NUNES, César Aparecido. Desvendando a Sexualidade. 1. ed. Papirus
Editora. 101 p.
“Desvendando a sexualidade” é um livro que perpassa questões
históricas e dogmáticas da sexualidade, estabelece-se levando em conta que o ser humano é um ser social e ao conviver em grupos ou sociedades, desperta sentimentos e vontades distintas e análogas, que se fundem tanto às necessidades fisiológicas e primárias, quanto aos conceitos históricos e evolutivos da humanidade. O sexo visto como algo natural, inerente ao ser humano, derruba fronteiras e preconceitos, entende e aceita o ser humano, indiferente do sexo ou opção sexual, como única espécie crítica e pensante, diferente dos demais animais, que veem no ato, apenas um momento para procriação. O humano historicamente vê na sexualidade e no ato sexual, uma oportunidade de ligação e intimidade, momentos de prazer e diferença, em alguns relatos históricos o sexo também foi narrado como diferença, dominação e grande oportunidade de negócio. Na incessante busca pelo perfeito e belo, a sexualidade desnuda os seres e cria uma dimensão de interligação e troca, derrubando ou acentuando as diferenças na história das civilizações. Entender a sexualidade como fator de prazer, de troca, de autoconhecimento, muda paradigmas e derruba toda uma sociedade baseada na virilidade masculina, sexo passa a ser encontro, sentimento e admiração pelo corpo e pelo ato, algo que transpassa o feio ou apenas o mecânico para buscar o fato de que somos seres capazes de distinguir a procriação e a fisiologia do prazer, tornando a sexualidade erma, não proibida e não pornográfica, uma dança envolvendo seres humanos, sentimentos e mecanismos do corpo; energias e sensações que oferecem êxtase e contentamento, sendo assim encarado como algo belo e natural, permitido aos seres humanos. Nesta perspectiva, cai por terra o machismo e a servidão, a pornografia, a identidade de gênero e escolha sexual. Destruindo paradigmas enraizados historicamente em nossa sociedade, são apenas corpos que se unem por prazer e sentimento. Acaba assim a necessidade do homem de provar sua virilidade mo início da adolescência, como relatado pelo autor, onde jovens tinham suas primeiras relações em prostíbulos ou até mesmo com a própria mãe; assim como perde a razão a cobrança da sociedade, ainda hoje, patriarcal, que obriga mulheres a se guardarem virgens e puras, como se ela ainda fosse uma moeda de troca ou um bom negócio para o pai, que a trocava por um bom dote. A sexualidade e o ato sexual precisam ser encarados como ato único e exclusivo da pessoa, que tem poder de decisão sobre seu corpo e suas escolhas, quanto mais natural for o ato, mais tabus se rompem, incertezas são esclarecidas, o desejo precisa ser saciado de forma sadia, sem medos e julgamentos. A conscientização, educação, observação e principalmente conhecimento do contexto social existente são indispensáveis para buscar uma educação sexual mais exitosa e menos traumática, voltada apenas para explicações vastas sobre sistemas reprodutores diferentes, com funções meramente copulatórios, com termos totalmente erotizados e proibidos, esses termos pouco ou nenhum sentido agregam, em sociedades e contextos mais rígidos, termos biológicos criam barreiras e geram atitudes escondidas e vergonhosas, tendo a descoberta sexual como algo pecaminoso e sem sentido. O ser humano, a sociedade, suas crenças e culturas são complexas e repletas de “entrelinhas” que tornam o sexo e a sexualidade algo que diverge de sua essência, que “remete” às culturas e ideais dominantes, deixando prazer, satisfação e desejo à margem, com estruturas ideológicas voltadas ao que se acha certo ou errado, diminuindo, na grande maioria das civilizações o poder da mulher e colocando no ápice de uma pirâmide imaginária, o prazer masculino . Analisando os estudos do professor e autor, Cesar Nunes, destaca-se que por muito tempo as sociedades caracterizavam-se como matriarcais, aos homens cabia apenas a função da caça e às mulheres, a responsabilidade total da comunidade, como engenheiras, médicas, educadoras, produtoras rurais e outros desígnios que com o cessar da caça, o homem se apodera e submete inclusive a mulher à sua vontade. A pesquisa sobre a sexualidade perpassa grandes filósofos e estudiosos, como Focault, Marx, Marilena Chauí, Reich, Georges , Politzer, Marcuse e Godelier, não deixando de lado compositores como Chico Buarque ou mitos como o “do Sol e a Lua”, que recontam ou tentam explicar a dominação masculina sobre as mulheres. A Bíblia e outros manuscritos deixados como fonte histórica, sempre valorizam o homem como ser superior, colocando a mulher como servil, desvalorizando seu poder de gerar vidas, onde tanto homens como mulheres saem de um ventre feminino, que desmistifica mitos e escritos nunca comprovados cientificamente. Mulheres são apedrejadas quando há prova de traição, enquanto ao homem há reforço na condição do uso de sua sexualidade, seja homossexual ou heterossexual , como na Grécia Antiga, que permitia a liberação do prazer, desde que esse homem sustentasse sua casa e seus rebentos e não apresentasse traços afeminados. A história das sociedades não é igual ou linear, em algumas, a mulher pertence ao marido, em outras, mantém-se na casa dos pais, relaciona-se com diversos parceiros e ao marido, cabe apenas dar o sobrenome às crias. Ainda hoje, existem sociedades poligâmicas, onde homens casam-se com o número de esposas que conseguirem sustentar. Se voltarmos na história, temos o dote, que muitas vezes para manter o poder e a riqueza da família, o casamento era feito entre os próprios irmãos. Todo estudo e investigação feitos pelo autor, trazendo elementos e informações pré-históricas, chegando ao modelo atual de sociedade, identificando o homem com seu tempo e sua forma de agir. Há quem diga que houve um aumento da homossexualidade, mas voltando ao comportamento humano, sempre houve homossexualidade e foi camuflada pela virilidade masculina e a submissão feminina e hoje com a facilidade na disseminação das informações e maior espaço para a expressão, essa conduta aparece como parte da sociedade atual e não como uma “doença” da sociedade atual, uma vez que os relatos comprovam essa conduta. Exige-se educação e certo comportamento do homossexual, pela tradição preconceituosa e velada. Precisamos urgente de uma educação sexual crítica para colocar a sociedade em marcha para uma nova compreensão da sexualidade e da homossexualidade. O livro leva o leitor à reflexão sobre conceitos e condutas enraizados e muitas vezes internalizados por nós sem questionamento ou criticidade. Desvendar a sexualidade, desnuda pensamentos e grandes pensadores que estudaram e pesquisaram nossa formação enquanto sociedade ocidental, uma leitura que vale a reflexão e a pesquisa, analisando a dimensão pedagógica da sexualidade, sem fragmentação e sem conceitos distorcidos e irreais. Ver o conceito positivo da sexualidade, não mais sustentada em mecanismos de doutrina, exploração e até mesmo de morte.