Você está na página 1de 6

Universidade de Brasília

Disciplina: Introdução a Ciência Política

Estudante: Marcelo Eduardo da Cruz Cascaes

Professora: Graziela Dias Teixeira

Matrícula: 19/0047330

O voto e a participação popular na política em


novas e velhas democracias
1. Introdução
Nos últimos anos, percebeu-se um decréscimo na quantidade de votos efetivos, sendo que
a maioria passou a ser brancos ou nulos. Essa realidade representa uma crescente apatia
política, ou seja, descrença no sistema político e a opção do indivíduo em não participar desse
sistema, uma vez que as pessoas não se sentem mais representadas e há um distanciamento
dos cidadãos em relação ao sistema político. Poderia se esperar que, pelo fim dos regimes
totalitálirios ou autoritários, haveria uma estabilidade da democracia, com uma ampla
participação popular, porém, não é isso que acontece. Mesmo após as ditaduras militares na
América Latina, por exemplo, ano após ano a quantidade de votos efetivos e o alinhamento
político dos cidadãos se dão em um números cada vez menores. Dessa forma, esses motivos
foram a base para a escolha do tema, pois representam a realidade que está disseminada entre
os países do mundo, englobando tanto democracias velhas como as novas.
Assim, Luis Felipe Miguel expõe alguns indícios da ocorrência da apatia política, sendo
relativos à atuação das instituições políticas, que refletem na sua legitimidade e confiança.
Ademais, essa realidade se alinha com algumas ideias elucidadas por Schumpeter, no que diz
respeito à relação de distância entre política e cidadão e a influência da mídia (MARQUES,
2007). Há quem diga que a apatia é um fenômeno positivo e natural, sendo essa a visão de
mundo de Lipset no seu influente escrito “Political man” (1963 [1960]), no entanto não é
observado como algo positivo no contexto da maioria dos países, especialmente dos da
América do Sul. Além disso, Charles Wright Mills expõe o grande problema enfrentado pelos
governos dos Estados Unidos, podendo ser analisado sob a perspectiva de outros países, que é
a existência do elitismo que domina o sistema político e econômico do país, sendo um dos
motivos para a apatia política.
Diante do exposto, o objetivo do ensaio é sustentar a ideia de que a participação popular
está em decadência, mesmo após os regimes totalitários e autoritários terem usurpado do
poder por anos. São várias a evidências que levam a essa conclusão, sendo muitas delas
representadas no artigo de Luis Felipe Miguel intitulado de “Representação Política em 3-D.
Elementos para uma teoria ampliada da representação política”, de 2003 e do escrito de
Danusa Marques denominado “Democracia e Ciências Sociais no Brasil”, de 2007.

2. Desenvolvimento

Nos últimos anos, especialmente após os regimes autoritários e totalitários, houve a


redemocratização, no qual a participação política da população tornou-se possível. Todavia, o
que se percebe é a apatia política, a partir do sentimento de falta de representação com os
candidatos. Assim, três fenômenos ocorrem, tanto nos países centrais, como nos países
periféricos, que comprovam essa nova realidade, e são eles: diminuição do contigente de
eleitores, falta de confiabilidade nas instituições políticas e diminuição e crise dos partidos
políticos (MIGUEL, 2003).
Em relação à diminuição da massa de eleitores, é necessário uma análise mais cautelosa,
visto que, em alguns países, o voto passou de optativo para obrigatório e houve uma
ampliação do poder de voto para minorias sociais. No entanto, estudos indicam que em países
que apresentam a votação optativa, ano após ano a porcentagem de eleitores diminui, o que
representa a falta de interesse político, falta de representatividade ou de consciência política.
Um argumento que sustenta essa realidade é o caso dos Estados Unidos. Nesse país, o
comparecimento às urnas para a votação presidencial oscilou entre 58,3% e 63,1% entre 1952
e 1968. Desde então, inicia-se uma curva vertiginosamente decrescente, alcançando 47,2% em
1996. Outro aspecto muito importante, é a questão dos países que apresentam voto
obrigatório, porque, por ser obrigatório, há a necessidade do comparecimento nas urnas e
votar. No entanto, muitos eleitores votam em branco ou nulo ou, muitas vezes, nem
comparecem nas urnas, sob justificativas, se abstendo (MIGUEL, 2003).
Ademais, é importante ressaltar que, enquanto os grupos que já participavam das
eleições, estão com o sentimento de apatia política, os grupos minoritários, por terem o direito
ao voto recentemente, estão em uma situação de prosperidade eleitoral, fato que poderá ser
modificado no decorrer dos anos. Vale ressaltar que não é um fenômeno totalizante, porque
alguns países não apresentam esse problema, como a Suécia, a Noruega e a Dinamarca
(MIGUEL, 2003).
A partir dessa análise profunda, uma corrente teórica difundida por Seymour Lipset, no
seu escrito “Political man” (1963 [1960]), argumenta que o fenômeno de diminuição da
participação popular nas urnas deve ser visto com bons olhos, a partir da perspectiva de que as
instituições estão em um estágio tão avançado que não seria mais necessário a participação
política popular. Todavia, é uma ideia que não se aplica à maioria dos países, como os países
do antigo bloco comunista e em países latino-americanos, porque a redemocratização foi
acompanhada da pauperização (MIGUEL, 2003).
O segundo problema apresentado no artigo de Luis Felipe Miguel diz respeito à falta de
confiabilidade nas intituições políticas. Essa realidade pode ser explicada a partir de três
análises, as instituições estão resgatando alguns valores autoritários, as instituições não estão
mais representando os eleitores ou a população em geral, o que causa uma crise de
legitimidade e a participação política da população é quase zero ou nula, o que permite que
seus interesse não sejam reivindicados de forma direta e objetiva, pois acabam mesclando
com os anseios dos políticos e de outros grupos, alcançando, às vezes, um meio-termo. Vale
ressaltar que é um fenômeno generalizado entre os países e não específico de uma região ou
de uma democracia nova ou velha (MIGUEL, 2003).
Por fim, o terceiro problema está relacionado com o esvaziamento dos partidos políticos.
Isso ocorre devido a três motivos, burocratização da estrutura interna partidária, da
diminuição do leque de pautas a serem discutidas e da influência midiática que
proporcionaram mudanças na concorrência eleitoral. Em relação à diminuição do leque de
pautas a serem discutidas, pode ser entendida como uma consequência da substituição da
democracia representativa pela “nova democracia delegativa”, ou seja, pela escolha de
representantes que debaterão assuntos específicos e votarão em um tema, ao invés de
apresentar um mandato com duração específica e com discussões mais amplas. Além disso,
no que concerne à influência midiática, é possível destacar que não há mais um debate entre
os candidatos pessoalmente, mas sim, em uma estrutura de comunicação distante do eleitor, o
que fez com que uma nova imagem de candidato seja criada (MIGUEL, 2003).
Luis Felipe Miguel destaca, também, os estudos de Charles Wright Mills no livro “A elite
do Poder”, que analisa a democracia representativa dos Estados Unidos, não de uma forma
formal, como a participação popular nas eleições e dos direito liberais, mas sim de forma
substantiva, ou seja, de uma forma mais crítica. Assim, conclui que a democracia
representativa americana é dominada por três grupos minoritários que, por meio de um
sistema integração, conseguem criar um mundo unificado, possibilitando compartilhar
interesses e decisões. Tais grupos, denominados por Mills como a “elite do poder”, são:
chefes militares, grande capitalistas e os principais líderes políticos. Essa unificação só é
possível a partir de um mecanismo de troca de cargos efetivos entre si, ou seja, um chefe
militar ganha um cargo no meio político, e da convivência no mesmo ambiente, ou seja, na
“alta roda”. Assim, os aspectos formais democráticos são cumpridos, mas em uma perspectiva
substantiva o maior princípio não está sendo respeitado, que seria o governo emanado do
povo (MIGUEL, 2003).
Essa realidade não ocorre somente nos Estados Unidos, pois, no Brasil, por exemplo, os
cargos do serviço público explicita esse fenômeno, e o mecanismo de intregração é
semelhante ao que ocorre com a concessão de cargos públicos a familiares. Esse instrumento
pode ser constatado no governo do estado e na prefeitura de Curitiba, quando Roberto
Requião, governador, e Beto Richa, prefeito, colocaram familiares em cargos públicos. Dessa
forma, o superitendente da Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (Appa),
Eduardo Requião, é irmão de Roberto, e a sua esposa, Maristela Requião, recebeu o cargo de
dirigente do Museu Oscar Niemeyer (MON).
Além disso, uma outra análise que explica a ocorrência dessa realidade se encontra nas
ideias de Schumpeter, quando afirma que as pessoas, em multidão, agem de forma irracional e
por impulso, sendo facilmente manipuladas pelo meios de comunicação (MARQUES, 2007).
Isso pode ser constatado a partir de propagandas políticas atacando partidos concorrente,
muitas vezes baseados em fake news como o que ocorreu nas eleições de 2018. Fernando
Haddad, candidato à presidência pelo Partido dos Trabalhos, foi acusado de ter criado o “kit
gay” para crianças de seis anos de idade, durante o governo de Lula, sendo,
consequentemente, considerado um candidato imoral. Todavia, trata-se de um projeto criado
em 2011 pelo Ministério da Educação, sob a gestão de Haddad, mas que nunca foi
implantado. O objetivo do projeto era de lutar contra o preconceito e a violência e ratificar o
respeito às pessoas da comunidade LGBTQ+.
Dessa forma, nunca teve o intuito de “sexualizar as crianças” ou disseminar as ideologias
de gêneros nas escolas brasileiras, como foi argumentado por Jair Bolsonaro, candidato à
presidência em 2018 pelo Partido Social Liberal, na entrevista ao Jornal Nacional na noite do
dia 29 de outubro de 2018. O projeto, denominado Escola Sem Homofobia, foi vetado pela
então presidente Dilma Rousseff
Ademais, graças à distância entre o povo e o sistema político, “as massas são incapazes de
decidir, compreender e caclculas consequências das decisões políticas” (MARQUES, 2007,
p.21). Consequentemente, apresentam o senso de falta de responsabilidade e de interesse pelo
sistema político, sendo independente do gênero, capacidade cognitiva e classe social, o que
explica a apatia política e influência da mídia nas massas sociais.

3.Conclusão

Diante do exposto, levando em consideração o conjunto de fatores, é evidente que as


instituições políticas estão em crise de legitimidade, o que explica a quantidade de criação,
nos últimos anos, de novas formas para a democracia, a fim de revitalizar as instituições.
Algumas das medidas foram implantadas, como as cotas no processo eleitoral para candidatos
que se enquadram nas minorias sociais (MIGUEL, 2003). Todavia, outros mecanismos, como
o sistema de sorteio de escolha dos candidatos para os mais diversos cargos no Poder
Legislativo e Executivo, não foram adiante. Ademais, é possível perceber que

há o reconhecimento, implícito ao menos, de que a redução da confiança popular


nos parlamentos e nos partidos não é efeito da “alienação”, da falta de compromisso
com a democracia ou de resquícios de valores autoritários.7 É, antes, a constatação
sensata de que as instituições atualmente existentes privilegiam interesses especiais
e concedem pouco espaço para a participação do cidadão comum, cuja influência na
condução dos negócios públicos é quase nula. Em suma, de que as promessas da
democracia representativa não são realizadas (MIGUEL, Luis Felipe, 2003, p. 126).

Ademais, constata-se que a a partir de métodos de segurança política, advindos das


crises econômicas e financeiras, ocorridas graças ao sistema capitalista, pelas premissas das
liberdades políticas, que “o Estado interfere do menor modo possível na liberdade dos
indivíduos, conferindo máximo de autonomia em sua ação” (SELL, Carlos, 2006, p. 56), e
econômicas, pela descentralização do mercado, calcada na noção da mão invisível, o Estado
se viu na necessidade de criar meios para mitigar as consequências negativas. Dessa forma,
alcançou-se o estágio de políticas de bem – estar social, ou seja, o Estado passa a ser o
promotor social e organizador da economia, culminando na formulação da ideia de Harbemas,
“o cidadão tende a transformar-se em cliente, renunciando à participação ativa e assumindo a
atitude passiva de quem se limita a aguardar serviços do Estado” (Habermas, 1973, pp. 9 e
ss., 2012, pp. 626 e ss.).
Logo, Luis Felipe Miguel constata, por meio de várias evidências, que as instituições
legais estão se definhando, pela falta de representatividade, mesmo após a experiência da falta
de democracia, durante os regimes totalitários e autoritários. Culmina-se, assim, no fenômeno
da apatia política, tanto em democracias novas quantas em velhas, sendo perceptível pelas
estudos estatísticos acerca do voto, tanto obrigatório quanto optativo.

Referências
MARQUES, Danusa. Democracia e Ciências Sociais no Brasil. Brasília: Universidade de
Brasília, 2007.
MIGUEL, Luis Felipe. Representação Política em 3-D: elementos para uma teoria
ampliada da representação política. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol.18, nº 51,
pp. 123-140, 2003.
PINZANE, Alessandro. Democracia versus tecnocracia: apatia e participação em
sociedades complexas. Lua Nova: Revista de Cultura e Política, vol. 89, pp. 135-168, 2013.
SELL, Carlos Eduardo. Ideologias políticas. Introdução à Sociologia Política. Petrópolis:
Vozes, 2006.
HABERMAS, J. . Kultur und Kritik: Verstreute Aufsätze. Frankfurt am Main: Suhrkamp,
1973.

BARRAGÁN, Almudena. Cinco ‘fake news’ que beneficiaram a candidatura de Bolsonaro.


Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2018/10/18/actualidad/1539847547_146583.html >.
Acesso em: 28 de mai. de 2019.

Você também pode gostar