais recebam a vacina até
ao Ænal do dia de hoje.
Com o sol a aquecer o exterior do
centro de vacinação, Albertina
Loureiro, 62 anos, é aconselhada a
também o que se sente por ali.
Pessoal docente e não docente
ocupa algumas das cadeiras
dispostas, com distância suÆciente
entre elas, até que alguém se
aproxima e chama o nome de
próxima pessoa a ser vacinada,
encaminhando-a para um dos 12
postos de vacinação ali montados.
Na mão, já levam preenchido o
professora não aponta qualquer
falha ao processo de vacinação,
desde que recebeu a SMS a avisá-la
de que era uma das pessoas a
serem vacinadas ontem, pelas 2h
da madrugada de quinta-feira. “Fui
a quarta pessoa a ser vacinada e
correu tudo muito bem. E ontem
até mandaram uma nova
mensagem, a avisar para não haver
1800
pessoas em Valongo e na Maia
e mais de 70 mil no país todo
devem ser vacinadas até hoje
e dúvidas sobre se a AstraZeneca
era ou não segura, mas os receios
que poderiam existir parecem
ter-se dissipado. “Há sempre os
que dizem que não querem ser
vacinados, mas acho que veio toda
a gente da minha escola”, diz. No
caso dela, garante, não houve
dúvidas: “Tenho problemas
cardíacos, e isto era algo pelo qual
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
ansiava. Para mim, é um alívio
poder tomar Ænalmente a vacina. A
minha Ælha, que é médica, está
sempre a dizer que é mesmo uma
necessidade sermos vacinados.”
Do posto de vacinação da
enfermeira Catarina Lopes acaba
de sair a quarta pessoa a ser
vacinada nesta manhã e, por
enquanto, não há nada de anormal
a registar, diz. Nem mesmo
grandes dúvidas de última hora
sobre a eÆcácia e segurança da
vacina. “Temos tido várias dúvidas
noutros pontos de vacinação, mas
aqui, não. Sendo a maior parte das
Covid-19: oito mortes
e 344 casos no país
P
ortugal registou
anteontem oito mortes e
344 novos casos de
covid-19. No total, desde
o início da pandemia, o país
soma 820.042 casos
confirmados e 16.827 vítimas
mortais. Segundo os dados
da DGS, o país tem agora
menos 51 pessoas
hospitalizadas em relação ao
balanço anterior e menos sete
nos cuidados intensivos. No
total, 618 doentes estão ainda
internados, 148 destes nos
cuidados intensivos. Há ainda
a reportar mais 3668 casos
recuperados da doença, num
total de 775.007
recuperações desde Março
de 2020. Existem, assim,
menos 3322 casos activos, o
que significa que 28.208
portugueses ainda lidam com
a doença (o número mais
baixo desde 31 de Dezembro).
Há 15.404 contactos em
vigilância pelas autoridades,
mais 105 do que no último
balanço. A maior parte das
vítimas mortais que figuram
na última actualização tinha
mais de 80 anos (cinco das
oito mortes eram nesta faixa
etária).
pessoas professores, acho que se
informaram antes de vir. Aqui é
muito simples, já trazem a
papelada preenchida, validamos as
informações, administramos a
vacina e já está”, diz.
Foi assim, simples, garante
Agostinho Correia, de 26 anos,
professor de Actividades de
Enriquecimento Curricular (AEC)
em cinco escolas do concelho.
Tomou a vacina, não tem qualquer
sintoma adverso e está quase a
chegar ao Æm da espera obrigatória
que fechará, por enquanto, o
processo. “Tudo tranquilo”, diz
também, num termo que parece
ser o mantra escolhido para o dia.
Para Fernando Filgueiras,
director executivo do
Agrupamento de Centros de Saúde
“Temos tido várias (ACeS) Maia-Valongo, o dia vai ser
um pouco mais agitado. O telefone
dúvidas noutros está sempre a tocar, porque há
pontos de muita gente para vacinar nos dois
postos abertos para o efeito e no de
vacinação, mas Gemunde, na Maia, o arranque do
processo foi atrasado por um
aqui, não”, diz a problema informático, que não
estava a permitir a introdução de
enfermeira Catarina dados na plataforma online em que
Lopes, entre devem Æcar registados todos os
processos de vacinação. “É o maior
vacinas, em Valongo ACeS da zona norte, servimos
cerca de 240 mil pessoas”, disse,
entre uma chamada e outra.
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 3
Em Valongo, o objectivo era
vacinar, até às 20h, cerca de 600
proÆssionais, deixando o processo
concluído ontem mesmo. Na Maia,
o centro de vacinação abrirá de
novo hoje, para se conseguir,
durante todo o Æm-de-semana,
vacinar as cerca de 1200 pessoas
com marcação. Pelas 9h30,
garante, já se estava a vacinar ali
também, mesmo sem que o
problema informático estivesse
resolvido. O responsável esperava
que o caso se resolvesse ainda
durante a manhã e a solução estava
desenhada: “Vai ter de se
introduzir mais tarde os dados que
não se conseguiram colocar até
agora. É mais trabalho, mas terá de
ser”, diz.
Enquanto ele fala, a professora
Dulce Martins sai das instalações,
pronta para regressar a casa. Antes
de seguir caminho, pára uns
segundos para cumprimentar o
presidente da Câmara de Valongo,
José Manuel Ribeiro, que também
está por ali a acompanhar o
processo. A autarquia alugou por
um ano esta antiga fábrica para que
funcione como centro de
vacinação, e há outro espaço
pronto, caso seja necessário
activá-lo, em Ermesinde, garante o
autarca. “É para descentralizar o
processo ainda mais, queremos dar
condições a este senhor para ele
decidir onde quer vacinar”, disse,
referindo-se a Fernando Filgueiras.
Durante todo o dia, 18 médicos e
enfermeiros e oito funcionários da
câmara (entre pessoal de limpeza,
da protecção civil ou de apoio
informático) estiveram por ali, a
garantir que tudo corria de forma
“tranquila”.
Por todo o país, o processo terá
sido similar, mas a expectativa é
que no Æm-de-semana de 10 e 11 de
Abril, quando será retomada a
vacinação do pessoal das escolas, a
velocidade aumente — entre
pessoal docente e não docente
deverão ser vacinadas, no total,
cerca de 280 mil pessoas.
Dulce Martins e Agostinho
Correia já estão despachados e
prontos para regressar, para a
segunda dose, a 19 de Junho.
Albertina Loureiro ia ser logo a
seguir.
Contando com eventuais faltas,
foi criada uma lista de suplentes
entre outras pessoas dos grupos
prioritários a serem vacinados
nesta fase e, ao Ænal do dia,
Fernando Filgueiras admitia que
várias tinham sido chamadas.
Houve convocados que faltaram e
outros que ainda foram chamados
em cima da hora, depois de os
responsáveis terem percebido que
havia um erro no contacto feito
inicialmente. Contas feitas,
Fernando Filgueiras aÆrmava que o
número de pessoas vacinadas
estava dentro das expectativas. As
contas Ænais Æcam para hoje.
António Costa
Mais 150 postos
e cem mil
vacinados por
dia em Abril
Luciano Alvarez
M
ais de 70 mil funcionários
das escolas do pré-escolar
e do 1.º ciclo foram convo-
cados para serem vacina-
dos neste Æm-de-semana e,
até meio da tarde de
ontem, cerca de 27 mil já tinham rece-
bido a primeira dose da vacina da
AstraZeneca, revelou o coordenador
do Plano de Vacinação contra a covid-
19, vice-almirante Gouveia e Melo. O
objectivo é acelerar, e muito, o pro-
cesso, com o primeiro-ministro, Antó-
nio Costa, a dar conta de que se pre-
tende chegar a “pelo menos cem mil”
vacinados por dia já em Abril.
O discurso não tem variado — vai
sempre depender de as entregas pre-
vistas de vacinas serem cumpridas —,
mas as expectativas continuam opti-
mistas. “Vamos receber em Abril o
que recebemos em Janeiro, Fevereiro
e Março [de vacinas]. Vamos ter de
triplicar o esforço de aplicação das
vacinas e, por isso, todo o processo
que tem decorrido nos centros de
saúde vai ter de ser complementado
com cerca de 150 postos desta natu-
reza para assegurar que vamos cum-
prir as nossas metas”, disse o primei-
ro-ministro durante uma visita ao
Pavilhão Multiusos de Odivelas, para
assistir ao processo de vacinação de
pessoal docente e não docente do
pré-escolar e do 1.º ciclo.
Mais tarde, Gouveia e Melo dava
conta de que neste Æm-de-semana o
objectivo é vacinar “entre 65 e 70 mil”
destes proÆssionais, mas que a inten-
ção é acelerar o processo já no Æm-
de-semana de 10 e 11 de Abril, para
que todos os proÆssionais das escolas
até ao ensino secundário sejam vaci-
nados antes do Ænal desse mês.
“Vamos saltar um Æm-de-semana
para nos organizarmos e passarmos
de 40 mil por dia para uma média de
cem mil por dia”, disse. O responsável
disse ainda que todos os proÆssionais
das escolas que não foram ainda con-
vocados, por questões técnicas, “vão
ser novamente contactados”, e garan-
tiu que o número de pessoas que se
recusaram a ser vacinadas é “ínÆmo,
na ordem de 1%, 2%”, sendo que
todos terão a hipótese de regressar ao
processo.
Também o Presidente da República
salientou a importância de avançar
com a vacinação do pessoal das esco-
las. “Com a eventual abertura de mais
escolas, há a necessidade de olhar
para as escolas e, nomeadamente,
para os professores”, aÆrmou.
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
4 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021
Destaque A educação em tempos de pandemia
Ano lectivo atípico entra na recta final
Pais, professores
e alunos estão
“esgotados”. E ainda
há três meses de
aulas pela frente
Samuel Silva
Entre os mais novos houve
alívio com o regresso à
escola, mas exaustão é a
palavra de ordem à entrada
para o 3.º período
Q
uando há pouco mais de duas
semanas o primeiro-ministro
anunciou o plano de descon-
Ænamento, havia dois pares
de olhos especialmente aten-
tos numa casa de Santa Maria
da Feira. Os Ælhos de Hugo Paiva “sal-
taram” quando perceberam que
podiam voltar à escola dali a poucos
dias. “Ficaram realmente felizes”,
conta o informático do Hospital de
São João, no Porto. As duas crianças
estavam “fartas” de estar em casa.
Hugo Paiva tem dois filhos, uma
rapariga no 4.º ano e um menino em
idade pré-escolar, e estavam conÆ#
nados há mais um mês do que a
maioria dos colegas. A covid-19 atin-
giu a família antes do Natal e a alta só
chegou no momento em que o Gover-
no decidia voltar a fechar as escolas.
Havia, por isso, “muitas saudades”
da escola. Mas era sobretudo dos
contactos sociais que as crianças sen-
tiram mais falta, conta o pai.
Em termos de ensino, os últimos
meses “foram mais consolidados” do
que o primeiro conÆnamento. O con-
tacto com professores e educadores
passou de três horas e meia de video-
conferência por semana para sessões
de três horas por dia. “Houve conti-
nuidade de aprendizagens e os alu-
nos não se sentem tão perdidos. Eles
sentem-se quase tão bem como se
estivessem na sala de aula”, explica
este pai de Santa Maria da Feira. Mas
fazem falta os amigos: “Eles queriam
muito voltar a encontrá-los.”
O Ælho mais novo de Cláudio Gon-
zaga anda no 3.º ano e também vol-
tou à escola, na Maia, a 15 de Março.
O regresso ao ensino presencial “ali-
viou bastante” o dia-a-dia deste con-
sultor de tecnologia. Tem outra Ælha,
no 7.º ano, que se manteve em ensi-
no à distância até ao Ænal do 2.º
período, na última sexta-feira.
Nos últimos meses, o quotidiano
doméstico não passou apenas pelo
acompanhamento das aulas à distân-
cia dos dois Ælhos, mas também pela
gestão da “carga emocional”, que
está a deixar marcas em ambas as
crianças: “Há maior irritabilidade,
por exemplo, e um excesso de eufo-
ria em pequenas coisas.” Sinais de
um esgotamento que é comum à
generalidade dos alunos. A grande
diferença do primeiro para o segun-
do conÆnamento, para Ana Paulo
Lourenço, foi que a sua Ælha estava
“muito menos motivada”. “Talvez já
soubesse o que a esperava.”
Trabalhar a dobrar
Ana Paula Lourenço não é só mãe, é
também professora no Colégio Vasco
da Gama, em Sintra — dá aulas de
Português e Inglês a alunos do 8.º e
9.º anos. Depois de mais dois meses
de conÆnamento e ensino à distân-
cia, está particularmente desgasta-
da? A resposta sai com um suspiro:
“Estou cansadérrima.”
“Estamos esgotados. É como se
estivéssemos a trabalhar a dobrar”,
avalia, por seu turno, Ester Leopol-
do, professora de Português e Histó-
ria no 2.º e 3.º ciclos. A preparação
das aulas à distância “é mais traba-
lhosa” do que no ensino presencial.
Além disso, o feedback dos exercícios
resolvidos nas aulas, que normal-
mente seria quase imediato em con-
texto presencial, agora exige um
trabalho de correcção em casa.
Esta professora contratada está
este ano colocada a mais de 700 km
de sua casa, em Bragança, e tem de tece relativamente cedo e, em espe- las, muitas das quais não estão pre-
dar aulas em duas escolas do Algar- cial, do prolongamento deste ano paradas para dias de muito calor”,
ve, o que a obrigava a viagens diárias lectivo. antecipa o presidente da Associação
entre Portimão e Lagos. Mas o can- Em Julho, o Ministério da Educa- Nacional de Dirigentes Escolares,
saço físico de “muitas horas em fren- ção (ME) já tinha deÆnido que Manuel Pereira.
te ao computador é superior” ao 2020/21 seria mais comprido do que A 23 de Junho terminam as aulas
desgaste que sentia no dia-a-dia. E “o Devia haver uns o habitual, dando tempo aos profes- para os alunos do 3.º ciclo e secundá-
pior”, continua, é que o ano lectivo
está longe de estar terminado. “Devia cinco dias a meio do sores para recuperarem as aprendi-
zagens perdidas no primeiro ano da
rio, com excepção dos do 11.º e 12.º
anos, que, por terem provas nacio-
haver uns cinco dias a meio do 3.º
período para descansarmos, tanto os
3.º período para pandemia. Depois de as aulas pre-
senciais terem sido novamente sus-
nais, acabam as aulas a 18 de Junho.
Ou seja, alunos e professores ainda
professores como as crianças”, diz.
Os alunos terminaram as aulas do
descansarmos, pensas, a tutela decidiu acrescentar
mais sete dias úteis de aulas no Ænal
têm pela frente entre 11 e 14 semanas
de aulas até ao Ænal deste ano.
2.º período na última sexta-feira. O tanto os professores do ano, o que signiÆca que os alunos Fruto das mudanças no calendário,
regresso ao trabalho está agendado
para 5 de Abril — e para o 2.º e 3.º como as crianças do 1.º e 2.º ciclos, bem como as crian-
ças do pré-escolar, vão Æcar nas esco-
as férias de Páscoa são mais curtas do
que o habitual — apenas uma semana.
ciclos já será feito presencialmente. Ester Leopoldo las até 8 de Julho. Parte do período que devia ser de
Nessa altura, os estudantes terão ain- Professora “Vai ser duríssimo entrar pelo descanso foi encurtado para com-
da pela frente um 3.º período longo, Verão dentro. Não é só o cansaço, pensar as duas semanas de interrup-
conjugação de uma Páscoa que acon- mas também as condições das esco- ção lectiva inicialmente decretada
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
FOTOS: NELSON GARRIDO
O impacto da pandemia nas escolas em todo o mundo
Fonte: Unesco
Hugo Paiva e
Cláudio
Gonzaga com
os filhos: na
pandemia, as
famílias
tiveram de se
reinventar
Ana Paula
Lourenço não
é só mãe, é
também
professora
em Sintra:
“Estou
cansa-
dérrima”,
confessa
pelo Governo, quando decidiu voltar
a fechar as escolas, em Janeiro.
“A maioria das crianças e jovens
não parou nesses 15 dias”, comenta a
pedopsiquiatra Catarina Amaral. Em
muitas escolas, sobretudo no sector
privado, esse período foi de acompa-
nhamento intensivo dos alunos. Hou-
ve também “muitos pais que, não
sabendo bem o que fazer perante a
situação, deram tarefas diárias aos
Ælhos”, acrescenta a especialista. Por-
tanto, os alunos “não descansaram
nessa altura, ao mesmo tempo que
Æcaram sem período de férias”.
O período de conÆnamento e ensi-
no à distância tem provocado uma
“exacerbação de sintomas” nas crian-
ças que Catarina Amaral já acompa-
nhava nas suas consultas, com pro-
Parcialmente abertas Abertas
Escolas permanecem fechadas em 26 países
A
té ao final desta semana, o
cenário na Europa era este,
de acordo com os dados
actualizados regularmente
pela UNESCO: escolas abertas
em países como o Reino Unido,
Áustria, Espanha, Bélgica,
França; fechadas na Hungria e
na Estónia; e apenas
“parcialmente abertas” (ou seja,
a funcionar só para alguns
graus de ensino ou em certas
regiões ou ainda num sistema
misto de ensino presencial e à
distância), na maioria dos
países europeus. É o caso de
Portugal, Itália, Irlanda,
Alemanha, República Checa,
Suécia, Noruega.
O mapa da UNESCO do
impacto da pandemia nas
escolas mostra que há 26 países
do mundo onde todos os
estabelecimentos de ensino
estão fechados. E muitos
outros, como Portugal, com
estabelecimentos parcialmente
abertos e onde muitas crianças
e jovens se mantêm apenas a
aprender à distância.
No início do mês, a ONG Save
the Children fazia as contas: a
pandemia declarada em Março
do ano passado retirou, no pico
do fecho das escolas, 91% dos
Fechadas por causa da covid-19
alunos das salas de aula de todo
o mundo. E depois da abertura
pouco ou nada voltou ao
normal. Em Inglaterra, por
exemplo, dados relativos ao
primeiro confinamento
revelaram que os alunos do Year
2 (seis a sete anos de idade)
tinham dois meses de atraso na
aquisição de competências
relativamente aos alunos de
anos anteriores; no caso dos
alunos desfavorecidos, este
atraso é de sete meses, como
se recorda no estudo
Aprendizagens Perdidas devido
à Pandemia: uma proposta de
recuperação, de um grupo de
economistas da Nova School of
Business and Economics (Nova
SBE), divulgado na sexta-feira.
Já nos Estados Unidos,
concluiu-se que os alunos do
2.º e 3.º ano tinham capacidade
de leitura oral 30% inferior às
dos seus colegas em anos
anteriores.
A Save the Children estima
que até agora as crianças
perderam em média 74 dias de
aprendizagem escolar devido
ao fecho de escolas. Nos países
mais pobres, este número é
muito maior, na América Latina
e Caribe ultrapassa os 110 dias.
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 5
blemas de ansiedade, déÆce de aten-
ção ou mesmo ansiedade. Além disso,
a pedopsiquiatra começa a notar sin-
tomas de burnout, sobretudo nos
jovens do ensino secundário.
“É preciso fazer um esforço extra”
para aprender as matérias que nem
sempre Æcam bem sabidas durante
as aulas à distância, admite Maria
Canudo. Esta aluna do 12.º ano da
Escola Secundário du Bocage, em
Setúbal, acredita que, no ensino
remoto, “não se aprende tanto como
nas aulas presenciais”.
“Ninguém aprende assim”
Margarida Ribeiro, que anda no 11.º
ano na Escola Secundária Carlos Ama-
rante, em Braga, conta algo seme-
lhante. Os professores “estão mais
preocupados em dar a matéria que
dizem que está atrasada”. Só a profes-
sora de Matemática parece entender
a necessidade de haver pausas duran-
te as aulas — “para ir comer ou beber
alguma coisa ou simplesmente esticar
o corpo”.
Às segundas-feiras, Margarida tem
aulas no computador entre as 8h05 e
as 18h50, apenas com pausa para o
almoço. “Na aula de Geologia, passa-
mos 2h15 sentados a ouvir falar de
rochas. Eu começo a ‘desligar’ ao Æm
de 1h30, porque tenho alguma capa-
cidade de concentração, mas acredi-
to que haja colegas que ‘desliguem’
mais cedo”, ilustra. “Ninguém apren-
de assim.”
O ensino secundário é o último
nível da escolaridade obrigatória a
PÚBLICO
regressar às aulas presenciais, a 19 de
Abril. A data começa já a causar algu-
ma ansiedade a Margarida Ribeiro,
porque os professores já estão a mar-
car testes para essas primeiras sema-
nas — “Vai ser tudo seguido.”
A pressa dos professores da Escola
Secundária Carlos Amarante, em Bra-
ga, em marcar testes escritos no
momento do regresso ao ensino pre-
sencial contrasta com o que foram as
últimas semanas. Os alunos da turma
de Margarida não Æzeram testes e o
trabalho feito à distância vai ter um
peso residual na nota do 2.º período:
95% da classiÆcação baseia-se em ele-
mentos de avaliação do 1.º período.
“É frustrante. No contexto em que
estamos, fazermos ou não fazermos,
é igual”, desabafa a estudante do 11.º
ano. O caso da Secundária de Braga
não é o único e há outras escolas que
decidiram dar um peso elevado ao
que aconteceu no período anterior,
desvalorizando o período de ensino
à distância. Os conselhos de turma
vão reunir-se na próxima semana
para atribuir as notas dos alunos. O
ME não emitiu qualquer orientação
relativa às avaliações.
Pelo contrário, na Secundário du
Bocage, em Setúbal, os alunos Æze-
ram testes e apresentações orais
durante o ensino remoto. A todas as
disciplinas há “pelo menos um ele-
mento de avaliação” relativo ao 2.º
período, além da valorização do tra-
balho contínuo à distância, explica
Maria Canudo. “A maioria dos meus
colegas até melhorou as notas.”
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
6 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021

Espaço público

Os museus à beira do abismo

N
ão é possível Æcar
Editorial impassível perante o
retrato que em dois dias
o PÚBLICO apresentou
sobre o estado dos
museus nacionais, instituições
insubstituíveis na construção da
David Pontes identidade de um povo, enquanto
locais de preservação e discussão
da memória, de descoberta de
cultura, de usufruto de um
percurso comum onde se condensa
o melhor de nós.
A perda dos melhores recursos
humanos, os guardiões dos
tesouros, e a degradação das
instalações que deveriam ser a
garantia de preservação desse
É uma situação de património são um sério alerta para
falência que alguns o estado a que conduziu o
museus nacionais permanente subfinanciamento e
parecem viver quando abandono destas instituições.
Estamos em “estado de catástrofe
não têm recursos para anunciada”, escreve a historiadora
assegurar as suas de arte Raquel Henriques da Silva,
funções básicas em carta aberta ao
primeiro-ministro, sublinhando
que os museus nacionais “estão na
iminência de serem palco de
desastres graves”.
Ninguém quer chegar aí, a essa
sensação de perda irreparável que é
ver destruído por desleixo e incúria
o que não pode nunca ser
substituído. As chamas do Museu
Nacional do Brasil estão ainda bem
presentes, para nos lembrar o que é
sofrer isso. Mas, quando vemos o
director do Museu Nacional de Arte
Antiga aÆrmar que o seu espólio
está verdadeiramente em risco,
sabemos que estamos na borda
desse abismo.
É urgente que o Governo saia do
seu torpor. Não somos um país rico,
a pandemia piorou tudo, mas não
consta que o Estado esteja falido.
Mas é uma situação de falência que
alguns museus nacionais parecem
viver quando não têm recursos
para assegurar as funções básicas
de preservação e segurança do
património à sua guarda. Quando
um museu deixa de poder
proteger a sua colecção, deixa de
ser museu.
Mas já não chega o Governo,
nem nunca chegou.
Continuaremos a repetir os ciclos
de estagnação e a perpetuar o
nosso atraso enquanto não
incrustarmos nas nossas ambições
e consequentes indignações
colectivas que a cultura e o
conhecimento são chaves
essenciais para deslindarmos este
nó. Hoje, como país, devemos
alegrar-nos por ver os professores
serem vacinados, mesmo que os
atrasos impeçam muitos outros de
receberem essa segurança,
porque sabemos que estamos a
investir no sucesso de um sector
essencial para o nosso futuro.
Amanhã deveríamos, pelas
mesmas razões, cuidar da saúde,
em risco de colapso, dos nossos
museus.

CARTAS AO DIRECTOR
Camisola
poveira
Ao invés de convidar a estilista
norte-americana Tory Burch a
visitar a Póvoa de Varzim, a
edilidade camarária poveira
ameaça com processo em
tribunal pela indevida
apropriação da tradicional
camisola poveira, fazendo-a
constar do seu catálogo de
vendas, como sendo de
inspiração mexicana.
Segundo noticiou a Visão, a
consultora de design de Tory
Burch é portuguesa. A
publicidade feita à volta da
fantástica camisola só fez
disparar a curiosidade sobre esse
traje e sobre o concelho poveiro.
Não se compreende como a
Câmara Municipal da Póvoa de
Varzim não iniciou há mais
tempo o processo de certiÆcação
no Instituto Nacional da
Propriedade Industrial. O
PÚBLICO está de parabéns por
ter sido o primeiro jornal a
noticiar a apropriação.
Ademar Costa, Póvoa de Varzim
Era uma vez um cão
muito peludo
O que tenho lido sobre o negócio
da compra da Groundforce (GF)
têm-me sido muito útil e
formativo em negócios.
Aproveitando os ensinamentos
da GF e do “sistema GF”, dei um
presente aos meus filhos, que há
muito tempo me pediam para
lhes comprar um cão. Só que o
bicho que eles queriam era um
daqueles especiais, com
pedigree, muito pequeninos e de
pêlo encaracolado abundante,
que cabem num bolso. Só que
estes animais custam balúrdios e
o mais barato que encontrei não
Æcava por menos de três
balúrdios. E eu não tinha esse
pecúlio, longe disso.
Foi então que usei o “sistema
GF” e acordei com o dono do
perro o seguinte negócio. Ele
dava-me o cão e fazíamos um
contrato pelo qual eu, no prazo
de três anos, lhe pagava o
animal, dando como garantia o
meu bom-nome na praça por ser
proprietário de uma empresa de
transportes (de cães). Fechado o
contrato, levei o bicho ao
tosquiador que lhe cortou o pêlo
raso. Ora o pêlo desta raça tem
um alto valor de mercado e
vendi-o facilmente por dois
balúrdios. Dei um ao vendedor e
guardei o outro. Um ano depois,
o pêlo tinha crescido o suÆciente
para nova tosquia e outros dois
balúrdios. Paguei uma segunda
prestação e esperei outro ano.
Depois de nova tosquia facturei
mais dois balúrdios, paguei a
última prestação e ainda
amealhei três balúrdios.
É o que se chama comprar um
cão com o pêlo do mesmo cão.
Perceberam o sistema?
Jorge Mónica, Parede
Maria João Marques
e a covid-19
Maria João Marques publicou no
dia 24 de Março, no PÚBLICO,
um artigo intitulado “Como nos
protegemos dos negacionistas da
vacina covid?”. Quero começar
por declarar que sou a favor das
vacinas, irei tomar a vacina
contra a covid-19 e considero a
presente pandemia um grave
risco para a saúde; nisso estou de
acordo com Maria João Marques.
O que já questiono é a ideia
subliminarmente transmitida de
obrigatoriedade da vacina. É que
o raciocínio de Maria João
Marques assenta num
pressuposto que me parece
errado: o de que os vacinados
não contagiam. Ora, pelo que
julgo saber (e a não ser assim
espero ser corrigido), a vacina
evita o desenvolvimento da
doença mas não evita a entrada
do vírus no organismo nem a
possibilidade de contágio. Deste
modo, acho que a ideia da Maria
João Marques não é sustentada
pela ciência.
José Jorge Abreu, Cascais
Negacionistas
Maria João Marques advoca no
seu artigo que quer iniciar um
debate sobre os negacionistas
das vacinas, mas começa mal.
Em primeiro lugar, assume como
certo que os negacionistas não
acreditam na covid-19, nem nas
máscaras, nem nas vítimas, e
acaba a comparar o espírito de
sacrifício dos negacionistas aos
resistentes nazis. Só lhe faltou
acrescentar que acreditam que a
terra é plana, para que o quadro
de “maluquinhos” Æcasse
completo. Ora não é assim,
existem muitas pessoas
antivacinas que não negam a
covid-19, e os vacinados são,
segundo os especialistas, quem
estará protegido, mas não
deixaram de ser portadores.
Todas as vacinas foram
aprovadas com carácter de
emergência, o que quer dizer
que não o teriam sido em
situação normal. E Ænalmente,
não se refere aos perigos sobre
abrir um precedente de
obrigatoriedade.
Se Maria João Marques quer
iniciar um debate sobre os não
vacinados acho bem, mas era
bom que começasse de um modo
mais sério, com tanto
preconceito não há debate
possível.
Patrícia Vieira, Penela

As cartas destinadas a esta secção têm de ser enviadas em exclusivo para o PÚBLICO e não devem exceder as 150 palavras (1000 caracteres). Devem indicar o nome, morada e contacto
telefónico do autor. Por razões de espaço e clareza, o PÚBLICO reserva-se o direito de seleccionar e editar os textos e não prestará informação postal sobre eles cartasdirector@publico.pt
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
BARTOON LUÍS AFONSO
ESCRITO NA PEDRA
“A vida não é mais do que uma contínua
sucessão de oportunidades para sobreviver”
Gabriel García Márquez (1927-2014), escritor
Nos últimos meses, em vários hospitais,
tivemos de cancelar cirurgias porque não havia
sangue de reserva Alexandre Valentim Lourenço
(presidente da Ordem dos Médicos do Sul )
O NÚMERO NESTE DIA 28 DE MARÇO
2,76
1930 Na Turquia, Constantinopla passa a desi-
gnar-se Istambul, e Angorá, Ancara 1939 Final
da Guerra Civil de Espanha com a rendição de
Madrid às forças do general Franco 1943 Morre,
aos 69 anos, o compositor e pianista Sergei
Rachmaninov 1974 Arquitecto e designer hún-
garo Erno Rubik cria o cubo Rubik 1977 Formali-
zado o pedido de adesão de Portugal à CEE 1978
Instituído o 12.º ano de escolaridade, em
substituição do Ano Propedêutico 1985 Morre,
A covid-19 matou pelo menos aos 92 anos, o pintor Marc Chagall 1994 Morre o
2.768.431 pessoas em todo o dramaturgo Eugéne Ionesco, aos 81 anos 2002
mundo, de acordo com o balanço Morre, aos 95 anos, o cineasta Billy Wilder 2019
de ontem da agência AFP Morre, aos 90 anos, Agnès Varda, realizadora
Ciranda
de roda
Ainda ontem
tem
H
Miguel Esteves Cardoso
oje vi uma andorinha
no chão, a bater as
asas. Pensei que
estivesse ferida mas
não, estava feliz.
Tinha acabado de
chegar e estava a desfazer as malas.
Estava a pendurar roupa, a tocar
campainhas, a chamar os insectos
alados. Não sei o que me levou a
pensar que estava aÇita, depois de
ter percorrido oito mil quilómetros
para cá chegar.
Não podendo mudar de
concelho, toda a gente faz questão
de calcorrear o concelho. É como se
tivéssemos sido invadidos por
turistas internos. Para mais, o
concelho de Sintra é enorme e a
população mexe-se bem, papando
quilómetros como se fossem
travesseiros.
Talvez para a próxima pandemia
fosse possível honrar o espírito do
small is beautiful e proibir que se
circulasse fora da freguesia onde se
vive ou, melhor ainda, fora da
freguesia onde se nasceu.
Hoje roubam-nos uma hora mas é
uma hora que se entrega de
bandeja: Æquem com ela, façam
muito bom proveito e venha de lá
esse Verão. Já há uns dias que ando
a circundar a praia onde vou
marinar, enchendo as narinas das
exalações dos bivalves, passando os
dedos pela areia a ver se aqueceu
desde ontem, consultando a
temperatura da água, a ver se já
dava para dar um mergulho.
Já se fazem conversas graduadas:
“Eu com catorze já tomo...”
“Ai, eu já tomo com treze...”
“Mas já estão treze...”
“Mas só com mais de vinte cá
fora...”
Não sou só eu. Somos muitas
moscas à volta do mel. Alguns
dentre nós já andam de calções de
banho desde que entrou o Março,
na esperança de que a Primavera se
tome de calores diante pernas tão
bem curtidas e torneadas. Há uma
osga com quem me cruzo,
permanentemente tisnada desde
que caiu num caldeirão de Ambre
Solaire, que ontem me dirigiu a
palavra: “Já estamos a cirandar,
amigo, já estamos a cirandar!”
Ah pois estamos.
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 7
A opinião publicada no jornal respeita
a norma ortográfica escolhida pelos autores
publico.pt
Lisboa Porto
Edifício Diogo Cão, Rua Júlio Dinis,
Doca de Alcântara Norte n.º 270 Bloco A 3.º
1350-352 Lisboa
Tel. 210 111 000
4050-318 Porto
Tel. 226 151 000
publico@publico.pt
DIRECTOR
Manuel Carvalho
Directores adjuntos
Amílcar Correia, Ana Sá Lopes, David Pontes, Tiago Luz Pedro
Directora de arte
Sónia Matos
Editoras executivas Andreia Sanches, Helena Pereira Editor de fecho José
J. Mateus Editor P2 Sérgio B. Gomes Online Mariana Adam, Patrícia Jesus,
Pedro Rios, Ivo Neto, Pedro Esteves (editores), Claudia Carvalho Silva, Filipa
Almeida Mendes, Inês Chaíça, Miguel Dantas; Aline Flor, Ruben Martins
(áudio); Carolina Pescada, Teresa Abecasis, Teresa Pacheco Miranda, Vera
Moutinho (vídeo); Ricardo Sampaio (responsável técnico); Pedro Guerreiro
(editor de redes sociais), Patrícia Campos, Lucas Freitas; Rui Barros
(jornalista de dados) Política Sónia Sapage, Álvaro Vieira (editores), São
José Almeida (redactora principal), Leonete Botelho, Luciano Alvarez
(grandes repórteres), Liliana Borges, Margarida Gomes, Maria João Lopes,
Maria Lopes, Marta Moitinho Oliveira, Nuno Ribeiro, Sofia Rodrigues Mundo
Ana Gomes Ferreira, António Rodrigues (editores), Bárbara Reis, Jorge
Almeida Fernandes, Teresa de Sousa (redactores principais), Rita Siza
(correspondente em Bruxelas), Alexandre Martins, António Saraiva Lima,
Clara Barata, João Ruela Ribeiro, Maria João Guimarães, Sofia Lorena
Sociedade Rita Ferreira, Pedro Sales Dias (editores), Clara Viana (grande
repórter), Alexandra Campos, Ana Cristina Pereira, Ana Dias Cordeiro, Ana
Henriques, Ana Maia, Joana Gorjão Henriques, Mariana Oliveira, Natália
Faria, Patrícia Carvalho, Samuel Silva, Sónia Trigueirão Local Ana Fernandes
(editora), Abel Coentrão, Cristiana Moreira, João Pedro Pincha, Mariana
Correia Pinto Economia Pedro Ferreira Esteves, Isabel Aveiro (editores),
Cristina Ferreira, Sérgio Aníbal (grandes repórteres), Ana Brito, Luís
Villalobos, Luísa Pinto, Pedro Crisóstomo, Raquel Martins, Rosa Soares,
Victor Ferreira Ciência Teresa Firmino (editora), Andrea Cunha Freitas,
Teresa Serafim Tecnologia Karla Pequenino Cultura/Ípsilon Paula
Barreiros, Inês Nadais (editoras), Vasco Câmara (editor Ípsilon), Isabel
Coutinho (subeditora), Nuno Pacheco (redactor principal), Isabel Salema,
Sérgio C. Andrade (grandes repórteres), Joana Amaral Cardoso, Lucinda
Canelas, Luís Miguel Queirós, Mário Lopes, Vítor Belanciano Desporto
Jorge Miguel Matias, Nuno Sousa (editores), Augusto Bernardino, David
Andrade, Diogo Oliveira, Marco Vaza, Paulo Curado Fugas Sandra Silva
Costa, Luís J. Santos (editores), Alexandra Prado Coelho (grande repórter),
Luís Octávio Costa, Mara Gonçalves Guia do Lazer Sílvia Pereira
(coordenadora), Cláudia Alpendre, Sílvia Gap de Sousa Ímpar Bárbara
Wong (editora), Carla B. Ribeiro P3 Amanda Ribeiro, Ana Maria Henriques,
Renata Monteiro, Mariana Durães Projectos Editoriais João Pedro Pereira
(editor), João Mestre Fotografia Miguel Manso, Manuel Roberto (editores),
Adriano Miranda, Daniel Rocha, Nelson Garrido, Nuno Ferreira Santos,
Paulo Pimenta, Rui Gaudêncio, Alexandra Domingos (digitalização), Isabel
Amorim (documentalista) Paginação José Souto (editor de fecho), Marco
Ferreira (subeditor), Ana Carvalho, Ana Fidalgo, Joana Lima, José Soares,
Nuno Costa, Sandra Silva, Sofia Espadinha Martins; Paulo Lopes, Valter
Oliveira (produção) Copy-desks Aurélio Moreira, Florbela Barreto, Manuela
Barreto, Rita Pimenta Design Digital Dinis Correia (coordenador), David
Mano, Filipe Ribeiro, Gabriel Sousa, Miguel Cabral Infografia Célia
Rodrigues (coordenadora), Cátia Mendonça, Francisco Lopes, José Alves
Marketing Editorial Joana Villas (coordenadora), João Mota, Ruben Matos
Secretariado Isabel Anselmo, Lucinda Vasconcelos Centro de
Documentação Leonor Sousa
Publicado por PÚBLICO, Comunicação Social, SA.
Presidente Ângelo Paupério
Vogais Cláudia Azevedo, Ana Cristina Soares e João Günther Amaral
Área Financeira e Circulação Nuno Garcia Recursos Humanos Maria José
Palmeirim Direcção Comercial Mafalda Campos Forte Direcção de
Assinaturas e Apoio ao Cliente Tiago Senna Análise de Dados Elisabeth
Fernandes Inovação Digital Guida Marques Pinto Área Marketing Produto
Alexandrina Carvalho Área de Novos Negócios Mário Jorge Maia
NIF 502265094 | Depósito legal n.º 45458/91 | Registo ERC n.º 114410
Proprietário PÚBLICO, Comunicação Social, SA | Sede: Lugar do Espido,
Via Norte, Maia | Capital Social €4.050.000,00 | Detentor de 100% de
capital: Sonaecom, SGPS, S.A. | Publicidade comunique.publico.pt/
publicidade | comunique@publico.pt | Tel. 210 111 353 / 210 111 338 / 226 151
067 | Impressão Unipress, Tv. de Anselmo Braancamp, 220, 4410-350
Arcozelo, Valadares; Empresa Gráfica Funchalense, SA, Rua da Capela de
Nossa Senhora da Conceição, 50, 2715-029 Pêro Pinheiro | Distribuição
VASP – Distribuidora de Publicações, Quinta do Grajal – Venda Seca,
2739-511, Agualva-Cacém | geral@vasp.pt
Membro da APCT Tiragem média total de Fevereiro 21.705 exemplares
O PÚBLICO e o seu jornalismo estão sujeitos a um regime
de auto-regulação expresso no seu Estatuto Editorial
publico.pt/nos/estatuto-editorial
Reclamações, correcções e sugestões editoriais podem
ser enviadas para leitores@publico.pt
ASSINATURAS
Linha azul 808 200 095
(dias úteis das 9h às 18h)
publico.pt/assinaturas
assinaturas@publico.pt
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
8 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021
Espaço público
Uma Páscoa do Mundo
Frei Bento Domingues O.P.
O modo como é entendida
e vivida a Páscoa cristã
depende de cada um
e das Igrejas em que
se reconhecem
1.
Entramos na Semana Santa ou,
como já foi usual dizer, na
Semana Maior. Os
acontecimentos que estão na
origem das várias correntes e
expressões do movimento cristão
dividiram o tempo: antes e depois de Cristo, a
partir do seu nascimento. Esta era
cronológica (Era Cristã ou Era Comum) é
globalmente adoptada, mesmo em países de
cultura maioritariamente não cristã, para
efeitos de unanimidade de critérios em vários
âmbitos, como o cientíÆco e o comercial. Nem
todos os países seguem o calendário
ocidental. Contudo, tornou-se o padrão
internacional, sendo reconhecido por
instituições como a ONU ou a União Postal
Universal, por razões conhecidas.
O modo como é entendida e vivida a Páscoa
cristã depende de cada um e das Igrejas em
que se reconhecem. Na Europa, já não
estamos em regime de Cristandade. A
separação entre Igrejas e Estado está
felizmente consumada em muitos países, mas
a ignorância das próprias tradições religiosas
parece-me, culturalmente, lamentável.
As pessoas da minha idade já conheceram
várias formas de entender e viver o Tempo
Pascal. Em certas zonas do país, procura-se
reconstituir, por devoção e louváveis razões
culturais, ecos da Semana Santa como a
viviam os nossos avós.
Entretanto, Portugal vai mudando. De ano
para ano, por causa da desertificação do
interior rural e da alteração cultural e religiosa
do país, a Semana Santa tem significações
muito diferentes conforme as comunidades
humanas. Os calendários religiosos reflectem
a diversidade religiosa [1].
Escrevo a partir do interior da Igreja
Católica que tem um pormenorizado ritual
das celebrações pascais. A configuração que
essas celebrações assumem — segundo as
paróquias, os movimentos e as congregações
religiosas — pode ser muito diferente. Para
quem dispõe de meios de deslocação, tem a
possibilidade de fazer algumas escolhas,
embora os textos litúrgicos sejam,
fundamentalmente, semelhantes, fruto de
selecções bíblicas.
O modo como está distribuída a encenação
da Semana Santa supõe que Jesus tinha
manifestado ruidosamente a sua oposição ao
sistema económico, social, político e religioso,
O Papa Francisco sonha
e luta pela morte dos
poderes de opressão
e pela ressurreição de
um mundo de irmãos.
Páscoa da Igreja e
Páscoa do Mundo!
organizado em torno do Templo de
Jerusalém. Esse sistema teocrático era, para
Ele, um engano escandaloso, pois não
passava de uma sacralização de negócios.
2. O Domingo de Ramos, segundo os quatro
Evangelhos, evoca um acontecimento
paradoxal que se vai radicalizar no tríduo
pascal: a recusa do messianismo político e do
reinado político de Deus, a recusa da teocracia.
No Domingo de Ramos, a resposta de Jesus
à manifestação popular, que o evocava como
incarnando “o reino do nosso pai David”,
parece ridícula: um rei não se apresenta
montado num jumentinho. Tem de mostrar
PAULO PIMENTA
grandeza na trepidação dos cavalos do
Exército. Um rei de jumentinho está a mostrar
que o seu reinado é de outra ordem, de ordem
desconhecida, muito humilde.
Tudo isto vai ser explicitado num eloquente
diálogo de surdos, encenado por S. João, que
importa ler devagar e meditar na revolução
religiosa e política que encerra. Continua
ainda hoje inquietante, indicando que o
mundo todo precisa de uma grande Páscoa,
de morrer ao império do eu, renascendo para
um mundo de irmãos.
Retenhamos este fragmento da longa
narrativa da Paixão: quando Jesus foi preso e
levado a tribunal pelas autoridades judaicas,
que o entregaram ao poder romano, Pilatos
quis saber qual era a acusação. Depois de
várias movimentações, perguntou a Jesus: Tu
és rei dos judeus? Respondeu-lhe Jesus: Tu
perguntas isso por ti mesmo ou porque outros
to disseram de mim? Pilatos replicou: Serei
eu, porventura, judeu? A tua gente e os sumos
sacerdotes é que te entregaram a mim! Que
Æzeste? Jesus respondeu: o meu reino não é
deste mundo; se o meu reino fosse deste mundo,
os meus guardas teriam lutado para que Eu não
fosse entregue aos judeus. Agora, o meu reino
não é daqui. Disse-lhe Pilatos: Então, Tu és rei?
Respondeu-lhe Jesus: tu dizes que sou rei.
Para isto nasci, para isto vim ao mundo, para
dar testemunho da Verdade. Todo aquele,
cujo ser é da Verdade, ouve a minha voz.
Diz-lhe Pilatos: o que é a verdade? E, tendo
dito isto, de novo saiu ao encontro dos judeus
e diz-lhes: eu não encontro qualquer culpa
nele [2]. Hoje, fala-se muito, pratica-se pouco,
da chamada política de transparência, mas
até as manobras da transparência podem
ocultar a verdade.
3. Como vimos, S. João marcou a recusa
messiânica do poder político em nome de
Deus. Para o Ælósofo Jean-Luc Nancy, existe
actualmente uma epidemia teocrática para
atacar a democracia [3]. A cartograÆa deste
procedimento começa na Índia,
“obviamente”, prossegue no Japão onde o
ex-primeiro-ministro Shinzo Abe tinha
multiplicado os sinais de entrelaçamento do
Estado com o xintoísmo, mesmo
tendencialmente de um retorno à divindade
anterior do imperador. A seguir, vem a
Turquia, onde se veriÆcou a reapropriação
muçulmana de Hagia Sophia (Santa SoÆa) em
Istambul, símbolo de toda uma política. A lista
inclui ainda a Birmânia, onde a resistência do
Estado ao budismo nacionalista e violento
não impede a progressão desta corrente, à
qual o novo governo é mais favorável do que o
anterior (que não evitou a perseguição aos
muçulmanos).
Jean-Luc Nancy nota que fenómenos
semelhantes estão a surgir na Tailândia e no
Camboja, onde o budismo theravada já é a
religião oÆcial. Também a recente lei israelita
do “Estado judeu”, as relações do Estado
russo com a religião ortodoxa e do Estado
húngaro com a Igreja Católica inscrevem-se
nesta tendência. O mapa da “epidemia
teocrática” regista a ascensão política dos
evangelistas nos Estados Unidos ou no Brasil
— incentivada e elogiada por Trump e
Bolsonaro. O Ælósofo conclui com uma
referência às agitações fundamentalistas cada
vez mais barulhentas, por parte, por
exemplo, dos católicos franceses.
A instrumentalização religiosa é um abuso.
Para o citado Ælósofo, uma religião digna
desse nome não consiste num esforço para
reactivar um passado, mas num fervor novo,
criativo. O que, todavia, se veriÆca é que a
avidez religiosa dos manipuladores políticos
(e mercantis) pretendem reactivar passados
distorcidos e truncados, submetidos às
necessidades da causa. A teocracia, que mais
ou menos assombra a epidemia actual — e
sempre em oposição à democracia —, não é
necessariamente o espírito das religiões
invocadas.
A democracia ainda não é o regime das
estruturas do poder, na Igreja Católica. O Papa
Francisco sonha e luta pela morte dos
poderes de opressão e pela ressurreição de
um mundo de irmãos. Páscoa da Igreja e
Páscoa do Mundo!
[1] Alfredo Teixeira (org.), Identidades
Religiosas em Portugal, Paulinas, 2012.
[2] Cf. Jo 18, 28-38; ver também Jo 12, 20-36.
[3] Cf. 7Margens, Eduardo Jorge Madureira,
Jean-Luc Nancy contra a manipulação religiosa
do poder, 15.03.2021. Não reproduzi na
íntegra.
Escreve ao domingo
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
A triste história de um Conselho Europeu deprimente
Sem fronteiras
Teresa de Sousa
O último Conselho
Europeu terminou como
começou. Sem qualquer
solução à vista
1.
Acabou mais cedo, revelando o
cansaço e a falta de soluções dos
líderes europeus, depois de um
ano tremendo. Teve como
convidado especial o Presidente
Joe Biden, que foi, por um breve
período de tempo, um líder europeu
honorário. Remeteu as questões mais
intragáveis para os representantes
permanentes. Fez um arremedo de ameaça
aos países onde o processo de vacinação é
mais rápido — leia-se Reino Unido —, que não
será mais do que uma forma de pressão.
Seria muito pouco avisado proibir a
exportação de vacinas para países que
exportam para a União Europeia
matéria-prima essencial para o seu fabrico,
incluindo o funcionamento dos
biorreactores necessários para as produzir.
A proposta da Comissão para travar a
exportação de vacinas teve desde o início a
oposição de vários países, entre os quais os
nórdicos ou a Bélgica (e também de
Portugal, embora mais discretamente,
porque tem de manter a isenção própria de
quem exercesse a presidência).
O Conselho Europeu terminou como
começou. Sem qualquer solução à vista.
Tudo estaria melhor se a Europa não
enfrentasse uma terceira vaga da pandemia,
que volta a obrigar ao confinamento mais ou
menos generalizado e a aumentar a pressão
sobre os sistemas de saúde. Na sexta-feira,
durante toda a tarde, o título que fez
manchete no site do Financial Times foi este:
“A Europa avisa que os hospitais se
aproximam da ruptura com a terceira vaga a
crescer.” “Se não houver forma de a conter,
corremos o risco de o nosso sistema de
saúde atingir o seu ponto de ruptura em
Abril”, disse em Berlim o ministro da Saúde
alemão. O Bild, o tablóide mais vendido na
Alemanha e um indefectível apoiante da
chanceler, questionava-se sobre se “Merkel
não estaria cansada demais para a tarefa”.
2. Talvez o sintoma mais deprimente da
reunião tenha sido o facto de ter passado
horas e horas a discutir as queixas do
chanceler austríaco, Sebastian Kurz, que diz
que o seu país foi prejudicado na
distribuição de vacinas, arrastando com ele
a Bulgária, Croácia e Letónia. Quer agora
que a próxima remessa da PÆzer compense
a Áustria dessas alegadas perdas. Não
convenceu ninguém. Há uma chave de
distribuição das vacinas pelos
Estados-membros em função da população
que tem sido cumprida. Houve países que
apostaram mais na AstraZeneca por causa
do preço, e que agora pagam pelas falhas na
sua distribuição. Mas isso não parece
desencorajar Sebastian Kurz, que aponta o
dedo à incompetência da Comissão,
irritando profundamente a chanceler.
Depois de horas de discussão, o assunto
foi, pura e simplesmente, remetido para o
Coreper, que reúne os embaixadores
permanentes dos Estados-membros em
Bruxelas. A imprensa europeia fala nas
diÆculdades internas do chanceler austríaco
para explicar o seu comportamento. O
Governo de coligação entre os
conservadores de Kurz e os Verdes está
envolvido em vários escândalos e o jovem
chanceler vê a sua popularidade baixar. Vale
a pena recordar que a Áustria ameaça vetar
a ratiÆcação do tratado de comércio livre
entre a União Europeia e o Mercosul, que se
arrasta há anos, porque os ecologistas não
aceitam as práticas agrícolas do Brasil. A
França ainda levanta algumas objecções,
mas por razões mais concretas: sendo o
maior produtor agrícola da Europa, teme a
concorrência brasileira. A questão não é
apenas económica. É uma questão de
inÇuência política num subcontinente com
fortes aÆnidades com o Velho Continente,
hoje disputado abertamente pela China.
3. As expectativas de recuperação
económica Æcam para cada vez mais tarde.
O esforço dos governos para compensar
empresas e pessoas é cada vez maior. As
perspectivas de crescimento económico
para este ano vão sendo reduzidas. Nos
Estados Unidos, com a vacinação a cobrir já
mais de cem milhões de americanos e com
Biden a garantir 200 milhões até ao 100.º dia
da sua presidência, no início de Maio, as
previsões da Reserva Federal são de um
crescimento de 6,5% — um valor quase
“chinês”.
A ironia desta história é que a União
chegou ao Verão do ano passado cheia de
orgulho e de conÆança pela forma como
estava a enfrentar a pandemia — quer do
ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA
A União chegou
ao Verão do ano passado
cheia de orgulho e de
conÄança. Hoje,
esse espírito parece
ter-se esfumado
ponto de vista da saúde pública, quer do
ponto de vista económico. Houve quem
falasse, ainda que com algum exagero, em
“Momento Hamiltoniano”, quando os
líderes europeus aprovaram em Julho um
impressionante fundo de recuperação de
750 mil milhões de euros para fazer face aos
efeitos económicos devastadores da
pandemia, sobretudo nos países mais
frágeis, Ænanciado pela emissão de dívida
conjunta. “Esta decisão marcou uma
mudança em relação à ultima década,
durante a qual a União avançou de crise em
crise recorrendo a soluções conservadoras e
de curto prazo, que não enfrentaram os
problemas da zona euro, da segurança, das
migrações ou de um ambiente internacional
hostil”, escreve Rosa Balfour, directora do
Carnegie Europe.
Hoje, esse espírito parece ter-se esfumado.
O Fundo de Recuperação e Resiliência
continua à espera de ratiÆcação pelos
parlamentos nacionais para poder chegar ao
terreno. Talvez lá para o Verão. Na
sexta-feira, a sua ratiÆcação enfrentou mais
um obstáculo, quando o Tribunal
Constitucional alemão decidiu suspender o
processo de ratiÆcação, depois de um grupo
de cidadãos ter interposto recurso contra a
emissão de dívida conjunta. O fundo já tinha
sido aprovado pelo Bundestag por uma
ampla maioria, ainda que pondo a ênfase na
sua natureza provisória. Entretanto, Joe
Biden tomou posse a 20 de Janeiro,
apresentou algumas semanas depois um
pacote de recuperação da economia de
quase dois biliões de dólares (o terceiro
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 9
desde o início da pandemia), o Congresso
aprovou no dia 10 de Março e o dinheiro já
chegou às empresas, às pessoas e aos
governos estaduais. É verdade que os
Estados Unidos são um país e a União reúne
27 países, tornando os processos de decisão
mais demorados. Mas isso não explica tudo.
4. A presença de Joe Biden foi o único
momento agradável e descontraído do
encontro dos líderes. As palavras de
boas-vindas de Charles Michel foram
simpáticas, mas não mais do que isso. Aliás,
partiu dele o convite ao Presidente. As de
Biden e as do primeiro-ministro português,
a quem coube falar em nome dos 27, foram
mais do que circunstanciais. Para além das
referências ao combate às alterações
climáticas, que os EUA querem liderar,
Biden falou da importância vital de reforçar
a competitividade das duas economias e
voltou à mensagem mais forte da sua política
externa, desaÆando a Europa a juntar-se aos
EUA no “desaÆo mais galvanizador do nosso
tempo” — enfrentar a ascensão do
autoritarismo no mundo. A sua esperança é
que os EUA e a União, se agirem em
conjunto, possam levar a uma mudança de
comportamento da China e a resolver alguns
problemas com a Rússia.
O primeiro-ministro português disse duas
ou três coisas politicamente relevantes.
Referiu o interesse dos dois lados numa
recuperação que permita reconstruir
“melhor”, assente em três vectores
essenciais: uma transição verde e digital que
seja justa; um comércio mundial aberto e
justo, mesmo em tempo de crises; uma
aposta em energias mais sustentáveis e mais
seguras. A nota mais importante da sua
intervenção foi sobre as mudanças a que
assistimos à escala global, as quais
“aconselham a revitalização da parceria
única com os EUA”, incluindo uma
abordagem cooperativa para lidar com os
seus principais “competidores”, de forma a
garantir a defesa dos seus valores comuns à
escala global.
António Costa não mencionou a China ou
a Rússia, mas também não invocou o novo
chavão europeu da “autonomia estratégica”.
Pelo contrário, Angela Merkel elaborou
longamente sobre o tema, na conferência de
imprensa Ænal, insistindo que a Europa não
precisa da caução dos EUA para tomar as
suas decisões. No seu espírito estava
certamente o Acordo de Investimento com a
China e o Nord Stream 2 — duas
manifestações do que Berlim entende ser
essa “autonomia”. A Europa está longe de
um consenso sobre as suas relações com os
Estados Unidos e com as potências
autoritárias a que Biden se referiu. Seria
uma pena se viesse a desperdiçar a
oportunidade que Biden lhe oferece e que
não durará para sempre. Como disse
também António Costa, a sua eleição “foi
uma vitória da esperança” e “as decisões
que já tomou, bem como a determinação de
que a sua Administração dá mostras, são
impressionantes”.
Jornalista. Escreve ao domingo
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
10 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021
Política Líder da Iniciativa Liberal justiƊca candidatura em Lisboa
Candidatura
Sofia Rodrigues
Nas primeiras eleições locais a que
concorre desde a sua fundação, a
de Moedas “não Iniciativa Liberal (IL) vai avançar
com 50 candidaturas autárquicas, a
esmagadora maioria em listas pró-
prias. Em declarações ao PÚBLICO,
vai ter força” o líder do partido, João Cotrim de
Figueiredo, assume que o objectivo
dos liberais em Lisboa não é só “tirar
para mudar
Fernando Medina” — isso “pode ser
uma coisa boa” — mas também alte-
rar a forma de fazer política. E, para
“mudar o sistema por dentro”, o
a câmara
deputado acredita que a candidatu-
ra do PSD-CDS liderada por Moedas
“não vai ter força”.
Na estratégia eleitoral autárquica
da IL, João Cotrim de Figueiredo não
coloca apenas em cima da mesa a
alteração de políticas como um único
ponto que justiÆca a apresentação de
candidatos próprios. “Não tenho
motivos para acreditar que não fosse
Partido liderado por João Cotrim de possível obter um programa bastante
mais liberal para Lisboa do que com
Figueiredo avança com 50 candidaturas Fernando Medina — mesmo integran-
do uma outra frente eleitoral —, mas
autárquicas, a maioria em listas próprias. a forma de o fazer, ligado aos apare-
lhos dos partidos, dos interesses dos
É o primeiro teste da IL no poder local partidos, a forma como as pessoas
NUNO FERREIRA SANTOS
são nomeadas para determinados João Cotrim de Figueiredo
cargos, isso percebi que esta candida- defende que é preciso “alterar
tura não vai ter força para alterar, a a forma como funciona
forma como funciona a Câmara de a Câmara de Lisboa”
Lisboa”, aÆrma.
“Melhorar a câmara, tirando de lá
Fernando Medina, pode ser uma coi-
sa boa, conseguir que algumas das
políticas sejam diferentes pode ser
uma coisa boa, mas não chega se o
sistema continuar a funcionar da
mesma maneira”, reforça. E se a IL
se juntasse à candidatura de Moedas,
não poderia ser uma forma de tentar
mudar as regras por dentro? “Não
temos massa crítica para mudar a
Câmara de Lisboa”, responde o
deputado. Melhorar a
Com um “óbvio risco eleitoral” de câmara, tirando
concorrer com Bruno Horta Soares,
fundador da IL, desconhecido do de lá Fernando
eleitorado, o líder da IL acredita, no Medina, pode ser
entanto, que o partido consegue
“roubar mais votos a Fernando Medi- uma coisa boa (...),
na” com uma candidatura própria mas não chega se o
do que integrada numa “frente”. Só
no pós-eleições a IL está disponível sistema continuar
para falar sobre convergências. a funcionar da
A estratégia em Lisboa — e que tem
reÇexo a nível nacional — reÇecte a mesma maneira
atitude de um partido que prefere João Cotrim de Figueiredo
correr uma maratona e que se coloca Líder da IL
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
como anti-sistema no sentido em que
quer combater os vícios do centrão. É
“sim” anti-sistema se for para lutar
contra alterações à lei como as que
PSD e PS aprovaram sobre as eleições
nas Comissões de Coordenação de
Desenvolvimento Regional. “Não que-
remos a quarta República, não nos
confundimos com outros anti-siste-
mas. Somos muito ‘anti’ a forma como
isto funciona, isso somos. Temos a
noção perfeita de que 20 ou 30 anos
depois de ter começado a funcionar
assim, com partilhas de poderes, com
um bloco central no pior sentido,
temos a noção de não podemos ter
demasiada pressa em querer mudar
essas coisas”, defende o líder da IL,
numa alusão ao Chega, mas que nun-
ca é referido directamente.
Aliás, da mesma forma indirecta,
João Cotrim Figueiredo reclama para
a IL o assombro que é , por vezes,
atribuído ao partido de André Ventu-
ra quando se compara a exposição
mediática e os números nas sonda-
gens: “Somos o verdadeiro fenómeno
político. Porquê? Porque estamos a
crescer da maneira mais difícil, não
vamos buscar pessoas às capas das
revistas, nem à vida pública mais
notória, com ideias ainda muito mal
percebidas por muita gente.”
Ainda sem objectivos quantitativos,
a IL tem como metas eleitorais a
“oportunidade de falar nas ideias libe-
rais” e a de “lançar pessoas novas”.
Envolvendo três mil pessoas nas lis-
tas, as candidaturas nascem nos
núcleos já implantados no território
e que se situam, sobretudo, nos gran-
des centros urbanos e no litoral do
país, mas que “cobrem 62% da popu-
lação”. A situação no Porto — em que
a IL admite apoiar Rui Moreira —, e
em “meia dúzia” de municípios em
que haverá coligação com o PSD ou o
CDS, será a excepção nesta estratégia
eleitoral.
A tradução da mensagem liberal
para a dimensão local é simples: “É
declinar a nível autárquico o que
temos tido no país. Os portugueses
são capazes de fazer bastante mais
por si e pelas suas comunidades do
que aquilo que lhes é permitido fazer.
Em muitos casos, a autarquia é omni-
presente, é o maior empregador, é o
maior organizador das actividades
económicas, actividades culturais.
Não tem de ser assim para sempre.”
Depois do apoio parlamentar ao
Governo Regional dos Açores PSD-
CDS, e de uma estratégia autárquica
marcada pela autonomia de candida-
turas, resta saber se a IL se coloca, já,
de fora de uma eventual coligação
pré-eleitoral PSD-CDS para as legisla-
tivas: “Apetece-me pôr de lado deÆ#
nitivamente, mas acho que não o
devo fazer a esta distância. Não é o
mais natural que venha a acontecer.”
Até lá, João Cotrim de Figueiredo ain-
da terá pela frente uma convenção do
partido, já que o mandato como líder
termina em Dezembro deste ano. As
autárquicas são, por isso, um teste à
sua estratégia eleitoral.
Costa diz que pedido de capital do
Novo Banco “ultrapassa” o devido
Luciano Alvarez
Primeiro-ministro
questiona anúncio de novo
pedido de cerca de 600
milhões de euros feito pelo
banco. PCP também
António Costa aÆrmou, ontem, que
o pedido de capital do Novo Banco
ao Fundo de Resolução “será apre-
ciado”, mas considerou que “mani-
festamente ultrapassa” aquilo que se
avalia ser devido, ao ser questionado
pelos jornalistas sobre o anúncio do
Novo Banco, feito na sexta-feira, de
que vai pedir mais 598,3 milhões de
euros ao Fundo de Resolução ao
abrigo do Mecanismo de Capital Con-
tingente, para fazer face aos prejuí-
zos de 1329,3 milhões de euros repor-
tados, relativos a 2020.
“É um pedido, será devidamente
apreciado, como o Ministério das
Finanças ontem [sexta-feira] já disse,
manifestamente ultrapassa aquilo
que é a avaliação que se faz sobre o
que são as necessidades e aquilo que
é devido, mas isso é outro Ælme”,
disse o primeiro-ministro, não se
alongando mais sobre o assunto. Na
sexta-feira, em comunicado do Minis-
tério das Finanças, o Governo disse
estar “plenamente convicto” de que
o valor Ænal do Fundo Resolução a
transferir para o Novo Banco, “após
a veriÆcação das entidades compe-
Presidente decide até amanhã se veta reforço
de apoios sociais aprovados na AR
O Presidente da República, Marcelo
Rebelo de Sousa, aÆrmou, ontem,
que ainda não se debruçou sobre os
diplomas aprovados pelo Parlamento
de reforço dos apoios sociais, mas
assegurou que tomará uma decisão
até amanhã.
No Ænal da celebração do Dia Mun-
dial do Teatro, no Palácio de Belém,
o Presidente foi questionado pelos
jornalistas sobre o destino de três
diplomas que reforçam apoios sociais
devido à pandemia e que o Governo
considera violarem a norma-travão,
razão pela qual o primeiro-ministro,
António Costa, recorrerá para Æscali-
zação sucessiva do Tribunal Consti-
tucional, como o PÚBLICO noticiou.
“Entre amanhã e depois de ama-
nhã eu tomarei uma decisão”, aÆr-
mou, fazendo questão de distinguir
tentes, Æcará abaixo do previsto na
proposta de Orçamento do Estado
de 2021 [476 milhões de euros]”.
Também na sexta-feira, o ex-ministro
das Finanças e actual governador do
Banco de Portugal, Mário Centeno,
disse esperar que os acordos sobre a
capitalização do Novo Banco previs-
tos no mecanismo de capital contin-
gente sejam cumpridos, ou seja, que
o Estado cumpra as injecções de
capital quando chamado, depois de
avaliado o pedido.
O PCP considerou o pedido do
Novo Banco uma “afronta aos milha-
res” de portugueses em diÆculdades
económicas, por causa da covid-19,
e defende que deve ser “liminarmen-
Primeiro-ministro tem dúvidas sobre verbas para o Novo Banco
entre os diplomas. “São diplomas
diferentes entre si, há um diploma
que não teve nenhum voto contra, só
houve votos a favor ou abstenções,
sobre matéria escolar de apoio ao
teletrabalho dos pais. E outros dois
que respeitam a medidas sociais
várias e em que o partido do Governo
votou contra e todos [os outros] a
favor”, acrescentou.
Marcelo Rebelo de Sousa não quis
adiantar se concorda com o argumen-
to do executivo de que os diplomas
violam a norma-travão consagrada na
Constituição, que proíbe o aumento
da despesa ou diminuição da receita
pelo Parlamento durante o ano de
execução de um Orçamento. “O que
posso dizer neste momento é: eu não
me debrucei sobre esses diplomas até
agora, porque tinha outros que eram
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 11
Política
te rejeitado”. O deputado Duarte
Alves aÆrmou mesmo: “Não pode-
mos aceitar uma situação em que o
Estado paga mas quem gere e Æca
com os lucros é o privado. Provavel-
mente, com uma venda que se reali-
Não podemos zará a um qualquer grupo bancário
aceitar uma internacional.” O deputado acres-
centou que o PCP “não aceita” que
situação em que o seja entregue “nenhuma verba” ao
Estado paga mas Novo Banco, ainda mais violando o
que está na versão Ænal do Orçamen-
quem gere e Äca to do Estado, e defendeu a necessi-
com os lucros dade de recuperar um controlo
público do banco “para ir atrás do
é o privado dinheiro que já lá foi entregue, aca-
Duarte Alves bar com os desmandos da actual
Deputado do PCP administração e também colocar o
NUNO FERREIRA SANTOS
banco ao serviço do país”.
Já a líder do BE, Catarina Martins,
considerou que o pedido de uma
nova injecção no Novo Banco “é ina-
ceitável” e uma “absoluta violência”
face à crise que o país atravessa,
acrescentando: “São quase 600
milhões de euros que ninguém sabe
de onde vêm. O primeiro-ministro
diz que quer analisar as contas. Pare-
ce que agora já não considera, como
disse ao Bloco no debate do Orça-
mento do Estado, que não se podiam
analisar as contas, porque isso pro-
vocaria uma crise Ænanceira terrível
no país. Parece que agora já estamos
todos de acordo que o Bloco tinha
razão, é mesmo preciso analisar as
contas antes de pôr sequer um tostão
mais no Novo Banco.”
prioritários, agora vou debruçar-me
e decidir entre amanhã e depois. O
Presidente da República faz isso todos
os dias, perante leis da Assembleia ou
decretos do Governo (…) não é um
drama, é tão natural como respirar”,
aÆrmou.
O Presidente disse ainda que, no
momento em que comunicar a sua
decisão, explicará “de forma porme-
norizada” o que entende sobre os
diplomas, voltando a repetir que “são
diferentes entre si”. Em causa estão
diplomas que alargam os apoios
sociais a sócios-gerentes e trabalha-
dores independentes, aos proÆssio-
nais de saúde e ainda de apoios a
100% aos pais em teletrabalho com
Ælhos em casa, e que foram aprova-
O Presidente não adiantou que dos, no Parlamento, pela oposição.
posição tomará sobre os apoios Público/Lusa
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
12 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021
Mundo Ataques dos jihadistas visaram os projectos de gás natural
Vários mortos e um português ferido
nas operações de resgate em Palma
Centenas de pessoas esperam ajuda para deixar vila do Norte de Cabo Delgado, com os jihadistas a atirar
contra civis que estavam a ser resgatados. Human Rights Watch conÄrma relatos de corpos nas ruas
Sofia Lorena
Várias pessoas foram mortas e um
português Æcou ferido numa opera-
ção de resgate na vila de Palma, perto
dos projectos de gás natural de Cabo
Delgado, que está desde quarta-feira
sob ataque dos jihadistas. Três dias
depois dos primeiros ataques contra
vários alvos na vila e no distrito de
Palma, no Norte desta província
moçambicana, há corpos de adultos
e crianças visíveis nas ruas e centenas
de funcionários, incluindo muitos
estrangeiros, à espera de resgate.
De acordo com informações dos
media locais conÆrmadas pela RTP,
pelo menos sete civis foram mortos à
entrada de um hotel que abriga pes-
soas em fuga dos jihadistas — é nesta
zona que se situam as instalações das
empresas que exploram o gás natural
na bacia de Rovuma incluindo a
gigante petrolífera Total.
Um português Æcou feridos nas
operações de resgate e foi levado de
helicóptero para Pemba, a capital da
província de Cabo Delgado, 250km a
sul, a partir do aeródromo que serve
os projectos de gás natural, em Afun-
gi, para onde foi inicialmente resga-
tado. “Em relação a um compatriota,
apurou-se que o ferimento pode ser
menos grave do que se temia e o res-
gate ocorreu em termos que, a certa
altura, se temia que não fosse possí-
vel”, conÆrmou o Presidente, Marce-
lo Rebelo de Sousa.
Já se sabia que os combatentes que
se julga terem ligações ao Daesh obri-
garam os residentes a fugir para a
Çoresta. Ao mesmo tempo, umas 200
pessoas, quase todos trabalhadores
das instalações para a exploração de
gás natural liquefeito (GNL), refugia-
ram-se no hotel Amarula Palma. Na
sexta-feira, pelo menos sete foram
abatidos quando estavam a ser retira-
dos do hotel numa coluna militar.
Segundo a Lusa, o número de vítimas
é incerto e pode ser maior.
A imprensa sul-africana escreve
que entre os mortos do ataque ao gru-
po que tentava abandonar a zona há
pelo menos um sul-africano. De acor-
do com o jornal The Citizen, a empre-
sa militar Dyck Advisory Group, ripos-
tou ao ataque permitindo que alguns
dos estrangeiros no Amarula fossem
retirados, assim como funcionários
bancários que foram levados de heli-
cóptero para as instalações da Total.
A situação no terreno é descrita como
“totalmente fora do controlo”, sem
Palma tinha sido até agora uma
das zonas mais poupadas aos
ataques que já levaram quase
700 mil pessoas a abandonar as
suas casas em fuga da violência
“Quase toda a vila
está destruída.
Muitas pessoas
mortas”, diz um
trabalhador dos
projectos de gás
REUTERS
que as Forças de Defesa moçambica-
nas e os guardas privados consigam
conter a violência.
“Uma coluna de 17 carros com res-
gatados do Amarula foi atacada pou-
co depois de saírem. Alguns foram
mortos, muitos conseguiram fugir.
Inicialmente, pensou-se que tinham
sido mortos. Eram umas cem pes-
soas”, disse à AFP o responsável de
uma empresa privada de segurança.
Um residente que fugiu com outras
pessoas para Quitunda, 4km a sudes-
te da vila, perto dos projectos de gás,
disse à Lusa que corpos de adultos e
crianças estão à vista nas ruas de
RICARDO FRANCO/EPA
Palma. A fuga, contou, foi feita aos
poucos, desde o início dos ataques
dos insurrectos que invadiram Palma
na quarta-feira. O grupo em que se
encontrava foi avançando, de rua em
rua, evitando a direcção dos dispa-
ros, chegando a Quitunda na quinta-
feira à tarde.
Disparos indiscriminados
“Várias testemunhas disseram à
Human Rights Watch que viram cor-
pos nas ruas e que os residentes fugi-
ram depois de os combatentes Al-
Shabab [como os habitantes de Cabo
Delgado chamam aos jihadistas]
terem disparado indiscriminada-
mente contra pessoas e edifícios”,
denuncia a organização não gover-
namental num comunicado.
“Quase toda a vila está destruída.
Muitas pessoas estão mortas”, aÆr-
mou um trabalhador dos projectos
de GNL ouvido pela AFP, depois de
ter sido levado para Afungi.
“Enquanto os locais fugiam para a
mata, os funcionários das empresas
de GNL, incluindo estrangeiros,
refugiaram-se no hotel Amarula à
espera de resgate.”
Outro trabalhador de uma empre-
sa subcontratada pela Total diz que
“ao cair da noite [de sexta-feira] mui-
tas pessoas permaneciam no interior
do hotel enquanto os militantes ten-
tavam avançar nessa direcção”.
Depois de ter conÆrmado os pri-
meiros ataques, na quinta-feira, o
Governo de Moçambique não fez
mais comentários, enquanto a polícia
nacional diz apenas estar a avaliar a
situação.
Para além da população que fugiu
por sua conta e dos trabalhadores
moçambicanos e estrangeiros refu-
giados no hotel, a Comissão Nacional
dos Direitos Humanos diz estar a
tentar coordenar esforços para aju-
dar 600 funcionários do Estado que
fugiram e estão actualmente “numa
zona intermédia à espera de qual-
quer socorro”.
“Estamos a tentar, com base nas
nossas possibilidades, ver se pode-
mos encontrar uma solução rápida
para socorrer aqueles cidadãos”, aÆr-
mou Luis Bitone, presidente desta
organização, citado pela televisão
privada moçambicana STV.
Em Palma vivem mais de 50 mil
pessoas, a maioria concentrada na
vila, onde também estão sediadas
várias empresas e muitos trabalhado-
res estrangeiros.
Não parecem restar dúvidas de que
o alvo dos ataques de quarta-feira foi
mesmo o megaprojecto de gás natu-
ral. Um dos vários grupos envolvido
no ataque coordenado visou o aeró-
dromo, situado a 6km da vila, que
funciona como principal porta de
entrada para Afungi, onde estão as
instalações das empresas que explo-
ram o gás natural.
A Total, principal investidora do
projecto local que representa o maior
investimento privado do continente
africano, estimado em 20 mil milhões
de euros, tinha acabado de anunciar
um “regresso gradual” aos trabalhos
de construção da fábrica de GNL,
interrompidos depois do ataque de
Dezembro nas redondezas. A empre-
sa conÆrmou entretanto que vai man-
ter em Pemba os funcionários que se
preparavam para voltar à zona.
A maioria dos residentes em fuga
da vila costeira dirigiu-se para a pro-
víncia de Afungi, em busca de segu-
rança. Os ataques de grupos ligados
ao Daesh a cidades e vilas de toda a
província de Cabo Delgado já levaram
quase 700 mil pessoas a fugir das suas
casas desde 2017. Segundo a Armed
ConÇict Location & Event Data, agên-
cia com sede nos Estados Unidos que
reúne dados, pelo menos 2600 pes-
soas já foram mortas, metade das
quais civis.
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
“Dia da vergonha” para as forças
armadas birmanesas com 114 mortos
Sofia Lorena
Entre os mortos há várias
crianças. UE diz que o dia
de ontem “ficará para
sempre gravado como um
dia de terror e desonra”
Era Dia das Força Armadas na Birmâ-
nia e foi o dia mais sangrento desde o
golpe militar do início de Fevereiro
no país. Durante uma parada militar
na capital, Naypyitaw, o líder da junta
militar, Min Aung Hlaing, reaÆrmou
que os soldados “procuram unir-se a
toda a nação para salvaguardar a
democracia”. Na véspera, a televisão
estatal dissera que os manifestantes
se arriscam a ser alvejados “na cabeça
e pelas costas”
Segundo várias testemunhas e rela-
tos em notícias locais, incluindo do
portal de notícias Myanmar Now, pelo
menos 114 pessoas perderam a vida
às mãos das forças de segurança.
“Hoje é o dia da vergonha para as
forças armadas”, aÆrmou um porta-
voz do CRPH (Committee Represen-
ting Pyidaungsu Hlutta), um grupo
antigolpe criado pelos deputados
depostos, num fórum online. “Os
generais estão a celebrar o Dia das
Forças Armadas quando acabam de
matar mais de 300 civis inocentes”,
diz este porta-voz, identiÆcado como
Dr. Sasa, dando uma estimativa já
ultrapassada dos mortos desde o
Taiwan denuncia maior incursão
de sempre da aviação chinesa
Taipé diz que 20 aeronaves
entraram no seu espaço
aéreo. EUA temem que
a China pondere assumir
o controlo do Estado
Vinte aviões militares chineses entra-
ram na zona de defesa aérea de
Taiwan, na maior incursão registada
desde que o Ministério da Defesa de
Taipé começou a divulgar os voos de
Pequim sobre as águas entre o Sul de
Taiwan e as ilhas Pratas, controladas
por Taipé, no mar da China, no ano
passado. “A China parece estar a pas-
sar de um período de contenção face
ao statu quo para um período em que
estão mais impacientes e preparados
para testar os limites e arriscar até
início dos protestos contra o golpe
que depôs o Governo civil de Aung
San Suu Kyi.
Entre as pelo menos 40 pessoas
mortas em Mandalay está uma rapa-
riga de 13 anos, a mesma idade de um
rapaz morto em Shwebo, Sagaing,
atingido por um atirador furtivo
quando estava à janela de casa.
Foi em Mandalay, a segunda maior
cidade do país, que na terça-feira uma
menina de sete anos foi morta a tiro,
atingida quando corria para o colo do
pai, durante um raide à casa da famí-
lia. A organização não governamental
Save the Childen dava então conta de
mais de 20 crianças entre os mortos
da repressão.
Apesar dos avisos e da repressão brutal, os protestos continuam
colocar a ideia da uniÆcação”, diz um
alto responsável dos Estados Unidos,
citado pelo Financial Times.
Após a entrada de tantos aviões
militares, no que é visto como uma
escalada dramática das tensões no
estreito de Taiwan, as forças aéreas
taiwanesas mobilizaram mísseis para
“monitorizar” a incursão.
A China tem aumentado as activi-
dades militares perto da ilha que con-
sidera parte do seu território nos
últimos meses, com Taipé a conside-
rar que isso põe em risco a estabilida-
de regional, mas a presença de tantos
aviões é rara: Taiwan diz que partici-
pam na missão quatro bombardeiros
H-6K com capacidade nuclear e dez
caças J-16, entre outros.
Estas operações acontecem depois
de a força aérea da ilha ter suspendi-
Para além de Mandalay e da região
central de Sagaing, há notícias de
mortes em Rangum, na região de
Bago (um manifestante e vários feri-
dos graves, escreve o jornal The Irra-
waddy) e em Lashio (leste do país).
Bebé atingido no olho
Um bebé de um ano foi atingido no
olho com uma bala de borracha, diz
o diário britânico The Guardian. O
Movimento Civil de Desobediência
identiÆca um dos mortos como o
médico Phyo Thant Wai, da Universi-
dade de Medicina de Mandalay.
Para além dos mortos que se
podiam ir somando através das con-
tas de media e de activistas pró-demo-
EPA
do as suas missões de treino, após a
queda de dois caças, esta semana, e
um dia depois de os EUA e Taiwan
terem chegado a acordo para aumen-
tar a cooperação entre as respectivas
guardas costeiras.
Segundo o responsável ouvido pelo
Financial Times, a Administração de
Joe Biden prepara-se para “uma fase
em que Xi Jinping, que vai entrar no
seu terceiro mandato, poderá consi-
derar que obter progressos signiÆca-
tivos em Taiwan será importante para
Os EUA temem
que Xi Jinping
considere que
obter progressos
em Taiwan seja
fundamental para
a sua legitimidade
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 13
cracia nas redes sociais, também há
vídeos de manifestantes a serem
espancados — há um em que se vê
forças de segurança a atirarem pedras
enormes à cabeça de uma jovem.
“Este derramamento de sangue é
horrível”, disse o embaixador do EUA
Thomas Vajda. “O povo da Birmânia
já falou claramente: não querem viver
sob governação militar.” A delegação
da União Europeia no país aÆrmou
que o dia de ontem “Æcará para sem-
pre gravado como um dia de terror e
desonra”.
“Deviam aprender com a tragédia
das mortes anteriores que correm o
risco de serem atingidos na cabeça e
pelas costas”, aÆrmara na sexta-feira
a televisão estatal, num aviso onde
não se especiÆcou se essas eram as
ordens dadas pela junta.
As facções armadas de diferentes
etnias não vão continuar quietas face
às mortes de manifestantes às mãos
dos militares, disse entretanto o líder
de um dos principais grupos. “Os gru-
pos armados étnicos agora têm um
inimigo comum e temos de nos juntar
para provocar dano a quem está a
fazer mal ao povo”, disse à Reuters o
general Yawd Serk, do Conselho de
Restauração do Estado de Shan/ Exér-
cito do Estado de Shan.
Foi a 1 de Fevereiro que o Exército
afastou do poder o Governo de Suu
Kyi, a pretexto de uma alegada fraude
nas eleições de Novembro, que ven-
ceu com maioria absoluta.
a sua legitimidade e legado”.
O alarme crescente na Administra-
ção Biden coincide com um aviso do
almirante Philip Davidson, chefe do
Comando Indo-PacíÆco dos EUA,
segundo o qual a China pode avançar
para uma acção militar “nos próxi-
mos seis anos”. O seu previsível suces-
sor, John Aquilino, disse esta semana
ao Congresso que “este é um proble-
ma que está muito mais próximo de
nós do que muitos pensam”, notando
as várias “acções agressivas” realiza-
das pela China, incluindo confrontos
com a Índia na fronteira.
“Temos visto coisas que não penso
que esperávamos”, disse Aquino no
comité das Forças Armadas no Sena-
do. “É por isso que continuo a falar
em urgência. Devíamos estar prepa-
rados hoje.”
Mundo
Três editores da oposição foram
detidos nos novos protestos
Dezenas
de detidos
em protesto
na Bielorrússia
Três editores de grandes plataformas
de media independentes da Bielorrús-
sia foram detidos em Minsk, a par de
dezenas de outras pessoas que parti-
cipavam em novos protestos contra
Aleksander Lukashenko, no poder há
27 anos, acusado de ter manipulado
o resultado das presidenciais de Agos-
to, que lhe deram 80% dos votos.
A praça da capital para onde foi
marcada a manifestação estava cer-
cada de viaturas da polícia e as estra-
das que lhe dão acesso foram fecha-
das, enquanto vários pequenos gru-
pos de manifestantes se juntavam nas
proximidades.
Entre os detidos estão Galina Ulasik
e Anna Kaltygina, editoras da plata-
forma TUT.by, cujo canal na aplicação
de mensagens Telegram é seguido
por 400 mil pessoas. Outra platafor-
ma, a Nasha Niva, com 90 mil leitores
no Telegram, diz que o seu chefe de
redacção, Yahor Martsinovich, tam-
bém foi detido na praça, tal como um
dos seus fotógrafos. Esta plataforma
(com o nome de um dos mais antigos
semanários da Bielorrússia), que par-
tilha regularmente vídeos de deten-
ções e da brutalidade policial grava-
dos pelos seus seguidores, é uma
importante fonte de informação
sobre os protestos antigoverno.
Na sequência das eleições que a
oposição disse terem sido fraudulen-
tas e cujos resultados nem a União
Europeia nem os Estados Unidos
reconheceram, as manifestações pas-
saram a ser semanais, apesar da
repressão e das detenções em massa.
Agora, depois de dois meses de algu-
ma acalmia, os líderes da oposição
voltaram a pedir aos bielorrussos
para intensiÆcarem os protestos.
As autoridades avisaram ao início
do dia que todos os que participassem
em manifestações se arriscam a ser
acusados criminalmente.
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
14 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021
Mundo
Tudo parece possível
para os Verdes
na Alemanha
O partido ecologista tem todas as probabilidades de integrar
o próximo Governo alemão. E poderá mesmo aproveitar o
descontentamento com a CDU-CSU para chegar à chancelaria
Maria João Guimarães
O antigo “partido antipartido” é hoje
“a âncora da estabilidade política
alemã”. Num ano de mudanças, no
meio de uma pandemia, o que virá
após o Ænal da era Merkel poderá ser
marcado pela ascensão dos Verdes.
Um partido que nasceu como um
movimento de protesto contra as
armas nucleares, juntando ambien-
talistas, feministas e activistas no
mínimo provocadores, é hoje um
partido do centro, pragmático, res-
ponsável e estável: a âncora, como
disse ao PÚBLICO, numa troca de
emails, Michael Lühmann, do Insti-
tuto para a Investigação de Demo-
cracia da Universidade de Göttin-
gen. Neste momento, “tudo parece
possível para os Verdes em Setem-
bro, incluindo a chancelaria”, diz.
Não é o único a ter esta opinião.
Richard Hilmer, do instituto Policy
Matters (e antigo director do institu-
to de sondagens Infratest Dimap),
também considerou, numa conver-
sa telefónica, que “os Verdes podem,
de facto, ter esperança de vir a ter o
próximo ou a próxima chanceler”.
As hipóteses são boas, apontou
Hilmer, “porque está a aumentar o
descontentamento com o Governo,
em especial com a União [CDU, de
Angela Merkel, e a bávara CSU, cen-
tro-direita, que governam em coli-
gação com os sociais-democratas],
por causa da gestão da pandemia e
do ‘caso das máscaras’, que tem,
ainda por cima, uma componente
moral”. Hilmer refere-se a negócios
duvidosos de deputados conserva-
dores: já se demitiram seis, a maio-
ria por ter lucrado com contratos de
compras de máscaras na primeira.
As sondagens vêm conÆrmando
esta linha de pensamento. O baró-
metro político da televisão pública
ZDF mostrou na sexta-feira uma
queda da CDU-CSU para 28% das
intenções de voto, e os Verdes subi-
ram para 23%. O SPD mantém-se
com 15%, a AfD (nacionalista) tem
12%, os liberais 9% e Die Linke
(esquerda radical) 7%. Mais: os
dados em bruto (sem correcções na
amostra) davam mesmo, pela pri-
meira vez, os Verdes um ponto per-
centu al ac ima da CDU- C SU
(28%-27%).
Nas últimas legislativas, em 2017,
os Verdes tiveram uma noite eleito-
ral decepcionante. Depois de boas
perspectivas apontadas pelas son-
dagens, foram o menos votado dos
partidos que entraram no Parlamen-
to, com apenas 8,9%.
Hoje, a situação é muito diferente,
diz Michael Lühmann. “Esta é a pri-
meira vez em que os Verdes estão
numa posição em que os valores
altos nas sondagens também podem
durar até à eleição. O resultado das
eleições em Baden-Württemberg [os
Verdes foram, de novo, os mais vota-
dos] irá dar um bom embalo ao par-
tido, e a enorme crise na União aju-
dará sobretudo os Verdes.”
Richard Hilmer nota, no entanto,
que pode haver novas mudanças na
aprovação da CDU, que pode ter
reÇexo nos Verdes. “A questão é que
estamos no meio de uma crise, com
um notório descontentamento e
frustração crescente das pessoas”,
diz. A Alemanha enfrenta uma ter-
ceira vaga da pandemia que se prevê
poder ser mais grave do que as ante-
riores, com diÆculdades nas decisões
de medidas, desentendimentos entre
a chanceler e os ministros-presiden-
Esta é a primeira
vez em que os
Verdes estão numa
posição em que os
valores altos nas
sondagens
também podem
durar até à eleição
Michael Lühmann
Instituto para a Investigação de
Democracia da Universidade de
Göttingen
tes dos estados federados, além de
uma campanha de vacinação mais
lenta do que antecipado, e ainda pro-
blemas na distribuição de testes rápi-
dos prometidos pelo executivo.
“Se em Setembro a vacinação esti-
ver avançada e a pandemia contro-
lada, há espaço para outros temas
serem mais importantes, como a
ecologia, o que beneÆciaria os Ver-
des”, diz Hilmer. “Mas também
ganhará peso a economia, e a com-
petência em termos de economia é
em geral dada aos partidos da União
— a questão é se conseguem recupe-
rar em meio ano.”
Lugar próprio
Já Lühmann realça que os Verdes
conseguiram, entretanto, “o seu pró-
prio lugar no sistema de partidos”,
o centro, e destacando como temas
fortes não só a ecologia mas também
“a posição na luta contra a AfD”,
com muito apoio “nas cidades, entre
as mulheres, e os jovens”. Hoje, os
Verdes “são liderados de modo pro-
Æssional, a luta entre as alas do par-
tido está ultrapassada, a crise climá-
tica ajuda-os, assim como o caos da
União pós-Merkel”, enumera.
Também Hilmer fala dos Verdes
Cronologia
além da ecologia, já que o partido
“abriu o leque de temas, também no 1979 governo de um estado federado,
campo social”, aponta. Lista Verde de Bremen entra no no Hesse. Joschka Fischer foi o
O pragmatismo é notado ainda parlamento do estado federado. primeiro ministro (estadual) do
nas coligações nos estados federa- Ambiente e Energia dos Verdes.
dos, onde fazem parte de 11 coliga- 1980
ções com várias combinações com
todos os partidos (excepto os nacio- Fundação do partido Os Verdes,
1993
nalistas da AfD): CDU, SPD, Liberais que não conseguem, nas Fusão com o movimento da
e Die Linke. A última — e única — vez legislativas desse ano, eleger Alemanha de Leste Aliança 90,
deputados. que juntava grupos de oposição
que os Verdes participaram num
Governo nacional foi com o SPD da ex-RDA.
(1998- 2005). 1983
Esta mudança parece cristalizada
no seu programa de base, aprovado Entrada dos primeiros
1998
no Ænal do ano passado, e no pro- deputados dos Verdes no Os Verdes entram no Governo
Bundestag, onde se nacional em coligação com o
grama eleitoral. “Penso que os Ver-
des acham, honestamente, que a destacaram, levando flores e SPD de Gerhard Schröder. Até
principal mensagem de uma política camisolas de malha coloridas. 2005, quando venceu a CDU de
Angela Merkel.
verde tem de ser cumprir, de modo
simultaneamente radical e realista, 1985
os objectivos do Acordo de Paris e,
com isso, desaÆarem-se a si próprios Primeira participação dos
1999
e à sociedade”, diz Lühmann. Verdes numa coligação de Congresso turbulento em que
A decisão de aceitar os limites do
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
foi derrotada uma moção
exigindo o fim imediato dos
bombardeamentos da NATO na
Sérvia, apoiada pelo Governo.
2011
Winfried Kretschmann é o
primeiro ministro-presidente
dos Verdes, numa coligação
com o SPD, em
Baden-Württemberg. Nas
eleições seguintes, os Verdes
são os mais votados e
coligam-se com a CDU.
2021
Os Verdes estão actualmente
presentes em 11 coligações nos
estados federados, em várias
combinações com a CDU, o
SPD, ou ainda os liberais.
Desde 2018 que na liderança
estão dois pragmáticos: Robert
Habeck e Annalena Baerbock
Acordo de Paris, que prevê medidas
como um máximo da subida da tem-
peratura na Terra de dois graus Cel-
sius, e não insistir na Æxação deste
máximo em 1,5ºC, foi uma mudança
substancial. “Esta honestidade é
arriscada”, comenta Lühmann,
“mas em tempos de crise a serieda-
de que está por trás dela poderá
trazer apoio”.
Os Verdes têm ainda sido o parti-
do solidamente pró-europeu, con-
trastando com uma postura mais
céptica, por exemplo do Partido
Liberal Democrata, com o líder
Christian Lindner, em tempos pré-
covid, a dizer que a proposta de
mutualização da dívida do Presiden-
te francês, Emmanuel Macron, iria
criar um sistema “como na União
Soviética”.
O partido é ainda o que tem mais
candidatos com raízes estrangeiras,
aponta a emissora Deutsche Welle,
HANNIBAL HANSCHKE/REUTERS
notando ainda a suavização das
posições em relação a automóveis e
industrias poluente. Até a agricultu-
ra, com organismos geneticamente
modiÆcados (OGM), deixou de ser
um tabu.
A ideia de que os Verdes possam
ser o principal partido numa coliga-
ção assusta, no entanto, muitos que
os vêem ainda como o “partido da
proibição” — que quer proibir o con-
sumo de carne nas cantinas, ou limi-
tar a velocidade dos automóveis nas
auto-estradas, em nome de menos
emissões de CO2.
Ulrich Schulte, jornalista do diário
TAZ, escreveu um livro chamado O
Poder Verde — como o partido ecolo-
gista quer mudar o país (tradução
livre), e diz que não há razão para
este medo. Mas também não há moti-
vo para a esperança de muitos de que
o partido seja a ponte para um travão
nas alterações climáticas e uma dis-
tribuição mais justa de rendimentos
no estado social. Mais uma vez,
seguindo a actual doutrina do meio,
é lá que os Verdes deverão estar.
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 15
Candidatura a chanceler
A decisão que falta:
será ele ou ela?
Maria João Guimarães
Os Verdes foram pioneiros na ideia
de ter uma liderança dual, com um
homem e uma mulher, uma tradição
com décadas. O partido, que na ori-
gem juntou movimentos feministas
além de paciÆstas e ecologistas, já
teve de escolher quem seria o primei-
ro membro do partido a integrar um
governo de um estado federado (foi
Joschka Fischer), ou quem seria o
ministro dos Negócios Estrangeiros
num governo nacional (foi Joschka
Fischer). Mas esta campanha marca
a primeira vez da sua história em que
vai decidir quem se candidatará a
chanceler: Annalena Baerbock ou
Robert Habeck.
“Ele ou ela?”, perguntava o jornal
Die Zeit. “A questão de quem é a
Ægura principal da campanha e, em
princípio, secundária”, disse
Michael Lühmann, do Instituto para
a Investigação de Democracia da
Universidade de Göttingen. “As suas
diferenças são mais em termos de
estilo, mas não de conteúdo, e
ambos conseguem mobilizar mais
do que os velhos eleitores dos Ver-
des.”
Uwe Jun diz que “há argumentos
contra e a favor de ambos”, mas na
sua opinião, “não fará grande dife-
rença, ambos são pragmáticos,
moderados” — aliás, a escolha dos
dois, em 2018, marcou a quebra de
tradição de ter sempre um dos co-
líderes da ala “pragmática” e outro
da ala “radical”: ambos são da pri-
meira.
Richard Hilmer, do instituto Policy
Matters, sublinha antes as diferenças
notórias entre ambos: Robert Habeck
parece mais aberto a trabalho em
coligação, mas o seu estilo nem sem-
pre cuidadosamente pensado já lhe
trouxe problemas (a dada altura saiu,
Annalena Baerbock
Mundo
por exemplo, das redes sociais).
Annalena Baerbock é mais forte den-
tro do partido, embora nas sonda-
gens a nível nacional seja menos
popular do que Habeck.
A decisão estará, agora, nas mãos
de Baerbock, porque Habeck decla-
rou que lhe daria a hipótese de ser ela
a escolher primeiro se queria o desa-
Æo de ser a candidata, ou não.
A favor de Habeck, 51 anos, de
Lübeck (Norte) é referida, muitas
vezes, a experiência executiva no
governo do estado federado de
Schleswig-Holstein (até 2018). A Baer-
bock, 40 anos, de Hanover (também
no Norte), actualmente deputada, é
apontada a essa inexperiência, já que
nunca participou em executivos.
Mas o seu CV é, apesar disso,
impressionante: estudou ciência
política e direito público em Hambur-
go, direito público na London School
of Economics, trabalhou com a euro-
deputada Elisabeth Schroedter, foi
eleita deputada aos 33 anos, encar-
regada dos temas de política externa
e segurança do seu grupo parlamen-
tar, porta-voz do grupo de trabalho
do partido sobre a Europa, e aos 38
anos foi eleita co-líder dos Verdes,
enumera Stephan-Andreas Casdorè,
director do diário Tagesspiegel.
Cardoè detalha o percurso de
Baerbok e não o de Habeck (estudou
ÆlosoÆa — tem um doutoramento
pela Universidade de Hamburgo —,
escreve e traduz), que também tem
sido quem dá mais entrevistas, por-
que ninguém o questiona se está
pronto para ser chanceler, pergunta
que se tem colocado apenas a Baer-
bock. E o director lembra que muitos
Æzeram a mesma pergunta há mais
de 15 anos em relação a Angela
Merkel, expressando dúvidas sobre
se ela estaria apta a ser chanceler.
“Estava. E como.”
Robert Habeck
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
16 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021
Sociedade Manuel Lemos faz um diagnóstico crítico da situação nos lares
“O Ministério da Saúde
é muito autocrático
na sua relação com
os parceiros sociais”
Manuel Lemos O presidente da União das Misericórdias
Portuguesas avisa que o Estado tem de aumentar as
comparticipações. Caso contrário, as famílias não aguentam
Entrevista
Natália Faria Texto
Nélson Garrido Fotografia
As comparticipações do Estado
para os lares de idosos estão
“francamente longe do custo real”.
E, num país com baixas reformas,
e em que as famílias estão no
limite, a situação não será
sustentável durante muito mais
tempo. Entre críticas ao Ministério
da Saúde, que acusa de ser
“autocrático” na sua relação com
os parceiros sociais, Manuel
Lemos, presidente da União das
Misericórdias Portuguesas, adianta
que terá de haver uma forte aposta
numa rede de apoio domiciliário “a
sério” e sustenta que, ao fim de um
ano de pandemia, a sociedade
portuguesa está em dívida para
com os funcionários dos lares.
Ao fim de um ano, que balanço
faz quanto ao impacto da
pandemia nos lares de idosos?
Dada a vulnerabilidade dos lares,
era natural que houvesse, como
houve, uma enorme preocupação.
Mas em Portugal nunca se
registaram casos como os de
outros países da União Europeia
em que os trabalhadores
desertaram, havia cadáveres nas
camas vários dias e ninguém
tocava neles, pessoas a morrer sem
que ninguém cuidasse delas. A
pouco e pouco, começou-se a
perceber que a perspectiva em
Portugal era diferente, de tal
maneira que Portugal é hoje
provavelmente o país da União
Europeia onde a percentagem de
óbitos nos lares em relação ao total
de mortos é das mais baixas.
A 15 de Março, as mortes nos
lares representavam 27,6% do
total de óbitos.
Os outros países estão todos acima.
Se recuarmos a Outubro, estava
nos 41%.
Nessa proporção estão incluídos
muitos lares ilegais. E não está feita
ainda essa separação entre os lares
da cooperação com o Estado e os
que não têm cooperação. Num
segundo momento, teremos de
separar para perceber isso melhor.
E há aqui uma coisa interessante:
nos lares das Misericórdias,
tínhamos em 31 de Dezembro
qualquer coisa como 480 óbitos. E
depois, em Janeiro e Fevereiro,
morreram cerca de mil pessoas.
Portanto, os meses letais foram
esses. Não foi o ano de 2020.
Porquê?
No princípio, o vírus estava muito
concentrado na zona dos lares. E,
na segunda vaga, depois de
Setembro e Outubro, foi a
comunidade em peso a mais
afectada. Como havia um grande
tráfego dos colaboradores e os
idosos iam — como nunca
deixaram de ir — aos hospitais, o
vírus entrava por aí. A segunda
vaga veio de fora para dentro e foi
muito devastadora. E morreu
muita gente nos nossos lares, mas
morreu muito mais gente na
comunidade.
Já se sabia, quando a pandemia
chegou a Portugal, que os lares
eram uma área particularmente
vulnerável. O que é que falhou
no acautelamento da
mortalidade? Foi a
desarticulação entre o sector
social e o da saúde?
Esse problema da desarticulação
entre a Segurança Social e a saúde
esteve presente sempre. E
continua a não estar resolvido. É
um problema velho,
nomeadamente em relação às
estruturas residenciais. O sector da
saúde tem com o sector social uma
relação muito autocrática. No caso
da Segurança Social, porque não
há lares públicos, há uma relação
diferente com o sector social. Mas
julgo que, no primeiro momento, o
grande problema foi o total
desconhecimento da doença e de
como é que o vírus atacava.
Faria sentido voltarmos a ter a
Segurança Social e a saúde sob o
mesmo chapéu, como no
Ministério dos Assuntos Sociais,
que vigorou entre 1974 e 1983?
Um superministério com isso era
tão pesado que o desgraçado que
fosse para lá tinha de ser um
super-homem, dada a importância
que estes assuntos hoje têm. Não
sou adepto desse modelo e
parece-me que o actual problema
se pode resolver com uma boa
coordenação ao nível do Governo.
O que não podemos é continuar
como se estivéssemos em dois
mundos diferentes. O Serviço
Nacional de Saúde é um mundo
público a 100% e só a contragosto
— e isto não tem a ver com o
ministro, mas com a máquina — vê
a comparticipação do sector social
e do sector privado. O sector social
tem uma lógica completamente ao
contrário, isto é, vive da
cooperação. Acho que é muito
importante que não haja assistência médica aos utentes. tornar obrigatória a assistência
opacidade nas relações no mundo Foi. É preciso ter presente que a médica nos lares?
da cooperação social, sou adepto legislação não obriga a que os lares Impõe-se, mas o Estado nunca foi
dessa transparência total e tenham médicos, que deveriam vir capaz de a executar. Por uma razão
absoluta, mas também acho que o do centro de saúde. Mas os muito simples: é que isso obriga o
Ministério da Saúde não pode ser médicos nunca vieram do centro Estado a comparticipar mais. E o
tão autocrático na relação com os de saúde. E já não vinham antes da Estado diz que não tem dinheiro
parceiros do sector social. Tem de pandemia. para mais. Esta obrigação de tomar
se habituar a ter parceiros e a viver Mas porquê? conta dos idosos não é do sector
com eles de uma maneira É algo que não vai acontecer. social, é uma obrigação
dialogante e transparente. Nunca aconteceu. Está no pacto de constitucional do Estado. O Estado
Voltando aos lares, foi notória a cooperação há muitos anos, mas, é que, por razões óbvias de
dificuldade inicial em garantir não havendo nenhuma lei que diga confiança, mas também porque é
que uma Misericórdia tem de muito mais barato, a delega no
contratar um médico, a verdade é sector social. Há 25 anos, era
que quase todas contrataram. E primeiro-ministro o engenheiro
porquê? Porque o serviço público António Guterres, foi celebrado
não vai lá. E nos lares da CNIS com o sector social um pacto de
[Confederação Nacional das cooperação para a solidariedade,
Instituições de Solidariedade] é o que é, ainda hoje, a nossa trave
Um idoso no mesmo. Talvez seja então melhor mestra da nossa relação com o
Grande Porto encararmos a realidade: o lar Estado. Já na altura, António
contrata um médico e isso vale Guterres disse que o Estado tinha a
custa 1300 euros mais xis por mês na obrigação de pagar pelo menos
por mês. O Estado comparticipação. É uma questão 50% da resposta social,
prática. desejavelmente 60%. Ele tinha
comparticipa Impõe-se ou não uma alteração noção de que o Estava pagava, no
com 400 euros da legislação, no sentido de máximo, 40%. E a verdade é que,
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
em 2018, os estudos da
Universidade Católica mostravam
que o Estado só comparticipava
38%. De 2018 para cá, tem de
somar aos custos o aumento do
salário mínimo em 2019, 2020 e
2021, e, neste último ano, os gastos
loucos que as instituições tiveram
com os equipamentos de
protecção individual (EPI).
Em quanto andará agora a
comparticipação do Estado?
Considerados os aumentos no
salário mínimo e as despesas com
EPI, a comparticipação do Estado
desceu para os 36% ou 35%, apesar
de nestes dois últimos anos até ter
havido um aumento de 9% nas
comparticipações. Portanto, o que
podemos dizer é que está
francamente longe do custo real.
Ninguém está a pedir que deitem
um balde de dinheiro em cima das
respostas, o que queremos é que o
Estado se aproxime mais do custo
real das respostas sociais. E, num
país como o nosso, tem de ser
entre os 50% e os 60%, no mínimo.
Em termos absolutos, quanto
custa em média um idoso num
lar por mês e quanto é que o
Estado comparticipa?
O valor varia consoante seja um
território mais urbano ou menos
urbano. Mas um idoso no Grande
Porto, por exemplo, custa à volta
de 1300 euros por mês. E quanto é
que o Estado comparticipa? São
400 euros.
E o resto vem das famílias?
O resto é a reforma, as famílias e as
Se o Estado
não aumentar as
comparticipações,
as instituições
não aguentam
e fecham
dívidas das instituições, que estão a
crescer de uma maneira
assustadora. O problema é esse!
Considerando que o
envelhecimento é inelutável —
em 2019, havia já 163,2 idosos
por cada cem jovens —, por
onde deve ser o caminho?
O caminho só pode ser um: o
Estado vai ter mesmo de gastar
mais dinheiro com os idosos. Tem
de fazer opções. E lembre-se de
que aquele primeiro trabalho do
professor Costa e Silva sobre a
retoma da economia dedicava três
linhas para todo o sector social e
era para falar sobre a rede de
cuidados continuados. Mas a rede
de cuidados continuados, o sector
social só a aguenta se o Estado
pagar o que custa tê-la. E o Estado
não está a pagar o que custa tê-la.
Portanto, se o Estado não
aumentar as comparticipações, as
instituições não aguentam e
fecham, o que vai custar muito
mais ao Estado e traduzir-se em
mais impostos para os cidadãos.
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 17
Colaboradores “exaustos”
“Há uma dívida global
da sociedade para com os
trabalhadores dos lares”
Manuel Lemos destaca o
“heroísmo” de quem esteve nos
lares a combater os efeitos da
pandemia e lamenta as polémicas
com a vacinação, que reduz a “fait
divers”.
Em relação ao modelo de
acolhimento residencial dos
idosos…
Eu, que tenho 72 anos, preferiria
morrer na minha casa, desde que
me garantam um apoio
domiciliário a sério: sete dias por
semana, num trabalho em rede,
moderno, inteligente. E penso que
vai ser assim com a geração de
idosos que vem aí e que é mais
letrada, mais ligada ao
computador e ao telemóvel. E uma
rede de apoio domiciliário até fica
mais barata, não à cabeça, mas em
média. E, sobretudo, tem menor
risco para o cidadão: se eu
apanhar uma doença na minha
casa, não corro o risco de
contagiar 60 tipos da minha idade
nos 200 metros quadrados em
meu redor.
Há essa revolução para fazer?
Há. Mas quer isto dizer que vão
acabar os lares? Não. O lar tem é
de ser pensado para pessoas muito
mais frágeis ou com demência e
que, quando o estado de
fragilidade aumenta, fazem a
transição para o lar.
Menorizada a questão dos riscos
entre os utentes, os proÆssionais
dos lares estão exaustos e
acusam sintomas de stress
pós-traumático, ao Æm de um
ano a combater a pandemia. O
que é que está a ser feito a este
nível?
Os colaboradores estão hoje
exaustos, é verdade. Infelizmente,
não podemos mandá-los para casa
descansar um bocado, porque a
situação continua a ser muito
complexa. Lidar com a velhice,
lidar com o apagamento de uma
vida é uma coisa em si muito
traumática. Enquanto num
hospital um idoso entra num
momento crítico e é um corpo
humano que está a falhar, e o
profissional usa toda a ciência e
tecnologia para tentar repor aquilo
a funcionar — e sei que muitos
sofrem quando não o conseguem
—, num lar o trabalhador assiste ao
desaparecimento, à falência
sucessiva, durante muito tempo.
Entretanto, criou laços com esses
idosos. O choque pós-traumático é
uma realidade. E é pena que não
consigamos assegurar aos nossos
colaboradores carreiras mais
dignas e em que se sintam também
eles mais consolados por uma
retribuição condigna.
Sente que há aqui uma espécie
de dívida da sociedade para com
os funcionários dos lares?
Tenho a certeza. E não é uma
dívida de agora. É uma dívida que
o vírus pôs a nu. Os nossos
colaboradores, da mesma maneira
que os nossos provedores, foram
verdadeiros heróis neste processo.
Daí que essa polémica toda à volta
da vacinação seja uma triste forma
de não reconhecer o trabalho
heróico de muitos voluntários que
foram para os lares e que
ajudaram à sobrevivência dos
idosos. Admito que nalguns casos
possa ter havido exageros —
embora não conheça directamente
nenhum — que ajudaram a destruir
esta imagem de mérito dos
colaboradores, dos provedores e
dos dirigentes efectivos que
estiveram lá dentro com os idosos.
Portanto, há de facto uma dívida
global da sociedade portuguesa
para com os trabalhadores dos
lares. Porque o fácil, e toda a gente
perceberia, era fugir dali. Os
nossos trabalhadores podiam ter
descido as escadas, tiravam a bata
e iam pela rua fora, como
qualquer outra pessoa. Mas não,
ficaram lá dentro.
Foi vacinado?
Só respondo a essa pergunta daqui
a uns meses, porque dizer agora se
fui ou não significaria tomar
posição por um dos lados e eu não
quero tomar posição sobre essa
matéria. Só quero dizer que os
provedores que o fizeram, fizeram
muito bem, desde que de facto
fossem dirigentes efectivos, que
viviam nos lares e se esforçavam
pelos idosos que lá estavam. É
como uma equipa de comando: eu
sempre achei muito bem que o
Presidente da República fosse até
o primeiro a vacinar-se. O país sem
Presidente da República ou sem
primeiro-ministro como seria?
Neste contexto, essa polémica não
foi mais um fait diver, que não
acrescentou nada aos nossos
idosos nem ao desgraçado do
provedor que estava lá e a quem
perguntaram se queria ser
vacinado porque sobravam doses.
Porque, de facto, sobraram doses.
E depois o país fez-se logo
moralista.
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
18 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021
Sociedade
Novos registos de unidades
de telemedicina crescem 2800%
Ana Maia
Segundo a Entidade
Reguladora da Saúde, o
número de novas unidades
registadas passou de 33 para
971 no espaço de um ano
O número de novas unidades de tele-
medicina registadas na Entidade
Reguladora da Saúde (ERS) disparou
entre 2019 e 2020, passando de 33
para 971, de acordo com dados envia-
dos ao PÚBLICO pela ERS. São núme-
ros que englobam os sectores público,
privado, cooperativo e social e que
representam um crescimento de
2842,4%. Este ano, até 25 de Março, o
regulador contabiliza já 218 novos
estabelecimentos registados nesta
área.
A pandemia trouxe a partir de Mar-
ço do ano passado uma nova realida-
de à prestação de cuidados de saúde.
Com as limitações nos atendimentos
presenciais, e algum receio dos doen-
tes em se deslocarem às unidades de
saúde, cresceu o apoio prestado aos
utentes através da telemedicina. Um
conceito que já existia e que passa,
por exemplo, pela utilização das
novas tecnologias para a realização
de consultas, monitorização de doen-
ças crónicas, análise de exames e
elaboração dos relatórios.
Não é de estranhar que o número
de novos registos na ERS tenha cres-
cido de forma exponencial e, em con-
sequência, a oferta existente nesta
área. “Desde Março de 2020 veriÆca-
se um crescimento muito expressivo
no número global de estabelecimen-
tos registados dos sectores privado,
PCP propõe 10,97 euros/dia para o teletrabalho
Raquel Martins
O PCP quer Æxar na lei a obrigatorie-
dade de os empregadores pagarem
um valor diário aos trabalhadores em
teletrabalho para os compensar pelo
acréscimo de despesas com água,
electricidade, Internet ou telefone.
Na iniciativa legislativa que entrega-
ram no Parlamento na sexta-feira, os
deputados comunistas propõem o
pagamento de 10,97 euros por dia (o
correspondente a 2,5% do valor do
Indexante de Apoios Sociais) e, ao
mesmo tempo, querem garantir que
o horário no regime de teletrabalho
não se inicia antes das 8h da manhã e
não termina depois das 19h.
cooperativo e social”, refere a ERS. A
25 de Março existiam nestes três sec-
tores 1245 unidades de telemedicina
a funcionar, quando a 31 de Março do
ano passado eram 227. Estes dados
não contemplam estabelecimentos
do sector público nem aqueles que
tinham actividade suspensa.
A pandemia introduziu uma nova
realidade, a da realização de testes
para o diagnóstico do SARS-CoV-2.
Questionada pelo PÚBLICO, a ERS
revelou que em 2020 se registaram
“142 novos estabelecimentos da tipo-
logia de posto de colheita de patologia
clínica e análises clínicas, e, em 2021,
já se registaram 66 novos estabeleci-
mentos”. A tipologia em que estas
unidades se enquadram — estabele-
cimentos prestadores de meios com-
plementares de diagnóstico — sofreu
um decréscimo de novos registos
entre 2019 e 2020. Mas este ano são
A pandemia trouxe uma nova realidade à prestação de cuidados
Os comunistas propõem uma nova
redacção do Artigo 168.º do Código
do Trabalho, que prevê que “os ins-
trumentos de trabalho respeitantes a
tecnologias de informação e de comu-
nicação, economato e qualquer ins-
trumento ou mobiliário eventualmen-
te necessário, pertencem ao empre-
gador e são por este cedidos, devendo
ainda assegurar a instalação e manu-
tenção dos mesmos e o pagamento
das inerentes despesas”.
Ainda nesse artigo passa a Æcar cla-
ro que a entidade empregadora asse-
gura o pagamento do acréscimo de
despesas [com o teletrabalho],
nomeadamente com os consumos de
água, electricidade, Internet e telefo-
já 201, o que é mais de metade do
total dos novos registos do ano passa-
do.
O registo na ERS é condição essen-
cial para os estabelecimentos presta-
dores de cuidados de saúde poderem
funcionar. Estão obrigadas a fazê-lo
todas as unidades do sector público,
privado, cooperativo e social, como,
por exemplo, hospitais, laboratórios,
clínicas médicas e dentárias, unida-
des de diálise, centros de enferma-
gem, termas, unidades prestadoras
de meios complementares de dia-
gnóstico, entre outros.
Um ano de pandemia
Numa análise ao primeiro ano de pan-
demia, entre Março de 2020 e Março
deste ano, foram registados na ERS
5556 novos estabelecimentos dos sec-
tores público, privado, cooperativo e
social. Quanto às tipologias, corres-
RUI GAUDÊNCIO
ne cujo valor diário não poderá ser
inferior ao correspondente a 2,5% do
valor do Indexante dos Apoios
Sociais, sem prejuízo da aplicação de
disposições mais favoráveis ao traba-
lhador em instrumento de regula-
mentação colectiva de trabalho”.
Caso a proposta venha a ser apro-
vada, signiÆcaria o pagamento de
10,97 euros por dia ao trabalhador, o
Diana Ferreira,
deputada do PCP,
é uma das
subscritoras do
projecto de lei
para compensar
trabalho em casa
pondem a “clínicas ou consultórios
médicos, centros de enfermagem,
clínicas ou consultórios dentários,
centros de medicina física e reabilita-
ção e postos de colheita de patologia
clínica e análises clínicas”, adianta o
regulador.
No mesmo período, 3244 estabele-
cimentos de saúde cancelaram o
registo. O regulador explica que, nes-
tes casos, “não se pressupõe a indica-
ção do motivo por parte do requeren-
te, o que inviabiliza a identiÆcação de
uma qualquer relação entre a cessa-
ção de actividade e a situação de pan-
demia”. Contas feitas, houve, “em
termos líquidos, um crescimento do
número de estabelecimentos regula-
dos pela ERS” — uma tendência que
se veriÆca desde 2018. Aliás, a 1 de
Março deste ano existiam 32.097 esta-
belecimentos prestadores de saúde
registados, um aumento de 6,9% em
relação a 1 de Março do ano passa-
do.
Os estabelecimentos prestadores
de saúde têm ainda a possibilidade de
suspender o registo, o que os impede
de prestar qualquer tipo de cuidado
de saúde enquanto a suspensão esti-
ver activa, mas permite que o valor a
pagar à ERS seja inferior. “Desde Mar-
ço de 2020 até à presente data, 2508
estabelecimentos prestadores de cui-
dados de saúde suspenderam a sua
actividade por motivo relacionado
com a covid-19”, refere a ERS. Destes,
2445 eram do sector privado, seis do
sector cooperativo, 40 do sector
social (dos quais 35 eram IPSS) e 17 do
sector público. No total, 146 tinham
convenções com o SNS. Actualmente,
94 permanecem em suspensão de
actividade.
que se traduziria em cerca de 220
euros mensais. Na proposta passa a
Æcar expresso que, em teletrabalho,
o horário não se pode iniciar antes
das 8h e terminar depois das 19h e a
realização de trabalho suplementar
tem de ser solicitado por escrito pela
entidade empregadora.
Os deputados do PC querem ainda
que Æque clara a possibilidade de, a
qualquer momento, o trabalhador
poder regressar ao posto na empresa.
O trabalhador pode rejeitar o teletra-
balho “quando considere que não
estão reunidas as condições para que
preste a sua actividade com dignida-
de, privacidade e respeito pelas con-
dições de segurança e saúde”.
Advogados
vão decidir
previdência
em referendo
Referendo aprovado por
71%. Classe vai ser chamada
a votar se opta pelo regime
da Caixa de Previdência
ou pela Segurança Social
A Assembleia Geral da Ordem dos
Advogados aprovou com 71,3% dos
votos um referendo para a classe
poder escolher entre o regime da Cai-
xa de Previdência dos Advogados e
Solicitadores (CPAS) e a Segurança
Social, foi ontem anunciado.
A assembleia geral reuniu-se na
sexta-feira para decidir se seria reali-
zado o referendo e “foi estrondosa a
vitória do sim, com mais de 70% dos
votos num universo de 5465 votan-
tes”, anunciou o grupo de advogados
que tinha avançado com a proposta,
em nota de imprensa enviada à agên-
cia Lusa. “A advocacia manifestou-se
maciçamente, votando favoravelmen-
te pela possibilidade de alteração do
Estatuto da Ordem dos Advogados,
no sentido de ser possível a opção
entre a CPAS e a SS [Segurança Social],
aliás, à semelhança do que já tinha
acontecido na OSAE [Ordem dos Soli-
citadores e dos Agentes de Execu-
ção]”, sublinhou.
Para o grupo de advogados, a vota-
ção é um “sinal inequívoco, para o
poder legislativo, de que os advoga-
dos e advogadas portugueses querem
alterar o paradigma do seu sistema de
previdência”. “Está aberta a porta
para que a advocacia tenha uma pre-
vidência digna desse nome, com
direitos na maternidade/parentalida-
de, na saúde e na quebra de rendi-
mentos”, concluiu.
O Conselho Geral (CG) da Ordem
dos Advogados irá agora “tratar dos
procedimentos necessários para a
concretização do referendo, após o
que anunciará a data da sua realiza-
ção”, indica a nota informativa da OA,
divulgada anteontem.
Entretanto, estão em apreciação
na Assembleia da República vários
projectos de lei que, basicamente,
propõem a integração da Caixa de
Previdência dos Advogados e Solici-
tadores (CPAS) na Segurança Social
por forma a garantir a possibilidade
de escolha de regime de contribui-
ções entre a CPAS e a Segurança
Social.
Na mesma Assembleia Geral da
Ordem dos Advogados, que se pro-
longou pela manhã e tarde de ontem
e contou com a participação de milha-
res de proÆssionais, foi chumbado o
Orçamento do Conselho Geral da OA
para 2021. Lusa
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 19

Rua Júlio Dinis, n.º 270, Tel. 22 615 10 00

Bloco A, 3.º Piso
4050-318 Porto
lojaporto@publico.pt
De seg a sex das 09H às 18H
CLASSIFICADOS

SINDICATO DOS TRABALHADORES

De Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas, e

ACTIVIDADES DIVERSAS
(Antigo Sindicato dos Contínuos e Porteiros, fundado em 1/11/41))
SEDE NACIONAL: Rua João da Silva, N.º 20, 1900-098 LISBOA – Telefs: 21-3463756 - 21-3475596/9 / Fax: 21-3475590
Contribuinte N.º: 500 977 666 - Email – stad_nacional@stad.pt - Página www.stad.pt

FILIADO:
Em Portugal, na CGTP – IN e FEPCES e, internacionalmente, na UNI-EUROPA E UNI-GLOBAL
Fundada em 1988 pelo Professor Doutor Carlos Garcia, a Associação Portuguesa de
ASSEMBLEIA-GERAL ORDINÁRIA DE 2021 Familiares e Amigos de Doentes de Alzheimer - Alzheimer Portugal é uma Instituição
Particular de Solidariedade Social. É a única organização em Portugal, de âmbito
CONVOCATÓRIA nacional, especificamente constituída para promover a qualidade de vida das pessoas
Camarada
De acordo com os Estatutos e para os efeitos do disposto no Art.º 49 com demência e dos seus familiares e cuidadores. Tem cerca de dez mil associados em
e o Art.º 1 do Regulamento da Assembleia-Geral, por este meio venho
convocar a todo o país.
ASSEMBLEIA-GERAL ORDINÁRIA Oferece Informação sobre a doença, Formação para cuidadores formais e informais,
do Sindicato para reunir de forma descentralizada, através de Sessões
Regionais e Locais, às 14.30 horas nas seguintes datas e locais: Apoio domiciliário, Apoio Social e Psicológico e Consultas Médicas da Especialidade.
SESSÃO REGIONAL
DATA
/ LOCAL
MORADA Como membro da Alzheimer Europe, a Alzheimer Portugal participa ativamente no
28/04/2021 Sessão da Delegação • Delegação Regional de Porto movimento mundial e europeu sobre as demências, procurando reunir e divulgar os
(4.ª Feira) Regional do Porto Largo Ramada Alta, N.º 140 - Porto
29/04/2021 Sessão da Delegação • Delegação Regional de Coimbra conhecimentos mais recentes sobre a Doença de Alzheimer, promovendo o seu estudo,
(5.ª Feira) Regional de Coimbra Av.ª Fernão Magalhães, n.º 24 -2.º C - Coimbra
29/04/2021 Sessão da Delegação • Delegação Regional de Setúbal a investigação das suas causas, efeitos, profilaxia e tratamentos.
(5.ª Feira) Regional de Setúbal Largo da Misericórdia n.º 46 - 2.º - Setúbal
30/04/2021 Sessão da Delegação • Sede Nacional do STAD Contactos
(6.ª Feira) Regional de Lisboa Rua João da Silva, N.º 20 - Lisboa
03/05/2021 Sessão da Delegação • Sindicato dos Cabeleireiros Sede: Av. de Ceuta Norte, Lote 15, Piso 3, Quinta do Loureiro, 1300-125 Lisboa - Tel.: 21 361 04 60/8 - E-mail: geral@alzheimerportugal.org
(2.ª Feira) Local da R. A. da Madeira Rua Dr. Fernão d´Ornelas, n.º 6, 2.º - Funchal
Centro de Dia Prof. Dr. Carlos Garcia: Av. de Ceuta Norte, Lote 1, Loja 1 e 2 - Quinta do Loureiro, 1350-410 Lisboa - Tel.: 21 360 93 00
03/05/2021 Sessão da Delegação • União Sindicatos Ponta Delgada
(2.ª Feira) Local da R. A. dos Açores Rua do Peru, 101 - Ponta Delgada Lar, Centro de Dia e Apoio Domiciliário «Casa do Alecrim»: Rua Joaquim Miguel Serra Moura, n.º 256 - Alapraia, 2765-029 Estoril
Tel. 214 525 145 - E-mail: casadoalecrim@alzheimerportugal.org
Esta Assembleia-Geral Ordinária terá a seguinte:
ORDEM DE TRABALHOS Delegação Norte: Centro de Dia “Memória de Mim” - Rua do Farol Nascente n.º 47A R/C, 4455-301 Lavra
1 - Analisar e decidir sobre o “Relatório e Balanço da Actividade Sindical Tel. 229 260 912 | 226 066 863 - E-mail: geral.norte@alzheimerportugal.org
e Contas de 2020” apresentado pela Direcção Nacional;
2 - Analisar e decidir sobre o “Plano Global de Actividade Sindical e Delegação Centro: Urb. Casal Galego - Rua Raul Testa Fortunato n.º 17, 3100-523 Pombal - Tel. 236 219 469
Orçamento para 2021” apresentado pela Direcção Nacional.
- E-mail: geral.centro@alzheimerportugal.org
CAMARADA
Uma Informação importante - os documentos que vão ser apresentados Delegação da Madeira: Avenida do Colégio Militar, Complexo Habitacional da Nazaré, Cave do Bloco 21 - Sala E, 9000-135 FUNCHAL
à Assembleia-geral pela Direcção Nacional (Relatório e Balanço da Tel. 291 772 021 - E-mail: geral.madeira@alzheimerportugal.org
Actividade Sindical e Contas /2020 e Plano Global de Actividades Sindicais
e Orçamento /2021), estarão à disposição dos sindicalizados na Sede Núcleo do Ribatejo: R. Dom Gonçalo da Silveira n.º 31-A, 2080-114 Almeirim - Tel. 24 300 00 87
Nacional e nas instalações das Delegações a partir do dia 22.Abril.2021
- E-mail: geral.ribatejo@alzheimerportugal.org
SAUDAÇÕES SINDICAIS
Presidente da Mesa da Assembleia-Geral,
Núcleo de Aveiro: Santa Casa da Misericórdia de Aveiro - Complexo Social da Quinta da Moita - Oliveirinha, 3810 Aveiro
Carlos Trindade
Tel. 23 494 04 80 - E-mail: geral.aveiro@alzheimeportugal.org
Comunicado n.º 19/2021 - Lisboa 26 Março.2021

CONHEÇA AS NOSSAS COLECÇÕES

DE BANDA DESENHADA

MAIS INFORMAÇÕES: loja.publico.pt | 210 111 010

 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
20 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021

Local Produto tem potencial de valorização ainda pouco explorado

Tory Burch acordou

os poveiros para o real
valor da sua camisola?
Vender camisolas a 80 euros não paga um euro à hora a quem as
faz. Estilista norte-americana estava a vendê-las por 700 euros
antes de ser criticada por plágio. Encomendas aumentaram
Reportagem

Abel Coentrão Texto

Nelson Garrido Fotografias
A estilista norte-americana Tory
Burch foi esta semana atacada por
vender camisolas poveiras, sem
atribuição de origem, a um preço
cerca de nove a dez vezes superior
ao que se pratica, para as mais
caras, na Póvoa de Varzim. A artesã
Desidéria Sousa considera o valor
exagerado, mas sente que o
trabalho que ela e outras mulheres
desenvolvem deveria ser mais
valorizado, pois, descontado o
preço da lã, em venda directa pode
ganhar 50 euros por uma peça que
lhe demora umas 50 horas a
tricotar e bordar. Como diria um
antigo primeiro-ministro, é fazer as
contas, para se perceber o pouco
que isso é.
Na quarta-feira, quando
denunciou o caso ao PÚBLICO, o
presidente da Junta da Póvoa de
Varzim, um antigo publicitário,
não deixou de ver o caso com Tory
Burch como uma oportunidade.
Ricardo Silva, atónito com a forma
como a estilista tentara fazer
passar por inspiração mexicana
uma camisola que poderia ter sido
feita por uma artesã local,
protestara com a empresa. Mas
esperava que se tirassem lições
deste caso. “Isto não pode apenas
ser um produto de museu. Há aqui
um potencial económico, de
possibilidade de geração de
emprego na comunidade, que
deveria ser aproveitado”, dizia o
autarca. Que, por outro lado, já
nesse Æm tarde, antes de a história
da usurpação pela estilista se
tornar pública, sentia que, mais do
que impedir Tory Burch de vender
camisolas, seria benéÆco se,
agindo correctamente, uma
empresa com a dimensão e alcance
mundial da empresária se
associasse a uma organização
local, para valorizar o produto, em
vez de o plagiar. Como defende,
aliás, a Organização Mundial de
Propriedade Intelectual (WIPO).
Uma marca de pertença
Quando o plágio foi desmascarado,
e o risco de o escândalo tomar
proporções internacionais se
tornou evidente, Burch pediu
desculpas ao município da Póvoa
de Varzim, e durante algumas
horas, na quinta-feira, o presidente
da câmara, Aires Pereira, ainda
Æcou na expectativa de perceber
quais eram as intenções da
empresária. Que, ao telefone, e
num tweet, manifestara intenção
de valorizar o trabalho das artesãs
poveiras. Mas, até agora, a
autarquia não recebeu a prometida
proposta de acordo, e o que
aconteceu foi que o produto
deixou de estar disponível na loja
online da estilista, pouco depois de
o Ministério da Cultura ameaçar
recorrer à justiça para defender
este património cultural e de a
história ser publicada no Instagram
do Diet Prada, que denuncia más
condutas na indústria da moda.
A camisola poveira não está
escondida do mundo. Para além de
já ter sido alvo de atenção da
National Geographic, em 1938, e de
ter sido vestida pela actriz e
princesa do Mónaco Grace Kelly,
várias já foram produzidas, mais
recentemente, para o Japão, e nos
anos 1960 uma loja da cidade
comprava-as às mulheres que as
faziam e exportava-as para vários
países. Mas é essencialmente um
produto de consumo local, para os
turistas que passam pela cidade ou
para as comunidades de poveiros
espalhadas pelos quatro cantos do
globo, que vêem nela uma espécie
de bilhete de identidade. Ao qual
só falta um número, porque muitas
das personalizações incluem
bordados com o nome, uma
alcunha ou as antigas marcas de
família, ou simplesmente a
designação “poveiro”.
E, de repente — com alegadas
inspirações mexicanas, primeiro;
sem inspirações nenhumas, após
um primeiro protesto da junta; ou
com inspiração nas camisolas
poveiras, depois de o caso se
tornar público —, a cópia de Tory
Burch mostra que, na percepção
de uma empresária da moda, há
clientelas inexploradas, dispostas a
pagar bem mais por uma peça que
até já tem derivações nos materiais
e nas cores. E que tem, por isso,
um potencial de valorização pouco
explorado, do ponto de vista da
economia local, como assume
quem a produz.
Muitas das personalizações surgem em meias, blusas ou até
Várias derivações incluem bordados com o nome, capas, em gestos que já mostram
A camisola mais tradicional é feita uma alcunha ou as antigas um pouco do potencial de
em lã de tom cru, da serra da marcas de família recriação deste produto. Que não
Estrela, mas vimo-las noutros poderia ser vendido a 30 euros —
tipos de lã, em Æo acrílico, ou até como perguntaram à historiadora
em algodão. E já se fazem em e directora do Museu Municipal da
verde, azul-escuro ou até preto. Os Póvoa de Varzim, Deolinda
bordados que a caracterizam Carneiro. “Isso nem para a lã
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
chegava”, avisa.
Entre as mulheres da associação
dos Amigos do Museu Municipal da
Póvoa de Varzim que se dedicam a
fazer camisolas, e talvez pelo facto
de, aos 75 anos, ainda ser uma
artesã no activo, Desidéria Sousa
não pensa de outra forma. “Os 700
euros são um exagero, mas isto
deveria vender-se por 250 a 300
euros”, nota esta algarvia, que,
depois de mais de duas décadas na
Argentina, se instalou, na Póvoa de
Varzim.
A pandemia travou os encontros
semanais no museu onde, sob a
batuta de Cármen Flores, um
grupo de mulheres troca
experiências, ensina quem quiser
entrar na roda e colabora na
confecção destas camisolas. Nos
últimos dias, o caso “da
americana” juntou-as de novo,
para encontros furtivos e distantes
com a imprensa, em que as “duas
de treta” têm por tema,
incontornavelmente, este episódio,
que pôs o país a querer saber mais
sobre o produto artesanal que lhes
sai das mãos.
Só “por amor à camisola!”
Até da Austrália já ligaram a
perguntar, diz Cármen, que pouco
consegue falar com o PÚBLICO
por ter de acorrer a pedidos de
informação e encomendas.
Desidéria aponta o rumo da
conversa. “Isto é melhor ir pelo
lado bom”, insiste a mulher que só
faz camisolas “por amor à
camisola”, pois para ganhar
dinheiro, explica, tem é de se
dedicar a peças mais pequenas,
adereços de vários tipos
inspirados nelas, que, esses sim,
mais acessíveis aos bolsos dos
clientes e fáceis de fazer, lhe dão
de comer. “Se vivesse das
camisolas, já teria morrido de
fome.”
Com Cármen e Desidéria, Maria
das Dores Morais, Maria da Luz
Cruz e Felicidade Gonçalves
formam o quinteto mais constante
do grupo que se encontra no
museu às sextas-feiras. Cármen,
que traz vestida uma réplica da
camisola usada por João Moço,
personagem principal do Ælme
Ala-Arriba, de 1942, já formou mais
gente. Mas, em 25 pessoas que lhe
passaram pelas mãos em duas
iniciativas apoiadas pelo IEFP, nem
todas conseguiram, por exemplo,
aprovação na arte dos bordados, e
são raras as que Æcaram a fazer
disto um trabalho.
Desidéria não tem dúvidas de
que é pelo esforço, e pela curta
compensação. “Um euro à hora é
muito pouco. É preciso valorizar
mais o nosso trabalho. Se houvesse
uma empresa que comprasse a
nossa produção a um preço justo,
talvez mais gente as Æzesse”, diz,
admitindo que com vendas pela
Internet poderiam chegar a outros
clientes. Mas a produção seria
sempre, de certa forma, limitada,
porque à mão, ou mesmo à
máquina, o processo é demorado.
Enquanto artesanato, cada peça é
única, e o cliente pode escolher
cores, o tipo de Æo e os motivos
que quer ver bordados. É isso que
torna cada peça especial, dizem.
Mesmo antes dos anos 1930 —
altura em que, pela mão do
etnólogo Santos Graças, ganhou os
motivos ligados à pesca —, a
camisola branca, que chegou a ser
tricotada em Azurara (Vila do
Conde) e bordada na Póvoa, já era
característica dos poveiros. Notou-o
Ramalho Ortigão, no seu famoso
livro Praias de Portugal — Guia do
Banhista e do Viajante, em 1876, que
descreve aqueles pescadores com
“a camisola justa com um coração e
uma cruz bordada ao peito, e umas
armas de Portugal com a respectiva
coroa bordadas no braço direito”.
O trajar, que incluía um catalão
na cabeça, era já distintivo, o que,
uns anos antes, terá confundido o
rei D. Luís, num encontro com uma
lancha poveira, no mar. Ficou
famoso o diálogo entre o monarca
— que lhes perguntou se eram
portugueses — e os pescadores, de
pronta resposta: “Poveirinhos, pela
graça de Deus!” Com o catalão fora
de moda, tal como a boina basca,
que o substituiu, a camisola
ganhou outros atributos, e passou
a ser usada por mulheres e
crianças como uma marca
identitária bem presente. É isso o
que explica a revolta com que os
descendentes daqueles
poveirinhos se atiraram a Tory
Burch, que acabou por retirar o
produto, sem nunca admitir que se
limitara a copiá-lo.
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 21
Camisolas poveiras
Expressão cultural
tradicional ainda à
espera de certificação
Abel Coentrão
As camisolas poveiras são produzidas
há mais de um século entre a comu-
nidade piscatória da Póvoa de Varzim,
mas nem esta peça de vestuário, nem
o saber-fazer que lhe está associado
estão certiÆcados.
A Junta de Freguesia da Póvoa de
Varzim está desde o ano passado a
desenvolver a certiÆcação desta peça
junto do Cearte — Centro de Forma-
ção ProÆssional para o Artesanato e
para o Património, mas o processo
não está ainda concluído. O museu
municipal prepara a edição de um
livro, que ainda não saiu por causa
da pandemia, e que deverá, agora,
incluir referências ao conÇito com a
estilista norte-americana Tory Burch,
que as tentou vender sem referência
à origem.
Quando o Governo, através do
Ministério da Cultura, anunciou que
iria solicitar a identiÆcação das vias
judiciais e extrajudiciais ao dispor do
Estado português para defender a
camisola poveira enquanto patrimó-
nio cultural português, levantou-se
imediatamente a questão da diÆcul-
dade de lutar contra a apropriação de
algo que ainda não está certiÆcado
como uma produção artesanal tradi-
cional, e cuja componente material
(os desenhos, o ponto utilizado), não
tendo um autor conhecido, diÆcil-
mente poderia ser defendido pelo
lado da propriedade intelectual.
Na verdade, tendo coincidido com
a ameaça do Estado, a retirada da
peça da loja online por parte de Burch
poderá estar mais depressa relacio-
nada com o impacto internacional
que o caso passou a merecer na sexta-
feira, depois de ter chegado ao Insta-
gram do Diet Prada. Criado há cinco
anos, o projecto dos nova-iorquinos
Tony Liu e Lindsey Schuyler expõe
situações de plágio na indústria da
moda, para além de outros proble-
mas graves, como a exploração de
modelos ou abusos sexuais. Dali, a
história já tinha, na sexta-feira, salta-
do para o The Independent, entre
outros, mas já com a tónica no pedido
de desculpas da estilista. Que apenas
assumiu um erro de má atribuição da
inspiração para o produto.
Respeitar tradições
Três dias depois de o caso ter sido
dado a conhecer, ninguém duvida,
em Portugal, de que a peça era uma
simples cópia de uma expressão cul-
tural tradicional (ECT). O caso cha-
mou a atenção de Vera Albino, advo-
gada da Inventa, sociedade especiali-
zada em conÇitos relacionados com
propriedade intelectual, que acom-
panha com atenção a forma como
alguns membros da indústria da alta-
costura se apropriam, por vezes, des-
tas ECT, e para quem Tory Burch
falhou alguns dos quatro princípios
propostos, para a indústria da moda,
por uma das mais reputadas juristas
nesta área, Brigitte Vézina, e seguidas
pela Organização Mundial da Proprie-
dade Intelectual.
Segundo esses princípios, os cria-
dores devem “compreender e respei-
tar as culturas indígenas, ou locais”,
podem “reinterpretar e transformar
essas expressões de maneira respei-
tosa”, “reconhecendo e publicitando
a titularidade dessas expressões”. Por
último, devem, sempre que possível,
dialogar com as comunidades de ori-
gem dessas ECT, e colaborar com elas
no desenvolvimento desse produto”,
explica a jurista portuguesa. Que
Portugal tem,
desde 2019, uma
estratégia para
a valorização
do saber-fazer
português, mas
ainda não foi
criada a associação
responsável
defende a classiÆcação destas mani-
festações da cultura popular como
património imaterial português, pas-
so que permitiria, por exemplo, o seu
eventual reconhecimento pela
UNESCO. Outras formas de certiÆca-
ção, como a Denominação de Origem
Protegida (DOP), não impedem que
o mesmo produto seja replicado nou-
tro lado. Apenas não pode usar a
denominação, acrescenta.
Portugal tem, desde 2019, uma
estratégia para a valorização do saber-
fazer português, mas ainda está para
ser criada a associação encarregada
de levar por diante esta iniciativa,
voltada, precisamente, para a valori-
zação do artesanato. Quando denun-
ciou o caso com Tory Burch ao PÚBLI-
CO, o presidente da Junta da Póvoa de
Varzim, que tem coordenado o pro-
cesso de certiÆcação das camisolas
poveiras, considerou excessivo que
“seja preciso pagar cerca de dez mil
euros”, acrescido de um valor anual
“de três mil euros”, para registar e
manter a certiÆcação.
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
22 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021
Economia PE faz balanço da directiva sobre cooperação administrativa
Cofres e jactos
privados: para
onde caminha a
troca de dados
Ɗscais na UE?
Relatório em discussão no Parlamento
Europeu propõe que as autoridades Äscais
da UE troquem dados sobre donos de
iates, jactos privados e cofres em bancos
Pedro Crisóstomo
A União Europeia está a discutir o
alargamento do leque de informa-
ções que as autoridades tributárias
trocam entre si para reforçar a segu-
rança interna contra a evasão Æscal
e o branqueamento de capitais.
Para ajudar a identiÆcar situações
de risco, o Parlamento Europeu
quer colocar em cima da mesa a
possibilidade de o intercâmbio auto-
mático de documentação entre as
autoridades Æscais incluir informa-
ções sobre os proprietários de jactos
privados e iates, e dados sobre os
contribuintes que usam cofres para
guardar dinheiro em espécie ou
objectos valiosos.
Se a Comissão Europeia concor-
dar e os governos aceitarem o repto
do Parlamento Europeu, as admi-
nistrações tributárias dos 27 Esta-
dos-membros Æcarão com um novo
manancial de dados para construir
matrizes de risco transnacionais,
fazer inspecções internas e investi-
gar em conjunto.
A directiva relativa à cooperação
administrativa (conhecida pela sigla
DAC) já foi alterada seis vezes desde
2011 e, como está em permanente
actualização, o Parlamento Europeu
decidiu fazer um balanço dos
ganhos alcançados, identiÆcar os
“ângulos mortos” da legislação e
propor alterações.
O projecto de relatório, que ainda
terá de ser votado, começou a ser
discutido há duas semanas na
comissão dos assuntos económicos
e monetários, onde está integrada
uma subcomissão dedicada aos
assuntos Æscais.
O documento foi redigido pelo
eurodeputado alemão dos Verdes
Sven Giegold — que há vários anos
segue as matérias de Æscalidade no
Parlamento Europeu — e inclui uma
proposta de resolução para que a
Comissão analise “a forma mais
adequada de incluir” cinco novos
tipos de informações na troca de
dados: informações sobre “os pro-
prietários beneÆciários de bens
imóveis e empresas”; sobre as
“mais-valias relacionadas com bens
imóveis e mais-valias relacionadas
com activos Ænanceiros, em parti-
cular para encontrar formas de as
administrações Æscais estarem mais
bem informadas para identiÆcar
mais-valias realizadas”; sobre os
“rendimentos de dividendos”; sobre
“activos não Ænanceiros como NUNO FERREIRA SANTOS
dinheiro, arte, ouro ou outros valo-
res detidos em portos livres, arma-
zéns alfandegários ou cofres de
depósito” e sobre a “propriedade de
iates e jactos privados”.
Prioridades da revisão
Embora a resolução ainda tenha de
ser aprovada em comissão e votada
no plenário do Parlamento Europeu
daqui a alguns meses (a primeira
leitura está prevista para Junho), a
primeira versão dá pistas sobre
quais poderão ser as áreas prioritá-
rias de intervenção da Comissão
Europeia nas próximos propostas
de revisão da legislação.
A ideia é abranger agora os inves-
timentos realizados em determina-
dos tipos de património que podem
estar a funcionar como refúgio de
actividades criminosas, em detri-
mento dos activos em relação aos
quais as obrigações de transparên-
cia cresceram nos últimos anos.
O relatório de Giegold chama a
atenção para o facto de estarem a ser
“utilizadas estruturas cada vez mais
complexas para ocultar os beneÆciá-
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
rios Ænais” de rendimento e patrimó-
nio. A eÆcácia destas regras, vinca,
“depende fortemente das directivas
contra o branqueamento de capitais
em vigor ao nível dos Estados-mem-
bros”: a aplicação “incorrecta” das
normas e as próprias “fraquezas”
que ainda existem na legislação
“minam a eÆcácia” das DAC.
Em Portugal, quando uma empre-
sa ou um cidadão alugam um cofre
num banco, o locatário é considera-
do um cliente da instituição. O ban-
co tem de cumprir os deveres de
diligência previstos na lei de preven-
ção do branqueamento de capitais,
embora isso não obrigue as entida-
des Ænanceiras a saber quais são os
objectos e os valores depositados
nos cofres, como conÆrmou ao
PÚBLICO o Banco de Portugal.
Se esses valores “forem visados”
noutras transacções ou operações
em que a lei de prevenção da lava-
gem de dinheiro se aplica, aplicam-
se aí os procedimentos de identiÆ#
cação e diligência.
O nível de informações que as
administrações trocam entre si tem
ERIC GAILLARD/REUTERS
Uma directiva em construção
2011
A primeira directiva relativa à
cooperação administrativa no
domínio da fiscalidade é de
2011. Conhecida a nível
europeu como a “DAC”
(a sigla em língua inglesa de
Directive on Administrative
Cooperation), o texto fundador
obrigou as autoridades fiscais a
enviarem e a receberem
informações sobre
determinados contribuintes a
partir de 2015, como dados
sobre rendimentos do trabalho,
produtos de seguros de vida
e imóveis.
2014
A segunda directiva, a DAC 2,
é de 2014 e entrou em vigor
em 2016. Os bancos ficaram
obrigados a transmitir às
autoridades tributárias
informações sobre o saldo das
contas bancárias dos clientes
residentes noutros
Estados-membros da União
Europeia, cabendo a cada fisco
enviar essa informação aos
congéneres. A obrigação
passou a abranger também os
valores sobre dividendos, juros,
ganhos de capital e outros
rendimentos financeiros.
2015
A DAC 3 é de 2015 e entrou em
vigor em 2017. Passou a obrigar
as autoridades tributárias a
trocarem informações sobre
decisões fiscais antecipadas e
acordos prévios sobre preços
Eurodeputados Lídia Pereira vindo a aumentar a um ritmo acele-
e José Gusmão (em baixo) são rado nos últimos anos.
relatores-sombra do relatório
Qualidade limitada
Portugal reporta à Alemanha,
Luxemburgo ou a qualquer outro
Estado-membro informações sobre
quais são os cidadãos residentes nes-
ses países que têm contas bancárias
em Portugal e recebe informação
idêntica sobre os portugueses; e o
mesmo acontece relativamente à
[Estão a ser] propriedade e rendimento de bens
imóveis, dados sobre preços de
utilizadas transferência, registo dos beneÆciá-
estruturas rios efectivos de empresas, relatórios
das multinacionais e a identiÆcação
cada vez mais de esquemas de planeamento Æscal
complexas transfronteiriços.
Os governos europeus já chegaram
para ocultar os a acordo em torno da DAC 7 (a sexta
beneÄciários Änais revisão da directiva, ou seja, o sétimo
texto legislativo) para que, a partir de
[de rendimento 2023, o intercâmbio automático entre
e património] as autoridades tributárias inclua os
rendimentos obtidos pelos vendedo-
Relatório de Sven Giegold res nas plataformas digitais.
Deputado alemão dos Verdes Apesar do reforço contínuo, há
no Parlamento Europeu arestas por limar. O projecto de rela-
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 23
de transferência de grupos
empresariais (com implicações
tributárias).
2016
A DAC 4 é de Maio de 2016 e
obrigou as multinacionais com
um volume de negócios
consolidado superior a
750 milhões de euros a
entregarem às autoridades
tributárias relatórios por país
sobre determinadas informações
fiscais, como pagamento de
impostos por jurisdição, para
troca de dados a nível europeu.
A medida entrou em vigor em
2017.
Entretanto, já este ano, os
governos europeus aceitaram
que as multinacionais sejam
obrigadas a divulgar algumas
destas informações.
tório do Parlamento nota que, nal-
guns casos, a “qualidade das infor-
mações trocadas é limitada” (por
exemplo, sobre os beneÆciários efec-
tivos) e lembra que a Comissão Euro-
peia concluiu em 2019 que, muitas
vezes, os Estados-membros cum-
prem apenas os requisitos mínimos
previstos na legislação.
A comissão dos assuntos económi-
cos quis fazer uma avaliação mais
Æna sobre a implementação das
directivas, mas esbarrou na impos-
sibilidade de acesso aos documentos
dos Estados-membros, que só a
Comissão Europeia conhece.
Os eurodeputados portugueses
Lídia Pereira (PSD) e José Gusmão
(BE) são relatores-sombra do relató-
rio da comissão dos assuntos econó-
micos e deverão trabalhar na nego-
ciação da versão Ænal do texto nos
próximos meses.
Lídia Pereira aÆrma que os euro-
deputados estão “desapontados”
com o facto de o Parlamento não ter
tido acesso a dados exactos sobre
“quando é que a troca de informa-
ção ocorre e sobre a qualidade da
2016
No mesmo ano, ficou pronta
uma outra revisão. A DAC 5 foi
concluída em Dezembro e
introduziu a declaração às
autoridades tributárias do
beneficiário efectivo de
empresas e outras entidades.
Entrou em vigor em Janeiro de
2018.
2018
A DAC 6 trouxe a troca
automática de informações
sobre esquemas de
planeamento fiscal na UE, que
têm de ser comunicadas às
autoridades fiscais pelos
contribuintes ou
intermediários (como
advogados ou consultores
fiscais). Entrou em vigor em
2020.
ANTONIO BRONIC/REUTERS
mesma”, e lamenta a “falta de von-
tade política” dos governos em tra-
balharem em conjunto com o Parla-
mento, porque, com excepção da
Finlândia e da Suécia, os restantes
recusaram-se a enviar informação
relevante sobre a aplicação das dis-
posições das directivas.
No entanto, alguns parlamentos
nacionais — como o português, o
alemão ou o austríaco — transmiti-
ram algumas informações.
José Gusmão aÆrma que o grupo
da Esquerda está “globalmente satis-
feito” com a proposta de relatório,
que, diz, vai “no bom sentido de
incluir” mais elementos na troca de
informação. “É um relatório no qual
vamos trabalhar.”
O eurodeputado bloquista lembra
que o documento faz “parte de uma
reÇexão construtiva” que o Parla-
mento fez sobre a necessidade de
reforço das medidas de combate ao
branqueamento de capitais e, tal
como Lídia Pereira, sublinha que é
preciso saber mais sobre a qualidade
da informação que está a ser trocada
entre os países.
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
24 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021
Ciência As Árvores e Nós (II)
A sexualidade de
plantas e humanos
Neste segundo artigo
— de uma série de quatro
a publicar ao Äm-de-semana —
continuamos a viagem pelas
semelhanças e diferenças entre
nós e as árvores, agora ao nível
do corpo e da reprodução sexuada
Jorge Paiva
A
morfologia do nosso corpo
e a de uma árvore são
semelhantes. Assim, temos
cabeça, tronco e membros
superiores (braços) e infe-
riores (pernas). As árvores,
copa (cabeça), tronco e ramos
(membros) superiores (braços) e
inferiores (ramos radiculares).
Como já referimos (As Árvores e
Nós I), também somos semelhantes
estruturalmente, pois somos
ambos seres vasculares (com
vasos): artérias e veias no nosso
corpo; Çoema e xilema nas plantas,
por onde circula água e um líquido
(sangue arterial nas artérias e veno-
so nas veias) no nosso corpo e seiva
(elaborada no Çoema e bruta no
xilema) nas plantas.
Claro que, apesar de semelhan-
tes, há grandes diferenças, a princi-
pal das quais, como referimos ante-
riormente (As Árvores e Nós I), é
que nós somos consumidores e
poluidores e as árvores são produ-
toras e puriÆcadoras.
Na reprodução também há mui-
tas semelhanças e diferenças.
A principal diferença é na repro-
dução assexuada, que nós não
temos. As árvores estão Æxas. Não
se movendo, a reprodução sexua-
da entre indivíduos é extremamen-
te aleatória e mais difícil do que no
nosso caso, que nos deslocamos
para emparceirar. Por isso, as
plantas conseguem reproduzir-se
sem precisarem de conjugação de
gâmetas.
Assexuadamente, as árvores
reproduzem-se naturalmente atra-
vés de ramos portadores de gemas,
que se desprendem, por fragmen-
tação (agitação do ar ou fragmenta-
dos por animais), que, chegados ao
solo e havendo condições, conse-
guem germinar formando árvores
genética e morfologicamente iguais
à árvore progenitora. A espécie huma-
na, quando descobriu isso, passou a
reproduzir assexuadamente árvores,
particularmente as fruteiras (estaca-
ria, enxertia, alporquia, mergulhia e,
actualmente, por micropropagação).
Nas plantas, além da fragmentação
vegetativa, ainda há outros processos
naturais de reprodução assexuada,
como, por exemplo, por gemas
(exemplo a batateira), esporos e apo-
mixia (produção de sementes, sem
fecundação).
A reprodução sexuada é extrema-
mente semelhante, embora os órgãos
sexuados tenham designações dife-
rentes devido ao tardio conhecimen-
to da sexualidade nas plantas (séculos
XVI-XVII). Quando Andrea Caesalpi-
no (1519-1603) descobriu que as plan-
tas tinham reprodução sexuada,
“calou-se”, com receio de ser conde-
nado. O monge Gregor Mendel (1822-
1884), quando o superior do conven-
to o proibiu de estudar a hereditarie-
dade com ratos (não era curial um
monge estar a assistir e promover
relações sexuais entre os animais),
continuou as experiências com plan-
tas (por exemplo, ervilheiras), pois,
como referiu, “o meu Superior não
sabe que as plantas também têm
reprodução sexuada”.
Nomenclaturas dos órgãos
Às plantas vasculares que dão semen-
tes chamamos espermatóÆtas (os
fetos, por exemplo, não dão semen-
tes), das quais umas dão Çores e fru-
tos (angiospérmicas) e outras não têm
Çores e não dão frutos, apenas semen-
tes (gimnospérmicas, como, por
exemplo, pinheiros, ciprestes e zim-
bros).
Tal como nas árvores com Çores
(angiospérmicas), em que os órgãos
reprodutores (estames, com Ælete e
antera; ovário, com estilete e estigma)
estão protegidos pelo perianto (sim-
ples, só com tépalas, ou diferenciado
em sépalas e pétalas), também nos
humanos temos a pubescência da
região púbica, que corresponde ao
perianto das angiospérmicas.
No aparelho reprodutor masculino
dos humanos, temos os testículos,
onde se formam as células sexuais
masculinas móveis (espermatozói-
des), que são introduzidas no apare-
lho reprodutor feminino pelo pénis.
Nas angiospérmicas, os grãos de
pólen formam-se nas anteras (os tes-
tículos das plantas), germinam sobre
o estigma e produzem o tubo polínico
(o pénis das plantas), que introduz as
células sexuais masculinas imóveis Dimensões árvore-homem: o óvulos dos animais correspondem as
(os espermatozóides das plantas) no biólogo Jorge Paiva junto a uma oosferas das plantas (gâmeta femini-
aparelho reprodutor feminino. Sterculia africa em Quiterajo no imóvel).
Nas angiospérmicas, o aparelho (Cabo Delgado, Moçambique) Vejamos, então, as homologias dos
reprodutor feminino, o pistilo (ová- órgãos. À vulva corresponde o estig-
rio, estilete, estigma), tem a mesma ma; à vagina e respectivo canal cor-
conÆguração do que o do ser huma- responde o estilete; ao útero corres-
no, apenas está voltado para cima ponde o que se designa por ovário
(para receber os grãos de pólen no nas plantas; ao ovário dos animais
estigma) em vez de estar voltado para corresponde o óvulo das plantas; ao
baixo, como no nosso caso.
Os órgãos sexuais femininos das A reprodução óvulo humano, célula sexual feminina
dos animais, corresponde a oosfera,
plantas têm designações diferentes
das dos animais, apenas porque
sexuada é célula sexual feminina das plantas.
Nas mulheres, quando a célula sexual
quando escolheram os respectivos
termos (exemplos: estilete, estigma,
extremamente masculina (espermatozóide) fecunda
a célula sexual feminina (óvulo), no
ovário, óvulo) ainda não se conhe- semelhante, oviduto (trompa), forma-se o ovo,
ciam bem as homologias entre eles e
os dos animais. Nos humanos, o apa- embora os órgãos iniciando-se aí (no oviduto) a forma-
ção do embrião, que se vai completar
relho genital feminino é constituído
pela vagina (com a vulva e canal vagi-
sexuados tenham no útero. Logo que o óvulo é fecun-
dado no oviduto, o útero inicia ime-
nal), que se liga ao útero, onde “desa-
guam” os ovidutos que vêm dos ová-
designações diatamente a preparação para rece-
ber o embrião (inicia-se a dilatação da
rios, onde se formam as células diferentes devido ao cavidade uterina, assim como da
sexuais femininas imóveis (óvulos).
Nas angiospérmicas, o corresponden- tardio conhecimento parede do útero). Nas plantas, logo
que o grão de pólen inicia a germina-
te ao útero é o ovário (já se chamava
assim quando se descobriu a homo-
da sexualidade ção no estigma e o tubo polínico vai
“caminhando” através do estilete,
logia); o correspondente ao ovário
das mulheres é o óvulo das esperma-
nas plantas levando na extremidade as células
sexuais masculinas (imóveis) ao
tóÆtas (plantas com sementes), e aos (séculos XVI-XVII) encontro das oosferas (células sexuais
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
femininas), o ovário (o “útero” das
plantas) inicia imediatamente a pre-
paração para a formação do fruto
(dilatação e espessamento dos teci-
dos), onde se vão formar os embriões
(nas sementes).
As gimnospérmicas, por não terem
Çores, não têm ovário, portanto não
dão fruto, pois, como vimos, o fruto
resulta da dilatação do ovário. Nos
animais que não têm útero, como
aves, por exemplo, depois da fecun-
dação do óvulo, como não há útero
nem placenta, o ovo carrega-se de
substâncias nutritivas (gema e clara)
envolvidos por uma parede protecto-
ra (casca) e sai do corpo da progeni-
tora para ser chocado (calor para que
o embrião se desenvolva) e dar um
pinto. É o que acontece com as
gimnospémicas que, por não terem
ovário (útero dos animais), depois da
fecundação da oosfera (óvulo dos
animais) o ovo carrega-se de substân-
cias de reserva, desenvolve-se o
embrião envolvido por uma parede
protectora (testa da semente) e sai do
corpo da progenitora dentro da
semente, para germinar e dar uma
nova planta.
Quando se dá a fecundação do óvu-
JORGE PAIVA
lo humano, como vimos, dá-se a dila-
tação do útero ao qual se liga o
embrião (para receber nutrientes),
que está protegido pela placenta. Nas
angiospérmicas, depois da fecunda-
ção da oosfera (célula sexual femini-
na) forma-se o ovo que germina den-
tro do óvulo (corresponde à placenta)
e forma o embrião, protegido pela
parede do óvulo que endureceu (tes-
ta da semente). Esta parede com o
embrião constitui a semente. Geral-
mente, no útero humano apenas há
um ovo, que germinado origina ape-
nas uma criança. Nas plantas, no ová-
rio (útero dos animais) formam-se
frequentemente muitos ovos, origi-
nando-se frutos com muitas semen-
tes, como, por exemplo, no melão e
na vagem das ervilheiras.
Gravidez extra-uterina
Assim, um pinhão do pinheiro, uma
gimnospérmica (não tem Çores, por
isso não produz frutos), é uma semen-
te, e uma castanha ou um grão de
milho são frutos (resultantes de plan-
tas com Çores) monospérmicos (com
uma única semente), e uma melancia
é um fruto polispérmico (com muitas
sementes).
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 25
Como sabemos, o embrião huma-
Fecundação e reprodução sexual no é alimentado no corpo materno,
com nutrientes que lhe chegam
através do cordão umbilical. Nas
Plantas Animais plantas, o embrião é alimentado
com nutrientes que a planta lhe for-
nece através de um tecido que o
envolve (endosperma nas gimnos-
pérmicas, albúmen, nas angiospér-
micas). Nas plantas que dão frutos
(angiospérmicas), geralmente ricos
Ovário Útero
em nutrientes, eles não são para
Estilete Canal alimentar os embriões, mas para
vaginal alimentar os animais dispersores.
Estigma Nas árvores, como não se deslocam
Lábios como nós, o único processo de dis-
persarem as sementes é com o auxí-
lio do vento (frutos secos ou semen-
tes leves e, muitas vezes, alados), ou
dos animais (frutos carnudos com
sementes de testa dura ou num
caroço) ou pela água (frutos Æbrosos
Ovário
e leves para sobrenadarem, como,
Óvulos por exemplo, o coco).
Há uma grande diferença após o
Estilete Tubo parto (saída do ser do corpo mater-
polínico no), pois no nosso caso a progenito-
Estigma ra tem de continuar a alimentar o
Ælho com nutrientes e água (leite)
Grão de pólen Germinação do que ela fornece; nas plantas, assim
grão de pólen que as sementes encontram água,
germinam e formam logo folhas
verdes para produzirem os nutrien-
tes necessários. As plantas não pre-
Parede cisam de mamar!
do fruto Como se referiu, logo que o óvulo
Embrião é fecundado no oviduto, o útero
Embrião inicia imediatamente a preparação
para receber o embrião (inicia-se a
dilatação da cavidade uterina, assim
Parede como da parede do útero). Se, por
do útero qualquer circunstância, o embrião
não chega ao útero, dá-se aquilo a
que se chama uma gravidez extra-
uterina.
Pois bem, nas plantas também há
Semente de uma Ovo de uma ave um fenómeno idêntico. Logo que o
gimnospérmica (pinheiro) com embrião grão de pólen inicia a germinação
Embrião no estigma e o tubo polínico vai
Embrião caminhando através do estilete,
levando na extremidade as células
Clara sexuais masculinas ao encontro das
oosferas (células sexuais femininas),
o ovário (o útero das plantas) inicia
Endosperma Gema imediatamente a preparação para
a formação do fruto (dilatação e
espessamento dos tecidos), onde
vão estar os embriões (nas semen-
Testa Casca tes). Se a viagem do tubo polínico é
interrompida e as células sexuais
masculinas não chegam a fecundar
as oosferas (células sexuais femini-
Sementes no fruto Criança no útero
nas), dá-se o correspondente a uma
gravidez extra-uterina, formando-
se, assim, um fruto sem sementes
(partenocarpia). Actualmente, há
vários processos de produção de
frutos sem sementes, particular-
mente na fruticultura, como laran-
jas, tangerinas, melancias e bananas
(quando se abre ao meio uma bana-
na, são bem visíveis os óvulos não
fecundados).
Nós e as árvores somos, realmen-
te, muito diferentes, mas extrema-
mente semelhantes...
Fonte: Jorge Paiva PÚBLICO | José Alves
Biólogo
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
26 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021
Cultura No MNAA, o Grupo dos Amigos já escreveu ao Presidente da República
Falta de obras e de
manutenção ameaça
museus públicos
Problemas de infra-estruturas levam os directores a temer
pela integridade das obras que têm à sua guarda, mesmo
quando entre essas “obras” estão os próprios edifícios
Lucinda Canelas
Sistemas de ar condicionado com
décadas que não têm manutenção
regular há pelo menos dez anos,
coberturas a precisar de obras que
causam inÆltrações nas paredes e nas
calhas de iluminação, videovigilância
com falhas e, a somar a tudo isto, uma
dramática falta de recursos humanos
que torna ainda mais difícil monito-
rizar as condições de conservação
dos edifícios e das colecções. Proble-
mas estruturais que enfrentam vários
museus sob tutela da Direcção-Geral
do Património Cultural (DGPC) e que
são particularmente graves nos
museus nacionais de Arte Antiga e do
Azulejo, em Lisboa.
A situação no Museu Nacional de
Arte Antiga (MNAA) é de tal forma
preocupante que leva o seu director,
o historiador de arte Joaquim Caeta-
no, a falar numa “tempestade perfei-
ta” que afecta, sobretudo, a escultura
em madeira e aquela que é a melhor
colecção pública de pintura portu-
guesa e europeia existente no país.
Danos no telhado deixam entrar
água nas salas e as suas marcas são já
bem visíveis nas paredes das galerias
de pintura e escultura portuguesas.
É aqui, no terceiro piso do museu,
que reabriu totalmente renovado em
2016, que estão jóias do património
nacional, como os Painéis de São
Vicente, de Nuno Gonçalves, actual-
mente em restauro, e pinturas de
mestres como Gregório Lopes, Frei
Carlos, Jorge Afonso ou Garcia Fer-
nandes. Nas galerias de pintura euro-
peia, onde estão expostas obras de
relevância internacional de artistas
estrangeiros, como o tríptico das Ten-
tações de Santo Antão (c.1500), de
Jheronymus Bosch, ou o Santo Agos-
tinho (c.1465) de Piero della Frances-
ca, a situação não é muito melhor.
“Com água nas paredes e nalgumas
calhas eléctricas, e a falência total do
sistema de climatização, que no
melhor dos casos tem máquinas com
quase 30 anos e sem manutenção, é
impossível controlar a temperatura e
a humidade nas salas. Ora, se eu não
posso garantir condições adequadas
de temperatura e de humidade, não
posso proteger a colecção, que é a
minha primeira obrigação enquanto
director”, diz Joaquim Caetano, que
deu conta desta e de outras situações
que o levam a temer pela integridade
das obras, algumas delas com mais de
500 anos, num relatório que fez che-
gar ao director-geral do Património,
Bernardo Alabaça, em Fevereiro.
Um resumo deste documento foi,
depois, entregue ao Grupo dos Ami-
gos do MNAA, que de imediato
enviou uma carta com as suas preo-
cupações ao Presidente da Repúbli-
ca, Marcelo Rebelo de Sousa, que
continua a ser o presidente honorá-
rio do conselho de curadores do
museu. “Neste momento a situação
do museu não pode deixar de ser
deÆnida como de altíssimo risco”,
Se eu não posso
garantir condições
adequadas de
temperatura e de
humidade, não
posso proteger
a colecção
Joaquim Caetano
Director do MNAA
escreveu o director no resumo feito
para o Grupo dos Amigos. “As deÆ#
ciências do controlo de climatização
impedem a normal manutenção do
ambiente necessário para a conser-
vação das obras de arte, tanto na área
de exposições permanente, como
nas zonas de reserva, provocando,
em situações de maior fragilidade,
uma acentuada degradação que
impede o cumprimento da mais bási-
ca função do museu, isto é, a preser-
vação do património à sua guarda.”
Os problemas no sistema de ar con-
dicionado no Museu de Arte Antiga
arrastam-se há anos e são muitas
vezes tema de conversa com a tutela,
garante ao PÚBLICO o director, mas
agravaram-se no segundo semestre
de 2020, quando a última das quatro
centrais que o compõem deixou de
funcionar. “Neste Inverno já notámos
vários problemas numa série de pin-
turas de maior dimensão, porque a
humidade excessiva reÇecte-se de
imediato criando barrigas, enfola-
mentos. Quando chegar o Verão, o
risco para as pinturas sobre madeira
vai ser ainda maior porque, tendo
muito mais humidade do que deviam,
vão ser sujeitas a uma secagem brus-
ca, o que pode levar a que as juntas se
separem e a que as tábuas estalem,
causando danos irreversíveis.”
Estes “danos irreversíveis” a que se
refere poderão atingir, sublinha Joa-
quim Caetano, obras de um valor
incalculável, grande parte do melhor
que Portugal tem em arte do passado.
“Os materiais não são pacientes, rea-
gem de imediato às condições
ambientais, físicas, em que têm de
viver. Ao contrário das pessoas, não
podem escolher ser sensíveis a argu-
mentos que explicam o facto de a sua
segurança estar suspensa, em risco,
com a falta de recursos Ænanceiros
para substituir o ar condicionado”,
continua o director.
Um prado no telhado
Se o Verão for muito quente, o museu
terá de fechar as galerias de pintura
e escultura portuguesas (terceiro
piso) e as de pintura europeia (andar
nobre), transferindo todas as obras
para a caixa forte e algumas salas no
piso térreo, menos sujeito a varia-
ções de temperatura e humidade,
explica Caetano. E manter-se-á aber-
to, numa versão eventualmente mais
próxima de um armazém do que de
um museu? “A única coisa que posso
dizer é que a nossa primeira opção,
a nossa única opção, é defender a
colecção.”
Joaquim Caetano diz que o
director-geral do Património e a sua
equipa estão conscientes da gravi-
dade do problema e do carácter ina-
diável da sua resolução, mas que “é
muito difícil esperar sem nada fazer
quando parecem reunidas as condi-
ções para uma tempestade perfeita,
para que aconteça um acidente” que
afecte o acervo.
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
MIGUEL MANSO
Tríptico Maria Antónia Pinto de Matos,
Tentações de directora do Museu Nacional do Azu-
Santo Antão lejo (MNAz), recebeu há quatro sema-
(c.1500), de nas a visita da equipa do departamen-
Jheronymus to de obras da DGPC e já tem em
Bosch, curso trabalhos na parte interior das
no MNAA janelas do edifício, mas os problemas
no Convento da Madre de Deus não
Sala de são coisa que se resolva com interven-
D. Manuel I ções pontuais, assegura: “Aqui, quan-
no Museu do está a chover, os nossos visitantes
Nacional sabem, porque também chove nas
do Azulejo galerias. Em alguns espaços é preciso
até pôr alguidares e avisos de piso
escorregadio. A cobertura precisa de
obras urgentíssimas e não é no Inver-
no que se podem fazer.”
Na sua maioria, também as telhas
que não estão partidas perderam o
vidrado que as tornava impermeá-
veis. “Há plantas a crescer no telhado
como se fosse um prado. O que é que
isso quer dizer? Que há água a acu-
mular-se por todo o lado.” Também
Maria Antónia Pinto de Matos se
queixa de anos de falta de manuten-
ção e de reparações periódicas. “As
intenções da DGPC são boas, mas, se
DANIEL ROCHA
a obra não se Æzer já, não sei o que
vai acontecer a este museu. É preciso
que se perceba que, para além de
uma colecção única no mundo, o
Museu do Azulejo está instalado num
edifício classiÆcado com mais de 500
anos que é em si mesmo uma peça
notável, com espaços absolutamente
extraordinários.”
No Museu Nacional de Arte Con-
temporânea (Museu do Chiado), as
preocupações não têm que ver com
o ediÆcado, mas com equipamentos.
O ar condicionado avariado há anos
e a impossibilidade de controlar a
humidade relativa de forma eÆcaz
impede a directora, Emília Ferreira,
de expor desenho e fotograÆa em boa
parte das suas galerias (as do edifício
renovado pelo arquitecto Jean-Michel
Willmotte). “Nas exposições Disso-
nâncias e Dilema de Ser e Parecer, no
edifício Willmotte, tirámos da parede
tudo o que era em papel. A humidade
relativa nas salas atingiu níveis altíssi-
mos, assustadores, que chegaram a
daniÆcar obras”, diz Ferreira, referin-
do-se a duas fotograÆas do século XIX
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 27
Carta aberta
ao primeiro-ministro
Opinião
Raquel Henriques da Silva
Tendo-me sido pedido um
comentário à investigação
conduzida pelo jornal PÚBLICO
sobre o estado de catástrofe
anunciada de museus tutelados
pelo Ministério da Cultura, e tendo
recebido de um dos directores, o
de Arte Antiga, informação de que
a situação põe já verdadeiramente
em risco o espólio do museu, não
posso deixar de lhe escrever.
Sei, senhor primeiro-ministro,
que não faltam justiÆcações actuais
para este ameaçador estado de
coisas, imediatamente no que
respeita à manutenção das
instalações. Não podendo deixar de
lembrar que esta penúria vem de
antes da pandemia e que o Plano de
Recuperação e Resiliência ignora a
cultura como instância
fundamental de desenvolvimento
de um país europeu, tenho de lhe
recordar que as catástrofes avisam
quase sempre antes de
acontecerem. Os museus nacionais,
tutelados por um fragilíssimo
Ministério da Cultura, estão na
iminência de serem palco de
desastres graves. Tem de haver
meios orçamentais imediatos para
suprir os problemas de segurança e
manutenção que acima foram
enumerados, mas urge também
confrontar a inoperância do
ministério e dos seus serviços.
que, com a água, Æcaram manchadas
e estão agora a ser restauradas.
“O conÆnamento e o museu fecha-
do agravaram a situação. Comunicá-
mos os danos nas fotograÆas e a nossa
preocupação à DGPC, mas a falta de
dinheiro absoluta faz com que não
consiga dar resposta.”
Sistemas em falência
José Carlos Alvarez, director dos
museus nacionais do Traje e do Teatro
e da Dança, ainda não tem de lidar
com danos nas colecções, mas as tare-
fas de conservação do Palácio do Mon-
teiro-Mor, também em Lisboa, onde
estão instalados, e do parque adjacen-
te são desaÆos permanentes. “Um
edifício do século XVIII tem sempre
problemas estruturais complicados
que não são de fácil resolução, como
as inÆltrações nas caleiras. A falta de
manutenção e de pessoal acentua-os.”
Por vezes, essa falha na manutenção
estende-se ao parque, onde as raízes
das árvores provocam rupturas na
canalização que serve os edifícios.
Para mim, é um incómodo
mistério pensar que o senhor,
nascido em meio cultural
estimulante, continua a acumular
fracassos neste campo. Para si, a
história, a cultura e os artistas
usam-se na lapela, guardando na
gaveta estudos e diagnósticos
consistentes, por exemplo o recente
relatório Museus do Futuro,
amplamente participado pelas
equipas dos museus e que enuncia
linhas de actuação, desde as que
podem ser implementadas de
imediato às de médio prazo.
Conhece esse relatório, senhor
primeiro-ministro?
Deixo-lhe um conselho: vá visitar
alguns museus assim que eles
puderem reabrir, depois de 5 de
Abril, e dê a sua palavra, às
angustiadas cheÆas e equipas, que é
tempo de mudar e que a mudança
vai mesmo acontecer. Muitos
considerarão esta proposta
ingénua. Eu quero acreditar que
não. Que vai compreender, por
exemplo, que é demasiado grave
estar a proceder-se a uma operação
extraordinária de estudo dos Painéis
de Nuno Gonçalves, um tesouro
nacional, europeu e mundial, mas a
sala onde eles estão irá passar o
Verão sem ar condicionado ou
sistema de alarme a funcionar com
segurança. E que, no Museu
Nacional do Azulejo, no Museu
Nacional do Teatro, no Museu
Nacional de Arte Contemporânea,
estas e outras ameaças crescem
todos os dias.
Historiadora de Arte
Em resposta às perguntas do
PÚBLICO, a DGPC faz saber que estão
identiÆcadas em todos os seus
museus, palácios e monumentos “as
patologias e necessidades de inter-
venção a todos os níveis e especiali-
dades”, tendo os serviços conheci-
mento de que “muitos dos equipa-
mentos e sistemas, instalados há
décadas, se encontram presente-
mente em falência, tendo atingido o
Ænal do seu tempo de vida útil”. E
que em certos casos, esclarece ainda
a direcção via email, estes equipa-
mentos são tão antigos que já nem há
peças no mercado que permitam a
sua reparação. Sendo a sua substitui-
ção integral “por versões tecnologi-
camente mais avançadas e mais eÆ#
cientes do ponto de vista ambiental
e energético” a única solução possí-
vel, é preciso esperar, já que ela exige
“recursos técnicos e Ænanceiros não
disponíveis”. Bernardo Alabaça
aguarda agora com “grande expec-
tativa a linha dedicada à EÆciência
Energética no Plano de Recuperação
e Resiliência”.
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
28 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021
Desporto Fase de apuramento para o Campeonato do Mundo de 2022
Portugal teve
princípio e
quase teve fim
Selecção empatou na Sérvia depois de
ter chegado aos dois golos de vantagem.
Ronaldo ainda marcou, mas os árbitros
não viram a bola dentro da baliza
Crónica de jogo
Marco Vaza
Fernando Santos tem razão quando
diz que não há jogos fáceis ou difíceis.
O Azerbaijão parecia fácil e foi o que
se viu. A Sérvia parecia mais difícil e,
durante meio jogo, pareceu fácil, mas
foi uma sensação que não durou o
jogo todo. Portugal fez uma bela pri-
meira parte, mas foi-se abaixo na
segunda e acabou com um empate
(2-2) frente aos sérvios no segundo
jogo do Grupo A da zona europeia de
qualiÆcação para o Mundial 2022. Um
empate que podia ter sido uma vitória
mesmo no último minuto: Cristiano
Ronaldo marcou, mas, como não há
VAR nesta fase da competição e os
árbitros desta partida vêem mal ao
longe, não houve herói.
Era expectável que Fernando San-
tos mudasse muita coisa em relação
ao jogo com o Azerbaijão. Porque a
exibição, apesar da vitória, não tinha
convencido. E porque, com três jogos
em seis dias, não dá para ter sempre
o mesmo “onze” e esperar que as per-
nas estejam sempre frescas. E assim
foi. Houve caras novas na equipa em
todos os sectores (menos na baliza),
com Cédric e Fonte nos lugares de
Nuno Mendes e Domingos Duarte,
Danilo Pereira, Sérgio Oliveira e Bru-
no Fernandes em vez de Rúben
Neves, João Moutinho e Pedro Neto,
e Diogo Jota no lugar de André Silva.
A mesma organização e novas dinâ-
micas individuais, era o que Fernan-
do Santos queria nesta sua terceira
viagem a Belgrado, onde já tinha ven-
cido por duas vezes em contexto de
qualiÆcação para o Europeu. E o pla-
no de rotação pareceu funcionar na
perfeição. O que quer que passasse
pelo meio-campo morria na bem roti-
nada defesa portuguesa, algo que é
sempre uma das valências mais signi-
Æcativas desta selecção.
MIGUEL A. LOPES/EPA
Na frente, Portugal tinha gente para
expor as fraquezas defensivas dos
balcânicos. Aos 8’, esteve bem perto
do golo, numa jogada de entendimen-
to entre Jota e Bernardo que acabou
com Ronaldo em boa posição para
atirar, mas a bola saiu bastante por
cima. Sempre no controlo, os portu-
gueses acabariam por justiÆcar o golo
logo aos 11’. Num bom envolvimento
ofensivo, Bernardo ganhou espaço
para cruzar e a bola, impulsionada
pelo seu magníÆco pé esquerdo, foi
ter com a cabeça de Diogo Jota e,
depois, ao encontro das redes guar-
dadas por Dmitrovic.
Ao contrário do que tinha aconte-
cido com o Azerbaijão, em que o golo
tinha demorado muito a acontecer (e
foi marcado por um adversário na
própria baliza), Portugal chegava
cedo à vantagem e podia construir
sobre ela. E aos 36’, em mais um belo
momento de ataque português, Diogo
Jota fez o 0-2. Cédric cruzou do lado
direito e o avançado do Liverpool vol-
tou a ser certeiro com a cabeça — foi
o seu quinto golo ao 11.º jogo pela
selecção nacional. Dois golos de van-
tagem era uma margem que explicava
bem as diferenças entre Sérvia e Por-
tugal. E Dragan Stojkovic, selecciona-
dor sérvio há menos de um mês, per-
cebeu isso mesmo e, a partir do ban- Com dois golos de cabeça, dominou, tirou Cancelo do caminho Sérvia na direcção de Cristiano Ronal-
co, alterou as coisas para a segunda Diogo Jota foi o grande e deixou para Kostic, que fez o 2-2. E do, que tinha passado quase anónimo
parte, procurando equilíbrio na bata- protagonista da primeira parte pouco depois, aos 66’, o próprio pelo jogo. CR7 conseguiu antecipar-se
lha do meio-campo. Entraram Maksi- Radonjic esteve perto da reviravolta, à saída de Dmitrovic e direccionou a
movic e Radonjic e os efeitos senti- com um belo remate que obrigou bola para a baliza. Ela foi a rolar e
ram-se no imediato. Ainda dentro do
primeiro minuto do segundo tempo,
Mundial 2022 Anthony Lopes a boa defesa.
O jogo podia cair para qualquer
ultrapassou totalmente a linha de
golo antes de Mitrovic a afastar. Era
Radonjic fez o cruzamento pela direi- GRUPO A lado, mas ninguém parecia querer golo, mas ninguém viu e, sem VAR
ta e Mitrovic, embrulhado entre Dani- Jornada 2 Æcar com ele nos últimos 20 e tal para corrigir o lance, não houve 2-3
lo e José Fonte, fez o 1-2, de cabeça. Rep. Irlanda-Luxemburgo 0-1 minutos. O tempo de compensação, milagroso de Ronaldo. A última ima-
O golo empolgou a selecção sérvia Sérvia-Portugal 2-2 porém, ainda foi mais do que anima- gem que se viu do capitão português
e assustou Portugal. Os balcânicos do. Aos 90+1’, a Sérvia Æcou reduzida foi a sair do campo, a tirar a braçadei-
J V E D M-S P
cresceram, desequilibraram o jogo a a dez, com a expulsão por vermelho ra e a atirá-la para o chão. E por falar
seu favor e aos 60’ chegaram ao 1. Sérvia 2 1 1 0 5-4 4 directo de Milenkovic, devido a uma em jogos fáceis ou difíceis, o Luxem-
empate. Portugal perdeu uma bola no 2. Portugal 2 1 1 0 3-2 4 entrada perigosa sobre Danilo. burgo, tido como o saco de pancada
ataque e os sérvios galoparam até à 3. Luxemburgo 1 1 0 0 1-0 3 Depois, foi o que se viu. Nos últi- do grupo, venceu na República da
área contrária, onde ninguém estava 4. Azerbaijão 1 0 0 1 0-1 0 mos segundos, Nuno Mendes conse- Irlanda. Vai ser o próximo adversário
no sítio onde devia estar. Radonjic 5. Rep. Irlanda 2 0 0 2 2-4 0 guiu meter uma bola longa na área da da selecção portuguesa.
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 29

2 2 Reacções

“Estudámos bem a Sérvia, “Entrámos muito mal na “Uma primeira parte muito “Fizemos uma excelente
SÉRVIA PORTUGAL mas sofremos um golo logo segunda parte, a sofrer boa. Na segunda parte eles primeira parte. Eles
Estádio Rajko Mitic, em Belgrado
após o intervalo e o jogo logo um golo. Houve muita mudaram o sistema e não entraram bem na segunda,
ficou dividido. Voltámos a desatenção. Isso deu conseguimos contê-los. mas depois voltámos a
Sérvia Dmitrovic, Milenkovic a90+1’,
Stefan Mitrovic, Pavlovic, Lazovic controlar e depois fizemos motivação à Sérvia. Isto Esta bola no fim poderia controlar e ainda fizemos
(Maksimovic, 46’ a53’), Gudelj,
Milinkovic-Savic, Kostic (Ristic, 71’),
um golo que não valeu” não tem de abalar a equipa” ter-nos dado a vitória” um golo que foi invalidado”
Tadic (Djuricic, 81’), Vlahovic (Radonjic, Fernando Santos Danilo Diogo Jota Cédric Soares
46’), Aleksandar Mitrovic a84’ (Jovic,
87’). Treinador Dragan Stojkovic
Seleccionador Médio Avançado Lateral direito

Portugal Anthony Lopes, Cédric,

Rúben Dias, José Fonte a54’, João
Cancelo (Nuno Mendes, 72’), Danilo,
Sérgio Oliveira (Renato Sanches, 72’), Rússia “rebocada” por Dzyuba
Bruno Fernandes a53’ (Palhinha, 90’),
Bernardo Silva, Diogo Jota (João Félix,
85’), Cristiano Ronaldo a90+4’.
Treinador Fernando Santos
A ofensiva do “tanque” russo, um rebelde indomável
Árbitro Danny Makkelie (Países Baixos)
Golos Diogo Jota 11’ e 36’, A. Mitrovic tem uma média de 22 golos por épo- último, foi emprestado mais do que físicas e técnicas poderiam permitir,
Diogo Cardoso Oliveira
46’, Kostic 60’ ca. Por que motivo um jogador de uma vez por problemas disciplinares, mas está, aos 32 anos, a tempo de
Trinta e dois anos, muitos golos, recursos tão vastos e registo goleador envolveu-se em polémicas políticas ajudar. Já soma 15 golos pelo Zenit,
Positivo/Negativo polémicas diversas e várias insurrei- interessante teve uma carreira limi- anti-Ucrânia e, no final de 2020, foi nesta época, e colocou, com um
ções depois, Artem Dzyuba continua tada ao futebol russo? A história tem afastado da selecção depois de um “bis”, a selecção como grande favo-
Diogo Jota a fazer a diferença no futebol euro- vários episódios, mas é fácil de con- vídeo privado, de cariz sexual, se ter rita no grupo H. Depois do abandono
Entrou directamente para o peu. Ontem, pela Rússia, somou mais tar: Dzyuba é um jogador dado aos tornado viral. de Akinfeev e Ignashevich, a Rússia
“onze” e marcou dois belos dois golos. E a Rússia, por Dzyuba, insólitos. “Pegou-se” com treinado- Com uma carreira quase toda entre precisa que o seu líder encontre a
golos de cabeça, a mostrar somou mais três pontos, ao triunfar, res — Emery e Cherchesov que o Spartak e Zenit, Dzyuba tem tido um estabilidade comportamental que
que a paragem prolongada por 2-1, frente à Eslovénia, no grupo digam —, gozou com o bigode deste percurso abaixo do que as valências tantas vezes já faltou.
não lhe tirou qualidades. O H de qualificação para o Mundial
avançado do Liverpool 2022. Esta conjugação de resultados
parece cada vez mais um coloca a armada de Moscovo bem Classificações
indiscutível. encaminhada para estar no Qatar.
São seis pontos em dois jogos, num GRUPO E
Radonjic grupo no qual Croácia, Eslovénia, Jornada 2
O avançado do Hertha Eslováquia, Malta e Chipre se têm Bielorrússia-Estónia 4-2
Berlim entrou ao intervalo e anulado mutuamente. Rep. Checa-Bélgica 1-1
revolucionou o jogo da Em Sochi, houve adeptos russos J V E D M-S P
Sérvia, com duas belas nas bancadas. Não muitos, que a pan- 1. Rep. Checa 2 1 1 0 7-3 4
assistências para golo. demia ainda não permite, mas os 2. Bélgica 2 1 1 0 4-2 4
suficientes para fazerem barulho nos 3. Bielorrússia 1 1 0 0 4-2 3
Arbitragem momentos em que Dzyuba fez a dife- 4. País de Gales 1 0 0 1 1-3 0
O empate acabou por ser rença, aos 26’ e 35’. Foi Dzyuba o 5. Estónia 2 0 0 2 4-10 0
um resultado justo entre as homem da tarde, no sudoeste russo,
duas equipas, mas foi falso, cravando um bom momento numa GRUPO G
porque aquela bola de carreira à qual o jogador ficou a dever Jornada 2
Cristiano Ronaldo, no mais momentos destes. A história Países Baixos-Letónia 2-0
último minuto, entrou deste avançado tem contornos algo Noruega-Turquia 0-3
Montenegro-Gibraltar 4-1
mesmo na baliza. Se bizarros e a bizarria não é um concei-
houvesse VAR, este erro to do qual o próprio se procure afas- J V E D M-S P
grosseiro teria sido tar, dado o sem número de episódios 1. Turquia 2 2 0 0 7-2 6
facilmente corrigido. extrafutebol. 2. Montenegro 2 2 0 0 6-2 6
Com quase dois metros e mais de 3. Países Baixos 2 1 0 1 4-4 3
90 quilos, este avançado russo não é 4. Noruega 2 1 0 1 3-3 3
um “panzer”, que esse conceito fica 5. Letónia 2 0 0 2 1-4 0
para os alemães, mas é um autêntico 6. Gibraltar 2 0 0 2 1-7 0
“tanque” de combate russo aplicado
ao futebol. Dzyuba já tratou, porém, GRUPO H
de fintar quem o vê como um “pinhei- Jornada 2
ro” de área incapaz de produzir fute- Rússia-Eslovénia 2-1
bol. Zlatan Ibrahimovic será o exem- Croácia-Chipre 1-0
plo supremo de talento acima dos Eslováquia-Malta 2-2
190 centímetros, mas Dzyuba, com J V E D M-S P
as devidas distâncias, tem caracterís- 1. Rússia 2 2 0 0 5-2 6
ticas semelhantes. Oferece um pouco 2. Eslovénia 2 1 0 1 2-2 3
de tudo: qualidade técnica na recep- 3. Croácia 2 1 0 1 1-1 3
Milenkovic ção, no passe e até mesmo no drible, 4. Eslováquia 2 0 2 0 2-2 2
Batido por Jota nos dois capacidade de jogar em apoios fron- 5. Chipre 2 0 1 1 0-1 1
golos de Portugal, o central tais, voluntarismo para dar soluções 6. Malta 2 0 1 1 3-5 1
da Fiorentina ainda se fez em largura e, claro, domínio total no
expulsar por uma entrada choque físico e no jogo pelo ar.
imprudente sobre Danilo. Desde 2011, nas temporadas em
que teve apenas um clube, Dzyuba
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
30 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021
Desporto
Verstappen confirma “domínio”
Red Bull e conquista primeira pole
Augusto Bernardino
Piloto holandês começa
como acabou a temporada
anterior, batendo Lewis
Hamilton por 0,388s na
qualificação no Bahrein
Max Verstappen e a Red Bull conÆr-
maram, em Sakhir, o “domínio”
sobre os Mercedes de Lewis Hamil-
ton e Valtteri Bottas (segundo e ter-
ceiro), com o piloto holandês a
garantir a primeira pole position de
2021, no Grande Prémio do Bahrein.
Verstappen começa, assim, a tem-
porada de Fórmula 1 de 2021 como
terminou a anterior e conquistando
a quarta pole da carreira, com
1m28,997 segundos, tempo que
superou a melhor tentativa de
Hamilton, por 0,388 segundos, e de
Bottas, por 0,585s.
No momento da verdade, Charles
Leclerc saiu da sombra e colocou o
primeiro Ferrari na segunda linha
da grelha de partida, batendo o sur-
preendente AlphaTauri de Pierre
Gasly e os McLaren de Daniel Ric-
ciardo e Lando Norris.
Verstappen dominou todo o Æm-
de-semana, sendo o primeiro nos
treinos livres e nas qualiÆcações,
tendo Æcado, contudo, isolado na
luta com a Mercedes, já que Sergio
Portugal enfrenta uma Inglaterra em modo pânico
Marco Vaza
Depois de ter entrado a ganhar e com
uma exibição segura no Europeu da
categoria, a selecção portuguesa de
sub-21 quer fazer o mesmo logo à
noite (20h, RTP1), em Ljubljana, fren-
te à Inglaterra, na segunda jornada
do Grupo D. Uma vitória frente aos
britânicos pode mesmo qualiÆcar a
equipa de Rui Jorge para os quartos-
de-Ænal, dependendo do que tiver
acontecido no outro jogo do agrupa-
mento (Suíça-Croácia às 17h), mas
uma derrota não será uma tragédia
para os portugueses, ao contrário do
que acontecerá com Inglaterra, que
chegou a este torneio como uma das
favoritas, perdendo logo no jogo de
estreia (1-0), frente aos suíços.
A Inglaterra, diz Rui Jorge, não será
um adversário assim tão diferente da
Pérez não foi além da segunda qua-
liÆcação.
Concluídos os treinos livres, sem-
pre com Verstappen no comando
das operações, e já com a noite a
fazer cair drasticamente a tempera-
tura da pista, a qualiÆcação arran-
cou com a “eliminação” dos dois
Haas (Nikita Mazepin provocou
duas bandeiras amarelas, a abrir e
a fechar, com dois piões), do William
de Nichola LatiÆ, do Alpine de Este-
ban Ocon e do Aston Martin de
Sebastian Vettel, terceiro mais lento
do pelotão.
A surpresa era, então, Yuki Tsu-
noda (AlphaTauri), em segundo,
atrás de Verstappen e à frente de
Hamilton, com a Honda em grande
É uma óptima
sensação ter
obtido a pole
position. Ainda
não tinha tido um início
de época como este
Max Verstappen
Red Bull
Croácia e terá um plano de jogo
semelhante ao de Portugal. “São
duas equipas que primam pela posse
de bola para o controlo do jogo. Vai
ser uma batalha interessante, vere-
mos quem terá maior capacidade.
Vai ser interessante a esse nível, para
além de ambos terem excelentes
valores individuais”, analisa o selec-
cionador português, que fez 47 anos
um dia antes deste jogo.
Admitindo que poderá operar
algumas alterações em relação ao
jogo de estreia com os croatas, em
que a vitória só se concretizou na
segunda parte, com um golo de Fábio
Vieira, Rui Jorge acredita que a vitó-
ria sobre os britânicos Æcará ao alcan-
ce se os jovens portugueses seguirem
o plano. “Este jogo será igualmente
difícil. O primeiro jogo também foi
difícil para nós, mas Æzemos as coisas
destaque, embora Pierre Gasly
(AlphaTauri) e Sergio Pérez (Red
Bull) tenham acabado por ceder as
posições cimeiras a Charles Leclerc
(Ferrari) e Daniel Ricciardo (McLa-
ren), com Valtteri Bottas ainda num
longínquo 11.º lugar.
Mesmo no Æm, depois de ter esta-
do em risco de falhar a segunda ron-
da qualiÆcativa, Carlos Sainz Æcou
imobilizado na pista, com proble-
mas rapidamente superados. O pilo-
to espanhol fecharia mesmo a pas-
sagem à última e decisiva etapa de
qualiÆcação com o melhor tempo...
um milésimo à frente do outro Fer-
rari, de Leclerc — segundo, seguido
de Hamilton.
Max Verstappen testou então
o composto macio, mas
“abortou” a volta que lhe
daria um tempo no topo a
pensar no início de Grande
Prémio com pneus médios.
Já Sergio Pérez falhava a
entrada no grupo da
frente, caindo na segun-
da qualiÆcação junta-
mente com os Alfa
Romeo, o William
de George Russell e o
AlphaTauri de...
Tsunoda, afundado
pela estratégia dos
pneus.
Na discussão pelo
bem. O jogo tornar-se-á mais fácil se
Æzermos as coisas bem”, reforçou
Rui Jorge.
E estará a Inglaterra, recheada de
jogadores com rodagem de Premier
Rui Jorge: “Vai ser uma
batalha interessante”
GRELHA DE PARTIDA
GP do Bahrein
1.º M. Verstappen (Red Bull)
2.º L. Hamilton (Mercedes)
V. Bottas (Mercedes)
3.º
4.º Charles Leclerc (Ferrari)
5.º Pierre Gasly (AlphaTauri)
6.º D. Ricciardo (McLaren)
7.º Lando Norris (McLaren)
8.º Carlos Sainz Jr. (Ferrari)
9.º Fernando Alonso (Alpine)
10.º L. Stroll (Aston Martin)
11.º Sergio Perez (Red Bull)
12.º A. Giovinazzi (Alfa Romeo)
13.º Y. Tsunoda (AlphaTauri)
14.º K. Raikkonen (Alfa Romeo)
15.º George Russell (Williams)
16.º Esteban Ocon (Alpine)
17.º Nicholas Latifi (Williams)
18.º S. Vettel (Aston Martin)
19.º M. Schumacher (Haas)
20.º Nikita Mazepin (Haas)
assalto à pole position surgiam, sem
grande alarido, Fernando Alonso
(Alpine) e ainda Lance Stroll (Aston
Martin), em esforço. O espanhol
bicampeão mundial já nada mais
podia fazer perante os argumentos
da concorrência, a não ser superar
Stroll na luta pelo melhor lugar da
quinta linha da grelha, assumindo a
nona posição.
League, em modo pânico com a pers-
pectiva de Æcar de fora dos “quar-
tos”? O seu seleccionador, Aidy
Boothroyd, cujo contrato termina no
Ænal do torneio, está consciente do
perigo que os jovens ingleses correm
no confronto com Portugal, mas
também usa esta situação como uma
oportunidade para crescer.
“Tudo faz parte do nosso desen-
volvimento. Os jogadores sabem e
nós sabemos da importância deste
jogo. Ainda estamos aqui e não
vamos desistir”, garantiu Boothroyd,
que Æcou desiludido com a falta de
capacidade atacante mostrada pela
sua selecção no embate com a Suíça:
“Somos uma equipa que se orgulha
de ter um futebol criativo e marcar
golos. Mas parecíamos um instru-
mento rombo e não fomos iguais a
nós próprios”, lamentou.
Secretário
de Estado confia
na consciência
dos desportistas
Fiscalização no
desconfinamento das
modalidades de baixo e
médio risco competirá aos
1'28,997 próprios praticantes
1'29,385
O secretário de Estado da Juventude
1'29,586
1'29,678
e do Desporto, João Paulo Rebelo,
1'29,809
pediu a “Æscalização da consciência”
1'29,927 individual no processo de desconÆ#
1'29,974 namento da prática desportiva, que
1'30,215 arrancará no dia 5 de Abril.
1'30,249 O regresso aos treinos e às compe-
1'30,601 tições inicia-se com as modalidades
1'30,659 de baixo risco e estende-se até 3 de
1'30,708 Maio, envolvendo “cerca de 600 mil
1'31,203 atletas federados, 50% dos quais de
1'31,238 modalidades colectivas”, notou João
1'33,430 Paulo Rebelo.
1'31,724 O governante deseja uma “Æscali-
1'31,936 zação da própria consciência” dos
1'32,056 praticantes, que “têm de ser respon-
1'32,449
sáveis”, para que não se ponha “em
1'33,273
causa o trabalho que o país tem feito
no controlo desta pandemia”.
Na Batalha, onde inaugurou um
complexo de padel e assistiu ao lan-
çamento do Campeonato Nacional de
trail, João Paulo Rebelo relembrou
que, numa primeira fase, apenas será
permitida a prática de desportos de
baixo risco. “Só a partir do dia 19
podem avançar as modalidades de
médio risco”, insistiu. Evoluindo
favoravelmente a situação epidemio-
lógica, “a partir de 3 de Maio já será
possível retomar toda a actividade
desportiva”.
O secretário de Estado acredita,
aliás, que este processo de desconÆ#
namento será bem-sucedido. “Os
amantes do desporto sabem que há
regras e que vão, seguramente, cum-
pri-las”, observou.
Quanto ao regresso do público aos
recintos desportivos, e já depois de o
Governo ter feito saber que não vai
acontecer pelo menos até meados de
Maio, João Paulo Rebelo remete a
questão para as autoridades de saúde,
em concreto a DGS. “Desejo que pos-
sa acontecer o mais rapidamente
possível”, acrescenta.
O secretário de Estado assistiu ain-
da a parte da reunião da direcção da
Associação Portuguesa de Árbitros de
Futebol, ouvindo do presidente da
Mesa da Assembleia Geral, Artur Soa-
res Dias, o pedido para que o sector
não seja esquecido na comercializa-
ção centralizada dos direitos televisi-
vos. “Os árbitros são agentes indis-
pensáveis”, vincou lembrando que
cabe à Liga e à Federação o entendi-
mento quanto ao “modelo mais justo
e equitativo”. Lusa
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
Breves
Futsal
Sporting e Benfica
discutem final
da Taça da Liga
O Sporting e o Benfica vão
decidir, esta tarde (18h, Canal
11), no Pavilhão Multiusos de
Sines, quem vai levar para
casa o troféu da Taça da Liga
de futsal. Ontem, nas
meias-finais da prova, os
“leões” derrotaram o Fundão
por 4-2, num jogo com um
autogolo para cada lado. Mário
Freitas (própria baliza), Rocha,
Tomás Paçó e Erick Mendonça
marcaram para o Sporting,
enquanto Paçó (própria baliza)
e Mário Freitas fizeram os
golos dos Fundão. Na outra
meia-final, o Benfica eliminou
o Modicus com um triunfo por
2-0, construído com golos de
Robinho e de Fábio Cecílio. Os
“encarnados” vão medir forças
com o Sporting pela terceira
vez nesta época (3-3 e 1-1).
Ciclismo
Peter Sagan foi o mais
forte na 6.ª etapa
da Volta à Catalunha
O eslovaco Peter Sagan
(Bora-hansgrohe) venceu ao
sprint a 6.ª etapa da Volta à
Catalunha, que manteve o
britânico Adam Yates (INEOS)
na liderança. A tirada, de 194
quilómetros, entre Tarragona
e Mataró, foi ganha em
4h23m19s, com Sagan a
impor-se ao sul-africano Daryl
Impey (Israel Star-up Nation) e
ao colombiano Juan Sebastián
Molano (UAE Emirates),
segundo e terceiro. O
português João Almeida
(Deceuninc-QuickStep) foi
oitavo colocado, com o
mesmo tempo do vencedor, e
mantém-se na sétima posição
da geral, a 1m07s de Yates.
Hoje, a 100.ª Volta à Catalunha
termina com um trajeto de 133
quilómetros, com início e fim
em Barcelona, destacando-se
a habitual subida a Montjuic.
Oliveira não conseguiu um lugar na Q2, para poder discutir a parte de cima da grelha
Miguel Oliveira parte do 15.º lugar
na estreia na temporada de MotoGP
Diogo Cardoso Oliveira
O português voltou a não
ser competitivo no Qatar e
vai arrancar para a corrida
de hoje no final da quinta
linha da grelha de partida
Tempos modestos nas três primeiras
sessões de treinos livres, uma ligeira
melhoria ontem, na quarta sessão, e
novo registo insuÆciente (15.º lugar)
na qualiÆcação para o Grande Pré-
mio do Qatar. Foi assim o início do
Æm-de-semana de estreia de Miguel
Oliveira (KTM) na temporada 2021 de
MotoGP, com o piloto português a
partir para a corrida de hoje (18h,
SPTV) no Ænal da quinta linha da gre-
lha, ao lado das Ducati de Enea Bas-
tianini e de Jorge Martin.
A pole position Æcou nas mãos do
piloto italiano “Pecco” Bagnaia
(Ducati), que vai partir com o francês
Fabio Quartararo (Yamaha) e o espa-
nhol Maverick Viñales (Yamaha) logo
atrás. Nota ainda para o modesto
décimo lugar de Joan Mir, campeão
do mundo em 2020.
Para Bagnaia, de 24 anos, esta foi
a primeira pole da carreira do 16.º
classiÆcado do Mundial 2020, con-
seguida com um novo recorde da
pista do Qatar (1m52,772s), batendo
o registo de Marc Márquez, dono do
anterior registo mais rápido.
Voltando a Miguel Oliveira, num
circuito tradicionalmente difícil para
a KTM na categoria-rainha — e o pró-
Público • Domingo, 28 de Março de 2021 • 31
DR
prio piloto deu conta das diÆculda- res pilotos deste início de Æm-de-se-
des que tem tido no equilíbrio da mana, mas Oliveira falhou o lugar na
moto e na eÆcácia em recta —, o por- derradeira sessão, não podendo dis-
tuguês foi obrigado a competir na Q1, putar um dos 12 primeiros lugares da
depois dos tempos modestos nas grelha de partida.
primeiras sessões de treinos. Na Q1, o número 88 da KTM come-
Os dois melhores pilotos da Q1 çou por fazer marcas desinteressan-
teriam lugar na Q2, frente aos melho- tes, rodando a quase meio segundo
do campeão do mundo, Joan Mir.
Colocado um pneu novo na traseira,
GRELHA DE PARTIDA a reentrada para a pista, a cerca de
cinco minutos do Ænal da sessão,
GP do Qatar
trouxe uma melhoria no tempo, mas
insuÆciente — o português melhorou
1.ª linha a prestação pessoal (1m53,958s), mas
Pecco Bagnaia (Ducati) 1m52,772s também os rivais rodaram melhor
Fabio Quartararo (Yamaha) 1m53,038s do que tinham feito até então. Ape-
Maverick Viñales (Yamaha) 1m53,088s sar do mau registo global, Oliveira
2.ª linha
Valentino Rossi (Yamaha) 1m53,114s
foi, na luta interna das KTM, o mais
Jack Miller (Ducati) 1m53,215s bem colocado na grelha.
Johann Zarco (Ducati) 1m53,286s Na Q2, para deÆnir a vantagem
3.ª linha suprema no arranque para o GP do
Franco Morbidelli (Yamaha) 1m53,313s Qatar, o mais forte foi Bagnaia, em
Aleix Espargaró (Aprilia) 1m53,315s
Alex Rins (Suzuki) 1m53,490s estreia em poles, fazendo o melhor
4ª linha uso possível das sempre eÆcazes
Joan Mir (Suzuki) 1m53,682s Ducati em circuitos rápidos, como é
Takaaki Kakagami (Honda) 1m53,721s o caso deste, no médio Oriente.
Pol Espargaró (Honda) 1m53,930s
Para além do mau desempenho
5ª linha
Enea Bastianini (Ducati) 1m53,733s das quatro KTM, todas fora da Q2,
Jorge Martin (Ducati) 1m53,840s destaque ainda para a presença das
Miguel Oliveira (KTM) 1m53,915s quatro Yamaha nas primeiras linhas
6ª linha da grelha de partida: Quartararo
Alex Márquez (Honda) 1m53,958s
Stefan Bradl (Honda) 1m53,995s
(segundo), Viñales (terceiro), Rossi
Luca Marini (Ducati) 1m54,122s (quarto) e Morbidelli (sétimo).
7ª linha Il Dottore mostrou-se particular-
Brad Binder (KTM) 1m54,240s mente feliz no Ænal da sessão de qua-
Danilo Petrucci (KTM) 1m54,443s liÆcação, com um quarto lugar mui-
Iker Lecuona (KTM) 1m54,627s
to positivo para um piloto lendário,
8ª linha
Lorenzo Savadori (Aprilia) 1m55,183s mas despromovido nesta temporada
à equipa satélite da Yamaha.
Desporto
Portugal deu
a volta à Espanha
e continua na luta
pelo Mundial
David Andrade
Aos 16 minutos, o duelo ibérico pare-
cia um pesadelo para a selecção por-
tuguesa de râguebi, mas o terceiro
jogo de Portugal no Rugby Europe
Championship (REC) 2021, competi-
ção que serve de apuramento para o
Mundial 2023, terminou com uma
importante e saborosa vitória sobre
a Espanha, no Jamor: 43-28.
Derrotados nas duas primeiras jor-
nadas, Portugal e Espanha Æcariam,
em caso de novo desaire, numa posi-
ção de risco no REC 2021 (o último
classiÆcado é despromovido em 2022
ao Rugby Europe Trophy) e, apesar
da exibição pouco convincente con-
tra os romenos, o seleccionador por-
tuguês, Patrice Lagisquet, fez apenas
três alterações no “XV” nacional.
E o início da partida fez prever mais
um confronto perdido no duelo entre
“packs”. Tal como tinham feito a
Geórgia e a Roménia, a Espanha
explorou na perfeição nos primeiros
16 minutos as debilidades de Portugal
em travar os “mauls” dos rivais para
marcar dois ensaios e colocar dois
jogadores lusos fora do relvado por
dez minutos com cartões amarelos.
A perder por 0-14 e em inferiorida-
de numérica, a equipa portuguesa
parecia encaminhar-se para uma ine-
vitável derrota, mas, num ápice, o
jogo mudou. Assumindo o domínio
territorial, Portugal começou a fugir
ao confronto entre avançados e, colo-
cando a bola nas linhas-atrasadas, foi
conquistando terreno.
Assim, conÆrmando o ascendente
português, Rafael Simões fez o pri-
meiro ensaio dos “lobos” aos 28’
(7-14), a Espanha respondeu, repondo
a vantagem, mas Nuno Sousa Guede-
sainda ofereceu a Jerónimo o ensaio
e, na “bola de jogo” da primeira par-
te, Portugal reentrava na discussão
pela vitória: 14-21.
O arranque dos últimos 40 minutos
trouxe mais boas notícias para os
“lobos”: aos 46’, um grande passe de
Portela ao pé terminou em ensaio de
Rodrigo Marta; aos 49’, o ponta espa-
nhol Fabien Perrin placou Portela de
forma perigosa no ar e foi expulso.
Com empate no marcador (21-21) e
vantagem numérica até ao Ænal, Por-
tugal manteve a cabeça fria. Aos 54’,
Samuel Marques assistiu Storti (28-21),
antes de cobrar, ele próprio, uma
penalidade (31-21) e fazer, seis minu-
tos depois, o quinto ensaio português
(38-21). No último minuto, o pilar
Francisco Fernandes acabou com
uma ligeira recuperação espanhola e
Æxou o 43-28 Ænal.
 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público.
Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A.
32 • Público • Domingo, 28 de Março de 2021

O seu jornal
não acaba aqui. LIGUE-SE A UM NOVO OLHAR
Continue para Programas, debates, entrevistas no novo espaço vídeo do PÚBLICO
publico.pt
publico.pt/aovivo

Ever Given mexeu-se mas continua encalhado no Canal do Suez

Victor Ferreira
Operações no Canal
do Suez permitiram mexer
o leme e a popa, mas
o navio continua encalhado
e a passagem bloqueada
Mexeu-se, mas pouco. E não foi o
suÆciente. As operações para soltar
o navio Ever Given, encalhado desde
terça-feira, recomeçaram às 14h30 de
ontem (menos duas horas em Portu-
gal continental) mas foram suspensas
por volta das 21h locais, sem que
tivessem libertado o cargueiro, que
tem 18.700 contentores a bordo. Os
trabalhos recomeçam hoje de manhã,
para tentar aproveitar a próxima
maré alta.
Até ao momento, foram tirados
junto da proa cerca de 20 mil metros
cúbicos de areia (cerca de 7000 tone-
ladas ou o volume de oito piscinas
olímpicas), além de 9000 toneladas
de águas de lastro dos tanques do
navio. Mas, nem assim, foi possível
Given, para aliviar o peso. Uma tarefa
já de si difícil, ainda mais complicada
pelas condições meteorológicas e as
correntes fortes.
O presidente da entidade gestora
do canal, Osama Rabie, revelou que
“a popa começou por mover-se e isso
foi um sinal positivo até às 21h”. “Mas
depois a maré caiu signiÆcativamente
e tivemos de parar [as operações].
Esperávamos que a qualquer momen-
to o navio pudesse deslizar e afastar-
se do ponto onde encalhou.”
A proa do porta-contentores, de 219
mil toneladas e com um comprimen-
to de 400 metros (equivalente a qua-
tro campos de futebol), “está mesmo
presa na argila arenosa, mas a popa
não, o que é positivo”, descreve Peter
Berdowski, presidente da empresa
holandesa que foi chamada pelo Egip-
to para ajudar nas operações.
Mas se o problema persistir, acres-
centa Berdowski, vai ser necessário
tirar 600 contentores do Ever Given.
A grua para isso deverá chegar ainda
neste Æm-de-semana àquele local,
mas alguns especialistas levantam
dade combinada de 400 toneladas.
Esperamos que a sua conjugação com
as dragagens na proa e a subida da
maré possa permitir libertar o navio
no início da próxima semana.”
EUA oferecem ajuda
Ao Æm de cinco dias de bloqueio de
KHALED ELFIQI/EPA
O “engarrafamento” continua a
engrossar enquanto não se reabre à
navegação os 193,3 quilómetros da
ligação entre o mar Vermelho e o mar
Mediterrâneo. Algumas companhias
já reorientaram alguns dos cargueiros
que continuavam à espera.
A Maersk, líder mundial do sector,
tinha 22 navios atrasados e informou
que dois deles já mudaram de rota e
rumaram a sul, para contornarem o
cabo da Boa Esperança.
Uma opção que torna a viagem
mais longa e demorada, acrescentan-
do entre oito e 12 dias. A procura de
rotas alternativas já começou, mas
encarece signiÆcativamente os custos
de transporte, numa altura em que o
mundo já estava a braços com uma
subida de preços devido à escassez
Se o problema persistir, vai ser de contentores face ao crescimento
necessário tirar 600 da procura durante a pandemia.
contentores do Ever Given. Com a navegação no Suez com-
Cargueiro tem 18.700 pletamente suspensa, o custo de
contentores a bordo transporte quase duplicou nos últi-
mos dias. As taxas para a indústria
petrolífera subiram 70% até sexta-
feira, mostrando bem como um

desencalhar o navio da empresa japo-
nesa Shoei Kisen Kaisha, que Æcou
preso na parte sul da travessia entre
o mar Vermelho e o Mediterrâneo.
Há 321 cargueiros parados devido
à suspensão total da navegação no
canal. As esperanças estão agora no
reforço de rebocadores. Se nem assim
for possível mover o barco, vai ser
necessário retirar contentores do Ever
reservas contra essa operação, avisan-
do que é muito complexa e lenta.
“Se não conseguirmos libertá-lo na
próxima semana, teremos de remover
uns 600 contentores da proa para
reduzir o peso. Isso atrasar-nos-á uns
dias, pelo menos, porque saber onde
vamos colocar esses contentores é
outro puzzle”, frisou.
“Os rebocadores terão uma capaci-
uma importante via de tráfego naval,
por onde passam 12% a 15% do comér-
cio mundial, o Presidente dos EUA
ofereceu ajuda.
“Temos equipamento e capacida-
des que a maioria dos países não tem.
Estamos a analisar que ajuda pode-
mos dar”, disse Joe Biden, na sexta-
feira, quando se encontrava no estado
do Delaware.
321
Há 321 cargueiros parados
devido à suspensão total da
navegação no Canal do Suez,
travessia entre o mar Vermelho
e o Mediterrâneo
navio encalhado devido a uma tem-
pestade de areia e ventos fortes
pode afectar toda a cadeia de valor
e acabar por se fazer sentir no bolso
dos próprios consumidores: o petró-
leo do mar do Norte (referência para
a economia portuguesa) manteve
durante toda a semana a valorização
de cerca de 6% que registou nas 24
horas após o incidente.

PÚBLICO, Comunicação Social, SA. Todos os conteúdos do jornal estão

protegidos por Direitos de Autor ao abrigo da legislação portuguesa, da
União Europeia e dos Tratados Internacionais, não podendo ser utilizados
fora das condições de uso livre permitidas por lei sem o consentimento
expresso e escrito da PÚBLICO, Comunicação Social, S.A.

publico.pt/aovivo
Conversas de
última página
Com João Miguel Tavares e Rui Tavares A última página do PÚBLICO
Todas as segundas-feiras, às 14h num frente-a-frente.
Envie as suas perguntas
EM DIRECTO
para aovivo@publico.pt