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Trilogia

O GOSTO
DAS COISAS
Vol. I
E o Rock nã o Morreu

Leopoldo Pontes

Todos os direitos reservados


© 2019

Capa sobre fotografia de Fafí Pontes

À FAFÍ...

Sumá rio
À Fafí...
FUTEBOL
CIDADES
sonhos n° 1
O GOSTO DAS COISAS N° 1
OÁ SIS
Homens de CabeloS CompridoS
OCIDENTE E ORIENTE
O GOSTO DAS COISAS Nº 2
LOUCOS E O PRECONCEITO
CHIMARRÃ O
A PALAVRA NÃ O É A COISA
A BIBLIOTECÁ RIA
VIVER EM MARTE
ANDRÓ IDES
A HARMONIA DAS ESFERAS Nº 1
UM OLHAR SOBRE A MIOPIA
O PRAZER DA RELEITURA
A SEGURANÇA CIENTÍFICA
O VALOR DO RODAPÉ
A LIBERDADE É UMA BICICLETA
SONHOS Nº 2
MULHERES DE CABELOS COMPRIDOS
VENDEM-SE SÍMBOLOS
MÚ SICA-MERCADORIA
MÚ SICA-OBJETO
A INTERRUPÇÃ O PELA MORTE
SABEDORIA
A RESPOSTA NÃ O-VERBAL
MORENO OU MULATO?
Á LEA
O MUNDO ABSTRUSO
ASSUMINDO PONTOS POSITIVOS
MACARRONADA
ABANDONANDO A APATIA
O BOTÃ O DA ESPIRITUALIDADE
EMPRESTAR LIVROS
O PRIMEIRO DIA
BIBLIOTECAS
RETORNO AO CHIMARRÃ O
A EXPERIÊ NCIA DIRETA
ARROZ DE CARRETEIRO
O CENTRO E O CÍRCULO
OUTRO OLHAR SOBRE A MIOPIA
SURREALISMO E ROCK
ABREVIATURAS
LER DEVAGAR
EQUILÍBRIO
SONHOS N° 3
A EXPRESSÃ O DA BELEZA
MAYA
A OBJETIVIDADE DA ARTE
A FUNÇÃ O DA ARTE
O GOSTO DAS COISAS N° 3
O PRAZER E A DOR
IMAGENS NO DIA-A-DIA
A REPRESENTAÇÃ O DO INSTANTE
A HARMONIA DAS ESFERAS Nº 2
O HOMEM DE BEM
CONHECER A LEI Nº 1
CONHECER A LEI Nº 2
A CONDIÇÃ O DA BELEZA
O RITMO DE CADA UM
O SILÊ NCIO MEDIEVAL
A MÚ SICA E O SILÊ NCIO
A ESCOLA E O DESSERVIÇO
UM
DOIS
Agrura no Trâ nsito
Sentir ou entender
Mandala
O Ser Humano, esse Desequilibrado Nº1
Cevada
O Ser Humano, esse Desequilibrado Nº2
Destino
Silêncio para Ouvir Mú sica nº1
Ouvir o Silêncio
Silêncio para Ouvir Mú sica nº2
O Ponto de Vista de Quem Observa
O que é Real
Jiló de Panela
Arte e Artesanato
Calabresa com orégano
Beleza
Querela dos Universais
Tornar-se Devoto
Arroz de Torresmo
Felicidade
Felicidade entre os Animais
Equilíbrio e Paz nº1
Abalados pelo Trâ nsito nº1
O Silêncio do Dia de Descanso
Abbey Road
Dedo-de-Moça
Democracia
Abalados pelo Trâ nsito nº2
Equilíbrio e Paz nº2
O Tempo do Mundo
Os Chakras e as Notas Musicais
A Mandala Pessoal
O Carma
Inverno
O Tempo Circular nº1
O Feminino no Poder
Saber Parar
E o Rock Nã o Morreu
Vento
Simplicidade na Culiná ria
O Tempo Circular nº2
O Tempo Circular nº3
O Nascimento do Universo nº1
O Nascimento do Universo n°2
Vai-e-vem
O Tempo no Vai-e-vem
A Eternidade
Em Memó ria de Nossos Avó s
Instrumentos Antigos
O Ser Humano, esse Desequilibrado Nº3
Trazer a Índia
Ouvir Mú sica
LP e Mú sica Digital
Lygia Fagundes Telles
ANTES DO RELÓ GIO
Apêndice: Genesis 1;1
SOBRE O AUTOR

FUTEBOL

Era criança. Meu pai adorava futebol, eu tentava. Tentava gostar. Ouvia jogo no radinho de
pilha sem entender nada. Chutava bola mais torto que qualquer um. Geralmente era
escalado para o gol.
Meu pai tinha cadeira cativa no está dio do Sã o Paulo Futebol Clube. E à s vezes me levava ao
jogo. Eu ia. Um dia, perguntei:
- Papai, aqueles jogadores de preto, que time eles sã o?
(Eram os goleiros...) Meu pai nã o escondeu a decepçã o, e nã o se furtou a contar o fato aos
amigos. E rir. Na minha frente.
Nunca mais me levou ao futebol.
CIDADES

Joã o Cabral de Melo Neto disse que Sevilha é uma cidade feminina. Eu entã o me perguntei:
e qual nã o é?
Pois qualquer cidade em si é feminina, acolhendo as pessoas em seu ventre. Vir ao mundo
numa cidade é ser filho dela. As pessoas nela nascem, trabalham e morrem. Nem sempre de
forma agradá vel, mas vivem.
O campo é má sculo, com seus tratores e enxadas. Ali se vive debaixo de sol e vento,
temperamentos masculinos.
É certo, a cidade tem seu animus, pois é masculinamente quadrada, cheia de arestas, cantos,
diferente da natureza, redonda e protuberante. E a anima do campo é a floresta, o bosque,
os animais.
A caatinga e o deserto sã o masculinos, sem dú vida, com sua aridez e seus limites. E seu lado
feminino é o oá sis. E as poucas plantas sobreviventes.
O mar? Evidentemente, nã o preciso dizer. Pura á gua e redondamentos.
SONHOS N° 1

Sonhos, como os temos em nossa infâ ncia e juventude, sã o pensamentos e sentimentos


constantes, confortantes, que nos fazem viver, criar, buscar novos limites!
Nã o devemos abandoná -los. Nunca! Viver sem eles é vegetar, é andar sem rumo, sem guia.
É deixar-se levar pelo abandono de si mesmo, pelo obscurecimento de nossa pró pria vida.
Houve um tempo em que eu achava que nã o tinha sonhos, só projetos. Encarava-os dessa
forma. Eles, na verdade, nã o eram devaneios puros, mas tinham caminhos por onde seguir,
se apoiavam na realidade circundante. Até que aprendi que deveríamos deixar de ter tantos
planos para reaprendermos a sonhar. De forma desmedida, com os olhos da alma!
Os ideais podem ir mudando, alterando-se com o nosso amadurecimento. É natural que
isso aconteça, porque vamos nos deparando com situaçõ es diferentes a cada dia, pessoas
outras, lugares distintos.
Podemos também adquirir novos, e assim envelhecermos com espírito de renascença.
À s vezes, uma aspiraçã o só existe para solapar outra, mais primordial. Aí reside a
necessidade que temos de descobrir quais sã o nossos sonhos realmente. A verdade
escondida por outra aparente. Podemos viver toda uma vida achando que sonhamos algo,
quando na realidade queremos é outra coisa.
O GOSTO DAS COISAS N° 1

Há um sabor que fica em nosso coraçã o quando apreciamos um belo quadro. Na verdade,
nã o precisa ser bonito, mas deixar-nos perplexos diante dele.
Grande importâ ncia têm também as gravuras e o grafismo, o traço. É como a verdadeira
imitaçã o da vida, porque na natureza nã o há linhas e contornos: isso é ilusã o de nossa vista.
O que existe sã o cores e por isso as telas nos chamam tanto a atençã o.
Um desenho limita as superfícies e nos ilude com suas fronteiras. A pintura nos faz isso
também, deixando-nos crer que vemos traços e linhas.
Para um quadro mexer com a gente, é necessá rio que nos imite em alguma coisa. Um
sentimento, um pensar, um modo de ser. Olhamos uma imagem e nos vemos refletidos nela,
como num espelho, e aí gostamos. Ou nã o. Mas aquilo nos diz alguma coisa, algo que nã o
podemos falar em palavras.
A pintura, como a mú sica, ou a poesia, o cinema, nã o pode ser explicada verbalmente, mas
sempre podemos falar sobre ela. As palavras ajudam a entender, mas nunca vã o até lá .
Podem chegar perto, mas nunca lá . A nã o ser, talvez, por meio de um poema.
Aliá s, a conversa nunca é totalmente compreensível. Como é ilusó ria a comunicaçã o
interpessoal... Nunca nos entendemos perfeitamente, e por isso precisamos da arte,
necessitamos dela sempre!
A arte nos une e só ela pode nos fazer compreender uns aos outros.
OÁ SIS

Na língua portuguesa, há algumas palavras que surpreendem. Vou falar sobre uma delas:
oá sis.
Oá sis é singular e plural ao mesmo tempo: posso falar o oásis ou os oásis. Assim, oá sis no
deserto é um dos vá rios, alguns ou todos! O oá sis; os oá sis. Oá sis é oá sis, oá sis sã o oá sis: o
que é, sã o.
Nã o há diferença se é ou se sã o. Há a existência, existir oá sis.
HOMENS DE CABELOS COMPRIDOS

Um velho costume mandava a todos os homens manterem seus cabelos curtos. Quando eu
era criança, meu pai sempre mandava cortar meu cabelo à moda americana, raspado dos
lados e atrá s, com um tufinho em cima, que encaracolava. Depois, ao chegar à adolescência,
com o rock e a moda de entã o, meus cabelos cresceram. Eram longos cabelos
encaracolados.
Com o passar dos anos, muitos dos jovens amadureceram e mantiveram seus cabelos
compridos. Meio esbranquiçados, em menor nú mero de fios, mas compridos.
Nã o falo desses que mantém rabinhos, porque aí nem aparecem muito, mas dos que os
deixam soltos, ao vento, como verdadeiras bandeiras, como a dizer que têm alguma coisa
diferente das pessoas comuns.
Quando eu era adolescente, via rapazes de cabelo comprido e os achava com cara de sá bios.
Eles pareciam mais calmos que o normal. Isso mesmo, parecia que aquele modo de se
apresentar mostrava uma certa sabedoria vital, um quê. Os anos se passaram e eles
envelheceram. A maioria cortou a grama, alguns só deixaram aumentar depois de adultos.
Vejo hoje alguns moços que também mantém seus cabelos longos. Pode ser uma atitude
rock, em geral, como quando eu era jovenzinho, embora muitos prefiram outro gênero
musical. Mas é diferente, ninguém hoje mais é apontado como pária só porque deixou seu
cabelo crescer.

OCIDENTE E ORIENTE

No século vinte, a cultura ocidental foi imperialista sobre os países do oriente. Haja vista o
poder da Coca-Cola, do McDonald’s, das grandes marcas, enfim, de modo geral advindas do
ocidente. Uma civilizaçã o que levou para o outro lado do mundo os nossos costumes,
métodos, tecnologia.
Agora, com o despertar do novo milênio, volta a ocorrer o que já houve em datas anteriores
na histó ria: uma dialética se constró i. É algo iniciado nos meados do século vinte. Novos
caminhos sã o obtidos com a contraposiçã o entre os dois hemisférios. Enquanto o oeste
ainda tenta manipular o leste, eles jogam seus dados contra nó s, mostrando antigos
métodos de produçã o com menores preços. E assim entram em nosso campo, jogando um
bolã o que antes era nosso. Devolvem-nos os nossos valores e produtos à maneira deles,
mercadorias que antes só nó s fabricá vamos.
No ocidente, a Ioga (ou “o” Ioga, como preferem alguns) é hoje vivenciada ao nosso modo,
como se fosse mais um tipo de exercício físico. Assim também, as lutas marciais e a
meditaçã o. Roupas indianas já sã o artigo comum em nossas feiras e lojas, sendo inclusive
manufaturadas por nó s, assim como os incensos. Até o tradicional sushi já vem sendo feito
com arroz agulhinha empapado.
Ocidente e oriente se amalgamam e formam um terceiro caminho, um novo modelo de
pensar.
No final, o que se conta já nã o é mais tã o oriental ou ocidental, mas uma terceira via, um
resultado que nã o é nem um, nem outro dos anteriores. É uma síntese da velha luta entre
yin e yang.
O GOSTO DAS COISAS Nº 2

Tudo tem um sabor, cada coisa tem seu pró prio gosto, tudo nos é dado com um paladar
pró prio, diferente. A culiná ria é uma arte rara, que mexe com os caprichos, os talantes de
cada um, os aromas, as tramas...
Minha esposa já algumas vezes comentou sobre meu prato sempre conter a comida toda
separadinha.
É que eu gosto de sentir o sabor de cada alimento, porque cada um tem que ter o seu
pró prio prazer.
É o gosto das coisas: cada uma tem o seu, se misturarmos tudo nã o teremos vá rios
prazeres, mas um ú nico, nã o maior que os anteriores, apenas ú nico. Assim valorizo a
culiná ria, quem preparou a refeiçã o, e o prato em si.
É como na vida, onde tudo deve ser saboreado a seu pró prio tempo, em seu lugar. Perceber
as sutilezas de cada detalhe é uma forma de aproveitar cada instante.
LOUCOS E O PRECONCEITO

Quem, afinal, é são de espírito?


HORÁ CIO; Sá tiras, II

Antigamente jogavam pedras nos loucos. O doido da vila era gozado por todos, tratado com
menosprezo. Ou o doido da família. De certa forma, ainda é assim, toda família elege um
anormal. As pessoas têm medo de serem confundidas com eles, temem ser chamadas de
malucas, e assim arrumam um bode expiató rio para sobre ele jogar todos os seus medos.
Riem do louco para mostrar que sã o diferentes dele.
É por isso que se afastam de quem é diagnosticado com alguma insanidade, debilidade
mental, retardo ou deficiência. Grande coisa! Quanto mais tentam se desviar, mais ficam
pró ximas. E mais se parecem com eles.
Três perguntas ficam no ar. A primeira: os loucos têm consciência de sua pró pria loucura?
Eis a indagaçã o feita por alguém que nã o se considera tal. Ninguém tem coragem de admiti-
lo. Todos dizem: eu nã o sou!
O que cada um é, só sabe quando outras pessoas lhe dizem. Cada qual é a somató ria daquilo
que acha que é com o que os outros lhe contam e o que lhe deixam de contar.
Um homem normal, que more numa casa normal, tenha uma família normal, um emprego
normal, uma vida normal, pode estar a um passo da psicose e nã o o saber.
A segunda pergunta: quem é louco? A medida de sua igualdade com a sociedade dá o
resultado. As pessoas tentam se proteger unindo-se com outras, como se todas fossem
igualmente sã s. E nã o o sã o.
Princípios regem a noçã o de normalidade. Estar bem consigo mesmo poderia ser um
princípio. Mas nem sempre o é. Indivíduos tidos como normais costumam ter muitos
problemas, sã o angustiados e perniciosos. Tanto quanto um alienado pode ser.
A derradeira: entã o, quem nã o é louco? A questã o é irrespondível. Afinal, um pouquinho de
piraçã o na vida de cada um é o tempero de nossas personalidades.
CHIMARRÃ O

Toda manhã preparo meu chimarrã o. Ponho minha chaleirinha para esquentar a á gua e
espero as primeiras chiadinhas para entã o desligar o fogo. Nã o pode ferver, senã o queima a
erva.
Trata-se, a erva, de mate nã o queimado, verde ainda, embora seco. Vem embalada em
saquinhos de 500 gramas ou de um quilo. No Sul, pode-se comprá -la a granel.
Arrumo o mate na cuia, também chamada de porongo e, cuidadosamente, vagarosamente,
coloco a á gua quente. Até encher. Entã o, deixo descansar por alguns segundos e assento a
bomba, que é o canudo pelo qual se toma o chimarrã o.
Colocar a bomba exige uma certa artimanha: tem-se que tampar o bocal com o dedo, para
entã o botá -la na á gua, até o fundo, onde deve ficar bem acomodada e firme. Só entã o se
retira o dedo, e nã o se mexe mais. De jeito algum! Aí a á gua dá uma descidinha.
Entã o é só chimarrear. Sento-me em minha poltrona favorita, perto da janela, e deixo os
pensamentos fluírem.
Esse é um ritual para todas as manhã s. Quando está frio, também o pratico no final da
tarde. Ou, se estiver calor, debaixo de um bom ventilador, já que moro no litoral.
É muito bom.
Recomendo.
A PALAVRA NÃ O É A COISA

Tenho notado como as pessoas têm confundido as palavras com aquilo que elas
representam. Principalmente quando se trata de sentimentos. Quero dizer: quando falo
amor, nã o estou mais que me referindo ao anseio. E pessoas acham que o ato de falar já é a
coisa em si. Complicado?
Nem tanto. A palavra já seria a emoçã o, em vez de apenas representá -la. Seria como dizer
que o mapa de um lugar é o territó rio propriamente dito.
Incrível? Pois é o que acontece. Por milênios o ser humano usou palavras para simular
sentimentos, até que chegou o dia em que passou a achar que elas sã o a pró pria coisa em si.
Basta falar eu te amo e já é o amor. Isso, na verdade, nã o deveria ocorrer, mas acontece. E
muito! Ou que invocar um morto trará de volta o ente querido.
Ora, e por que isso se dá ? Nã o sei, mas já é um fato. E quanto mais passa o tempo, mais
existe. Repare só no dia-a-dia, e veja se você também nã o está aplicando isso em sua vida.
De minha parte, estou me policiando.
A BIBLIOTECÁ RIA

Vamos dar loas à bibliotecá ria. Algumas podem até ser insuportá veis, mas nã o é a regra.
Sempre me dei bem com elas, amo essa profissã o. Na verdade, acho isso um grande
negó cio. Nã o no sentido do dinheiro, mas no de humanidade, o grande serviço que elas
prestam à sociedade. Elas ajudam as pessoas a crescerem por dentro.
Aliá s, conheci poucos bibliotecá rios, conto nos dedos de uma só mã o. Geralmente sã o
mulheres nessa ocupaçã o. Nã o sei porque, talvez seja necessá ria uma paciência feminina
para aguentar os ratos, como nó s.
Foi o caso do Gabinete de Leitura, em Rio Claro. Foi lá que uma grande liçã o foi-me dada
por uma bibliotecá ria.
Eu tinha o costume de marcar a pá gina do livro que estava lendo com a ficha de usuá rio.
Pois nã o é que a moça da biblioteca, quando fui renovar um livro, tirou justamente essa
ficha para marcar nela a renovaçã o? Tirou, assim, sem mais nem menos, e eu, no ardor de
meus vinte e poucos anos, quase gritei: -Nã o! Nã o faz isso... Estava marcando onde parei...
A bibliotecá ria nem me olhou, porém respondeu: - Um bom leitor nunca esquece onde parou
de ler.
Hoje em dia, só em raros casos utilizo um marcador de pá ginas.
VIVER EM MARTE

De braço dado, os Marcianos olhavam as dunas


onduladas do seu novo mundo.
E.C. TUBB; Colô nias no Espaço

Já nã o se fala mais tanto sobre isso. Quando eu era criança, a voz corrente era de que no
futuro viveríamos também em outros mundos, além da Terra. As viagens interplanetá rias
seriam comuns. Quando a TV mostrou o Homem pisando na Lua, nossa ú nica lua até o
momento, muitas foram as esperanças de estar um dia em Marte, Vênus, ou planetas além
de nosso sistema solar. Chegamos ao terceiro milênio: e daí?
Ficava aberta a probabilidade de um dia fundarmos colô nias terrestres em outros mundos,
viver neles como se vive aqui, ou de uma nova maneira, quiçá . Novas civilizaçõ es. E as
viagens só de ida a Marte para 2030, e daqui a uma ou duas décadas, têm sido creditadas.
Revistas vendidas em bancas de jornal trazem, ainda, vez por outra, artigos falando dessa
possibilidade. Poderíamos criar nesses novos astros uma nova ecologia, com mares de á gua
doce e morna, plantas e até animais. Poderiam se desenvolver espécies tal qual temos na
Terra, adaptadas ao novo sistema.
A ideia persiste nas nossas cabeças. Mas os fatos demonstram que nã o dificilmente um dia
possamos viver em Marte: já nã o acontecem grandes progressos no campo da Astroná utica.
Existem notícias de pequenas viagens fora de nossa gravidade e atmosfera, mas a grande
tacada hoje é a preservaçã o ambiental. Temos que cuidar muito bem de nosso ambiente,
que é aqui que nossos filhos e netos viverã o.
PS: A NASA perdeu os créditos para essa missã o a Marte para 2030, mas agora se fala de
uma para a Lua, embora nada esteja certo.

ANDRÓ IDES

Um robô não pode ferir um ser humano


ou, por omissão, permitir
que um ser humano sofra algum mal.
ISAAC ASIMOV; Eu Robô

O ser humano tem â nsia de superaçã o. Quer sempre estar acima e além de onde já está .
Assim, a criaçã o de um similar, que tenha suas pró prias características e ainda lhe possa ser
ú til, é o grande motivo para pesquisas, descobertas e invençõ es.
A construçã o de computadores pessoais, a partir de 1976, mostrou ao grande pú blico ser
possível arquitetar, calcular, pensar, enfim, com auxílio de má quinas. Cito aqui o TK 2000,
que era capaz de tocar mú sica monofô nica, composta pelo programador. Eu mesmo usei
um desses no meu trabalho de conclusã o de curso, em 1984.
O computador como o conhecemos é apto a desenvolver o que criamos, nã o pensa por si. O
conceito de criaçã o de robô s segue o mesmo critério.
A palavra androide vem de andrus, homem. Androide, portanto, é aquele que se assemelha
a um ser humano, embora nã o o seja. É , portanto, uma criaçã o por imitaçã o. É espécie, onde
robô é o gênero. Servirá , se um dia vier a existir, para realizar o que o ser humano nã o
consegue, ou nã o quer, fazer. Trabalhará sem carteira assinada, sem férias, sem
reclamaçõ es. Terá , entretanto, que parar eventualmente para reparaçõ es e manutençã o. E
quem sabe haverá alguns para consertar os outros.
Viver entre androides poderá ser algo comum. Nó s os confundiremos, na rua, com os seres
de verdade. Será esse um avanço no conceito de robô s e computadores, como os
conhecemos atualmente. Será o grande passo para nossas futuras geraçõ es.
A HARMONIA DAS ESFERAS Nº 1

Um homem chamado Boécio, na Idade Média, falava sobre a Harmonia das Esferas,
considerando que cada planeta do sistema solar emitia uma nota musical.
No entanto, a estética era vista como um instrumento, uma faceta Divina, e nada mais
ló gico que se entendesse essa harmonia como uma sutileza do Criador, naturalmente muito
diferente da mú sica dos homens medievos.
Ora, dizem cientistas atuais que uma estrela em colapso emite uma vibraçã o equivalente,
mais ou menos, à nota fá . Se considerarmos que tudo no universo oscila, nada sendo
está tico, os planetas também teriam vibraçõ es específicas. Poderia, destarte, pensar que
cada um deles emitisse um “som”, embora inaudível no espaço, por falta de ar. A oscilaçã o
estaria lá , o som nã o.
UM OLHAR SOBRE A MIOPIA

Uma característica tenho desde tenra idade: ser portador de miopia. O míope é aquele que
tem dificuldade de enxergar de longe. Ao se deparar com algo que esteja à distâ ncia, os
contornos nã o se definem bem. Entã o, o oculista recomenda o uso de lentes de correçã o.
Lembro-me que, quando era criança e jogava futebol – mal -, eu o fazia sem os ó culos. A
bola aparecia de repente, era comum virar alvo. Nã o conseguia ter a noçã o da profundidade
tã o bem como quando estava com eles. Mas entã o eu nã o podia jogar, porque podiam se
quebrar.
Os primeiros dias do uso de ó culos sã o a grande descoberta: tudo parece mais novinho,
mais colorido, mais fá cil de se ver. Os detalhes aparecem com mais facilidade. A vida parece
renovar-se!
Nã o sei se todo míope é assim: quando olho para alguma coisa, se a quero ver bem devo
focar, como uma câ mera de projeçã o, ou de fotografia. Se olho rá pido, nã o vejo com clareza,
tenho que ficar mirando o objetivo até ficar contrastado. Isso já me causou problemas.
Entretanto, há uma vantagem em ser míope: você passa a ter dois olhares sobre o mundo,
um com os ó culos (ou lentes de contato), outro sem. No primeiro, as coisas aparecem
claras, firmes, sem alteraçã o com relaçã o à profundidade; no segundo olhar, sem os ó culos
(ou sem as lentes), tudo aparece borrado, as cores se fundem, as três dimensõ es ficam
comprometidas. Duas realidades perceptíveis.
Se você quiser se inteirar do que te rodeia, é só colocar os ó culos; se preferir distanciar-se,
descansar do mundo, é só tirá -los, e tudo fica bem.
O PRAZER DA RELEITURA

Ler é um prazer. Maior ainda é pegar um livro, depois de muitos anos já lido, e o reler.
Luiz Carlos Maciel, Drummond e Ferreira Gullar li-os com vontade, pela primeira vez, com
vinte e poucos anos de idade. Tornaram-se esses, naqueles dias, um verdadeiro manancial
de consultas. Até que, com o passar dos anos, os encostei.
Duas décadas se passaram e os reli, revendo as marcaçõ es e as anotaçõ es pessoais, e pude
sentir o quanto mudei desde entã o. Quero dizer, ainda sou o mesmo Leopoldo, mas
amadureci. O que era importante nos primeiros anos dos 1980, já nã o tem a mesma
gravidade. E o que nã o me chamou tanto a atençã o naqueles dias, hoje me atrai.
Outra dessas vivências foi com certos livros da biblioteca de meu pai, algumas traduçõ es
dos anos 1940, de Aldous Huxley. Experimentei-os no entusiasmo dos 14 ou 15 anos, e os
reli com 48. Novo autor, novas obras, tamanha a diferença que fizeram. Revi lembranças, é
verdade, mas descobri muitas coisas que nã o me haviam entã o passado.
Assim também com Machado de Assis, conhecido nos bancos escolares. Naquele tempo,
pouca atençã o retive sobre ele. Somente fui redescobri-lo quando fiz minha pó s-graduaçã o,
cerca de trinta anos depois, e aí, só entã o, vislumbrei sua genialidade.
A releitura propicia uma revisã o de nossos valores. Naturalmente, o rever sabores e
sentimentos torna-se uma inovaçã o, uma nova descoberta.
Reler é um grande prazer.
A SEGURANÇA CIENTÍFICA

Desde pequenos aprendemos na escola que o ser humano vem do macaco e que o elo
perdido era uma raça da qual saíram o Homo Sapiens e outra mais. Nó s vencemos e aqui
estamos, matando uns aos outros e nos relacionando. Conhecimentos como esse sã o-nos
imputados como científicos, e por isso tidos como corretos. Mas... e se? Quero dizer, se nos
descobríssemos enganados por toda nossa vida?
A ciência é construída sobre estatísticas e postulados. Assim, a partir de uma proposiçã o,
um experimento é feito repetidas vezes. Dos resultados, se obtém uma estatística. Dessa,
cria-se um novo princípio, ou reforça-se um anterior. Esse é dito uma verdade científica.
Mas o que nã o nos damos conta é de que tal muda de tempos em tempos. Quando a
experimentaçã o é feita novamente sob as mesmas condiçõ es e começa a dar outros
resultados, ou novas tentativas sã o feitas, sob diferentes circunstâ ncias, e se obtém
conclusõ es distintas, a verdade passa a ser outra. E as escolas e universidades passam a
ensinar a novidade.
Talvez alguém ainda se lembre de quando aprendemos que a Terra tinha a forma de uma
pera!?!
Por isso mesmo, nada mais falível que uma verdade científica. E, no entanto, nos sentimos
tã o seguros com a proposiçã o dita no início deste artigo como se fosse definitiva.
Por que acreditar, sem espírito crítico, que o ser humano veio do macaco? Ou que ambos
tenham tido um ancestral comum, que tivesse evoluído até o está gio atual? Por que a fé tã o
firme num Big Bang? As pessoas confiam cegamente, só porque leram num livro, num
jornal, na internet, ou assistiram na tevê. O que pode dar a total credibilidade a tais
veículos, ou a quem os conduz?
O ser humano civilizado é engraçado, acha-se inteligente porque tem tais crenças. Nã o é
nada diferente daquele que acredita que o trovã o criou o mundo, e que acha que isso é
verdade porque seus antepassados assim o disseram.

O VALOR DO RODAPÉ

Já é saber quando reconheces que não sabes coisa alguma.


CONFÚ CIO

Quando fiz faculdade de jornalismo, tínhamos uma cadeira chamada diagramação.


Aprendíamos como dispor os artigos, matérias e anú ncios numa folha de jornal, ou de
revista. Havia as zonas fortes da pá gina e as fracas, assim como as pá ginas fortes e as fracas.
Nã o me lembro as nomenclaturas, mas o princípio era esse.
Como bons estudantes, retivemos na nossa mente o má ximo que pudemos e buscamos
aplicar isso na prá tica. Os anos se passaram, formamo-nos e um dia fui trabalhar na Gazeta
Jordanense.
Era um jornal de interior, no qual eu fazia ao mesmo tempo serviço de reportagem,
fotografia, redaçã o, diagramaçã o, artigos de fundo e o que aparecesse.
José Aércio Moreira era o nome do dono. Muito ativo, de bom coraçã o, deixava-me
totalmente à vontade para trabalhar. Entã o, mostrei pra ele como eu sabia diagramar bem,
dispondo os artigos em cada pá gina, respeitando as zonas fortes para os anú ncios e
matérias mais importantes. Ele olhou bem e nada falou.
Os dias se passaram e comecei a ter contato com os anunciantes. Eles nã o sabiam
diagramaçã o, nã o conheciam as regras das zonas fortes e fracas. Mas tinham o dinheiro
para pagar o jornal e faziam suas pró prias exigências.
Eles pagavam mais caro só para ter direito a aquele anú ncio que ficava numa tirinha fina,
no pé da pá gina. O da primeira era mais importante, mas nem por isso os outros ficavam
muito para trá s. E nunca, na faculdade, eu ouvira falar do valor do rodapé. Afinal, ficava
numa zona fraca, nã o tinha tanto impacto para o leitor.
Com frequência, achamos que conhecemos bastante algum assunto e discorremos sobre ele
com tal fluência como se fô ssemos muito sá bios... até que um dia descobrimos que nada
sabemos.
A LIBERDADE É UMA BICICLETA

Você pode andar a pé, mas se tiver uma bicicleta você poderá ir mais longe. A liberdade que
ela possibilita faz você ir mais além.
Ora, para tanto sã o necessá rias algumas regras: você tem que se equilibrar, pedalar, ter
freios para ajudar a parar. Ainda que sejam os pés na roda.
Você pode ter um câ mbio, a fim de trocar marchas.
Sã o mú ltiplas as possibilidades, mas quanto mais vantagens, maior o nú mero de regras:
como utilizá -las, como nã o estragá -las, quando podem, ou devem, ser usadas e assim por
diante.
Se você nã o quiser normas de conduta, você nã o poderá usar a bicicleta, e assim nã o terá
tanta liberdade: você estará limitado ao andar a pé. Correr e sentir o vento no corpo nã o é a
mesma coisa que senti-lo sobre uma bicicleta. É diferente.
A liberdade exige regras para ser usufruída.
SONHOS Nº 2

Gosto muito do filme Dreams (Sonhos), de Akira Kurosawa. Ele é feito sobre histó rias de
uma vida, mas sob a forma de sonhos, aqueles que se têm quando se dorme. É sobre esses
que quero agora falar.
Tem gente que diz que nunca sonha. Essas pessoas nã o se dã o a chance de se conhecer,
porque as fantasias noturnas dizem muito de nó s mesmos. Fazem-nos ouvir as vozes que
durante o dia nã o prestamos atençã o.
Nã o há coisa melhor do que, no meio de uma cochiladinha, dormir pesado. Aí, você acorda e
diz: Puxa, que sonho gozado!
Nó s sempre sonhamos. Podemos nã o nos lembrar, mas sempre sonhamos. Quando
dormimos, temos períodos sem sonho entremeados com sonhos. Se acordamos em meio a
um período sem sonho, achamos que nã o tivemos nenhum; se acordamos em meio a um
período com sonho, e ficamos a recordá -lo, passamos a tê-lo junto com nossos
pensamentos. Tudo depende, portanto, do momento em que acordamos.

MULHERES DE CABELOS COMPRIDOS

Gosto de cabelos compridos.


Uma epístola do Novo Testamento diz que o cabelo para as mulheres é um véu. No bom
sentido da palavra.
Cabelos sã o o charme da mulher. Deixá -los crescer é uma grande coisa, mostra vitalidade,
alegria, beleza. A moça que os mantém longos pode até nã o ser bonita, mas sempre ficará
mais encantadora.
Houve um caso famoso de uma cantora paraguaia. Ficou célebre usando cabelos até a
cintura! Vendia muitos discos, fazia shows concorridos, era o maior sucesso! Um dia,
cortou-os. Imediatamente, a venda dos discos caiu e a fama idem. Resultado: deixou-os
crescer novamente.
Nos anos 1970 os cabelos compridos eram a grande moda. As meninas tinham que mantê-
los, nã o importa como. Escuros, claros, ruivos, encaracolados, lisos, ondulados, frisados... E
nó s, rapazes, admirá vamos. Hoje, curto os de minha esposa.
Até hoje me extasio com isso. Acho que as grandes contribuiçõ es da moderna tecnologia
sã o os xampus e condicionadores. Maior que computadores. Afinal, se precisar, podemos
passar sem computador. Mas nã o sem mulheres de cabelos compridos.
VENDEM-SE SÍMBOLOS

Houve um tempo em que se compravam coisas. O cara ia à venda e obtinha mantimentos


para sua casa. Mandava fazer uma carroça para se transportar e à sua família.
A vida mudou. Vivemos numa sociedade de consumo, onde o valor do ser humano é medido
pelo que ele pode comprar. As pessoas adquirem mais do que podem, e passam a gastar
acima de seus limites, emprestando sempre dos bancos e de firmas abertas para esse fim.
Nunca se gastou tanto, nunca se comprou tanto, nunca se emprestou tanto dinheiro quanto
nos dias atuais. Nunca foi tã o usado o cartã o de crédito! E nã o é para se sustentar, é para
garantir e manter um padrã o de vida que, na verdade, nã o se pode suportar.
O consumidor vive frustrado, sempre quer mais do que tem, sempre quer algo que nã o
conseguiu ainda. Isso seria bom se se traduzisse em aspiraçõ es. Mas nã o. É sempre o
princípio de se amealhar demonstraçõ es de uma riqueza que nunca se terá , de um estar no
mundo acima dos outros.
Compramos símbolos, nã o mais coisas. Adquirimos estilos de vida. Esse é um cará ter da
atualidade. Entretanto, vai mudar, como tudo muda.
O consumismo nã o será para sempre, e no futuro o ser humano vai entender que a vida é
mais do que comprar. Entã o, nesse dia, deverá conseguir a felicidade que sempre almejou.
Ou, pelo menos, saberá onde buscá -la.
MÚ SICA-MERCADORIA

Um mau negó cio hoje em dia é abrir uma loja exclusivamente de CDs. Pouca gente ainda os
compra. A mú sica popular deixou de vir embalada apenas em á lbuns, pode ser puxada pelo
computador. Tem ainda o pen-drive. E quem nã o tem acesso à informá tica, ou quer o CD,
busca o pirata. (Tem o pessoal que curte vinil, mas aí é outra histó ria.)
Esse foi o caminho tomado pela mú sica popular. Tudo começou com os antigos bolachões
de 78 rpm (rotaçõ es por minuto). Eram discos que retinham três minutos de cada lado, as
cançõ es precisavam caber nesse exíguo tempo. Claro, havia aqueles um pouco maiores, de
cinco minutos de cada lado, mas eram menos comuns. Esses geralmente eram destinados a
peças eruditas.
Entã o, ficou-se determinado que a cançã o popular nã o podia ter mais do que três minutos.
Isso se manteve com os vinis de 33 rpm, que continham, em média, seis faixas de cada lado.
Tinha também as fitas k7 e as fitas de rolo, mas elas apenas serviam como escudeiras dos
LPs, servindo também para gravar.
Na segunda metade dos anos 1960, a psicodelia começou a usar os discos inteiros, com
composiçõ es que duravam muito mais que os normais três minutos. Apareceram os discos-
conceito, e o rock progressivo dos 70 continuou com essa nova tradiçã o, incluindo á lbuns
duplos com uma só composiçã o dividida em quatro partes, como em Tales From
Topografics Oceans, do Yes.
Entretanto, essa nova forma nã o agradou à indú stria fonográ fica, que dependia das cançõ es
de três minutos para tocar no rá dio. A mú sica deveria servir apenas para acondicionar os
anú ncios.
Assim, voltou-se ao velho formato, mesmo com a invençã o do CD, que pode tocar mais de
setenta minutos sem parar. E também com a gravaçã o digital, que mantém o esquema de
gravar centenas de cançõ es que, dificilmente, ultrapassam os cerca de três ou cinco
minutos.
Hoje se compra pela internet as mú sicas que se quer ouvir do lançamento de um artista.
Nã o é necessá rio adquirir o disco todo. E as letras podem ser obtidas já com as cifras. Os
Beatles nã o fizeram concertos nos ú ltimos anos e sobreviviam apenas com a venda dos
discos, fitas e quetais, o que hoje seria impossível. A banda tem que se contentar com a
renda dos shows.
As velhas gravaçõ es podem também se armazenar em nosso computador, e até passadas
para pendrives, por exemplo.
É a nova vida aparecendo. O artista popular tem hoje mais meios de mostrar o seu trabalho,
de vendê-lo, ainda que precise se colocar na ditadura dos três minutos. E para vencer isso,
ele tem os shows, os discos ao vivo e a pertiná cia em ganhar o pú blico por sua pró pria
capacidade.
MÚ SICA-OBJETO

Quando apareceram os primeiros fonó grafos, a pessoa precisava rodar a manivela com a
mã o para ouvir o cilindro, coberto de cera, gravado. Se rodava mais rá pido a mú sica durava
menos; mais devagar, durava mais. Mas era necessá rio ficar junto com o aparelho, rodando
o cilindro enquanto se ouvia a gravaçã o.
Em pouco tempo, a manivela passou a servir apenas para dar corda no fonó grafo, que
começou a tocar sozinho. E rapidamente os cilindros deram lugar aos discos de 78 rpm, que
inicialmente eram gravados apenas de um dos lados. Podia-se dançar, enquanto a mú sica
tocava!
Depois vieram as eletrolas, que dispensavam a necessidade de se dar corda a cada novo
disco, pois o trabalho ficava para a rede elétrica. Bastava ligar o botã o.
De resto, o que já se sabe: vieram os discos de vinte minutos de cada lado e depois os CDs,
com mais de setenta minutos de mú sica. Por fim, os smart-phones e quetais.
O que mudou nesses aproximadamente cem anos? O que modificou foi o modo de se ouvir a
mú sica popular. Dificilmente alguém fica parado perto do aparelho de som escutando a
cançã o. O má ximo é levá -lo consigo no bolso...
A INTERRUPÇÃ O PELA MORTE

Durante anos, amei ouvir Cá ssia Eller. Gostava de sua voz e da maneira como interpretava
as cançõ es. E a jogada era ficar se perguntando o que ela gravaria em seguida. Na verdade,
eu esperava seu retorno ao esquema guitarra-baixo-bateria, sem orquestra nem mú sicos de
apoio.
Entretanto, o absurdo aconteceu: estupidamente ela morreu, por razõ es que até hoje nã o
temos muita certeza.
O que ficou? Sua obra gravada.
Nã o é possível saber o que ela faria em seguida. Nã o dá mais para esperarmos o que ela
fará , porque seu tempo na Terra acabou.
O mesmo se dá com escritores. Machado de Assis, o maior contista e romancista brasileiro,
sabemos que nada mais podemos esperar dele, da sua genialidade. Sua obra foi
interrompida inevitavelmente com sua morte.
É diferente de lermos um autor vivo, do qual podemos esperar um novo livro, com o qual
podemos conversar sobre qualquer assunto, cuja empreitada ainda nã o está terminada.
Curioso o caso de Nietzsche: escreveu Ecce Homo dando uma geral em toda sua filosofia,
como um corolá rio de tudo o que publicara até entã o, como se soubesse que estava no fim.
Pouco tempo depois, enlouqueceu. Caso raro, para se discutir.
A grande coisa é que tudo isso fica guardado. Podemos rever nossa cantora, nosso escritor
ou filó sofo, ainda que estejam mortos. Os quadros revelam os seres humanos que os
pintaram; as fotos, os que as clicaram; os filmes, as pessoas que os fizeram. Temos um
grande acervo à nossa disposiçã o, para aprendermos mais e sempre.
SABEDORIA

Em 1984, quando morava em Santos, comprei uma ediçã o do Tao Te King. Trata-se de um
livro composto por 81 ensinamentos em forma de poemas. Neles, o leitor é instado a nã o-
agir, isto é, atuar no mundo de acordo com os movimentos da natureza e do universo.
Da filosofia do Tao surgiu o taoísmo, uma evoluçã o que, para alguns, é considerada uma
degeneraçã o.
A autoria é atribuída ao chinês Lao-Tsé, muitos anos antes de Cristo. Diz a lenda que esse
escritor já saiu do ventre de sua mã e bem velhinho, de longa barba e tudo o mais.
Do estudo desse livro, compus, na época, um poema:
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SABEDORIA
Apud Tao Te King

O sá bio conhece o mundo sem obtê-lo.


Ele nã o o contém em suas mã os
Porque tem em mente que dele nã o precisa.

O sá bio tem o mundo à s suas mã os


Porque o conhece e nã o o deseja.
Imita-o sem sê-lo.

O sá bio é, sem imitar;


Conhece, sem desejar;
Aprende, sem reter.

Eis o que é a sabedoria!


A RESPOSTA NÃ O-VERBAL

Aprendemos, desde cedo, a sempre responder à s perguntas. Para tanto, elas devem ser
ló gicas, a fim de que a resposta também o possa ser. A dú vida deve ser respondível em
palavras. Assim, a questã o nunca fica no ar, simplesmente, à toa.
No entanto, existem indagaçõ es que parecem nã o ter retorno. Poderia perguntar: qual o
som de duas mã os? E a pessoa responderia batendo palmas. E qual o som de um só dedo?
No zen, o mestre dá ao discípulo uma pergunta indecifrá vel, o koan, e este fica em frente a
uma parede branca pensando na possível resposta. É como: qual a diferença entre um
coelho? Aparentemente, nã o há soluçã o. Mas o discípulo pensará naquela questã o até
ferver o cérebro. Nesse ponto, cairá num vazio, o sunyata. E do vazio, virá a resposta.
Exercícios como esse podem movimentar a mente. Precisamos ter incertezas – honestas –
dentro de nó s, a fim de tã o somente buscar soluçõ es. Para tanto, podemos nos servir de
outros meios, além do pensamento. Dentre todos, existe a arte, a mais simples forma de se
obter conhecimento.
Como já sabemos, nem sempre as respostas serã o necessariamente verbais.
MORENO OU MULATO?

Quando vou à padaria, sempre peço o pã o mais moreninho. Faço isso a contragosto, para
dizer que o quero mais tostado. No entanto, é como está ficando arraigado o termo no
Brasil.
O pró prio mulato se chama moreno, o que é impensá vel. Ora, eu sou moreno, porque tenho
a pele clara e o cabelo escuro (embora já estejam brancos). O mulato é um cruzamento do
negro com o branco. Deveria ter orgulho em dizer: -Eu sou mulato!
Entretanto, tantos anos de preconceito fizeram a palavra soar como discriminató ria. É bem
como se pode ver no livro de Lima Barreto, Recordações do Escrivão Isaías Caminha, quando
o pró prio delegado chama o rapaz de “mulatinho”. De forma ostensivamente pejorativa!
Isaías confessa que as lágrimas me vieram aos olhos. Nã o era o termo, mas a forma como era
usado.
Passados mais de cem anos da aboliçã o da escravatura, o tabu ainda impera no país. De
maneira tã o veemente, que o pró prio mulato (ou pardo) se deixa levar por ele, nã o
assumindo sua pró pria cor. E os tolos de outras cores embarcam na onda.
O mulato nã o é negro, nã o é branco. É uma mistura. É uma das cores mais em voga no
Brasil, terra de miscigenaçõ es.
Á LEA

Essa palavra tem uma importâ ncia muito grande. Significa sorte, risco.
Vem do latim, alea, de onde a famosa frase: Alea jacta est! (A sorte está lançada!) A palavra
latina também tem o significado de jogo de azar.
Alear significa fazer voar, levantar, dar asas. É sinô nimo de alar. Preste atençã o na
proximidade entre as ideias do voo e do acaso.
Daí vem também aleatória, que é o que depende de um acontecimento futuro nã o
conhecido, fortuito, casual.
Em direito, o contrato aleató rio é o que depende de ocorrência porvindoura imprevisível,
como o pacto de seguro. Nele, o lucro ou vantagem é incerto. É também o caso do bilhete de
loteria e da aposta, em que a regra é o prejuízo de quem joga.
Gosto do vocá bulo á lea. Tem o som de uma chacoalhada de asas. É como o vô o de um
pá ssaro livre.
O MUNDO ABSTRUSO

Nascemos num mundo complexo. Todos nó s. Quando saímos à luz, um meio intrincado nos
recebe.
Primeiro, somos nó s conosco mesmos. Tudo o que temos a fazer é sugar o leite, dispensá -lo
e dormir. Também choramos e dizemos alguma coisa parecida com vogais. Mas já
absorvemos o que nos rodeia de alguma forma. Os sons, as cores e formas, as sensaçõ es
tá cteis, o paladar, os cheiros.
Depois, passamos a senti-lo de maneira mais complicada. Vêm os amigos e os parentes, a
escola, para muitos o trabalho. E passamos a vida toda tentando entender o mundo e nos
instruindo sobre ele. Que se mostra, a nó s, abstruso, isto é, confuso e desordenado, nunca
obedecendo fielmente à s leis e princípios.
Acostumamo-nos a colocar o cinto de segurança quando entramos num carro; aprendemos
a nã o entrar no elevador quando ele está muito cheio; a respeitar filas; a andar em escadas
rolantes; a jogar damas ou xadrez; a nos comportar à mesa; torcemos por algum time;
fazemos parte de algum grupo, associaçã o, agremiaçã o... E tem os computadores, as
bicicletas, a tevê... E os rios, as praias, as montanhas...
Há muitos livros para se ler, muitos filmes para se assistir, muitos quadros para se ver,
muitas poesias e mú sica para se ouvir, muitas esculturas para se apalpar e escorregar as
mã os, muitas peças de teatro, muitos nú meros de dança, muitos cursos e seminá rios,
palestras e work-shops...
Eis a grande coisa: as pessoas, de modo geral, usam apenas a juventude para aprender,
como se o mundo nada mais tivesse depois a ensiná -las. Ou como se elas mesmo nã o
pudessem voltar a refletir criticamente. E nã o percebem o quanto deixam de conhecer, nã o
se dando a chance de crescer mais e mais.
O mundo é extremamente complexo. Tem aspectos verdadeiramente ruins, mas outros
maravilhosos. Nã o nascemos à toa, é bom aproveitarmos nosso tempo para aprendermos
sobre o que ele tem a oferecer, desde o que há debaixo e acima da terra e das á guas, até
sobre o que o ser humano produziu e produz. E tenho certeza de que o tempo de uma vida
é pouco para tudo. Mas vale a pena.
ASSUMINDO PONTOS POSITIVOS

Durante a infâ ncia e adolescência meus amigos chamavam-me de filó sofo, ou intelectual, o
que me desagradava bastante. Eu só queria ser um cara legal. Tanto que, à primeira
oportunidade, passei a usar lentes de contato. E decidi que nã o leria mais nenhum livro.
Tinha entã o 19 anos de idade.
Um dia, enquanto esperava começar um show, conversava na plateia com alguns roqueiros.
E discutia avidamente.
Eis que, num dado momento, uma garota virou-se pra mim, com todo seu entusiasmo, e
disse: - Já sei! Você é um intelectual do rock!
Aquilo me caiu como uma pedra. Tanto me esforçara para me desvencilhar daquela
imagem... Só queria ser um cara legal.
Foi quando descobri que existem certas coisas que fazem parte de nó s, mesmo que nã o
queiramos.
Voltei a usar ó culos. E a ler livros.
A questã o é que existem aspectos bons e maus. Devemos considerar ambos, tornando os
positivos mais fortes e os negativos mais fracos. Mas só conseguimos isso se tivermos a
coragem de olhar para dentro de nó s mesmos. Assumir o que faz parte de nó s e nã o tentar
solapar, pois quanto mais queremos esconder, mais aparecem. E entã o trabalhar para fazer
crescer nossos pontos melhores e diminuir os que nos atrapalham.
MACARRONADA

A China criou o macarrã o. Bem fininho, que para ser comido se enrola nos palitinhos.
A lenda conta que Marco Polo levou o prato para a Itá lia. De lá , vieram os outros tipos de
massa.
A macarronada é um ponto de honra, todos nó s devemos aprender a fazer. Principalmente
no Brasil, onde a colô nia italiana esteve em peso. Minha sogra, por exemplo, era de Roma e
meu bisavô de Concamarise.
Quando se trata de espaguete ou talharim, há um detalhe importante a ser levado: nunca se
quebra ao meio a massa! Ela foi feita para ser enrolada no garfo, por isso deve ser longa,
muito longa.
Depois, vem o detalhe do molho: tem que ser copioso, abundante! E os tomates devem ser
cozidos maduros, bem vermelhos! Uma pitada de açú car é bom para tirar a acidez, nã o
muito para nã o virar agridoce.
Você pode juntar alguns pedaços de carne, já assados previamente, ou entã o moída, para
fazer uma bolonhesa.
Na hora de servir, deixe a massa numa travessa, o molho em outra e queijo ralado em
separado, para que os convivas se sirvam a gosto.
É simples e saboroso, ideal para domingo, dia de macarrã o. Feito para se compartilhar em
família.
ABANDONANDO A APATIA

Em meus tempos de colegial, em Sã o Paulo, ao fazermos uma prova, todos ficá vamos com a
cabeça pra baixo, olhando o que tínhamos que resolver, ou escrevendo a resposta.
De repente, vinha da rua o som de uma freada de carro! Ninguém subia o rosto, a nã o ser
um colega, que até comentava, em voz alta, o fato. Ele era o ú nico que nã o havia sido criado
na capital paulista. Vinha do interior. Nã o era apá tico, como nó s.
Naquela época e lugar, achá vamos estranho alguém comentar algo tã o corriqueiro quanto
uma brecada de automó vel. E, no entanto, nó s está vamos errados. Todos nó s.
A cidade grande tira das pessoas o ato de se surpreender diante das coisas. Nada é motivo
para grandes emoçõ es. Nem para pequenas. Tudo se torna incolor, sem brilho.
Temos que reaprender a nos espantar. Como crianças. Os movimentos da vida têm que nos
maravilhar. A beleza de um arco-íris, de uma lua cheia, do canto de um pá ssaro. Nã o ter
medo de levar susto com freadas de automó vel, nem de nos deslumbrar com o que é
comum. Nada ou ninguém é tã o comum que nã o mereça uma atençã o.
Essas reaçõ es a impressõ es só irã o nos enriquecer, e tornar nossas relaçõ es mais pró speras
com o mundo. No começo, temos que treinar, prestar mais atençã o ao que nos rodeia. O
tempo fará o resto.
O BOTÃ O DA ESPIRITUALIDADE

Poucas semanas antes de falecer, meu pai me segredou: - Quero ver como é a passagem.
Ele se referia, naturalmente, à passagem desta vida para a outra.
Nã o seria estranho, a nã o ser no caso dele, que se declarara ateu durante boa parte de seus
dias na Terra.
As pessoas sempre têm uma grande curiosidade a respeito do que acontece quando se
morre. Ninguém passa incó lume a essa dú vida. Ela é pró pria ao ser humano.
A espiritualidade existe em todos e pode ser desenvolvida. Ou sabotada. Mas há um botã o
sempre pronto a desabrochar. Em alguns pode ser mais difícil, porém sempre está lá .
O que ocorre é que nem sempre dá tempo na vida das pessoas dela se traduzir em religiã o
formal. Pode vir apenas em forma de filosofia, ou de simples boas açõ es, como acontecia
com meu pai.
EMPRESTAR LIVROS

Se há uma coisa que aprendi, à custa de muita chumbrecada, foi nunca emprestar um livro.
A nã o ser que você nã o o queira de volta; aí, é melhor dar de vez. Ou entã o, se você nã o se
importar dele vir com orelhas, desconjuntado, folhas saindo, sujo, enfim, pior do que
quando se foi. Isso, quando devolvem.
Tem gente que pega o livro emprestado e risca, faz suas pró prias marcaçõ es, chega até a
anotar compra de supermercado. Tem também quem o dobra como se fosse um jornal...
Tem quem usa marcador de pá ginas mais grosso que a capa. Tem quem se apoia nele com
os cotovelos, ou o lê abrindo pelo meio.
Pode acreditar, existe gente que consegue lidar desse jeito com os livros dos outros! E
muito mais, coisas que nem me lembro para descrever aqui.
Depois, tem aquela piada já relatada por um antigo escritor, Enrique Jardiel Poncela : alguns
[1]

autores te pedem que não emprestes seus livros a ninguém, porquê, emprestando-os, pões teus
amigos em condições de não precisarem comprá-los, com o que o escritor sai prejudicado em
seus interesses.
Além do mais, pegar livro emprestado é na biblioteca pú blica.
Por essas e outras, nã o empresto mais.
O PRIMEIRO DIA

Hoje foi o primeiro dia que nossa filha foi à faculdade. Ela entrou em nono lugar em Direito,
e esperá vamos que voltasse pintada. Mas nã o teve trote e sim uma aula de filosofia jurídica.
Ela vem se preparando há dias, para tudo isso. Foi inclusive ao Templo, a fim de se
aparelhar melhor.
Lembro-me de quando era pequenininha e a levamos para a creche. Deixamo-la e fomos
trabalhar. Ficamos com aquele sentimento que os pais sempre têm quando deixam seus
filhos sozinhos em algum lugar.
Nosso filho, mais velho, foi diferente: preferiu nã o fazer faculdade alguma, decidiu viver
como motorista de ô nibus e caminhã o. Apesar de ter frequentado boas escolas, ter tido
bons professores, achou que seria mais feliz realizando seu desejo de infâ ncia. E assim vive
seus dias, dirigindo e dirigindo.
Com isso, deixou ele que a experiência que tivéramos na juventude passasse apenas a ela.
Recordo-me de meus primeiros dias na faculdade. Creio que a impressã o deverá ser
parecida para nossa filha, apesar de a estar tendo quase trinta anos depois. Afinal, sempre é
a vida se renovando.
BIBLIOTECAS

Cresci numa casa onde enormes estantes cobriam duas paredes da sala. Eram cheias de
livros de, em sua maioria, literatura e relatos de guerra. Era comum as pessoas entrarem e
se mostrarem extasiadas com o nú mero de volumes expostos. Para mim, no entanto, era
perfeitamente normal, pois crescera em meio à quilo.
Durante a adolescência, conheci a biblioteca da casa de meu amigo Ronald, que ficava numa
á rea fechada por janelas. Nã o eram livros como os de meu pai, mas mais voltados à ciência,
engenharia e matemá tica. Adorava ficar ali, principalmente em dias de frio e chuva.
Quando me casei, conheci a biblioteca que um dia fora de meu sogro, repleta de livros de
medicina, arte, mas também de filosofia e literatura. Minha esposa, como eu mesmo,
mantinha também sua biblioteca pessoal.
Sempre normal em nossas vidas. É difícil para nó s pensarmos que pessoas podem viver
sem livros. Sem frequentar bibliotecas pú blicas, escolares ou universitá rias, livrarias ou
sebos. Gastam dinheiro em sorvete, mas nunca em livros.
As bibliotecas têm que fazer tanto parte de nó s como a comida que comemos e a roupa que
vestimos.
Fazem parte de nossa vida interior.
RETORNO AO CHIMARRÃ O

Tenho o há bito de tomar o chimarrã o solito, sem companhia. Minha esposa à s vezes toma
uma ou duas cuias. E raramente chimarreio junto com algum amigo que aprecie o porongo.
Tudo começou quando morá vamos em Campos do Jordã o. Lá , tínhamos uma casa de chá , A
Ponte do Leã o. Houve uma feira gaú cha, que durou umas duas semanas, acho. E todo dia
uma rapaziada ia lá ... Fizemos amizade, foi muito legal. Entã o, no ú ltimo dia da feira, deram-
me um presente: uma cuia e uma bomba!
Daí, ensinaram-me como funcionava e comecei a tomar todos os dias.
Passando os anos, perdi a cuia e deixei o costume. Um dia, num acampamento em Ilhabela,
alguém estava chimarreando no copo e me ofereceu. Aceitei e tive a grata lembrança do
que era isso.
Ao voltar para casa, passei a tomar no copo, com a bomba que ainda tinha. Ora, um amigo
de entã o, sabendo disso, trouxe-me de presente de uma viagem sua ao Rio Grande do Sul
um novo jogo para chimarrã o. Foi a senha para meu retorno ao costume.
De lá para cá , nã o parei mais.
A EXPERIÊ NCIA DIRETA

Há uma preocupaçã o do ser humano em se ligar ao Ser Supremo. Isso é do íntimo de cada
um e cada qual o faz por um meio. Alguns conseguem chegar mais perto.
Há um Deus em princípio dentro de nó s. Podemos vir a ser Deuses. Há um Deus fora de nó s,
ao qual nos dirigimos.
Fazemos ambas as coisas por meios de transcendência. A mú sica pode nos ajudar e foram
para tanto compostos mantras, hinos e rezas.
Entretanto, há o que podemos chamar de experiência direta, que é a oraçã o ao Pai, sem
intermediá rios. É a que fazemos por nó s mesmos, sem palavras decoradas, sem frases de
efeito, como uma verdadeira conversa.
Tenho minha experiência pessoal e é essa que vou passar.
Ao conversar com Ele, faço-o com todo o respeito. Primeiro, invoco o Pai dos Céus. Entã o,
passo aos agradecimentos. Sempre temos o que agradecer: por mais um dia de vida, por
nosso corpo, pelas possibilidades que Ele nos dá etc. Depois, peço. À s vezes explico e dou
minhas razõ es, a paciência é um atributo do Senhor. E termino em nome de Jesus Cristo.
Por fim, o mais importante: ficar em silêncio para ouvir a resposta. Que nã o será
necessariamente verbal, como já disse em outra ocasiã o. E nem sempre virá no momento
em que esperamos, pois o tempo divino é diferente do nosso. Esse é o fundamento da
experiência direta com Deus. Eu a pratico com alguma constâ ncia e indico para todas as
circunstâ ncias.
ARROZ DE CARRETEIRO

Quando se fala em comida brasileira, pensa-se logo em feijoada. Mas existem muitas outras
coisas interessantes e saborosas e uma delas é o arroz de carreteiro.
Trata-se de um prato típico do sul do Brasil. É muito simples fazê-lo, todavia existem tantas
formas de prepará -lo como nú mero de cozinheiros. Cada um tem sua pró pria receita.
Minha esposa tem a dela.
Começa-se por colocar a carne seca na á gua e deixando-a descansar, a fim de tirar o sal
excessivo.
Depois, precisa cortá -la em pedaços ou desfiá -la. Tirado o sal e cortada, é a vez de prepará -
la no fogo. Ponha ó leo na panela e jogue a carne seca. Mexa-a com vigor até que fique
pronta. Deixe-a de lado.
Faça o arroz branco. Pode colocar um pouquinho daquela á gua da carne seca, a fim de
salgar e dar gosto.
Depois, é só misturar tudo e está pronto o arroz de carreteiro!
Essa é uma receita bá sica, mas você pode acrescentar cebola, alho, linguiça, ervilha, tudo de
acordo com a sua vontade. Pode também colocar a carne seca no arroz antes de terminá -lo,
ou este sobre ela, logo apó s estrugi-la. Apenas deve tomar cuidado para nã o descaracterizar
o prato.
Boa sorte.
O CENTRO E O CÍRCULO

No estudo dos símbolos, ir da extremidade do círculo ao seu centro é passar do exterior ao


interior, do mundo das formas ao da contemplaçã o, do temporal ao atemporal, do mú ltiplo
à unidade. É a viagem ao ponto criador.
O círculo é a representaçã o do sol, da perfeiçã o e da eternidade, assim como do reino
celeste e do nú mero nove. É também o movimento, a roda do destino (Idade Média) e a
roda budista.
Opõ e-se ao quadrado. A junçã o dos dois é muito comum nas mandalas hindus e tibetanas. E
nas figuras chinesas. E no grafismo medievo.
O símbolo do Tao é um círculo cortado ao meio por um sigma, ficando negro de um lado e
branco do outro, tendo dois pequenos circulinhos, um em cada lado, de cores inversas,
como a dizer que em cada princípio há sempre um pouco de seu oposto. Dentro de todo
masculino, um pouquinho de feminino e vice-versa.
Nos emblemas religiosos, Deus é sempre colocado no centro. Em muitas imagens cristã s,
Jesus é colocado no meio e os evangelistas nos quatro cantos, como a representarem o
princípio da cristandade e sua estabilizaçã o.
Assim como o círculo é o mundo, o universo, o ser humano deve habitar o seu nú cleo para
ser normal. O excêntrico é o que fica fora do centro (do latim Ex Centri, saído do centro para
a periferia). Entre os antigos gregos, os heró is eram todos centrados. No entanto, em nossa
sociedade, o indivíduo deve sair do centro para poder criar, produzir, ficando de fora, para
realizar os seus atos, a sua filosofia, a sua dança. E assim, tornar-se um heró i, um artista, um
pensador. Ele cria seu pró prio centro.
O círculo é simétrico e está tico em sua simetria. O movimento implica numa saída do centro
para a periferia. Se pensarmos em mudar o lugar do centro, tudo se alterará e teremos um
novo sistema simétrico e está tico.

OUTRO OLHAR SOBRE A MIOPIA

Diz uma antiga teoria que esse mal apareceu com a urbanizaçã o. As cidades exterminaram
com os longínquos horizontes e o ser humano nã o precisou mais enxergar tã o ao longe. Nã o
precisou e, com isso, perdeu a capacidade de ver, por si, as extremidades do céu, do mar, da
terra. Passou a usar lunetas, binó culos... e ó culos.
Outra conjectura, confirmando a que acabamos de falar, diz que você pode exercitar sua
visã o avistando largos e distantes horizontes. Tal exercício possibilitaria um retorno ao
olhar de lince, perdido pela civilizaçã o urbana.
Tudo isso nos levaria a crer que os nascidos e viventes do campo nã o teriam nunca miopia.
Nã o é verdade, pois o que se vê é gente apertando a vista para conseguir enxergar, em vez
de usar lentes de correçã o. Ora, no meio urbano mais pessoas fazem uso de lentes de
contato ou ó culos porque estã o mais pró ximas de pontos de consulta e venda.
Eu mesmo, uma época, mandei fazer ó culos com grau menor e passei a fazer exercícios
recomendados por especialistas, a fim de eliminar minha miopia. Nada aconteceu, a nã o ser
os famosos casos de encontrõ es com transeuntes e outros pequenos acidentes, já que a
vista continuava enxergando pouquinho... Levei meses até me convencer que os exercícios
nã o estavam adiantando nada!
Com o tempo, a gente passa a admitir o uso dos ó culos. Nada melhor que curtir uma
armaçã o nova, poder escolher entre a de metal ou de material plá stico. Mandei até fazer um
par extra, com lentes escuras para dirigir. Fora o par para leitura, cuja necessidade adveio
com a maturidade.

SURREALISMO E ROCK

O movimento surrealista surgiu nos anos 1920. Seu grande impacto consistia de fazer
parecer realidade o imaginá rio, produto de sonho. Daí, a minha definiçã o de surreal: é o
irreal com ar de real.
Assim, pintores como Magritte e Salvador Dali fizeram a festa. Os reló gios moles de Dali
ficaram famosos! Paisagens oníricas eram retratadas como se fossem verdadeiras. Na
mú sica erudita, compositores fizeram o mesmo. Escritores.
No rock, os primeiros discos do Pink Floyd, a partir de 1967, tinham temas surreais, em que
se podiam ouvir o som de outros planetas, do espaço interplanetá rio, de naves espaciais e
coisas assim. Ora, no espaço nã o há som, mas o Pink Floyd o tocava. Fazia mú sica do mais
puro onirismo.
Outras bandas, pelo mundo, fizeram algumas peças assim: Yes, Mutantes, Iron Butterfly e
outros psicodélicos e progressivos. Na Alemanha, nos anos 1970, o Eloy fez histó ria no
primeiro disco. Era uma sonoridade gélida! E extremamente surreal.
O surrealismo norteou muitas capas de discos psicodélicos e progressivos nos anos 1960 e
70. As artes plá sticas e o rock por muito tempo andaram juntos. Hoje, com o desprezo do
pú blico pelas capas de discos, isso ficou para trá s.
ABREVIATURAS

Até poucas décadas, distribuíam-se folhetos pela rua com a abreviatura V.S., que queria
dizer Vossa Senhoria.
Hoje, nenhum publicitá rio usa mais essa forma de tratamento. Prefere dizer você.
Antigamente, abreviava-se apenas como v., e todos entendiam. Hoje, mudou para vc. Na
internet todos usam essa nova maneira. E até em bilhetinhos.
Outra abreviatura que mudou foi p/a: essa era a forma de se escrever abreviadamente
para, porque era p/ para dizer per (por) e a, acrescentado, para estabelecer a palavra.
Atualmente, escreve-se para apenas assim: p/.
Pessoalmente, ainda escrevo da maneira antiga, passados todos esses anos, principalmente
quando o faço rapidamente. Nã o me acostumei ainda com a nova escrita. No entanto, faz
parte da evoluçã o que as pessoas usuá rias da língua constroem. E as novidades vã o se
transformando em instituiçõ es, que um dia serã o derrubadas, por sua vez.
LER DEVAGAR

A vida toda gostei de ler. Em casa, ou em qualquer lugar. Se sabia que ia enfrentar uma fila,
levava um livro. Se sabia que ia ficar um tempo sem fazer nada, levava um livro. Sempre foi
assim. Como Jim Morrison, do Doors, que sempre levava um livro consigo.
A grande característica já foi a avidez. Devorava livros! Lia vá rios ao mesmo tempo, cada
um de um tipo, e com muita rapidez.
O que mudou com o passar dos anos foi a velocidade. Continuo lendo mais de um livro por
vez, um em especial e outros para descansar. Porém agora dou mais tempo para as
reflexõ es.
Mais comumente volto o pará grafo, ou até pá ginas, para reler. E paro mais frequentemente
para refletir sobre o que acabei de ler. Demoro muito mais tempo para terminar um livro.
Essa mudança veio com o amadurecimento. Ficamos adultos e crescemos. E o tempo nos
traz novidades, coisas que nã o esperamos na juventude.
Posso garantir que ler devagar é muito melhor. Aproveita-se mais da leitura. E o mais
importante sã o as paradas para reflexã o.
EQUILÍBRIO

Filosofias, religiõ es, ideologias, propugnam de uma forma ou de outra pelo equilíbrio. As
pessoas buscam esse modo de ser e de estar em suas vidas, conscientemente ou nã o. E o
que é o equilíbrio?
A palavra se origina do latim: aequilibrium. É a proporção equitativa. Cândido de Figueiredo [2]

dizia: Estado de um corpo, que é atrahido ou solicitado por fôrças oppostas, que se anullam
sobre um ponto de resistência.
Assim, para se falar em equilíbrio, deve-se pensar em forças contrá rias que se anulem. E
quais sã o elas?
A grande falá cia é querer que sejam o bem e o mal, como se fossem esses os extremos de
uma balança. Ora, há apenas uma forma de se obter o bem, e inú meras para o mal. Só há
uma maneira de se ser honesto, nã o importa a religiã o ou a falta dela, o pensamento, e
inú meras de se praticar a desonestidade.
Nã o se pode ser mais ou menos digno, mais ou menos correto. Mas se pode pensar num
deputado mais corrupto ou menos. Ele pode ter assumido atos de corrupçã o mais
virulentos que outro. O primeiro será mais desonesto que o segundo, porém ambos nã o
serã o honestos. A honestidade é a total ausência de corrupçã o. Ou se é ou se nã o é.
Estar no centro é estar longe dos limites. O bem está no fiel da balança. O mal, nã o nas duas,
mas nas mú ltiplas extremidades. Contrapô -las é destruí-las, resultando-se também no
equilíbrio, conforme definiçã o do dicioná rio da Real Academia Espanhola: Estado de un
cuerpo cuando fuerzas encontradas que obran en él se compensan destruyéndose
mutuamente.
Outrossim, estar num dos extremos, qualquer deles, é mau. Pode-se estar mais, ou menos,
pró ximo de uma das pontas. Entã o, estar equilibrado é ser bom. Esse é o princípio do
equilíbrio.
SONHOS N° 3

Meu amigo Armando esteve em Praga, Tchecoslová quia, e visitou o Museu do Comunismo.
Seus comentá rios foram sobre como um sonho de igualdade entre os indivíduos pô de se
transformar, na prá tica, numa realidade tã o diferente.
A ditadura de esquerda é tã o malévola quanto a de direita. O que o Brasil perdeu durante
os vinte anos de regime de força nunca mais conseguiu rever. Da mesma forma, os países
ditatoriais de esquerda. Sempre há perdas, principalmente culturais. E o que se vai é para
nunca mais voltar, por mais que se busque.
Os sonhos do socialismo utó pico se desvaneceram naqueles países, assim como os da
liberdade capitalista se alteraram para um monopolismo econô mico. Em ambos, os poderes
ficaram concentrados nas mã os de pouquíssimos seres humanos, fazendo dos povos
verdadeiras massas controladas, com as individualidades massacradas.
Muitos anarquistas, que sonharam com um mundo sem fronteiras nem governos, as
pessoas comandando-se por si e respeitando-se umas à s outras, acabaram entrando para
partidos políticos, ou criando-os, e distorcendo a ideia inicial. Outros ainda creem e
subsistem fora dos partidos.
A EXPRESSÃ O DA BELEZA

O que é bonito? É tudo o que nos agrada e nos toca no fundo de nosso coraçã o. Entã o
dizemos: que mú sica bonita! Que quadro bonito! Que bonito poema! Que filme bonito! É um
agradar gostoso, envolvente.
O Belo é mais que isso, é a nobreza do bonito. Os gregos antigos buscaram um ideal de
beleza na figura humana, representado em sua estatuá ria. Talvez a modelo que tenha
posado para o escultor da Vênus de Milo nã o fosse tã o bonita, mas o que nos foi legado é a
representaçã o de um ideal.
Se o conceito de beleza se amplia, nossa contemplaçã o, entã o, se perde, se evade. O que é
Belo se transforma em comum, o Feio se torna raro. É quando entra a nova estética, a
vanguarda. O Belo é sempre o que há de pouco, por isso mesmo valioso.
A evoluçã o cultural nã o é sistemá tica. A dialética humana é uma verdadeira polialética:
para cada tese, muitas antíteses. Isso torna imprevisível o Belo do futuro.
MAYA

Apreendemos o mundo através de nossos sentidos de percepçã o, como a audiçã o, o tato, a


visã o... Por mais perfeitos que possam ser, entretanto, sã o apenas meios de perceber o que
nos rodeia.
Os outros animais têm sentidos diferentes do nosso. Cada qual na sua á rea, uns percebem
melhor os odores, outros têm visã o diferenciada etc. Há insetos, por exemplo, que
enxergam o ultravioleta, invisível para nó s humanos.
Por conseguinte, ficamos a pensar: o que é real? Será que o que percebemos pelos nossos
sentidos tem quanto de realidade? Ora, nã o enxergamos tudo o que existe, nã o ouvimos o
ultrassom, só conseguimos alguns paladares, entã o falta-nos alcançar muitas coisas. Os cã es
pressentem coisas que sequer imaginamos.
O que percebemos é o que os hindus chamam de Maya, a teia de ilusõ es. Dessa forma, o que
nos parece real é totalmente ilusó rio, apenas uma percepçã o falha de nossos sentidos. Jung
escreveu que nossas percepçõ es nã o podem apreender todas as formas de existência.
O mundo como o sentimos é, como dizia Platã o, um jogo de aparências, fruto da experiência
cotidiana e sensível, o viver nos acontecimentos mutá veis.
Nã o temos a exata dimensã o da realidade, o que existe é muito mais, bem além do que
podemos perceber com nossa humanidade.
A OBJETIVIDADE DA ARTE

Se dissermos que a arte é subjetiva, concordaremos com uma ideia geral de que se inclina
para o gosto pessoal de cada um. Digo, no entanto, que o subjetivismo é um objetivismo
incompreendido.
Ora, quando dizemos que algo foi exposto com objetividade, estamos dizendo que a
exposiçã o mostrou as ideias com clareza, concisã o, sintética. É a ideia sem rodeios, sem
necessidade de explicaçõ es, observaçõ es, totalmente integrada em si mesma,
estruturalmente perfeita.
O subjetivo é o inverso, o oposto, o imaginá rio, o que exige explicaçõ es de toda a espécie.
Imaginemos entã o uma linha que vá do objetivo ao subjetivo: quanto maior o
entendimento, mais perto vai se tornando um do outro, até que o primeiro seja sinô nimo
do segundo.
A arte tem um ponto essencial, um quê inexplicá vel, indizível, sem decifraçã o racional.
Mesmo assim, nã o é iló gica e tem um poderoso vínculo com alguma realidade. Ela sai do
inconsciente do artista, mesmo que sua técnica seja consciente. E vai diretamente ao
inconsciente do receptor. Objetivamente.
Por vir do inconsciente, nenhum artista tem controle sobre o que faz. E a grande funçã o da
arte é o que toca o receptor sem que ele mesmo consiga explicar. Nã o há censura que
alcance essa funçã o direta. É muito objetivo!
A FUNÇÃ O DA ARTE

Nã o há maior e melhor porta-voz de uma sociedade que o artista. Como parte integrante,
ele passa a vivência de uma época e lugar.
O artista pode querer mostrar o que há de Belo, ou demonstrar sua maestria técnica, ou
engajar-se numa posiçã o ideoló gica, ou retratar seu tempo para a posteridade. No entanto,
sua maior importâ ncia é a de cumprir um equilíbrio para sua comunidade. Seu inconsciente
ligado ao inconsciente coletivo gera símbolos e o produto passa a refletir todos os anseios,
medos, sentimentos e sensibilidades da coletividade.
Imaginemos o universo limitado pelo espaço de um cubo. Ele é a capacidade falante de um
indivíduo. Nele estã o todas as palavras que o sujeito conhece para se comunicar. Vamos
representar as palavras por pontos dentro do cubo. Uma frase ou texto representaremos
por traços unindo os pontos. Cada ideia/emoçã o pode ser representada por um ponto ou
um traço, maior ou menor, ou até um conjunto de traços.
De repente, uma ideia/emoçã o indizível! Por mais que se juntem palavras, frases ou textos,
nada consegue exprimi-la. Um ponto inalcançá vel. O transmissor se emudece, frustrado por
nã o conseguir expressar-se. É entã o que nasce a arte, fruto de uma comunicaçã o frustrada.
O transmissor alcança o ponto, que ainda nã o existia, por meio de um poema, uma melodia,
uma escultura, um filme etc.
Amor é diferente de amour, que é diferente de love. Dizer que a canoa virou é diferente de
dizer aonac (a palavra invertida). Por isso, a dificuldade de uma traduçã o, a impossibilidade
de transformar uma obra de arte em palavras. Ela é o que é.
O GOSTO DAS COISAS N° 3

A palavra-chave para se apreciar uma obra de arte é a sensibilidade. Nã o se deve pensá -la
como iló gica, inexata. A arte é um poderoso vínculo com a realidade, filtrado por alguma
coisa sem decifraçã o racional. Acima da técnica, pode ser encontrada nos mais variados
aspectos do conhecimento humano.
A arte nã o é sempre bela, assim como nem toda beleza é arte. Entretanto, à s vezes uma
pode ser outra e vice-versa.
Mais conveniente do que entender uma obra de arte é senti-la. No entanto, ler e aprender
sobre ela é importante, para estar mais pró ximo do seu contexto.
Deve-se sentir o que o artista passa através da obra. Pode ser um clima, um sentimento,
uma mensagem. Captar o que é transmitido, voluntá ria e involuntariamente. Deixar que
tudo flua por nó s, sejam sons, imagens, sensaçõ es. Há de se continuar tentando até chegar
ao inexplicá vel.
É um verdadeiro diá logo entre o interior do artista e o interior de quem aprecia a obra.
Nã o há nada mais revolucioná rio que a conversa entre coraçõ es.
O PRAZER E A DOR

Na antiga Grécia, Platã o escreveu que o prazer é a ausência de dor. Epicuro dizia que o
supremo prazer é a ausência de dor e de agitaçã o.
Até hoje, dor e prazer sã o vistos como antagô nicos. E, no entanto, nã o o sã o, embora sejam
antô nimos. Tanto um quanto outro sã o impressõ es sobre nosso físico, nossa moral. Porém,
cada qual é um por si. Pode-se ter maior ou menor prazer, sem a presença da dor. E mais ou
menos dor, na ausência de qualquer prazer.
Pode-se ter ambos ao mesmo tempo, como sofrer de dor de estô mago enquanto se aprecia
uma bela mú sica. Ou num só ato, os dois estarem presentes.
Há o caso do masoquista, que busca em si a dor para sentir prazer. E do sá dico, que se sente
prazeroso com a dor de outrem.
Um homem pode estar muito infeliz e buscar uma forma de prazer para esquecer sua dor.
Ou mesmo vice-versa.
Os extremos da dor sã o a sua falta (nã o-dor) e seu excesso. Nã o há necessariamente prazer
na ausência da dor. Assim também os extremos do prazer: nã o é porque ele nã o exista que
necessariamente a dor estará presente.
Até certo ponto, o prazer é agradá vel e a dor nã o. Assim também, a pró pria felicidade nã o
pode ser vista como uma sucessã o de prazeres, ausente a dor. Nó s buscamos ambos,
mesmo que inconscientemente. É parte de nossa vida, é característica de ser humano.
IMAGENS NO DIA-A-DIA

Vivemos em meio a muitas imagens, está ticas ou em movimento. Elas estã o em toda parte.
Se estamos em casa, ou na rua, no trabalho, ou em algum estabelecimento comercial,
institucional, sempre temos à nossa volta uma infinidade de imagens. Sã o fotografias e
ilustraçõ es em jornais e revistas, cartazes está ticos ou nã o, televisõ es funcionando, fora o
cinema.
Nã o percebemos o quanto mudou nos ú ltimos cem anos. Nossa civilizaçã o era, até entã o,
representada em imagens nas pinturas e desenhos feitos à mã o, ou em gravuras de uma ou
duas centenas de có pias. Mesmo os jornais, revistas e livros tinham pequenas tiragens e
pouquíssimas figuras. Se formos mais alguns séculos para trá s, nem sequer tínhamos
imprensa.
A ú nica imagem pictográ fica numa casa, se havia, era a de um quadro pendurado na parede.
Nas ruas nã o havia imagens, cartazes com figuras ou fotografias. A pintura e o desenho, a
escultura, assim como a gravura e os mú ltiplos, eram as ú nicas formas de se obter imagens
para se expor em algum lugar. E eram raros!
Hoje, essas figuras feitas à mã o passam a ter um valor extra, apesar da multiplicidade de
imagens, pois sã o ú nicas, num mundo onde a copiagem é a regra.
A REPRESENTAÇÃ O DO INSTANTE

A mú sica e o teatro sempre foram artes que existiam apenas no momento em que eram
produzidos. Um som existia apenas na hora em que acontecia.
Com a invençã o do fonó grafo, a execuçã o musical pô de ser registrada. Nã o era mais apenas
o registro no papel, a indicaçã o de como deveria ser tocada, mas a gravaçã o para a
posteridade.
Da mesma forma, a filmadora pô de captar para o futuro a representaçã o teatral.
O que surgiu depois disso foram novas artes: a execuçã o musical passou a ter um caminho
que nã o tinha, que é a montagem. O cara entra num estú dio, toca primeiro a parte da
bateria, depois os instrumentos de corda, os de sopro, e por fim canta. Poucas pessoas
podem fazer o papel de muitas e o resultado é diferente do que se fosse a mú sica tocada ao
vivo.
Assim também o cinema, que deixou de ser um teatro filmado para se tornar uma colagem,
onde as cenas sã o filmadas mú ltiplas vezes e escolhidas as melhores, para entã o se editar o
filme. A televisã o e as produçõ es para internet seguem o mesmo padrã o: você nunca sabe o
que existia originalmente, apenas conhece o produto final, que nã o é necessariamente o
registro de um instante.
As novas maneiras artísticas nã o acabaram, entretanto, com a partitura e os livros de textos
teatrais, mantendo-se tudo lado a lado. É impensá vel achar que uma forma terminará com
outra, pois as novas criaçõ es passam a andar junto com as tradicionais.
A HARMONIA DAS ESFERAS Nº 2

Há uma teoria que diz que tudo no universo vibra. Nada é está tico. Tudo tem, portanto, seu
pró prio balanço. Esse movimento vibrató rio produz um som.
Assim como os planetas, as estrelas, os astros em geral, também a Terra e tudo que a
contém emitiria um som pró prio. Apenas nã o seria ouvido no espaço sideral, onde nã o se
escutam os sons por falta de ar que os propague.
Pensando nisso, pergunto: qual o som de um gato? No caso, nã o é o seu miado, porém uma
nota que resultaria da vibraçã o de seu corpo.
Afinal, qual o som de um ser humano? Emitimos todos a mesma nota musical? Ou ela varia
de uma pessoa para outra? O dedo sozinho emitiria uma nota diferente da mã o? Seria nosso
corpo um imenso acorde? Ou teríamos um som fundamental que resumiria todos os nossos
tons?
Assim, quando ouvimos uma mú sica que nos parece agradá vel, é porque ela se harmoniza
com os sons de nosso corpo. Se pensarmos em termos de chakras, há quem diga que cada
um deles tem sua correspondência a uma nota musical.
Ora, por que nã o ouvimos esses sons? Porque é muito sutil para os nossos ouvidos. E além
do mais, como seria para nó s escutarmos o tempo todo essa série de sonoridades?
Atrapalharia bastante! Nã o precisamos, afinal, disso para nossa vida diá ria. Porém, quem
sabe possamos ouvi-las através de algum exercício.
O HOMEM DE BEM

Como é bom ser bom.


MARTINS FONTES

Vivemos uma sociedade desvinculada do universo. O ser humano, para estar de bem com a
sociedade, polui as reservas naturais, incluindo o pró prio ar que respira e a á gua com que
sacia sua sede, além de, com seus costumes, contribuir para o aquecimento global.
Como fazemos isso? Só andamos de automó vel, moto e ô nibus, deixamos a á gua escorrer à
toa, jogamos detritos sem tratamento sobre os rios, acendemos lâ mpadas onde nã o é
necessá rio, usamos aparelhos de ar condicionado cancerígenos, enfim colaboramos para a
destruiçã o do ú nico ambiente onde podemos sobreviver, a Terra, e de nossos pró prios
corpos.
O homem de bem caminha de acordo com a sociedade onde vive, é o centralizado nela: no
nosso caso, ele é do mal, pois como é acordante com a sociedade, é descentralizado do
universo. Se fosse do bem nã o participaria das corrupçõ es, nem mesmo das pequenas
desonestidades.
Nã o se pode destruir o pró prio corpo, nem o de outrem, pois isso é se intrometer no
movimento natural do universo, que é mutá vel, porém ú nico. Nã o se pode, do mesmo
modo, e pela mesma razã o, destruir nossa morada.
A sociedade conservadora pressupõ e o uso de drogas lícitas e a perfuraçã o de partes
irremediá veis do corpo. Pessoas famosas usam drogas, todos sabem, tornam-se exemplos
para a sociedade e nenhum homem de bem faz nada.
O conservadorismo aceita o aborto, desde que ninguém veja, como se nenhuma pessoa
soubesse que acontece. Aceita também a jogatina, seja em forma velada ou financiada pelo
governo. Ora, na loteria quem ganha está levando o dinheiro de muito leite e pã o que nã o
foi comprado para ser gasto com o jogo. Muita gente deixa de comer melhor, ou
simplesmente de comer, para apostar numa ilusã o. E nossa sociedade apoia tudo isso.
Só há uma forma de se fazer as coisas direito, nã o duas ou três. Existe uma ú nica maneira
de estarmos centralizados no universo. Tudo tem um só caminho e é esse que temos que
buscar. Todos nó s.
CONHECER A LEI Nº 1

Um velho brocardo romano dizia: Ignorantia juris neminem excusat. Em bom português,
isso quer dizer: A ignorância do direito não é desculpa para ninguém. Isso quer dizer que
nenhuma pessoa pode dizer que cometeu um crime ou contravençã o por desconhecer a lei.
O direito, já desde a velha Roma, presume que todo cidadã o conhece a lei, ou, pelo menos,
tem o direito e o dever de conhecê-la. Essa é a maneira de fazer-se valer para todo mundo.
O estranho é que, apesar de tudo isso, ela é tratada pelos doutores como se fosse algo muito
complicado. E na verdade o é, cheia de meandros e subterfú gios. Assim, quem a conhece de
verdade? Somente alguns jurisconsultos, especialistas legais, apenas eles a detêm com
sabedoria, mas ninguém a sabe de cor, toda, com suas mudanças diá rias.
Com tais fatos, chegamos a outro dito nã o tã o conhecido quanto o primeiro, que diz:
Ignorantia juris controversi ignorantem excusat. Quer dizer que a ignorância do direito,
quando controvertido, é desculpa para o ignorante. Assim, o ato pecaminoso pode ser
perdoado quando houver controvérsia na lei. É o momento em que a ignorâ ncia da lei é
perdoada, pela pró pria falha que ela mesma apresente.
[3]
CONHECER A LEI Nº 2

Como já vimos, ninguém pode se desculpar de descumprir a lei por nã o conhecê-la. No


Brasil, repete-se o brocardo latino: Ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que nã o a
conhece.[4]

Entretanto, como conhecer a lei? Cinco anos numa faculdade de direito é pouco para tanto,
pois lá apenas se aprendem os rudimentos. O que se poderia dizer sobre uma vida?
Torna-se necessá rio, pois, fazer valer o que se está escrito nos grandes livros. A ú nica
maneira seria através das escolas, incluindo-se, junto à matemá tica e ao estudo da língua
pá tria, os princípios do direito e as principais leis para a vida diá ria.
Os meninos saberiam, legalmente, quando poderiam tirar frutos de alguma á rvore. Isso
para nã o falar das coisas realmente sérias, como o casamento, o divó rcio, o parentesco, as
questõ es de incapacidade jurídica, da moradia, da culpabilidade, da propriedade, entre
muitas outras.
Saber o que se pode, o que nã o se pode, os direitos e os deveres, as obrigaçõ es. Pelo menos
o principal.
Os primeiros ensinamentos já se norteariam junto com as primeiras letras. Melhores
cidadã os poderiam ser formados e uma sociedade mais consciente ser construída. Com
isso, chegaríamos mais pró ximo da realidade que a pró pria lei quer existir.
A CONDIÇÃ O DA BELEZA

Antes de ser forma, o Belo é um conceito. Mutá vel. É , no entanto, sempre fonte de prazer. O
nã o-Belo nos causa repulsa, o quase-Belo atrai, o Belo nos leva à contemplaçã o.
Ora, a Vênus de Milo é a representaçã o de um ideal. Todavia, por maior que tenha sido o
esmero do escultor, ele sempre esbarraria na limitaçã o do material, na pró pria estrutura
física da pedra, seu formã o e martelo, nas condiçõ es ambientais, na variaçã o climá tica e até
mesmo na sua condiçã o humana.
Por outro lado, para lermos um poema de Safo, poetiza grega que viveu entre os séculos VII
e VI AC, esbarramos na diferença de contexto e até de linguagem. Nunca a teria citado se
nã o a conhecesse por suas traduçõ es. Porém, desse modo, posso estar perdendo a graça
original, talvez um ar meló dico do grego arcaico, um sentido histó rico ou pessoal
compreensível apenas na época ou por quem a conhecesse pessoalmente.
Será que o tradutor conseguiu se aproximar do ponto essencial que Safo buscou? E se
tentá ssemos traçar a mudança dos sentidos que rodeiam as palavras e ideias que ela usou?
De alguma forma podemos conhecer a poetiza grega e alguma porçã o da beleza de seus
versos nos vem. É diferente, por exemplo, da escultura que, em tese, nã o necessita de
traduçã o, é verdade, porém mesmo assim podemos usufruir ambas.
O RITMO DE CADA UM

Quem nos garante que o mundo gira sempre na mesma velocidade em torno de si mesmo e
sempre na mesma rota em torno do sol? Assim também, o ritmo de cada pessoa funciona de
maneira diferente. O ritmo bioló gico é pessoal, nem todos funcionam igualmente.
Lembro-me quando, na adolescência, elaborei um biorritmo pessoal analisando meus dias.
Fazia curvas de aproximadamente sete dias subindo e sete descendo. Por que sete? Porque
é o nú mero de dias da semana.
Depois, elaborei um biorritmo anual, analisando os anos de alta e os de baixa que já se
tinham passado. Cheguei à conclusã o de que poderia prever os futuros anos em ascensã o e
queda.
Onde errei? Justamente no fato de achar que o ritmo seria sempre igual, tantos anos
subindo e tantos descendo, regularmente. Isso nã o ocorre, nem mesmo com os dias. Por
isso, nã o podemos pensar em termos de simetria.
Creio que pensar numa ideia de biorritmo está vel, eternamente está vel, é o mesmo que ter
a ideia de que nosso corpo é um reló gio. Nã o se pode imaginar um corpo como se fosse uma
simples má quina, externa ao meio em que vive. O meio influencia o ser como o ser
influencia o meio. O biorritmo é uma medida, mas nã o inexorá vel.
Ora, quando as pessoas nã o tinham reló gios para regular seus compromissos, elas
funcionavam de acordo com seus ritmos pessoais, mais ou menos ajustados ao da natureza.
E ninguém tinha nada a ver com isso, estava tudo certo e na mais absoluta ordem.
O SILÊ NCIO MEDIEVAL

Existe um detalhe que me chama bastante a atençã o quando observo quadros pintados na
Idade Média. Em geral, sugerem um silêncio respeitoso. As pessoas estã o sempre de boca
fechada e seus movimentos têm ares de lentidã o, quando nã o estã o ausentes. Elas parecem
estar posando para o pintor.
Isso é natural para uma época em que as ciências propunham um universo está tico, onde os
deslocamentos planetá rios eram perfeitamente circulares e em torno da Terra. Nada levava
à ideia de mudanças, muito menos de revoluçõ es.
Tal característica quase nã o existe nos quadros anteriores ou posteriores à era medieval.
De um modo geral, é como se emitissem sons. Uma paisagem nos leva a ouvir o barulho das
folhas das á rvores ao vento, um retrato respira, uma pintura retratando uma feira pode nos
fazer ouvir o murmurinho das pessoas comprando, anunciando mercadorias, conversando.
A arte abstrata e a contemporâ nea em geral sã o bastante barulhentas! Nã o raro, artistas
plá sticos trabalham ouvindo mú sica e acabam levando os sons para sua obra. Claro que,
entretanto, existem hoje também quadros silenciosos, mas isso é excepcional. Encontra-se
tal, principalmente, em obras surrealistas e de arte fantá stica.
A MÚ SICA E O SILÊ NCIO

Existe a partitura, que escreve a mú sica em seus mais variados aspectos: meló dico,
harmô nico, rítmico e dinâ mico. Ela inclusive escreve os momentos de silêncio, chamados
pausas, nã o apenas as notas musicais.
A mú sica se contrapõ e ao ambiente em que esteja sendo executada. Assim, num concerto,
há um relativo silêncio; numa festa ou na rua há barulho.
Ocorre que nos tempos atuais é muito difícil obter-se o sossego de séculos atrá s. Mesmo
dentro de uma sala de concertos, onde todos se portem reverentemente, sempre se ouvem
sons vindo de fora, como buzinas e freadas de automó vel.
Assim, a mú sica contemporâ nea já se reveste, desde sua composiçã o até sua execuçã o, do
ruído da civilizaçã o. Incluindo o som de ventiladores ou de aparelhos de ar condicionado.
Nos mosteiros antigos, qualquer som era contraposto ao silêncio, quebrado apenas pelo
canto dos passarinhos. Fossem os cantos gregorianos e cantochõ es, no caso dos ocidentais,
fossem os mantras, no caso dos orientais.
As pausas eram realmente silenciosas, como queria o compositor. Serviam para a
meditaçã o. Hoje, o silêncio é barulhento. O instrumento musical para de tocar, mas o som
continua. Nã o existe mais o momento para a reflexã o.
A ESCOLA E O DESSERVIÇO

A escola nã o pode servir para apenas preparar a criança para a sociedade que aí está . Isso é
um desserviço. A escola deve preparar o aluno para ser crítico do mundo. Deve preparar
para agir sobre o mundo, tornando-o melhor do que é.
Na verdade, ela pode até preparar o aluno para ganhar dinheiro, por uma questã o de
sobrevivência, mas nunca pode parar por aí.
A escola tem que ser mais do que aquilo que já é. Tem que ensinar o que existe de bom e
louvá vel, tem que ser um luminar para o educando, fazer com que ele se torne um ser
humano na acepçã o da palavra.
Se nã o for tudo isso, nã o estará cumprindo sua funçã o primordial, que é a de fazer meninos
e meninas se tornarem seres mais humanos, menos preconceituosos, menos corruptos,
mais honestos e bons.
Existem escolas hoje que se aproximam da funçã o primordial, mas sã o exceçõ es. Quem se
serve da educaçã o em geral nã o tem essa oportunidade. Preparar para o mundo que está
aí? Isso, a televisã o e a internet já fazem...
UM

Todos Deuses sã o deuses


Todos sã o um só Deus
Todas religiõ es sã o diversas
Cada uma é pró pria de si
Nenhuma é verdadeira sem fé
Cada ser humano tem sua Verdade
Cada verdade tem sua Divindade
E o que é verdade?
O que é Verdade?

DOIS

As coisas que sentimos


Nã o sã o as coisas que vemos.
As coisas que vemos
Nã o sã o as coisas que ouvimos.
Porque as coisas que sentimos
Sã o coisas que vemos e que ouvimos
E por isso nã o podemos ver
Nem ouvir
Mas sã o coisas que podemos sentir.
AGRURA NO TRÂ NSITO

O trâ nsito é nosso maior motivo de contendas. Outro dia, dirigindo, parei no meio da rua
para esperar o carro da frente, que estava parado, seguir. Em vez de ele ir pra frente, deu
ré...
E ainda foi virando pra estacionar numa vaga quase do meu lado! Bateu na minha frente.
Imediatamente gritei com ele e saí do meu Golzinho, pra ver o estrago. Na verdade, nã o
aconteceu nada, mas ele também gritou comigo, dizendo que tinha avisado que ia dar ré.
De onde eu estava nã o dava para enxergar o sinal da lanterna. Mas depois, olhando o Gol, vi
que realmente nada acontecera, e aí senti o erro que cometera, tendo gritado com ele
inutilmente. Arrependi-me e fui pro meu carro quietinho, quietinho, enquanto ele
continuou a gritar comigo, emitindo-me impropérios e quetais.
Nã o pude dar ré porque tinha um outro automó vel atrá s de mim. Esperei o da frente
terminar a manobra e segui meu caminho. Nã o melhorei em nada a vida de alguém tendo
gritado com o cara. Com isso, quem errou fui eu.
SENTIR OU ENTENDER

O que é mais importante na mú sica: sentir ou entender?


Quando estudava violã o, meu professor, seu Serafim, dizia que eu nã o podia olhar para o
instrumento enquanto tocava e sim para a partitura. Ensinou-me a forma correta de se
posicionar o violã o, a mã o, o braço, os dedos nas cordas, além de solfejo e teoria musical.
Para educar meu ouvido, ele pegava seu pró prio violã o ou violino e me fazia acompanhar
com acordes e ritmo. Ele me ensinava, portanto, a entender.
Alguns meses depois de estar com ele, comprei minha primeira guitarra elétrica. Logo
percebi que se tratava de outro instrumento, cuja técnica era diametralmente oposta ao do
violã o. Naquela época, nã o existiam escolas que ensinassem a tocar guitarra elétrica, que
nem era considerado instrumento musical. Porém, as aulas do seu Serafim me auxiliaram
muito, principalmente porque já estava acostumado a tocar sem olhar: tomei a prá tica,
assim, de tocar de olhos fechados, ouvindo a mú sica que fazia. Foi assim que desenvolvi a
nova técnica, sem escola, sem partitura, só no ouvido. Embora entendesse o que fazia,
conseguia sentir com muito mais emoçã o a minha pró pria mú sica.
Com outros instrumentos, como a flauta-doce, comecei também entendendo para depois
sentir. O que seria, entã o, sentir sem entender? Nã o sei, a nã o ser o que eu ouvia antes de
começar a estudar. Posso dizer que o entender me ajudou a sentir com mais intensidade,
mas isso só depois de muitos anos, pois no começo eu precisava me desvencilhar de um
para obter o outro. Minha opiniã o naquele tempo seria diferente da atual. Mas posso
garantir que sentir é mais gostoso que entender, embora tenha a mesma importâ ncia e um
seja suporte do outro.
MANDALA

A mandala é uma figura geralmente circular, com objetivo estético, mas também como
forma de equilibrar o indivíduo que a observe ou que a faça. Carl Jung as desenhava como
forma de terapia pessoal.
A palavra mandala vem do sâ nscrito e significa círculo. Apesar de sua origem oriental, ela
nos remete, ocidentalmente, à Roda da Vida medieval. Mas o símbolo é utilizado
mundialmente por diversos credos religiosos e esotéricos, numa significaçã o de
perenidade, eternidade, ou mesmo de ciclos e repetiçã o. Vem daí sua representaçã o como o
centro da Terra ou do universo.
A princípio é apenas um desenho ou pintura. Uma simples circunferência irregular traçada
a mã o já pode ser uma mandala. Ou um grafismo extremamente detalhado e multicolorido,
regularíssimo, baseado em repetiçõ es e círculos. Construí-la é o típico exemplo de uma
atividade que fica entre o intelectual, o espiritual, o artesanal e o artístico. Sua feitura pode
misturar o consciente e o inconsciente.
Sã o feitas de diversos materiais. Podem ser de papel, vidro, metal, madeira ou até de
plá stico! Podem ser encontradas em diversas civilizaçõ es, seja em livros, nos objetos ou na
arquitetura.
Os budistas tibetanos fazem-nas na areia, bem complexas e coloridas. Quando terminadas,
sã o irremediavelmente destruídas, como um ensinamento sobre a impermanência e
fugacidade das coisas no mundo.
O SER HUMANO, ESSE DESEQUILIBRADO Nº1

Buscar é um meio de se chegar a algum lugar. Entretanto, buscar o equilíbrio é idealizar,


pois nunca estamos exatamente no centro. Estar no centro é ser eminentemente bom. Há
uma ú nica maneira de se ser bom, um ú nico modo, um ú nico estar. Os opostos, longe do
meio ideal, sã o sempre atraentes para o ser humano, que se desloca fatalmente para eles.
Toda questã o humana se resume em estar mais pró ximo ou distante do equilíbrio. É
diferente do animal, equilibrado com a natureza à sua volta, equilibrado com o universo.
Mas o animal nã o tem o livre arbítrio, segue seu caminho por instinto, apenas assim.
Nó s temos a intuiçã o e o raciocínio para nos guiar. O instinto existe em nó s, mas nã o
podemos nos dirigir por ele unicamente, justamente porque temos um poder de decisã o. E
para nosso alvedrio, isto é, para nossa liberdade de escolha, intuímos e raciocinamos. O
cristã o tem ainda o poder do Espírito Santo, que é como a intuiçã o, mas vem apó s o
raciocínio, nã o antes.
Com tanto poder na mã o, o ser humano acaba nã o sabendo como agir, e se desequilibra
constantemente, nunca estando no centro. E no entanto, é o meio de desenvolvimento,
sempre saindo do centro, embora na busca do equilíbrio.
CEVADA

Todos os grãos são bons para alimento


do homem,...; e a cevada para todos os
animais úteis e para bebidas suaves...
Doutrina e Convênios 89: 16-17

Muita gente substitui o café pela cevada. Entretanto, nada tem a ver um com a outra.
Embora sejam idênticos na cor e na textura, sã o muito diferentes, no sabor e no aroma.
Além do mais, a cevada alimenta, tem nutrientes e engorda. Ela é escura, amarga e nã o é
excitante. Numa visã o macrobió tica, eu diria que é até extremamente yin.
Em casa, substituímos a rubiá cea pela cevada e a tomamos sempre. Minha esposa adora!
Ela era fissurada no café, toma hoje cevada regularmente. Fazemos e colocamos na garrafa
térmica, para tê-la disponível o dia inteiro.
O modo de fazer é quase o mesmo do café: você pode fazer com filtro, mas tem que ser de
pano, porque no de papel nã o passa. Se preferir, apenas ponha o pó no fundo do recipiente
e jogue á gua fervendo por cima, deixando descansar e tomando depois, como se fosse o café
turco.
Para uma chaleira de á gua, coloco duas colheres bem cheias de pó . Se fizer bem forte, serve
também para ser utilizada em receitas. Dá pra fazer bolo e, se for mais fraquinha, pra
acrescentar na massa de uma torta, no lugar da á gua.
Nã o precisa pensar em descafeinar, porque naturalmente nã o tem cafeína. Por ser
alimento, só se tem a ganhar e até as crianças podem tomar sem perigo. Dá pra tomar com
leite e até pra fazer capuccino. Fica uma delícia se tomada com chantili por cima. O preço,
por enquanto, é muito mais baixo que o do café, mas nã o sei até quando. Nó s
experimentamos e gostamos.
O SER HUMANO, ESSE DESEQUILIBRADO Nº2

Buridan, um pensador medieval, contou um caso hipotético que seria, a seu ver, trá gico!
Pois eis que um asno, com muita fome e sede, ambas as coisas na mesma intensidade, seria
colocado bem no meio de um caminho que tivesse, de um lado, á gua, e do outro, comida.
A tragédia existiria porque o asno nã o poderia decidir se saciaria primeiro sua sede ou sua
fome, ficando no meio do caminho até sua morte. Tudo porque nã o tem o poder de decisã o,
o livre-arbítrio, pró prio apenas do ser humano.
Nó s, por outro lado, na situaçã o do asno, nos desembaraçaríamos por uma das duas
alternativas e, por uma questã o de sobrevivência, nos desequilibraríamos por alguns
momentos, tornando-nos apenas saciados de uma das necessidades. O equilíbrio viria com
o saciar de ambas.
Eis cá , portanto, a explicaçã o do porque o ser humano tem que se desequilibrar: na busca
do equilíbrio constante, deve sempre sair do centro, a fim de se movimentar além e
continuar seu caminho na vida. Isso nã o quer dizer que devamos ter por norma viver
desequilibradamente: tudo deve sempre rumar para o centro.
Aqui, falamos em sobrevivência. Mas filosoficamente o ser humano está sempre achando
contradiçõ es em suas crenças, saindo assim de um equilíbrio de pensar para chegar a
outro, um pouco acima do anterior. E por que acima? Porque o que se segue tem a
experiência do que veio antes, como numa espiral, em que uma circunferência vai acima de
outra e assim por diante. Do faminto e sedento para uma situaçã o de saciedade. E assim até
nova sede e fome.
Ora, se Deus é dez, o ser humano é nove! Isto é, Ele é a beleza da precisã o, do equilíbrio
dinâ mico; nó s, a beleza da imperfeiçã o, da incompletude, da constante busca. Ele comanda
a roda da vida, nó s somos o homem com a lanterna na mã o. Nossa vida é um treinamento
para sairmos do nove para o dez.
DESTINO

Teilhard de Chardin, como pensador cristã o, é dos que creem existir um destino da espécie
humana, assim como da pessoa. A ideia de destino é partilhada por muitos, porém de
forma distinta entre uns e outros. Pois há duas maneiras de se vê-lo: a primeira é a fatalista,
que pensa nele como algo inexorá vel, independente de nossos atos; a segunda o faz
consequência de nossas atitudes.
Creio, entretanto, numa terceira forma: o destino existe, mas nã o é imutá vel, nem pura
consequência de nossos atos. É , todavia, uma combinaçã o dessas duas maneiras.
Toda açã o tem uma reaçã o, é verdade, mas o que fazemos nã o é solitá rio no universo,
relaciona-se com o já existente à nossa volta. Portanto, existe a reaçã o sobre os
movimentos da natureza, que afeta o destino da espécie humana, a qual afeta o das pessoas
individualmente. Isso se mistura com o que cada um de nó s constró i em nossas vidas, que
afeta, por sua vez, a espécie, o mundo, o universo.
Assim, tudo o que nos acontece é resultado do que fazemos, mas também do que o Universo
prepara para nó s. Em outras palavras, o Destino nos dá uma determinada vara para pescar
e uma determinada lagoa, nó s decidimos se vamos ou nã o pescar, como fazê-lo, a que hora,
como usar a vara, além do que Ele pode nos deixar mais ou menos peixes disponíveis e nó s
podemos ser mais ou menos diligentes na pescaria, mais operosos ou contemplativos... O
resultado poderá ser mú ltiplo.
Ou entã o, desacredite-se no destino.
SILÊ NCIO PARA OUVIR MÚ SICA Nº1

Hoje em dia, para se ouvir mú sica basta apertar um botã o que se podem ouvir horas
seguidas de sons musicais. Isso nos faz pensar sobre a qualidade do que ouvimos.
Podem até serem cançõ es de extremo apuro, todavia estarã o em sequência quase sem
intervalos, com pequenas pausas intermediando. Ouvem-se mú sicas seguidas como se
fosse tudo um ú nico som intermitente. Isso é ruído!
Num concerto erudito, há entre os nú meros musicais um espaço silencioso, irregular, que
nos prepara para a pró xima mú sica.
No tempo dos discos de vinil, o tempo musical era de, no má ximo, de uns 15 a 25 minutos!
Entã o, precisava-se ir até o aparelho de som para virar o disco ou trocá -lo. Havia um
silêncio intermediador. Era o período em que o ouvinte parava suas atividades para se ligar
no que estava tocando. Havia uma tendência maior em se prestar atençã o. Nã o havia
controle remoto para reiniciar o disco. Acabava, reinava o silêncio.
Claro, existia a vitrola automá tica, mas entre um disco e outro sobrava um tempo para o
braço sair do disco de baixo, subir, bater no de cima, que entã o caía, para daí a agulha ir à
primeira faixa do disco, que nem sempre chegava exatamente no início. Era uma forma de
manter o ruído que se formava.
A mú sica em si é feita de pausas e sons e estes só sã o percebidos quando contrapostos a um
relativo silêncio. Muita mú sica em seguida, portanto, vira barulho, e a gente acaba nã o
ouvindo. É preciso um período para a reflexã o, o descanso, a preparaçã o para a pró xima.
Para se gostar de mú sica, deve-se aprender a ouvir o silêncio.
OUVIR O SILÊ NCIO

O silêncio absoluto inexiste na natureza. Sempre há algum som. Ouvir o silêncio é saber
escutar os pequenos sons que permanecem, como algum pá ssaro que canta ou um cã o que
late ao longe, o mar batendo a dois quilô metros de distâ ncia, uma folha que o vento leva
pelo chã o.
Isso é um exercício que todo aquele que tem o dom da audiçã o deve praticar: ficar o quanto
possível imó vel e buscar os sons que o rodeiam. Desde os externos até os que vêm de
dentro de seu pró prio corpo. Se preferir caminhar, juntar aos sentidos o som de seus
passos.
Sim! O ritmo corporal, através da respiraçã o. As batidas do coraçã o, mais sentidas que
escutadas propriamente. E nã o só o ritmo, mas os tons emitidos, mais graves, mais agudos.
Os que vêm do estô mago.
Além disso, de onde vem cada som? De dentro de nosso corpo, de fora, de longe, de perto,
da direita, da esquerda, de trá s, correndo de um lado para o outro, numa multifonia
natural!
Se estivermos do lado de um computador ligado, o barulho da ventoinha...
Ouvir o silêncio é uma brincadeira infantil que serve para nos sensibilizarmos durante a
vida inteira.
SILÊ NCIO PARA OUVIR MÚ SICA Nº2

Para se entender mú sica, há primeiro de se entender o silêncio.


Quando vamos a um concerto, presenciamos diversos tipos dele. O primeiro, ao chegar, é
aquele em que o pú blico está conversando, em que escutamos o ranger de cadeiras, alguma
risada...
O segundo é quando, no caso de uma orquestra, os mú sicos entram no palco e começam a
afinar seus instrumentos. A plateia já diminui seu barulho, respeitosamente. Entram em
cena os sons musicais, que ainda nã o é a mú sica. Esse momento é emocionante! A isso se
segue um silêncio dos mú sicos.
Entã o vêm as palmas para o maestro, que entra. Ele fala alguma coisa, pode apresentar
algum solista, que entra também sob aplausos. Aí é a vez do terceiro silêncio, quando à s
vezes até se pode ouvir a respiraçã o do ouvinte a seu lado. É o reverencial, em que todos
aguardam pelo início do concerto propriamente dito. O maestro levanta os braços e
introduz o que vinha sendo esperado!
O ar é tomado apenas pela mú sica, o pú blico reverentemente se silencia. O resto, já se sabe:
as palmas ao final, à s vezes acompanhadas por alguns gritos, a calmaria e a retomada do
concerto, isso podendo se repetir mais vezes, até o final, quando todos se vã o para seus
silêncios particulares. Ou barulhos.
O Ponto de Vista de Quem Observa

É diferente o ponto de vista de quem observa daquilo que realmente é. O que percebemos
nã o é a coisa em si, mas apenas o que conseguimos captar da realidade.
Existe um universo real, de onde emanam diversos reflexos. Desses todos, captamos alguns,
através de nossos sentidos, como a visã o, a audiçã o, o tato. E cada qual de nó s diferente, de
maneira pessoal.
O ar nunca é frio ou quente, mas nó s o sentimos assim. É uma de nossas formas de percebê-
lo. Quando ele se movimenta e bate em nosso rosto, nó s o sentimos em forma de vento.
Notamos desse modo a sua existência, inclusive se nos vem com algum aroma,
identificando outros elementos da natureza. Portanto, o ar existe, mas nó s nã o o
conhecemos, nã o o que ele realmente é: apenas por seus reflexos em nossos sentidos.
Os odores nã o existem por si, muito menos da forma como os distinguimos, a nã o ser para
nossos narizes.
Assim as cores: nó s as vemos de acordo com a impressã o que a luz causa sobre nossos
olhos, mas isso nã o quer dizer que as coisas sejam da cor que enxergamos...
Da mesma forma, quando temos a impressã o de que alguém chega à porta de nossa casa,
antes mesmo de apertar a campainha ou bater palmas, estamos agindo por meio de nossos
sentidos, impregnados pelo que acontece à nossa volta.
O que sentimos nã o é o que existe no universo, mas tã o somente o que apreendemos dele.
Muitas características ele pode oferecer sem que tenhamos sentidos capazes de percebê-
las.
A realidade nã o é racional. Ela nã o segue esquemas pré-determinados, nem teorias ou
postulados. E é muito mais ampla do que nossos corpos e mentes conseguem compreender.
O QUE É REAL

Credo quia absurdum. [5]

Se a realidade é muito maior do que podemos compreender com nossos sentidos, nosso
raciocínio é pouco para entendê-la.
Eu pesava pouco mais de noventa quilos. Fazendo uma determinada dieta, cheguei aos
setenta e cinco, mais ou menos.
Um dia, comecei a me pesar em duas balanças eletrô nicas, de farmá cias da mesma rede. E
passei a notar que continuava emagrecendo, mas numa média de duzentos gramas por dia.
Achei demais, porque já nã o estava mais fazendo dieta alguma. Pelo contrá rio! Comecei a
ficar muito preocupado!
Principiei uma superalimentaçã o para ver se parava a queda vertiginosa de peso, no
entanto nada ocorria... Isso passou a ser tã o inquietante que procuramos um médico. Ele
me pesou e passou uma bateria de exames. Fiz todos!
Nã o deu nada... Pelo contrá rio, havia até melhorado meu colesterol, por exemplo. Fiz outra
bateria. Precisei esperar alguns dias, novamente, pelo resultado.
Ora, todos os sinais do universo indicavam que eu estava doente! Ligava a tevê e aparecia
um programa falando sobre doença. Pegava uma revista e lá vinha uma matéria falando
sobre doença. Além do mais, pelo meu raciocínio, eu estava contaminado. No entanto, apó s
uma oraçã o sincera, peguei uma revista de minha igreja e abri numa pá gina qualquer, para
escolher alguma matéria para ler. A resposta veio imediata: Estou limpo! Era o ú nico lugar
que dizia que eu nã o estava doente. Todos outros sinais do universo diziam o contrá rio.
Quando fomos pegar o resultado dos exames... deu negativo! E ao voltar ao médico, meu
peso estava igual, contrariando todas as vezes que eu fora nas farmá cias. Suas balanças
estavam erradas! Todos os acenos advindos do raciocínio ló gico formal estavam errados.
Apenas o espiritual acertou. Apenas ele estava sintonizado com a realidade. E até hoje,
quando aqui escrevo, mantenho o mesmo peso de aproximadamente setenta e cinco quilos.
JILÓ DE PANELA

Nem todos gostam. Muita gente diz que odeia, sem nunca ter experimentado, o que é um
contrassenso. Aliá s, nã o sei por que é tã o caro. Eu amo! E tenho um jeito de fazê-lo, muito
singelo e delicioso.
Lave bem os jiló s, corte as tampinhas e jogue-as fora. Entã o, cada fruto (ele é um fruto!)
deve ser colocado em pé e cortado em quatro partes longitudinalmente, como se fossem
quatro gomos. A forma de cortar é muito importante, pois é ela que valoriza o sabor.
Nã o tire a casca e nem coloque sal ou qualquer outro tempero.
Ponha todos numa panela com pouquíssima á gua, só o suficiente para nã o queimar, um
fundinho mal-e-mal. E deixe-a tampada, no fogo alto. À s vezes, com uma pá de madeira, ou
uma colher-de-pau, mexa para nã o grudar e ajudar a manter a homogeneidade.
Você vai saber a hora em que está pronto, pela aparência e pela maneira como fica molinho
quando se mexe com a colher. Eu gosto de deixar tostar um pouco, pra ficar mais yang.
Entã o, sinta o cheiro, desligue o fogo e imediatamente coloque um pouco de shoyu (chô io),
misturando bem. Volte a tampar e deixe descansar por alguns minutos.
Fica saboroso! Vai bem com um virado de feijã o.
ARTE E ARTESANATO

O oleiro faz um vaso, manipulando a argila,


Mas é o oco do vaso que lhe dá utilidade.
LAO-TSÉ ; Tao Te King, XI

Todo artesão vive cercado de coisas formosas. O artesanato tem duas características, que o
diferem da arte: ele é sempre utilitário e tende ao bonito.
Dizer que ele é utilitá rio é dizer que sempre serve para alguma coisa. Tudo que se faz no
artesanato tem uma utilidade: é para guardar algo dentro, é para pendurar, para enfeitar,
para enxugar, é sempre com algum objetivo prá tico.
O artesã o nunca faz algo que seja propositalmente feio, ele busca a pulcritude. Em geral, o
que ele faz tem que respeitar alguma estética.
É diferente com a arte. Ela nã o é necessariamente utilitá ria, geralmente nã o serve para
nada, embora possa até enfeitar ou ter algum uso prá tico. Da mesma forma, nem sempre o
objeto artístico é belo.
O artesã o se cerca de coisas belas, o artista nã o necessariamente.
A arte tem sempre uma mensagem, ainda que inconsciente. Isso é fundamental. E ela
obedece a um ímpeto interior, de necessidade humana.
Por isso, arte nã o é artesanato e vice-versa. Isso nã o faz, entretanto, com que um seja
superior à outra. Por isso, mentimos quando dizemos que tal artesã o é um artista pela
beleza de suas peças! Cada qual em seu lugar.
No entanto, é muito comum que uma invada o espaço de outra e, assim, o artesã o possa
praticar um pouco de arte e o artista um pouco de artesanato.
Além do mais, como se diz por aí, o mú sico tem estú dio; o artista plá stico, atelier; o artesã o,
oficina.
CALABRESA COM ORÉ GANO

Existem pratos que todo mundo faz, mas que cada um de uma forma diferente. É o caso da
linguiça calabresa. Tenho um jeito que eu gosto mais e vou descrevê-lo.
Coloque a linguiça pra congelar. Pode ser de um dia para o outro. Entã o a retire do
congelador ou do freezer e espere um pouco degelar, mas só o suficiente para desgrudar
uma de outra.
Descoladas, coloque-as sobre uma tá bua de cortar, pegue uma faquinha de ponta e espete
até a madeira em vá rios pontos das linguiças. Isso servirá para que a gordura saia na
frigideira e ajude-a a fritar.
Se nã o tiver uma uóki, use uma frigideira ou uma panela baixa, sem tampa. Coloque as
linguiças já furadas, ainda congeladas, sobre ela, espalhadas, e acenda o fogo alto. Jogue
entã o um mínimo de á gua, só um pouquinho, pra nã o queimar logo de cara a sua calabresa.
Algumas pessoas usam ó leo, mas isso eu condeno, pois endurece a pele e engordura muito.
Você verá que a pró pria á gua do descongelamento, somada à gordura que sai das linguiças,
irá fritá -las todas regularmente. Pessoalmente, gosto de deixar tostar um pouquinho. Só se
tem que virar uma vez, todas elas, para queimar igualmente de ambos os lados.
O segredo é, pouco antes de virar, jogar o orégano majestosamente sobre tudo, deixando
que se exale o aroma da erva!
Sirva logo que terminar o preparo. Deve ser comido com arroz e uma saladinha.
BELEZA

Desejo aprender cada vez mais a ver o belo


na necessidade das coisas: é assim que serei
sempre daqueles que tornam as coisas belas.
F. NIETZSCHE; A Gaia Ciência, 276

A ideia do belo é algo que se modifica com o tempo, assim como da arte. Durante muito
tempo, o que se pensou a respeito da arte é que ela tinha que ter beleza.
Assim, há o subjetivismo e o objetivismo. No primeiro, nã o há modelos; no segundo, eles
imperam, como no caso do enunciado de Santo Tomá s de Aquino:... belas, com efeito, são
chamadas as coisas que, vistas, despertam prazer.
[6]

A arte nã o é nunca subjetiva, ela tem sempre algo a dizer, ainda que para isso nã o existam
palavras.
Já a beleza nã o se pode dizer que seja objetiva, pois mesmo no conceito de Tomá s de
Aquino há o despertar de um sentimento pessoal: mesmo que algo seja prazeroso para
alguém, pode nã o se-lo para outro.
Assim, um modelo pode agradar alguém e nã o outro. Entretanto, a determinaçã o sobre o
que se pode ou nã o gostar obedece a critérios histó ricos, a vida de cada um. Isto é, há
mú sicas que me apetecem porque historicamente eu vivi algo que as elas me remetem
deliciosamente. Outras me sã o odiosas porque me levam para lugares que nã o me
interessam. Outras, ainda, posso gostar por motivo nã o histó rico.
Por isso inventaram o conceito do bom-gosto, associando-o a um viver bem, a um estar
rodeado de coisas belas e agradá veis, conforme a noçã o de uma minoria autoritá ria.
Querela dos Universais

Assim é chamada uma questã o insistentemente discutida na Idade Média. Basicamente,


sobre a relaçã o existente entre a palavra e a coisa. Isto é, a palavra fala de coisas existentes
e inexistentes. Qual a relaçã o entre o nome e a coisa, a linguagem e a realidade?
Ora, qual a relaçã o entre o que falamos e a realidade sobre o que dizemos?
Quando damos o nome a algum objeto, nã o estamos mais do que apenas apontando-o. Nã o
precisamos estar com ele em nosso poder, embora o enunciando seja como se o tivéssemos.
Por isso é tã o importante usarmos palavras em nossas oraçõ es: ao utilizarmo-nos de tais,
adquirimos o poder de estar com as coisas como que em nossas mã os, já naquele instante.
A meditaçã o zen procura pensar em nada, no nada. É a ausência de palavras, além de todo
pensamento. É o estar fora de toda querência, o inverso da oraçã o.
A Questã o dos Universais se torna extremamente atual, considerando os meios de
comunicaçã o de massa: o que se propaga com palavras é o que se está apresentando? A
veracidade pode nã o ser o que aparenta.
TORNAR-SE DEVOTO

Pois, se não houver fé entre os filhos dos homens,


Deus não pode fazer milagres entre eles;
portanto, ele não apareceu senão depois que
tiveram fé.
É ter 12: 12

É impossível provar racionalmente a existência de Deus.


Vá rias tentativas houveram para tanto. Uma que considero interessante é a de Santo
Anselmo. Ele criou uma demonstraçã o racional. Ela pode ser resumida da forma como se
segue.
A palavra Deus indica um ser perfeito. No entanto, se Ele nã o existisse, deveríamos supor
em algo ou alguém maior, que tivesse existência real. Afinal, existir é uma das perfeiçõ es.
Entã o a palavra Deus só pode indicar um ser realmente existente.
Ora, ninguém se torna devoto com uma explicaçã o dessas. Ela pode servir por um instante,
ou dois, mas nã o permanece. Apó s o convencimento, uma contradiçã o virá e uma nova
conclusã o será tirada. O processo dialético é pró prio da mente humana e nã o serve para os
propó sitos da fé.
O converter-se é diferente de se convencer. A ú nica maneira de uma pessoa se converter é
através de uma experiência religiosa, que suplante os sentidos de percepçã o bá sicos. Trata-
se de transcendência: um convertido é alguém que passou por um momento de
discernimento suprarracional. Uma epifania. A experiência extra-sensorial é importante,
para nã o dizer fundamental, para a conversã o. Ela transforma a pessoa e cria uma crença.
Esse é o ú nico caminho para tornar-se devoto.
ARROZ DE TORRESMO

Esse prato eu mesmo inventei. Pela delícia que ficou, passo para você, que me lê. Faça-o
também e depois me diga o que achou.
Pegue o arroz já lavado e coloque-o numa panela, com á gua por cima para cozinhá -lo. Jogue
pouco sal. Se o arroz nã o for integral, ponha um pouquinho de shoyu. Deixe ferver e
mantenha o fogo.
Pegue o torresmo, em pedaços, numa quantia generosa, e jogue-o sobre o arroz. Mexa com
uma colher de pau para misturar bem e deixe estar sozinho, docilmente meio tampado.
O prato se faz sem mais ajuda. É só esperar que ele termine de secar. Se estiver o arroz
ainda durinho, vá pondo um pouco de á gua quente até ficar no ponto. E sem mais delongas,
seu arroz de torresmo está pronto! Nã o o sirva logo apó s desligar o fogo, deixe-o descansar
alguns minutos.
É só . Nã o vai cebola, nem alho, nem ó leo: esse ú ltimo advém do pró prio torresmo. Seu
sabor é inigualá vel. Acompanha uma saladinha. É um prato muito simples e dadivoso.
FELICIDADE

Feliz o homem que não pecou com a sua boca


e que não foi ferido pelo remorso dos pecados.
Feliz aquele cuja consciência não o acusa
e aquele que não perdeu sua esperança.
Eclesiástico 14:1-2

O objetivo da vida de qualquer pessoa é ser feliz. Mesmo um suicida, pratica seu ato
pensando numa felicidade de sair da situaçã o em que se encontra. Alguém que se encontre
faminto, ou sedento, quer saciar sua fome, ou sede, para assim se tornar mais feliz. A
sobrevivência é felicidade.
Há muitas formas de se ser feliz. Mesmo quando a pessoa nã o perceba, ela está
constantemente procurando isso.
Procurar por fama, poder e dinheiro sã o maneiras de buscá -la, mesmo que nã o se encontre.
Meditar e orar sã o também modos para se achá -la.
O que ocorre é que as pessoas ignoram a felicidade quando a encontram. Estã o vivas e nã o
agradecem por isso. Estã o lendo este livro e nã o distinguem a fortuna que é poder ler e
reconhecer mensagens através disto. Comem e bebem e nã o notam como isso é prazeroso.
Utilizam-se dos ó rgã os dos sentidos e nã o percebem como isso é importante para sua
alegria. Conseguem raciocinar! Podem ouvir mú sica, admirar belos quadros, contemplar
esculturas, apreciar poemas, assistir filmes ou peças teatrais, dançar, cheirar perfumes!
Aprender coisas novas! Podem escolher no que acreditar! Conseguem conversar, trocar
ideias! Têm famílias, podem fazer amizades! E quantas coisas nos sã o possíveis! Tudo isso é
ditoso. E muito mais.
Sã o sempre pequenas coisas, pequeninos detalhes. Do mínimo se obtém o má ximo.
O primeiro passo é reconhecer a felicidade. A nã o ser que você tenha medo de ser feliz: aí, a
histó ria será outra.
FELICIDADE ENTRE OS ANIMAIS

Quem cria animais sabe quando eles estã o felizes. Um animal doméstico é feliz quando sabe
que tem um dono. Ele é feliz quando sabe atender ordens. Ele fica feliz quando tem comida
e á gua. Fica também feliz quando recebe carinho. E até quando dá uma coçadinha ou
lambidinha. Nã o é só quando está contente que ele é feliz.
Quando dou de comer a meus cã es, costumo sempre que possível fazer uma festinha neles:
assim, comem com mais vontade e alegria, sempre abanando o rabinho. A comida desce
melhor e os nutrientes funcionam mais satisfatoriamente. É o mesmo que acontece com o
ser humano, que quando está risonho come melhor e o alimento se torna mais nutritivo.
Minha filha tinha uma fêmea de anã o russo, que é um tipo de hamster. O bichinho foi vítima
de um A.V.C. (derrame) e ficou arrastando as patas traseiras, com deficiência no trato de
uma das dianteiras. Ficou quase cega, ainda. Caso vivesse na natureza, estaria totalmente
perdida! Condenada à morte.
No entanto, no criadouro, tinha sempre á gua e comidinha já pronta, pouco precisando usar
sua praticamente ú nica pata restante. Cogitou-se de sacrificá -la, mas nã o havia motivo.
Afinal, ela mostrava-se perfeitamente adaptada à nova situaçã o física e pronta sempre a
satisfazer suas necessidades de fome e sede. Embora nã o tivesse mais condiçã o de subir as
rampas da gaiola, andava pelo andar térreo se arrastando. Ainda assim, vivia caindo de si
mesma e rolando.
Todo ato possível para sua pró pria sobrevivência ela praticava. Mostrava-se feliz com sua
vidinha. Por que matá -la? Que direito teríamos para tanto? Resolvemos mantê-la viva e
com todas as premissas para deixá -la o mais feliz possível.
O animal nã o tem as complicaçõ es criadas pela mente humana. Ele nã o se revolta pelo
destino que enfrenta. Sua psicologia é diferente, ele é muito mais adaptá vel que nó s a novas
situaçõ es de sua vida e, portanto, muito mais apto a reconhecer sua felicidade. Mesmo que
nem saiba o que é isso.
EQUILÍBRIO E PAZ Nº1

Para estar melhor em minha vida, quero dizer, mais sintonizado,


Duas coisas sã o importantes:
A oraçã o
E ouvir mú sica.
A primeira me sintoniza com Deus
E a segunda comigo mesmo, embora
A mú sica sirva também como forma de
Comunicar-me com o Divino.
Na verdade, ambas sã o atividades que se pode aplicar sozinho ou junto com mais gente. O
melhor é praticá -la em família. Quando isso nã o é possível, faço em minha solidã o.
A oraçã o me conecta com o Altíssimo, Aquele que um dia foi homem. A mú sica com meu
interior, com o divino em potência, que hoje é homem e um dia poderá ser divindade.
ABALADOS PELO TRÂ NSITO Nº1

As pessoas ficam muito nervosas no trâ nsito. Todos acham que estã o em seu direito de
gritar e espernear contra seus semelhantes. Todos sentem estar com a razã o e nã o querem
nem discutir o contrá rio.
O nervosismo é parte de quem vive no trâ nsito, parece até pró prio dele. A impressã o que
dá é que é impossível conviver com nossos iguais, que nem sempre sã o tã o parecidos
assim...
Por qualquer coisa, lá vem um gesto, um sinal, um berro! A buzinada anda em desuso, mas
quando acontece a resposta do outro vem de forma nada agradá vel. É muito difícil as
pessoas aceitarem seu pró prio erro. E quase tã o difícil quanto isto é acatarem o erro do
outro como desculpá vel.
No trâ nsito é onde todos menos se perdoam. Até os bons modos, à s vezes, sã o mal
interpretados.
A Igreja Cató lica, inclusive, pronunciou-se a respeito, através do documento Orientações
para a Pastoral das Estradas, apresentado ao pú blico pelo cardeal Renato Martino e
preparado pelo Conselho Pontifício para os Migrantes. Ele exorta aos fiéis para que se
comportem bem na direçã o e enumera o que sã o os pecados nessa situaçã o.
Por minha conta, decidi mudar meu pró prio há bito. Evito deixar-me alterar por essas
coisas. Com isso, tem vez que quem está do meu lado, no carro, fica revoltado com algo que
acontece no trâ nsito, enquanto eu mesmo já nã o ligo mais.
Claro que nem sempre isso dá certo. E lá vou eu com um impropério! Mas isso venho
tentando mudar e espero conseguir. Aconselho que você faça o mesmo, a gente acaba se
sentindo bem melhor.
O SILÊ NCIO DO DIA DE DESCANSO

Estejas lembrado do dia do sábado para santificá-lo.


Ê xodo 20:8

E no primeiro dia da semana,


ajuntando-se os discípulos para partir o pão,...
Atos dos Apó stolos 20:7

Ó fiéis, quando fordes convocados


para a Oração da Sexta-feira, recorrei à
recordação de Deus e abandonai os vossos negócios;...
Alcorã o 62:9

Para os muçulmanos, é na sexta-feira. Para os judeus, do pô r-do-sol da sexta ao pô r-do-sol


do sá bado. Para os cristã os em geral é no domingo. Falamos do dia de descanso, que é
quando se alivia do labor diá rio.
Mesmo em Sã o Paulo, a maior cidade da América Latina, ele existe, quando as lojas fecham,
o comércio sossega, as escolas nã o têm aula, as ruas do centro ficam desertas. Tudo entra
em repouso.
Claro, existem locais que nã o fecham, mas isso ainda é exceçã o. O normal é nã o abrir no
domingo. Ou, como já disse, para alguns isso acontece no sá bado ou na sexta-feira.
Nesse dia, o som muda. É um tempo de paz. Para muitos, é a oportunidade de ficar a TV
ligada o dia inteiro, o que é muito pouco original e meritó rio, convenhamos. Para outros,
mú sica! Conversar na mesa do almoço até mais tarde. Dormir depois da refeiçã o, visitar os
amigos e parentes, tudo é vá lido. Aproveitar o silêncio para ler, pintar um quadro...
É o dia a ser guardado como sagrado, para se ir à igreja e estar em comunhã o com Deus. Ou,
para os ateus, comungar com sua consciência.
O dia de descanso tem que existir para todo mundo. Ninguém é saudá vel trabalhando de
segunda a segunda, sem interrupçã o.
ABBEY ROAD

Gosto dos Beatles. Nã o falo aqui da importâ ncia deles na mú sica, mas de quanto eles me
fazem bem pessoalmente. E de todos os seus discos o que mais me chama atençã o é Abbey
Road, que é aquele cuja capa mostra os quatro atravessando uma rua.
Conheci essa grande obra musical na época de seu lançamento, quando meu pai a levou
para casa. Eu tinha onze anos e a descobri com todos os meus sentidos. Já a conhecia de
capa, mas seu conteú do só fui ouvir entã o.
Como quase todo vinil, ele tem dois lados tocá veis. O primeiro tem um jeito e o segundo
outro. O lado um tem seis faixas, o dois tem dez! No segundo selo interno, o que se
relaciona sã o onze cançõ es: qual é a décima-primeira? O incrível é que, em mp3, as
dezessete mú sicas existem e sã o as mesmas que vêm no disco.
Havia uma magia: você olhava a agulha da vitrola passar à s vezes de uma faixa para a outra,
no lado dois, sem interrupçã o sonora, sendo impossível descobrir nesses momentos
quando terminava uma cançã o e começava outra! Absolutamente psicodélico!
I Want You (She’s So Heavy) fechava o lado um de repente, como se a agulha pulasse do som
em abundâ ncia para o nada. Entã o, a gente tinha que ir até o aparelho para virar o disco.
Isso acabou com a reediçã o no formato digital.
A gravaçã o foi feita em 1969. Era um só grupo, mas cada mú sica tinha um aspecto
diferente. Pode-se até extrair de cada uma o estilo que pelo menos uma banda dos anos
setenta tenha seguido. Ali está o soft, o pop, o progressivo e até o heavy-metal, tudo em
princípio, tudo em gestaçã o.
A banda inglesa estava em seu melhor momento, muito criativa e inspirada. Embora o disco
mais importante da carreira deles seja o Sergeant Peppers, considero Abbey Road o mais
bonito. Na verdade, foi o adeus dos Beatles, o ú ltimo que eles gravaram. O que saiu depois
desse, Let It Be, foi gravado antes.
DEDO-DE-MOÇA

Tem gente que nã o consegue nem cheirar, outras nã o vivem sem: é a pimenta! Ela tem
vá rias qualidades terapêuticas e é boa para quem quer ter vida longa.
Onde moro nã o se acha qualquer uma, a normal é a conhecida pelo nome de “dedo-de-
moça”. É uma pimenta vermelha, compridinha, de mais ou menos o tamanho de um dedo.
Daí o nome.
Cada um tem um jeito de prepará -la, embora possa mesmo ser comida ao natural.
Cortadinha fina e misturada no arroz dá um gostinho muito especial!
Eu tenho a minha forma de deixá -la pronta: primeiro lavo todas na á gua corrente. Depois
seco bem com uma toalha. Sobre uma tá bua de cortar, pico todas num tamanho de
aproximadamente meio centímetro e as coloco em vidros previamente limpos.
Enquanto descansam, coloco uma boa porçã o de azeite numa panela e aqueço. Nã o é pra
ferver, é só pra esquentar. Nã o tem uma temperatura certa, é a olho! Ele tem que ser bom,
puro, se possível de baixa acidez. Aquecido o azeite, jogo-o sobre a pimenta, que já está
acondicionada nos vidros, até cobri-la. Pode ter mais azeite que pimenta, o que nã o pode é
o contrá rio.
Em seguida, fecho os vidros e guardo-os em local escuro durante pelo menos um mês.
Quanto mais tempo ficar, melhor. Nã o sei se existe um limite, pois nunca cheguei lá .
Por fim é só usar, com uma colherinha pró pria para isso. É sabor e aroma pra toda a vida!
DEMOCRACIA

Segundo Aristó teles, existem três formas principais de organizaçã o do Estado: monarquia,
oligarquia e democracia.
Na monarquia, uma pessoa governa sozinha. Na oligarquia, poucos governam. Na
democracia, o povo todo é dono do governo.
Ora, no Brasil vivemos de duas maneiras: com a democracia e com a oligarquia. Na época
das eleiçõ es, temos a primeira, pois o povo escolhe seus governantes. Passado esse período,
ninguém mais apita nada e voltamos à velha oligarquia de sempre, onde um pequeno grupo
faz o que quer e o povo fica à sua mercê...
Por que isso acontece? Porque nos acomodamos, nã o nos importamos com o que os
poderes legislativo e executivo fazem no país. Mal sabemos a funçã o de senadores,
deputados e vereadores, mal entendemos o que dizem o presidente, os governadores, os
prefeitos.
A corrupçã o corre solta porque deixamos subir no poder pessoas corrompidas, aceitamo-
las como iguais a nó s. A primeira coisa a ser feita é educar a nó s mesmos, evitando essa
mesma corrupçã o entre nó s, deixando para trá s o “jeitinho" e sendo, o povo mesmo, justo.
Isso é o mais importante!
Em seguida, evitar que os corruptos permaneçam no poder e que eles tornem a se elevar;
buscar nomes que realmente promovam a honestidade, a retidã o. Nã o pessoas que apenas
conhecemos durante as eleiçõ es, mas que acompanhamos durante nossas vidas. E depois,
continuar acompanhando durante a gestã o de cada uma.
O mais importante: nã o deixar que façam carreira política, pois a política nã o deve ser uma
profissã o. Muito menos aos poucos escolhidos. Para que exista a verdadeira democracia,
tem que ser uma oportunidade para todos servirem a seu país.
ABALADOS PELO TRÂ NSITO Nº2

Vanitas vanitatum, omnia vanitas.[7]

Ecclesiastes 12; 8

Por que as pessoas ficam tã o nervosas no trâ nsito?


A princípio, penso nos motoristas, que estã o dentro de um carro, que é um bem frá gil,
qualquer coisa já amassa, risca, ou a qualquer momento pode ter um pneu avariado, ou
outro problema. Esse fato já nos deixa em apuro constante. Fora isso, a noçã o de que no
trâ nsito vivemos num limite entre a vida e a morte, com constantes ameaças de um
acidente. Todas essas coisas existem e ficam martelando na consciência de cada um.
Ora, acontece isso também na cabeça de motociclistas e ciclistas, que circulam em meio aos
automó veis. No meio dessa balbú rdia, entram os pedestres, que vivem se achando no
direito de provocar o resto. E o resto também se desafia, uns aos outros, esquecendo-se das
boas maneiras e do trato gentil.
Talvez uma vontade de poder exista na mente de todos. Joseph Smith disse que, mal tem o
homem um pouco de poder na mã o, já tende a querer dominar outros. Isso é pró prio do ser
humano. Devemos combater justamente esse mal dentro de nó s, sendo mais luminosos uns
com os outros, inclusive no trâ nsito. O mal nã o se erradica com outro mal.
EQUILÍBRIO E PAZ Nº2

Além da oraçã o e de ouvir mú sica, outras atividades servem também para restaurar meu
equilíbrio e paz. Uma delas é tomar chimarrã o, coisa que faço todas as manhã s, pelo menos.
Desde o ato de preparar: aquecer a á gua até ouvir o ponto de chiar, cevar o mate, colocar a
bomba na cuia. Por fim, usufruir o chimas: sorver a á gua quente vagarosamente, curtindo o
sabor e o aroma da erva, até apitar.
Contemplar quadros é outra dessas atividades. Gosto de tê-los nas paredes de nossa casa.
Faz bem à alma. Principalmente originais, sejam telas ou gravuras, mas algumas estampas
também sã o boas. Gosto também de apreciá -los, como à s esculturas e mú ltiplos, em
exposiçõ es de arte e em livros específicos, que trazem reproduçõ es de artistas.
A flagrâ ncia de perfumes também é muito aprazível. Sentir um cheiro na mulher amada, em
especial. O odor de algumas plantas e até de animais. Cheiro de livro antigo.
Agrada-me também o aroma de incenso, perfumando a casa. Adquiri esse gosto na
adolescência, quando incensos do tipo indiano eram difíceis de achar em Sã o Paulo. O
primeiro que comprei foi um da Spiritual Sky, em 1974. Com o tempo, comecei a achar
devotos Hare Krishna pela rua e eles sempre tinham para vender. Hoje em dia se acha em
qualquer lojinha. O problema é o que eles estampam em suas embalagens, como se fossem
soluçõ es para os problemas que as pessoas têm em seu cotidiano. Mas se prestarmos
atençã o somente na fragrâ ncia, tudo bem.
Por fim, a leitura. Há livros que trazem muita serenidade no coraçã o e esses sã o sempre
adequados para o fim que se propõ em. Literatura, filosofia, poesia, mú sica, entre outros, ao
lado das escrituras sagradas, sã o partes de um todo.
Enfim, estas sã o atividades que me trazem equilíbrio e paz.
O TEMPO DO MUNDO

Existe uma dataçã o bíblica que coloca a criaçã o do mundo no ano de 4004 AC. Isso é um
dado apenas para os que acreditam.
Parece pouco tempo, perto dos 4,5 bilhõ es estimados pela ciência atual, que é também
apenas para os que acreditam.
Entretanto, o que muitos notam é que vivemos dias cada vez menores, o tempo parecendo
que corre mais rá pido que quando éramos meninos. É claro que aí entra a questã o pessoal,
de que quando somos mais jovens, com menos tempo de vida, os dias parecem realmente
maiores, em comparaçã o com o que sentimos no futuro. Mas, mesmo assim, as pessoas
estã o dizendo que o tempo está mais acelerado que no passado. Muitos jovens estã o
achando que tudo está passando muito rá pido!
Baseado nisso, podemos imaginar que os dias da Antiguidade eram muito maiores que os
atuais. O ritmo do nosso planeta era mais lento que hoje. Entã o, muito mais coisas
aconteciam em cada dia.
Já os seis dias de criaçã o foram grandes eras, ou quem sabe tenham sido bem grandinhos.
Duraram bem mais que os atuais. E a noçã o de histó ria fica comprometida, da mesma
forma como a ideia de que o método do carbono 14 pode nos dar o tempo decorrido de um
objeto.
Afinal, nã o podemos pensar no Tempo como perfeitamente regular, retilíneo, como uma
régua; ele é relativo.
OS CHAKRAS E AS NOTAS MUSICAIS

Aprendemos com os orientais que nosso corpo tem sete chakras, que sã o centros de
energia circulares e rotativos. O primeiro fica na base da espinha. O segundo, três dedos
abaixo do umbigo. O terceiro, no plexo solar. O quarto, no coraçã o. O quinto, na garganta. O
sexto, na testa. O sétimo, na coroa.
Cada um tem suas funçõ es e é ligado a diversas coisas. Entre elas, as notas musicais. Assim,
tocando-as ou entoando-as, sensibilizamos os chakras correspondentes.
O problema é saber a altura exata dessas notas. Nos tempos antigos, cada uma tinha a
altura diferente das atuais. Isso se mede por hertz. O nú mero de hertz do dó central, por
exemplo, era mais baixo na época barroca que atualmente. Isso pode ser comprovado por
instrumentos musicais fabricados naquela época.
Por isso, como decidir a afinaçã o a ser utilizada com respeito aos chakras? Naturalmente,
nã o podemos usar a atual, mas quiçá a da Antiguidade. E quem sabe qual era a altura das
notas musicais naqueles dias?
O que se poderia alcançar, portanto, seria através de instrumentos que pudessem ser
afinados da forma antiga. Mas de que maneira, já que nã o temos a noçã o exata de qual era
sua afinaçã o?
É impossível determinarmos a altura exata das notas para sensibilizar cada chakra. Por
outro lado, dos antigos tempos até hoje, nó s também mudamos e, talvez, possamos dizer
que as notas musicais tenham se alterado ao nosso conforme.
A MANDALA PESSOAL

O significado de uma mandala pode vir apenas do inconsciente de quem a faz, como
acontece em todos os casos, ou também de forma consciente pelo seu autor.
A ideia é transportar para a figura o ímpeto ou desejo pessoal, a fim de que se concretize no
plano espiritual ou físico. Normalmente serve para meditaçã o, a partir da fixaçã o do olhar
da pessoa sobre ela.
Eu mesmo tenho pintado algumas, por puro prazer. Faço-as bem pessoais. Nã o sei ainda se
existe uma para cada pessoa, uma ú nica, que seja o espelho de nó s mesmos. Penso que
talvez seja necessá rio cultivar muitas e muitas, seja fazendo, seja adquirindo, sejam ambas
as coisas. Cada uma nos refletirá em determinado momento. Mas deveremos seguir esse
caminho, de muitas e muitas se acompanhando, se completando, todas de certa forma
sendo nossas, as nossas mandalas.
Entã o, um dia, nesta vida ou depois, talvez descubramos enfim uma ú nica que seja o
espelho de nosso íntimo.
O CARMA

Como atua o Poder Supremo?


Ninguém o sabe.
LAO-TSÉ ; Tao Te King, XXI

Os hindus acreditam que vivemos o carma: somos, cada um de nó s, resultado do que


fizemos em nossas vidas passadas. Três formas de carma existem: a primeira é
determinada no nascimento e termina nesta vida; a segunda fica latente enquanto se vive; a
terceira é o resultado final de como se age pela existência.
Outro conceito importante nas religiõ es hinduístas é o do samsara, que é a sucessã o de
vidas, mortes e renascimentos, um apó s outro, ligados numa roda, na qual o indivíduo fica
preso até que consiga chegar finalmente ao nirvana, um estado de transcendência livre do
sofrimento, externo a esse círculo.
Os budistas falam, além disso, que somos, cada um de nó s, resultado do que fazemos o
tempo todo – causa e efeito. É como a causalidade, na filosofia, que preconiza que todo
acontecimento tem um agente.
A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Ú ltimos Dias crê que somos, cada um de nó s,
resultado do que fizemos em nossa pré-existência, que nã o teve início, mas que teve um
fim, com nosso nascimento. Durante nossa vida, as bênçã os de Deus podem advir pelas
açõ es que praticamos e pelo nosso respeito aos mandamentos.
No fundo, todos convergem para uma coisa: nã o somos o que somos à toa. Se vivemos com
nossas alegrias, dores, presentes, é porque fizemos algo anteriormente para merecê-los,
seja antes ou durante nossa vida. Nã o é questã o de culpa, mas de consequência, pois nem
tudo que parece inicialmente ruim ou bom o é realmente. E no dia-a-dia esse processo é
contínuo, sempre ocorrendo os fatos de acordo com nossos atos.
No entanto, existem coisas que escapam a nosso controle, nã o sendo causadas por nó s, mas
por fatores externos. Nã o somos causadores de toda reaçã o. Mas todo ocorrido tem uma
razã o para existir.
INVERNO

E desconfio do inverno porque é a estação do conforto. [8]

ARTHUR RIMBAUD; Adeus (Uma Estaçã o no Inferno)

Muito se fala sobre as estaçõ es, mas a mais comentada é a dicotomia inverno-verã o. Afinal,
sã o os á pices do frio e do calor. Ou deveriam ser. Ou eram, antes dessa confusã o que vem
acontecendo em nosso clima planetá rio.
De qualquer forma, elas ainda existem e o inverno é onde tomo mais chimarrã o e chocolate
quente. Minha esposa diz que toma mais á gua no frio.
É bom para dormir com dois-três edredons, comer feijoada, andar com as mã os nos bolsos
e dizer que está frio e que sente saudades do calor.
Em casa, uma de nossas cadelas deita-se conosco em nossa cama. Ela é pequenina, mas
ajuda a esquentar. Só atrapalha quando inventa de querer deitar entre eu e minha esposa.
No entanto, é mais difícil pintar aquarelas, o contato com a á gua é mais difícil. Ainda que
seja com o pincel. Um amigo violinista, Nielsen Saint, diz que as cordas machucam sua mã o
nesse período. Realmente, parece que até a maneira de se regular os instrumentos muda, a
afinaçã o fica mais dura.
Embora andemos mais rá pido, parece que a produçã o manual diminui: tudo fica mais
doído, mais rijo. Isso nã o interfere, entretanto, com minha produçã o intelectual, que se
mantém intacta. No tempo em que usava a má quina de escrever era mais difícil teclar no
inverno, os dedos nã o batiam tã o bem. No entanto digitar no computador nã o muda muito
numa estaçã o ou noutra, embora no verã o seja sempre mais fá cil.
Fazer qualquer exercício no inverno exige mais aquecimento.
Mas as pessoas ficam mais elegantes nessa estaçã o, se vestem melhor, os cachecó is saem do
armá rio, os pulô veres, os casacos e a solidariedade.
O TEMPO CIRCULAR Nº1

Da maneira como concebemos o tempo, ele é linear, com um passado, um presente e um


futuro, com os dias, meses e anos se seguindo de forma regular.
Ora, e se nã o for assim?
Consideremos que o tempo seja irregular, com diferenças nos tamanhos dos dias, meses e
anos, conforme a época. Quem sabe tenhamos passado por períodos de imensas noites e
imensos dias...
Consideremos que o futuro esteja junto com o passado e que o presente seja uma ilusã o, ou
talvez a ú nica coisa que exista realmente. Mas isso, deixemos de lado por hora.
Houve algumas ocasiõ es na histó ria em que os povos acreditavam num tempo nã o-linear,
em que o passado era a criaçã o do mundo e o futuro o juízo final. O presente se sucedia com
a mudança das estaçõ es e a repetiçã o constante dessas. Vivia-se por luas e primaveras, mas
sem contabilizá -las, apenas reconhecendo-as quando voltavam. Era como um círculo,
eternamente recomeçando, para apenas sair dele quando viesse o Dia Final, fosse esse uma
grande catá strofe ou um Apocalipse.
Consideremos que a cada período de tempo o futuro se reencontre com o passado, mas
acima deste, como numa espiral. Cada experiência sendo ú nica: a posterior, ainda que
parecida com uma anterior, nã o é repetiçã o. Seria esta uma releitura do tempo circular.
No entanto, se a dialética existe mesmo, nem sequer a espiral será necessariamente regular.
Assim, previsõ es baseadas em acontecimentos passados nã o terã o valor, pois isso é um
raciocínio baseado na ló gica formal.
Pode ser, portanto, que nossa ideia de histó ria esteja um pouco equivocada. Talvez haja um
passado e um futuro, mas nã o da forma como conhecemos. Isso explicaria fatos dos mitos e
lendas da cultura mundial e, principalmente, alguns milagres.
O FEMININO NO PODER

Existem pessoas que dizem que as mulheres dominarã o o mundo. Ora, isso já ocorre, de
certa maneira. Sã o elas que educam a maioria dos homens, há milênios! É verdade, existem
os pais, mas no início da vida de cada criança quem mais fica do lado dele é normalmente a
mã e.
Se homens dominam o mundo, em algum momento de suas vidas mulheres cuidaram para
que eles sobrevivessem: pelo menos uma mulher lhe deu de mamar. E tem mais, pelo
menos uma mulher lhe ensinou que deveria, quando crescesse, dominar o planeta! E essa
mesma mulher o ensinou a subjugar o sexo oposto.
Fora isso, nos dias que correm existem mulheres no poder, sim. Mas elas nã o sã o
feministas. Elas nã o propagam os valores femininos. Nã o raro, sã o tã o ou mais machistas
que seus colegas masculinos. Ora, que vantagem existe de se usar gravata?
Utilizam-se dos mesmos estratagemas, dos mesmos vícios de governar. Nã o aproveitam a
oportunidade para colocar o feminino em açã o.
O feminismo deve ser uma divulgaçã o de outro modo de agir. Deve suavizar, nã o dominar;
deve ajudar, nã o competir; deve colocar seu coraçã o ao lado da mentalidade
exclusivamente racional. Excluir o militarismo imperante e demonstrar afeto e amor à s
pessoas. A intuiçã o e a emoçã o auxiliando a razã o.
Essa nova versã o de Poder tem que ser usada por todos, homens e mulheres. O feminino no
Poder nã o é só para um dos sexos, é para todos!
Assim, ao criar as crianças, devemos ensiná -las a governar suas vidas antes de quererem
mandar nos outros. Talvez isso ajude a terminar com essa â nsia de poder que tanto
prevalece nos adultos de nossa civilizaçã o.
SABER PARAR

Houve um tempo em que eu nã o parava. Trabalhava todos os dias, o tempo todo, mantendo
de dois a três empregos ao mesmo tempo. Ficava na rá dio pela manhã , fazia matérias para
um jornal à tarde e dava aulas à noite. Aos domingos, mesmo quando ficava em casa,
arrumava atividade para fazer. Nã o parava! Até dormir era um incô modo...
Foi nessa época que, num ú nico mês, perdi os três empregos. E fiquei completamente
desesperado. O transtorno nã o era unicamente pelo dinheiro que deixaria de ganhar, mas
pela falta do que fazer.
Bom, arrumei trabalho e tempos depois estava fazendo jornada dupla novamente e
estudando à noite. Aos domingos, entretanto, nã o descansava.
A grande dificuldade eram as férias. Como atravessar os dias?
Passaram-se os anos e as contingências da vida me levaram para uma aposentadoria. E aí?
Tive que finalmente conviver com o tempo livre, coisa para a qual nunca me preparara.
Ora, tudo tem que parar, periodicamente. Tudo tem que ter um tempo para o descanso. Até
a terra em que se planta deve repousar. E agora, eu estava frente a frente com o momento
para o lazer. Um lazer obrigató rio. E para o resto de minha vida.
Nossa civilizaçã o é predató ria até consigo mesma. Há um contra-instinto de suicídio e nã o-
preservaçã o que se impõ e a cada um. Esquecemo-nos das pausas para a reflexã o e até para
uma cochilada. Queremos constantemente produzir e perdemos a noçã o de que até o
Senhor descansou apó s seis dias de afazeres.
Hoje acho que aprendi a parar. Organizo atividades durante seis dias e paro no domingo.
Isso eu reputo como sabedoria.
E O ROCK NÃ O MORREU

Nos anos 1970 tinha a turma que dizia que o rock bom era dos anos 50, o rockabilly. Tinha
também os que diziam que o rock tinha tido seu á pice nos 60 e que entã o o progressivo
tinha matado o bom e velho rock’n’roll.
O tempo passou e presentemente temos grandes nomes das ú ltimas décadas, incluindo os
progressivos. De hoje em dia alguma coisa também ficará , ninguém sabe ainda o quê.
Ora, nos 70 o Black Sabbath nã o era tã o considerado como é hoje! Raul Seixas é muito mais
cultuado agora do que quando era vivo. O Pink Floyd era ainda uma banda experimental. O
Yes era imitado pelo mundo todo. Led Zeppelin! Os Mutantes, Rita Lee e Tutti-Frutti e o
Terço faziam shows fantá sticos! Luiza Maria gravava um disco arrebatador que pouca
gente comprou. O Eloy lançava seu primeiro disco. Arnaldo e a Patrulha do Espaço
ensaiavam seus primeiros passos. O Crucis mostrava um rock progressivo de primeira
linha.
Dos anos 80 e 90, pinço Legiã o Urbana e Guns and Roses: o que podemos deixar de dizer
deles? E Cá ssia Eller e Nirvana. Pra mim, ela foi a melhor intérprete que o rock brasileiro já
teve. Teve também alguns experimentais, que vale a pena ouvir.
Vamos ver o que teremos do início do terceiro milênio... O rock nã o morreu, ainda.
VENTO

Gosto muito desta palavra: vento.


Começa pelo som que ela tem. A letra v tem um som que venta, quando é dita. A primeira
sílaba venta por si. Por fim, acaba repentinamente, como se uma porta batesse. Mas ela bate
sem violência.
Vem do latim ventus, cuja sonoridade é muito parecida. Mas aí o som termina aos poucos,
devagar, de modo mais pró ximo ao que acontece na prá tica.
Em japonês, kamikaze quer dizer Vento de Deus. É a poesia nos vocá bulos.
Em hebraico é composto de três letras: resh, vo e hete. É outro som, também soa
bruscamente, mas de uma forma mais forte: ruach.
Deus soprou no boneco de barro para dar-lhe vida.
Vento, como aprendemos na escola, é o ar em movimento. O ar, tã o precioso, correndo por
aí. Podemos produzi-lo, também, com um simples leque ou soprando com nossa pró pria
boca.
Sair aos quatro ventos é partir em todas as direçõ es, por todas as partes.
É rico Veríssimo escreveu uma obra lindíssima, chamada O Tempo e o Vento. Nó s a tínhamos
em nossa biblioteca, mas infelizmente a passei pra frente.
O vento no rosto pode ser muito agradá vel. Pode fazer dançar um lençol no varal ou os
cabelos de nossa cabeça, mas também causar grandes estragos.
SIMPLICIDADE NA CULINÁ RIA

Que me perdoem alguns chefs, mas eu acredito na simplicidade da Arte Culiná ria.
Existem pratos muito saborosos feitos com muitos ingredientes, é verdade, mas em geral a
boa culiná ria se resolve com poucos elementos.
Por exemplo, a feijoada: nela se colocam diversas partes do porco, linguiça, paio, feijã o
preto e alguns temperos. A escolha de cada parte é importantíssima, porque se
simplesmente jogar tudo na panela e cozinhar, nã o se terá uma boa feijoada. É necessá rio
escolher o que mais se afeiçoa aos pertences e ao feijã o, para entã o saber bem temperar.
Ora, adoro pimenta, mas acho que ela deve ser colocada apenas no prato, nunca na feijoada
diretamente. Cebola é importante, alho também, coentro nunca!, a nã o ser no Nordeste
brasileiro. Já na farofa, deve haver apenas farinha e sal, talvez uma salsinha, mantendo-se
quase neutra para nã o estragar o principal. Algumas farofas prontas têm alho, e esse
tempero já está na feijoada, nã o há porque estar em dois pratos ao mesmo tempo. O arroz
também tem que ser o mais simples possível, pelo mesmo motivo da farofa.
Grandes comidas sã o singelas: o arroz de carreteiro, o omelete, o sushi, o frango xadrez, a
bureka. Nã o podem ter muita mistura, pois isso denigre os sabores. É como uma pintura: se
tiver elementos demais, ela se perde. Ainda que seja detalhista, há de se saber escolher o
que colocar. E o artista passa sua vida trabalhando na síntese, no quanto menos, mais.
O TEMPO CIRCULAR Nº2

Os reló gios sã o circulares. Mesmo quando sã o feitos em outros formatos, seu


funcionamento é circular. Tem sido assim desde o nascimento do primeiro.
Talvez nã o seja apenas coincidência que assim o seja. Quando o primeiro foi criado, a ideia
que se tinha do tempo era que ele era também circunferencial, nã o linear como o
entendemos hoje.
Da mesma forma, a construçã o de Stonehenge também obedece à circularidade, nã o apenas
porque essa figura geométrica tenha significado especial, místico e esotérico, mas por causa
da característica do tempo: um e outro sã o circulares.
Com o entendimento da dialética, chegamos ao ponto em que compreendemos o tempo nã o
mais como linear, nem mais como circular, mas como uma espiral, sempre voltando ao
mesmo ponto, porém acima do anterior. Com isso, a representaçã o continua sendo a
circunferência, que é a espiral vista de cima. Ou mesmo o círculo, que será a espiral que
cresce a cada volta.
Sendo uma espiral decrescente, teríamos a explicaçã o do porque o tempo nos parece
passar cada vez mais rá pido.
O TEMPO CIRCULAR Nº3

O tempo, para os povos indígenas brasileiros, também é circular. Nã o há , para eles, a noçã o
de continuidade, mas sim de repetiçã o de ciclos. O passado é está tico, nã o existe Histó ria.
A grande quebra do círculo é quando se tem uma festa: naquele momento, há uma saída da
rotina e a realidade também é desmontada. Trata-se de um afastamento do ciclo.
Assim, o irreal transpassa o tempo e surge em meio a todos. Dá -se oportunidade para que o
prazer se instale no lugar do dia-a-dia. É nesse instante que os deuses falam e se
manifestam.
É quando se desenvolve o que nã o tem lugar no cotidiano, o místico aparece em todo seu
fulgor. O despido de todo dia é substituído pelas má scaras e fantasias.
Isso repete-se nas festas populares, quando a sociedade é criticada ou imitada. Dá -se nos
bumbas-meu-boi, nos reisados. Acontecia antigamente, em nosso país, no carnaval, quando
as classes sociais se misturavam nos blocos que passavam pela rua. Mas ocorre, de certa
forma, até hoje, quando as escolas de samba trazem figuras ligadas à s religiõ es afro-
brasileiras.
Nossas festas continuam sendo quebra de ciclos, maneira de sair do habitual para um
momento prazeroso. Ao final, volta-se para o cíclico, o normal, o cotidiano, como se voltasse
de uma experiência extra-sensorial para a vida. Afinal, nã o se pode viver numa festa eterna:
cansa.
O NASCIMENTO DO UNIVERSO Nº1

Um dia nasceu o universo.


Isso pressupõ e o início de tudo. Foi a partir de entã o, e só nesse momento que teria
começado a existência do que conhecemos hoje por dimensã o e por tempo.
A ciência atual fala do Big Bang: uma explosã o teria originado a existência e tudo que nela
contém.
O hinduísmo milenar conta que esse começo criou o Om (aum), um grande som, cuja
ressonâ ncia ocorre até hoje.
A Bíblia Sagrada se silencia a respeito, ensinando apenas sobre a criaçã o de nosso mundo.
Nã o diz coisa alguma sobre a concepçã o do cosmo. Santo Agostinho perguntou: Que fazia
Deus antes de criar o céu e a terra?
[9]

Alguém o criou ou foi uma açã o espontâ nea? Ele já existia ou veio com o Big Bang?
Algumas religiõ es e a ciência têm crenças ou teorias a respeito. Mas o mais interessante é
saber o que passou a existir com o nascimento do universo: tudo o que conhecemos. Antes
disso, nem o caos, que já seria alguma coisa.
Da mesma forma como nasceu, um dia morrerá . E assim, todas as coisas, como as
dimensõ es e o tempo.

O NASCIMENTO DO UNIVERSO N°2

O que existia antes de nascer o universo? Ninguém sabe. Talvez o Nada. Falamos sobre o
nascimento do universo. Mas o que havia antes do Big Bang?
A primeira ideia é de que nã o havia nada, ou talvez um imenso Nada, uma nã o-existência.
No entanto, isso é apenas um primeiro conceito. Um segundo pensa na eternidade, algo que
está além da existência de qualquer cosmogonia.
Vem à nossa cabeça o pensamento de que outro universo possa ter existido antes deste e
no seu lugar. Assim como outros existem além do nosso, algum houve anteriormente no
mesmo local.
Se assim nã o fosse, haveria uma existência entre dois Nadas, ou ele sempre teria existido e
nunca teria fim.
Isso, naturalmente, sem falar da possibilidade de outros universos existirem ao mesmo
tempo que o nosso no mesmo espaço e tempo.
VAI-E-VEM

A Teoria de Gaia pressupõ e a Terra como um organismo vivo, ela como um todo. Ora,
podemos falar o mesmo do nosso universo.
Assim, a existência dele como um organismo vivo pressupõ e um movimento vital, uma
pulsaçã o, um vai-e-vem, como uma respiraçã o, como é a atual expansã o e uma futura
contraçã o, seguida de outra expansã o e assim por diante .
[10]

Da mesma forma como os polos positivo e negativo, a açã o e a reaçã o, tudo no universo
obedece ao dualismo. O equilíbrio é o funcionamento da lei.
A expansã o é o correspondente à hybris, a contraçã o à nemesis. A primeira é o crescimento,
a inspiraçã o, o insuflar, a excitaçã o; a segunda, a expiraçã o, o relaxar e o consequente
encolhimento do corpo. Diá stole e Sístole. O pulsar do universo obedece a um estimular e
um acalmar. É a ideia do Tao: um movimento yang seguido por um movimento yin.
Essa, a chave: o universo pulsa! O universo vive.
O TEMPO NO VAI-E-VEM

O universo pulsa. Com seu nascimento, surgiu o espaço e o tempo. O primeiro está em
expansã o. O segundo, num está gio de decréscimo, correndo cada vez mais rá pido, a volta da
espiral cada vez menor.
Esse decrescer do tempo acontece, portanto, concomitantemente ao crescimento da
dimensã o.
Na contraçã o do universo, pró ximo está gio da pulsaçã o, o tempo voltará a crescer, os dias
serã o cada vez maiores, tudo irá cada vez mais devagar.
A pulsaçã o do universo segue dessa forma, expandindo-se e contraindo-se no que diz
respeito ao espaço, seguidamente, do mesmo modo que o tempo faz o movimento
contrá rio.
Assim, explicamos alguns fundamentos do que ocorre na natureza. Tudo reflete o Todo. E
nossos corpos acompanham esse processo de vai-e-vem.
A ETERNIDADE

Disse Platã o que o tempo é um simulacro da eternidade. Eis, pois, a noçã o da inexistência
do Tempo. E digo mais, do espaço.
Vivemos aprisionados no Tempo e no espaço, como se isso determinasse nossa existência.
Na verdade, faz parte, mas nã o é só .
A eternidade está além desses conceitos. Viver fisicamente é estar preso a eles, mas isso
nã o implica que existam expressamente.
No entanto, precisamos deles para administrar nossas vidas. Nã o sabemos nos virar sem
eles. E assim, presos a essas noçõ es, precisamos delas durante todo nosso trajeto na Terra.
Deus está além do Tempo e do espaço. Esse tem que ser nosso objetivo, para além desta
vida.
EM MEMÓ RIA DE NOSSOS AVÓ S

Nã o existem muitos negros no Brasil. O que mais há sã o mulatos (pardos) e cafusos.


A maioria da populaçã o em nosso país é formada por pessoas que têm em sua linhagem
ascendentes da Á frica e da Europa, quando nã o também dos índios brasileiros.
No entanto, para a Lei de Cotas o sujeito é branco ou negro, nã o há meio-termo. Ora, se
existe o reconhecimento de um pai negro na família, com mã e branca, o filho
necessariamente será mulato, independente da sua cor de pele. Entretanto, a negritude é
vista como se fosse um vírus contaminador, o ser branco na família é renegado e a mulatice
é esquecida e jogada fora como se nã o existisse. Nã o podemos esquecer que Barak Obama é
mulato, nã o negro. Portanto, nã o dá pra comparar sua ascensã o à Presidência dos Estados
Unidos com o livro de Monteiro Lobato, O Presidente Negro.
Há de se buscar nã o mais só o reconhecimento dos negros, mas os dos mulatos, dos
mamelucos e dos cafusos, assim como das situaçõ es intermediá rias: isso é um fato e
devemos tal como memó ria a nossos antepassados.
INSTRUMENTOS ANTIGOS

Os instrumentos musicais antigos eram mais graves que os atuais. A afinaçã o era diferente,
pois o dó central era mais grave.
Na verdade, a tonalidade vem se tornando cada vez mais aguda, o dó central subindo em
nú mero de hertz, talvez acompanhando a ressonâ ncia da sílaba Om, que teria sido o som
primordial do universo, ao nascer. Esse som também vai se tornando cada vez mais agudo,
conforme vai se esvaindo.
Assim, para bem afinar um instrumento de cordas antigo é necessá rio deixa-las um pouco
mais soltas que o normal, a fim de acompanhar o que teria sido originalmente.
O cravo, provavelmente, nã o era tã o agudo quanto o percebemos hoje. Assim como a viola
de gamba, ou a viola d’amore.
As flautas-doces nã o se afunilavam nas pontas, como hoje em dia: ganhavam nos graves e
perdiam nos agudos.
A mú sica, portanto, vem se tornando cada vez mais aguda. A nã o ser no rap, funky ou no
hip-hop, influentes da dance-music, que o baixo marcava o ritmo como um bate-estaca,
assim como a bateria, que muitas vezes era eletrô nica.
O SER HUMANO, ESSE DESEQUILIBRADO Nº3

O ser humano está sempre fora do centro, ao contrá rio dos animais. Mas como podemos
dizer que o animal é bom, se ele parece à s vezes tã o cruel para com seus iguais?
Ora, é o que ele pode fazer com o que tem, impossível se superar! Ele conta apenas com seu
instinto, nã o tem livre arbítrio.
Distinto de nó s, que podemos sempre melhorar ou piorar, crescer ou nã o, nos
aproximarmos menos ou mais do centro ideal; o animal é fixo num centro, equilibrado com
o meio em que vive.
Há ocasiõ es na natureza em que o bicho altera o ecossistema: aí, entra a dialética,
mostrando que nem sempre as coisas sã o iguais, nem sempre o futuro é previsível. É o
momento em que o animal, mesmo sem ter livre arbítrio, sai do centro, como um ser
humano qualquer.
TRAZER A ÍNDIA

E o Senhor chamou seu povo Sião...


Moisés 7:18

Soube de um casal que foi morar na Índia. Viviam eles em uma grande cidade brasileira,
com todos os vieses do trabalho estressante. Agora estã o naquele país, fazendo ioga todos
os dias e buscando recuperar sua espiritualidade. Inclusive, encontraram no povo indiano
uma diferença de atitude perante a vida. Como irã o se achar futuramente, nã o sei, mas
conheço outro caso parecido.
Um amigo meu, comerciante, quis acompanhar um lama tibetano numa viagem à Europa.
Largou tudo, seu comércio, sua morada, seus amigos, para fazer essa turnê.
Lá chegando, deparou-se com a realidade de seu guru, como ele realmente era junto à s
pessoas, no dia-a-dia. E acabou ficando indignado, pois nã o era como podia esperar. A
espiritualidade almejada foi-se embora e ele voltou para o Brasil certo de que nã o
precisava ter feito toda aquela excursionada para obter o que entã o já conseguira. Na
verdade, o Tibet estava dentro dele, nã o apenas no mestre.
Da mesma forma, o casal poderá um dia descobrir que a verdadeira Índia sã o eles que
constroem, nã o precisam viajar ao lado oposto do planeta.
OUVIR MÚ SICA

Usar ó culos, como já disse noutra feita, tem suas vantagens. Acho essencial para se ouvir
mú sica. Claro, nã o o uso deles, mas a ausência. Digo isso no caso da miopia.
Ser míope, quando se ouve mú sica, é muito bom. Você pode tirá -los e observar as imagens
que aparecem. Tudo é fluido, as luzes vêm mais dilatadas e você nã o consegue mais saber
quem está por perto. Talvez, quem esteja pertinho, mas só e por pura prá tica.
Numa sala de concertos, você tira os ó culos e nã o enxerga mais os detalhes de quem toca,
mas ouve com muito mais apuro. Sem precisar fechar os olhos você tem um caleidoscó pio
de cores e sons que se amontoam.
É diferente de simplesmente fechar os olhos, quando o som vem em toda sua pureza. Na
verdade, mistura-se o som com as imagens etéreas... Quanto mais forte a miopia, maior a
impressã o. A luz existe, as cores também, mas tudo é mais diá fano.
Quem nã o é míope, tem a vista perfeita, nã o consegue obter esse efeito. Talvez um dia
construam ó culos especiais para pessoas nã o-portadoras de desvios visuais, a fim de que
elas possam desfrutar desse bem.
LP E MÚ SICA DIGITAL

Muito se fala sobre a superioridade dos LPs em relaçã o à mú sica digital. Quanto aos velhos
CDs, nã o há dú vida. Quando eles apareceram, dizia-se que era uma mídia indestrutível, e
que o som era límpido!
Sem dú vida alguma, alguns detalhes que se perdiam no LP obtinham-se no CD. Mas isso nã o
durou.
Vieram outros sistemas de mú sica digital e o CD ficou para trá s. No entanto, dificilmente
alguém para de fazer qualquer coisa para ouvir mú sica digital. Normalmente, é para servir
de fundo a outra atividade.
Isso acontece menos com os LPs. Ainda hoje, quem os ouve chega a acompanhar as letras
no encarte, observa a capa e até para de fazer o que está fazendo para ouvir a mú sica. É
pró prio do LP, faz parte de sua característica. Mesmo, e principalmente, se for ouvir um
antigo compacto, que trazia uma ou duas cançõ es de cada lado, quando muito três.
Outra coisa: o CD quando começa a falhar nã o tem retorno, só mesmo jogando fora. Ele é,
em essência, descartá vel. O vinil, mesmo riscado, pulando, continua tocando: este sim, é pra
sempre.
LYGIA FAGUNDES TELLES

1976. Sã o Paulo. Meu professor de Língua Portuguesa no Colégio Campos Salles, Maluf,
recomenda à nossa classe do 3º colegial a leitura do livro As Meninas, de Lygia Fagundes
Telles. Algumas semanas depois, a classe toda é levada para o apartamento da escritora.
Nã o sei o que pareceu a ela, mas a mim foi uma grande descoberta, a oportunidade de
conhecer quem escrevera o livro que eu acabara de ler.
É verdade que a classe lotou a sua sala de visitas, que era também uma biblioteca.
Aproveitei para rapidamente olhar os livros que compunham a coleçã o e achei no meio
deles alguns de Rimbaud, poeta ao qual na época vinha depositando grande afeiçã o.
Na verdade eu queria falar com ela sobre o livro que acabara de ler, mas no alto de meus 18
anos vivia cheio de vergonha, nã o era mais que uma criança e sobre isso nada perguntei.
Apenas, bobamente, fui até ela e perguntei sobre o poeta francês. Lygia me disse para
prestar atençã o no fogo que ele trazia nos versos. Levei comigo essa liçã o, que norteou-me
na leitura dele pelos pró ximos anos.
No entanto, sobre ela mesmo, nada pude saber.
Corta para a primavera de 1993, em Campos do Jordã o. Já como jornalista, entrevisto-a.
Aproveito para perguntar vá rias coisas que queria saber. Ela havia sido convidada para
participar da Academia Jordanense de Letras. Converso com a autora e ganho dela um livro.
Aproveito para comprar também o Capitu, que ela acabara de lançar.
Além de entrevistá -la, ganho dela um livro e ainda compro outro, sendo ambos
autografados. E, mais uma vez, bobamente, deixo passar a oportunidade: nã o falo a ela da
vez que a conhecera em 1976. Ela faz discurso, vai-se embora e eu perco a ocasiã o de
conversar mais a fundo com essa imortal da Academia Brasileira de Letras.
Desta feita, a grande liçã o veio em sua entrevista, quando ela falou: Eu não quero ser
compreendida, quero ser amada!
ANTES DO RELÓ GIO

Antes do advento do reló gio, as pessoas nã o tinham a ideia do tempo como nó s temos hoje.
Nã o se marcava um encontro para uma hora exata. O esperar era uma constante, fazia parte
do viver.
Dizia-se: -Vamos nos encontrar amanhã antes do sol nascer! E entã o se deparavam em
momentos diferentes, talvez com diferenças de vinte minutos, mas isso nã o era atraso,
desde que fosse antes do sol nascer...
Os casais marcavam encontro ao cair da tarde, e sempre um chegava depois do outro. À s
vezes, bem atrasado. Mas isso nã o era considerado atraso, porque o cair da tarde tinha uma
duraçã o de vá rios minutos. E ninguém ligava para isso, porque ninguém conhecia os
minutos, as horas...
Falavam em horas, mas baseados na posiçã o do sol.
Quando havia um eclipse era um sinal dos Céus. Havia dias de chuva e dias de sol; noites em
que a chuva caia e outras em que nã o. Havia a estaçã o do plantio e a da colheita. Tudo se
repetia e isso era a segurança do ser humano: saber que no dia seguinte haverá um sol
novamente nascendo e na estaçã o das chuvas choverá , na do estio fará muitos dias de sol.
Os dias amanheciam, o sol se levantava, se punha a pino e se deitava. Os homens, as
mulheres e as crianças também se levantavam, se punham a pino e se deitavam. Dia apó s
dia. Noite apó s noite. As sombras eram imensas ao amanhecer, mínimas no pico do sol e
má ximas novamente ao final do dia. Sempre era assim.
O cotidiano era a marca da existência. Fora do cotidiano, nada existia, só o grande Mistério
Insondá vel. Como hoje em dia, as pessoas preferiam nã o se perguntar o que havia além do
cotidiano.
Nã o se pensava no futuro, porque só se vivia o presente. O passado era feito de histó rias
contadas pelos mais velhos e a experiência da mesma tecnologia que os filhos e os filhos
dos filhos iriam ter. Nã o se pensava em progredir, porque também nã o havia a regressã o.
Nã o havia a lembrança de tempos em que o arado nã o existia, mas imaginava-se que tudo
fora criado assim, num á timo, e assim continuava até os entã o dias atuais. Por isso nã o
havia a ideia do progresso. Regredir seria imaginar voltar no tempo, e o tempo sequer era
imaginado.
Vivia-se o tempo como um eterno presente, aguardando-se o Dia Final, ou alguma Grande
Catá strofe.
A invençã o do reló gio trouxe à s pessoas a ideia do existir dentro de uma grande má quina.
Entã o, o pensamento levou os seres humanos a crerem que tudo estava contido dentro de
um grande reló gio.
Aqueles dias se foram e hoje vivemos acorrentados a um andamento marcado e
desvinculado de nosso humor. Como tudo se vai, este aprisionamento também um dia se
irá . E conheceremos entã o alguma nova forma de sentir o tempo.

APÊ NDICE: GENESIS 1;1

A primeira sentença considerada completa pela Bíblia é: No Princípio criou Deus os Céus e a
Terra. Assim é na Vulgata, na do Rei Thiago, na de Joã o Ferreira de Almeida e na Bíblia de
Jerusalém, com insignificantes variaçõ es.

Porém, existe a versã o mais antiga, dita a original, que é a hebraica, na Torá , escrita
por Moisés: Bereshit baro Elochim at Shamaim ve at Aarets.

Be: No, em o;
ROCh: vento, sopro;
BeRE: criar;
ShTh: colocar, fazer, nomear, trocar, fundamento, base;
REShiTh: Princípio;
BaRO: Criou;
ELoChIM: Deuses; deuses; Deus;
At: para;
ShaMa: o Céu;
ShaMaIM: os Céus;
Ve: e;
At: para;
AaReTz: a Terra.

Tradução literal: No Princípio [o Eterno] criou [os] deuses para os Céus e para a Terra.

Daí, pressupomos que o pró prio Criador fez os deuses pagã os, criou o animismo, para os
Céus e para a Terra, antes de qualquer outra coisa. Digo que sã o Espíritos, sem corpo. Se
nã o os fizesse, a quem os seres humanos se voltariam? Ora, Ele concluiu que era mais fá cil
aos antigos aceitarem primeiro o paganismo, onde os deuses tinham características
humanas, como ciú mes e inveja; eles se voltavam para esses deuses que recebiam nomes e
características físicas, espirituais e morais, de acordo com a cultura de cada povo. Thor, o
deus do trovã o, seria Tupã , em outro lugar, Xangô em outro etc. Caim e sua descendência
em geral manteve seus ídolos. Só depois, quando Ele se revelasse ao Patriarca Abrã o, como
Eu Sou, aprendessem a crer no Deus Ú nico, abandonando os ídolos. E com o Cristianismo
restaurado, no Espírito Santo e em Jesus Cristo. Para os Santos dos Ú ltimos Dias, Jeová é, no
Antigo Testamento, o pró prio Nome de Jesus Cristo. E o Pai Celestial seu pai, Elochim
(pronuncia-se Elohim, ou Eloim).

Entretanto, sequer conhecemos se a Torá ainda é como foi escrita por Moisés; cerca de
setenta anciõ es, muitos anos depois de Cristo, tiveram que se reunir para que todos os
judeus lessem as escrituras em sua forma original. Como as letras hebraicas eram todas
consonantais, foi preciso criar as vocalizaçõ es através de pontos e traços, posteriormente.
Mas a memó ria religiosa dos hebreus nã o era mais a mesma em todas as regiõ es do mundo,
o que fez com que cada Rabino tivesse sua pró pria doutrina, ampliando assim as
interpretaçõ es da Torá . O Talmud é a coleçã o de livros da Bíblia Hebraica com comentá rios
e comentá rios dos comentá rios. Fora o fato de nã o sabermos se Moisés ainda escrevia os
textos comaspalavrasjuntas entre si ou se já eram separadas. Pois com todas juntas você
pode criar outras traduçõ es. Existem, entretanto, no alfabeto hebraico, cinco letras que sã o
diferentes quando escritas no meio das palavras ou no final. Isso facilitaria saber a divisã o
dos vocá bulos. E há também formas de dizer que demonstram que uma nova frase está se
iniciando (E aconteceu que...).

O que aconteceu com a Bíblia Cristã pode também ter ocorrido com a Bíblia Hebraica:
modificaçõ es, retiradas de partes preciosas do Livro, enfim alterados textos inteiros,
principalmente quando as có pias eram todas manuscritas.

Apesar de crermos em Jesus Cristo, há uma grande populaçã o no mundo que presta
louvores a deuses anímicos, tradicionalmente, variando, como já dissemos, os nomes e
algumas características, que se vã o mudando, alguns mais, outros menos. Porém, devemos
respeitá -los, pois muitas pessoas os seguem. Mas os que se voltam a um Deus ú nico, nã o
devem prestar louvores a eles.

Esta é uma interpretaçã o baseada em meus estudos pessoais.

SOBRE O AUTOR
Leopoldo Pontes nasceu à s quatro e meia da manhã do dia quatro de abril de 1958, na
cidade de Sã o Paulo.
No final dos anos 1970 e início dos 80, publicou por conta pró pria vá rios livretos de
poesia, na base do mimeó grafo e off-set.
Tem algumas premiaçõ es por contos, estadual e nacional.
Sua formaçã o acadêmica inclui Jornalismo e Direito, além de uma pó s-graduaçã o em
Língua Portuguesa e Literatura.
Tem outros livros publicados pela Amazon.

Contato com o autor: leopoldopontes21@gmail.com

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A RESPOSTA NÃ O-VERBAL
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ASSUMINDO PONTOS POSITIVOS
MACARRONADA
ABANDONANDO A APATIA
O BOTÃ O DA ESPIRITUALIDADE
EMPRESTAR LIVROS
O PRIMEIRO DIA
BIBLIOTECAS
RETORNO AO CHIMARRÃ O
A EXPERIÊ NCIA DIRETA
ARROZ DE CARRETEIRO
O CENTRO E O CÍRCULO
OUTRO OLHAR SOBRE A MIOPIA
SURREALISMO E ROCK
ABREVIATURAS
LER DEVAGAR
EQUILÍBRIO
SONHOS N° 3
A EXPRESSÃ O DA BELEZA
MAYA
A OBJETIVIDADE DA ARTE
A FUNÇÃ O DA ARTE
O GOSTO DAS COISAS N° 3
O PRAZER E A DOR
IMAGENS NO DIA-A-DIA
A REPRESENTAÇÃ O DO INSTANTE
A HARMONIA DAS ESFERAS Nº 2
O HOMEM DE BEM
CONHECER A LEI Nº 1
CONHECER A LEI Nº 2
A CONDIÇÃ O DA BELEZA
O RITMO DE CADA UM
O SILÊ NCIO MEDIEVAL
A MÚ SICA E O SILÊ NCIO
A ESCOLA E O DESSERVIÇO
UM
DOIS
Agrura no Trâ nsito
Sentir ou entender
Mandala
O Ser Humano, esse Desequilibrado Nº1
Cevada
O Ser Humano, esse Desequilibrado Nº2
Destino
Silêncio para Ouvir Mú sica nº1
Ouvir o Silêncio
Silêncio para Ouvir Mú sica nº2
O Ponto de Vista de Quem Observa
O que é Real
Jiló de Panela
Arte e Artesanato
Calabresa com orégano
Beleza
Querela dos Universais
Tornar-se Devoto
Arroz de Torresmo
Felicidade
Felicidade entre os Animais
Equilíbrio e Paz nº1
Abalados pelo Trâ nsito nº1
O Silêncio do Dia de Descanso
Abbey Road
Dedo-de-Moça
Democracia
Abalados pelo Trâ nsito nº2
Equilíbrio e Paz nº2
O Tempo do Mundo
Os Chakras e as Notas Musicais
A Mandala Pessoal
O Carma
Inverno
O Tempo Circular nº1
O Feminino no Poder
Saber Parar
E o Rock Nã o Morreu
Vento
Simplicidade na Culiná ria
O Tempo Circular nº2
O Tempo Circular nº3
O Nascimento do Universo nº1
O Nascimento do Universo n°2
Vai-e-vem
O Tempo no Vai-e-vem
A Eternidade
Em Memó ria de Nossos Avó s
Instrumentos Antigos
O Ser Humano, esse Desequilibrado Nº3
Trazer a Índia
Ouvir Mú sica
LP e Mú sica Digital
Lygia Fagundes Telles
ANTES DO RELÓ GIO
Apêndice: Genesis 1;1
SOBRE O AUTOR

[1]
Amor se escreve sem agá, traduzido por Galvã o de Queiroz.
[2]
Novo Diccioná rio da Língua Portuguesa.
[3]
Há quem diga que a lei nã o tem falhas. A esses podemos dizer entã o que ela pode ser polêmica e contestada por ela
mesma.
[4]
Art.3º da Lei de Introduçã o ao Có digo Civil. O art.16 do Có digo Penal de 1940 diz: A ignorância ou a errada compreensão
da lei não eximem de pena.
[5]
Creio por ser absurdo. Essa frase é frequentemente atribuída a Santo Agostinho, mas nã o combina com sua filosofia. Há
quem diga que foi dita primeiramente por Tertuliano. Nã o sei.
[6]
... pulchra enim dicentur quae visa placent. (Suma Teológica, I, 5)
[7]
Vaidade de vaidades, tudo é vaidade.
[8]
Et je redoute l’hiver parce que c’est la saison du confort!
[9]
Confissões: XI, 12, vers. 14: Eis a minha resposta àquele que pergunta: “Que fazia Deus antes de criar o céu e a terra?” [...]
Gosto mais de responder: não sei – quando de fato não sei [...].
[10]
Dizem algumas pessoas da ciência que nosso universo está em expansã o. E que assim como houve um Big Bang haverá
um Big Crunch. Mas nã o creio nessa hipó tese.

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