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U M SPIN off é uma obra derivada de uma narrativa já existente. Esse aqui foi
escrito pensando nas leitoras do livro Lady Malícia, que queriam saber o que
havia acontecido entre Charlotte e Theodor durante seus encontros furtivos
no clube Lust.
Esse, no entanto, NÃO É o livro deles.
O livro deles foi lançado em junho de 2020, e começa onde esse spin off
termina.
Portanto, se chegou aqui antes de ler Lady Malícia, aqui está o link para
o livro. É preferível ler primeiro a história deles ou não entenderá por que os
dois não podem ficar juntos — mas ficam, e querem ficar mais.
No mais, as Doze Noites de Lady Malícia são isso: doze noites de
lições sobre o amor e o sexo em um clube de prazeres proibidos. (Se você
não gosta de ler cenas de sexo, esse conto não é para você). Preparem-se
para conhecer Charlotte e Theodor de forma íntima, e saber tudo que
eles aprenderam juntos antes de se reencontrarem anos depois…
Karina
CON TEN TS
Q UANDO ENTREI no quarto escuro sentia bem mais medo do que desejo, e
estaria mentindo se afirmasse o contrário. O homem que eu seguia era
arrebatadoramente bonito, de um jeito que homens não costumavam ser. No
entanto, além de bonito, era também forte demais. Sedutoramente gentil em
gestos e fala, admitia. Infelizmente, se tentasse me forçar a algo, não
conseguiria me desvencilhar dele.
Que ele não tivesse qualquer pressa era um ponto positivo, eu ia
pensando enquanto subia as escadas. Um desses elementos que, embora não
garantisse a uma dama qualquer tipo de segurança, indicava que ele
controlava seus instintos. Isso o afastava da classe dos predadores, certo?
Lembrei de algo que Mademoiselle Marie havia me contado logo que
começamos a conversar sobre esses assuntos proibidos. Ela falou que, ao
chegar de Paris, foi trazida até ali por uma amiga francesa. Como eu, minha
tutora queria ver se algo tão exótico poderia existir. Mulheres libertas do
pesado fardo da sociedade, fazendo sexo com estranhos? Ela mal acreditou
que tal coisa existia, mesmo depois de ter visto com os próprios olhos.
Lembro que perguntei, entre a excitação e a vergonha, se ela tinha
experimentado também. Mademoiselle disse que não, mas que era fascinada
pela liberdade de poder estar ali, e poder experimentar coisas novas se
quisesse — mas não necessariamente fazer o que mais tarde poderia trazer
arrependimentos. Como eu, ela havia decidido não se casar — não achava
que conseguiria gostar da mesma pessoa por mais que alguns anos, nem
imaginava uma vida servil ao lado de um homem que já não amava mais.
Lembro que sua frase me fez exalar tão profundamente que cheguei a me
sentir leve: saber que havia mais mulheres no mundo que pensavam como eu
foi um alívio. Não estava sozinha em achar o casamento um mau negócio.
Mas ali estava eu, vivendo algo que nem mesmo minha tutora atrevida
havia tentado. Envolvendo-me com alguém do clube. Prestes a beijar um
desconhecido e deixar que ele me tocasse.
O couro cabeludo formigava quando ele acendeu uma das lamparinas e o
quarto ganhou cor. O pescoço ganhava uma finíssima película de suor,
consequência da tensão. Eu nunca havia sido tocada por um homem. Havia
coragem em minha decisão, mas muita imprudência. Ele poderia ser violento.
Se fosse, a quem recorreria? Oh, Deus. Eu poderia estar entrando no quarto
com um homem vil, e caso as coisas dessem errado, carregaria memórias
horríveis sobre o amor que poderiam afetar minha escrita.
Mas o caminho certo — cortejo, noivado, matrimônio — era para as
moças certas, e eu não me incluía na categoria. Tive oportunidades de me
relacionar com alguns cavalheiros, mas pouca vontade. Havia nascido torta.
Ele esperou que eu entrasse no quarto e parou à frente, relaxado e seguro,
como se já tivesse feito aquilo algumas vezes. Sua segurança era completa, e
a pontada de interesse se transformou em curiosidade. Quantas mulheres um
homem podia ter durante a vida e retomar o caminho do bem? Todas?
Apenas algumas?
O nosso número eu conhecia: um. E esse único precisaria ser o homem a
colocar a aliança em seu dedo.
O quarto era decorado em tons de vermelho, salpicado de detalhes
dourados aqui e ali. Era luxuoso de um jeito exuberante e ostensivo, como se
aguardasse a visita da nobreza. Talvez aguardasse. Os cheiros não eram bons
nem ruins, apenas exóticos: perfumes há muito desbotados, charutos
fumados, tecidos lavados e perfumados com água de colônia. Havia uma
lareira acesa e uma poltrona. Algumas cadeiras, um divã de veludo escuro
mais adiante.
Ele esperou que meus olhos terminassem o passeio pelo quarto e
voltassem até os dele. Olhando-o tão gentil e paciente adiante, entendi
finalmente que a porta estava fechada e que meu destino naquele lugar já
havia sido decidido. Vontade e oportunidade haviam colidido, e algo da
esfera do inimaginável estava para acontecer.
— Senhor... Antes de mais nada, obrigada por compreender que... Que
não estou preparada para ir até o final — disse apertando os dedos nos outros.
E por final eu queria dizer a cama. O lugar onde as coisas aconteciam.
— Não precisamos da cama — ele percebeu o que eu quis dizer. — Mas
entendo a senhora. E adoraria saber o que lhe trouxe aqui.
Que voz. Que sensação estranha senti-la de maneira física.
— Curiosidade — respondi. Eu poderia dizer que foi desejo, mas não foi.
Foi outra coisa. — Nunca fui beijada ou tocada. Preciso saber como é.
— Por que não com um marido? — ele indagou.
— Ele pode nunca aparecer.
Ele se afastou só o suficiente para tirar a jaqueta escura e jogá-la sobre a
mesinha em frente à lareira acesa, como um marido que chega em casa depois
de um dia no trabalho. Ele não pareceu ter acreditado em mim. Seus ombros
eram largos e causavam um calor estranho, que amolecia meus músculos.
Cintura estreita, traseiro arredondado, preso entre o tecido justo. Ele se virou,
desabotoando os pulsos da camisa.
— O que me permitirá fazer?
A pergunta me arrancou do estado ébrio e me trouxe para a realidade. O
que eu permitiria? Queria conhecer os segredos, mas desconfiava que fossem
muitos. Queria saber como eram os toques mais sensíveis. Os beijos que não
se limitavam à boca. Lera sobre alguns, mas era difícil imaginar a sensação
de senti-los.
— Q-quase tudo — gaguejei.
Seus olhos escureceram à medida em que o “quase tudo” ganhou forma
em sua mente.
Consegui dizer, antes que fosse tocada, que sonhava em sair dali
encantada. Com lembranças que pudesse carregar comigo quando pudesse
contar apenas com elas. E falei que precisava permanecer virgem.
— Para o casamento que nunca virá? — Ele provocou.
Dei de ombros. Uma mulher precavida valia por duas.
Trocamos algumas frases, os olhos dançando uma dança própria,
ocupados em aquecer o corpo. Mais uma lição aprendida: os olhos aquecem
tanto corpo quanto alma. São carícias nos músculos tensos e conversam entre
si numa linguagem única.
O mascarado afastou meu cabelo dos ombros, tocando de leve minha
pele. Ele me estudava com os olhos. Então desceu com as costas dos dedos
por ela, afastando a seda.
O tecido escorregou por um ombro, revelando mais do que eu jamais
revelara na vida. O coração disparou e quis erguer a mão e pará-lo. Se eu o
interrompesse, a noite acabaria? Talvez. Ele parecia mais velho e mais
experiente, e não havia motivos para que continuasse com uma jovem de
ideias avançadas e postura casta. Em algum momento meu corpo precisaria
alcançar minhas ideias, e aquele precisava ser o momento.
A seda despencou pelos braços secando minha boca, e então fiquei nua.
Seios eriçados à mostra, mamilos franzidos, mãos se apertando em punhos ao
lado da cintura querendo tapar o que estava exposto. Era uma imposição do
clube descartar os espartilhos, roupas íntimas, chemises ou qualquer outra
peça que não fosse esse tipo de roupão fino que nos envelopava de forma
íntima.
Ele deu um passo para trás e eu pensei: ele mudou de ideia. Mas ele
queria me olhar de certa distância, sem roupa. Nua.
— Uma criatura linda — ele falou, disparando uma onda de timidez mais
forte que eu. Tampei o triângulo castanho entre as pernas e a parte de cima,
olhando para os lados, envergonhada. Não queria estar nua. Nem sentir o
coração quase saindo pela boca, ou aquela sensação nauseante de
constrangimento. Isso não era bom. Não queria me sentir daquela maneira.
Por que não ficou então com os pretendentes que sentavam na sala de
estar de sua casa e conversavam horas sobre o tempo, suas próprias vidas ou
assuntos que jamais lhe interessavam? Uma parte minha quis saber. Você
está finalmente em um lugar onde coisas acontecem. Deixe-as acontecerem!
— Não, por favor — Ele pediu removendo minha mão com delicadeza,
me olhando nos olhos.— Lembre-se de que não sei quem você é. Talvez não
nos vejamos outra vez. Só por hoje, por essa noite, permita-se ser inteira e
completamente admirada. Venerada e beijada. Acha que consegue?
A frase me pegou desprevenida. Ele só saberia quem eu sou se eu
contasse. Ofegante, firmei minhas prioridades antes de fazer que sim. Era
apenas um corpo, e principalmente: era meu. Por mais que o mundo ao redor
o tratasse como sua propriedade, ele era meu. Eu o habitava e queria aquela
experiência.
Lentamente minhas mãos foram se afastando e o mascarado as cobriu
com as suas.
Ele voltou a se aproximar; a boca do pescoço, as mãos da minha cintura.
Um repuxar elétrico, disparado no momento em que os lábios sedosos
tocaram a pele, fez meu corpo se contrair. O espasmo me fez apertar seu rosto
contra o meu ombro, e os beijos ali, naquela parte tão trivial, mostraram que a
lateral da garganta era um berçário de estrelas. Ele entendeu logo pelo
murmúrio rouco que meu pescoço deveria ser revisitado. Mal notei que o
apertava, as mãos cravadas em sua camisa como se precisassem dele para não
cair.
Os olhos parcialmente escondidos procuraram os meus. Eu ainda não
havia decidido o que achava daquilo: eu era só sentidos. Sensações em estado
bruto, ainda não transformados em sentimentos.
Mas comecei a mudar de ideia quando ele se inclinou e me beijou.
Na boca.
Com língua.
Segurando a lateral do meu rosto, por cima do laço da máscara, ele forçou
a língua para dentro. Abria? Deixava ele entrar? Aquilo era perversamente
íntimo. Os lábios se entreabriram e a ponta morna da língua perfumada
procurou a minha. Retribuí, sem saber como. As pontas dos polegares
acariciaram meu rosto, o cheiro da bebida entrando de maneira narcótica em
mim.
Foi uma surpresa notar que não apenas eu, mas também ele ofegava. Seu
desejo era cru e visível em seus gestos. A máscara deixava que visse pouco
dos olhos, mas os cílios longos e claros estavam abaixados. Ele estava
entregue ao beijo, inteiro naquele contato. Ele beijou o canto da minha boca e
mordeu de leve meu lábio inferior. As mãos desceram, tocando a cintura.
Beijou o outro canto dos lábios, subindo os dedos. Quando alisou com a
ponta do nariz minha máscara, seus dedos já tocavam meus seios. Ele
passeou com a ponta sobre a superfície sensível e, constrangida, me encolhi
quando ficou claro quão excitado meu corpo reagia a ele.
As mãos foram descendo cada vez mais firmes pela pele. Eu mal
conseguia me sustentar de pé, constrangida por ter descrito por anos os beijos
de maneira errada. Eles eram muito melhores do que as palavras que usei.
Mexiam com muitas partes do corpo, e nem de longe diziam respeito apenas
à bocas.
As palmas de suas mãos envolveram ambos os montes, os polegares
circulando ao redor do mamilo. Minha intimidade começou a palpitar e uma
umidade constrangedora umedeceu o meio de minhas coxas. Aquilo era
escandalosamente proibido e errado. Posso beijá-los? Ele sussurrou baixinho
e cada pelo, cada mínimo pelinho que cobria meu corpo se ergueu. Eu já
havia ouvido falar de carícias indecentes nos seios. Havia lido Sade,
imaginado coisas luxuosas e pecaminosas envolvendo alguns pontos
erógenos, mas ele estava falando dos meus. E ele queria levar a boca até eles.
Fiz que sim, sem ar, firmando a máscara no rosto como garantia de que
ele jamais saberia quem eu era, notando que cada centímetro de pele
encrespava à medida que ele descia a língua do pescoço até lá. Na falta de
onde agarrar, agarrei seu cabelo. Eu mal enxergava o que ele fazia, a cabeça
dele abaixo do meu queixo, mas sentia o contato da língua morna com a pele.
O cheiro do cabelo perfumado. O fechamento da boca em mim.
Os olhos quase rolaram em suas órbitas quando ele me abocanhou.
Era estranho sentir o interior da boca, tão úmido e quente, ao redor de
uma superfície tão incrivelmente sensível. Ele ajustou o rosto para fazer o
mesmo no outro, e um calor sem igual correu por mim, me esquentando
inteira.
Então ele levantou, o ato proibido e indecente realizado, como se quisesse
quebrar a última fronteira do pudor. Não era simples ultrapassar certo ponto e
eu teria relutado mais se não tivesse visto, ao olhar para ele, olhos
incrivelmente entregues.
Havia sido bom para ele também. E saber que eu tinha a capacidade de
dar prazer a um homem facilitou minha entrega.
Como se quisesse dizer obrigada pelo medo perdido, eu o beijei. Só
precisei encontrar sua boca e o resto aconteceu sozinho. A língua úmida e
fervente na minha, me pressionando; os dedos enfiados nas mechas do
cabelo, sentindo os dele correrem pelo meu cabelo também. O beijo se
ajustou como uma dança. Era um movimento sensual, mas forte; suas mãos
faziam pressão sobre a minha pele. Passearam pelas minhas nádegas, minhas
coxas, minha cintura. Eu sentia o tecido de sua calça roçar no meu ponto
mais sensível, mostrando que ele estava muito excitado. Sua camisa apenas
parcialmente desabotoada colava aos seios sensíveis. Minha respiração
acelerou quando ele me empurrou para trás e minhas costas encontraram uma
parede, nem um pouco mais dura que o peito colado ao meu. O beijo ganhou
tons sôfregos e os braços já não mais me abraçavam, e sim me prendiam
firmes a ele. Era bom e estranho, tanto contato em tão pouco tempo, mas
descobri, ali, que a mente em algum momento se dissocia do corpo e cede
espaço no palco. Sendo eu agora apenas sentidos, permiti que ele encaixasse
a virilha estufada entre o vão de minhas pernas.
A fricção erótica me pegou desprevenida. Eu o sentia. Eu o ouvia respirar
excitado, o volume sob o tecido querendo encontrar minha pele. Embora ele
ainda estivesse vestido, meu corpo inteiro tremia de medo. Palavras sempre
foram meu forte: em palavras, eu tinha coragem. Ali, elas faltavam.
Não saberia dizer se foi o toque, a luz tremulante das velas ou a segurança
da máscara. Talvez tenha sido uma confiança crescente nele. Quando ele
insinuou a mão entre as minhas pernas, o primeiro reflexo foi me encolher.
Ele fez que sim, para que soubesse que não avançaria ali ainda.
O problema? Eu estava começando a querer. Por isso, quando ele investiu
outra vez, afastei as pernas. Tentei prestar atenção ao que estava acontecendo,
a mente de escritora querendo colher o impalpável, mas uma nova lição
mostraria que nesses momentos era extremamente difícil se concentrar em
sensações. Ou entender como funcionavam os delicados detalhes do
encontro, o que significava aquela respiração pausada, o olhar cravado no seu
enquanto os dedos descobriam, para o seu constrangimento, o quanto estava
molhada. Comecei a respirar mais fundo à medida que a trilha de beijos
voltou a passear pelo pescoço em direção à clavícula. Ele estava voltando
para os seios enquanto brincava com os caracóis do meu triangulo íntimo.
Meus dedos apertaram a carne rija dos braços, amolecida pela confusão
deliciosa de sensações.
Quando o dedo procurou espaço entre os lábios de baixo, comecei a
respirar forte demais. As pernas tremeram. Sabia que havíamos conversado
sobre meus limites, mas estava com medo. Não podia deixá-lo avançar
demais. Mas o que era demais? E por que queria tanto que ele chegasse
nesse estágio?
Parei sua mão antes que seus dedos entrassem em mim.
— Por favor, não.
— Por que não? É bom — ele sussurrou de volta.
Fiz que não. Eu acreditava nele, devia ser mais do que bom. Mas aquilo
estava ficando intolerável. Sensações demais, pensamentos demais,
consequências demais. Olhei para baixo, para o pedaço de tecido jogado no
chão. Hora de ir.
Ele pareceu levemente frustrado mas, cavalheiro, pegou o kimono do
chão e me entregou.
— Está tudo bem? — Ele me ajudou a vesti-lo. Seus olhos estavam nos
meus e não mais na pele descoberta do corpo.
— Não sei — respondi sincera. — Achei que estivesse preparada, mas
não estou.
Eu me sentia ao mesmo tempo uma farsante e uma ordinária. Como me
encararia outra vez no espelho?
— Senhora? — Ele interrompeu minhas dúvidas, erguendo o meu queixo
e me obrigando a olhar para ele. — Não precisa se explicar. Eu entendo.
— Perdoe-me. Achei que conseguiria.
Ele fez que entendia.
— O que a impediu? Saberia dizer?
Eu mesma.
— Não estava bom? — Ele insistiu com voz tranquila. — Fiz algo que
não gostou?
— Oh, não — eu o acalmei. Deslizei a mão pelo braço de fios dourados e
macios, me sentindo na obrigação de esclarecer aquela dúvida. — Não foi o
senhor. Foi o medo.
Pelo modo como me olhou, ele parecia entender. Não era fácil para uma
mulher entregar-se assim, embora essa mulher fosse, de longe, aquela a ter os
pensamentos mais atrevidos.
A resposta do mascarado me surpreendeu:
— Acostume-se com a ideia. Pense no que aconteceu… Sei que sentiu
desejo e posso garantir: posso fazê-la sentir muito mais. Mas não apresse o
momento ou ele será imperfeito.
Como minhas pernas me mantinham de pé, nem eu mesmo sabia.
— T-tenha certeza de que pensarei, senhor.
Eu só pensaria nisso a partir de hoje.
— Desperdicei esta noite porque não consegui superar meu medo tolo —
confessei abaixando a cabeça, me sentindo uma fraude. — Tenho certeza que
me arrependerei no futuro.
— Não é um medo tolo — ele respondeu. — As consequências para as
mulheres são imensas. Acredite, eu sei. Mas sempre haverá outra noite depois
dessa.
— O senhor não entende. Não posso sair de casa. Agora, só daqui a
quatro semanas…
Os olhos claros do homem cintilaram no escuro e sua boca encostou
delicadamente em minha testa.
— Se daqui a quatro semanas estará de volta, começarei a sonhar com
esta noite desde agora…
Noite 2
ESPANTE OS MEDOS
Theodor
Charlotte
A PRIMEIRA COISA que ele me disse quando nos encontramos foi que contou
os dias para me ver. Ele sempre me encontrava na escadaria e dizia a mesma
coisa: como havia sentido a minha falta e esperado pela minha chegada.
Eu me sentia profundamente desejada.
Também havia contado os dias em todos os seus minutos para estar ali.
Só que, ao contrário dele, não podia deixá-lo saber. O peso de uma revelação
dessas era diferente para homens e mulheres. Temia que, caso ele soubesse
que sentimentos começavam a tingir as noites, desistisse de mim. Ele estava
sendo cavalheiresco, usufruindo de sua privilegiada condição masculina para
ser lisonjeiro. Quando nós exaltávamos sentimentos, deixávamos de parecer
uma dama. Passávamos a ser vistas com cautela, porque podíamos nos tornar
sentimentais demais. Por isso guardava minhas emoções a sete chaves e
evitava pensar em qualquer coisa que lembrasse vagamente sentimentos.
Seria melhor assim.
Assim que a porta se fechou, ele me atacou. As máscaras que sempre
impediam o primeiro beijo de ser perfeito se moveram alguns centímetros
para dar lugar ao encontro de peles. Minhas mãos correram por seus braços
cheias de saudade. Eu podia até esconder as palavras dentro da boca, mas
meus gestos mostravam que eu havia ansiado loucamente por ele.
— Quero mostrar algo novo hoje à noite — ele sussurrou baixinho, tão
rouco e sedutor que minhas pernas fraquejaram.
— Tudo é novo para mim — respondi.
— Isso mudará o modo como enxerga a boca — ele segurou meu queixo
entre as mãos firmes, seu hálito doce de bebida me inebriando de forma
enlouquecedora.
— Onde depositará beijos que já não tenha depositado? — perguntei,
sorrindo.
Ele sorriu de volta, misterioso. No segundo seguinte, estávamos sobre o
divã perto da lareira.
Ele me deitou com cuidado, mantendo o kimono frouxamente amarrado
em minha cintura. A seda deslizou, revelando tudo, o que não fazia qualquer
diferença no momento.
Ele sumiu do meu lado e reapareceu sobre a minha barriga, beijando-me
de forma delicada. Sob a luz dourada do fogo seu cabelo ganhava as mil
cores que achei tão atraentes no primeiro dia. As mãos me prendiam ao
estofado aveludado, uma em cada lado da minha cintura, os lábios se
movendo da direita para a esquerda, leves como plumas. Um desejo úmido e
quente se avolumava entre as minhas pernas. Partes minhas imploravam por
ele.
Sequer vi em que momento suas mãos abriram minhas coxas e seu rosto
desapareceu entre elas. Tentei fechá-las, apavorada pelo que imaginava que ia
acontecer, despreparada para aquela intimidade. Nossa intimidade trazia
fluidos e cheiros. Trazia carne exposta, viva e sensível. Sua persistência
mostrou que ele não só sabia disso como queria continuar.
A língua do mascarado deslizou pela minha intimidade, lambendo,
acariciando e sugando partes que jamais imaginei poderem ser sugadas. Sua
boca brincava em mim com reverência e delicadeza. Eu agarrava a lateral do
divã e olhava para o fogo querendo descobrir como descrever algo tão bom.
Era mais do que bom. Era íntimo e fazia as pernas tremerem.
Uma urgência cada vez mais próxima me fez retesar a barriga e tentar
expulsá-lo dali. Implorei para que ele parasse; implorei mentalmente para que
não me ouvisse. Mas seus lábios sabiam onde ir e o que fazer, cobrindo às
vezes partes íntimas e pequenas, sugando-a como fazia com o mamilo,
alterando entre lamber rápido e devagar até que um toque certo no ponto
sensível me fez curvar as costas.
Então ele parou.
Ele deixou o meio de minhas pernas antes que eu atingisse o ápice,
sorrindo satisfeito ao ver que havia me transformado em uma massa amorfa
de sensações. Eu só conseguia ofegar, frustrada.
— Foi, realmente, uma lição — consegui balbuciar antes que ele fizesse
que não.
— Essa é apenas uma fração da lição, Mondschein.
Que eu tivesse forças para o que ainda viria, pensei, tentando me ajeitar
sobre as almofadas. Ele me puxou pelos pés outra vez. Ele me queria deitada.
— Ainda não.
Ele se ajoelhou ao lado do divã.
— Eu… eu estava — quase lá, tentei explicar, mas ele sabia bem o que
tinha feito.
— Está muito cedo. Quero mostrar outras coisas antes.
Ele desamarrou o laço do kimono e me ajudou a tirá-lo. Inteira e
completamente nua, à mercê de suas mãos e seus olhares, aguardei que ele
me mostrasse o que queria. Ele desceu os olhos maliciosamente pelo meu
corpo, acendendo meus instintos de alerta. Aquilo era uma loucura. Ele me
olhava com tamanha intensidade que eu me sentia sem máscara. Ele me
reconheceria um dia, eu soube. Ele se aproximou sem dizer nada, e os lábios
voltaram a se esfregar em minha garganta, procurando o ponto pulsante sob a
pele. Ele depositou mais que beijos molhados ali: ele correu a língua por toda
aquela extensão, intercalando com mordidas leves.
— Não quer saber a lição de hoje? — Ele perguntou.
Fiz que sim de olhos fechados, cada toque morno da língua na pele
aquecida pela proximidade com o fogo encrespando a pele.
— A lição de hoje é ser lambida. Inteira.
O som que soltei me causou vergonha. Ele saiu de dentro, do núcleo de
prazer que me aquecia, e agradou o mascarado. Aquele bendito sorriso
branco e de lado estava de volta.
— Mas para isso preciso disso aqui — ele puxou o carrinho com a
bebida.
Ele pegou as frutas e colocou um morango na minha boca. A fruta doce e
suculenta, ligeiramente ácida, nunca pareceu tão erótica. Ele chupou uma
cereja, deixando apenas o caroço e o cabo de lado, e com a boca perfumada
pelo cheiro da fruta, beijou minhas escápulas, dirigindo-se para baixo.
— Seus seios são os mais macios que já senti — Ele os circulou com as
palmas quentes, a textura da mão masculina me fazendo suspirar. Então ele
colocou outra fruta na boca, e da mesma forma como chupou a cereja, fez
com cada um dos mamilos até que eles ficassem vermelhos.
A essas alturas meu corpo se contorcia de prazer e agonia.
Sua língua deslizava por lugares que nunca pensei serem erógenos: pulso.
Entre os dedos das mãos. Interior dos braços, das coxas, lateral dos pés. Ele
intercalava as lambidas e mordiscadas com morangos e cerejas, e eu soube,
ali, que nunca mais olharia para essas duas frutas da mesma maneira.
Ele brincou com minhas partes íntimas. Espremeu-as sobre mim. Fez com
que a noite trouxesse tantos suspiros e sorrisos que quase disse, em voz alta,
que o desejava mais que apenas durante poucas horas em um mês. Ele me
cobriu de beijos e me devorou com avidez. Depois de certo momento fechei
os olhos. Só sua língua existia no mundo. Sua ponta morna e molhada e os
caminhos gelados que ela deixava depois de goles no espumante. Aquilo era
mais que uma lição de sedução: era adoração da forma mais sensual que
havia ouvido falar.
Quando o gozo veio, ele não estava dentro de mim. Ele apenas sugava o
lóbulo de minha orelha enquanto com a ponta do dedo estimulava o centro
entre as minhas pernas. Foi impossível lutar contra o que desabou. Ondas e
mais ondas de prazer absoluto arquearam minhas costas e me fizeram
esquecer quem eu era, o que fazia, e que precisaria em breve ir embora.
Eu ainda sentia o calor se espalhando do ventre para o resto do corpo
quando percebi algo perigoso.
Eu poderia morrer por mais daquilo.
Noite 5
VOY EUR
Theodor
E RA a quinta vez que ela aparecia e a lua estava cheia no céu. Não suportava
mais esperá-la no primeiro andar, por isso a esperei na entrada. Tudo em que
eu pensava era que ela precisava vir. Não sei como toleraria os dias se ela não
aparecesse. Eu estava perigosamente envolvido por ela.
Assim que ela surgiu, segurei-a pela mão como se a tivesse esperado por
28 dias de pé na entrada. Ela se assustou ao me ver lá embaixo, mas não
chegou a dizer nada. Apenas engoliu a surpresa e me estendeu o braço,
entrando comigo no ambiente como se fôssemos um casal. Meu coração
ribombava e os dedos a apertaram mais do que deviam, com medo de que ela
escapasse por eles. Ela me tranquilizou, pousando a segunda mão sobre eles,
me acalmando em silêncio de que estava ali e não sumiria tão cedo.
Seu casaco cobria todo o vestido e sua máscara dessa vez era clara. Ela
deveria seguir para a ala de trocas, onde deixaria sua roupa guardada e
vestiria o kimono, mas não suportava perdê-la de vista nem mais um
segundo.
— Para onde estamos indo? — Ela perguntou.
— Você hoje está comigo. Não precisa seguir as regras.
Ela pausou.
— Admito que estou surpresa, senhor. Deve ser um cliente recorrente no
clube para se dar ao luxo de não obedecer as regras.
Mesmo na escuridão da escadaria ela percebeu que eu sorria.
— Sou um bom cliente, senhora. E minhas gorjetas abrem portas.
Era tudo que ela precisava saber a respeito de mim e do clube.
Ela acreditou que fôssemos em direção ao quarto, mas eu tinha outros
planos. A loucura da noite anterior havia incendiado minha cabeça nas
últimas semanas. Lambê-la inteira, sentindo cada pedaço de seu corpo havia
enchido minha cabeça de ideias. Ela era uma mulher ousada querendo
aprender; eu era um homem devasso querendo ensinar. Eu a queria de pé,
deitada ou de ponta cabeça. Queria mergulhá-la em mel, atá-la, dizer coisas
sujas em seu ouvido ou beijá-la por horas a fio. Só de imaginar o sexo com
ela — até o fim — sentia as calças quererem arrebentar. A opção para hoje
era ousada, mas sei que ela gostaria.
— Não vamos para a suíte? — Ela perguntou quando peguei o outro lado.
Fiz que não.
Ao lado da escadaria, com vistas para o primeiro andar, ficava uma
alcova. Era como uma balcão, mas oculto por grossas cortinas de veludo.
Dali era possível observar os flertes e insinuações do primeiro andar, e ter
acesso aos corredores do segundo. Elas eram finamente decoradas com
estofados opulentos e permitiam que um casal se sentasse confortavelmente
enquanto observava os flertes abaixo — ou que se acomodasse da maneira
que quisesse. Nada fechava o lugar, apenas outro par de cortinas. Era um
lugar aberto e quase exposto.
Seu olhar corria meu corpo; eu podia ouvir sua respiração em mim.
— O que quer aqui? — ela perguntou.
— Você — respondi, fechando as cortinas atrás de nós.
Assim que a escuridão nos envolveu, meus braços se fecharam ao redor
dela. Ela me recebeu afoita e entregue, saudosa como eu mesmo me sentia.
Podia sentir o quanto pela pressão de suas mãos em mim, e retribuí pesando a
mão sobre ela também. Não queria que ela tivesse a mesma experiência dos
outros dias. Queria que soubesse que haviam infinitas maneiras de amar, e eu
saberia ensinar todas elas.
Charlotte
O beijo foi longo, cheio de arfadas e ajustes do corpo. Seu gosto era uma
loucura, uma mistura de atos desempenhados durante a noite — um gole de
bebida, um charuto fumado há tempos, o perfume já impregnado no tecido do
colarinho. Eu o queria com desespero; quase havia morrido quando no meio
da semana ouvi meu pai comentar que talvez não pudesse viajar. O que seria
de mim, passei a repetir desolada. O que seria de mim se não o sentisse outra
vez? Por sorte ele viajou e eu estava ali.
Apesar dos riscos. Apesar da vida.
O mascarado me empurrou em direção à parede, respirando de maneira
pesada. Estava acontecendo algo novo, ali. Encostei a cabeça na parede,
firme entre suas pernas, vendo por entre a fenda das cortinas a movimentação
do primeiro andar. Ele abriu meu casaco com desespero enquanto eu
permanecia quieta e à sua disposição. Ele desfez o laço do pescoço,
desabotoou sôfrego cada minúsculo botão da minha blusa, desfez a
amarração da saia e a roupa caiu inteira aos meus pés, por cima do casaco
comprido, já no chão. Eu estava arqueada, insegura, arfante, os seios subindo
e descendo, os mamilos eriçados e à espera de seu toque, o centro entre as
pernas desejando seus dedos. Eu andava limitando a quantidade de roupas,
sabendo que cada segundo me despindo era um segundo a menos com ele.
Com a luminosidade vinda do lado de fora, vi os olhos azuis passarem do
meu rosto para o meu corpo.
Eu sentia o corpo flamejar. Devia ser assim que a uma presa temia o
ataque de um predador: como o coração em ritmo vertiginoso. Mas havia a
parte do desejo, certamente não presente no desespero da presa. O desejo
causava vontades indizíveis.
— Mondschein — ele sussurrou antes de firmar meu rosto entre as mãos
e embrenhar os dedos no meu cabelo. A máscara quase levantou — quase —
e precisei de certa força para descê-la outra vez. — Está me enlouquecendo
com essas vindas esporádicas.
Sua voz veio tão rouca e fraca que mais pareceu um pedido.
— É o que posso oferecer — respondi, dolorida por não poder oferecer
mais.
Eu o despi entre beijos. Estávamos agora os dois nus e expostos,
escondidos por cortinas de pano. Se alguém resolvesse entrar nos nicho nos
descobriria. Lá embaixo, talvez um ou outro visse que dois corpos se
enroscavam por entre a fresta, mas era essa a lição da noite: o temor em ser
visto. De ser descoberto. A necessidade de ser silencioso e discreto quando
qualquer um poderia abrir as cortinas e nos flagrar. Só de pensar nisso algo
elétrico subia por mim. Encrespava a pele, me estalava em partes diferentes.
Firme, porém gentil, o mascarado me virou. Meu ventre encostou na
parede e ele me prendeu contra ela. Sentia seu corpo colado ao meu, o
volume de seu membro fazendo pressão contra meu traseiro.
Senti seu hálito quente na nuca, sorrindo quando os beijos recomeçaram
úmidos e lentos. Dedos grossos tocaram o meu quadril, massageando minhas
nádegas. A parede era áspera contra os mamilos, mas estava concentrada em
sentir o que dele tocava em mim. Seu peito encostou em minhas costas, sua
boca encontrou a nuca quente. Fechei os olhos, sentindo o vapor contra pele.
Sua virilha ia e vinha, indecente, me fazendo contrair. Aquilo estava
ficando cada vez mais íntimo e perigoso. Eu sentia o membro túrgido roçar a
curva das nádegas, perigosamente perto de onde eu sentia a vida palpitar.
Mas, de certa forma, estava claro para mim — por causa dos movimentos
dele — que ele não avançaria sem permissão.
Uma lambida varreu a pele da base do pescoço até a orelha, me fazendo
encolher de agonia. As mãos masculinas se fecharam ao redor dos meus seios
e os tocaram, numa agonia doce, brincando com o bico. A carne entre as
coxas latejava. As mordidinhas no pescoço me fizeram arquear as costas de
forma tímida.
Pela primeira vez, o indicador e o polegar apertam com força o mamilo e
eu me retraí. Dor? Sim, dor, a outra mão pareceu entender, procurando o vão
entre as pernas. Dor e outra coisa. E enquanto o polegar rodava o bico contra
o indicador, as mãos acariciavam meu interior. Que lição era aquela? Eu
sentia as pernas fracas tremerem. Seu dedo se movia melado por mim. Ele
usou a umidade ao trocar de mãos. Agora os outros dedos giravam de forma
delicada o outro mamilo, enquanto outro dedo sumia em mim.
Eu queria me virar. Pedir que me mostrasse tudo, porque aquele tipo de
provocação à conta-gotas estava me matando. Mas o mascarado não tinha
pressa. A boca continuava a mordiscar o lóbulo da orelha, enquanto eu
descobria que podia existir um prazer incomensurável no casamento entre a
carícia molhada e a dor. Tentei me virar para vê-lo, mas ele fez shhh no meu
ouvido e me pediu para aguardar.
— Preste atenção — ele disse firme e rouco no meu ouvido. — Vou
intensificar os movimentos, mas não tenha medo. Não vou entrar em você.
Meu coração disparou. Tão forte e tão rápido que alguém, do outro lado
da parede, poderia ouvi-lo.
— O que vai fazer? — perguntei entre um gemido e outro.
— Quero sentir você. Quero que me sinta. Sem penetração.
Oh, meu Deus.
Ele me abraçou, a pele quente contra a minha, a pressão entre as bandas
da nádega agora mais encaixada. Ele se ajustou entre as minhas coxas,
deixando claro que era ali que deveria segurá-lo. A pressão de sua mão ficou
mais urgente, e cinco dedos de sua mão direita cravaram em minha coxa.
Com a outra mão ele afastou a cortina.
Apenas um pouco, o suficiente para que vislumbres do que estávamos
fazendo ali ficasse à mostra para quem quisesse ver.
— O que está fazendo? — Virei o rosto para o outro lado.
— Está escuro aqui dentro — A voz áspera disse em meu ouvido. —
Tudo que verão são corpos em movimento. Evidências discretas do ato.
Todos que virem serão discretos. Ninguém nos interromperá.
— Mas seremos vistos — Eu consegui dizer entre arfadas, com um misto
de vergonha e excitação. O calor que tomava meu corpo me esquentou
inteira. — Alguém me verá nua.
Ele continuou a massagear meus seios e mordiscou o pescoço.
— Sabe o que veriam? — A voz masculina provocou.
Fiz que não.
— Paixão — ele respondeu. — Seu corpo e o meu. Juntos. Movendo-se
durante o ato. Só não saberão quem somos.
Aquilo roubou a força das minhas pernas. Quase me desequilibrei, mas
me mantive de pé, as mãos contra a parede, o fio de luz chegando da janela
aberta. De dentro de mim escorria um líquido cremoso que fazia o ir e vir de
seu membro entre minhas coxas deslizar. Alguém estava nos vendo fazer
aquilo. O simples pensamento de estar sendo observada era enlouquecedor e
corroía meus nervos. Nem mesmo nome para aquilo eu tinha.
— Quero que sinta a eletricidade de tudo isso — Ele disse rouco.
Eu sentia.
Olhei para trás, respirando de maneira tão ofegante quando ele
desencaixou de mim para me acalmar. Não vou mentir: a ideia de ser
observada era inquietante, mas também excitante. Quando finalmente nos
olhamos, seus olhos eram uma loucura. Eletrizantes, intensos. Havia um
brilho aguçado ali que não conseguia reconhecer.
Ele me empurrou com o tronco até a parede e colou o dele em mim.
— Se preferir, pode ficar de frente para mim. Ou podemos fechar as
cortinas — ele falou.
Ele estendeu a mão até o veludo, mas a parei com a mão no ar.
Lá embaixo, ninguém parecia nos olhar. E, se nos olhasse, veria seu
corpo esculpido colado ao meu, tampando-me inteira.
— Deixe-as abertas — falei quase sem voz.
Ninguém sabe quem é você. Ninguém jamais saberá.
Ele me beijou outra vez, e seu membro se encaixou entre as coxas, mas
de frente. Grosso, inchado. Deliciosamente encaixado entre as minhas coxas.
Confie em mim, seus olhos disseram, mas eu já confiava. E enquanto nos
beijávamos e suas mãos bagunçavam meu cabelo, ele ia e vinha, simulando o
movimento mais antigo do mundo. Senti-lo ir e vir tão próximo de onde
minha intimidade palpitava foi a sensação mais próxima do sexo que poderia
me dar ao luxo de sentir. Eu queria que tudo fosse diferente, mas as coisas
eram o que eram, e eu jamais ultrapassaria aquela barreira ali.
O ir e vir o fez chegar antes de mim ao clímax. Com o auxilio de seus
dedos e sua boca maliciosa, logo eu também explodi em suas mãos,
encerrando de maneira inesquecível aquela lição de sensualidade.
Noite 6
ATADA
Theodor
Theodor
Charlotte
Era um novo homem, ali, que havia despertado uma nova mulher. Sei que ele
estava com raiva e o assunto me frustrava também. Nada ali era ideal, mas
era o que tínhamos.
Suas mãos deslizavam sobre seu membro, indo e vindo da cabeça larga à
base. Seus olhos estavam escurecidos e profundos. Ele queria uma
compensação por não me ter como queria. Eu queria compensá-lo também.
— Quero que me chupe — ele falou. — Quero ver meu pênis desaparecer
na sua boca.
A ideia e as palavras dispararam meu coração. Aquilo era indecente. Era
íntimo. Que dama faria aquilo?
Eu, que havia deixado a decência do lado de fora da porta, oito meses
atrás. Eu faria aquilo com prazer. Ele parou à frente e eu me curvei. Toquei-o
com a ponta dos dedos, cheia de desejo. Mesmo saciada, precisava de mais.
Minha intimidade estava dolorida e inchada, mas ainda havia espaço para um
novo pico de prazer. Eu era pura agonia por ele.
Abri a boca e o lambi, e o mascarado afrouxou a pressão das mãos sobre
meus ombros. Meus lábios sentiram a textura enlouquecidamente quente,
úmida e aveludada do seu membro. Que mistério que uma pele tão fina
cobrisse algo tão grosso e duro. Pensei mil vezes em fazer aquilo no decorrer
dos meses, mas faltava-me coragem. A coragem aos poucos vinha.
Há tempos sonhava com seu cheiro, seu sabor, mesmo que jamais fosse
escrever aquilo em minhas páginas. Essa era uma daquelas experiências que
iria diretamente para o baú que era o meu coração. Uma caixa cheia de
tesouros só meus. Sua mão apertou meu cabelo para me segurar no lugar,
indicando que queria que eu me movesse sobre ele. Acolhi-o na boca, indo e
vindo, deixando que ele ditasse o ritmo. A respiração dele estava profunda, os
olhos agora fechados. Queria poder vê-lo melhor, mas a maldita escuridão —
tão necessária — escondia esses momentos bonitos. Eu o sentia, era isso o
que importava. Sentia sua ponta, morna e molhada, deslizando pela cavidade
de minha boca. Sentia-o quente ao contato dos lábios, a carne dura esticando
meus lábios e me preenchendo enquanto experimentava seu gosto. O único
barulho além dos gemidos roucos que ele dava era o da lenha crepitando na
lareira.
O mascarado acariciou meu cabelo, afastando-o da frente, fazendo
carinho em minhas orelhas e retraindo quando minha ousadia permitiu que
ele sumisse inteiro em minha boca. Não consegui deixar muito, mas ele
soltou uma imprecação que traduzi como algo bom. Beijei-o ali. Inspirei seu
cheiro único e masculino.
Ele me parou antes que jorrasse seu prazer em mim. Passando a mão pelo
meu cabelo, tremendo, deslizou os dedos até meu rosto.
— Tenho fome de você — ele disse com voz quebrada.
— E eu, de você — respondi.
Empurrando-me de volta até os travesseiros, ele me abraçou. Sua
respiração saía profunda e seus olhos estavam fechados. Ele levou a mão ao
membro e finalizou o serviço, virando-se para o lado quando o gozo veio.
Queria que tivesse jorrado sobre mim, mas não tive coragem de confessar.
Um pudor a menos de cada vez.
Havia sido uma experiência incrível ver seu lado duro e passional, e uma
prova de que era um homem com pleno domínio sobre os seus desejos e
pensamentos. Que pena, uma parte de mim suspirou. Um homem com pleno
domínio de suas emoções jamais arrancaria minha máscara e me tomaria
como sua, a despeito dos meus medos e dúvidas. Uma minúscula parte de
mim queria que ele fosse irresponsável e acabasse com a minha agonia. Que
decidisse por mim que nosso destino era ficarmos juntos.
Ele não faria isso, e eu só tinha que agradecê-lo.
Minha mão desceu por ele e apalpou sua cintura estreita, amando cada
centímetro de pele que percorria. Contornei suas nádegas e encaminhei os
dedos até a frente, explorando seus pelos e detalhes. Por um tempo massageei
sua anatomia agora saciada, deixando claro que queria seus fluidos em mim.
Por hoje, entre meus dedos; amanhã, quem sabe, dentro de mim.
Naquela noite paramos por ali. Ficamos brincando e conversando
baixinho até que a madrugada fosse alta, eu com as mãos ao redor de seu
membro, curiosa em saber por que minava da cabeça aquele líquido
translúcido, ele querendo que eu descrevesse o que eu sentia quando chupava
meu seio ou brincava com os dedos entre minhas partes íntimas. Intercalamos
respostas com beijos no nariz. Com olhares para a própria anatomia, para
respostas engraçadas que suplantassem as verdadeiras. Os pudores
desapareciam aos poucos, dando espaço para a descoberta de dois corpos que
pareciam terem sido criados para estar na boca e na ponta dos dedos do outro.
E que provavelmente encaixariam-se como se tivessem sido feitos para essa
função.
Em algum momento, exausta e satisfeita, ergui os olhos até ele, perdida
de amor. Ele me olhava de volta, os olhos brilhando como espelhos.
Amo você, o pensamento escapou perigoso, e me controlei para não
retrair.
Ele só não percebeu porque algum pensamento igualmente perigoso o fez
retrair também.
Noite 9
VOCÊ TEM CORAGEM?
L ONGE DO CLUBE Lust eu era uma dama. Uma jovem que precisava se
comportar de forma exemplar, sob o risco de despertar suspeitas. Da minha
capacidade em me misturar em sociedade — e desaparecer nela — estava a
saída para a vida dupla que andava levando. E eu era exemplar em ser uma
dama. Frequentava cafés, bordava com aparente tranquilidade, ajudava na
educação de minhas irmãs. Jamais demonstrava estar com a cabeça longe,
pensando em bobagens. Eu era centrada e discreta. Irrepreensível.
Mas em silêncio eu sofria. Mal conseguia comer de tão apaixonada.
Todas as palavras que escrevia tinham inscritas em segredo os detalhes do
mascarado; minha paixão por ele tingia o papel tanto quanto a tinta preta.
Seus olhos, sua pele, os calores que me consumiam, os desejos indizíveis que
ele fazia acontecer em mim… Tudo aquilo me dava material infinito para os
livros, mas estava acabando com meus nervos. Eu estava completamente à
mercê de suas ideias sensuais e perigosas. Em algum momento precisaria
parar de frequentar o clube para o meu próprio bem.
Quando? Não sabia. Pior: não queria.
Na noite em que deveria estar lá, quatro semanas depois da inacreditável
cena de falta de pudor em público, passei mal. Incapaz de sair da cama, vi a
lua nascer e desaparecer no céu sem conseguir me levantar. Ao mesmo tempo
em que me sentia febril de tanta vontade de estar com ele, uma parte minha
repetia em silêncio: aproveite para desaparecer. Suma de lá antes que
descubram você. Mas na noite seguinte, assim que Emma e Arabella foram
para a cama, desci as escadas e escapei.
Eu sabia que o fim das idas à Lust se aproximava. Sentia que meus
encontros com o mascarado precisavam chegar ao fim.
Assim que ele me recebeu na porta, ansioso pelo atraso de uma noite,
percebeu que eu não estava bem. Caminhamos até o quarto em silêncio, onde
pela primeira vez não fui atacada por seu ímpeto. Ele estava tenso, eu podia
sentir. Tudo em mim indicava que aquela não era uma noite como as outras.
Ele não parou de traçar delicadamente caminhos pelo meu corpo com
suas mãos poderosas, mas os olhos estavam mais atentos às minhas reações
que o normal. Há dias ardia em febre, digladiando internamente entre
continuar a loucura ou desaparecer enquanto ainda havia tempo.
— Você emagreceu — ele disse olhando para mim. — Esteve adoentada?
— Não é nada — respondi. Queria que ele me beijasse logo. Era como se
tivesse passado fome, mas dele.
— Sinto muito pelo que fiz no encontro passado — ele falou procurando
meus olhos, segurando meu rosto entre as mãos quentes. — Fui ousado
demais. Não perguntei antes se desejava aquilo. Perdoe-me, Mondschein.
— Ninguém sabe quem sou — segurei seus braços. — Não se preocupe
com isso. Agora, por favor… beije-me.
Mas ele não me beijou. Ele continuou a estudar minhas reações, as mãos
ao redor do meu rosto.
— Você está quente.
Eu estava. Não sei que tipo de mal recaiu sobre mim, mas eu me sentia
fraca. Fraca, deprimida e carente dele.
Sem aviso ele se abaixou e me ergueu do chão, me levando no colo até a
cama.
— Você não está bem.
— Estou bem — falei, sentindo-me mal. — Não é nada — segurei as
lapelas de seu casaco. — Não saia de perto de mim.
— Mondschein… — ele me deitou sobre as almofadas, ajeitando algumas
atrás de mim. Então sentou-se ao meu lado. — Não sairei até que esteja bem.
Vou pedir um chá — ele disse, e senti pena ao ver o carrinho cheio de
morangos e cerejas à minha espera. — Não saia daqui.
Como se eu conseguisse, pensei.
Ele retornou algum tempo depois acompanhado de uma criada. Ela trocou
o carro de bebidas e comidas por outro. Chás e um bolo recém assado
aguardavam por mim. Eu me sentia quente dentro do vestido — não tive
tempo de colocar o kimono — e a máscara apertada me fazia sentir sem ar.
Assim que a senhora saiu, ele retornou ao meu lado.
— Estou preocupado com você — disse.
— Não é nada. Acho que sofri demais, e meus nervos aqueceram o corpo.
Tenho quase certeza que a febre está ligada à iminência desse encontro.
Ele não esperava tanta sinceridade. Tirando a jaqueta, acomodou-se ao
meu lado, seu corpo bonito de frente para o meu.
— Sei então como se sente.
Olhamo-nos por uma eternidade. Pensamentos perigosos passavam pela
minha mente. Ideias absurdas, como tirar a máscara e deixá-lo ver quem eu
era. Tirar sua máscara e implorar que me falasse quem ele era. Mas aquele
era um clube onde o envolvimento emocional não estava no cardápio. Eu me
sentia tola por me envolver demais.
— Perdoe-me por estar aqui assim — falei. — Não devia ter vindo.
— Céus, não — ele acariciou meu rosto. — Se não tivesse aparecido, eu
teria ficado doente.
Ele trouxe minhas mãos à boca e beijou-as. Então sorriu quando sorri
para ele.
— Quanto a isso… — ele brincou com a fita que amarrava a minha
máscara. — Estive pensando sobre nós. Se quiser tirar, prometo que não…
Não. Não, não não.
Meus braços endureceram e afastei suas mãos.
— Não — fui clara.
— Calma — ele respondeu. — Era só uma sugestão. Não precisa tirá-la.
Era claro que não a tiraria. Sinos badalavam dentro de mim, como os de
cidades da costa que alertam seus moradores do perigo do oceano. O
mascarado só voltou a falar quando viu que eu estava tranquila outra vez.
— Só farei o que quiser, e no ritmo que quiser, querida. Sei que tem
medo que descubra sua identidade, mas lembre-se: prometi não persegui-la
nem procurá-la, e pretendo cumprir a promessa.
Faltava firmeza em sua afirmação, mas mesmo assim sua resposta doeu.
— Eu sei. — respondi, afastando aquela ideia da cabeça.
Nos beijamos com delicadeza, os lábios dele me sugando de leve. As
ideias de desaparecer evaporaram como a febre do corpo. Minha própria
saúde parecia depender agora de seus braços.
Naquela décima noite não houve lições. Passamos as horas conversando
sobre ideias, opiniões sobre assuntos banais, rindo de coisas sem importância.
Um homem e uma mulher trocando confidências enquanto tomavam chá,
comiam bolo e se olhavam como se fossem mais do que eram.
Embora nunca viriam a ser, e ambos sabiam.
Noite 11
TOQUE-SE
Theodor
Charlotte
FIM
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Theodor?
Fim da amostra.
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Publicitária, professora de alemão, psicóloga e escritora — tudo que é legal ser, já fui (e
sou). Sou também mãe de duas crianças lindas e esposa parceirona. Já corri o mundo e
morei em um monte de lugares. Adoro falar sobre livros, técnicas de escrita e papos psi!
Se quiserem falar comigo, sabem onde me encontrar!
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