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Introdução

A presente pesquisa pretende entender como a obediência às diretrizes de Moscou e a


construção política efetiva das diretivas estabelecidas pela IC se articularam no Partido
Comunista do Brasil. Tentaremos entender, à luz de documentação existente no Centro de
Documentação e Memória (CEDEM) da Unesp e no Arquivo Edgar Leurenroth, na Unicamp,
do jornal A Classe Operária e da Revista La Correspondencia Sudamericana como as
relações entre a Internacional Comunista e o Partido Comunista do Brasil foram estabelecidas,
quais os níveis de obediência dos comunistas brasileiros, como era estruturada a relação de
poder e, por fim, quais os efeitos práticos das ordem de Moscou sob o cotidiano militante na
organização brasileira.

A III Internacional Comunista (IC) ou Comintern foi fundada em março de 1919 e


passou a existir como fruto da articulação internacional de comunistas de todo o mundo.
Estava baseada na luta contra o imperialismo, o colonialismo e na perspectiva da revolução
mundial. Lênin foi o organizador e inspirador da Comintern, defendendo um marxismo
revolucionário. Sua articulação acontecia nos partidos comunistas que, paulatinamente, se
espalhavam ao redor do mundo. Os partidos que faziam parte da IC, possuíam o direito de
participar de seus Congressos. Lá, materializavam as relações com o movimento internacional
do comunismo, compartilhavam informações teóricas e práticas, no geral, para estruturar em
seus países o levante do proletariado: a revolução mundial.

Durante os debates iniciais no I Congresso da Internacional Comunista, 2 a 6 de março


de 1919, em Moscou, houve pequena representatividade, poucos partidos estavam
organizados, um dos pontos foi a dificuldade de acesso a Rússia Soviética (FERREIRA, 2016,
p.81), o que derivou à chegada de outras delegações após o encerramento. Os alemães foram
contra a criação da III Internacional, por acreditar que não haveria uma quantidade expressiva
de pessoas. De toda forma, os ânimos estavam eufóricos, as oportunidades ocasionadas pela
Revolução Bolchevique propiciavam nesse contexto histórico o levante da classe do
proletariado, para a internacionalização do movimento.
Na abertura do congresso, Vladmir Lenin apresentou as “Teses e Relatórios sobre a
democracia burguesa e a ditadura do proletariado”, enfatizava a necessidade em se instaurar
a ditadura do proletariado. Oposta a falácia burguesa sobre a democracia, ainda de acordo
com Lenin: “é a repressão violenta da resistência dos exploradores, uma ínfima minoria da
população, os latifundiários e os capitalistas1”, no qual, esse modelo de governar,
1
https://www.marxists.org/portugues/lenin/1919/03/04.htm#topp acesso em 28 de janeiro de 2020
possibilitaria aos párias sociais, estarem à frente do movimento. O sucesso viria através dos
comunistas, que tinham vivenciado revoluções e experienciado a opressão em seu seio
constitucional, os ânimos afloravam pós-revolução Russa de 1917.
O livro História da Internacional Comunista (1919-1943), de Pierre Broué (2017, p.
106) proporciona um fio condutor para analisarmos os primeiros passos da IC. Durante a
ascensão e queda do movimento, que passou a ser inserido globalmente em outros países,
tivemos uma quantidade expressiva de documentos sobre a Internacional, a abertura parcial
dos arquivos de Moscou proporcionou pluralidade no fazer historiográfico, assim para não
perdermos o fio, seguiremos os rastros, da causa proletária mundial, presente no Partido
Comunista do Brasil.
Em 1919, os principais dirigentes foram Trotsky, Rakovsky, Zinoviev, Platten, junto
obviamente a Lenin, que por encarar o dever de administrar a Rússia Soviética, não poderia
estar na presidência, de forma, que coube a Zinoviev, assessorado por Bukharin a tarefa de
presidir a Internacional (BROUÉ, 2007, p.108).
Os funcionários em sua maioria eram russos, que as vicissitudes da guerra civil
privaram de seu meio ou que, tendo militado fora da Rússia antes da guerra, eram úteis por
ligações pessoais, outros, eram estrangeiros refugiados (BROUÉ, 2007, p.109). Obviamente,
para ser internacional deveria estar em outros espaços, os birôs foram ampliados ao longo da
Europa.
Na Ucrânia, foram preparados emissários em diversas frentes para propagar o
comunismo estabelecendo contatos, aparentemente é um princípio simples, “espalhar a
palavra”, o que causou dificuldade foi o despreparo de alguns emissários, junto a ineficiência
de articulações. Na Alemanha, houve maior sucesso, ao adotarem o princípio de Lênin de
“instalar um birô com pessoas mais experientes, forjadas na clandestinidade e capazes de
assuntos financeiros (BROUÉ, 2007, p.113) ”.
A estratégia de divulgação e alianças sobre a Internacional prosperou, atraindo e
ampliando a participação dos delegados e organizações, tivemos no II Congresso da
Internacional, em julho de 1920, a presença de 217 delegados e 67 organizações (BROUÉ,
2007, p. 197). Uma das principais determinações foram as condições para admissão na IC,
entre elas, esteve a veiculação do órgão comunicacional que deveria estar em “mãos”
genuinamente comunistas, a rotina e popularização da ditadura do proletariado deve, manter-
se viva nas mentes dos trabalhadores2. De maneira que, a ideologia deveria ir de encontro à
prática, por exemplo, é importante que se fizesse ecoar mundialmente a frase “Trabalhadores
2
https://www.marxists.org/archive/lenin/works/1920/jul/x01.htm acesso em 28 de janeiro de 2020
do mundo, uni-vos”, do Manifesto do Partido Comunista de Karl Marx e Friedrich Engels. No
entanto, deveria ser de igual modo praticada, possibilitando aos trabalhadores entenderem o
potencial do poder de sua união, identificando os problemas do modo capitalista de atuação,
ao qual estavam sendo subjugados.
Havendo a possibilidade de resistência nos países, dominados pela burguesia, essa que
não deveria ser tida como confiável, os comunistas deveriam articular-se ilegalmente, para
que no momento exato, ajudassem na ascensão do Partido 3. As células comunistas deveriam
atuar nos sindicatos, sempre filtrando possíveis “invasores” no meio comunista, e ao serem
identificados deveriam ser denunciados e expulsos4. Todas as resoluções da Internacional
deveriam ser adotadas imediatamente por todos os partidos filiados. Deveriam alterar a
nomeação para “Partidos Comunistas”, nesse campo de luta era importante demarcar a causa
do trabalhador comunista, através da identificação da bandeira comunista. Em 1922, o Partido
Comunista do Brasil, tentará adentrar à IC. Sem sucesso, pois não atende aos pontos
apresentados no II Congresso. Apenas em 1924, ao adaptar suas pautas ao Comitê Central de
Moscou, ocorrerá sua inserção.
O III Congresso da Internacional Comunista ocorreu em junho de 1921, contou com a
presença de 605 delegados, das 103 organizações e 52 países 5, um dos números mais
representativos da Internacional Comunista. Um dos debates apresentados, pontuou que os
objetivos traçados nos congressos anteriores, estava longe de serem alcançados. Divergindo
dos momentos de euforia e otimismo, que transbordava nas outras discussões do I e II, usou o
momento para refletir à urgência da causa, que transitou em diferentes espaços, com
finalidades divergentes.
Após as discussões sobre à Ação de Março 6, as articulações da reação capitalista era
marcada pela crise das democracias liberais e o surgimento de ditaduras em países vizinhos 7,
com ênfase na Itália, que atacou os principais grupos de esquerda, que já dialogava com o
fascismo, apoiados pela burguesia. Lênin se preocupava com as diferentes frentes que a
Internacional tomava, pois estavam perdendo espaço na luta, que deveria preservar a união. É
complexo pensarmos, que lutar pela união, caracterizava um caldeirão de opiniões diferentes,
no qual, a finalidade era a causa comunista, mas tinham suas interpretações de como deveria
ocorrer, ao pensarem às etapas para se propagar a ditadura do proletariado.
3
Idem
4
Idem
5
BROUÉ, Pierre. História da Internacional Comunista (1919-1943). São Paulo: Sundermann, 2007. p.289
6
Explicar aqui, o que foi
7
FERREIRA, John Kennedy. Do socialismo utópico ao científico na América Latina: Apontamentos sobre o
encontro do Comunismo latino americano e III Internacional Comunista. 2016. USP. p. 95
O surgimento do movimento comunista no Brasil foi oficializado a partir do Partido
Comunista do Brasil em 1922. Alguns dos militantes não possuíam conhecimento amplo da
causa comunista já que alguns derivavam do movimento anarquista, mas ficaram
entusiasmados com os rumos da Revolução Bolchevique de 1917. Uma das razões para a
organização do I Congresso do Partido Comunista do Brasil se dava no interesse em ser aceito
como membro efetivo da IC.

Enviaram um delegado representando a comissão brasileira ao IV Congresso da


Internacional Comunista que não obteve sucesso na aderência do PCB à IC. O partido ficou
aceito como membro simpatizante. O partido brasileiro conseguiria sua efetivação apenas no
ano de 1924.

A repressão política do governo brasileiro mantinha quase nulas as possibilidades de


existência pública do PCB. As articulações feitas entre os militantes, embora majoritariamente
clandestinas, obedecia à tática da frente única, seguindo as orientações de Moscou. Tratava-se
de uma aliança com a pequena burguesia. A criação de um Bloco Operário e Camponês se
deu, inspirado na tática frentista, lançando candidatos representantes dos trabalhadores, não
necessariamente ligados ao PCB, para não haver impedimento do governo na eleição.

Paulatinamente, a construção da aliança pequeno-burguesa, enquanto também


mudavam as orientações de Moscou. A tática passou a ser questionada, a partir das mudanças
políticas na direção da Internacional Comunista, em que a tática de classe contra classe foi
instituída em 1928. Dessa forma os comunistas não poderiam se unir, a nenhuma outra classe,
e, se o fizessem, deveriam estar na direção do processo. No plano organizativo, os intelectuais
que formaram o PCB na década de 1920 foram desalojados dos espaços de direção para dar
lugar a representantes “reais” da classe trabalhadora na direção do Partido, num período
chamado “obreirismo” acarretando consequências importantes à história do PCB e do
comunismo brasileiro.

A História da Internacional Comunista vem sendo debatida ao longo do século XX e


XXI

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