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NACION AL
ano 16 • número 61 • abril – junho 2023
www.interessenacional.com.br e www.interessenacional.com
Populismo em Marcha?
Anthony W. Pereira
Editora
Marili Ribeiro
Editor Responsável
Rubens Antonio Barbosa
conselho editorial
Direitos reservados à
associação interesse nacional
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Apresentação
ARTIGOS
1 A
nossa extrema-direita – e as deles
O sociólogo Demétrio Magnoli lembra em seu artigo que o triunfo eleitoral de
Donald Trump ativou alarmes globais ao sinalizar que “as democracias
ocidentais enfrentavam o desafio da ascensão do populismo de direita”. A
vitória de Jair Bolsonaro significou a inserção do Brasil nessa tendência.
Embora o bolsonarismo articule-se politicamente com correntes internacionais
da extrema-direita, suas raízes ideológicas não são similares às correntes
internacionais: “O bolsonarismo não é mera expressão nacional das ideias que
movem o populismo de direita nos EUA ou na Europa”, pondera.
3 A
falta que faz uma tradição liberal-democrática
O processo de impeachment de Dilma Rousseff deixou marcas profundas para
o filósofo Fernando L. Schüler. O fato de o PT ser bem estruturado tornou
previsível a reação que veio: “Acertou a revista The Economist, que à época
4 P
opulismo em Marcha?
Traçar cenário do populismo numa perspectiva histórica e global foi o
caminho escolhido pelo articulista Anthony W. Pereira para contextualizar o
momento. “Podemos abordar o populismo como uma forma de política de
massas caracterizada por desempenhos políticos transgressivos que se opõem
às "elites" em nome de um "povo autêntico” e dependem, pelo menos em parte,
da comunicação não mediada entre um líder e seguidores”, diz ele. Mesmo que
essas características sejam comuns, há outras formas de política de massas,
como movimentos e partidos não populistas. Dada a amplitude da definição, o
conteúdo ideológico e o impacto político do populismo podem variar.
5 U
m novo papel para as forças armadas
O economista Edmar Bacha e o cientista político Simon Schwartzman
avaliam a militarização do governo estimulada por Jair Bolsonaro. Esse
fato, mais a tentativa de envolver as forças armadas em um golpe militar e a
passividade, senão conivência, de muitos de seus setores com estes
movimentos, trouxeram para a ordem do dia a necessidade de se discutir o
papel das forças armadas na sociedade brasileira: “Não se trata somente da
questão mais imediata da ameaça que houve à democracia, mas dos temas
mais amplos, de médio e longo prazos, do relacionamento entre o setor
militar e a sociedade civil e do papel das forças armadas brasileiras no
mundo atual para um país como o Brasil”.
6 R
elações entre o Estado e o Soldado: um desafio para o País
O general Otávio do Rêgo Barros cita em seu artigo o pensador italiano
Norberto Bobbio em suas ponderações sobre o futuro da democracia.
Depreende dali que “somente o respeito ao ser difuso conhecido como
democracia fará a sociedade avançar na autoproteção e consequente
sobrevivência da tribo da qual cada indivíduo livre é parte”. Para ele, a
estrutura política e social do Brasil foi abalada por um presumido
7 D
esafios da política externa do terceiro mandato de Lula
Ao mesmo tempo em que vê o presidente Lula diante do desafio de recolocar o
Brasil no cenário internacional, após quatro anos de isolamento e de perda de
liderança em temas essenciais para a agenda interna – de mudanças climáticas à
saúde global, passando por direitos humanos –, o cientista político Guilherme
Casarões, considera potenciais obstáculos: “Penso que a revitalização da nossa
política externa pode ser um dos pontos de partida para que o novo governo
cumpra sua promessa de reconciliação nacional. Afinal, não faltam exemplos
mostrando que é possível que um presidente construa legitimidade política de
fora para dentro – usando a diplomacia, em suas múltiplas manifestações, para
viabilizar a consecução de seu programa governamental.”
8 O
bastidor da crise das urnas eletrônicasl
As urnas eletrônicas foram objeto de grande controvérsia, antes das eleições de
outubro de 2022, a partir de contestação pelo presidente Jair Bolsonaro. O
diplomata Rubens Barbosa faz aqui um registro de seu envolvimento pessoal a
chamado do presidente do Tribunal Superior Eleitoral, em uma crise que, pela
sua sensibilidade, não foi conhecida à época. Havia a possibilidade da falta de
urnas em função da falta de semicondutores para a produção dos equipamentos
nos prazos requeridos. A ação do TSE foi decisiva para que o problema fosse
contornado. Barbosa fez gestões junto aos fornecedores, contribuindo para que a
crise fosse superada e evitado potencial problema político diante do risco da não
realização das eleições na data prevista.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . sumário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
Apresentação
Há quem considere que o papel do partido político deveria ser o balizador das
ações públicas e o elo entre o Estado e a sociedade. Porém, no caso brasileiro,
está bem descaracterizado. A abundância de partidos e a incapacidade de atuar no
processo legislativo com personalidade, para que a sociedade se oriente conforme
valores e políticas públicas em prol da maioria, inexistem. Eles funcionam como
um balcão de interesses privados incapazes de impedir o retalhamento do Estado
em favor de causas corporativistas.
Outro ponto relevante no momento é o papel das forças armadas, após a militarização
de funções públicas e civis, estimulada pelo governo anterior e que trouxe para a
ordem do dia a necessidade de se discutir as relações entre Estado e atuação do
setor militar. Como menciona um dos autores das análises, “somente o respeito ao
ser difuso conhecido como democracia fará a sociedade avançar na autoproteção e
consequente sobrevivência da tribo da qual cada indivíduo livre é parte”.
Boa leitura!
os editores
■D
emétrio Magnoli é sociólogo, conselheiro do Centro Brasileiro
de Relações Internacionais, colunista dos jornais Folha de S.Paulo e
O Globo, comentarista internacional na GloboNews
■ Deus e Pátria
Deus, a bandeira e o hino são chaves narrativas compartilhas por Trump, nos EUA,
Vladimir Putin, na Rússia, Recep Erdogan, na Turquia, Viktor Orbán, na Hungria,
e a coalizão Meloni/Salvini, na Itália. Nesse plano mais genérico, Bolsonaro
participa do movimento geral da direita populista.
2. https://bit.ly/3xMH3Hk
3. https://bit.ly/3ZdmdMZ
4. https://bit.ly/3ZcVbFD
■ Aliança profana
Nem todos curvaram-se aos novos tempos. Uma corrente de economistas liberais,
aferrada ao dogma da absoluta liberdade de mercado, enxergou na democracia liberal
um malévolo disfarce do socialismo. Dessa crença nasceu uma atração por regimes
autoritários dispostos a conduzir programas de radical liberalização econômica.
A atual direita republicana nos EUA, ainda liderada por Trump, deita raízes no
nativismo, na xenofobia e no isolacionismo. Contudo, no plano econômico, prega o
protecionismo comercial e aponta a globalização (às vezes, nas formas da China e
do México) como responsável pelas agruras que afligem o “americano esquecido”.
■B
olívar Lamounier é doutor em Ciência Política pela
Universidade da Califórnia. Membro da Comissão Afonso
Arinos da Presidência da República para elaboração de projeto
constitucional. Assessor acadêmico do Clube de Madrid, entidade
internacional de apoio à democracia
Penso que a virtude está no meio. Muito vai depender do desempenho de Lula em
seus primeiros seis ou oito meses em duas áreas. Na economia, evidentemente. Na
desradicalização política que temos vivido desde os tempos de Dilma Rousseff,
agravada pela emergência do bolsonarismo na eleição presidencial de 2018.
É preciso dar a César o que é de César, quero dizer, dar a cada um a quota de
desatino que impôs ao país. Sobre Bolsonaro, não há muito a dizer, basta lembrar
que ele sequer reconheceu a vitória eleitoral de Lula. Foi por uma margem estreita?
Foi, e daí? Foi para isso que inventaram o segundo turno. Se o primeiro turno não
produz uma maioria política folgada, o segundo o fará pelo caminho da aritmética.
Cinquenta por cento mais um dos votos válidos é a maioria. Do ponto de vista
aritmético, vale o que está escrito, um voto é suficiente para definir quem venceu.
Do ponto de vista econômico e nas demais áreas substantivas, a legitimidade
depende das opções e do desempenho. As simple as that.
Quais são, então, as alternativas? Ora, é lógico que é preciso crescer, e crescimento se
faz com investimento. Conhecemos bem a mania brasileira de que crescimento tem que
ser com investimento estatal: o chamado nacional-estatismo. Dá-se que não há recursos
públicos disponíveis para investimento. Segunda alternativa: aumentar o intercâmbio
com o exterior e trazer capitais para o setor privado, mas é uma mágica que Lula pareça
disposto a tirar do bolso do colete. “Privado”, para ele, continua sendo nome feio.
A terceira alternativa, então, é não crescer, ou seja, permanecer deitado eternamente
em berço esplêndido ou, se preferem, permanecer aprisionado na armadilha do baixo
crescimento e pastar uns 20 ou mais para dobrar nossa pífia renda anual per capita.
Acadêmico irremissível, não consigo martelar o teclado sem evocar alguns dos
fatores que nos jogaram nesse buraco. Apontem um país que tenha incluído a
classe trabalhadora no processo político sem que ela criasse e sofresse solavancos
consideráveis. A Inglaterra? Não por acaso, o ícone mundial desse processo
surgiu bem aqui perto, banhado pelo rio da Prata: foi o comandante-general Juan
Domingo Perón. Ele conseguiu integrar a classe operária, mas destruiu o país, e
ela é que se tornou a malta dirigente, impedindo-o de crescer e se democratizar.
Segundo, no plano da ideologia, somos um país incorrigível. Não tememos ser tragados
nas águas fétidas do proverbial “poço”, contanto que possamos dar murros no peito e
berrar que o “petróleo é nosso”. Acreditamos piamente que bom governo é “governo
forte”, entendendo por tal um sujeito com certa relação carnal com ditaduras, ou seja,
aquele que aceita qualquer coisa, menos uma América Latina institucionalmente
civilizada. Temos uma Constituição boa para ser lida em voz alta, mas sua qualidade
literária não a isenta de sandices sem conta (como o “trânsito em julgado” após
quatro instâncias). Nem em voz alta e nem à boca pequena, haja vista que nem certos
parlamentares enrubesceram com o invento do “orçamento secreto”. Neste ponto, o
Meu veio acadêmico leva-me a uma outra digressão, que o leitor com certeza
achará estapafúrdia. O fato é que não enxergamos o Brasil. Insistimos em tentar
compreendê-lo pelos olhos de uma geração brilhante – a primeira que nos
proporcionou um diagnóstico consistente – mas manifestamente desatualizada.
Refiro-me a gigantes como Sérgio Buarque de Holanda, Gilberto Freyre e
Raymundo Faoro. Outros houve, dei minori, como Alberto Torres e Oliveira
Vianna, que também exerceram (creio que exercem até hoje) uma enorme
influência em nossa oftalmologia coletiva.
Todos eles, grandes e pequenos, aferraram-se à tese (não de todo fora da curva,
para as condições da época) que eram mínimas as nossas chances de um dia
construir um Estado digno do nome e promover o crescimento da economia.
Mesmo o maior deles, com admirável cuidado, sem nunca descuidar dos
indispensáveis matizes, o próprio Sérgio Buarque nunca se desvestiu da crença de
que a raiz última de nossas mazelas eram os “grilhões” do passado – vale dizer,
a colonização portuguesa, escravista e monocultora. Partindo dessa premissa,
pelo menos uma dúzia de colegas letrados respaldou-o, afirmando que o perverso
elemento que nos brecava era a “família patriarcal”, ou seja, a família extensa,
autoritária, assentada nos latifúndios, dispersa pelos cafundós, tudo absorvendo
em seus domínios. Sobre tal base, como edificar um Estado digno do nome?
“Não é justo afiançar-se, sem apelo, nossa incompatibilidade absoluta com os
ideais democráticos [...]. (Mas) a ideia de uma espécie de entidade imaterial
e impessoal, pairando sobre os indivíduos e presidindo os seus destinos, é
dificilmente inteligível para os povos da América Latina” (Raízes do Brasil, 6ª
edição, pág. 138). Imbuído da sociologia romântica, notadamente da alemã, Sérgio
Buarque situou-se vigorosamente como o contraposto do calvinismo dissecado por
Max Weber, mas o fez postulando uma ordem normativa (cultural) praticamente
imutável, cuja dissolução teria que ser obra de séculos1.
1. Cobrar de Sérgio Buarque um entendimento mais exato do Estado como uma “ordem impessoal pairando
sobre os indivíduos” não é razoável, pois só a literatura recente nos propicia elementos seguros sobre a formação
do Estado desde suas raízes medievais. Tal processo remonta, na verdade, à crise generalizada do século XII,
posterior ao feudalismo sensu strictu, e se estende ao século XVII, quando o Estado renascentista e em seguida
o absolutista se apresentam plenamente configurados. Veja a respeito: SKINNER, Quentin. The Foundations
of Modern Political Thought, Vol. 1 (Cambridge, UK: Cambridge University Press1978); BISSON N, Thomas
-The Crisis of the Twelfth Century – Power, Lordship, and the Origins of European Government. Princeton, NJ:
Princeton University Press, 2009; STRAYER, Joseph R. – On the Medieval Origins of the Modern State (Prin-
ceton, NJ: Princeton University Press, 1970); REYNOLDS, Susan – Fiefs and Vassals – The Medieval Evidence
Reinterpreted. Oxford, UK: Oxford University Press, 1994;
Aqui encontramos outra vez o culturalismo estático do qual nem Sérgio Buarque
conseguiu se livrar por completo. Contrariamente ao que sustentaria Marx, a
“superestrutura” subjugava a “infraestrutura”. Viesse a industrialização, viesse a
urbanização, “a ideia de uma entidade material e impessoal haveria de pairar para
sempre sobre os indivíduos, moldando seus destinos”. E, no entanto, a máquina se
moveu. Em 1930, somente 5% da população total comparecia às urnas nas eleições
presidenciais; em 1945, 16%; em 2022, 72%, como em qualquer democracia
avançada, equivalendo a 156 milhões de almas.
■F
ernando L. Schüler é filósofo, articulista e consultor de empresas
e organizações civis nas áreas de Cultura e Ciências Políticas. Foi
secretário de Estado da Justiça e do Desenvolvimento Social do Rio
Grande do Sul e é professor do Insper
Em algum momento, isto tudo mudou. Um primeiro sinal talvez tenha vindo
das grandes manifestações de rua de 2013, que pareciam seguir a tendência dos
flash mob democráticos, tão bem diagnosticados por Manuel Castells, como
um novo ator nas democracias, na era digital. Algo que por vezes chamei de o
“quinto poder”, feito da multidão que se reúne sem uma liderança claramente
identificada, de modo efêmero e sem uma agenda objetiva, mas com um enorme
poder de questionar o sistema de poder como um todo. No Chile, seis anos depois,
manifestações deste tipo tiveram um impacto muito mais profundo. Além da
violência e das dezenas de mortos, a provocação de um processo constituinte,
que mesmo derrotado, ao final, mudou a geografia do poder, no País. No Brasil,
seguiríamos em frente. As eleições de 2014 apresentaram, pela primeira vez,
um novo tipo de polarização, dividindo o mapa brasileiro em uma clivagem
O fato é que ao longo de mais de duas décadas, que vão do final dos anos 80 até
quem sabe os movimentos de rua de 2013, o tema da democracia virtualmente
desapareceu do nosso cotidiano político. Disse isso em um debate, tempos atrás, e
uma pergunta surgiu na plateia: em que momento a “questão democrática” havia
retornado ao centro do debate brasileiro? Algo na linha: quando nos perdemos?
Em que momento, temas que já considerávamos superados, a conversa sobre “gol-
pe”, o “cala-boca” a deputados e jornalistas, e o medo de falar, haviam voltado à
tona? Respondi que era difícil precisar. É possível que tudo venha da polarização
tóxica da última década e meia. O “nós contra eles”, o “nunca-antes-neste-País”.
E logo a reação conservadora. A ideia da “salvação nacional”, da “nossa bandeira
A resposta a isso tudo poderia ter sido, desde o início, uma reação altiva das
instituições, mas o que vimos foi o contrário. Ao invés de fincar pé nos preceitos
da Constituição, criamos uma difusa lógica de exceção. Criamos o crime
inexistente de fake news, atribuímos ao Estado a prerrogativa, inexistente em
nosso ordenamento institucional, de legislar sobre a “verdade”, retomamos a
censura prévia em larga escala, cancelamos passaportes e bloqueamos contas
de jornalistas, fizemos terra arrasada da inviolabilidade parlamentar, do direito
ao contraditório, do simples acesso da defesa aos autos de processos. Criamos
inclusive um procedimento novo: a prerrogativa do Estado para “apagar” do
mundo digital quem se interpretar como “risco à democracia”. Tudo sob o signo
do autoengano, do argumento ad hoc da “democracia militante”, que inclui
achar que um tuíte do PCO, uma indagação, do professor Marcos Cintra, sobre
as urnas eletrônicas ou um diálogo sem pé nem cabeça, em um grupo privado de
WhatsApp, representam graves riscos à democracia.
A série de reformas que o País fez, nos últimos anos, foram precisamente
na direção de uma maior estabilidade institucional. Foi este o sentido da Lei
Geral das agências reguladoras, aprovada em 2019; do Marco do Saneamento
Básico, que abriu o setor para a competição e vem atraindo uma montanha de
investimentos. Ou ainda da reforma trabalhista. Estudo feito por pesquisadores
da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper)
mostrou como a regra inibindo a litigância de má fé resultou em um aumento de
■A
nthony W. Pereira é diretor do Centro Kimberly Green para a
América Latina e Caribe da Universidade Internacional da Flórida. É
editor do livro Right-Wing Populism Within and Beyond Latin America
e foi diretor-fundador do Instituto Brasil no King's College London de
2010 a 2020
A era atual tem sido chamada de era do populismo. Muitos desses movimentos,
partidos, líderes e governos populistas – embora não todos – corroem a
democracia. Debates sobre as causas e consequências do populismo, bem como
sobre quais são as alternativas mais razoáveis a ele, são abundantes na literatura
popular e acadêmica, e também são altamente carregados. Este artigo examina o
tema, com foco especial em uma forma relativamente nova de populismo
transnacionalista de direita, que teve um grande impacto no Brasil.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . populismo em marcha? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
comunismo soviético, bem como ao liberalismo, socialismo e fascismo. Esses
governos foram inclusivos na medida em que concederam direitos aos
trabalhadores recém-urbanizados e aos profissionais de classe média. Eles
incorporaram sindicatos e basearam-se em uma franquia expandida após períodos
em que os sindicatos foram marginalizados e reprimidos e o voto foi estritamente
limitado e controlado.
Uma segunda onda de populismo começou na América Latina nos anos 90,
representada por presidentes como Carlos Menem (1989-1999), na Argentina,
Alberto Fujimori (1990-2000), no Peru, Fernando Collor de Mello (1990-1992),
no Brasil, e Abdala Bucaram (1996-97), no Equador. Ao contrário dos seus
homólogos populistas clássicos, estes líderes não eram inclusivos, mas, sim,
implementaram políticas neoliberais que expandiram o alcance dos mercados e
enfraqueceram os sindicatos. Embora alguns analistas não os reconheçam como
populistas, devido às suas diferenças com os seus antecessores clássicos, o seu uso
de comunicação não mediada com os seus apoiadores e a sua (pelo menos
retórica) oposição às “elites” e à autorrepresentação como outsiders qualificam-
nos como populistas dentro da definição aqui oferecida.
Uma terceira onda de populismo tem vindo a ocorrer globalmente nas últimas
décadas e foi acelerada pelo colapso financeiro de 2008-2009 e pela crescente ou
persistente desigualdade de rendimentos em muitos países. Esta onda consiste em
populismos que têm elementos ideológicos tanto de esquerda como de direita, ou
mesmo uma misturas dos dois. (O seu conteúdo ideológico preciso pode ser
menos importante do que o fato de serem populistas).
■ Populismo de esquerda
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . populismo em marcha? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
atingiu o seu auge nos anos 90 e 2000. É, principalmente, um “murro descendente”,
atacando os forasteiros culturais ou étnicos, bem como as elites do establishment.
Ao contrário do conservadorismo tradicional, defende um ataque radical às
principais instituições, que se diz estarem imbuídas de um ethos coletivista de
“marxismo cultural”. Recorrendo a pensadores tradicionalistas como Olavo de
Carvalho e Steve Bannon, algumas vertentes do populismo de direita condenam a
ciência e todo o projeto do Iluminismo, remontando a uma era pré-moderna de uma
sociedade rigidamente hierárquica, rejeitando a ideia de progresso e colocando os
valores espirituais e culturais acima dos valores materiais.
■ Conclusão
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . populismo em marcha? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
inclusão social e oportunidades para todos, menos desigualdade e a erradicação
da fome e da pobreza extrema. As políticas sociais, fiscais e habitacionais da
sua administração irão tentar reduzir tanto a pobreza como a desigualdade,
embora num ambiente muito menos favorável do que o que prevaleceu nos dois
primeiros mandatos da presidência dele entre 2003 a 2010. Em termos de
identidade, Lula defendeu o respeito pelas diferenças, a melhoria das divisões e
a “normalidade democrática”.
Jair Bolsonaro não quer que o governo de Lula tenha sucesso em nenhum destes
esforços. Como indicou no seu discurso na Conferência de Ação Política
Conservadora (CAPAC) em National Harbor, Maryland, nos EUA. Em 4 de março
de 2023, a sua missão “ainda não terminou” e parece sentir que, se Donald Trump
(ou alguém como ele) conseguir retomar a Casa Branca em 2024, as suas hipóteses
de reconquistar a presidência no Brasil também serão boas. O conflito sobre o
destino do populismo de direita no Brasil – e no mundo – não vai acabar logo. ■
1. D
avid Collier and Ruth Berins Collier, Shaping the Political Arena (Princeton: Princeton University Press), p.
22.
2. F
rederico Finchelstein, From Fascism to Populism in History (Oakland: University of California Press), p. xv.
3. F
rederico Finchelstein, From Fascism to Populism in History (Oakland: University of California Press), pp.
xvi-xvii.
4. O
s gnósticos eram grupos heréticos nos primeiros anos de cristianismo que rejeitavam os ensinamentos
ortodoxos e a sabedoria convencional e acreditavam na busca do conhecimento espiritual pessoal (gnose). Da
Encyclopedia Britannica, “Gnosticism summary” at: https://www.britannica.com/summary/
gnosticism#:~:text=In%20general%2C%20Gnostics%20taught%20cosmological,the%20divine%20spark%20
in%20humans acessado no dia 5 de março de 2023.
5. As últimas quatro características da lógica populista são listados por Andrew Arato e Jean Cohen, “Civil
society, populism and religion” in Carlos de la Torre, ed. Routledge Handbook of Global Populism (London:
Routledge, 2019), pp. 98-112; a referência pode ser encontrado na página 103.
6. F
rancisco Panizza e Yannis Stavrakakis, “The Political Construction of `The People’ in Pierre Ostiguy,
Francisco Panizza, and Benjamin Mofffitt, eds. Populism in Global Perspective (New York: Routledge, 2021),
pp. 21-46; a referência pode ser encontrada na página 28.
7. F
rancisco Panizza e Yannis Stavrakakis, “The Political Construction of `The People’” in Pierre Ostiguy,
Francisco Panizza, and Benjamin Mofffitt, eds. Populism in Global Perspective (New York: Routledge, 2021),
pp. 21-46; a referência pode ser encontrado na página 28.
8. B
enjamin R. Teitelbaum, War for Eternity: The Return of Traditionalism and the Rise of the Populist Right
(London: Allen Lane, 2020) pp. 8-14.
9. P
ara um exemplo da explicação econômica, veja Barry Eichengreen, The Populist Temptation (Oxford: Oxford
University Press, 2018). Para um exemplo da explicação cultural, veja Pippa Norris e Ronald Inglehart,
Cultural Backlash (Cambridge: Cambridge University Press, 2019).
10. H uman Rights Watch, “Brazil: Attacks on Gender and Sexuality Education”, 12 May 2022: https://www.hrw.
11. Josh Moody, “De Santis Higher Ed Bill Heads for the Legislature” no History News Network, 27 February
2023, at: https://historynewsnetwork.org/article/185110 acessado no dia 5 de março de 2023.
12. Thomas Piketty, Capital and Ideology (Cambridge: Harvard University Press, 2020), p. 2.
13. Andrew Arato e Jean Cohen, “Civil society, populism and religion” in Carlos de la Torre, ed. Routledge
Handbook of Global Populism (London: Routledge, 2019), pp. 98-112; a referência pode ser encontrada na
página 110.
15. “ Leia e veja a íntegra dos discursos de Lula após vitória nas eleições” na G1: https://g1.globo.com/politica/
eleicoes/2022/noticia/2022/10/31/leia-e-veja-a-integra-dos-discursos-de-lula-apos-vitoria-nas-eleicoes.ghtml
acessado no dia 6 de Março de 2023.
16. M
ariana Sanches, “Missão na Presidência ainda não acabou, diz Bolsonaro em evento conservador nos EUA”
no BBC Brasil, 5 de março de 2023: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cprv0l45gn7o acessado no dia
6 de março de 2023.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . populismo em marcha? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
Um novo papel para as forças armadas
■E
dmar Bacha é diretor do Instituto de Estudos de Política Econômica/
Casa das Garças e membro das Academias Brasileiras de Ciências e de
Letras. Participou do Plano Real, foi presidente do BNDES e do IBGE,
professor em universidades no Brasil e nos EUA. É economista e Ph.D
em Economia pela Universidade de Yale
■S
imon Schwartzman é pesquisador visitante do Departamento
de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências da
Universidade de Campinas e pesquisador associado ao Instituto de
Estudo de Política Econômica/Casa das Garças. É doutor em Ciências
Políticas pela Universidade da Califórnia, Berkeley
Ao invés disto, no entanto, eles têm sido elaborados internamente pelas forças
armadas e aprovados pelo Congresso sem maior discussão. O outro lado da
inexistência de uma comunidade civil especializada e capacitada para examinar
Talvez seja difícil alterar este perfil de gastos no curto prazo, mas é importante
que haja uma política de ajuste voltada para a criação de um contingente menor e
mais qualificado, conforme necessidades operacionais bem definidas e com níveis
salariais e de benefícios previdenciários equivalentes ao da população civil com
características semelhantes. Uma nova política de recursos humanos requer rever
o serviço militar obrigatório, que há muito se tornou inviável, e a redistribuição
dos efetivos militares conforme sua necessidade estratégica, e não mais nos
grandes centros urbanos do Sudeste, como atualmente.
Uma questão central sobre os papéis das forças armadas é o entendimento correto
da noção de que sua principal função é a defesa do país de ameaças externas, e a
questão correlata de quanto o Brasil, enquanto potência regional de renda média,
precisa e tem condições de manter uma força armada convencional. Parece claro
que não faz sentido manter indefinidamente um contingente militar de grande
porte, com equipamento ultrapassado e pouca capacidade de mobilização. É
preciso pensar a questão das ameaças externas em pelo menos três níveis: global,
regional e local.
Esta providência é necessária para estabelecer o que as forças armadas não são,
mas insuficiente para estabelecer o que elas devem ser, o que só pode ser feito por
uma doutrina militar atualizada, compatível com as possibilidades e necessidades
internas e o envolvimento do país na ordem internacional, aprovada pelo
Congresso e reconhecida como válida pela sociedade brasileira como um todo,
incluindo as próprias forças armadas. ■
■O
távio do Rêgo Barros é general de Divisão da Reserva,
graduado em Ciências Militares e Administração pela Academia
Militar das Agulhas Negras, pós-graduado pela Escola Superior de
Guerra e doutor pela Escola de Comando e Estado-Maior do Exército.
Foi chefe do Centro de Comunicação do Exército e porta-voz da
Presidência da República
Com otimismo contido, Bobbio afirmou que o fim da democracia era apenas uma
conjectura e que o respeito às normas e às instituições democráticas era o primeiro
e mais importante passo para a renovação progressiva da sociedade (Bobbio 2020).
Há uma tendência de nossos analistas de política, quando tratam das relações entre
civis e militares, de nos compararem com os Estados Unidos da América. É bom
parâmetro, mas é transparente reconhecer as diferenças entre as Forças Armadas
brasileiras e as americanas.
Em artigo publicado no site War on the Rocks com o título Don’t drag the
militarys into politics, Kori Schake confirma esse envolvimento e aponta o dedo
para os responsáveis: os políticos (Schake 2022).
– Presidents Barack Obama and Donald Trump both nominated record numbers
of high-ranking veterans into senior civilian appointments. Like his predecessor,
President Joe Biden nominated a recently retired veteran to be secretary of defense.
More recently, Biden placed uniformed marines beside him as he gave a highly
– This did not completely eliminate the idea that there could be circumstances
in which members of the armed forces could and should defy the civilian
authorities. On 21 April 2021, 60 years after the attempted putsch against de
Gaulle, a letter published in Valeurs Actuelles, a right-wing journal, signed
by current and former officers, complained about the failure of the authorities
to take action to stop the spread of radical Islamist ideas and warned of the
possible need for our ‘active comrades’ to intervene ‘in a perilous mission of
protecting our civilisational values’.
O conceito do controle civil sobre o estamento militar não é novidade, tendo sido
formulado há mais de 60 anos pelo professor Samuel P. Huntington e apresentado
no livro O Soldado e o Estado (Huntington 2016). À medida que ganhava força
nas democracias ocidentais de primeiro mundo era contestado pelos fatos.
Criar bolhas desconectadas entre esses dois atores, onde cada um acredita-se
detentor da verdade inquestionável, é caminho para a fragilização da sociedade e
reforço da fuga das regras consuetudinárias da democracia.
A meu juízo, e em uma visão atual, o que Huntington defendeu é uma relação
mais fluida e equilibrada.
– Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela
Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas
com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente
da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes
constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
Nesse mesmo tempo, viu-se os anos 2010 como a década das contestações
sociais, um contraponto às dificuldades que o governo da ex-Presidente teve com
a economia e o seu partido com o envolvimento em denúncias de corrupção nas
relações entre governos e empresas.
Encerrada a mais dura eleição dos últimos anos, a vitória apertada da oposição
gerou uma onda de protestos dos derrotados, alguns em dissonância com a
legalidade, e fez emergir, do lado vencedor, críticas acerbas ao militares.
■ Um futuro de estabilidade
No Brasil, não sendo pouco enfrentar esses desafios, ainda olhamos o retrovisor da
história acreditando no fantasma de um intervencionismo militar.
Chefes militares nos últimos dias, sob extrema pressão de interesses pessoais e
políticos, deram provas incontestáveis da compreensão do papel de Estado das
Forças Armadas e da sua subordinação à Constituição ao agirem alinhados com os
preceitos legais vigentes em nosso país.
– Se não houve golpe no Brasil, é porque os militares não quiseram embarcar
numa aventura inconstitucional. Golpes são atos de violência que requerem o
uso da força, sem a qual suas chances de sucesso, se existentes, são mínimas
(Rosenfield 2023).
Todavia, a luta contra o partidarismo dentro das Forças Armadas se torna objetivo
principal das lideranças fardadas.
A ação política, quando necessária, deverá ser liderada pelos Ministros da Defesa
e os Comandos de cada uma das Forças Armadas, com foco nas missões impostas
à Instituição pela Constituição e outros dispositivos legais.
Como salientou José Murilo de Carvalho em sua obra “Forças armadas e a política
no Brasil” (Carvalho 2019):
Respeitando aqueles que defendem a interpretação de que o Artigo 142 traz em sua
redação o conceito de Poder Moderador por parte das Forças Armadas. Não traz!
Respeitando aqueles que acreditam que mudar a redação do Artigo 142 trará
quietude e transparência nas relações entre civis e militares. Não trará!
■ Bibliografia
BOBBIO, Norberto. 2020. O futuro da democracia. Sao Paulo: PAZ & TERRA.
CARVALHO, José Murilo de. 2019. Forças armadas e política no Brasil. Sao Paulo: TODAVIA.
FREEDMAN, Laurence. 2022. Command, the politics of military operations from Korea to Ukraine. New York:
OXFORD.
JOSEPH F. Dunford, Graham Allison e Jonah Glick-Unterman. 2023. “Foreign Affairs.” Foreign Affairs. 5
de Janeiro. Acesso em 27 de Fevereiro de 2023. https://www.foreignaffairs.com/united-states/guardians-
republic.
SCHAKE, Kori. 2022. “Don’t drag the militarys into politics.” War on the rocks. 13 de Dezembro. Acesso em 27
de Fevereiro de 2023. https://warontherocks.com/2022/12/dont-drag-the-military-into-politics/.
STEPAN, Juan J. Linz & Alfred. 1996. A transiçao e consolidaçao da democracia. Rio de Janeiro: PAZ E
TERRA.
■G
uilherme Casarões é professor da Fundação Getúlio Vargas, doutor
e mestre em Ciência Política pela Universidade de São Paulo e mestre
em Relações Internacionais pela Universidade Estadual de Campinas.
Coordena o Observatório da Extrema Direita
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assume seu terceiro mandato presidencial
diante de um país dividido. Sua vitória nas eleições de 2022 contra o incumbente
Jair Bolsonaro foi a mais apertada de toda a história da democracia brasileira.
Uma de suas tarefas, portanto, será a pacificação do Brasil, seja por meio
do combate à fome e à desigualdade, da reconstrução das políticas públicas
que foram desmanteladas pelo governo anterior e até mesmo de medidas de
enfrentamento ao discurso de ódio e ao extremismo. São tarefas tão necessárias
quanto difíceis, que certamente não surtirão o efeito necessário no tempo de um
mandato presidencial. Isso não significa, claro, que o atual governo não deva dar
passos decisivos rumo a uma reconciliação ampla.
Num primeiro momento, é bem possível que o Brasil não seja instado a tomar
lados nessa disputa bipolar. Contudo, um eventual acirramento da guerra na
Ucrânia ou um entrevero político-militar mais grave entre Washington e Beijing
exigirá de Lula uma postura cautelosa para preservar os interesses nacionais.
Além disso, a eleição de um republicano à presidência norte-americana em
2024, impondo uma visão de soma zero aos parceiros na relação com a China,
certamente dificultará a capacidade brasileira de navegar entre os dois polos de
poder. Até agora, contudo, o equilíbrio entre as superpotências tem funcionado.
Existem duas potenciais contribuições que o governo Lula poderá prestar à ordem
internacional no curto tempo de um mandato. Ambas envolvem a reconstrução
de plataformas de cooperação nas quais o Brasil foi protagonista – ou até mesmo
liderança – ao longo das últimas décadas. A primeira delas diz respeito às relações
continentais. Nos últimos anos, a política externa brasileira abandonou os
mecanismos de integração regional que nos colocavam como centro de gravidade
político da América do Sul. O Mercosul, ainda resiliente no papel, perdeu sua
capacidade de organização política, comercial e financeira na vizinhança imediata.
Diante do acirramento da crise venezuelana e da polarização ideológica das
relações sul-americanas, incentivada pelo bolsonarismo, o Brasil retirou-se na
Unasul e da Celac, organizações criadas por ele próprio alguns anos atrás.
A boa notícia é que o vácuo de poder deixado pelo desinteresse brasileiro ainda
não foi totalmente preenchido, a despeito de ensaios de protagonismo regional
por parte de Chile, Colômbia e México. O Brasil poderá resgatar seu espaço,
beneficiado por uma nova “onda rosa” de partidos de esquerda ascendendo ao
poder na região. Mas não se trata de tarefa simples. Do ponto de vista econômico,
a presença chinesa na região cresceu nada menos que 26 vezes entre 2000 e
2020, reduzindo significativamente as possibilidades de expansão de comércio e
investimentos brasileiros nas áreas em que o país ainda possuía alguma entrada na
■ Considerações finais
Se é verdade que neste terceiro mandato a busca por um legado diplomático guiará
as ações do Brasil no mundo, é também verdade que esse processo envolverá uma
complexa articulação de diferentes atores governamentais, econômicos e sociais.
Tampouco, pode-se perder de vista a importância de se pavimentar o caminho para
estratégias duradouras, que extrapolem o tempo de um presidente ou partido no
poder. A julgar pelas movimentações dos últimos três meses, ainda que não seja
uma caminhada fácil, tudo indica que o governo está disposto a fazer bom uso da
política externa. ■
■R
ubens Barbosa é diplomata, presidente do Instituto de Relações
Internacionais e Comércio Exterior (Irice) e foi embaixador em Londres
e Washington
Nos meses seguintes, as declarações foram se tornando cada vez mais fortes. Em
agosto, a proposta do governo de voto impresso foi recusada pelo Congresso,
apesar da pressão sobre o legislativo com o desfile de veículos militares na
Esplanada dos ministérios, em meio ao crescente envolvimento do Ministério
da Defesa, convidado a participar de comissão para examinar a transparência e a
segurança das urnas eletrônicas. O TSE reagiu, abrindo inquérito para apurar as
acusações sem comprovação feitas pelo presidente sobre fraudes nas urnas e enviou
ao STF notícia crime pelo vazamento de informações de um inquérito sigiloso da
Polícia Federal sobre o ataque hacker sofrido pela corte eleitoral em 2018.
O trabalho de negociação final foi feito pelo ministro Barroso, que conversou
com os interlocutores e obteve a promessa de que seria feito o melhor possível
para atender à pretensão brasileira. Restava aguardar a informação da ponta da
linha com a Positiva para ver se a indicação recebida por Barroso se efetivaria.
Enquanto isso, continuavam as gestões em Brasília.
Com a situação normalizada, em dezembro, dei por encerrado meu trabalho junto
à Positiva. Agradeci ao Sandiuchi e ao ministro Barroso a confiança e continuei a
acompanhar a crescente crítica do governo às urnas, inclusive com a participação
do Ministério da Defesa, envolvido pelo presidente no questionamento das urnas.
Fico imaginando o que teria acontecido, se o trabalho que me foi atribuído não
resultasse efetivo. O assunto se transformaria em questão de segurança nacional.
A ausência do fornecimento das 225.000 para substituir urnas antigas poderia
criar problemas para a realização das eleições, talvez seu adiamento. O presidente
Bolsonaro poderia usar esse fato para aumentar suas críticas às urnas eletrônicas e
estimular uma crise institucional mais ampla.
Balanço da atuaçãoBolsonaro
do Brasil enoo Conselho
Centrão:
de Segurança
Novas Alianças, da ONU
Velhos Problemas
Carlos AlbertoHelena
FrancoChagas
França
A necessidade de um governo de
Bolsonaro: reconstrução
Armas, Ideologianacional
e Poder Cláudio Couto
Augusto de Arruda Botelho
Armadilhas ideológicas
Do America First para America IsRosenfield
Denis Lerrer Back:
Primeiros Dias da Diplomacia de Biden
Brasil tem pressa na pauta de meioRubensambiente
Ricupero
e mudança do clima
e Realpolitik
Biden Equilibra RetóricaEverton Vieira Vargas
na Política Externa
Desafios urgentes para o Ministério daIgor Defesa
Gielow
Eugenio Diniz
Governança Tecnológica é Central
2022: últimapara
chance de eleição
as Relações presidencial
Internacionais
sem candidato evangélico
Ronaldo Lemos
Juliano Spyer
Itaipu e o Desafio da Continuidade
Vinicius do Valle
José Luiz Alquéres
A política externa e o novo governo Altino Ventura Filho
Rubens Barbosa
Após 30 anos, Mercosul Requer
Reverso da fortuna: a volta
Freioda
deboa imagem
Arrumação
do Brasil Rubens
no mundo
Barbosa
Daniel Buarque
Fabiana Gondim Mariutti
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . titulo do capitulo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
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