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1. Introdução
A utilização de novas tecnologias nos processos de produção e trabalho traz alterações
positivas, mas muitas vezes pode gerar perdas para grupos da sociedade. Observa-se que com
as tecnologias da informação e comunicação (TICs) surgiram novas modalidades de prestação
de serviços e de consumidor, propiciando o aumento da uberização do trabalho e
consequentemente a precarização do mesmo. Antunes (2020) afirma que com a Quarta
Revolução Industrial novos trabalhos serão criados por e para pessoas com mais aptidões,
inteligência e capacitações, no entanto as precarizações, o subemprego e o desemprego
tenderão a aumentar.
Atualmente, empresas de tecnologias utilizam aplicativos com o propósito de unir prestação
de serviço-cliente, tais como serviços de entrega, transportes, serviços domésticos. Esse tipo
de trabalho já era praticado, mas numa época de crise, com o aumento do desemprego e a
pandemia do Coronavírus, houve um acentuado acréscimo na demanda desses serviços
(Cannas, 2021), contribuindo para redução das garantias dos trabalhadores.
Durante a pandemia, devido às normas de distanciamento em que as pessoas buscavam ficar
mais em casa, houve uma mudança de comportamento dos consumidores (Fernandes, 2021;
De Meyer, 2020), estes passaram a utilizar mais os meios digitais e tecnológicos para efetuar
suas tarefas. Pode-se citar o uso de aplicativos para efetuar compras e recebê-las em casa,
participar de reuniões, aulas e entretenimentos on-line, trabalhar em home office.
A difusão dessas novas formas de trabalhar também parece ser estimulada pela alta taxa de
desemprego que levou muitos indivíduos a buscarem essa forma de trabalho para obter uma
renda para sobrevivência (AMORIM, 2021). Este tipo de trabalho favorece a precarização do
trabalho, levando o trabalhador a um falso empreendedorismo, falta segurança nas relações e
se reduz o pertencimento à empresa. Também se nota o crescimento do senso do “cada um
por si”, do individualismo.
Segundo (Abílio, 2019) uberização do trabalho é uma nova forma de controlar e gerenciar o
trabalho concatenado à informalidade, que alicerça o trabalhador sob demanda.
Esse tema é relevante porque a Uberização está atingindo novos mercados. Essa modalidade
de trabalho, as plataformas tecnológicas podem ser encontradas em diversos setores como nas
áreas de serviços financeiros e bancários, medicina, educação e comércio (GINIYATULLIN,
2019).
Este artigo analisa a opinião de motoristas por aplicativo em relação às condições de trabalho
a partir de uma survey conduzida no interior dos veículos, sendo estruturado em mais quatro
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2. Contextualização
Nesta seção são apresentados tópicos relativos ao processo de uberização encontrados na
literatura sobre o tema.
De acordo com Schwab (2016) a quarta revolução cresce de forma significativa, ocorrendo
geralmente na maioria dos setores em todas as nações. E a extensão e intensidade das
mudanças alteram sistemas inteiros de produção, gestão e governança.
Segundo Schwab (2016), a indústria 4.0 difere das revoluções anteriores devido à união das
tecnologias e à interligação entre os domínios digitais, físicos e biológicos. A conectividade
das pessoas e o avanço da Inteligência Artificial aumentaram a disponibilidade de diversos
produtos e serviços como carros autônomos, drones, assistentes virtuais, softwares que
traduzem, investem e descobrem novos medicamentos. Com a computação e a
disponibilidade de grandes quantidades de dados, algoritmos preveem interesses culturais das
pessoas.
Segundo Giniyatullin (2019), a uberização está se desenvolvendo com rapidez na prestação de
serviços, principalmente no setor de transporte.
As empresas tecnológicas, que intermediam oferta e demanda, definem o valor e a variação
do trabalho, e têm ferramentas de avaliação e controle da produtividade que não possuem
regras claras (ABÍLIO, 2021).
Uma das vantagens do uso de sites da Internet como parte da uberização é agregar grande
número de propostas, expandir o sortimento, reduzir custos para os participantes do mercado,
e monitorar os concorrentes da empresa (GURINA, 2019).
Essa revolução está modificando o modo de produzir e de negociar no Brasil e no mundo,
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serviços, considerado “parceiro”. Mas na realidade, apesar da negação de vínculo, ele está
sujeito a um aplicativo que indica o cliente, local e tipo de serviço a realizar, seja transporte,
entrega, dentre outros, onde sua remuneração é baixa o que permite uma maior apropriação do
valor pela empresa, elevando seus lucros (ABÍLIO, 2020).
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opções de emprego formal com direitos e garantias. Outros podem adotá-la para
complementar sua renda, pois o que ganham não é suficiente para manter uma família.
De acordo com Amorim (2021) a pandemia intensificou a utilização do trabalho por
aplicativo, devido ao isolamento social, ao aumento do desemprego e à facilidade de acesso
ao trabalho. As pessoas que ficaram desempregadas ou tiveram redução de renda aderiram ao
trabalho por aplicativo, mas tiveram que se sujeitar a uma jornada de trabalho maior para
garantir seu sustento.
Apesar das plataformas possibilitarem a execução de um trabalho e reduzir o impacto
negativo do desemprego, o trabalhador just-in-time não tem direitos trabalhistas e nem poder
de barganha. A pesquisa de Abílio (2019) sobre a uberização revela como empresas utilizam
de modo vantajoso para si as condições de vida e a fragilidade social.
3. Metodologia
A metodologia do trabalho é uma pesquisa com a utilização do método survey. Foram
entrevistados 30 motoristas na região metropolitana do Rio de Janeiro de outubro de 2021 a
março de 2022. As perguntas foram realizadas durante o trajeto de aproximadamente 20
minutos.
Para a realização da coleta de dados, foi utilizado um questionário baseado no artigo de
Moraes (2019). Foram utilizadas as questões mais relacionadas à opinião dos motoristas em
trabalhar por meio de um aplicativo. Também foram incluídas questões com o objetivo de
analisar o sentimento do motorista quanto ao cansaço e estresse.
O questionário compreende questões objetivas fechadas. As entrevistas foram realizadas no
período da manhã ou à tarde devido o fluxo do trânsito estar menos intenso.
O questionário foi testado com três motoristas a fim de analisar a clareza das perguntas
utilizadas. O tempo médio da entrevista foi de 20 minutos.
Foram coletadas as informações dos 30 respondentes escolhidos de forma aleatória. A
pesquisa avaliou os dados através da análise estatística procurando relações das respostas
obtidas pelo questionário baseadas na literatura, e eventuais relações entre elas.
4. Resultados
Através da tabela 1, verifica-se que 16,67% dos motoristas utilizam o aplicativo há 1 ano,
provavelmente por falta de emprego devido à crise política, econômica e social. Quando este
valor é somado com o percentual de motoristas que utilizam o aplicativo há mais de um ano e
a menos de 3 anos, ou seja, desde 2020, início da pandemia SARS-CoV-2, o novo
Coronavírus que causa a doença COVID-19; o percentual atinge 50%.
Uma hipótese plausível para a causa desse alto número de trabalhadores por aplicativos há um
pouco mais de 2 anos, pode ser o desemprego e agravo da crise no Brasil pela pandemia do
Coronavírus. Tal hipótese não foi verificada neste estudo.
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Tabela 2 – Se o motorista se sente cansado e se o trabalho com aplicativo é a sua única fonte de renda
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5. Conclusão
O artigo buscou analisar a opinião dos motoristas por aplicativo em relação às condições de
trabalho a partir de uma survey conduzida no interior dos veículos, durante a prestação do
serviço de transporte.
Verificou-se que o número de trabalhadores por aplicativos aumentou, provavelmente devido
ao aumento do desemprego, acentuado pela crise no Brasil e pela pandemia do Coronavírus.
Também foi verificado que a maior parte dos motoristas tem o trabalho por aplicativo como
sua única fonte de renda, e se sentem cansados no dia a dia. A observação de que maioria não
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fenômeno da uberização, como a sociedade pode se preparar para que a desigualdade social
não aumente, além da importância da qualificação dos trabalhadores.
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REFERÊNCIAS
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