Você está na página 1de 22

Apêndice 1 Energia e Enzimas

The force that through the green fuse drives the flower
Drives my green age; that blasts the roots of trees
Is my destroyer.

And I am dumb to tell the crooked rose


My youth is bent by the same wintry fever.

The force that drives the water through the rocks


Drives my red blood; that dries the mouthing streams
Turns mine to wax.

And I am dumb to mouth unto my veins


How at the mountain spring the same mouth sucks.

Dylan Thomas, Collected Poems (1952)

N essas estrofes iniciais do famoso poema de Dylan Thomas, o poeta


proclama a unidade essencial das forças que impelem igualmente
objetos animados e inanimados desde seus primórdios até sua destruição
final. Os cientistas chamam essa força da energia. As transformações de
energia desempenham um papel-chave em todos os processos físicos e quí-
micos que ocorrem nos sistemas vivos. No entanto, a energia sozinha é insu-
ficiente para promover o crescimento e o desenvolvimento dos organismos.
Proteínas catalíticas chamadas enzimas são necessárias para assegurar que as
taxas das reações bioquímicas sejam suficientemente rápidas para sustentar
a vida. Neste apêndice, são examinados os conceitos básicos sobre energia,
o modo pelo qual as células transformam energia para realizar trabalho útil
(bioenergética), assim como a estrutura e a função das enzimas.
A1-2 Apêndice 1 • Energia e Enzimas

Fluxo de energia através trar e mais restrito. Trabalho, no sentido mecânico, é o


deslocamento de qualquer corpo contra uma força oposta.
dos sistemas vivos O trabalho realizado é o produto da força e da distância
O fluxo de matéria através de organismos individuais e de percorrida, como expresso na seguinte equação*:
comunidades biológicas é parte da experiência cotidiana; já
o fluxo de energia não, embora ele seja fundamental para W=f (A1.1)
a própria existência dos seres vivos. O que torna conceitos O trabalho mecânico aparece na química, pois, sempre
como energia, trabalho e ordem tão indefiníveis é sua na- que o volume final de uma reação de mistura excede o vo-
tureza imaterial: considera-se muito mais fácil visualizar a lume inicial, o trabalho deve ser realizado contra a pressão
dança de átomos e moléculas do que as forças e os fluxos da atmosfera; de modo inverso, a atmosfera realiza traba-
que determinam a direção e a magnitude dos processos na- lho quando um sistema se contrai. Esse trabalho é calcula-
turais. O ramo da física que trata desses assuntos é a termo- do pela expressão PV (onde P representa a pressão e V o
dinâmica, disciplina abstrata e exigente que a maioria dos volume), termo que aparece frequentemente em fórmulas
biólogos contenta-se em ler às pressas. Contudo, a bioener- termodinâmicas. Em biologia, trabalho é empregado em um
gética é tão permeada de conceitos e relações quantitativas sentido amplo para descrever o deslocamento contra qualquer
derivadas da termodinâmica que é praticamente impossível uma das forças que os seres vivos encontrem ou gerem: mecâni-
discutir o assunto sem referências frequentes à energia livre, ca, elétrica, osmótica ou mesmo potencial químico.
potencial, à entropia e à segunda lei da termodinâmica. Uma ilustração mecânica bem conhecida pode auxiliar
O propósito deste apêndices é reunir e explicar, de a esclarecer a relação entre energia e trabalho. A mola na Fi-
forma tão simples quanto possível, os conceitos funda- gura A1.1 pode ser estendida a uma determinada distância
mentais da termodinâmica e suas relações recorrentes se for aplicada força a ela – isto é, se trabalho for realizado
vistas ao longo deste livro. Os leitores que preferirem um sobre a mola. Esse trabalho pode ser recuperado por uma
olhar mais amplo sobre o assunto devem consultar tam- combinação apropriada de roldanas e usado para levantar
bém os textos introdutórios de Klotz (1967) e de Nicholls um peso sobre a mesa. Pode-se dizer, portanto, que a mola
& Ferguson (1992), ou os textos avançados de Morowitz estendida possui energia, que é numericamente igual ao
(1978) e de Edsall & Gutfreund (1983). trabalho que ela pode realizar sobre o peso (desconsideran-
A termodinâmica desenvolveu-se durante o século do o atrito). Por sua vez, pode-se dizer que o peso sobre a
XIX, a partir dos esforços para compreender como uma mesa possui energia – em virtude de sua posição no cam-
máquina a vapor funciona e por que é produzido calor po gravitacional da Terra –, a qual pode ser utilizada para
quando se perfura um canhão. O próprio nome “termo- realizar outro trabalho, como girar uma manivela. O peso,
dinâmica” e muito da linguagem dessa ciência lembram portanto, ilustra o conceito de energia potencial – a capa-
essas raízes históricas, embora fosse mais apropriado falar cidade de realizar trabalho proveniente da posição de um
de energética, pois os princípios envolvidos são univer- objeto em um campo de força –, e a sequência como um
sais. As plantas, assim como todos os outros fenômenos todo ilustra a conversão de um tipo de energia em outro, ou
naturais, estão submetidas às leis da termodinâmica. Por a transdução de energia.
isso, a termodinâmica fornece uma estrutura indispensá-
vel para a descrição quantitativa da vitalidade biológica. Primeira lei: a energia total é sempre conservada
É de entendimento comum que dispositivos mecânicos
Energia e trabalho envolvem tanto a realização de trabalho como a produção
Inicialmente, aborda-se o significado de “energia” e “tra-
* Pode-se observar, de passagem, que as dimensões do trabalho
balho”. Energia é definida, tanto na física elementar são complexas – ml2t–2 –, onde m significa massa, l distância e t tem-
como na vida diária, como a capacidade de realizar tra- po, e que o trabalho é uma quantidade escalar, isto é, o produto de
balho. O significado de trabalho é mais difícil de encon- dois termos vetoriais.

(A) (B) (C)

Figura A1.1 Energia e trabalho em um sistema mecânico. (A) energia potencial armazenada na mola estendida realiza o trabalho
Um peso repousando sobre o chão está fixado a uma mola por meio de levantar o peso quando a mola se contrai.
de uma corda. (B) Ao puxar a mola, ela é colocada sob tensão. (C) A
Apêndice 1 • Energia e Enzimas A1-3

ou absorção de calor. Pode-se variar a quantidade de tra- Energia total absorvida pela folha =
balho exercido sobre a mola, até um determinado máximo, energia emitida pela folha + energia armazenada pela folha
usando pesos diferentes, e a quantidade de calor produzida
Observe que, embora a energia absorvida pela folha tenha
também variará. Porém, muito do trabalho experimental
sido transformada, a energia total permanece a mesma,
tem mostrado que, em condições ideais, a soma do traba-
conforme a primeira lei.
lho realizado e do calor liberado é constante e depende so-
mente do comprimento inicial e final da mola. É possível, A variação na energia interna de um
assim, imaginar uma propriedade – a energia interna da sistema representa o trabalho máximo que
mola –, com a característica descrita pela seguinte equação: ele pode realizar
 U = Q + W (A1.2) A equivalência entre energia e trabalho deve ser quanti-
ficada recorrendo-se a “condições ideais”, isto é, pela exi-
Aqui Q é a quantidade de calor absorvida pelo sistema e W gência de que o processo seja realizado reversivelmente.
é a quantidade de trabalho realizada pelo sistema.* Na Fi- O significado de “reversível” em termodinâmica tem uma
gura A1.1, o trabalho é mecânico, mas poderia também ser conotação especial: o termo descreve condições nas quais
elétrico, químico ou de qualquer outro tipo. Portanto, U forças opostas são tão equilibradas que uma variação in-
é a quantidade líquida de energia introduzida no sistema, finitesimal em uma ou outra reverteria a direção do pro-
seja como calor, seja como trabalho; inversamente, tanto a cesso.** Nessas circunstâncias, o processo produz a quan-
execução de trabalho como a liberação de calor acarretam tidade máxima possível de trabalho. A reversibilidade
uma diminuição na energia interna. Não se pode especificar com essa conotação não é encontrada com frequência na
um valor absoluto para o conteúdo de energia; apenas mu- natureza, como no exemplo da folha. As condições ideais
danças na energia interna podem ser medidas. Observe que diferem tão pouco do estado de equilíbrio que qualquer
a Equação A1.2 aceita que calor e trabalho são equivalentes; processo ou reação exigiria um tempo infinito e, portan-
seu propósito é enfatizar que, em condições ideais, U de- to, não ocorreriam. Todavia, o conceito termodinâmico de
pende apenas dos estados inicial e final do sistema, e não reversibilidade é útil: se for medida a variação de energia
de como o calor e o trabalho estão repartidos. interna que um processo acarreta, obtém-se um limite su-
A Equação A1.2 é uma afirmação da primeira lei da perior para o trabalho que ele pode realizar; para qualquer
termodinâmica, que é o princípio de conservação de ener- processo real, o trabalho máximo será menor.
gia. Se um sistema específico não troca energia com seu No estudo de biologia vegetal são encontradas vá-
entorno, seu conteúdo de energia permanece constante; se rias fontes de energia – particularmente transformações
energia é trocada, a variação na energia interna será dada luminosas e químicas –, bem como uma diversidade de
pela diferença entre a energia ganha do entorno e aquela funções do trabalho, incluindo os trabalhos mecânico, os-
perdida para ele. A variação na energia interna depende mótico, elétrico e químico. O significado da primeira lei
somente dos estados inicial e final do sistema, nem da rota na biologia provém da certeza, meticulosamente estabe-
nem do mecanismo de troca de energia. Energia e traba- lecida pelos físicos do século XIX, de que os vários tipos de
lho são interconversíveis; mesmo o calor é uma medida da energia e trabalho são mensuráveis, equivalentes e, den-
energia cinética dos constituintes moleculares do sistema. tro de certos limites, interconversíveis. A energia é para a
Para colocar isso de maneira tão simples quanto possível, a biologia o que o dinheiro é para a economia: o meio pelo
Equação A1.2 estabelece que nenhuma máquina, incluin- qual os seres vivos obtêm bens úteis e serviços.
do as máquinas químicas que são conhecidas como vivas,
pode realizar trabalho sem uma fonte de energia. Cada tipo de energia é caracterizado por um
Um exemplo da aplicação da primeira lei ao fenô- fator capacidade e um fator potencial
meno biológico é o balanço energético de uma folha. As A quantidade de trabalho que pode ser realizada por um
folhas absorvem energia de suas adjacências de duas ma- sistema, seja mecânico, ou químico, é uma função do tama-
neiras: como radiação incidente direta do sol e como ra- nho do sistema. O trabalho pode sempre ser definido como
diação infravermelha do entorno. Alguma energia absor- o produto de dois fatores – força e distância, por exemplo.
vida pela folha é irradiada de volta para o ambiente como Um é um fator potencial ou intensidade, que independe do
radiação infravermelha e calor, enquanto uma fração da tamanho do sistema; o outro é um fator capacidade e é dire-
energia absorvida é armazenada, tanto como produtos tamente proporcional ao tamanho (Tabela A1.1).
fotossintéticos como na variação da temperatura foliar. Em bioquímica, a energia e o trabalho tradicional-
Desse modo, pode-se escrever a seguinte equação: mente têm sido expressos em calorias; 1 caloria é a quan-
tidade de calor necessária para elevar a temperatura de
1 g da água em 1ºC, especificamente, por exemplo, de
* A Equação A1.2 é mais comumente encontrada na forma U =
Q – W, que resulta da convenção na qual Q é a quantidade de
calor absorvida pelo sistema a partir do entorno e W é a quantidade ** Em bioquímica, a reversibilidade tem um significado diferente:
de trabalho realizada pelo sistema sobre o entorno. Essa convenção em geral, o termo se refere a uma reação cuja rota pode ser invertida,
afeta o sinal de W, mas não altera o significado da equação. frequentemente com um entrada (input) de energia.
A1-4 Apêndice 1 • Energia e Enzimas

15 para 16°C. Em princípio, pode-se executar o mesmo


processo realizando o trabalho mecanicamente com uma TABELA A1.1 Fatores potencial e capacidade
pazinha; esse experimento conduz ao estabelecimento em energética
do equivalente mecânico do calor como 4,186 joules por Tipo de energia Fator potencial Fator capacidade
caloria (J cal–1)*. Existe também a oportunidade de utili- Mecânica Pressão Volume
zar as unidades equivalentes de eletricidade, baseadas no Elétrica Potencial elétrico Carga
volt: um volt é a diferença de potencial entre dois pontos,
Química Potencial químico Massa
onde 1 J de trabalho é utilizado na transferência de um
coulomb de carga de um ponto para outro. (Um coulomb Osmótica Concentração Massa
é a quantidade de carga transportada por uma corrente de Térmica Temperatura Entropia
1 ampere [A] que flui durante 1 s. A transferência de 1 mol
de carga ao longo de um potencial de 1 volt [V] envolve
96.500 J de energia ou trabalho.) A diferença entre ener- a direção de processos espontâneos, e esse é um caso.
gia e trabalho é frequentemente uma questão de sinal. O A função termodinâmica que se procura é chamada en-
trabalho deve ser feito para levar uma carga positiva mais tropia, a quantidade de energia em um sistema não dis-
próxima à outra carga positiva, porém as cargas adquirem ponível para a realização de trabalho, correspondente ao
energia potencial, que, por sua vez, pode realizar trabalho. grau de aleatoriedade de um sistema. Matematicamente,
a entropia é um fator capacidade correspondente à tem-
A direção de processos espontâneos peratura, Q /T. Pode-se dar a resposta à pergunta, assim
como a segunda lei da termodinâmica, desse modo: a
Deixados por sua conta, os eventos no mundo real tomam direção de todos os processos espontâneos é para au-
um rumo previsível. A maçã cai do galho. Uma mistura mentar a entropia de um sistema mais seu entorno.
de hidrogênio e oxigênio gasoso se converte em água. A Poucos conceitos como a entropia são tão básicos
mosca presa em uma garrafa está condenada a morrer, as (e, no entanto, tão obscuros) para uma compreensão do
pirâmides a se fragmentarem em areia, as coisas se de- mundo em que se vive. Presumivelmente, isso ocorre
compõem. Porém, não há nada no princípio de conser- porque a entropia não seja intuitivamente relacionada
vação da energia que proiba a maçã de retornar ao seu às percepções sensoriais humanas, como são a massa e
ramo com a absorção de calor do entorno ou que impeça a temperatura. A explicação dada aqui segue a exposição
a água de se dissociar nos seus elementos constituintes de especialmente lúcida de Atkinson (1977), que explica a
uma maneira similar. A busca pela razão de que nenhuma segunda lei de uma forma, aparentando, à primeira vista,
dessas coisas ocorra sempre levou a profundos insights fi- pouca semelhança com a que foi exposta acima:
losóficos e gerou relações quantitativas úteis sobre a ener-
gética de reações químicas e a quantidade de trabalho que Nós devemos tomar [a segunda lei] como o conceito
que qualquer sistema, que não esteja a zero absoluto,
pode ser obtida delas. Uma vez que os seres vivos são, em
tem uma quantidade mínima de energia irredutível,
muitos aspectos, máquinas químicas, esses temas devem que é uma propriedade inevitável daquele sistema
ser examinados com algum detalhe. naquela temperatura. Isto é, um sistema requer certa
quantidade de energia apenas para estar a uma tempe-
Segunda lei: a entropia total sempre aumenta ratura especificada qualquer.
A partir da experiência diária com pesos caindo e corpos
aquecidos esfriando, pode-se esperar que processos es- A constituição molecular da matéria fornece uma ex-
pontâneos sigam na direção que reduz a energia interna, plicação fácil: alguma energia é armazenada no movimento
isto é, a direção na qual U é negativo. Porém, há tam- térmico das moléculas e nas vibrações e oscilações dos seus
bém exceções para que isso seja uma regra geral. A fu- átomos constituintes. Pode-se exprimir isso como ener-
são do gelo é uma exceção: um cubo de gelo colocado gia isotermicamente indisponível, visto que o sistema não
em água a 1°C irá se liquefazer, mesmo que medições pode transferir nenhuma parte dela sem uma redução na
mostrem que a água líquida (em qualquer temperatura temperatura (assumindo que não ocorra qualquer alteração
acima de 0°C) está em um estado de energia mais alta física ou química). A energia isotermicamente indisponível
do que o gelo; evidentemente, alguns processos espon- de qualquer sistema aumenta com a temperatura, visto que
tâneos são acompanhados por um aumento na energia a energia da agitação molecular e atômica aumenta com a
interna. O cubo de gelo fundido não viola a primeira lei, temperatura. Quantitativamente, a energia isotérmica in-
pois o calor é absorvido à medida que ele derrete. Isso disponível de um sistema particular é dada por ST, em que
sugere que há uma relação entre a capacidade para a ab- T é a temperatura absoluta e S é a entropia.
sorção espontânea de calor e o critério para determinar O que é a entropia? A reflexão sobre a natureza da
energia isotermicamente indisponível sugere que, para uma
determinada temperatura, a quantidade dessa energia será
* No padrão em uso atual baseado no metro, quilograma, e, segun-
do, a unidade fundamental de energia é o joule (1 J = 0,24 cal) ou o maior quanto mais átomos e moléculas forem livres para
kilojoule (1 kJ = 1.000 J). se mover e para vibrar – ou seja, quanto mais caótico for o
Apêndice 1 • Energia e Enzimas A1-5

sistema. Por outro lado, o arranjo ordenado dos átomos em sentido oposto forem iguais, não haverá alteração líquida
um cristal, com um lugar para cada um e cada um em seu na composição, e o equilíbrio prevalecerá.
lugar, corresponde a um estado de baixa entropia. Em zero A segunda lei tem sido expressa em muitas versões.
absoluto, quando todo o movimento cessa, a entropia de Uma versão impede a existência de máquinas moto-contí-
uma substância pura é igualmente zero. Essa afirmação é, às nuo: uma vez que a energia é, pela segunda lei, degradada
vezes, denominada terceira lei da termodinâmica. perpetuamente em calor e torna-se isotermicamente inútil
Uma molécula grande, uma proteína, por exemplo, (S > 0), o movimento contínuo requer uma entrada (input)
na qual muitos tipos de movimentos podem ocorrer, terá de energia do exterior. A versão mais célebre e, ao mesmo
quantidades consideráveis de energia armazenada dessa tempo, desconcertante, da segunda lei, foi fornecida por R.
maneira – mais do que uma molécula de aminoácido. Con- J. Clausius (1879):“A energia do universo é constante; a en-
tudo, a entropia da molécula de proteína será menor do que tropia do universo tende em direção ao máximo”.
a dos aminoácidos constituintes nos quais ela pode se dis- Como a entropia pode crescer sempre, gerada a partir
sociar, devido às restrições impostas aos movimentos desses de nada? A raiz da dificuldade é verbal, como Klotz (1967)
aminoácidos, já que eles são parte da estrutura maior. Qual- habilmente esclareceu. Tivesse Clausius definido a entro-
quer processo que leva ao relaxamento dessas restrições pia com o sinal oposto (correspondendo à ordem, em vez
aumenta a liberdade de movimento e, portanto, a entropia. do caos), sua tendência universal seria diminuir; então, se-
Essa é a tendência universal dos processos espontâne- ria óbvio que as variações espontâneas seguissem a dire-
os, conforme definido na segunda lei; é por isso que as va- ção que diminui a capacidade para variações espontâneas
liosas enzimas armazenadas no refrigerador tendem a de- subsequentes. Os solutos difundem-se de uma região de
compor-se e por que o gelo derrete na água. O aumento em maior concentração para outra de menor concentração; o
entropia quando o gelo se liquefaz na água é“compensado” calor flui de um corpo aquecido para um frio. Às vezes, es-
pela absorção de calor do entorno. Enquanto a variação lí- sas variações podem ser revertidas por um agente externo
quida na entropia do sistema mais seu entorno for positiva, para reduzir a entropia do sistema em consideração, mas
o processo pode ocorrer espontaneamente. Isso não signi- então esse agente externo deve mudar, de modo a reduzir
fica, necessariamente, que o processo ocorrerá: a taxa é, em sua própria capacidade para futuras mudanças. Em resu-
geral, determinada por fatores cinéticos independentes da mo, “a entropia é um índice de exaustão; quanto mais um
variação entrópica. Tudo que a segunda lei determina é que sistema tiver perdido sua capacidade para variação espon-
o destino das pirâmides é desintegrar-se em areia, enquanto tânea, quanto mais esta capacidade tiver sido exaurida,
a areia nunca irá se agrupar em uma pirâmide; a lei não diz maior é a entropia” (Klotz, 1967). Inversamente, quanto
quão rapidamente isso deve acontecer. mais distante um sistema está do equilíbrio, maior é sua
capacidade para mudar e menor sua entropia. Os seres vi-
Um processo é espontâneo se a ΔS do sistema e vos ocupam a última categoria: uma célula é o epítome de um
seu entorno for positiva estado que está distante do equilíbrio.
Não há nada místico na entropia – ela é uma quantidade
termodinâmica como outra qualquer, medida experimen- Energia livre e potencial químico
talmente e expressa em unidades de entropia. Um método
de quantificá-la é por meio da capacidade de calor de um Muitas transferências de energia que ocorrem em orga-
sistema, a quantidade de energia necessária para elevar a nismos vivos são químicas; necessita-se, portanto, de uma
temperatura em 1°C. Em alguns casos, a entropia pode ser expressão quantitativa para a quantidade de trabalho que
calculada a partir de princípios teóricos, embora apenas uma reação química pode realizar. Para esse propósito, as
para moléculas simples. Para os propósitos do livro, o que relações que envolvem a variação de entropia no sistema
importa é o sinal da variação na entropia, S: um processo mais seu entorno são inadequadas. Há necessidade de uma
pode ocorrer espontaneamente quando a S do sistema e função que não dependa do entorno, mas que, assim como
seu entorno é positiva; um processo para o qual a S é ne- S, alcance um mínimo sob condições de equilíbrio e, desse
gativa não pode ocorrer espontaneamente, mas o processo modo, possa servir tanto como um critério para a exequibi-
oposto pode; e, para um sistema em equilíbrio, a entropia lidade de uma reação como para a medição da energia dis-
do sistema mais seu entorno é máxima e a S é zero. ponível para a realização de trabalho a partir dela. A função
“Equilíbrio” é outra daquelas palavras familiares que empregada universalmente para esse propósito é a energia
é mais fácil usar do que definir. Seu significado cotidia- livre, abreviada como G em homenagem ao físico-químico
no indica que as forças atuando sobre um sistema estão do século XIX J. Willard Gibbs, que a introduziu.
igualmente equilibradas, de modo que não há tendência
ΔG é negativa para um processo espontâneo em
resultante para mudança; esse é o sentido no qual o termo
“equilíbrio” será utilizado aqui. Uma mistura de substân- temperatura e pressão constantes
cias químicas pode estar no meio de uma rápida intercon- Anteriormente, tratou-se da energia isotermicamente
versão, mas, se as taxas das reações em um sentido e no indisponível, ST. Energia livre é definida como a ener-
A1-6 Apêndice 1 • Energia e Enzimas

gia que é utilizável em condições isotérmicas, pela se- rante a fosforilação oxidativa, cuja G aparente é tão alta
–1 –1
guinte relação: quanto 67 kJ mol (16 kcal mol ). Claramente, a célula
deve realizar trabalho para tornar a reação total exergôni-
 H = G + TS (A1.3)
ca. A ocorrência de processos endergônicos na natureza,
O termo H, entalpia ou conteúdo calórico, não é completa- portanto, implica que eles sejam acoplados a um segundo
mente equivalente a U, a energia interna (ver Equação A1.2). processo, exergônico. Grande parte da bioenergética celu-
Para ser exato, H é uma medida da variação total de ener- lar e molecular diz respeito aos mecanismos pelos quais o
gia, incluindo o trabalho que pode resultar de variações no acoplamento de energia é realizado.
volume durante a reação, enquanto U exclui esse trabalho. 0
(Um pouco adiante, será retomado o conceito de entalpia.) A variação na energia livre padrão, ΔG , é a
Entretanto, no contexto biológico, geralmente enfocam-se variação na energia livre quando a concentração
reações em solução, para as quais variações em volume são de reagentes e produtos é 1 M
desprezíveis. Para a maioria dos objetivos, então, Variações na energia livre podem ser medidas experimen-
talmente por métodos calorimétricos. Eles têm sido tabu-
 U G + TS (A1.4)
lados de duas formas: como a energia livre de formação de
e um composto a partir de seus elementos e como a G para
 G U – TS (A1.5) uma reação específica. É de extrema importância lembrar
que, por convenção, os valores numéricos se referem a um
O que torna essa uma relação útil é a demonstração de que,
conjunto específico de condições. A variação na energia livre
para todos os processos espontâneos a temperatura e pressão
padrão, G , refere-se a condições em que todos os reagentes e
0
constantes, G é negativa. Assim, a variação na energia livre é
produtos estão presentes a uma concentração de 1 M; em bio-
um critério de exequibilidade. Qualquer reação química que
química é mais conveniente empregar G ', que é definida
0
prossiga com uma G negativa pode ocorrer espontanea-
da mesma maneira, exceto que o pH é considerado como
mente; um processo para o qual a G é positiva não pode
7. As condições observadas no mundo real são passíveis
ocorrer, mas a reação pode prosseguir na direção oposta; e
de serem muito diferentes destas, especialmente quanto
uma reação na qual a G é zero está em equilíbrio, e não
às concentrações dos participantes. Para tomar um exem-
ocorrerá variação líquida. Para temperatura e pressão deter-
plo bem conhecido, G ', para a hidrólise de ATP, é cerca de
0
minadas, a G depende apenas da composição da mistura –1 –1
–33 kJ mol (–8 kcal mol ). No citoplasma, entretanto, as
de reação; por isso, a expressão alternativa “potencial quí-
concentrações reais de nucleotídeos são aproximadamente
mico” é especialmente apropriada. Novamente, nada é dito
3 mM ATP, 1 mM ADP, e 10 mM Pi. Como se pode ver, as
sobre a taxa, apenas sobre a direção. Se uma reação tendo
variações na energia livre dependem fortemente das con-
uma dada G prosseguirá, e em que taxa, é determinado
centrações, e a G para a hidrólise de ATP em condições
pela cinética, e não por fatores termodinâmicos.
fisiológicas, portanto, é muito mais negativa do que a G ',
0
Há uma relação estreita e simples entre a variação na –1 –1
aproximadamente –50 a –65 kJ mol (–12 a –15 kcal mol ).
energia livre de uma reação química e o trabalho que a
Desse modo, conquanto os valores da G ', para muitas reações
0
reação pode realizar. Desde que a reação seja reversível,
sejam facilmente acessíveis, eles não devem ser usados indiscri-
 G = Wmáx (A1.6) minadamente como um guia do que acontece nas células.

Isto é, para uma reação se realizando em temperatura e O valor de ΔG é uma função do deslocamento da
pressão constantes, – G é uma medida do trabalho máxi- reação a partir do equilíbrio
mo que o processo pode realizar. Mais precisamente, – G A discussão precedente sobre a energia livre mostra que
representa o máximo trabalho possível, exclusivo de tra- deve haver uma relação entre G e a constante de equi-
balho pressão–volume, e, desse modo, é uma quantidade líbrio de uma reação: no equilíbrio, G é zero, e quanto
de grande importância em bioenergética. Qualquer pro- mais distante uma reação está do equilíbrio, maior é a G
cesso seguindo na direção do equilíbrio pode, em princí- e mais trabalho a reação pode realizar. A expressão quan-
pio, realizar trabalho. Pode-se, por conseguinte, descre- titativa dessa relação é
ver os processos nos quais a G é negativa como aqueles
 G0 = –RT ln K = –2,3RT log K (A1.7)
“que liberam energia”, ou exergônicos. Inversamente,
para qualquer processo se afastando do equilíbrio, G é em que R é a constante dos gases, T a temperatura absolu-
positiva, e fala-se de uma reação “que consome energia”, ta e K a constante de equilíbrio da reação*. Essa equação é
ou endergônica. Naturalmente, uma reação endergônica
não pode ocorrer: todos os processos reais se movem em * N. de T. Na literatura físico-química sobre equilíbrio químico, em
direção ao equilíbrio, com uma G negativa. O conceito português, utiliza-se o termo constante de equilíbrio da reação (Kc)
para a razão entre a multiplicação das concentrações dos produtos
de reações endergônicas, apesar disso, é uma abstração (cada uma elevada ao seu respectivo coeficiente estequiométrico)
útil, pois muitas reações biológicas parecem se afastar do sobre a multiplicação dos reagentes (cada uma elevada ao seu res-
equilíbrio. Um exemplo excelente é a síntese de ATP du- pectivo coeficiente estequiométrico) de uma reação química.
Apêndice 1 • Energia e Enzimas A1-7

uma das ligações mais úteis entre a termodinâmica e a bio-


química e tem uma série de aplicações. Por exemplo, a equa-
ção é facilmente modificada, permitindo o cálculo da varia-
ção na energia livre em outras concentrações que não as das

Energia livre
condições-padrão. Para as reações mostradas na equação A B

A+BC+D (A1.8)
a variação real na energia livre, G, é dada pela equação

(A1.9)
 A pura B pura

em que os termos entre colchetes referem-se às concen-


trações no tempo da reação. Estritamente falando, deve-
0,001K 0,01K 0,1K K 10K 100K 1.000K
riam ser utilizadas atividades, mas elas geralmente não
são conhecidas em condições celulares, de modo que as Figura A1.2 Energia livre de uma reação química como uma
concentrações devem resolver. função do deslocamento do equilíbrio. Imagine um sistema fechado
A Equação A1.9 pode ser reescrita para tornar sua contendo os componentes A e B nas concentrações [A] e [B]. Os dois
componentes podem ser interconvertidos pela reação A  B, que está
importância um pouco mais clara, fazendo q representar
no equilíbrio quando a razão produtos:reagentes, [B]/[A], se equivale
a razão produtos:reagentes, [C][D]/[A][B]. Substituindo à unidade. A curva mostra qualitativamente como a energia livre,
a Equação A1.7 na Equação A1.9, seguido pelo rearranjo, G, do sistema varia quando o total [A] + [B] é mantido constante,
resulta a seguinte equação: mas a razão produtos:reagentes é deslocada do equilíbrio. As se-
tas representam esquematicamente a variação na energia livre, G,
para uma pequena conversão de [A] em [B] ocorrendo em razões
(A1.10) produtos:reagentes diferentes. (Segundo Nicholls & Ferguson, 1992.)

Em outras palavras, o valor de G é uma função do afasta- cos; aqueles em que o calor é absorvido, como a fusão ou
mento da reação do equilíbrio. A fim de deslocar um sis- a evaporação, são referidos como endotérmicos. A oxida-
tema do equilíbrio, trabalho deve ser realizado sobre ele e ção da glicose a CO2 e água é uma reação exergônica (G
0

a G deve ser positiva. Inversamente, um sistema deslo- –1 –1


= –2.858 kJ mol [–686 kcal mol ]). Quando essa reação
cado do equilíbrio pode realizar trabalho sobre outro sis- ocorre durante a respiração, parte da energia livre é con-
tema, desde que os parâmetros cinéticos permitam que a servada por meio de reações acopladas que geram ATP.
reação prossiga e exista um mecanismo que acople os dois A combustão da glicose dissipa a energia livre da reação,
sistemas. Quantitativamente, uma reação de mistura a liberando a maior parte dela como calor (H = –2.804 kJ
25°C, cuja composição é uma ordem de grandeza afasta- –1 –1
mol [–673 kcal mol ]).
da do equilíbrio (log K/q = 1), corresponde a uma variação A bioenergética está preocupada com a transdução de
–1 –1
na energia livre de 5,7 kJ mol (1,36 kcal mol ). O valor energia e, portanto, destaca as transferências de energia
da G é negativo se a razão produtos:reagentes real for livre, mas às vezes a transferência de calor também pode
menor do que a razão de equilíbrio, e positivo se a razão apresentar significado biológico. Por exemplo, a água tem
produtos:reagentes for maior. –1 –1
um alto calor de vaporização, 44 kJ mol (10,5 kcal mol ) a
O ponto que a G é uma função do deslocamento de 25°C, que desempenha um importante papel na regulação
uma reação (na verdade, de qualquer sistema termodinâmi- da temperatura foliar. Durante o dia, a evaporação da água
co) do ponto de equilíbrio é central para uma compreensão a partir da superfície foliar (transpiração) dissipa o calor
da bioenergética. A Figura A1.2 ilustra esquematicamente do entorno e auxilia a resfriar a folha. De modo inverso, a
essa relação para a interconversão química das substâncias A condensação de vapor de água como orvalho aquece a fo-
e B, e a relação reaparecerá brevemente de outras maneiras. lha, uma vez que a condensação da água, sendo o reverso
A variação na entalpia mede a energia da evaporação, é exotérmica. A função abstrata entalpia é
transferida como calor medida direta da energia trocada na forma de calor.
Processos químicos e físicos são quase invariavelmente
acompanhados da geração ou absorção de calor, o que Reações redox
reflete a variação na energia interna do sistema. A quanti- Oxidação e redução referem-se à transferência de um ou
dade de calor transferido e o sinal da reação estão relacio- mais elétrons de um doador para um aceptor, geralmente
nados à variação na energia livre, como demonstrado na outra espécie química; exemplo é a oxidação do ferro fer-
Equação A1.3. A energia absorvida ou liberada como calor roso pelo oxigênio, que forma ferro férrico e água. Reações
em condições de pressão constante é designada como a desse tipo exigem uma consideração especial, pois elas de-
variação no conteúdo de calor ou entalpia, H. Os proces- sempenham um papel central tanto na respiração como na
sos que geram calor, como a combustão, são exotérmi- fotossíntese.
A1-8 Apêndice 1 • Energia e Enzimas

A variação na energia livre de uma reação de vras, o potencial-padrão redox é uma medida, em uni-
oxirredução é expressa como o potencial padrão dades eletroquímicas, da variação na energia livre de um
redox em unidades eletroquímicas processo de oxidação-redução.
Como as variações na energia livre, o potencial redox
Reações redox podem ser muito bem descritas em termos
medido em condições diferentes das condições-padrão
de sua variação na energia livre. Contudo, a participação
depende das concentrações das espécies oxidadas e re-
de elétrons torna conveniente seguir o curso da reação
duzidas, de acordo com a seguinte equação (é importante
com instrumentação elétrica e incentiva o uso de uma no-
observar a similaridade na forma com a Equação A1.9):
tação eletroquímica. Isso permite também a análise minu-
ciosa do processo químico em reações oxidantes e reduto-
ras separadas. Para a oxidação do ferro, pode-se escrever (A1.15)

(A1.11) Aqui Eh é o potencial medido em volts e os outros símbo-


los têm seus significados habituais. Daí resulta que o po-
(A1.12) tencial redox em condições biológicas pode diferir subs-
tancialmente do potencial-padrão de redução.
(A1.13)
Potencial eletroquímico
A tendência de uma substância para doar elétrons, sua
“pressão de elétrons”, é medida por seu potencial-padrão Nas seções precedentes, introduziu-se o conceito de que
de redução (ou redox), E0, com todos os componentes a uma mistura de substâncias cuja composição diverge do es-
uma concentração de 1 M. Em bioquímica, é mais conve- tado de equilíbrio representa uma fonte potencial de energia
niente empregar E’0, que é definido do mesmo modo, ex- livre (ver Figura A1.2). De modo inverso, uma quantidade
ceto que o pH é 7. Por definição, então, E’0 é a força eletro- semelhante de trabalho deve ser exercida sobre uma mistura
motriz dada por metade de uma célula em que as espécies em equilíbrio, a fim de afastar sua composição do equilíbrio.
reduzidas e oxidadas estão presentes a 1 M, 25°C e pH 7, Nesta seção, são examinadas as variações na energia livre
em equilíbrio com um eletrodo que pode aceitar reversi- associadas a outros tipos de deslocamento do equilíbrio – a
velmente elétrons de espécies reduzidas. Por convenção, saber, gradientes de concentração e de potencial elétrico.
a reação é escrita como uma redução. O potencial-padrão
O transporte de um soluto neutro contra seu
de redução do eletrodo de hidrogênio* serve como refe-
rência: em pH 7, ele equivale a –0,42 V. O potencial-pa-
gradiente de concentração diminui a entropia
drão redox como definido aqui é geralmente referido na do sistema
literatura sobre bioenergética como o potencial médio Considerando um recipiente separado, por uma membra-
(midpoint potential), Em. Um potencial médio negativo na, em dois compartimentos que contêm soluções de um
indica um bom agente redutor; oxidantes têm potenciais soluto neutro nas concentrações C1 e C2, respectivamente,
médios positivos. o trabalho necessário para transferir 1 mol do soluto do
O potencial redox para a redução do oxigênio à água primeiro compartimento para o segundo é dado pela se-
3+ 2+
é +0,82 V; na redução do Fe a Fe (a direção oposta guinte equação:
àquela da Equação A1.11), +0,77 V. Portanto, pode-se pre-
2+ 3+
dizer que, em condições-padrão, o par Fe –Fe tenderá a (A1.16)
reduzir o oxigênio à água em vez do inverso. Uma mistura
2+ 3+
contendo Fe , Fe e oxigênio provavelmente não esta-
rá em equilíbrio, e a amplitude de seu deslocamento do Essa expressão é análoga à expressão para uma reação quí-
equilíbrio pode ser expressa em termos tanto da variação mica (Equação A1.10) e tem o mesmo significado. Se C2 é
na energia livre pela Equação A1.13 ou em diferença no maior do que C1, a G é positiva, e trabalho deve ser rea-
potencial redox, E’0, entre os pares oxidantes e redutores lizado para transferir o soluto. Novamente, a variação na
(+0,05 V no caso da oxidação do ferro). Em geral, energia livre para o transporte de 1 mol de soluto contra um
gradiente de dez vezes a concentração é 5,7 kJ, ou 1,36 kcal.
 G0’ = –nF E’0 (A1.14) O motivo para que trabalho deva ser realizado para mo-
ver uma substância de uma região de menor para uma de
em que n é o número de elétrons transferido e F é a cons- maior concentração é que o processo acarreta uma variação
–1 –1
tante de Faraday (23,06 kcal V mol ). Em outras pala- para um estado menos provável e, portanto, uma redução na
entropia do sistema. Inversamente, a difusão do soluto da re-
* O eletrodo-padrão de hidrogênio consiste em platina, sobre a gião de maior concentração para aquela de menor ocorre na
qual gás hidrogênio é borbulhado a uma pressão de 1 atm. O ele-
trodo é imerso em uma solução contendo íons hidrogênio. Quando
direção de maior probabilidade; isso resulta em um aumento
a atividade dos íons hidrogênio é 1, aproximadamente 1 M H+, o na entropia do sistema e pode prosseguir espontaneamente.
potencial do eletrodo é considerado como 0. O sinal da G torna-se negativo e o processo pode realizar
Apêndice 1 • Energia e Enzimas A1-9

a quantidade de trabalho especificado pela Equação A1.16,


desde que exista um mecanismo que acople o processo de 1
difusão exergônico à realização de trabalho. 2
+
+ +
+ +
O potencial de membrana é o trabalho que deve + +
+
ser realizado para mover um íon de um lado +
+
para o outro da membrana + – + + +
+ +
– + +
O assunto torna-se um pouco mais complexo se o soluto +
+ – + +
em questão transporta uma carga elétrica. A transferência +
de um soluto carregado positivamente do compartimento +
+
1 para o compartimento 2 causará, então, uma diferença +
na carga que se desenvolve através da membrana: o se-
gundo compartimento torna-se eletropositivo em relação
ao primeiro. Uma vez que cargas iguais se repelem entre Figura A1.3 Transporte contra um gradiente de potencial eletro-
químico. O agente que move o soluto carregado (do compartimento
si, o trabalho realizado pelo agente que move o soluto do 1 para o compartimento 2) deve realizar trabalho, superando tanto o
compartimento 1 para o compartimento 2 é uma função gradiente de potencial eletroquímico como o gradiente de concentra-
da diferença de carga; mais precisamente, ele depende ção. Em consequência, os cátions no compartimento 2 foram elevados
da diferença no potencial elétrico através da membrana. a um potencial eletroquímico mais alto do que os do compartimento
Essa diferença, chamada abreviadamente de potencial de 1. Os ânions que neutralizam as cargas positivas foram omitidos.
membrana, aparecerá novamente nas páginas seguintes.
O potencial de membrana, E*, é definido como o
trabalho que deve ser realizado por um agente para mover to de transdução de energia durante a fotossíntese. Um
uma carga de teste de um lado da membrana para o outro. cátion de valência z move-se do compartimento 1 para o
Quando 1 J de trabalho deve ser realizado para mover 1 compartimento 2, contra um gradiente de concentração
coulomb de carga, diz-se que a diferença de potencial é (C2 > C1) e um gradiente de potencial elétrico de mem-
1 V. O potencial elétrico absoluto de qualquer fase simples brana (o compartimento 2 é eletropositivo em relação ao
não pode ser medido, mas a diferença de potencial entre compartimento 1). A variação na energia livre envolvida
duas fases sim. Por convenção, o potencial de membrana nessa transferência é dada pela seguinte equação:
sempre é dado em referência ao movimento de uma carga
positiva. Ele indica o potencial intracelular em relação ao (A1.18)
do meio extracelular, que é definido como zero.
O trabalho que deve ser realizado para mover 1 mol
G é positiva, e a transferência pode prosseguir apenas se
de um íon contra um potencial de membrana de E volts
acoplada a uma fonte de energia – nesse caso, a absorção de
é dado pela seguinte equação:
luz. Como resultado dessa transferência, pode-se dizer que
 G = zF E (A1.17) os cátions no compartimento 2 têm um potencial eletroquí-
mico maior do que os mesmos íons no compartimento 1.
em que z é a valência do íon e F é a constante de Faraday.
O potencial eletroquímico para um íon específico é
O valor da G para a transferência de cátions para um
designado íon.Os íons tendem a fluir de uma região de
compartimento positivo é positivo e, assim sendo, exige
maior potencial eletroquímico para uma de menor poten-
trabalho. Inversamente, o valor da G é negativo quando
cial e, assim procedendo, podem em princípio realizar tra-
cátions se movem para um compartimento negativo, de
balho. A quantidade máxima desse trabalho, desprezan-
modo que pode ser realizado trabalho. O potencial elétrico
do o atrito, é dada pela variação na energia livre dos íons
é negativo através da membrana plasmática da maioria das
que fluem do compartimento 2 para o compartimento 1
células; portanto, os cátions tendem a se difundir para dentro,
(ver Equação A1.6) e é numericamente igual à diferença
mas têm que ser “bombeados” para fora.
de potencial eletroquímico,  íon. Esse princípio é a base
A diferença de potencial eletroquímico, Δ , inclui de uma grande parte da transdução biológica de energia.
os potenciais de concentração e elétrico A diferença de potencial eletroquímico,  íon, é con-
venientemente expressa em quilojoules por mol ou qui-
Em geral, íons movendo-se através de uma membrana
localorias por mol. Entretanto, frequentemente é conve-
estão sujeitos a gradientes tanto de concentração como de
niente expressar a força motriz para o movimento iônico
potencial elétrico. Considere, por exemplo, a situação des-
em termos elétricos, com as dimensões de volts ou mili-
crita na Figura A1.3, que corresponde ao principal even-
volts. Para converter  íon em milivolts (mV), dividem-se
todos os termos da Equação A1.18 por F:
* Muitos textos utilizam o termo  para a diferença de potencial
de membrana. Entretanto, para evitar confusão com o uso de  (A1.19)
para indicar o potencial hídrico (ver Capítulo 3), o termo E é utili-
zado aqui e em todo o texto.
A1-10 Apêndice 1 • Energia e Enzimas

Um caso importante em questão é a força motriz de pró-


tons, considerada em detalhe no Capítulo 6. 1
2
As Equações A1.18 e A1.19 provaram ser de impor-
tância fundamental em bioenergética. Primeiro, elas me- + + +
+ +
dem a quantidade de energia que deve ser utilizada no + –
+ – + + +
transporte ativo de íons e metabólitos, uma função im- + + – + +
+
portante das membranas biológicas. Segundo, uma vez + +
+
que a energia livre das reações químicas é frequentemente + +
+ +
transferida para outras formas, pela geração intermediária
+ + +
de gradientes de potencial eletroquímico, esses gradien- +
tes desempenham um papel fundamental nas descrições
do acoplamento biológico de energia. Deve ser enfatizado
que os termos elétrico e concentração podem ser adicio-
Figura A1.4 Geração de um potencial elétrico por difusão iônica.
nados, como na Equação A1.18, ou subtraídos, e que a
O compartimento 2 tem uma concentração salina maior do que a do
aplicação das equações a casos específicos requer aten- compartimento 1 (os ânions não são mostrados). Se a membrana é
ção cuidadosa aos sinais dos gradientes. Deve-se também permeável aos cátions, mas não aos ânions, os cátions tenderão a se
observar que as variações na energia livre nas reações difundir do compartimento 2 para o compartimento 1, gerando um
químicas (ver Equação A1.10) são escalares, enquanto as potencial de membrana no qual o compartimento 2 é negativo.
reações de transporte têm direção, isto é, um aspecto sutil
mas crítico do papel biológico dos gradientes iônicos. um processo exergônico. Um potencial gerado por esse
A distribuição de íons no equilíbrio é um importan- processo é descrito como um potencial de difusão ou
te caso especial da equação eletroquímica geral (Equação como um potencial de Donnan. (Potencial de Donnan é
A1.18). A Figura A1.4 mostra uma vesícula ligada à mem- definido como o potencial de difusão que ocorre no caso-
brana (compartimento 2) que contém uma alta concentra- -limite, no qual o contraíon é completamente impermeá-
ção do sal K2SO4, envolvida por um meio (compartimen- vel ou fixado, como na Figura A1.4.) Muitos íons são dis-
to 1) contendo uma concentração mais baixa do mesmo tribuídos desigualmente através de membranas biológicas
sal; a membrana é impermeável a ânions, mas permite a e diferem bastante em suas taxas de difusão através da
passagem livre de cátions. Os íons potássio irão, portanto, barreira; portanto, os potenciais de difusão sempre contri-
tender a se difundir da vesícula para a solução, enquanto buem para o potencial de membrana observado. Todavia,
os ânions sulfato são retidos. A difusão dos cátions gera na maioria dos sistemas biológicos, o potencial elétrico
um potencial de membrana, com o interior da vesícula medido difere do valor que seria esperado com base na
negativo, que restringe a difusão posterior. No equilíbrio, difusão iônica passiva. Nesses casos, devem-se invocar
G e  é igual a zero (por definição). A Equação A1.18 bombas eletrogênicas de íons, sistemas de transporte que
pode ser, então, adaptada para dar a seguinte equação: conduzem o processo exergônico indicado na Figura A1.3
a expensas de uma fonte externa de energia. Os sistemas
(A1.20) de transporte desse tipo transferem a energia livre de uma
reação química para o potencial eletroquímico de um gra-
diente iônico e desempenham papel primordial no aco-
em que C2 e C1 são as concentrações de íons K+ nos dois
plamento biológico de energia.
compartimentos; z, a valência, é unitária; e E é o poten-
cial de membrana em equilíbrio com o gradiente de con-
centração de potássio. Enzimas: as catalisadoras da vida
Essa é uma forma da célebre equação de Nernst. Se- As proteínas constituem cerca de 30% do peso seco total
gundo ela, no equilíbrio, um íon permeante se distribuirá de células vegetais típicas. Se forem excluídos os materiais
através da membrana, de modo que força química motriz inertes, como a parede celular e o amido, que podem repre-
(para fora nesta situação) será contrabalançada pela força sentar até 90% do peso seco de algumas células, as proteí-
elétrica motriz (para dentro). Para um cátion univalente nas e os aminoácidos representam 60 a 70% do peso seco
a 25°C, cada aumento de 10 vezes no fator concentração de células vivas. Como foi visto no Capítulo 1, as estruturas
corresponde a um potencial de membrana de 59 mV; para do citoesqueleto como os microtúbulos e microfilamentos
um íon divalente, o valor é 29,5 mV. são compostos de proteína. As proteínas podem também
A discussão precedente sobre as consequências ener- ocorrer como formas de armazenamento, particularmente
géticas e elétricas da translocação de íons ilustra um pon- em sementes. Porém, a principal função das proteínas no
to que deve ser claramente compreendido, isto é, que um metabolismo é a de servir como enzimas, catalisadores bio-
potencial elétrico através de uma membrana pode surgir lógicos que aumentam enormemente as taxas das reações
por dois mecanismos distintos. O primeiro mecanismo, bioquímicas, tornando a vida possível. As enzimas partici-
ilustrado na Figura A1.4, é a difusão de partículas carre- pam nessas reações, mas elas não são alteradas fundamen-
gadas a favor de gradiente de concentração preexistente, talmente no processo (Mathews & Van Holde, 1996).
Apêndice 1 • Energia e Enzimas A1-11

As enzimas têm sido chamadas de “agentes da vida” Union of Biochemistry) com base na reação que ela cata-
– uma expressão bastante apropriada, pois elas controlam lisa. Além disso, muitas enzimas têm nomes populares ou
a quase totalidade dos processos vivos. Uma célula típica comuns. Assim, o nome popular rubisco refere-se à D-ri-
contém vários milhares de enzimas diferentes, que con- bulose-1,5-bifosfato carboxilase/oxigenase (EC 4.1.1.39*).
duzem uma ampla diversidade de ações. As característi- A versatilidade das enzimas reflete suas propriedades
cas mais importantes são sua especificidade, que permite como proteínas. A natureza das proteínas permite tanto o
a elas distinguirem-se entre moléculas muito similares, e reconhecimento por uma enzima de seu substrato espe-
sua eficiência catalítica, que é bem maior do que a de ca- cífico como o aparato catalítico necessário para conduzir
talisadores comuns. A estereoespecificidade das enzimas diversas e rápidas reações químicas (Stryer, 1995).
é notável, permitindo a elas distinguirem-se não somen-
te entre enantiômeros (estereoisômeros espelhados), por Proteínas são cadeias de aminoácidos unidos por
exemplo, mas entre átomos ou grupos de átomos aparen- ligações peptídicas
temente idênticos (Creighton, 1983).
As proteínas são compostas por longas cadeias de ami-
Essa capacidade de discriminar entre moléculas seme- noácidos (Figura A1.5) unidas por ligações amida, co-
lhantes resulta do fato de que a primeira etapa na catáli- nhecidas como ligações peptídicas (Figura A1.6). As
se enzimática é a formação de um composto firmemente 20 diferentes cadeias laterais de aminoácidos dotam as
ligado, um complexo não covalente entre a enzima e o(s) proteínas de uma grande diversidade de grupos que têm
substrato(s): o complexo enzima-substrato. As reações propriedades químicas e físicas diferentes, incluindo gru-
catalisadas por enzimas exibem propriedades cinéticas in- pos hidrofílicos (polares) e hidrofóbicos (apolares), grupos
comuns que estão também relacionadas à formação desses polares carregados e neutros, e grupos ácidos e básicos.
complexos bastante específicos. Outra característica distin- Essa diversidade, junto com a relativa flexibilidade da li-
tiva das enzimas é que elas estão sujeitas a vários tipos de gação peptídica, a elas permite a tremenda variação nas
controle regulatório, variando desde efeitos sutis sobre a propriedades das proteínas, desde a rigidez e inativida-
atividade catalítica por moléculas efetoras (inibidoras ou ati- de de proteínas estruturais à reatividade de hormônios,
vadoras) à regulação da síntese enzimática e à degradação, catalisadores e receptores. O aspecto tridimensional da
pelo controle da expressão gênica ou pelo turnover proteico. estrutura proteica proporciona a discriminação precisa no
As enzimas são singulares na enorme intensifica- reconhecimento de ligantes, as moléculas que interagem
ção de taxas que elas proporcionam, ordens de grandeza com as proteínas, como mostrado pela capacidade das
maior do que aquelas efetivadas por outros catalisado- enzimas para reconhecer seus substratos e de anticorpos
res. As ordens típicas de aumento de taxas de reações para reconhecer antígenos, por exemplo.
catalisadas por enzimas em relação àquelas de reações Todas as moléculas de uma proteína específica têm a
não catalisadas correspondentes são 108 a 1012. Muitas mesma sequência de resíduos de aminoácidos, determi-
enzimas convertem cerca de milhares de moléculas de nada pela sequência de nucleotídeos no gene que codifica
substrato em produto em 1 s. Algumas convertem cerca aquela proteína. Embora a proteína seja sintetizada como
de 1 milhão! uma cadeia linear pelo ribossomo, após a liberação ela se
Diferente da maioria dos outros catalisadores, as dobra espontaneamente em uma forma tridimensional
enzimas funcionam à temperatura e à pressão atmos- específica, o estado nativo. A cadeia de aminoácidos é
férica ambientes e geralmente em uma estreita faixa de chamada um polipeptídeo. O arranjo tridimensional de
pH próxima à neutralidade (há exceções; p. ex., proteases átomos na molécula é referido como conformação. As
vacuolares e ribonucleases são mais ativas em pH 4 a 5). alterações na conformação não envolvem a ruptura de li-
Algumas enzimas são capazes de funcionar em condições gações covalentes. A desnaturação envolve a perda de sua
extremamente graves, como, por exemplo, as pepsinas, a forma tridimensional singular e resulta na perda da ativi-
enzima degradadora de proteínas do estômago, que têm dade catalítica.
um pH ideal por volta de 2,0, e a hidrogenase da arque-
As forças responsáveis pela forma de uma molécula
obactéria hipertermofílica (“afinidade extrema ao calor”)
de proteína são não covalentes (Figura A1.7). Essas in-
Pyrococcus furiosus, que oxida H2 a uma temperatura ideal
terações não covalentes incluem pontes de hidrogênio;
maior do que 95°C (Bryant & Adams, 1989). A presença
interações eletrostáticas (também conhecidas como liga-
dessas enzimas termoestáveis notáveis permite à Pyrococ-
ções iônicas ou pontes salinas); forças de van der Waals
cus crescer otimamente a 100°C.
(forças dispersivas), que são dipolos transientes entre
As enzimas são geralmente denominadas segundo átomos espacialmente próximos; e “ligações” hidrofóbi-
seus substratos pela adição do sufixo “-ase” – por exemplo, cas – a tendência de grupos apolares de evitar o contato
-amilase, malato desidrogenase, -glicosidase, fosfoenol- com água e, portanto, para associarem-se. Além disso,
piruvato carboxilase, peroxidase. Milhares de enzimas já
foram descobertas e novas têm sido encontradas todos os * O número EC (Enzyme Commission) indica a classe (4 = liase) e
dias. Cada enzima foi denominada de um modo sistemá- a subclasse (4.1 = clivagem carbono–carbono; 4.1.1 = clivagem da

tico pela União Internacional de Bioquímica (International ligação C–COO ).
A1-12 Apêndice 1 • Energia e Enzimas

Grupos R hidrofóbicos (apolares)

COO - COO -
+
COO -
+
H3N C H H3N C H
COO - H3N
+
C H H C CH3
CH2
+
H3N C H CH CH2
CH
CH3 H3C CH3 H3C CH3 CH3

Alanina [A] Valina [V] Leucina [L] Isoleucina [I]


(Ala) (Val) (Leu) (Ile)

COO -
COO - COO -
+
+ + H3N C H
H3N C H H3N C H
CH2 COO -
COO - CH2 CH2 +
H CH2 H3N C H COO -
+
C
+
H2N CH2 S CH2 H3N C H
NH
H2C CH2 CH3 SH H

Prolina [P] Fenilalanina [F] Triptofano [W] Metionina [M] Cisteína [C] Glicina [G]
(Pro) (Phe) (Trp) (Met) (Cys) (Gly)

Grupos R hidrofílicos (polares)


Grupos R neutros
COO -
COO - +
H3N C H
COO -
+
H3N C H
-
+ COO - COO
CH2
H3N C H CH2 + +
H3N C H H3N C H
CH2 CH2
C H C OH H C OH
C
H2N O H2N O H CH3 OH

Asparagina [N] Glutamina [G] Serina [S] Treonina [T] Tirosina [Y]
(Asn) (Gln) (Ser) (Thr) (Tyr)

Grupos R básicos Grupos R ácidos


COO -
COO - +
+ H3N C H
H3N C H
CH2 COO -
CH2 + COO -
CH2 H3N C H
COO -
+
CH2 H3N C H
CH2 CH2 +
CH2 H3N C H CH2
NH C
CH2 :NH CH2 CH2
C HC
+ NH3 H2N NH2
+
:N CH COO - COO -

Lisina [K] Arginina [R] Histidina [H] Aspartato [D] Glutamato [E]
(Lys) (Arg) (His) (Asp) (Glu)

Figura A1.5 Estruturas, nomes, códigos de uma única letra (en-


tre colchetes), abreviaturas com três letras e classificação dos ami-
noácidos.
Apêndice 1 • Energia e Enzimas A1-13

(A) R1 O R2 O pontes dissulfeto covalentes são encontradas em muitas


+ proteínas. Embora cada um desses tipos de interações não
H3N C C N C C
covalentes seja fraco, há tantas interações não covalen-
O–
H H H tes nas proteínas que, na totalidade, elas contribuem para
uma grande quantidade de energia livre para a estabiliza-
Ligação peptídica ção da estrutura nativa.

A estrutura das proteínas é hierárquica


(B) ψ φ As proteínas são compostas de unidades organizacionais
H H O H O H O com complexidade crescente. A estrutura primária de
uma proteína refere-se à sequência de resíduos de ami-
...N C C N Cα C N C C ... noácidos. A estrutura secundária refere-se a unidades
estruturais locais regulares, geralmente mantidas unidas
R1 H R2 H R3
por pontes de hidrogênio. As mais comuns dessas unida-
des são -hélice e folhas  formando folhas -pregueadas
Unidade rígida
paralelas e antiparalelas e voltas (Figura A1.8). A estrutura
Figura A1.6 (A) A ligação peptídica (amida) une dois aminoáci- terciária – a estrutura tridimensional final do polipeptídeo
dos. (B) Sítios de rotação livre, dentro dos limites do impedimento – resulta do empacotamento da estrutura secundária e da
estérico, nas ligações N–C e C–C ( e ); não há rotação sobre a exclusão do solvente. A estrutura quaternária refere-se à
ligação peptídica devido ao seu caráter de ligação dupla.
associação de dois ou mais polipeptídeos separados, for-
mando complexos. Quando associados dessa maneira, os
polipeptídeos individuais são chamados de subunidades.
Uma molécula de proteína consistindo de uma gran-
de cadeia polipeptídica isolada é composta de várias uni-
dades dobradas independentemente, conhecidas como
domínios. Geralmente, os domínios têm uma massa
molecular de cerca de 104 dáltons. O sítio ativo de uma
enzima, isto é, a região à qual se liga o substrato e ocorre a
reação catalítica, é geralmente localizado na interface en-
tre dois domínios. Por exemplo, na enzima papaína (uma
protease vacuolar encontrada no mamão e representativa

PONTES DE HIDROGÊNIO ATRAÇÕES ELETROSTÁTICAS


Entre elementos de
união peptídica +
H C R
CH2 COO– H3N CH2 CH2 CH2 CH2

H C R N H

N H O C

O C H C R

H C R INTERAÇÕES DE VAN DER WAALS

Entre
– + – +
cadeias laterais NH2

CH2 OH O C CH2 + – + –

– + – +
Serina Asparagina

Figura A1.7 Exemplos de interações não covalentes em proteí- tivamente. As interações de van der Waals são interações dipo-
nas. As pontes de hidrogênio são interações eletrostáticas fracas lo transitórias de curto alcance. As interações hidrofóbicas (não
envolvendo um átomo de hidrogênio entre dois átomos eletrone- mostradas) envolvem a reestruturação do solvente água em volta
gativos. Em proteínas, as pontes de hidrogênio mais importantes de grupos não polares, minimizando a exposição da área super-
são aquelas entre ligações peptídicas. Interações eletrostáticas são ficial apolar ao solvente polar; essas interações são conduzidas
ligações iônicas entre grupos carregados positivamente e nega- pela entropia.
A1-14 Apêndice 1 • Energia e Enzimas

Figura A1.8 Hierarquia da estrutura proteica. (A) Estrutura pri- H


mária: ligação peptídica. (B e C) Estrutura secundária: -hélice (B) e
folha -pregueada antiparalela (C). (D) Estrutura terciária: -hélices,
N
folhas -pregueadas e espirais aleatórias. (E) Estrutura quaternária: R
quatro subunidades.
H C
H
N
H C
C R
C N C
O
H C H O
H
C C C
N
N C O
(A) Estrutura primária
C O
H H
C
N C
O C N
O
H C
H O H O H O H O H
C C
N C C N C C N C C N C C N
N C O C N C C N CC N CC N C C
C H H H H
O H O O O O
C H
N C
C N H H H H
O O O O O O
C C C C
H C C N C N C N C N C N C N C N C N
H C C C C C
C O O O O C
N H H H H
N C O

O (C) Estrutura secundária (folha β-pregueada)


(grupos R não mostrados)
(B) Estrutura secundária (α-hélice)
(grupos R não mostrados)

(D) Estrutura terciária (E) Estrutura quaternária

de uma grande classe de tiolproteases de plantas), o sí- As enzimas são proteínas catalisadoras
tio ativo encontra-se na junção de dois domínios (Figura altamente específicas
A1.9). Hélices, laços e folhas  contribuem para a forma Todas as enzimas são proteínas, embora recentemente al-
tridimensional singular dessa enzima. guns pequenos ácidos ribonucleicos e complexos proteína-
As determinações da conformação de proteínas têm -RNA foram encontrados exibindo comportamento similar
revelado que há famílias de proteínas que têm dobras tri- a enzimas no processamento do RNA. As proteínas têm
4 6
dimensionais em comum, bem como padrões em comum massas moleculares que variam de 10 a 10 daltons, po-
de estrutura supersecundária, como --. dendo ser uma cadeia polipeptídica dobrada única (subuni-
Apêndice 1 • Energia e Enzimas A1-15

Fenda do
sítio ativo Uma enzima específica catalisará apenas um tipo de
reação química para somente uma classe de molécula – em
alguns casos, para apenas um composto em particular. As
enzimas são também muito estereospecíficas e não geram
subprodutos. Por exemplo, a -glicosidase catalisa a hidró-
lise de -glicosídeos, compostos formados por uma ligação
glicosídica à D-glicose. O substrato deve ter a configuração
anomérica correta: ele deve ser -, não -. Além disso, deve
ter a estrutura de glicose; nenhum outro carboidrato, como
xilose ou manose, pode atuar como substrato para a -gli-
cosidase. Por fim, o substrato deve ter a estereoquímica cor-
reta; nesse caso a configuração D absoluta. A rubisco (D-ri-
bulose-1,5-bifosfato carboxilase/oxigenase) é a enzima mais
abundante do mundo e catalisa a adição do dióxido de car-
bono a D-ribulose 1,5-bifosfato, formando duas moléculas
de 3-fosfo-D-glicerato, a etapa inicial do ciclo C3 redutor do
carbono fotossintético. A rubisco tem especificidade muito
precisa pelo substrato carboidrato, mas ela também catalisa
Domínio 1 Domínio 2 uma reação oxigenase em que O2 substitui CO2, como foi
Figura A1.9 A estrutura da papaína, mostrando os dois domí- discutido mais profundamente no Capítulo 8.
nios e o sítio ativo inserido entre eles.
As enzimas reduzem a barreira de energia livre
entre os substratos e os produtos
dade ou protômeros) ou oligômeros de várias subunidades Os catalisadores aceleram a taxa de uma reação mediante
(oligômeros são geralmente dímeros ou tetrâmeros). Nor- redução da barreira de energia entre substratos (reagentes)
malmente, as enzimas têm somente um tipo de atividade e produtos, e não são eles próprios gastos na reação, mas
catalítica associada à mesma proteína; isoenzimas ou iso- são regenerados. Desse modo, um catalisador aumenta a
zimas são enzimas com função catalítica similar com dife- taxa de uma reação, mas não afeta a taxa de equilíbrio de
rentes estruturas e parâmetros catalíticos, codificadas por reagentes e produtos, pois as taxas da reação nas duas di-
genes diferentes. Por exemplo, várias isoenzimas diferentes reções são aumentadas na mesma proporção. É importante
foram encontradas para peroxidase, uma enzima de paredes perceber que enzimas não podem provocar a ocorrência de
celulares vegetais envolvida com a síntese de lignina. Uma uma reação não espontânea (energeticamente “ladeira aci-
isoenzima de peroxidase foi também localizada nos vacúo- ma”). Entretanto, muitas reações celulares energeticamen-
los. As isoenzimas podem exibir especificidade para tecidos te desfavoráveis prosseguem porque elas são acopladas a
e mostrar regulação do desenvolvimento. uma reação energeticamente mais favorável, geralmente
As enzimas frequentemente contêm um grupo pros- envolvendo a hidrólise de ATP (Figura A1.10).
tético não proteico ou cofator, necessário para a atividade
biológica. A associação de um cofator com uma enzima
depende da estrutura tridimensional da proteína. Uma A+B C ΔG = +4,0 kcal mol–1
vez ligado à enzima, o cofator contribui para a especifi- ATP + H2O ADP + Pi + H+ ΔG = –7,3 kcal mol–1
cidade da catálise. Exemplos típicos de cofatores são íons
metálicos (p. ex., zinco, ferro, molibdênio), grupos heme A + B + ATP + H2O C + ADP + Pi + H+ ΔG = –3,3 kcal mol–1
ou agrupamentos ferro-enxofre (especialmente em en-
zimas de oxidação-redução) e coenzimas (p. ex., nicoti-
namida adenina dinucleotídeo [NAD+/NADH], flavina A + ATP A – P + ADP
adenina dinucleotídeo [FAD/FADH2], flavina mononu- A – P + B + H2O C + H+ + Pi
cleotídeo [FMN] e piridoxal fosfato [PLP]). As coenzimas
são geralmente vitaminas ou derivadas de vitaminas e A + B + ATP + H2O C + ADP + Pi + H+
atuam como transportadoras. Por exemplo, o NAD+ e o
FAD transportam hidrogênios e elétrons em reações re- Figura A1.10 Acoplamento da hidrólise de ATP para impulsio-
dox, a biotina transporta CO2, e o tetra-hidrofolato car- nar uma reação energeticamente desfavorável. A reação A + B 
rega fragmentos de um carbono. A peroxidase tem tanto C é termodinamicamente desfavorável, enquanto a hidrólise de ATP
para formar ADP e fosfato inorgânico (Pi) é termodinamicamente
heme como grupos prostéticos Ca2+ e é glicosilada; isto é,
muito favorável (tem uma grande G negativa). Por meio de inter-
ela contém carboidratos ligados covalentemente a cadeias mediários apropriados, como A-P, as duas reações são acopladas,
laterais de asparagina, serina ou treonina. Essas proteínas produzindo uma reação global que é a soma das reações individuais
são chamadas glicoproteínas. e tem uma variação de energia livre favorável.
A1-16 Apêndice 1 • Energia e Enzimas

Figura A1.11 Curvas de energia livre para a mesma reação,


Estado de transição
tanto não catalisada como catalisada por enzima. Assim como um
catalisador, uma enzima reduz a energia livre de ativação do estado Não catalisada
de transição entre os substratos e produtos em comparação com
aquela da reação não catalisada. Ela faz isso pela formação de vários

Energia livre
complexos e intermediários, como complexos enzima-substrato e
enzima-produto. O estado de energia livre fundamental do com-
plexo enzima-substrato na reação catalisada por enzima pode ser Catalisada por enzima
maior do que aquela do substrato na reação não catalisada, e a
energia livre do estado de transição do substrato ligado à enzima
Energia livre
será significativamente menor do que na reação não catalisada cor-
de ativação
respondente.
Substrato

As enzimas atuam como catalisadores porque redu-


Produto
zem a energia livre de ativação de uma reação. Elas fazem
isso por meio de uma combinação de aumento do estado Progresso da reação
fundamental G do substrato e reduzindo a G do esta-
do de transição da reação, reduzindo, portanto, a barrei-
ra contra a reação (Figura A1.11). A presença da enzima
leva a uma nova rota de reação que é diferente daquela da teína. O resto da estrutura proteica fornece uma forma
reação não catalisada. de posicionamento do substrato e dos sítios catalíticos,
flexibilidade para variações conformacionais e controle
A catálise ocorre no sítio ativo regulador. A forma e a polaridade do sítio de ligação res-
O sítio ativo de uma molécula enzimática é geralmente pondem por grande parte da especificidade das enzimas,
uma pequena fenda ou bolsa na superfície (ou próximo e há complementariedade entre a forma e a polaridade
a ela) da enzima. É conveniente considerar o sítio ativo do substrato e as do sítio ativo. Em alguns casos, a li-
como composto por dois componentes: o sítio de ligação gação do substrato induz uma mudança conformacional
do substrato (que atrai e posiciona o substrato) e os gru- no sítio ativo da enzima. A mudança conformacional é
pos catalíticos (as cadeias laterais reativas de aminoáci- especialmente comum onde há dois substratos. A liga-
dos ou cofatores, que conduzem as reações de ruptura e ção do primeiro substrato aciona uma mudança confor-
de formação de ligações envolvidas). macional da enzima que resulta na formação do sítio de
A ligação do substrato ao sítio ativo envolve inicial- ligação para o segundo substrato. A hexoquinase é um
mente interações não covalentes entre o substrato e tan- bom exemplo de uma enzima que exibe esse tipo de al-
to as cadeias laterais como as ligações peptídicas da pro- teração conformacional (Figura A1.12).

(A) (B)
D-Glicose

Sítio ativo

Figura A1.12 Alteração conformacional na hexoquinase, in- sítio ativo. Essa mudança configura o sítio de ligação para o segun-
duzida pelo primeiro substrato da enzima, D-glicose. (A) Antes da do substrato, ATP. Dessa maneira, a enzima evita hidrólise inútil de
ligação à glicose. (B) Após a ligação à glicose. A ligação de glicose ATP mediante proteção dos substratos do solvente aquoso. A reação
à hexoquinase induz uma mudança conformacional em que os dois global é a fosforilação da glicose e a formação de ADP.
domínios principais ficam juntos, próximo à fenda que contém o
Apêndice 1 • Energia e Enzimas A1-17

Os grupos catalíticos são geralmente as cadeias laterais Vmáx


de aminoácidos e/ou cofatores que podem funcionar como
catalisadores. Exemplos comuns de grupos catalíticos áci-
dos são (–COOH das cadeias laterais do ácido aspártico ou

Velocidade inicial (v)


do ácido glutâmico, imidazol da cadeia lateral da histidina),

básicos (–NH2 da lisina, imidazol da histidina, –S da cis- Vmáx [S]

teína), nucleofílicos (imidazol da histidina, –S da cisteína, v=
1/2V
–OH da serina) e eletrofílicos (frequentemente íons metá- máx Km + [S]
2+
licos, como Zn ). Os grupos catalíticos ácidos funcionam
mediante doação de um próton, os básicos por receber um
próton. Os grupos catalíticos nucleofílicos formam uma li-
gação covalente transitória com o substrato.
O fator decisivo na catálise é a interação direta entre
a enzima e o substrato. Em muitos casos, há um interme-
diário que contém uma ligação covalente entre a enzima Km
e o substrato. Embora os detalhes do mecanismo catalíti- Concentração do substrato[S]
co difiram de um tipo de enzima para outro, um número
Figura A1.13 Gráfico da velocidade inicial, v, versus a concen-
limitado de características está envolvido em todas elas. tração do substrato, [S], para uma reação catalisada por enzima.
Essas propriedades incluem a catálise ácido-base, a catá- A curva é hiperbólica. A velocidade máxima, Vmáx, ocorre quando
lise eletrofílica ou nucleofílica e a alteração do estado fun- todas as moléculas de enzima estão completamente ocupadas pelo
damental por meio de forças eletrostáticas ou mecânicas substrato. O valor de Km, definido como a concentração de substra-
sobre o substrato. to em 1/2Vmáx, é um reflexo da afinidade da enzima pelo substrato.
Quanto menor o valor de Km, maior afinidade terá a ligação.
Uma equação cinética simples descreve uma
reação catalisada por enzima Normalmente, os valores de cinética enzimática são
Sistemas catalisados por enzimas frequentemente exibem medidos no estado estacionário, e essas condições ge-
uma forma especial de cinética, denominada cinética de ralmente prevalecem na célula. Para muitas reações ca-
Michaelis-Menten, que é caracterizada por uma relação talisadas por enzimas, a cinética nas condições do estado
hiperbólica entre a velocidade de reação, v, e a concentra- estacionário pode ser descrita por uma expressão simples
ção do substrato, [S] (Figura A1.13). Esse tipo de curva é conhecida como a equação de Michaelis-Menten:
conhecido como uma curva de saturação, pois, quando a
enzima se torna saturada com o substrato (i.e., cada molé-
(A1.21)
cula da enzima tem uma molécula do substrato associada
a ela), a taxa se torna independente da concentração do
substrato. A cinética de saturação indica que um processo em que v é a taxa ou velocidade observada (em unida-
de equilíbrio precede a etapa limitante da taxa: des como moles por litro por segundo), Vmáx é a velocida-
de máxima (em concentração infinita de substrato) e Km
(geralmente medido em unidades de molaridade) é uma
constante característica de determinado sistema enzima-
em que E representa a enzima, S o substrato, P o produto -substrato e está relacionada à constante de associação da
e ES o complexo enzima-substrato. Assim, quando a con- enzima com o substrato (ver Figura A1.13). Km representa
centração de substrato é aumentada, será alcançado um a concentração do substrato necessária para semissatu-
ponto em que todas as moléculas da enzima estarão na rar a enzima e, portanto, a concentração do substrato em
forma do complexo ES, e a enzima estará saturada com Vmáx/2. Em muitos sistemas celulares, a concentração habi-
o substrato. Uma vez que a taxa da reação depende da tual do substrato está na vizinhança do Km. Quanto menor
concentração de ES, a taxa não aumentará mais, pois não o valor do Km, maior a afinidade da enzima pelo substrato.
poderá haver concentração maior de ES. Os valores típicos para o Km estão na faixa de 10–6 a 10–3 M.
Quando uma enzima é misturada com um excesso Pode-se obter facilmente os parâmetros Vmáx e Km pelo
grande de substrato, haverá um período inicial muito cur- ajuste experimental de dados à equação de Michaelis-
to (geralmente milissegundos) durante o qual as concen- -Menten, tanto pelo ajuste da curva por computador como
trações do complexo enzima-substrato e dos intermediá- pela forma linearizada da equação. Um exemplo de uma
rios crescem até certos níveis; esse período é conhecido forma linearizada da equação é a representação duplo re-
como estado pré-estacionário. Uma vez estabelecidos, cíproco de Lineweaver–Burk mostrada na Figura A1.14A.
os níveis de intermediários permanecem relativamente Quando dividido pela concentração da enzima, o valor de
constantes até que o substrato seja esgotado; esse período Vmáx resulta no número de rotações, o número de molé-
é conhecido como estado estacionário. culas de substrato convertidas em produto por unidade de
A1-18 Apêndice 1 • Energia e Enzimas

Inibida Inibida

1/v 1/v 1/v

Km
Intercepção 1 Inclinação =
do eixo x = – Vmáx
Km Intercepção Não inibida Não inibida
1
do eixo y = –
Vmáx

1/[S] 1/[S] 1/[S]


(A) Reação catalisada por enzima não inibida (B) Inibição competitiva (C) Inibição não competitiva

Figura A1.14 Diagramas duplo recíprocos de Lineweaver-Burk. cadeia lateral de histidina do sítio ativo. Esses compostos
Um gráfico de 1/v versus 1/[S] produz uma linha reta. (A) A reação são muito úteis nos estudos da mecânica de enzimas, mas
catalisada por enzima não inibida mostrando o cálculo de Km a partir eles têm uso prático limitado como herbicidas, devido a
da interceptação do eixo x e de Vmáx a partir da interceptação do eixo
sua reatividade química que pode ser prejudicial à planta.
y. (B) O efeito de um inibidor competitivo sobre os parâmetros Km e
Vmáx. O Km aparente é aumentado, mas a Vmáx não é alterada. (C) Um Os inibidores reversíveis formam ligações fracas, não
inibidor não competitivo reduz Vmáx, mas não tem efeito sobre o Km. covalentes com a enzima, e seus efeitos podem ser competi-
tivos, não competitivos ou mistos. Por exemplo, o herbicida
glifosato (Roundup®), de largo espectro amplamente uti-
tempo por molécula de enzima. Os valores do número de lizado, funciona inibindo competitivamente uma enzima-
rotações típicos variam de 102 a 103 s–1. -chave na biossíntese de aminoácidos aromáticos, a 5-enol-
piruvilchiquimato-3-fosfato (EPSP) sintase. A resistência
As enzimas estão sujeitas a vários tipos ao glifosato foi recentemente alcançada por engenharia
de inibição genética de plantas que são capazes de superexpressarem a
Qualquer agente que diminua a velocidade de uma rea- EPSP sintase (Donahue et al., 1995).
ção catalisada por enzima é chamado um inibidor. Os ini- INIBIÇÃO COMPETITIVA Inibição competitiva é a forma
bidores podem exercer seus efeitos de muitas maneiras mais simples e mais comum de inibição reversível. Ela ge-
diferentes. Em geral, se a inibição é irreversível, o com- ralmente se origina da ligação do inibidor ao sítio ativo com
posto é chamado inativador. Outros agentes podem au- uma afinidade similar ou mais forte do que a do substrato.
mentar a eficiência de uma enzima; eles são chamados Desse modo, a concentração efetiva da enzima é diminuída
ativadores. Inibidores e ativadores são muito importan- pela presença do inibidor, e a reação catalítica será mais len-
tes na regulação celular de enzimas. Muitos inseticidas e ta do que se não houvesse inibidor. A inibição competitiva
herbicidas agriculturalmente importantes são inibidores é em geral baseada no fato de que a estrutura do inibidor se
enzimáticos. O estudo da inibição enzimática pode forne- assemelha àquela do substrato; por isso, a forte afinidade
cer informação útil sobre os mecanismos cinéticos, a na- do inibidor pelo sítio ativo. A inibição competitiva também
tureza dos intermediários e complexos enzima-substrato, pode ocorrer em enzimas alostéricas, em que o inibidor se
o mecanismo químico de ação catalítico, bem como a re- liga a um sítio distante da enzima, causando uma alteração
gulação e o controle de enzimas metabólicas. Além disso, conformacional que altera o sítio ativo e impede a ligação
o estudo dos inibidores de potenciais enzimas-alvo é es- normal do substrato. Esse sítio de ligação é chamado sítio
sencial para a concepção racional de herbicidas. alostérico. Nesse caso, a competição entre o substrato e o
Os inibidores podem ser classificados como reversí- inibidor é indireta.
veis ou irreversíveis. Os inibidores irreversíveis formam A inibição competitiva resulta em um aumento aparen-
ligações covalentes com uma enzima ou a desnaturam. te no Km e não tem efeito sobre a Vmáx (Figura A1.14B). Por
Por exemplo, o iodoacetato (ICH2COOH) inibe irre- medição do Km aparente como uma função da concentração
versivelmente tiolproteases, como a papaína, mediante do inibidor, pode-se calcular o Ki, a constante de inibição,
alquilação do grupo –SH do sítio ativo. Uma classe de que reflete a afinidade da enzima pelo inibidor.
inibidores irreversíveis é a dos chamados marcadores de
afinidade ou agentes modificadores direcionados ao sítio INIBIÇÃO NÃO COMPETITIVA Na inibição não competi-
ativo, porque sua estrutura direciona-os ao sítio ativo. Um tiva, o inibidor não compete com o substrato pela ligação
exemplo é a clorometil tosila-lisina cetona (tosyl-lysine ao sítio ativo. Em seu lugar, ele pode se ligar a outro sítio
chloromethyl ketone, TLCK), que inativa irreversivelmente da proteína e obstruir o acesso do substrato ao sítio ativo,
a papaína. A parte tosila-lisina do inibidor se asseme- alterando, portanto, as propriedades catalíticas da enzi-
lha à estrutura do substrato e assim se liga ao sítio ativo. ma, ou ele pode se ligar ao complexo enzima-substrato
A parte clorometil cetona do inibidor ligado reage com a e, assim, alterar a catálise. A inibição não competitiva é
Apêndice 1 • Energia e Enzimas A1-19

(A) Figura A1.15 Curvas de pH e temperatura para reações enzi-


máticas típicas. (A) Os traçados de muitas reações catalisadas por
enzima mostram contornos campanulados da velocidade versus
pH. O ponto de inflexão em cada curva corresponde ao pKa de um
grupo ionizante (i.e., o pH no qual o grupo ionizante está 50%
Velocidade inicial

dissociado) no estado ativo. (B) A temperatura causa um aumento


exponencial na velocidade de reação até que o máximo seja alcan-
çado. Além do ideal, a desnaturação térmica diminui drasticamen-
te a velocidade.

um ácido e outra para o grupo atuando como base (Figura


A1.15A). Embora os efeitos do pH sobre a catálise enzi-
mática reflitam geralmente a ionização do grupo catalítico,
eles podem também refletir uma mudança conformacional
3 4 5 6 7 8 9 da proteína, dependente do pH, que leva à perda de ativi-
pH dade como consequência da alteração do sítio ativo.
(B) A dependência da temperatura da maioria das rea-
ções químicas também se aplica às reações catalisadas
por enzimas. Portanto, a maioria das reações catalisadas
por enzimas mostra um aumento exponencial na taxa
com o aumento da temperatura. Entretanto, uma vez
Velocidade inicial

que as enzimas são proteínas, outro fator fundamental


entra em cena – a saber, a desnaturação. Após certa tem-
peratura ser alcançada, as enzimas exibem uma redução
muito rápida na atividade como um resultado do início
da desnaturação (Figura A1.15B). A temperatura na qual
a desnaturação se inicia e, portanto, na qual a atividade
catalítica é perdida, varia com a enzima específica e com
as condições ambientais, como o pH. Frequentemente, a
desnaturação inicia por volta de 40 a 50°C e é completa
0 10 20 30 40 50 60 acima de cerca de 10°C.
Temperatura (ºC)
Sistemas cooperativos aumentam a sensibilidade
ao substrato e são geralmente alostéricos
observada frequentemente na regulação de enzimas me- As células controlam rigorosamente as concentrações da
tabólicas. Pode-se diagnosticar esse tipo de inibição pois maioria dos metabólitos. Para manter esse controle rigo-
o Km não é afetado, enquanto a Vmáx decresce na presença roso, as enzimas que controlam a interconversão metabó-
de quantidades crescentes do inibidor (Figura A1.14C). lica devem ser muito sensíveis. A partir de um gráfico da
velocidade versus concentração do substrato (ver Figura
INIBIÇÃO MISTA A inibição mista é caracterizada por efei-
A1.13), pode-se ver que a velocidade de uma reação cata-
tos tanto sobre a Vmáx (que diminui) como sobre o Km (que
lisada por enzima aumenta com a concentração crescente
aumenta). A inibição mista é muito comum e resulta da for-
do substrato até Vmáx. Entretanto, podemos calcular a par-
mação de um complexo consistindo da enzima, do substra-
tir da equação de Michaelis-Menten (Equação A1.21) que
to e do inibidor que não se decompõe nos produtos.
o aumento da velocidade de uma reação catalisada por
O pH e a temperatura afetam a taxa das reações enzima de 0,1 Vmáx para 0,9 Vmáx requer um incremento
catalisadas por enzimas enorme (81 vezes) na concentração de substrato:
A catálise enzimática é muito sensível ao pH. Essa sensi-
bilidade é facilmente compreendida quando se considera
que os grupos catalíticos fundamentais são em geral íons
ionizáveis (imidazol, carboxila, amina) e que eles são ca-
taliticamente ativos apenas em seu estado ionizado. Por
exemplo, o imidazol atuando como uma base será fun-
cional apenas em valores de pH acima de 7. Gráficos das
taxas de reações catalisadas por enzimas versus o pH são
geralmente campanulados, correspondendo a duas curvas
sigmoides, uma para um grupo ionizável atuando como
A1-20 Apêndice 1 • Energia e Enzimas

Ativador metabólicas, que frequentemente servem como retroini-


adicionado bidores, geralmente não possuem semelhança estrutural
com o substrato da primeira etapa.

A cinética de alguns processos de transporte de


V membrana pode ser descrita pela equação de
Michaelis-Menten
Inibidor adicionado
As membranas contêm proteínas que aceleram o movi-
mento de íons específicos ou moléculas orgânicas através
da bicamada lipídica. Algumas proteínas de transporte
de membrana são enzimas, como ATPases, que usam a
[S] energia da hidrólise do ATP para bombear íons através da
membrana. Quando essas reações ocorrem na direção con-
Figura A1.16 Sistemas alostéricos exibindo curvas sigmoidais
da velocidade versus a concentração do substrato. A adição de um trária, as ATPases mitocondriais e cloroplastídicas podem
ativador desvia a curva para a esquerda; a adição de um inibidor a sintetizar ATP. Outros tipos de proteínas de membrana
desvia para a direita. funcionam como transportadores, ligando seu substrato
em um lado da membrana e liberando-o no outro lado.
A cinética de transporte mediado por carregadores
Esse cálculo mostra que a velocidade da reação é in- pode ser descrita pela equação de Michaelis-Menten da
sensível a pequenas variações na concentração do subs- mesma maneira que as reações catalisadas por enzimas
trato. O mesmo fator aplica-se no caso de inibidores e (ver Capítulo 6). Em vez de uma reação bioquímica com
inibição. Em sistemas cooperativos, por outro lado, uma um substrato e produto, entretanto, o carregador liga-se
pequena variação em um parâmetro, como a concentra- ao soluto e o transfere de um lado de uma membrana
ção do inibidor, resulta em uma grande variação na velo- para o outro. Admitindo X como o soluto, podemos escre-
cidade. Uma consequência de um sistema cooperativo é ver a seguinte equação:
que a curva de v versus [S] não é mais hiperbólica, mas
se torna uma sigmoide (Figura A1.16). A vantagem dos Xexterior + carregador  [X-carregador] 
sistemas cooperativos é que uma pequena mudança na Xinterior + carregador
concentração do efetor crítico (substrato, inibidor ou ati-
Uma vez que o carregador pode se ligar ao soluto mais
vador) levará a uma grande variação na velocidade. Em
rapidamente do que ele pode transportar o soluto para o
outras palavras, o sistema se comporta igual a um inter-
outro lado da membrana, o transporte de solutos exibe a
ruptor.
cinética de saturação. Isto é, uma concentração é atingi-
A cooperatividade é normalmente observada em
da adicionando mais soluto não resulta em uma taxa de
enzimas alostéricas que contêm múltiplos sítios ativos
transporte mais rápida (Figura A1.17). Vmáx é taxa máxima
localizados sobre múltiplas subunidades. Essas enzimas
de transporte de X através da membrana; Km é equiva-
oligoméricas geralmente ocorrem em dois estados confor-
lente à constante de ligação do soluto ao carregador. As-
macionais principais, um ativo e um inativo (ou relativa-
sim como reações catalisadas por enzimas, o transporte
mente inativo). A união de ligantes (substratos, ativadores
mediado por carregador requer um alto grau de especi-
ou inibidores) à enzima perturba a posição de equilíbrio
ficidade estrutural da proteína. O transporte efetivo do
entre as duas conformações. Por exemplo, um inibidor fa-
soluto através da membrana envolve, aparentemente,
vorecerá a forma inativa; um ativador favorecerá a forma
alterações conformacionais, também similares àquelas de
ativa. O aspecto cooperativo funciona da seguinte manei- reações catalisadas por enzimas.
ra: um evento de cooperação positiva é aquele em que a
união do primeiro ligante torna a ligação do próximo mais A atividade enzimática é frequentemente
fácil. De modo semelhante, a cooperatividade negativa regulada
significa que o segundo ligante será ligado menos facil- As células podem controlar o fluxo de metabólitos me-
mente do que o primeiro. diante regulação da concentração de enzimas e de sua
A cooperatividade na ligação ao substrato (homo- atividade catalítica. Pelo uso de ativadores ou inibidores
alosteria) ocorre quando a ligação do substrato ao sítio alostéricos, as células podem modular a atividade enzi-
catalítico de uma subunidade aumenta a afinidade pelo mática e obter a expressão cuidadosamente controlada da
substrato de um sítio catalítico idêntico localizado em catálise.
uma subunidade diferente. Os ligantes efetores (inibido-
res ou ativadores), em contraste, ligam-se a outros sítios CONTROLE DA CONCENTRAÇÃO ENZIMÁTICA A quanti-
diferentes do sítio catalítico (heteroalosteria). Essa relação dade de enzima em uma célula é determinada pelas taxas
se ajusta bem ao fato de que os produtos finais das rotas relativas de sua síntese e sua degradação. A taxa de sín-
Apêndice 1 • Energia e Enzimas A1-21

Vmáx
Velocidade de transporte

E F G
A B C D
Vmáx H I J
2

Figura A1.18 A inibição por retroalimentação em uma rota me-


tabólica hipotética. As letras (A-J) representam metabólitos e cada
seta representa uma reação catalisada por enzima. A seta em negri-
to para a primeira reação indica que duas enzimas diferentes com
diferentes susceptibilidades ao inibidor estão envolvidas. As linhas
Km tracejadas indicam metabólitos que inibem enzimas específicas.
Concentração externa do soluto A primeira etapa na rota metabólica e os pontos de ramificação
são locais particularmente importantes para o controle por retroa-
Figura A1.17 A cinética do transporte, de um soluto através de limentação.
uma membrana, mediado por carregador, é análoga àquela de rea-
ções catalisadas por enzimas. Assim, curvas da velocidade de trans-
porte versus a concentração do soluto são hiperbólicas, tornando-
-se assintóticas para a velocidade máxima em alta concentração de ca. Esse tipo de modificação covalente evita a degradação
soluto. proteolítica prematura de constituintes celulares pela en-
zima recém-sintetizada.
tese é regulada ao nível genético por uma diversidade de
INIBIÇÃO POR RETROALIMENTAÇÃO Deve-se considerar
mecanismos, que são discutidos detalhadamente na últi-
uma rota metabólica típica com dois ou mais produtos fi-
ma seção deste apêndice.
nais como aquela mostrada na Figura A1.18. O controle
COMPARTIMENTALIZAÇÃO Enzimas diferentes ou iso- do sistema requer que, se os produtos finais aumentem
enzimas com propriedades catalíticas diferentes (p. ex., demasiadamente, sua taxa de formação seja diminuída.
afinidade pelo substrato) podem estar localizadas em De modo semelhante, se o reagente A aumentar muito, a
diferentes regiões da célula, como a mitocôndria e o taxa de conversão de A nos produtos deve ser aumentada.
citosol. De modo semelhante, enzimas associadas a ta- O processo é geralmente regulado pelo controle do fluxo
refas especiais são frequentemente compartimentaliza- no primeiro passo da rota e em cada ponto de ramifica-
das; por exemplo, as enzimas envolvidas na fotossíntese ção. Os produtos finais, G e J, que podem não ter seme-
são encontradas nos cloroplastos. Os vacúolos contêm lhança com o substrato A, inibem a enzima em A Ø B e no
muitas enzimas hidrolíticas, como proteases, ribonucle- ponto de ramificação.
ases, glicosidases e fosfatases, bem como peroxidases. As Por haver duas enzimas em A Ø B, cada uma inibi-
paredes celulares contêm glicosidases e peroxidases. As da por um dos metabólitos finais, mas não inibido pelo
mitocôndrias são a localização principal das enzimas en- outro, é possível exercer um controle mais fino do que
volvidas na fosforilação oxidativa e no metabolismo de com apenas uma enzima. A primeira etapa em uma rota
energia, incluindo as enzimas do ciclo do ácido tricarbo- metabólica é geralmente chamada etapa comprometida
xílico (tricarboxylic acid, TCA). (committed step). Nessa etapa, as enzimas estão sujeitas ao
principal controle.
MODIFICAÇÃO COVALENTE O controle por modificação A frutose-2,6-bifosfato desempenha um papel cen-
covalente de enzimas é comum e geralmente envolve sua tral na regulação do metabolismo de carbono nas plantas.
fosforilação ou adenililação*, de modo que a forma fos- Ela funciona como um ativador na glicólise (a degrada-
forilada, por exemplo, é ativa, e a forma não fosforilada é ção de açúcares para produzir energia) e um inibidor na
inativa. Esses mecanismos de controle são normalmente gliconeogênese (a síntese de açúcares). A frutose-2,6-
dependentes de energia e quase sempre envolvem ATP. -bifosfato é sintetizada a partir da frutose-6-fosfato, em
As proteases são normalmente sintetizadas como uma reação que requer ATP e é catalisada pela enzima
precursores inativos, conhecidos como zimogênios ou frutose-6-fosfato 2-quinase. Ela é degradada na reação
proenzimas. Por exemplo, a papaína é sintetizada como inversa catalisada pela frutose-2,6-bifosfatase, que libera
um precursor inativo chamado propapaína e torna-se ati- fosfato inorgânico (Pi). Essas duas enzimas estão sujeitas
vada após a clivagem (hidrólise) de uma ligação peptídi- ao controle metabólico pela frutose-2,6-bifosfato, bem
como por ATP, Pi, frutose-6-fosfato, di-hidroxiacetona
* Embora alguns textos se refiram à conjugação de um composto fosfato e 3-fosfoglicerato. O papel da frutose-2,6-bifos-
com o ácido adenílico (AMP) como “adenilação”, o termo quimica- fato no metabolismo vegetal é discutido em detalhes nos
mente correto é “adenililação”. Capítulos 8 e 12.
A1-22 Apêndice 1 • Energia e Enzimas

Referências
Atkinson, D. E. (1977) Cellular Energy Metabolism and Its Edsall, J. T., and Gutfreund, H. (1983) Biothermodynamics: The
Regulation. Academic Press, New York. Study of Biochemical Processes at Equilibrium. Wiley, New
Bryant, F. O., and Adams, M.W.W. (1989) Characterization of York.
hydrogenase from the hyperthermophilic Klotz, I. M. (1967) Energy Changes in Biochemical Reactions.
archaebacterium, Pyrococcus furiosus. J. Biol. Chem. 264: Academic Press, New York.
5070–5079. Mathews, C. K., and Van Holde, K. E. (1996) Biochemistry, 2nd
Clausius, R. (1879) The Mechanical Theory of Heat. Tr. by Walter ed. Benjamin/Cummings, Menlo Park, CA.
R. Browne. Macmillan, London. Morowitz, H. J. (1978) Foundations of Bioenergetics. Academic
Creighton, T. E. (1983) Proteins: Structures and Molecular Press, New York.
Principles. W. H. Freeman, New York. Nicholls, D. G., and Ferguson, S. J. (1992) Bioenergetics 2.
Donahue, R. A., Davis, T. D., Michler, C. H., Riemenschneider, Academic Press, San Diego.
D. E., Carter, D. R., Marquardt, P. E., Sankhla, N., Sahkhla, Stryer, L. (1995) Biochemistry, 4th ed. W. H. Freeman, New
D., Haissig, B. E., and Isebrands, J. G. (1995) Growth, York.
photosynthesis, and herbicide tolerance of genetically
modified hybrid poplar. Can. J. For. Res. 24: 2377–2383.

Você também pode gostar