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A FORMAÇÃO INICIAL DE EDUCADORAS

E A CONSTRUÇÃO DO DISCURSO EM ESPAÇO 2909


03 a 06 de setembro de 2018 Anais do VII ENEBIO – I EREBIO NORTE ISBN 978-85-8857-812-8

A FORMAÇÃO INICIAL DE EDUCADORAS E A CONSTRUÇÃO


DO DISCURSO EM ESPAÇO DE EDUCAÇÃO NÃO FORMAL

Gabriela Gotlieb Ribas (UFABC)


Patrícia Sessa (UFABC)

Resumo: O presente trabalho consiste na investigação do discurso construído em um contexto de


mediação em espaço de educação não formal na cidade de São Paulo - SP, à luz da formação dos
educadores da instituição. As construções dos discursos de duas educadoras em formações distin-
tas (Bacharelado em Pedagogia e Licenciatura em Ciências Biológicas) foram analisadas por meio
da análise textual discursiva, e os dados obtidos a partir do acompanhamento de visitas guiadas e
entrevista semiestruturada, evidenciaram como as educadoras trabalham as interações e conteúdo da
exposição por meio dos diálogos e intervenções pedagógicas.
Palavras-chave: Construção de discurso; educação não formal; formação inicial; estágio curricular

Introdução

O
espaço não formal de educação não indica que não há uma formalidade ou uma lógica
educacional, o que difere do âmbito escolar são as maneiras como as relações acontecem. A
educação formal e não formal pode acontecer concomitantemente pois a primeira cumpre
outra função no escopo educacional, a de “garantir a transmissão dos conteúdos socialmente acu-
mulados, sistematizando-os” (GARCIA, 2009, p. 36). Já a educação não formal e a informal estão
presentes em todos os espaços e vivências da construção dos cidadãos. Nesse sentido, Paulo Freire
destaca:

Se estivesse claro para nós que foi aprendendo que aprendemos ser possível ensinar,
teríamos entendido com facilidade a importância das experiências informais nas ruas,
nas praças, no trabalho, nas salas de aula das escolas, nos pátios dos recreios, em que
variados gestos de alunos, de pessoal administrativo, de pessoal docente se cruzam cheios
de significação (FREIRE, 1997, p. 44).

No espaço expositivo das instituições museais, as informações visuais, táteis, auditivas e


demais aparatos interativos tem como objetivo informar, cativar e divulgar conhecimento. No caso
dos museus e exposições com temáticas específicas, como as científicas, há a preocupação com a
divulgação e alfabetização científica. Krasilchik e Marandino (2007) apontam para a importância
de a alfabetização científica como dever e responsabilidade de diversos profissionais além da própria
sociedade e colocam os espaços de educação não formal como de grande contribuição na alfabetiza-
ção científica dos cidadãos. Para isso, é importante considerar os discursos utilizados nesses espaços,
sobre eles Marandino destaca Simmoneux e Jacobi:
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O discurso expositivo é fruto de adaptações e transformações de vários outros discursos


– científico, educacional, comunicacional, museológico, entre outros – determinadas
pelas finalidades e objetivos da exposição e também pelas especificidades de tempo,
espaço e objetos nos museus, que, por sua vez, configuram certa linguagem específica de
comunicação com o público (SIMMONEUX, JACOBI, 1997 apud MARANDINO,
2008, p. 20).

O discurso do educador ou educadora então configura vital importância para a experiência


que os públicos terão ao visitar a exposição. Marandino evidenciando Garcia prescreve que “consi-
derando a extensão da instituição museal por meio de seu discurso, esse profissional deve se valer da
sua abordagem pessoal para reformular conteúdos acessíveis a todos os frequentadores de museus”
(GARCIA, 2006 apud MARANDINO, 2008, p. 23).
Sendo assim, esses educadores não devem se restringir em apenas repetir as informações
do que está em exposição, Pugliese aponta que eles devem “se valer da sua abordagem pessoal
para reformular conteúdos acessíveis a todos os frequentadores de museus” (GARCIA, 2006 apud
PUGLIESE, 2015, p. 196). Explicita ainda, aproximando o papel do educador ou educadora com
o do professor ou professora, que “esse processo deve ser feito de modo a garantir a correção concei-
tual, mas, ao mesmo tempo, promover a aproximação das ideias expostas pelo público, levando-o a
refletir, a perguntar, a duvidar e a querer buscar mais e novas informações sobre o tema abordado”
(Idem). Papel que se entrelaça ao do professor, cuja atuação também pode ser considerada na edu-
cação não formal.
Portanto, é de extrema importância que a formação inicial do professor considere em suas
práticas pedagógicas a atuação deste profissional também nos espaços de educação não formal,
“expandindo assim a discussão do Ensino de Ciências no contexto da alfabetização científica para
diferentes espaços educativos” (PUGLIESE, 2015, p. 197). Este ensaio visa então identificar a abor-
dagem comunicativa no discurso de duas educadoras em formação inicial em atuação no espaço não
formal de educação.

Análise dos discursos e da Abordagem Comunicativa


Os discursos construídos pelas educadoras foram considerados neste ensaio para fins de
análise, seu enunciado e o contexto de produção a que estão submetidos. Maingueneau aponta que
os discursos devem ser analisados por mais do que o enunciado diretamente explicitado. Amossy
(2005) ao mencionar o autor diz que “as análises do discurso praticadas por Maingueneau, Amossy
e Haddad indicam por vias diversas a necessidade de considerar a posição do locutor como ser empí-
rico no campo em que ele se situa (político, intelectual, literário ou outro)” (MAINGUENEAU,
1894-1995 apud AMOSSY, 2005, p. 25).
Macedo (2008) ainda destaca que a análise deve considerar a heterogeneidade dos discursos
com atenção voltada à aspectos que fogem à simples explanação de palavras, mas considerar tam-
bém “ao silêncio, ao não verbalizado, ao que foi explicitamente incluído, ao tom da voz e, mesmo,
às falas que se esvaziam de sentido para aquilo que está sendo discutido” (MAINGUENEAU, 1989,
apud MACEDO et al, 2008, p. 652).
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As pesquisas em torno dos discursos têm acontecido em novas direções, sobretudo na área da
educação, relacionados às abordagens comunicativas no processo de ensino e aprendizagem. Assim
como Maingueneau exige o contexto para a análise, as relações na área da educação demandam
pesquisas acerca da “...forma como os significados e entendimentos são desenvolvidos no contexto
da sala de aula” (MORTIMER; SCOTT, 2002, p. 284).
Mortimer e Scott (2002) apresentam ferramentas que visam analisar os discursos utiliza-
dos por professores para guiar as interações de significação na sala de aula. Estas ferramentas têm
embasamento nos gêneros discursivos descritos por Mikhail Bakhtin que se fundamentam na ideia
de que “cada esfera na qual a linguagem é usada desenvolve seus tipos relativamente estáveis de
enunciados. A isso nós podemos chamar de gêneros de discurso” (BAKHTIN, 1953/1986 apud
MORTIMER; SCOTT, 2002).
A análise proposta por este estudo usará o aspecto de Abordagem Comunicativa dentro do
escopo de ferramenta idealizada por Mortimer e Scott. O papel central da Abordagem Comunicativa
na análise dos discursos está relacionado ao como as educadoras - no caso deste estudo - trabalham
as interações e conteúdo da exposição por meio dos diálogos e intervenções pedagógicas. Na fer-
ramenta proposta por Mortimer e Scott, a abordagem comunicativa pode acontecer por meio de
quatro classes. As duas primeiras têm relação com a natureza dessa interação e pode ser classificada
em Dialógica ou De Autoridade. As duas classificações restantes se relacionam com a presença ou
ausência de mais de uma pessoa expressando sua opinião nessas interações, podendo ser uma relação
Interativa ou Não Interativa a depender da quantidade de ‘vozes’ ouvidas e consideradas no discurso.
Quadro 1 - Classificações propostas por Mortimer e Scott (2002) e suas dimensões a partir da combinação de cada grupo de
classes. Elaborado pela autora.

Na dimensão Interativo/dialógico, a educadora e os estudantes “exploram ideias, for-


mularam perguntas autênticas e oferecem, consideram e trabalham diferentes pontos de vista”
(MORTIMER; SCOTT, 2002, p. 288). Porém, na dimensão Não-interativo/dialógico a educa-
dora “reconsidera, na sua fala, vários pontos de vista, destacando similaridades e diferenças” (Idem).
Quando voltamos a atenção para os discursos De autoridade, há o aspecto Interativo/de auto-
ridade em que a educadora “geralmente conduz os estudantes por meio de uma sequência de
perguntas e respostas, com o objetivo de chegar a um ponto de vista específico” (Idem) ou ainda o
Não-interativo/de autoridade onde a educadora “apresenta um ponto de vista específico” (Idem).
Nessa perspectiva, o presente trabalho busca analisar quais as características comunicativas
dos discursos das educadoras em formação na condução da mediação com grupos de escola, mais
especificamente no que tange as abordagens comunicativas. descritas por Mortimer e Scott (2002),
quando em atuação em um espaço de educação não-formal na cidade de São Paulo – SP, durante o
segundo semestre de 2017.
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Metodologia
O ensaio tem como objetivo identificar a abordagem comunicativa nos discursos de duas
educadoras em formação inicial atuantes de um espaço não formal de educação. O estudo de caso
de abordagem qualitativa “visa à descoberta, à obtenção de respostas e à formulação de novas inda-
gações, enfatizando a interpretação de um contexto, retratando a realidade de forma completa e
profunda e permitindo a compreensão de uma instância singular” (LÜDKE; ANDRÉ, 2007 apud
FERRARI, 2014). A pesquisa envolveu a coleta de áudio durante visitas guiadas de duas educado-
ras, sujeitos da pesquisa, além de posterior entrevista semiestruturada com as mesmas.
Para análise dos dados coletados, foi feita a análise textual discursiva (ATD) que se caracte-
riza pelo movimento de seleção de unidades de significado em meio à interação entre os sujeitos,
considerando os contextos nos quais são produzidos. Estas unidades são organizadas em categorias
pelo pesquisador. As categorias emergem do exercício de interpretação do significado pelo pesquisa-
dor, que considera o espaço no qual o discurso foi construído. É uma ferramenta mediadora para a
produção de significados e por isso “se desloca do empírico para a abstração teórica, que só pode ser
alcançada se o pesquisador fizer um movimento intenso de interpretação e produção de argumen-
tos” (MORAES e GALIAZZI 2006, p. 118).
Tendo em vista a necessidade de considerarmos o contexto de produção do discurso para
buscarmos significados, vale explicar o local onde a investigação ocorreu, seus sujeitos de pesquisa e
o contexto da presente investigação.
A unidade SESC fica localizada no centro da cidade de São Paulo – SP e foi inaugurada na
década de 40, mas recentemente recebeu mais espaços no edifício que ocupa, tendo também maior
diversidade de programações, com os objetivos de fornecer ação educativa, propositiva e transfor-
madora para a melhoria das condições de vida dos indivíduos; serviços que contribuam para o bem-
-estar de sua clientela e melhoria de sua qualidade de vida; e contribuir para aperfeiçoar, enriquecer
e difundir a produção cultural (SESC, 2017).
Na ocasião das observações, o espaço de educação não-formal contava com uma exposição
sobre o mosquito Aedes aegypti, principal vetor de doenças como Dengue, Zika e Chikungunya
(BRAGA, I. A; VALLE, D., 2007) de produção realizada pelo Museu da Vida do Rio de Janeiro.
A exposição recebeu o nome de “Aedes: que mosquito é esse?” (FIOCRUZ, 2017). O objetivo foi
trazer para o centro de São Paulo a mostra a respeito dos hábitos e doenças que podem ser transmi-
tidas pelo mosquito assim como apresentar formas de prevenção de maneira lúdica e tecnológica.
(SESC, 2017).
As educadoras entrevistadas neste estudo ocuparam o cargo de estagiárias na exposição e
tinham como escopo de trabalho a mediação e a visita guiada de segunda à sexta feira das 13h às
19h. As escolas tinham visitas marcadas diariamente a partir das 14h. Eram grupos de 25 a 40 alu-
nos do ensino fundamental (I e II) ao médio. As educadoras, após acordo validado pelo Termo de
Consentimento Livre Esclarecido, cederam parte de suas visitas guiadas para registro de gravação
em áudio além de entrevista semiaberta que foram pautadas nas seguintes perguntas:
1) Qual o papel da exposição para os alunos?
2) A sua interação com os alunos influencia nesse processo?
3) Como você interage?
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4) Qual a origem do seu modo de interação?


5) Já aconteceu de aparecer outros pontos de vista acerca do assunto abordado? Se sim → Como você
lidou com a situação? Se não → Você investiga outros pontos de vista na sua interação?
6) Qual é, para você, o papel do educador em espaços de educação não-formal como este?
O registro dos áudios das visitas guiadas não ultrapassou 15 minutos de gravação e foram
feitos antes das entrevistas. Os trechos usados para análise foram compilados durante a análise assim
como as respostas das entrevistas. O perfil das educadoras assim como a denominação aqui utilizada
para a referência a cada uma delas está sistematizado no quadro 2.
Quadro 2 - Perfil das educadoras entrevistadas. Elaborado pela autora.

Análise e Discussão
Para fins de análise e melhor aproveitamento dos dados coletados, além de facilitar a relação
das dimensões de abordagem comunicativa de Mortimer e Scott (2002) com a formação das edu-
cadoras, apontamos duas categorias: a) Um discurso didático pedagógico com o fator dos conhe-
cimentos específicos decorrentes da formação, característica presente na Educ1 e b) Um discurso
didático pedagógico sem o fator dos conhecimentos específicos atribuídos à formação característica
presente na Educ2.
Muito embora a Educ2 tenha tido um embasamento teórico para poder atuar como edu-
cadora numa exposição que tem o tema ligado à biologia do mosquito, consideramos aqui que a
Educ1 tem maior familiaridade com os assuntos por ter tido maior gama de conhecimentos especí-
ficos e partiremos desse pressuposto para poder analisar a diferença nos discursos com relação a este
aporte de conhecimentos.

Discurso didático pedagógico com conhecimento específico


O discurso da Educ1 começa com perguntas acerca do que os alunos conhecem sobre o mos-
quito. Em seguida ela pergunta sobre o porquê é importante sabermos sobre o mosquito. Alguns
alunos se manifestam e dão respostas que conversam com os dados científicos e algumas vezes não.
Quando isso não ocorre, a educadora sinaliza que essa não é uma informação correta e conduz o
aluno, ou por perguntas ou por afirmações, para a resposta científica. A partir de então ela começa
a expor aos alunos informações sobre o mosquito, seus hábitos e nichos ecológicos. Durante toda a
condução da visita a educadora verifica se os alunos estão com alguma dúvida sobre o que ela está
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explicando. Há interação por parte dos alunos, mas a educadora sempre retoma o conhecimento
científico como régua para verificar se os alunos estão certos ou errados nas suas afirmações.
Na entrevista, a Educ1 conta que a origem da sua maneira de interagir com os alunos
está ligada, principalmente, com a maneira de interagir de uma professora de Biologia que teve
quando aluna do Ensino Médio, relatando ainda perceber que quando ela guia dos alunos através
de perguntas direcionadas, os alunos conseguem chegar mais facilmente ao conhecimento científico
partindo do pouco do conhecimento que a escola, limitada ao livro didático, oferece. Quando um
aluno tem uma opinião divergente do que é o conhecimento científico ela não o corrige direta-
mente, mas oferece diretrizes e dicas para que ele alcance e conclua o que é de fato o que a ciência
diz. A educadora Educ1 acredita que a exposição tem grande importância em:

Ampliar o conhecimento que é pequeno porque a escola se limita ao que está no livro, expli-
cando, sei lá, a vida de um inseto, e aqui a gente tá associando vidas como existe dentro de
um ecossistema, né? Um vírus associado a um inseto e essa interação espécie específica né, e
fora que a gente aprofunda assim tanto cientificamente quanto… eu acho que tem um apelo
aqui social aqui também né!? por que fala de toda uma problemática de lixo na rua e de
conscientização das pessoas e do papel que cada um pode ter socialmente falando (Educ1).

A educadora Educ1 evidencia, em sua entrevista e prática uma abordagem comunicativa na


dimensão Interativa/De autoridade. Ela considera que a sua atuação como mediadora é a de levar os
alunos a entenderem o ponto de vista científico, numa relação de complementar o que eles estudam
no ambiente escolar e faz isso da posição de quem tem o conhecimento científico para difundi-lo,
portanto, está numa posição de autoridade com relação ao assunto e incentiva a participação dos
alunos de maneira a considerar suas opiniões para explicar o que é de conhecimento científico e o
que não é.
Em outro trecho da entrevista ela conta sobre um aluno que a contrariou quando ela per-
guntou se o aluno não achava que o mosquito era bonito:

Eu falei assim: “nossa olha como esse mosquito é bonito!” E o menino falou: “bonito nada,
é nojento é muito feio!”. Aí eu falei: “é bonito pra mim porque eu gosto de biologia... e ele
vive num mundo diferente do nosso então ele é perfeito dentro do mundo dele, né?! (Educ1).

A educadora considerou a opinião do aluno e colocou na conversa o elemento da relati-


vidade do belo, colocando para ele que tudo bem ele achar o mosquito feio ou bonito, isso é um
conceito relativo. Nesse momento a educadora passa de um discurso Interativo/De Autoridade para
um discurso Interativo/Dialógico pois mostra que não é uma autoridade no assunto beleza, mas
trabalha os diferentes pontos de vista que surgiram na conversa.
Vale ressaltar que a educadora se apoia bastante na defesa de que os alunos devem sair da
exposição com o conhecimento científico mais amplamente conhecido. Isso pode vir de uma visão
dela enquanto formada com o conhecimento específico e que esse conhecimento é o mais impor-
tante na vivência da exposição. A Educ1 tem muita segurança na condução do conteúdo e nas res-
postas que dá às perguntas dos alunos pois tem muito claro para ela mesma o objetivo da exposição
com relação ao conteúdo e à importância da divulgação científica.
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Discurso didático pedagógico sem conhecimento específico


O discurso na visita guiada da Educ2 é voltado às atividades práticas da exposição. Ela
conduz os alunos pelas lupas (estereomicroscópios) e espera que eles perguntem sobre o que estão
observando nos equipamentos. A educadora pede para que eles confirmem ou não se estão con-
seguindo observar as fases do ciclo de vida do mosquito e afirma que olhar essas fases pela lupa é
muito melhor do que só ver essas fases pelos vídeos que eles assistiram.
Na entrevista, a educadora diz que a interação com os alunos é voltada para a parte prática
pois como ela não tem o conteúdo teórico, prefere exemplificar o que eles podem fazer no dia a dia
para o controle do mosquito:

A minha monitoria é mais voltada à prática uma vez que eu não tenho todo o conteúdo
teórico né!? O meu é uma questão mais prática, então eu tento conscientizá-los na questão do
dia a dia, na vivência do dia a dia, o que eles podem fazer dentro de casa ou de repente na
escola, questões mais do cotidiano e não a parte tão teórica e mais a parte prática (Educ2).

A educadora Educ2 evidencia em seu discurso a dimensão Não interativa/De autoridade,


onde reforça as orientações das atividades práticas. Por sentir dificuldades e insegurança em condu-
zir o assunto científico, seu foco é muito maior na experiência dos alunos com as práticas disponí-
veis na exposição e, portanto, usa mais o foco nas atividades.
O trecho de visita gravado não permite outras observações, portanto, da entrevista, podemos
concluir que a educadora transita de um discurso De autoridade ora Interativo ora Não Interativo,
buscando deixar a possibilidade de Interação para os assuntos que tem mais segurança em conduzir.

A minha interação com eles é muito prática assim… procuro introduzi-los no tema inicial-
mente quando eles entram. Pergunto se alguém já teve [alguma doença transmitida pelo
mosquito], se porventura alguém da família já teve, quais foram as consequências se eles
sabem me dizer quais são os sintomas. E a maioria que vem aqui já tem uma breve noção
né?! Ou o pai já teve, ou o avô já teve, ou a mãe teve, ou até algum deles já tiveram. Então
é uma abordagem mais pra conhecer, pra gente saber como vai abordar, e a partir daí trazer
o conhecimento, mostrar pra eles como é a evolução, o que que pode ser feito pra prevenir e o
que nós podemos fazer pra não evoluir né!? (Educ2).

No trecho acima a educadora evidencia a falta de familiaridade com o conteúdo científico


pois utiliza o termo ‘evolução’ para se referir às fases do ciclo de vida do mosquito, mas busca,
conforme uma abordagem didática pedagógica, uma ênfase em entender o grupo antes de definir a
abordagem e estratégia pedagógica com que irá conduzir a visita. Esse momento é Interativo, mas
ainda sim De Autoridade de quem conhece a exposição.

Considerações
Tanto a Educ1 quanto a Educ2 usaram do discurso De Autoridade em suas abordagens
comunicativas. O que varia tanto nos áudios de gravação das visitas quanto nas entrevistas, é a
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necessidade da Interação ou da Não Interação na condução do roteiro. Tal razão pode ter origem no
fato de a escola ter um tempo determinado para estar no espaço e hora para o ônibus voltar, além
da preocupação com o tempo em cada ponto de parada para que todos os grupos escolares possam
ter a mesma experiência.
As diferenças nos discursos também aparecem quando se trata de abordar o assunto de
maneira mais científica ou de maneira mais no âmbito de conhecimentos gerais. Quando a Educ1
dá muita ênfase que seu objetivo é sempre levar para o que a Ciência traz de informação, a Educ2
preza mais pelo conhecimento geral de cuidados com o dia a dia para prevenção da doença pelo
controle do mosquito. E há, nessas ênfases, segurança para lidar com o que mais se conhece, nas
categorias didático pedagógicas com ou sem conhecimento específico.
Mesmo que haja, por parte das educadoras, uma preocupação em fazer com que os alunos
da mesma classe, tenham as mesmas experiências, há a necessidade de se considerar a diversidade
de contextos e vivências na construção dos discursos de cada uma das educadoras do espaço, pois a
experiência será, mesmo assim, diferente para cada um dos grupos, e nem entramos no mérito do
contexto dos alunos.
Sendo assim, a construção dos discursos nesse contexto, pouco representativo, mas que pode
ser um início de um questionamento maior é influenciada pela formação dos educadores no que
diz respeito às classes e dimensões apontadas por Mortimer e Scott (2002). Cabe verificar em pes-
quisas futuras se a estrutura da exposição ou ainda a distância das escolas à instituição, diminuindo
o tempo disponível para a visitação, não exige das educadoras e educadores um discurso mais obje-
tivo, participativo ou não.
Os espaços de educação não formal são ambientes ricos em experimentações e análises para
os professores em formação. As características próprias da mediação em uma exposição levam o
educador a experimentar e descobrir qual é sua identidade como professor:

De fato, a educação não-formal possui características próprias quanto à autonomia do


visitante na busca do saber, o que favorece a ampliação e o refinamento cultural em
um ambiente capaz de despertar emoções que se tornem aliadas de processos cogniti-
vos dotados de motivação intrínseca para a aprendizagem de ciências. Acreditando, no
entanto, que o mediador pode colaborar para tornar uma visita significativa, preen-
chendo o vazio que muitas vezes existe entre o que foi idealizado e a interpretação dada
pelo público ao que está exposto, consideramos que a mediação requer um saber com
dimensões peculiares: o saber da mediação (QUEIROZ et al, 2002, p. 78).

Assim, apontamos que os discursos das educadoras entrevistadas têm construções diferentes
em aspectos que tangem tanto a formação e a segurança com o conteúdo abordado quanto a expe-
riência com a prática docente. A Educ1, prioriza o conteúdo relacionado às Ciências Biológicas da
exposição, embora não tivesse tido experiências anteriores ainda na atividade docente, enquanto
que a Educ2, por já ter trabalhado com Educação Infantil, transita com a prática docente no atendi-
mento ao público escolar, embora não tivesse tanta segurança com o conteúdo ou o uso dos termos
científicos abordados.
Quando possível, o estágio curricular obrigatório realizado em espaço de educação não for-
mal e misto (com a presença de multiprofissionais em formação docente) é ainda mais rico em
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experiências e trocas, além de ser importante ferramenta de prática em assuntos transversais de


acesso ao público geral, complementando a experiência do professor em formação com relação
tanto aos conteúdos quanto com a prática docente. A diversidade dos públicos também deve ser
considerada pois o estagiário deve saber sempre considerar os contextos, não controlados como no
espaço de educação formal, dos grupos que chegam à exposição.
Nesse sentido, ao analisarmos os discursos das educadoras em formação na condução da
mediação com grupos de escola, mais especificamente no que tange as abordagens comunicativas
envolvidas nas interações, ressaltamos que o espaço de educação não formal se constitui como cená-
rio profícuo ao desenvolvimento dos saberes docentes relativos à formação docente. Tais espaços são
repletos de elementos que participam da mediação entre o conhecimento e os sujeitos, cenários nos
quais as abordagens comunicativas são protagonistas na construção discursiva.

Referências
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