Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
t
* íl
I
f
LUGAR*
NEGRO GiRI
IIRCULA
1
Sumário
Copyright © 2022 by herdeiros de Lélia Gonzalez
Copyright © 2022 by herdeiros de Carlos Hasenbalg
Capa
Elisa von Randow
Apresentação, por Márcia Lima 9
Imagem de capa
Mayara Ferrão
O movimento negro na última década,
Revisão
Huendel Viana por Lélia Gonzalez 15
Nana Rodrigues
O golpe de 1964, o novo modelo econômico
e a população negra 17
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip) Movimento ou movimentos negros? 25
(Câmara Brasileira do Livro, sp, Brasil)
Gonzalez, Lélia Experiências e tentativas 29
--- / Lélia Gonzalez, Carlos Hasenbalg. — i* ed. — Rio
Lugar de negro
de Janeiro: Zahar, 2022.
A retomada político-ideológica 39
ísbn 978-65-5979-O59-3
Notas 137
Apresentação
9
Lugar de negro II
Apresentação
frase de Millôr Fernandes sobre a peculiaridade do racismo do racismo e do sexismo”. A essa perspectiva, alinha-se a ideia
brasileiro ao dizer que "no Brasil não existe racismo por do lugar emancipatório que a mulher negra ocupa trazendo,
em suas palavras, "a marca da libertação de todos e de todas”.
que o negro conhece o seu lugar”. “Saber o seu lugar é
O sentido natural do lugar social dá espaço ao sentido político
uma expressão de naturalização das posições sociais, uma
hierarquia presumida que aloca indivíduos segundo os mar presente na construção do feminismo negro.
cadores sociais de raça, classe, gênero e território. Naquele Carlos Hasenbalg, assim como Gonzalez, trabalha a
ideia de lugar como resultante de práticas discriminatórias
momento, refletir sobre os processos discriminatórios de
impostas à população negra que atuam com o intuito de
construção dessas posições sociais havia se tornado uma
tarefa primordial da agenda intelectual e política de pes- regular suas aspirações através da construção dos "lugares
quisadores e militantes. É digno de nota que, na época do apropriados”. Ao analisar o negro na publicidade, no ar
lançamento deste livro, foram publicados também O lugar tigo que fecha a presente obra, o autor destaca como esse
da mulher, organizado por Madel Luz, e O lugar do negro na segmento reproduz estereótipos, contribuindo para a cons
força de trabalho, escrito por Lucia E. G. de Oliveira, Rosa trução desses lugares que em geral confinam o negro em
M. Porcaro e Tereza C. N. Araújo. posições subordinadas ou de entretenimento.
Mas há outros sentidos importantes atribuídos à ideia de
lugar, presentes em especial na obra de Lélia Gonzalez, cujo
* Ver Lélia Gonzalez, Por umfeminismo afro-latino-americano. Rio de
pensamento é marcado por duas chaves analíticas: chamar
Janeiro: Zahar, 2021.
Lu^ar^ negn
Apresentação 13
Assim, o lugar de negro é construído a partir das di
mensões socioeconômicas, mas também de protagonismo Carlos Hasenbalg, por sua vez, traça um panorama da
político. Os autores sintetizam aqui importantes reflexões discussão racial no Brasil debatendo os principais aspectos
sobre a questão racial brasileira, alinhando-se ao modelo analíticos sobre a configuração do racismo e das desigual
interpretativo que aborda a discriminação racial como um dades raciais. O autor analisa a produção estadunidense
mecanismo central de produção e reprodução das desi acerca da temática racial e tece uma crítica importante às
gualdades. Escrito durante o período de redemocratização teses assimilacionistas e à abordagem marxista da época.
do país, este livro contribuiu para uma grande tarefa que Ele argumenta que relegar o preconceito racial e o racismo
o movimento negro brasileiro enfrentava: desconstruir a ao reflexo das relações de classe subestima o papel especí
narrativa da democracia racial que tinha sido fortalecida fico da opressão racial na sociedade brasileira.
na ditadura. Trazendo o debate para o caso brasileiro, Hasenbalg
Lélia Gonzalez dedica-se aqui a apresentar o processo examina as principais vertentes interpretativas das relações
de consolidação do movimento negro, abordando questões raciais, destacando que, embora distintas, todas mantêm a
significativas sobre sua formação e consolidação e desta perspectiva assimilacionista, imputando às características
cando a existência de uma tradição de mobilização negra do grupo subordinado a responsabilidade por sua situação
no país desde o pós-abolição. Seu ensaio narra as condições desigual. Essas perspectivas, segundo ele, não consideram
históricas, econômicas e políticas nas quais o movimento a possibilidade de racismo, industrialização e desenvolvi
negro constrói seu caminho, culminando na mento capitalista coexistirem. Sua tese é que preconceito e
Movimento Negro Unificado, em 1978. A criação do discriminação raciais são ressignificados na nova estrutura
sua própria trajetória política, depoim. autora mobiliza social, e que as práticas racistas geram benefícios materiais
e diversos fatos históricos marcantes, tentos de militantes e simbólicos ao grupo dominante ao desqualificar compe
do percurso, as múltiplas formas de e recupera, ao longo titivamente a população negra.
atuação política do
movimento negro, os desafios imposto: Passadas quatro décadas, os temas abordados em Lugar
organizações negras e a importância d: >s internamente às de negro seguem atuais. Compreender as configurações de
na construção das suas pautas, dem. as mulheres negras raça e classe no Brasil, assim como o lugar da discriminação
andas e ações.
racial no entendimento das desigualdades, é uma agenda
negro
Márcia Lima
O movimento negro
na última década
LÉLIA Gonzalez
17
18 Lugar de negro
O golpe de 1964, o novo modelo econômico e a população negra 19
gimento desse novo personagem, 0 "boia-fria”, no cenário para o Sudeste, e se concentrando num mercado de trabalho
da história dos despossuídos deste país. que não exige qualificação profissional, o trabalhador negro
Com tal afluxo de mão de obra, não foi difícil para os tec- desconheceu os benefícios do “milagre”.
nocratas do poder realizarem seu projeto de crescimento Como já foi dito, o arrocho salarial, imposto como uma
econômico. A industria automobilística, assim como a de das condições para o desenvolvimento do país, resultou
construção civil, serviram de pontas de lança do processo que na queda do nível de vida da grande massa trabalhadora
afogou os demais setores da economia brasileira na voragem (basta lembrar que em 1976 cerca de 80% da força de trabalho
do imperialismo multinacional. A construção civil foi sobre era constituída por trabalhadores manuais, rurais e urbanos).
tudo um grande escoadouro da mão de obra barata (majori- Se em 1960 a população pobre participava da renda nacional
tariamente negra), porque não qualificada. E toma de abrir numa faixa de 18%, em 1976 essa percentagem havia caído
rodovias, de desativar ferrovias etc. e tal. Eram as grandes para 11%. Por outro lado, se em 1960 a participação do negro
obras do milagre ; e 0 seu exemplo mais grandiloquente está na força de trabalho não era das mais significativas, em 1976
aí, na ponte Rio-Niterói, que também poderia ser considerada ela atingia a faixa dos 40%. Por aí se vê que esse aumento de
como o túmulo do trabalhador desconhecido, tal o número participação no mercado de trabalho não significou uma me
de vidas anônimas ceifadas durante a sua construção lhoria do nível de vida para o conjunto da população negra.
Outro grande escoadouro de mão de obrabarata foi a pres As condições de existência material dessa população
tação de serviço. Também ali encontramos 0 trabalhador negra remetem a condicionamentos psicológicos que de
negro fortemente representado, sobretudo em atividades vem ser atacados e desmascarados. Os diferentes modos
menos qualificadas, tais como limpeza urban de dominação das diferentes fases de produção econômica
mésticos, correios, segurança, transportes urban no Brasil parecem coincidir num mesmo ponto: a reinter-
presença era pequena, por exemplo, num tip0
pretação da teoria do lugar natural, de Aristóteles. Desde a
trial como o do abc paulista, uma vez que 0 nível
época colonial aos dias de hoje, a gente saca a existência de
das indústrias ali concentradas exigia um tip0 de
uma evidente separação quanto ao espaço físico ocupado
ção que a maioria dos trabalhadores negros não ia^za-
Possuía p-_ por dominadores e dominados. O lugar natural do grupo
suma, deslocando-se do campo para a cidade, ou d v.
0 Ardeste branco dominante são moradias amplas, espaçosas, situa-
LuSar de negro
0 golpe de 1964, 0 novo modelo econômico e a população negra 23
sões tais como “Brasil: Ame-o ou deixe-o”. Propaganda e um tema cuja complexidade, dada a multiplicidade de suas
variantes, não permite uma visão unitária. Afinal, nós, ne
publicidade firmes em cima, fazendo a cabeça; muito riso,
gros, não constituímos um bloco monolítico, de caracte
muito brilho, muita assepsia, muito perfume. Muita festa,
rísticas rígidas e imutáveis. Os diferentes valores culturais
grandes carnavais... Enquanto isso, dos subterrâneos do
trazidos pelos povos africanos que para cá vieram — ioru-
regime emanavam odores pestilenciais, acompanhados de
bás ou nagôs, daomeanos, malês ou muçulmanos, angola
choro e ranger de dentes. Curioso que provenientes de jo
nos, congoleses, ganenses, moçambicanos etc. —, apesar
vens dessa mesma classe média.
da redução à "igualdade”, imposta pela escravidão, já nos
Sabemos que as contradições internas do modelo vi
levam a pensar em diversidade. Além disso, os quilombos,
gente, aliadas à crise do petróleo, acabaram por desmas
enquanto formações sociais alternativas, o movimento
carar o milagre . Não foi por acaso que o governo Geisel
revolucionário dos malês, as irmandades (tipo Nossa Se
iniciou-se sob o signo da distensão. E também não foi por
nhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos), as
acaso que diferentes setores da sociedade civil começaram a
sociedades de ajuda (como a Sociedade dos Desvalidos de
desencadear seu processo de contestação ao regime durante
Salvador), o candomblé, a participação em movimentos po
aquele governo. Foram os estudantes que deram o alerta
pulares etc. constituíram-se em diferentes tipos de resposta
geral em termos de movimentos e conquistas populares...
ao regime escravista. Por outro lado, que se pense nos ciclos
26
Lu8ar de negro
Movimento ou movimentos negros? 27
neada, não dá. Como não daria pra falar do movimento papos, algumas escritazinhas próprias, alguma prática, as
de mulheres, por exemplo. No entanto, a gente fala. Exa sim como da entrevista que fiz com três companheiros: Ha
milton (mnu/sp), Astro (mnu/rj) e Paulo Roberto (Instituto
tamente porque está apontando para aquilo que os dife
de Pesquisa das Culturas Negras, ipcn, do Rio).*
rencia de todos os outros movimentos; ou seja, a sua espe
cificidade. Só que nesse movimento, cuja especificidade é
o significante negro, existem divergências, mais ou menos
fundas, quanto ao modo de articulação dessa especificidade.
Deve o negro assimilar e reproduzir tudo o que é euro-
branco? Ou só transar o que é afronegro? Ou somar os dois?
Ou ter uma visão crítica de ambos? Deve o negro lutar pra
encer na vida através do seu esforço pessoal para, desse
odo, provar que é tão capaz quanto o branco? Ou lutar
* Lélia Gonzalez se refere a Hamilton Cardoso, Astrogildo Esteves
com e pelo conjunto da população negra? Juntamente Filho e Paulo Roberto dos Santos. Salvo indicação em contrário, todas
com as notas de rodapé são da presente edição.
nao negros também oprimidos? Ou não? Por um espaço
Experiências e tentativas
29
30
Lugard^egro
Experiências e tentativas 3i
Dependendo do tlp„ de atividade des
Oe™»Se0„sidelá4a!cornoen dMo-
Em suma, esses dois tipos de entidades negras remetem-nos
zx::rrés,cordõe!'mar’“,us'™ch“'
masiuIt S"S“laS
a Frente Negra Brasileira (1931-8), buscou sintetizar ambas as
práticas, na medida em que atraiu os dois tipos de entidade
para o seu seio. Por aí, dá para entender também o sucesso de
-«dade^Qn'"0^ 8r“d' »— *
sua mobilização. Afinal, ela conseguiu trazer milhares de ne
dos abre.alas 37a s,8nífcaçto d° >■“' gros para os seus quadros. Precedida pelo trabalho de uma im
elas se„pre prensa negra cada vez mais militante, a fnb surgiu exatamente
mpostas por tais " • Submeter às regras no grande centro econômico do país, que era e é São Paulo.
ração de negros ldades • Afinal, qualquer aglome-
Mais exatamente, na cidade de São Paulo, estendendo-se para
(um exemplo bem pr' • encarada
a**3 a corno caso de polícia outros municípios do interior. Com isso estamos querendo
bl°C0 negro de Salvad^ 0 de HÓS
lIÍ10 nós refere 'se a um famoso
refere-s,
ressaltar o seu caráter eminentemente urbano, uma vez que
lOr’ 0 Raches;
nais daqueia cidade n uues, que se consultem os é o negro da cidade que, mais exposto às pressões do sistema
a eP ?ara se ter
a Perseguiçã0 poupai a Uma da violência dominante, aprofunda sua consciência racial.
Policial de
ter s'do compie^^ ' 1Ue foi objeto, a pomo Por outro lado, a industrialização e a modernização, que
mente d,
4ue os tei Nã„ esqueçamos, se dão a partir de São Paulo para o resto do país, farão com
3°"^ lí.u„:a3^esat„.bM,elra,
;andomblé, que a organização política do negro encontre ali suas forças
3
aS entldades culturais de m iente-D
regist:
' Deequal
"> Pd-. de expressão mais avançadas. É em São Paulo que se inicia
o processo de integração do negro na sociedade capitalista,
na medida em ;itlsidode
de
sobretudo nos anos 1930, quando a imigração europeia é
sihilitaram ao mesmo tempo ansarein 0 'Ult ' ^P^
interrompida pelo governo Vargas. É por aí, também, que
Polírica, preparadora do advento^
exercíci,
:nt0 d°s m<°vitnept se compreende por que a fnb constituiu-se num dos setores
de caráter ideológico ’Ca
°snegros mais atrasados do operariado paulista (embora, a partir de
um racha interno, a Frente Negra Socialista lhe fizesse opo-
3* Lugar de negro
Experiências e tentativas 33
poetas. E nós, brasileiros de origem africana, como estamos? poesia, parte da luta contra a exploração social em todos os
Estamos no limiar de um novo tempo. Tempo de Àfrica- níveis, na qual somos os mais atingidos.
-vida nova, mais justa e mais livre, e, inspirados por ela, renas Cadernos Negros é a viva imagem da África em nosso con-
cemos arrancando as máscaras brancas, pondo fim à imitação. tinente. É a Diáspora Negra dizendo que sobreviveu e sobre
Descobrimos a lavagem cerebral que nos poluía e estamos as viverá, superando as cicatrizes que assinalam sua dramática
sumindo nossa negrurabela e forte. Estamos limpando nosso trajetória, trazendo em suas mãos o livro.
espirito das idéias que nos enfraquecem e que só servem aos Essa coletânea reúne oito poetas, a maioria deles da geração
que nos querem dominar e explorar. que durante os anos 1960 descobriu suas raízes negras. Mas
Cadernos Negros marca passos decisivos para nossa valori- o trabalho para a consciência negra vem de muito antes; por
açao e resulta de nossa vigilância contra as idéias que nos isso, Cadernos Negros 1 reúne também irmãos que estão na
luta há muito tempo. Hoje nos juntamos como companheiros
Criada por — nesse trabalho de levar adiante as sementes da consciência
>r um grupo de jovens negros e negras dedicado à literatura,
“Publicação de
* Cultura"'■e’rnos
Centro de NeZros teve início em 1978, em São Paulo, no
Arte Negra (Cecan). Tornou-se uma importante para a verdadeira democracia racial.
referenciada lit<
- -teratura afro-brasileira. OS AUTORES
36
LuZar de negro
Experiências e tentativas 37
as tentativas de manipulação por parte do Estado Novo, vão se transformando em empresas da indústria turística.
continuaram seu projeto de resistência cultural. E se nos Os antigos mestres de um artesanato negro, que antes diri
giam as atividades nos barracões das escolas, foram sendo
remetemos às escolas de samba, por exemplo, constata
substituídos por artistas plásticos, cenógrafos, figurinistas
mos que sua produção não deixava de expressar a resposta
crítica da comunidade negra em face dos dominadores. A etc. e tal. O cargo de presidente de ala transformou-se numa
profissão lucrativa com a venda de fantasias. Os sambas
guisa de exemplo, vale recordar o que Candeia e Isnard
foram simplificados em sua estrutura, objetivando não só
nos contam a respeito do desfile de 1940 da Portela, cujo
o fato de serem facilmente aprendidos como o de poderem
enredo era Homenagem à Justiça”; como o samba de
ser gravados num mesmo disco. Os “nêgo véio” da Comis
Paulo da Portela não foi bem ensaiado, “os componentes
são de Frente foram substituídos por mulatas rebolativas e
mudaram o sentido das palavras trocando ‘Salve a Justiça
tesudas. Os desfiles transformaram-se em espetáculos tipo
por Pau na Justiça ? Esse ato falho diz-nos muito mais
teatro de revista, sob a direção de uma nova figura: o car
re o que sentia e pensava a comunidade do que todos
navalesco. Levantaram-se arquibancadas para ricos, pobres
s de enredo que pintaram durante e depois do
Estado Novo. Segundo os mesmos autores, foi a partir e remediados, autoridades e povo, nacionais e estrangei
de t955 que elementos da elasse média branca passaram a ros, com a venda de ingressos nos respectivos preços. Tudo
requentar as escolas de samba. Como já vimos anterior- isso com a presença de jornalistas, fotógrafos, cinegrafistas
ente-tratar-se-ia de representantes dos setores progres- e câmeras de tv durante os desfiles. Estes, por sua vez, pas-
38
39
40
Lu^ar de negro
A retomada politico-ideológica 41
dançar bem. Isto, aliás, é um dado importante: quem dança face do soul foi de surpresa e temor (mas a polícia sempre
em
bem o soul, dança bem o samba De repente, o pessoal esteve lá para garantir a “ordem”); enquanto isso, a intelec
percebeu: “Bom, se o Big Boy pode fazer a equipe dele, eu tualidade progressista acusava-o de alienação, dizendo que
também posso me especializar nisso, ganhar dinheiro etc.”. crioulo tinha mais é que dançar samba...
Começam, então, a surgir equipes de negros. [...] Realmente Ainda segundo Carlos Alberto Medeiros, o Renascença
Clube inaugurou seus bailes-soul com as famosas Noites do
há um dado de alienação, há esse aspecto de fantasia, que faz
Shaft, ponto de encontro da turma que articulou o movi
parte da coisa toda. Mas, ao mesmo tempo que existe esse
mento negro no Rio. Nesse mesmo ano, 1974» o Centro de
dado, existe também um fator importante, que é o da agluti
Estudos Afro-Asiáticos e a Sociedade de Estudos da Cultura
nação. [...] No momento em que se pode perceber que “já que
Negra no Brasil (secneb, de Salvador), com a colaboração
eu posso me unir para fazer isso, eu posso me unir para fazer
do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, realizaram
uma coisa mais positiva”, isso se torna importante. É claro
as Semanas Afro-Brasileiras, no período que se estendeu de
que nem todo mundo faz essa passagem.3
30 de maio a 23 de junho, com exposição de arte afro-brasi
leira, experiências de danças rituais nagô, de música sacra,
Interessante notar que o soul foi um dos berços do movi
popular e erudita afro-brasileira. Tudo isso acompanhado
mento negro do Rio, uma vez que a moçada que ia aos bailes
de seminários e palestras, com a presença de 6 mil pessoas,
não era apenas constituída de trabalhadores, mas de estu
dantes secundários e universitários também. O fato é que a vindas de diferentes bairros e camadas sociais do Rio.5 A
negrada jovem da Zona Norte e da Zona Sul começou a se exposição de arte sacra (objetos litúrgicos segundo modelos
ruzar nesses bailes, que reuniam milhares de pessoas, todas tradicionais nagô-iorubá), recriação de símbolos e arte po
negras. O fenomeno também se estendería para São Paulo; e pular, foi organizada por Juana Elbein dos Santos e Mestre
se a gente pega um dos números doJorntgro4 e lê a entrevista Didi (o assogbá Deoscóredes Maximiliano dos Santos, do
gadinha (dezoito a vinte anos), a gente vê uma coisa, e Axé Opô Afonjá, de Salvador). Antes de chegar ao Brasil, ela
Tviv eSSenClak nã° é aUenada; t0d0S afirmam’ P°rílue fora apresentada em Lagos, Acra e Dacar, na África, assim
como em Paris, Londres e Buenos Aires. As Semanas foram
do outro, uma iniciativa oficial, acadêmica, transada não das crianças, da casa etc., o que é sintomático. De um
modo geral, esses machões eram de uma geração mais
em termos de “Oropa, França e Bahia”, mas, ao contrário,
velha, porque os mais jovens cresceram junto com suas ir
via “Bahia, África e Oropa”, e com muito axé em cima.
mãs de luta. Aliás, vale notar que não existe coisa mais ho
Pois é...
mossexual, e no pior sentido, porque não conscientizado e
A partir das Semanas, a “tiurma” entrou em contato com
assumido, do que o ressentimento sectário dos machistas.
0 Afro-Asiático, e passou a se reunir em suas dependencias.
De qualquer modo, o avanço das mulheres negras, dentro
Durante o decorrer da semana, encontravam-se duas vezes
do movimento negro carioca, marcaria sua diferença com
para preparar dois tipos de texto: um com o noticiário
relação a outras regiões (onde, hoje, o quadro é diferente,
peito de atos de discriminação e outro relativo ao perío
apesar dos pesares). No ano seguinte, em 2 de julho de
pré-colonial na África. Aos sábados, reunião geral para
cutir os textos, na base da dinâmica de grupo. No domingo, 1975, num encontro de mulheres realizado na Associa
estava todo mundo na Noite do Shaft no Renascença. A ção Brasileira de Imprensa,* lá estavam aquelas jovens e
cada reunião o grupo crescia. valentes negras, marcando sua posição num importante
Chegou um ponto documento, em que diziam:
em que as mulheres passaram a se
reunir separadam,
ente para, depois, todos se reunirem
numa sala maior, onde se di* O destino da mulher negra no continente americano, assim
È claro que pintou macbism.
^sentiam os problemas comuns.
como o de todas as suas irmãs da mesma raça, tem sido, desde
bem solidariedade e entendi:to e paternalismo, mas tam-
que eram os famosos atores da tv Globo; não eram todt manipular seus talões de cheques, impôs algumas tarefas de
Los
atores mas havia um grande número de atores que se reu caráter extremamente culturalista, que nos atrapalharam
nia — negros, todos negros — que se reunia na Zona Sul para cacete no Rio de Janeiro. E essas tarefas foram o quê?
básicas dessa agremiação, que não se pretende apenas uma rendadas, sambando sem parar. Com minha comissão de frente
escola de samba, mas um centro de cultura negra: digna de respeito. Intimamente ligado às minhas origens.
Artistas plásticos, figurinistas, coreógrafos, departamentos
riedade e colaboração não só dos amigos e colegas de eav A turma de São Paulo tomou conhecimento do que se
(que, juntamente com seus alunos, ajudaram na realização passava por aqui, através do Boletim do ipcn, e, então,
dos eventos), mas dos irmãos e companheiros do Olorum pintou por aqui para levar um papo. Esse foi o primeiro
Baba Min, do ipcn, do Ceba, da Sinba, da Zona Norte, da encontro de uma série que se realizaria em São Paulo,
Zona Sul, dos subúrbios, das favelas e até mesmo da África Rio Claro, São Carlos etc. As discussões se dariam em
55
o Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial 57
d“c„m„pnmeiraaav.
realiz’táuni
áproKJJ"
dCOntec'mentos discriminatórios contra
‘°’àsi8h3o,no
'ntra°s últimos
gras devem desempenhar o seu papel histórico em defesa
da comunidade afro-brasileira; e, lembramos, quem silencia
consente.
d, v“lê»d°s pela imprensa. negr^.ampiamente
Não podemos mais aceitar as condições em que vive o
homem negro, sendo discriminado da vida social do país,
1X1“',abriI’ **»* de vivendo no desemprego, subemprego e nas favelas. Não po
demos mais consentir que o negro sofra as perseguições cons
tantes da polícia sem dar uma resposta.
ba„ilfcl d ga'“ Tiert' f»»". TODOS AO ATO PÚBLICO CONTRA O RACISMO
por Seu ato 3 COn^anÇa de que não será punido PELO FORTALECIMENTO E UNIÃO DAS ENTIDADES
AFRO-BRASILEIRAS
Nós também sabemos
d"“Como toa. Que os processos desses casos não
°S os outros casos de discriminação Assinavam o documento os seguintes grupos e asso
raClal’Serãoapenas
is processos abafados e arquivados ciações: Câmara de Comércio Afro-Brasileira, Centro de
PelaSautoridadesd(
este País Arte e Cultura Negra, Associação Recreativa Brasil Jovem,
a^ntedatortura ora um dos casos tenha a
MaSOAtOPúblicoCoOnS&quente morte de um cidadão. Afrolatino América, Associação Casa de Arte e Cultu
tepúdio. e convidam °’ Racismo marcará fundo nosso ra Afro-Brasileira, Associação Cristã Beneficente do Brasil,
Jornegro, Jornal Abertura, Jornal Capoeira, Company Soul,
tQres democráticos que lu-
8rossaremfileira easinjusr. Zimbabwe Soul. Nas reuniões seguintes, a primeira se
ac stlças aos direitos humanos
atOCOnt—ismo 'lr,,dade afto-hrasí(eira nesse retirou e o segundo começou a se atemorizar com a re
Fazemosumconv.ti pressão. De qualquer modo, um grupo de membros do
d°Paisparaainpliari :e esPecial Cecan organizou-se com o Centro de Luta Decisão e levou
atodasas
ern ^osso eritidades negras
adiante a ideia de realização do Ato Público. Formou-se,
As entidades ne-
o Movimento Unificad° Contra a Discriminação Racial 59
dos atletas negros do Tietê veio ao nosso encontro para companheiro de lutas pela de ancestral (ou seja, faleceu,
segundo a expressão tradicional). E os já então companhei
informar sobre os acontecimentos; cabia-nos, agora, mobi
ros da Quilombo me indicaram para resumir e discutir
lizar as entidades negras cariocas. Abdias do Nascimento,
com os membros da ala dos compositores o enredo que ele
que chegara ao Rio alguns dias antes, proveniente dos Es
escrevera. Nei Lopes e Wilson Moreira (essas duas “feras”)
tados Unidos, topou logo participar do processo, E não dá tiveram o seu samba-enredo escolhido como o melhor,
para esquecer aquela tarde ensolarada em que a gente se dentre outros muito bons. E, num trecho do samba, eles
mandou para Coelho Neto, para levar um papo com Can dizem: “E os quilombolas de hoje em dia/ São candeia que
deia sobre a participação da Quilombo no Ato Público. Papo
nos alumia”...
vai, papo vem, ele nos presenteou com o folheto do enredo Além da Quilombo, o Renascença Clube, o Núcleo Negro
para o próximo carnaval: "Noventa anos de Abolição . Fora Socialista, o Ceba e o ipcn foram as associações cariocas que
escrito por ele, Candeia, "baseado nas publicações de Ed apoiaram o novo movimento e assinaram uma nota conjunta
son Carneiro, Lélia Gonzalez, Nina Rodrigues, ArthurRa de solidariedade que foi remetida para São Paulo. Enquanto
isso, naquela cidade, como vimos, ocorriam as primeiras de
mos Alípio Goulart”...
Surpresa e emocionada, disse-lhe que ainda não tinha fecções, determinadas pelo velho temor da repressão e pelo
um trabalho publicado digno de ter meu nome ao lado da não menos velho temor do comprometimento. Argumenta
queles cobras” (afinal, um artiguinho aqui, outro acolá, va-se que um ato público era algo de muito sério e, no caso,
até mesmo temerário. Felizmente a lucidez e a firmeza dos
de tempos em tempos, não significava nada). Ele retruco
dizendo que sabia muito bem do trabalho que eu vinh mais decididos não se abateu diante de tais receios.
Prefeitura de Salvador, dirigi-me para aquela cidade, na a organização política dos negros. Ora, esse clima e essa
primeira semana de maio, para dar um curso cujo título determinação já haviam pintado em diferentes pontos do
era: “Noventa anos de abolição: uma reflexão crítica”. 0 país, como já dissemos. Faltava esse Sete de Julho, garantia
entusiasmo dos debates com aquele público eminente simbólica de um movimento negro de caráter nacional.
mente negro e jovem deu-me a dimensão do que estava ...E estávamos todos lá, nas escadarias do Theatro Mu
ocorrendo com a moçada negra em diferentes pontos do nicipal de São Paulo. Muita atividade (distribuição da carta
pais. Representantes do Grupo Malê, do Centro de Estu aberta à população, colocação de cartazes, faixas etc.), muita
dos Afro-Brasileiros, assim como de blocos e afoxés de alegria, muita emoção. As moções de apoio chegavam e
Salvador, lá estavam, discutindo e reivindicando, denun eram lidas com voz forte e segura. A multidão aplaudia.
ção. Estamos nas ruas para denunciar as péssimas condições contra um povo inteiro. É esse racismo institucionalizado
de vida da comunidade negra. que dá segurança para a prática de atos racistas como os que
Hoje é um dia histórico. Um novo dia começa a surgir para ocorreram no Clube Tietê, como o ato de violência policial
P°lS a eleS também exigiremos justiça! Casos como esses são rotina em nosso país que se diz de-
quando toda umasociedadi Urri negro é lamentável, mas mos todos a engrossarem o movimento unificado contra a
um povo inteiro, ou se ssuni.«uudes,ad f ea discriminação RACIAL.
é trágico para nós nei Portanto, propomos a criação de centros de luta do moví-
0 resultado
62
CONTRA O RACISMO
Pais de família desempregados, filhos desamparados, sem
Hoje estamos na rua numa campanha de denú assistência médica, sem condições de proteção familiar, sem
ncia!
Campanha contra a discriminação racial, contra a opressão escolas e sem futuro. E é esse racismo coletivo, esse racismo
policial, contra o desemprego, o subemprego e a marginaliza- institucionalizado que dá origem a todo tipo de violência
contra um povo inteiro. É esse racismo institucionalizado
ção. Estamos nas ruas para denunciar as péssimas condições
de vida da comunidade negra. que dá segurança para a prática de atos racistas como os que
ocorreram no Clube Tietê, como o ato de violência policial
Hoje é um dia histórico. LJm novo dia começa a surgir para
que se abateu sobre Robson Silveira da Luz, no 44“ Distrito
o negro!
Policial de Guaianazes, onde esse negro, trabalhador, pai dc
Estamos saindo das salas de reuniões, das salas de confe
família, foi torturado até a morte. No dia iu de julho, Nikon
rências, e estamos indo para as ruas. Um novo passo foi dado
Lourenço, mais um negro operário, foi assassinado por um
na luta contra o racismo.
policial no bairro da Lapa, revoltando toda a comunidade c
Os racistas do Clube de Regatas Tietê que se cubram, pois
igiremos justiça. Os assassinos de negros que se cuidem, o povo em geral.
Casos como esses são rotina cm nosso país que se diz dc-
pois a eles também exigiremos justiça!
mocrático.
MENTO UNIFICADO contra a discriminação racial
E tais acontecimentos deixam mais evidente e reforçam a
P ser um instrumento de luta da comunidade
^gra.Este movimentn a justiça de nossa luta, nossa necessidade de mobilização.
balho de denúncia n ° É necessário buscar formas de organização. E preciso ga
raciai a manente de todo ato de discriminação
racial’ a c°nstante organÍ2 - rantir que este movimento seja um forte instrumento de luta
tarmos todo e QUai da COmunidade Para enfren'
qualquer tipo der^- permanente da comunidade, onde todos participem de ver
é trágico para nós negros; entar, ai então Portanto, propomos a criação de centros de luta do mov
0 resultado
mento unificado contra a discriminação racial, nos bair
62
LWnejr0
o Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial
63
CONTRA O RACISMO
Pais de família desempregados, fiihos desamparados, sem
Hoje estamos na rua numa campanha de denúncia! assistência médica, sem condições de proteção familiar s
I
Campanha contra a discriminação racial, contra a opressão escolas e sem futuro. E é esse racismo coletivo, esse racismo
policial, contra o desemprego, o subemprego e a marginaliza- institucionalizado que dá origem a todo tipo de violência
contra um povo inteiro. É esse racismo institucionalizado
ção. Estamos nas ruas para denunciar as péssimas condições
que dá segurança para a prática de atos racistas como os que
de vida da comunidade negra.
ocorreram no Clube Tietê, como o ato de violência policial
Hoje é um dia histórico. Um novo dia começa a surgir para
que se abateu sobre Robson Silveira da Luz, no 44° Distrito
o negro!
Policial de Guaianazes, onde esse negro, trabalhador, pai de
Estamos saindo das salas de reuniões, das salas de confe
família, foi torturado até a morte. No dia iQ de julho, Nikon
rências, e estamos indo para as ruas. Um novo passo foi dado
Lourenço, mais um negro operário, foi assassinado por um
na luta contra o racismo.
policial no bairro da Lapa, revoltando toda a comunidade e
Os racistas do Clube de Regatas Tietê que se cubram, pois
o povo em geral.
exigiremos justiça. Os assassinos de negros que se cuidem,
Casos como esses são rotina em nosso país que se diz de-
pois a eles também exigiremos justiça!
OVIMENTO UNIFICADO CONTRA A DISCRIMINAÇÃO RACIAL
mocrático.
E tais acontecimentos deixam mais evidente e reforçam a
P ser um instrumento de luta da comunidade
negra. Este movimento justiça de nossa luta, nossa necessidade de mobilização.
, deve ter como princípio básico o tra
balho de denúncia É necessário buscar formas de organização. É preciso ga
. * anente de todo ato de discriminação
racial, a COnstant
rantir que este movimento seja um forte instrumento de luta
tarmos todo e aual da “munidade para enfren-
^«tipoderacismo permanente da comunidade, onde todos participem de ver
^noss^^^
izo social que causa o racisto dade, definindo os caminhos do movimento. Por isso chama-
QuandouraapessoanjQgostade
quando toda umasocieaadi um negro élamentável, tnaS mos todos a engrossarem o movimento unificado contr
te assume atitudes racistas frente A discriminação racial.
um povo inteiro, ou se
nega a enfrentar, ai então o resultado
é trágico para nós n<tegros: Portanto, propomos a criação de centros de luta do moví
foi criado para ser u '.ADO CONTR. Casos como esses são rotina em nosso país que se diz de
.A A DISC
■«'Mínação racial mocrático.
negra. Este movim» m instrume.
■nto de lu
balho de denúnci; ento deve tei ta da comunidade E tais acontecimentos deixam mais evidente e reforçam a
r com»
va perm; '°prÍncíPiobásicootra.
racial, a constante anente de justiça de nossa luta, nossa necessidade de mobilização.
organiz. tOdOat°dediscrl-
tarmos todo e qual» •ação da minação É necessário buscar formas de organização. É precis g
'quer ti} CortlUnidadi
Todos nós sabei ípo de racisi le
para enfren- rantir que este movimento seja um forte instrumento d
•mos ■Dlo.
Quando uma o prejuízo
pesso. S°CiaIque permanente da comunidade, onde todos participem
quando tod.\a uma »a não gosta de 1 Causa o racismo. ■ Pnr isso chama
sociedade assu dade, definindo os caminhos do movimen
um povo in\teiro, » meatitUdes Rentável, mas
ou se nega a enfn mos todos a engrossarem o movimento unif
é trágico 'entar.ai
racistaSfr<
para nós; negros: ente a
ent5oo discriminação racial.
res“ltado luta do movi-
Portanto, propomos a criação de centr
ios bair-
mento unificado contra a discrim
”’s «la», „M PrÍsõeS, nos te o Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial 65
terreirOs de ‘rreiros de
Urr|banda, no,, candonlblé,nos
Samba, 'e trabalh, tas que levaríamos para a assembléia que se realizaria no
"“íêrejasp '°’nas e5colas de
J S’em todo iugarn
De lut, 'e o ne; dia 23 de julho na capital paulista. Dentre as propostas que
tização ’ate« a info levamos, destaco uma: a que sugeria o acréscimo do sig-
e Organi2açâo d ’rmaÇão’aconScien.
a c°munídade
nificante "negro” ao nome do movimento. Daquela data
fon, negra’ t0rnando-nos
e’ ativ° e comb,
em diante, passamos a ser o Movimento Negro Unificado
'Os os setores da „ontgt0I
Convida Socieclade brasiJeira Contra a Discriminação Racial. Nessa mesma assembléia
11105 os setores d,
nos aPoiem, 'emOC^osdasociedadi interestadual (São Paulo e Rio de Janeiro), reunida nas de
criando [asj !e para que
Verdadeirad, condiçõesnecessáril pendências da acbb, continuaram a pintar as divergências;
!ernocracia as Para criar uma
racial. os setores mais conservadores não deixavam de demonstrar
COhJTR
■AadiscrIM1n
'AÇÃo Racial seus receios em face das propostas mais avançadas dos se
c°NTr
AA OPRESSÃO
POUCIAL tores progressistas do movimento. Desnecessário dizer que
pSLAa
ampliação
pOR u
D° Movi^ent0 eles começaram a se afastar do projeto com que nos havía
'MAAUTáNTl,
■CA DEMOCRAcra
CU Racial mos comprometido. Após calorosas discussões, foi eleita
Pess°alm, uma comissão provisória que se encarregaria de elaborar
ente>não Poderei
^botnem o anteprojeto dos documentos básicos do mnucdr: carta de
esquecer a ima,
negro> lgem daquele
Podia ]e princípios, estatuto e programa de ação.
4°- ^rcou,arePr°duzidlo ,
-Aslá
ern yoz ajta o docu_
Dias depois, seguíamos para Salvador, Abdias e eu, a fim
1116 fhndo
do Paletó, °seu
passando de colocarmos os irmãos daquela cidade a par dos acon
Dia r °deenxugáaJaSnaman
0 braço 1105 olhos .lasn ga
Seguinte, tecimentos (também eles haviam enviado sua moção de
Primeira °S jornais
4 E n°tÍCÍ-a-em apoio ao ato de 7 de julho). Sua adesão foi imediata, assim
Charnada aboli, estávaitlo:
ÍÇão d ’StlOnonagési Manchetes de I como seu compromisso de comparecimento à Assembléia
Retorna a Cscravat 1110 ano após a
mos ■Ura. ! Nacional a ser realizada no Rio de Janeiro. Lá pelos fins de
AtOPúbUco.R,
3 '^^bleia d agosto, um grupo de intelectuais negros do Rio e de São
então Da d' aVabação do
’ Para di; Paulo seguiu para Belo Horizonte, a fim de participar da n
SCL>tir as „
as Propor Semana de Estudos Afro-Brasileiros, organizada pelo Insti
tuto Estadual d 0 Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial 67
° Patrimônio Histórico
Gerais. Tbd,
°S> à e^eção de um pert de Mi,
dentre toas dos ânimos. Mesmo assim, as discussões continuaram no
eSteS’doiserammemb
MNUCDRe
Ao regressarmos já tfnb maior entusiasmo. Lá pelas tantas, eram evidentes os sinais
C°missâl
«»>-gro.que;ee haD,os“^u.do pPtovisóna.
de cansaço, resultantes de tanta empolgação, de tanta en
a adesão de
um trega. Era bonito de ver aquela negada tão cheia de vida, tão
Vin*nto naquela cid e
Organizar
orno- ardorosa, mesmo que discordante, empenhando-se inteira
^iaacomu Gera“
Aparecer àassemblei tarnbém
Se compro-
a no Rio. naquela assembléia. E o lance mais incrível se deu quando o
n E;aÚltÍ-^irealI2ad.
!a nos dias o Io P TT . sono começou a ameaçar o andamento dos trabalhos. Já era
nas ^pendências d,
O IPCN Prp Setembr°’
Pau10’ Bahia, Mini■asGer ■ alta madrugada de segunda-feira; estávamos todos exaus
aS deJegações de São
tos, exauridos, mas com uma determinação que teimava
Casefluminen,
em transcender tudo isso. E era um tal de nego cochilando
emaspesoasqüeali
Para não
do Cimento, 11138 ^mbém^leger^C0611111611^05 ^^S*C°S aqui, outro acolá, outro mais adiante, todos insistindo em
rp-<
Passai*ostodo
Çara se afa;
S.
e
r°u-se praticamente
lniciavam os trabalhos.
exceção dos companheiros do Espírito Santo, que deixaram
para fazê-lo mais tarde) e se decidiu o posicionamento que
teríamos diante das eleições, mediante a noção de voto ra
a Vez da ndOe votando o estatuto.
de ação, o cial. Isto significava o estabelecimento de uma plataforma
^^-edo
quebrou. thn jOs 1 de programa das exigências da comunidade negra, primeiramente apre
deri■rotadasreti 8rUpOs r . Ordem
Çue sentada aos candidatos negros e, caso não a encampassem
tlrOu-sesob Ujas pr°Post Quase o pau
protes^o: :as *inh; (o que acabou ocorrendo), aos candidatos progressistas da
arn sendo
° e*qu. oposição, em seguida, para que a divulgassem durante a
lentamento
Lugar^negro
0 Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial
69
campanha e buscassem efetivá-la durante o mandato. Estes
últimos cumpriram ou tentaram cumprir a primeira parte, questão racial, diluindo-a mecanicamente na luta de cias-
nada fizeram com relação à segunda, exceto alguns belos ses (por aí se vê como certas posições de esquerda nada
discursos (o que a gente já previa). mais fazem do que reproduzir o mito da democracia racial,
Vale recordar aqui um fato muito interessante, que nos criado pelo liberalismo paternalista que elas dizem com
remete à ideologia do branqueamento. Como se sabe, ela con bater). De acordo com nossa companheira de mnu Neusa
siste no fato de os aparelhos ideológicos (família, escola, Santos Souza, em seu importante trabalho sobre o drama
igreja, meios de comunicação etc.) veicularem valores que, de ser negro no Brasil, tais mecanismos de ocultamento e
juntamente com o mito da democracia racial, apontam para negação são devidos ao fato de, em termos psicanalíticos, o
uma suposta superioridade racial e cultural branca. Vale branco ser vivenciado como ideal do ego. De nossa parte, de
notar que é justamente por aí, por essa articulação entre o acordo com as pesquisas de Cheikh Anta Diop, e também
mito e a ideologia, que se deve entender o caráter disfarçado numa perspectiva psicanalítica, a universal “fobia de negro”
do racismo à brasileira. Daí se segue que pessoas negras remetería justamente para o contrário. Mas isso é assunto
(pretas ou mulatas, porque dá no mesmo) internalizam para um outro papo, posto que a reprodução da ideologia
tais valores e passam a se negar enquanto tais, de maneira do branqueamento é um fato concreto que só confirma o
mais ou menos consciente (o mesmo acontecendo com as que a Neusa diz. Isto feito, aqui vai o nosso relato.
(° mesmo
pessoas brancas", isto é, aquelas cujos traços revelam uma Fui designada pelos companheiros de movimento para
aquelas
ascendência negra, mas que são vistas como brancas; Ab- levar nossa plataforma política a um famoso e respeitado
<lue são
dias do Nascimento as chama de "brancoides"). Em suma, candidato da oposição, que é negro. Na sala de espera de
chama de
elas sentem vergonha de sua condição racial e passam a
sua seu escritório, fui abordada por uma jovem recepcionista,
desenvolver mecanismos de ocultamento de sua -‘inferio
morena queimadinha”, que foi logo me dizendo: “Escuta
ridade”. Esses mecanismos recobrem um amplo quadro de
aqui, minha filha, se você veio aqui para pedir emprego ao
racionalização que vai desde um efetivo ra •
dr------ - nem adianta, porque ele não vai te receber . Por aí
sas (negros ou “brancoides” que, por palavras e às
racismo aves- se vê que, de acordo com sua bela cabecinha, uma crioula
gostam de preto”) até a atitude “democrática”
atOs> ‘não querendo falar com o candidato só podia ser para pedir
^nega a
emPrego... Depois de uma verdadeira odisséia, consegui
Lu&rde
ser levada à presença do dr.___ , que leu atentamenten<%r0 0 0 Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial 7t
s„a-
mento de multa.
■onaheecida^zv
esu]tantes de r- —1 entre
de^ lr>os,
o nosso movimento, pois definimos pontos programáticos,
data para a reunião preparatória do Congresso de Culturas
pCriais a ^«onada em
°U de cor.
•sHieitaa Negras das Américas e tiramos um documento nacional do
e Paga-
Dia da Consciência Negra.6
Na verdade, fiCo 0 Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial
>U 73
estabelecido o Vinte de
c°mo o Dia Nr .
. lacional da Consciência Negra. Nos Novembro
A ZUMBI
tes, tería:mos os atos públicos, as passeat;
anos seguin
20 DE novembro: dia nacional da consciência negra
manifestação, ocorrendo em nível te outras formas de
sões de um assentimento: o da nacional enquanto expres- Nós, negros brasileiros, orgulhosos por descendermos de
ao empenho do mnu, ampliand* comunidade negra. Graças zumbi, líder da República Negra de Palmares, que existiu
do Grupo Palmares, o Vinte d»lo e aprofundando a proposta no estado de Alagoas, de 1595 a 1695, desafiando o domínio
num ato políticoO de aíirm e Novembro transformou-se português e até holandês, nos reunimos hoje, após 283 anos,
justamente naquilo em ação da história do povo negro, para declarar a todo o povo brasileiro nossa verdadeira e
de organização e de que ele demonstrou sua capacidade efetiva data: 20 de novembro, dia nacional da consciência
proposta de uma sociedade alternativa; negra!
na verdade, Palm,
ares foi o autêntico berço da nacionalidade
brasileira, ao se Dia da morte do grande líder negro nacional, zumbi, res
constituir como efetiva democracia racial, ponsável pela primeira e única tentativa brasileira de esta
e Zumbi, o simbob
lo vivo da luta contra todas as formas de
exploração. E hi belecer uma sociedade democrática, ou seja, livre, e em que
pje tamos aí”, constatando a importância da
iniciativa do m. todos — negros, índios, brancos — realizaram um grande
Nu, uma vez que grupos e entidades negras de
todo o pais se avanço político e social. Tentativa esta que sempre esteve pre
mobilizam em torno dessa data magna. E 0
Treze de M-. sente em todos os quilombos.
ada vez mais, caracteriza-se como data ofi-
ciai de órgã Hoje estamos unidos numa luta de reconstrução da socie
(o que é g emamentais, ou seja, como papo de branco
até coerente, pois a chamada abolição resolveu os dade brasileira, apontando para uma nova ordem, onde haja a
proble.■mas das classes dominante k
participação real e justa do negro, uma vez que somos os mais
Mas antes brancas e não
v.™!aOt.x.ode.de„OTCmbrodew8 oprimidos dos oprimidos', não só aqui, mas em todos os lugares
o nosso).
onde vivemos. Por isto, negamos o Treze de Maio de 1888, dia
AO POVO BRASILEIRO
Mulher (promovida pelo Conselho Mundial das Igrejas), e para prisão cautelar indicavam a principal vítima do sis
Veneza, 1979; Conferência Alternativa da Década da Mu tema: a população negra, para variar. Os linchamentos já
lher, Copenhague, 1980; “Sanções contra a África do Sul” se sucediam e a pena de morte já era vista como "natural”
pelos vários setores da classe média (duramente atingi
(promovida pela onu), Paris, 1981;
da pelo "pacote de dezembro”, ponto de partida para o
Palestras (Estados Unidos, Europa e África: Senegal,
seu empobrecimento progressivo). Diante de tal quadro,
Alto Volta e Mali), entrevistas (imprensa falada, escrita
os congressistas votaram a execução das seguintes campa
e televisada dos três continentes citados), manifestações
nhas articuladas: “Mais empregos para os negros” e "Con
(Dia da Libertação Africana, 25 de abril; vale ressaltar
tra a violência policial”. O desdobramento desta última,
que o Dia Nacional da Consciência Negra, o nosso
no momento que as bombas estavam aí, explodindo pelo
nte de Novembro, foi comemorado em Londres em
1980) etc. país, levou nossos companheiros de Minas a marcarem
O 1 Congresso d» o fato de que a população negra é objeto de um terror
o mnu significou um grande passo em
termos de luta política do cotidiano.
do Rio de janeiro, São P, negro. Reunindo delegados Também nós, mulheres negras, além da denúncia do
Bahia,
'aulo,série
Grande do Sul, avançou uma de Minas Gerais e Rio branqueamento do homem negro, em termos de casa
posteriormente confirmadas. AoanaIisa:
questões que seriam mento, discutimos os problemas relativos à educação de
cional, os congressistas avaliaram r a conjuntura na- nossas crianças, controle da natalidade, assim como nossa
da violência: na medida em que corretamente a questão
participação no processo de libertação do povo negro e na
com ela a aproximação da crise a abertura" se fazia, e
luta contra o racismo. Analisamos também a situação da
ec°nômica, haveria
uma mui egra enquanto empregada doméstica no quadro
1
darePr°dução do o Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial
8i
racismo (inclusive por parte de muitas
militantes bra
ncas do movimento de mulheres),
conquistou espaços políticos que exigiram esse avanço por
Quanto à
questão da cultura negra, sérias críticas foram parte delas. Hoje não da mais para sustentar posições cul-
dirigid.
as ao processo de comercialização e folclorizaçâo turalistas, intelectualistas, coisas que tais, e divorciadas da
que ela tem sofrido por parte das secretarias e agências de
realidade vivida pelas massas negras. Sendo contra ou a
turismo. Conscientes da impossibilidade de deter a invasão favor, não dá mais para ignorar essa questão concreta, co
capitalista, reivindicamos a profissionalização dos produto locada pelo mnu: a articulação entre raça e classe. Por outro
res de cultura popular. Era a consciência de que sobretudo lado, o advento do mnu e a difusão de sua proposta polí
as entidades negras de massa haviam se transformado em tica, objetivada em seu programa de ação e em sua carta
se de princípios, inspiraram a criação de diversas entidades
empresas; consequentemente, por que não pagar salários
para passistas, bateristas, compositores e outros membros e grupos negros em vários pontos do país. Finalizemos,
natos das escolas de samba? então, com o texto de nossa carta de princípios:
seu nome foi simplificado para (o que já se fazia na prática) ou nos cabelos sinais característicos dessa raça —, reunidos
Movimento Negro Unificado (mnu). em assembléia nacional, convencidos da existência de:
À guisa de conclusão deste depoimento, não podemos - discriminação racial
deixar de ressaltar que deste d»
o advento do - marginalização racial, política, econômica, social e cul
que o advento do
mais importante salto qualitativo nas mnu da comuni-
lutasconsistiu no tural do povo negro
salto qualitativc
dade negra brasileira na década de 1970. Vale notar que - péssimas condições de vida
na década d<
s entidades culturais que, de um modo ou de outro, se - desemprego
distanciaram do mnu (por que, de
discordarem de sua proposta ou
mnu (por discc - subemprego
por falta de clareza política), foram obrigadas a se posicio-
areza política), fora - discriminação na admissão de empregos e perseguição
narem de maneira maUiva; justamente porque o mnu
mais incisr racial no trabalho
- condições sub-humanas de vida para os presidiários
0 Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial 83
de negro
maioria
PELA LIBERTAÇÃO DO POVO NEGRO!
fJ
t9
negro CfllllS
ÜRCULA
1
. HSIINII
lR