Você está na página 1de 5

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA – UFU

INSTITUTO DE HISTÓRIA – INHIS

HISTÓRIA DO BRASIL REPÚBLICA II

PROFESSOR MARCELO LAPUENTE MAHL

RESENHA

Wallerstein, Immanuel – As Agonias do Liberalismo - Revista Lua Nova (34) • Dez 1994.

Samuel Alves Melo - 11911HIS205

Uberlândia - MG

2022
A Revolução Francesa deixou diversas marcas na sociedade. Uma das principais
marcas, foi o momento simbólico do fim do ancien régime, marcando uma mudança
política profunda. Marcando também o entendimento de que mudanças políticas eram
normais, e que, eram feitas pela própria população, o poder estava em suas mãos e não
mais nas de um soberano.

Com a derrubada dos anciens régimes, abriu-se espaço para o desenvolvimento


das novas ideologias do século XIX, sendo elas: o conservadorismo, o liberalismo e o
comunismo, “que forneceram a linguagem dos debates políticos subsequentes no interior
da economia mundial capitalista.”1 Entretanto, dentre as três ideologias, o liberalismo
saiu triunfante. Conseguindo o apoio da direita e da esquerda, oferecendo o que cada uma
precisava naquele momento; “Para, a direita pregou concessões; para a esquerda,
organização política.”2 Para os conservadores pareceu acalmar os instintos
revolucionários, e para a ala radical, forneceu mudanças concretas no presente. Sendo
assim, o liberalismo estabeleceu um caminho de longo prazo para as duas alas políticas,
que resultou em uma via intermediária, beneficiando em todo caso o próprio liberalismo.

Além dos fatores políticos, o liberalismo contou com um conceito organizador, o


chamado, “reformismo racional” que consistiria na presunção de que os homens eram
naturalmente racionais e eles, ou os mais racionais, deveriam indicar o caminho, ou seja,
as reformas necessárias para se alcançar o progresso. Além disso, novamente o
liberalismo consegue agradar ambos os lados, mesmo de forma contraditória em alguns
momentos, como:

Os liberais podiam simultaneamente argumentar que o indivíduo não deveria ser


constrangido pelos mandatos (coletivos) do Estado e que a ação do Estado era
necessária para minimizar as injustiças contra o indivíduo. Eles podiam, então,
ser simultaneamente favoráveis ao laissez-faire e às leis de regulamentação do
trabalho, pois o que importava aos liberais não era nem o laissez-faire, nem essas
leis per se, mas sim o progresso deliberado e estável em direção à boa sociedade3

O liberalismo se tornou um governo dos “melhores”, todavia, os melhores não


eram mais definidos pelo nascimento ou pelo sangue, como em épocas anteriores, mas
passaram a ser avaliados pelo nível educacional. Em última instância, os melhores são os
beneficiados da meritocracia. A necessidade de ter um pequeno grupo no poder, existe

1
Wallerstein, Immanuel – As Agonias do Liberalismo - Revista Lua Nova (34) • Dez 1994. p.119.
2
Idem. p.120.
3
Idem. p.121.
exatamente para impedir que o governo seja de todos. Sendo assim, o liberalismo não se
apresenta como antiestatista, mas sim, como antidemocrático, “o liberais defendiam
sempre que apenas o reformismo racional barraria o advento da democracia, um
argumento que ao final seria aceito com simpatia por todos os conservadores
inteligentes.”4 Essa característica, acaba remontando as próprias raízes do liberalismo,
sendo esse, um dos objetivos do liberalismo como ideologia.

Durante o período liberal, um importante fator ocorrido foi a mudança daqueles


que eram considerados pertencentes as classes perigosas, da segunda metade do século
XIX para a primeira metade do século XX. Durante a segunda metade do século XIX, as
classes perigosas consistiam nas classes trabalhadoras da Europa e EUA, que eram
administradas por meio de concessões: “a elas foi oferecido sufrágio nacional
(masculino), o início do Estado de Bem-Estar, uma identidade nacional.”5 Neste contexto,
a identidade nacional é pensada comumente em relação a outros povos ou nações,
considerando esses povos inferiores ou inimigos de sua nação, neste caso, contra o mundo
não-branco. Sendo assim, “O imperialismo e o racismo eram parte de um pacote oferecido
pelos liberais às classes trabalhadoras européias e norte americanas sob a aparência do
“reformismo racional”.”6

Já na primeira metade do século XX, as classes perigosas estão localizadas no


terceiro mundo ou sul global. E essa mudança geográfica, gera uma grande mudança na
base do discurso liberal, o reformismo racional. Em uma perspectiva mundial, o
reformismo social atrelado ao racismo e imperialismo, não fazia sentido, pois,
anteriormente eram as novas classes perigosas, o alvo de racismo e imperialismo dos
países europeus e norte-americanos, visto que, esses alvos eram externos a nação europeia
ou norte-americana. Esse caso, demonstra como o liberalismo se propõe como
universalista, entretanto, ao expandir as ideias liberais ao globo, resultou na exposição de
suas contradições, principalmente em relação a democracia.

A partir de 1945, os EUA se consolidam a maior força econômica e militar, apesar


do grande exército soviético, os EUA contavam com a bomba atômica. Com isso, eles
foram capazes de organizar politicamente o sistema mundial. O período de 1945-1968,

4
Idem. p.122.
5
Idem. p.122.
6
Idem. p.122.
foi o auge da hegemonia norte-americana e da legitimação global da ideologia liberal.
Um período de grande expansão da economia mundial, em diferentes partes do mundo,
porém, beneficiando mais o norte global em relação ao sul.

Neste período acontece também a chamada “Guerra Fria”, um conflito entre EUA
e URSS, porém, que não ocorrem conflitos nos países em guerra ou na Europa. Em
contrapartida, ocorreram diversos conflitos em outras partes do mundo, principalmente
na Ásia. Esses conflitos aconteciam de diferentes formas, no caso coreano, onde o país
foi dividido em dois, um lado, apoiado pelos norte-americanos e o outro pelos soviéticos,
de forma similar ao que acontecia na Alemanha. Já no caso do Vietnã, a luta nacional
tinha apenas um lado, a dos movimentos de libertação nacional, que não queriam ter
nenhum conflito com os EUA e a Europa, apenas queriam ser deixados em paz por esses
países, baseando-se na própria estrutura dos países imperialistas, “Os movimentos de
libertação nacional estavam, desse modo, protestando contra os poderosos e o faziam em
nome do cumprimento da agenda liberal de autodeterminação das nações e de
desenvolvimento econômico dos países subdesenvolvidos.”7

O período de 1945-1968, foi também “o triunfo mundial das forças anti-


sistêmicas.”8 Isso ocorreu devido, a uma longa gestação de 1848-1945, onde foram
desenvolvidas diversas estratégias pelos movimentos anti-sistêmicos, que também se
estruturaram durante esse período. Isso acarreta um aparente paradoxo, o mesmo
momento de triunfo dos movimentos populares em paralelo com o auge do liberalismo e
a hegemonia dos EUA. Entretanto, mesmo com a vitória de movimentos populares, o
período da Guerra Fria, não resultou em maiores liberdades, pelo contrário, a repressão
interna de todos os países ganhou ainda mais força, pelas tensões geopolíticas mundiais.
Além disso, as desigualdades materiais aumentaram ainda mais.

O fim do período, ocorre graças a revolução mundial de 1968. Um movimento


que estava posicionado “contra o sistema histórico como um todo – contra os Estados
Unidos como poder hegemônico do sistema contra as estruturas econômicas e militares
que constituíam os pilares do sistema.”9 O desenvolvimento das ciências sociais que era
apoiado pela ideologia liberal, em função do reformismo racional, foi usado para

7
Idem. p.125.
8
Idem. p.125.
9
Idem. p.126.
questionar os próprios liberais, e o que distinguia aquele grupo dos demais, o que fazia
eles estarem entre os “melhores”. O movimento de 1968, foi como um rápido brilho na
história, em apenas três anos ele acabaria, porém, acabou deixando muitas marcas, a
principal delas talvez seja marcar o fim da era de uma centralidade do liberalismo, ou
como a única ideologia possível, recolocando-a como uma dentre tantas outras estratégias
políticas.

O período de 1968-1989 teve como seu último marco, o colapso dos comunismos.
Esse período, de acordo com o autor, gerou um enorme caos político/social. Esse caos,
parece surgir da grande insatisfação da população com a desigualdade do sistema e
consequentemente, a falta de democracia. Deste assunto, o autor mostra dois fatores: “o
crescimento do total da riqueza material e o fato de que não apenas um punhado de
pessoas, mas certamente menos do que a maioria delas até agora pôde viver bem”10 Sendo
assim, é necessário a busca por um modelo mais igualitário e democrático e para isso, é
precisar atuar em frentes intelectuais/culturais para tratar o problema do eurocentrismo,
requisito básico para a igualdade das pessoas, dos cidadãos, de qualquer nacionalidade,
raça ou religião.

10
Idem. p.133.

Você também pode gostar