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Análise das relações humanas no contexto digital, político e sociológico do Brasil

contemporâneo1
Arthur Albano2
Geísa Mattos3
Universidade Federal do Ceará

A disciplina de Comunicação e Sociologia ministrada no segundo semestre de 2022


ocorreu em um período bastante interessante da história do Brasil: as eleições
presidenciais. Por causa disso, os textos da unidade possuem um direcionamento mais
político, que funciona como um fio condutor conectando-os de maneira geral. A
primeira unidade condensa sete textos, abrindo com “Os desafios impostos pelas mídias
sociais à democracia”, da autora Beatriz Walid, que passeia pelos principais temas
abordados nos textos posteriores como: democracia na era digital, o fenômeno das fake
News e a era da pós-verdade, e a utilização de redes sociais no dia-a-dia como
ferramenta para modificar interações sociais.
A bússola para se guiar em meio as leituras se dá através do texto O Poder da Ideologia
de István Mészáros, que desmistifica uma crença popular de que o jornalismo tem que
ser imparcial. Para Mészáros, tudo possui uma ideologia, seja ela a dominante ou a
oculta. O autor aprofunda ainda mais o conceito através de exemplos dentro da vida
acadêmica e política. O que impressiona é que ideologia é o conceito mais diluído nos
textos posteriores, já que ele é um importantíssimo para se entender como filtros
invisíveis são criados, ou como surgem as guerras culturais e os movimentos sociais,
sem falar que a ideologia é importantíssima para compreender o panorama político
brasileiro que foi palco de uma ascensão da extrema direita muito graças a mídia e o
conservadorismo do país atrelados com o fenômeno das Fake News. De um olhar
externo pode até parecer que os textos não possuem ligações entre si, mas quanto mais
se estuda, nota-se a teia que os conecta, permitindo assim compreender o cenário
sociológico da nossa sociedade contemporânea.
Um dos principais fatores para alcançar essa compreensão é aceitar que as redes sociais
vieram pra ficar. Através do livro “O Filtro Invisível: O que a internet está escondendo
de você”, entende-se o fator da identidade nessa sociedade hiper conectada, em que a
personalidade do usuário molda o filtro dos conteúdos que serão consumidos até o
momento em que esse filtro começa a determinar a personalidade do usuário em um
loop contínuo. Dessa maneira, o usuário fica mais sugestivo a receber conteúdos que ele
vai se identificar mais, gerando uma bolha de informação da qual dificilmente ele vai
sair por conta própria se não houver um estímulo de verdade. Fato é que esses filtros e
essas bolhas seguem ideologias e interesses que muitas vezes são ocultados, por isso é
necessário refletir sobre o comportamento online para não ficar restrito a padrões e
mecanismos guiados pelos outros.
Ainda nessa questão, fica fácil de entender a alta disseminação de fake news quando se
analisa elas dentro de bolhas de informação. As fake news são uma das principais
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Resenha da primeira unidade de textos da cadeira de Comunicação e Sociologia
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Aluno de Graduação do 1º semestre do Curso de Jornalismo da UFC
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Professora da cadeira de Comunicação e Sociologia

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ferramentas que a direita brasileira se utiliza para atacar seus adversários, e elas são
extremamente eficazes porque são distribuídas dentro de bolhas de pessoas que tem uma
tendência muito maior a acreditarem nelas, muitas vezes por causa da ideologia que
seguem ou pela falta de um letramento digital adequado. Sem falar que as redes sociais,
como Whatsapp e Facebook, foram as mais “culpadas” por serem espaços sem lei em
que essas fake news rodam livremente. Segundo o texto “O que são, afinal, fake news,
enquanto fenômeno de comunicação política?” de Tatiana Dourado e Wilson Gomes, é
necessário desenvolver ações específicas para combater as fake news, já que elas são
apenas sintomas de ataques a credibilidades de instituições como o STF ou TSE e outas.
Dentre essas ações incluem-se o letramento digital da população e a checagem de fatos,
prática essa que se tornou cada vez mais necessária no meio jornalístico dado o número
de mentiras difundidas desde as eleições de 2018.
Evento que foi destrinchado pela tese de Fabíola Mendonça de Vasconcelos que focou
em analisar o papel de grandes jornais como O Globo e A Folha de São Paulo durante a
ascensão política de Jair Bolsonaro. Aceitando que as fake news foram uma das
ferramentas mais eficazes que levou o presidente a ser eleito em 2018 (vide a histórias
como a mamadeira de piroca), vale salientar que a mídia teve um papel importantíssimo
nessa eleição ao incentivar o antipetismo e quase sempre banalizar as horríveis
declarações e comportamentos de Bolsonaro em diversas ocasiões. Um dos exemplos
mais ridículos dessa isenção midiática foi quando o Estadão lançou um editorial sobre
os candidatos a presidente (Haddad e Bolsonaro) com a chamada “Uma escolha muito
difícil”. Dado toda a trajetória que a democracia teve que percorrer para continuar
existindo, é revoltando que os jornais não assumam um compromisso ideológico para
com a liberdade em prol de interesses financeiros, que são os que mais movem a roda
contra a esquerda. É por isso que Jair Bolsonaro conseguiu se eleger. Ele tinha o povo
acreditando nas suas fake news, os jornais longe de denunciar a imoralidade de suas
ações e uma nação caminhando para se tornar cada vez mais conservadora.
É nesse Brasil contemporâneo e conservador que as guerras culturais se fazem cada vez
mais presentes. Em um país que uma maioria tenta de formas cada vez mais violentas
oprimir as minorias, é necessário unir-se para lutar e reivindicar direitos básicos como
ter sua orientação sexual e nome social respeitados, poder ocupar lugares sem medo e
ter acesso digno a educação, saúde e lazer como o resto da população possui. No
entanto, a ideologia dominante (liberal conservadora cristã) faz com que uma grande
maioria não consiga nem enxergar as minorias como pessoas que também possuem
esses direitos, acarretando assim nas guerras culturas, termo esse cunhado por James
Hunter em seu livro Culture Wars: The Strugle To Define America que é a base do texto
Guerras Culturais: Conceito e Trajetória de Cristina Teixeira de Melo e Paulo.
Segundo os autores, as guerras culturais nascem do dilema moral em torno de questões
como sexualidade, posição da mulher na sociedade, aborto, racismo e outros temas
“delicados” perante a sociedade. Em um governo de extrema direita é mais que óbvio
que essa guerras se intensifiquem devido a falta de interesse em proteger os direitos das
minorias existentes. O Governo Bolsonaro rejeita tudo que não segue a ideologia deles,
e é por causa disso que ministérios como o da Cultura foram extintos, porque eram um
dos poucos que estavam interessados em abrigar essa diversidade de existências de um
país tão gigantesco quanto o Brasil.

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E como resolver essas guerras culturais? A resposta se dá através dos movimentos
sociais. Segundo o autor Manuel Castells, o legado de um movimento social consiste na
mudança cultural produzida pela sua ação. Existem vários grandes movimentos que
mudaram a história do Brasil como o Diretas Já, o movimento dos Caras-Pintadas e
mais recentemente as Jornadas de Junho, que começaram com protestos pelo aumento
de vinte centavos nas passagens de ônibus e acabou acarretando no impeachment da
presidenta Dilma Rousseff. Isso porque é ingenuidade acreditar que esses movimentos
também não seguem uma ideologia e interesses ocultos da elite que domina o nosso
país. No entanto, há esperança em movimentos sociais comandados por minorias, que
encontraram nas redes sociais uma maneira de se fortalecer.
Indivíduos que antes eram oprimidos por guerras culturais, conseguem encontrar seus
iguais graças a Internet, que concentra toda essa indignação e a usa como combustível
para exigir mudanças sociais. Um dos grandes exemplos é o atual movimento do
“#EleNão” que movimentou diversas pessoas contra a figura de Jair Bolsonaro. É
graças a esses movimentos sociais que o Brasil não sucumbiu de vez à extrema direita e
sua ideologia conservadora, conseguindo resistir, mesmo que aos poucos, em um
mundo cada vez mais extremista e conectado. Como diz Manuel Castells no final do seu
livro, “pois o que é irreversível no Brasil como no mundo é o empoderamento dos
cidadãos, sua autonomia comunicativa e a consciência dos jovens de que tudo que
sabemos do futuro é que eles o farão. Mobilizados”. Uma frase que funciona como
encerramento, afirmação e profecia acerca do nosso futuro.
Através de todos esses textos e conceitos, a conclusão é que ser jornalista no Brasil
contemporâneo exige uma carga imensa de estudos históricos para compreender os
erros do passado e não repeti-los por pura ignorância. Além de que é altamente
necessário manter-se informado através das redes sociais, ainda que reconhecendo os
malefícios que elas trazem como os filtros invisíveis e as bolhas de informação, pois a
Internet é algo que veio para modificar todas as áreas do comportamento humano,
incluindo a comunicação e a política, que são as que geram mais empenho tanto de
quem produz conteúdo quanto de quem consome. Daí surge a necessidade da
responsabilidade, do bom senso e da honestidade para que não seja necessária uma
checagem de fatos a cada frase dita em uma simples declaração.
Dito isso, ressalto a importância de analisar o recorte temporal que essa cadeira do curso
foi ministrada. Até o momento essas aulas foram importantíssimas para minha formação
como profissional porque ampliaram meus conhecimentos na área da sociologia, sendo
uma das que mais me interesso desde a época do ensino médio. Isso porque acredito que
um bom jornalista é aquele que é humano, e essa disciplina me ensinou que é necessário
desconstruir-se das suas crenças ideológicas prévias, assimilar o futuro e lutar por
aqueles que mais precisam.

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