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Substratos para produção de mudas hortícolas para

cultivo hidropônico
Fernanda Alice Antonello Londero Backes1,
Candice Mello Romero Santos2 e Rogério Luiz Backes 31

ubstrato é o meio onde se e à cultura que se deseja produzir total do substrato não ocupado por

S desenvolvem as raízes das


plantas cultivadas na au-
sência do solo. Este tipo de cultivo
(Martinez & Silva Filho, 2004).
Assim, o objetivo do trabalho é
caracterizar sete substratos
partículas orgânicas e minerais. O
substrato ideal deve apresentar
espaço poroso total superior a 85%
se refere a qualquer sistema de hortícolas utilizados para a produção do seu volume. O total de poros
produção de plantas em um meio de mudas para cultivo em existente em um substrato se divide
distinto do solo, onde se insere o hidroponia. entre microporos, responsáveis pela
cultivo hidropônico de plantas Caracterização física dos retenção de água, em volume que
(Kämpf, 2000). O cultivo sem a substratos – As propriedades corresponde à capacidade de
presença do solo aumentou subs- físicas dos substratos condicionam retenção hídrica do substrato, e
tancialmente nos últimos 20 anos, o crescimento das raízes e macroporos, que estão preenchidos
elevou a produção hortícola e constituem o conjunto de com ar e o seu volume é
proporcionou ganhos de produ- características que descrevem o caracterizado como espaço de
tividade, até mesmo em áreas com substrato em relação a sua aeração (De Boodt & Verdonck,
condições adversas de cultivo. A porosidade, densidade, capacidade 1972; Kämpf, 2000). Substratos
rápida expansão no uso de substratos de retenção de água, ar e nutrientes porosos, com adequada drenagem,
pode ser explicada pelas vantagens (Andriolo, 1999; Kämpf, 2000). A possibilitam bom desenvolvimento
proporcionadas ao produtor, porosidade total refere-se ao volume de pêlos radiculares e raízes bem
especialmente o melhor controle do
meio de cultivo (Rivière & Caron,
2001). Tabela 1. Características físicas e químicas de alguns substratos usados
Ainda é muito intensa a busca na produção de mudas hortícolas
por materiais que reúnam carac-
terísticas adequadas para os diversos Substrato pH CE CRA Densidade CTC
usos na horticultura, e atualmente,
mS/cm
com o desenvolvimento da cons-
ciência ambiental, há necessidade Turfa (1)
5,8 0,5 a 0,7 Alta Baixa Alta
do uso de substratos que contribuam
para a diminuição do impacto CAC 7,1 - Baixa Baixa Alta
ambiental. Vermiculita 7,2 0,23 Alta Baixa Alta
O produtor, ao adquirir um
Areia 6,5 - Baixa Alta Baixa ou nula
determinado substrato para a
produção de mudas, precisa ser Fibra de coco(2) 5,6 3,3 Alta Baixa Alta
informado sobre o uso correto do
Turfa Fértil – Florestal S.A.
(1)
mesmo, bem como suas principais
Propriedades de amostra de fibra de coco do México.
(2)
características físicas e químicas
Nota: CE = condutividade elétrica.
(Tabela 1). Cada substrato possui
características próprias, que devem CRA = capacidade de retenção de água.
CTC = capacidade de troca de cátions.
ser conhecidas avaliando-se em
cada caso sua adequação ao sistema CAC = casca de arroz carbonizada.

Aceito para publicação em 16/8/05.


1
Eng. agr., Dra., Universidade do Contestado – UnC –, C.P. 1, 89460-000 Canoinhas, SC, fone: (47) 3622-9999 e-mail: fernanda@cni.unc.br.
2 Eng. agr., Dr., Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, fone: (61) 3448-4741, e-mail: candice@cenargen.embrapa.br.

3 Eng., agr., Dr., Epagri/Estação Experimental de Canoinhas, C.P. 216, 89460-000 Canoinhas, SC, fone: (47) 3624-1144, e-mail:

backes@epagri.rct-sc.br.

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ramificadas, as quais possuem propriedade de suas partículas longo do tempo e a isenção de toxinas
grande capacidade de absorção de sólidas de adsorver e trocar cátions. ou patógenos. O custo de aquisição
nutrientes. Os materiais selecionados para a deve ser baixo, a fim de não
A densidade é a relação entre a produção de mudas para o cultivo inviabilizar a técnica. No entanto,
massa e o volume do substrato e hidropônico devem possuir baixa ou isto não é suficiente se não estiver
afeta sua capacidade de retenção de nula CTC, ou seja, devem ser disponível em quantidade suficiente
água e ar. Os materiais usados como quimicamente inertes, com o no momento da aquisição (Andriolo,
componentes de substratos variam objetivo de permitir um maior 1999; Martinez & Silva Filho, 2004).
em densidade seca entre 100kg/m3, controle nutricional das plantas ou Os substratos podem ser classi-
como turfa, espuma fenólica e de evitar problemas de salinização ficados, segundo suas propriedades,
vermiculita, e 1.500kg/m3 , como excessiva do substrato (Kämpf, 2000; em quimicamente inertes (materiais
areia (Kämpf, 2000). É importante Martinez, 2002). com CTC baixa ou nula) e
conhecer e manter constante a Em hidroponia, a riqueza de quimicamente ativos (materiais com
densidade dos substratos, a fim de substratos em nutrientes minerais CTC alta) e, segundo sua origem,
se obter melhor controle da não é muito importante, pois estes em orgânicos (decomposição mais
irrigação, evitando-se a falta ou o são fornecidos pela solução nutritiva rápida) ou inorgânicos (decom-
excesso de água para as plantas. previamente balanceada, conforme posição mais lenta).
As propriedades físicas de aeração a necessidade da cultura. O conteúdo Substratos organominerais –
e retenção de umidade são as mais de nutrientes pode ser medido pela Podem apresentar as mais di-
importantes, pois permitem a condutividade elétrica (CE), a qual versas composições, conforme as
difusão de O2 para as raízes. O nível fornece informações sobre a fontes (casca de pínus, turfa,
ótimo da capacidade de aeração varia concentração total de nutrientes na vermiculita, etc.) usadas em seu
entre 10% e 30%, pois nesta faixa as solução e é expressa em deciSie- preparo, proporcionando bom
raízes dispõem de volume suficiente men/m ou miliSiemen/cm. desenvolvimento das mudas de
de ar para suas funções respiratórias Escolha dos substratos alface (Figura 1) (Backes, 2003a),
(Martinez, 2002). hortícolas – A oferta e o uso de tomate, pepino, flores em geral,
Caracterização química dos substratos na produção de mudas etc. Para a produção de mudas para
substratos – As propriedades hortícolas para o cultivo o cultivo hidropônico, estes
químicas dos substratos referem-se hidropônico vêm crescendo substratos apresentam algumas
principalmente aos valores de pH, aceleradamente e as indústrias desvantagens: não são inertes,
capacidade tampão da acidez, grau produtoras utilizam matéria-prima podem ser veículos de contaminação
de decomposição, capacidade de de diferentes origens e, em geral, por patógenos (por exemplo,
troca de cátions e salinidade. não dispõem de critérios e nem de Fusarium sp.) e necessitam a
Os valores de pH variam muito laboratórios para o controle da retirada do material ao redor das
entre os componentes do material qualidade de seus produtos. Pouco raízes antes do transplante, o que
ou mistura. A faixa de pH se sabe a respeito dos teores totais provoca estresse às mudas, para
compreendida entre 5,5 e 6,5 é a e dos teores disponíveis de não haver risco de entupimento do
mais adequada para o crescimento nutrientes no material de origem. sistema de irrigação.
da maioria das plantas cultivadas. O Alguns critérios importantes Turfa – É o substrato orgânico
pH corresponde ao critério químico devem ser considerados na escolha natural de maior expressão no
de maior importância ao crescimento de um substrato hortícola: o custo, cultivo de mudas olerícolas e
das plantas. Muitos desequilíbrios a disponibilidade, a estabilidade ao ornamentais. Esse tipo de substrato
nutricionais estão relacionados a
valores inadequados de pH.
A capacidade tampão da acidez
indica a intensidade de alteração do
pH do meio com a adição de
fertilizantes ou água de irrigações
ricas em carbonato. Os substratos
orgânicos são mais resistentes a
alterações, enquanto os inorgânicos
sofrem alterações bruscas no pH.
Problemas de substratos com falta
ou excesso de retenção de nutrientes
podem ser solucionados, em parte,
pelo uso de componentes que
apresentem maior poder tampão e
alto valor de capacidade de troca de
cátions, como turfa e vermiculita
(Kämpf, 2000; Martinez & Silva
Filho, 2004).
A capacidade de troca de cátions
(CTC) de um substrato é a Figura 1. Mudas de alface em substrato organomineral

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constitui-se numa vegetação 0,5 e 2mm, pois apresenta boa provoca redução no volume com o
aquática e pantanosa parcialmente porosidade. Granulometrias infe- decorrer do cultivo. Esta insta-
decomposta. Puro ou em misturas riores a 0,5mm podem ser perigosas bilidade é decorrente de sua
com outros componentes, é usado por causarem risco de falta de estrutura laminar com ligações
na produção de mudas (piscinas ou oxigênio às raízes, devido à alta frouxas, que são sensíveis aos
“floating”) para posterior capacidade de retenção de água e impactos mecânicos, desfazendo-se
transplante para o cultivo sem solo baixa aeração. Granulometrias em partículas menores. No Brasil,
(subirrigação, gotejamento e superiores a 5mm não retêm a utilização da vermiculita como
sistema de fluxo e refluxo) e para umidade suficiente, obrigando o substrato hortícola tem se
hidroponia em sistema de fluxo produtor a manter um rígido expandido, associada ao sistema de
laminar de nutrientes (NFT). Um controle da irrigação (Martinez, produção de mudas em bandejas
problema futuro pode ser o impacto 2002). A utilização da areia lavada com orifícios individuais (Figura 2).
ao meio ambiente pelo excessivo constitui-se em excelente meio para Para que seu uso seja viável, deve-
uso desse substrato, já que a turfa a formação de mudas de algumas se considerar sua economicidade,
é um material natural não- espécies, podendo ser misturada a pois é um produto industrializado.
renovável. Todavia, as reservas outros substratos (Santos et al., Espuma sintética – É desen-
mundiais ainda são grandes 2000). volvida para a obtenção de mudas
(Martinez, 2002). Um sério Vermiculita – Substrato obtido de alta qualidade e isenta de conta-
obstáculo à sua utilização em larga a partir do aquecimento a 1.000o C minação por patógenos, pois é um
escala na horticultura é o elevado do mineral mica. Esse material é produto estéril; apresenta elevada
custo de aquisição. As misturas de estéril, de elevada porosidade, porcentagem de macroporos e baixa
turfa com outros componentes como densidade de 90 a 150kg/m3, alta de microporos, excelente drenagem
vermiculita, areia, cascas e perlita capacidade de retenção de água e baixa produtividade elétrica
têm sido muito utilizadas para a fase (45% a 50%) e alta CTC, podendo (CE). Os danos causados durante a
de produção de mudas. reter nutrientes em suas partículas operação de transplante são míni-
Cascas – A casca de arroz car- e cedê-los posteriormente às mos, pois as mudas são transferidas
bonizada e a casca de pínus são plantas. O pH varia entre 6 e 7. Para com as células de espuma dire-
compostos que apresentam grande a produção de mudas em hidroponia tamente para os canais de cres-
disponibilidade e, em geral, são de a granulometria mais indicada varia cimento, conforme Figura 3. A
baixo custo, o que torna sua entre 0,75 e 1mm (Martinez, 2002). espuma sintética tem sido utilizada
utilização promissora, principal- O uso da vermiculita apresenta com sucesso no enraizamento de
mente em misturas com materiais algumas desvantagens que limitam estacas de crisântemo para cultivo
minerais ou orgânicos. Do ponto de sua expressividade na produção de hidropônico (Backes et al., 2002a;
vista físico, esses materiais são mudas em hidroponia: exige a Backes et al., 2002b), assim como
muito porosos e apresentam baixa limpeza das raízes antes do na produção de mudas de alface,
capacidade de retenção de água, boa transplante, requer suporte para a rúcula e agrião (Furlani et al.,
aeração e drenagem. Em termos produção das mudas, exige mais 1999). A lavagem das placas de
químicos, sua composição é variável tempo e mão-de-obra durante o espuma fenólica é fundamental para
em função da origem do material. transplante, favorece o desenvol- sua utilização na produção das
A casca de arroz carbonizada é vimento de algas na superfície das mudas. Como desvantagens, as
muito utilizada para o enraiza- bandejas e apresenta elevado custo. espumas fenólicas apresentam alto
mento de estacas de crisântemo e Outro aspecto negativo é a falta de preço e são de difícil decomposição,
roseira para cultivo hidropônico. estabilidade de estrutura, que gerando resíduos de descarte que
Esse material possui baixa podem poluir o ambiente.
densidade, baixa capacidade de Fibra de coco – Material
retenção de água, boa aeração, industrializado de origem vegetal,
drenagem rápida e eficiente e valor leve, de fácil manuseio, com elevada
de pH em torno da neutralidade capacidade de retenção de água, boa
(Kämpf, 2000). Já a casca de pínus, aeração e de estrutura física
na produção de mudas, deve ser altamente estável (Figura 4); é
moída e curada. Como desvantagem isento de pragas, doenças e
ao uso destes substratos destaca-se sementes de plantas daninhas. A
a necessidade de limpeza das mudas fibra de coco é um material para ser
antes do transplante para evitar o utilizado como substrato na
entupimento do sistema de produção de mudas para hidroponia,
irrigação da hidroponia. entretanto seu uso depende de um
Areia – É constituída basica- bom tratamento e preparação para
mente por óxido de silício (SiO2) e garantir ao consumidor um produto
pode ser encontrada naturalmente confiável e isento de problemas
em grande abundância. A granu- como o teor de sais (naturalmente
lometria mais recomendada para o rica em K). Para a melhor utilização
uso na produção de mudas para Figura 2. Mudas de alface em da fibra de coco na produção de
hidroponia está compreendida entre substrato vermiculita mudas, devem ser adotadas práticas
60 Agropec. Catarin., v.19, n.1, mar. 2006
crisantemo en espuma fenólica con
diferentes concentraciones de solución
nutritiva. In: FLORICULTURA en la
Argentina. Buenos Aires: EFA, 2002b.
p.23-26.

4. BACKES, F.A.A.L.; SANTOS, O.;


SCHMIDT, D.; NOGUEIRA FILHO, H.;
MANFRON, P.A.; CASAROLI, D.
Reposição de nutrientes durante três
cultivos de alface em hidroponia.
Horticultura Brasileira , Brasília, v.21,
n.4, p.590-596, 2003a.

5. BACKES, F.A.A.L.; BARBOSA, J.G.;


STRINGHETA, A.C.O. Principais
fatores de produção. In: BARBOSA, J.G.
Crisântemos – Produção de mudas,
cultivo para corte de flor, cultivo em
Figura 3. Mudas de alface em espuma fenólica vaso, cultivo hidropônico . Viçosa:
Aprenda Fácil, 2003b. p.61-72.

Foto cedida por Amafibra


6. DE BOODT, M.; VERDONCK, O. The
physical properties of the substrates in
horticulturae. Acta Horticulturae,
Wageningen, v.26, p.37-44, 1972.

7. FURLANI, P.R.; SILVEIRA, L.C.P.;


BOLONHEZI, D.; FAQUIN, V. Cultivo
hidropônico de plantas. Campinas: IAC,
1999. 52p. (IAC. Boletim Técnico, 180).

8. KÄMPF, A.N. Substrato. In: KÄMPF,


A.N. Produção comercial de plantas
ornamentais. Guaíba: Agropecuária,
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9. MALVESTITI, A.L. Propriedades e


aplicações da fibra de coco na produção
de mudas. In: ENCONTRO NACIONAL
SOBRE SUBSTRATOS PARA
PLANTAS, 4., Viçosa, MG. Anais…
Viçosa, MG: UFV, 2004. p.226-235.

10. MARTINEZ, P.F. Manejo de substratos


para horticultura. In: ENCONTRO
Figura 4. Mudas de hortícolas em fibra de coco
NACIONAL DE SUBSTRATOS PARA
PLANTAS, 3., 2002, Campinas, SP.
Caracterização manejo e qualidade de
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2. BACKES, F.A.A.L.; BARBOSA, J.G.;
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MORIT A, R.M.; BARBOSA, M. 11. MARTINEZ, H.E.P.; SILVA FILHO,
Enraizamento de estacas de J.B. Introdução ao cultivo hidropônico
Considerações finais crisântemo, em espuma fenólica, de plantas. Viçosa: UFV, 2004. 111p.
submetidas a diferentes concentrações
Todos os substratos caracte- de solução nutritiva. In: ENCONTRO 12. RIVIÈRE, L.M.; CARON, J. Research
rizados neste trabalho são indicados NACIONAL DE SUBSTRATOS PARA
on substrates: State of the art and need
para a produção de mudas para PLANTAS, 3., 2002, Campinas, SP.
for the coming 10 years. Acta
hidroponia, sugerindo-se em Caracterização, manejo e qualidade de
Horticulturae, v.548,. p.29-41, 2001.
substratos para produção de plantas.
especial o uso de turfa, areia,
Campinas, SP: IAC, 2002a. p.122. (IAC.
espuma fenólica e fibra de coco. Documentos, 70). 13. SANTOS, O.; SCHMIDT, D.;
NOGUEIRA FILHO, H.; LONDERO,
Literatura citada 3. BACKES, F.A.A.L.; BARBOSA, J.G.; F.A. Cultivos sem solo – Hidroponia.
BARBOSA, M.; MORIT A, R.M. Santa Maria: UFSM. 2000. 107p.
1. ANDRIOLO, J.L. Fisiologia das Enraizamiento de estacas de (Caderno didático,1).

Agropec. Catarin., v.19, n.1, mar. 2006 61

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