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A INCLUSÃO DE PESSOAS COM NECESSIDADES ESPECIAIS NO ENSINO

FUNDAMENTAL

Edilene do Carmo Lima Barbalho

1- Introdução

A Constituição Federal de 1988 trouxe um grande avanço a educação brasileira, ela assegura e
propõe avanços significativos, elege a cidadania e a dignidade da pessoa humana
(art.1ºincisos II e III) como um dos seus objetivos fundamentais: a promoção do bem de
todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade, e quaisquer outras formas de
discriminação ( art. 3º, inciso IV) e também garante o direito a igualdade ( art.5º) e trata no
artigo 205 e seguintes, do direito de todos à educação. Esse direito visa "o pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para a cidadania e sua qualificação para o trabalho".
Além disso, garante “igualdade de condições, e acesso e permanência na escola” (art.206,
inciso I).
Esta lei por si só já seria suficiente para que as instituições escolares passassem a
repensar a educação como um direito inegável a todos, independentemente de suas
deficiências. Dentre outras, podemos citar também, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB DE 1996), que não só garante o acesso e permanência de todos na escola, mas
acrescenta que é dever do Estado prover o acesso destes educandos e também dos com
necessidades especiais, preferencialmente nas escolas públicas.
Na Declaração de Salamanca, uma lei muito importante sobre princípios, políticas e
práticas relativas às necessidades especiais que, resultou da Conferência Mundial sobre
Necessidades Educativas Especiais, realizada na Espanha em 1994, é dada orientação acerca
das estruturas e ações necessárias ao bom desenvolvimento das práticas relativas à inclusão
seja pelo setor público ou privado, destacando a necessidade do investimento público no que
tange às políticas, financiamento e preparação de profissionais para este intento.
O princípio básico da inclusão escolar, de acordo com essa Declaração, consiste em
que as escolas reconheçam as diversas necessidades dos alunos e a elas respondam,
assegurando-lhes uma educação de qualidade, que lhes proporcione aprendizagem por meio
de currículo apropriado e promova modificações organizacionais, estratégias de ensino e uso
de recursos, dentre outros quesitos.
Parto do pressuposto que a inclusão de pessoas com deficiência na escola e em vários
segmentos da sociedade vem ganhando espaço, mesmo assim tais pessoas continuam vítimas
de preconceito por serem consideradas diferentes. Dessa forma as conquistas em relação aos
direitos destas pessoas acontecem nas leis, mas não se concretizaram na vida cotidiana.
O exposto associado às diversas conversas, leituras e palestras relacionadas ao assunto,
me levou a perguntar:
- Como a inclusão está acontecendo dentro das escolas?
- Existe na escola um PPP que atenda as pessoas portadoras de necessidades especiais?
- Em caso afirmativo, como são cumpridos os objetivos propostos no PPP?
- Há, dentro da escola, profissionais capacitados para trabalhar com pessoas portadoras de
necessidades especiais?
Acredito que fazendo uma comparação entre a proposta da escola presente no PPP,
com a lei vigente e com a prática na sala de aula, possamos entender e colaborar com o
entendimento sobre a diferença entre a teoria e a prática da inclusão possibilitando enriquecer
a literatura a respeito do tema, auxiliando a sociedade na busca do crescimento no que diz
respeito à inclusão. Para esta constatação se faz necessário pesquisar na escola se ela realiza o
processo de inclusão previsto em lei.
Sob essa perspectiva, pesquisa qualitativa se revelou como instrumento que
proporcionaria o desenvolvimento dessa proposta. Segundo Oliveira (2007) a pesquisa
qualitativa é

[...] um processo de reflexão e análise da realidade através da utilização de métodos


e técnicas para compreensão detalhada do objeto de estudo em seu contexto
histórico e/ou segundo sua estruturação. Esse processo implica em estudos segundo
a literatura pertinente ao tema, observações, aplicação de questionários, entrevistas e
análise de dados, que deve ser apresentado de forma descritiva. (OLIVEIRA, 2007.
p. 41)

Evidencio, assim, a escolha do método de pesquisa qualitativa, pois seria possível


aproximarm ainda mais do objeto de estudo analisando e interpretando seus aspectos mais
profundamente, oferecendo uma análise detalhada sobre hábitos, atitudes, investigações e
tendências de comportamento.
Iniciado então o trabalho buscando o referencial teórico em que me apoiaria,
simultaneamente realizei a observação in loco para reconhecimento da real aplicação dos
documentos juntamente com entrevistas aos alunos, professores, funcionários enfim, a
comunidade que se envolve direta ou indiretamente na educação inclusiva.
2 – O que é a inclusão

Para que possa dar continuidade a pesquisa sobre “A inclusão de pessoas com
necessidades especiais no ensino fundamental”, faz-se necessário à princípio, entender o que é
necessariamente a inclusão. Para Sousa (2010, p.1), a “inclusão é um processo incidente na
realidade educacional”, ela deve ser concebida nos seus contornos teóricos e práticos para
permitir uma visão crítica desta prática social e não somente de seu discurso que,
gradualmente, está se tornando hegemônico (ao menos no âmbito da Educação Especial),
(MAGALHÃES, 2001,p.1). Ela ainda sugere a postura adequada dos educadores, a
elaboração e a adaptação dos currículos, orientação e intervenção pedagógica, inovação
educativa dos processos integradores, a adaptação dos recursos humanos e de materiais, para
que haja um ensino de qualidade.
Para que ocorra a inclusão escolar deve haver,
Práticas pedagógicas diferenciadas, baseadas na noção de que ao educador cabe
desenvolver o seu trabalho a partir das condições efetivamente existentes na
clientela atendida. A concepção de prática pedagógica diferenciada e inclusiva, por
outro lado, está ancorada na tese de que a heterogeneidade dos alunos deve ser
respeitada e, portanto, os alunos com necessidades educativas especiais têm direito
de participar e de serem considerados membros ativos no interior da comunidade
escolar. Esta inclusão está associada ao redimensionamento de práticas educativas
que visem à superação do fracasso escolar: não basta garantir o acesso à escola, de
crianças com ou sem deficiências, é preciso que a escola esteja apta para lidar com o
aluno real. O que parece estar em jogo quando o assunto é inclusão é a consideração
em torno da DIFERENÇA. (MAGALHAES,2001. p.4).

“A inclusão traz o conceito de que é preciso haver modificações na sociedade para


que esta seja capaz de receber todos os segmentos que dela foram excluídos, entrando assim
em um processo de constante dinamismo político social” (SOUSA,2010) e para isso se faz
necessário o envolvimento e interação da comunidade , educadores, pais e alunos.
Ferreira, 2010 aponta ainda que, “a inclusão é um processo dialético complexo, já que
envolve a esfera das relações sociais, vividas na escola. No seu sentido mais profundo, vai
além do ato de inserir, de trazer a criança para dentro da escola. Significa envolver,
compreender, participar e aprender”.
Falar sobre inclusão de portadores de necessidades especiais, segundo Roseli Ferreira,
deve-se primeiramente conceituar a "deficiência", e ela o faz sob a perspectiva de vários
autores.
Na concepção de Sassaki (2003)
uma criança com deficiência era aquela que, do ponto de vista intelectual,
físico, social ou emocional, estava tão notavelmente desviada do considerado
crescimento normal, que não podia se beneficiar ao máximo com o programa escolar
comum e requereria esta em uma classe especial ou em e serviços complementares.
(SASSAKI apud SOUSA,2010)

Já segundo Paula (2004),

os alunos com deficiência eram aqueles considerados inferiores à média normal com
característica física e psicológicas, que não se ajustavam aos programas escolares
elaborados para a maioria dos alunos, e que necessitam de educação especial e, em
alguns casos, colaboração de serviços especiais ou de ambos, para atingir um nível
compatível às respectivas aptidões ditas normais.(PAULA apud SOUZA,2010).

Mazzota (1982), coloca que, os educandos com desvio acentuado de ordem física,
emocional ou sócio-cultural, para serem adequadamente atendidos, requeriria de auxílios ou
serviços especiais de educação. (MAZZOTAapud SOUZA,2010)
A partir dessas definições as autoras Roseli Ferreira e Rita de Cássia, veem um
conflito entre normalidade e deficiência ,pois:

existe uma tendência de ardente defesa dos aspectos teóricos da inclusão e práticas,
amiúde, pseudo-inclusivas. Porque estamos diante de uma sociedade exclusiva na
qual o racismo, o sexismo e o preconceito contra pessoas com deficiência permeiam
práticas e discursos. Isto leva os professores de classes regulares a representarem a
inclusão de forma confusa, chegando até a serem reforçados preconceitos; assim na
escola, a ideia de deficiência acaba por sobrepujar as “necessidades educativas” de
cada aluno. Com efeito, evidencia-se, no que diz respeito à inclusão escolar, um
conflito de representações sobre normalidade/deficiência.( MAGALHÃES,
2001,p.2).

e ainda que o importante é oferecer serviços complementares, adotar práticas criativas na sala
de aula, rever posturas e construir uma nova filosofia educativa não esperando que a pessoa
com deficiência se adapte à escola, mas que esta se transforme de forma a possibilitar a
inclusão daquela.
É necessária a percepção de que “o conhecimento é construído pelo sujeito e a
aprendizagem, é um processo com tempo e ritmo diversificado, determinado pela qualidade
da interação, do nível de participação e problematização, das oportunidades de vivenciar
experiências, e de construírem significados, elaborar e partilhar conhecimentos em grupos”
(SOUSA, 2010 p.4). A autora afirma ainda que para que o
sucesso da educação inclusiva realmente aconteça, surge a necessidade dos
professores estarem empenhados na interação desses alunos e que haja interesse em
compreender suas necessidades e desejos disponíveis para interpretar suas formas de
expressão e comunicação que, muitas vezes, os diferenciam dos demais. E,
principalmente, professores que estejam empenhados a ensinar de forma realmente
significativa. (SOUSA, 2010 p.4)
Dessa forma,
incluir exige dos educadores novos posicionamentos, modernizando a escola e
fazendo com que os professores transformem suas práticas para que, de fato, todos
os alunos aprendam.
É necessário operacionalizar a inclusão escolar afim de que todos os alunos,
independentemente de classe, raça, gênero, sexo, características individuais ou
necessidades educacionais especiais, possam aprender juntos com qualidade. Esse é
o grande desafio, numa clara demonstração de respeito à diferença e compromisso
com a promoção dos direitos. (SOUSA,2010 p.5)
Assim,
o fato de a criança ser matriculada e frequentar a sala de aula regular, por si só, não
garante a sua inclusão – esta última pressupondo mudanças valorativas e atitudinais,
e envolvendo transformações dos padrões curriculares da escola que
convencionalmente tende a reificar os estigmas associados às pessoas com
deficiência. ( MAGALHÃES, 2001,p.2).

A prática inclusiva vai além da administração da matrícula. O que realmente vale é


oferecer serviços complementares, adotar práticas criativas na sala de aula, rever posturas e
construir uma nova filosofia educativa.
No artigo de Roseli Ferreira é apresentada a necessidade de adequação de espaço,
mobiliário, adaptações em todos os espaços físicos e nos materiais para a prática educativa da
inclusão e a Rita de Cássia frisa que não basta esta organização, que

não se pense que a aceitação e o respeito à diversidade é tarefa que diz respeito
apenas à capacitação de professores e a existência de condições humanas e materiais
na escola, a solidariedade ou a tolerância. Dessa forma, é no projeto pedagógico que
a escola se posiciona em relação a seu compromisso com uma educação de
qualidade para todos os seus alunos. Assim, a escola deve assumir o papel de
propiciar ações que favoreçam a interação social, definido em seu currículo, uma
opção por práticas heterogêneas e inclusivas”. ( MAGALHÃES, 2001,p.4).

A respeito das diferenças as duas autoras concordam que as diferenças não são
características naturais e sim produzidas em discursos, até porque não se pode ser totalmente
diferente por pertencermos a uma mesma raça. Os “diferentes” e os “não-diferentes” são
produtos sociais e são associados a relações de poder.
Em relação aos profissionais atuantes na educação inclusiva, conforme Paula (2004)
“na educação inclusiva torna-se imprescindível que os educadores se coloquem como
profissionais transdisciplinares, com conhecimento básico em cada área específico
(fisioterapeuta, psicólogo, terapeuta ocupacional, médico etc.) não esquecendo de agir, sem
interferir com respeito, ampliando o olhar, avaliando o aluno conforme o potencial de seu
próprio ser constituinte, favorecendo as diversas formas de comunicação e apoiando a
individualidade de cada um, na solução de problemas”. (PAULA apud SOUZA, 2010).
4 – A escola e os desafios da inclusão

A escola pesquisada é pública e situa-se no bairro União e atende a alunos do bairro


Horto, Cidade Nova, União, São Marcos, Ana Lúcia, Bom Retiro, dentre outros da região. A
maioria dos alunos é de família de baixa renda. A escola foi escolhida por possuir 5 alunos do
Ensino Fundamental 1 com deficiência de aprendizagem e uma aluna com paralisia cerebral,
esquizofrenia e epilepsia com 25 anos e que pertence ao 2º ano do Ensino Médio, a quem
denominarei “aluna x” .
Os alunos matriculados, com a faixa etária compreendida entre 6 e 15 anos no Ensino
Fundamental e entre 15 e 22 anos no Ensino Médio. No horário matutino, funciona o ensino
médio e uma turma do Projeto Tempo Integral com alunos do primeiro ao sexto ano do
Ensino Fundamental e no horário vespertino o Ensino Fundamental.
A informação obtida sobre o Plano Político Pedagógico (PPP) da escola foi de que
ele estava em construção e por isso não seria disponibilizado para análise.
Além das salas de aula, uma quadra, biblioteca, cantina e administração a escola conta
com uma sala de recursos que atende aos alunos com necessidades especiais no horário da
manhã.
O Programa de Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais, instituído pelo
MEC/SEESP por meio da Portaria Ministerial nº 13/2007, define que o objetivo das salas de
recursos é
Apoiar a organização e a oferta do Atendimento Educacional Especializado – AEE,
prestado de forma complementar ou suplementar aos estudantes com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento, altas habilidades/superdotação
matriculados em classes comuns do ensino regular, assegurando-lhes condições de
acesso, participação e aprendizagem.

E afirma que que o programa disponibiliza equipamentos e materiais pedagógicos que


possibilitam o atendimento educacional especializado.
O que se vislumbrei foi o trabalho da professora da sala de recursos que se desdobra
para realizar atendimentos no contra-turno e a sua dificuldade em se preparar para atender a
alunos com deficiências distintas e com necessidades específicas para as quais seriam
necessários aprofundamentos dentro das possibilidades cognitivas de cada indivíduo para que
assim o seu desenvolvimento pudesse ser mais efetivo.
Ficou nítido também o grande desafio vivido diariamente pela professora de apoio que
acompanha a aluna com paralisia cerebral. A escola não possui nenhum recurso pedagógico
ou técnico que possa ser utilizado para auxiliar no desenvolvimento da aluna. A aluna não se
adapta à turma em que foi matriculada, ficando todos os seus dias junto aos alunos do Ensino
Integral.
O desenvolvimento nos campos sociais e afetivos da aluna citada foram visíveis e de muito
sucesso, porém no que tange os conhecimentos escolares, a prática é inexistente. Não há na
escola nenhum tipo de recurso técnico ou material que se possa trabalhar de acordo com os
Planos Curriculares Nacionais (PCN’s), onde consta que as práticas observadas devem
atender aos objetivos propostos no processo de leitura, desenvolvimento do conhecimento do
aluno e ao princípio uso →reflexão →uso.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No Ensino fundamental, percebe-se a possibilidade da inclusão dos alunos com
necessidades especiais especialmente no que tange a socialização. Vê-se claramente a
articulação, aceitação, diálogo e colaboração entre todas as crianças com ou sem necessidades
especiais. Nesse período de pesquisa foi notório o cuidado e o carinho com que as crianças do
Projeto Tempo Integral tratavam a aluna “X”, mesmo em seus momentos de crise, o que , por
questões de segurança física das crianças da turma, se fazia necessário o seu afastamento

O acesso a escola esta garantido, mas pelo visto o questionamento ainda persiste: a escola está
apta para lidar com o aluno real?
~ não basta garantir o acesso à escola, de crianças com ou sem deficiências, é preciso que a
escola esteja apta para lidar com o aluno real.
REFERÊNCIAS

BRASIL.Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo:


Editora Fisco e Contribuinte,1988. 135p.

DECLARAÇÃO DE SALAMANCA. Disponível em:


<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/ salamanca.pdf>. Acesso em: 4 junho 2013.

LDB 1996. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Disponível em: <


http://portal.mec.gov.br/ seed/arquivos/pdf/tvescola/leis/lein9394.pdf> Acesso em: 3 junho
2013.

MAGALHÃES, Rita de Cássia Barbosa Paiva.Construindo um olhar multicultural sobre a


educação inclusiva: primeiras aproximações.UECE/CED. Disponível em:
<http://www.cefetes.br/gwadocpub/ Pos-Graduacao/Especializa%C3%A7%C3%A3 o%20em
% 20educa%C3%A7%C3%A3o%20EJA/
Publica%C3%A7%C3%B5es/anped2001/textos/p1566139621984.PDF>. Acesso em: 9 junho
2013.

OLIVEIRA, M. M. Como fazer pesquisa qualitativa. 3.ed. Petrópolis (RJ): Vozes, 2008.
181p.

SOUSA, Roseli Ferreira de.Inclusão no ensino regular. 2010. Disponível


em:<http://www.pedagogia.com.br / artigos/ensinoregular/index.php?pagina=0> Acesso em:
9 junho2013.
Programa Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais

http://portal.mec.gov.br/escola-acessivel/194-secretarias-112877938/secad-educacao-
continuada-223369541/17430-programa-implantacao-de-salas-de-recursos-
multifuncionais-novo

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