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XLII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO

"Contribuição da Engenharia de Produção para a Transformação Digital da Indústria Brasileira"


Foz do Iguaçu, Paraná, Brasil, 04 a 07 de outubro de 2022.

UBERIZAÇÃO: APLICATIVOS NO GERENCIAMENTO DO TRABALHO

Natália de Moraes Duque (Universidade Federal Fluminense)


nataliaduque@id.uff.br

Fernando Toledo Ferraz (Universidade Federal Fluminense)


fernandoferraz@id.uff.br

A uberização, que é parte do que se tem chamado de "economia de


plataforma", é um fenômeno que vem se difundindo no mundo atual e
mudando a estrutura de emprego em tempos de crise. Ainda que se
argumente que o fenômeno representa uma precarização do trabalho,
muitos motoristas consideram esta opção como alternativa ao
desemprego. O trabalho formal demanda mais despesas com direitos
trabalhistas para o empregador e com este tipo de vínculo a empresa
minimiza seus custos e o trabalhador reduz seus direitos trabalhistas.
Este trabalho procura analisar a opinião dos motoristas por aplicativo
em relação às condições de trabalho a partir de uma survey conduzida
no interior dos veículos, durante a prestação do serviço de transporte.

Palavras-chave: Uberização, Desemprego, Crise, Aplicativo.


XLII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO
"Contribuição da Engenharia de Produção para a Transformação Digital da Indústria Brasileira"
Foz do Iguaçu, Paraná, Brasil, 04 a 07 de outubro de 2022.

1. Introdução
A utilização de novas tecnologias nos processos de produção e trabalho traz alterações
positivas, mas muitas vezes pode gerar perdas para grupos da sociedade. Observa-se que com
as tecnologias da informação e comunicação (TICs) surgiram novas modalidades de prestação
de serviços e de consumidor, propiciando o aumento da uberização do trabalho e
consequentemente a precarização do mesmo. Antunes (2020) afirma que com a Quarta
Revolução Industrial novos trabalhos serão criados por e para pessoas com mais aptidões,
inteligência e capacitações, no entanto as precarizações, o subemprego e o desemprego
tenderão a aumentar.
Atualmente, empresas de tecnologias utilizam aplicativos com o propósito de unir prestação
de serviço-cliente, tais como serviços de entrega, transportes, serviços domésticos. Esse tipo
de trabalho já era praticado, mas numa época de crise, com o aumento do desemprego e a
pandemia do Coronavírus, houve um acentuado acréscimo na demanda desses serviços
(Cannas, 2021), contribuindo para redução das garantias dos trabalhadores.
Durante a pandemia, devido às normas de distanciamento em que as pessoas buscavam ficar
mais em casa, houve uma mudança de comportamento dos consumidores (Fernandes, 2021;
De Meyer, 2020), estes passaram a utilizar mais os meios digitais e tecnológicos para efetuar
suas tarefas. Pode-se citar o uso de aplicativos para efetuar compras e recebê-las em casa,
participar de reuniões, aulas e entretenimentos on-line, trabalhar em home office.
A difusão dessas novas formas de trabalhar também parece ser estimulada pela alta taxa de
desemprego que levou muitos indivíduos a buscarem essa forma de trabalho para obter uma
renda para sobrevivência (AMORIM, 2021). Este tipo de trabalho favorece a precarização do
trabalho, levando o trabalhador a um falso empreendedorismo, falta segurança nas relações e
se reduz o pertencimento à empresa. Também se nota o crescimento do senso do “cada um
por si”, do individualismo.
Segundo (Abílio, 2019) uberização do trabalho é uma nova forma de controlar e gerenciar o
trabalho concatenado à informalidade, que alicerça o trabalhador sob demanda.
Esse tema é relevante porque a Uberização está atingindo novos mercados. Essa modalidade
de trabalho, as plataformas tecnológicas podem ser encontradas em diversos setores como nas
áreas de serviços financeiros e bancários, medicina, educação e comércio (GINIYATULLIN,
2019).
Este artigo analisa a opinião de motoristas por aplicativo em relação às condições de trabalho
a partir de uma survey conduzida no interior dos veículos, sendo estruturado em mais quatro
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seções. Na seção 2 são apresentados os conceitos preliminares, incluindo definições de alguns


termos utilizados na literatura. Na seção 3 a metodologia utilizada é descrita. Os resultados
são apresentados na seção 4. Na seção 5, é realizada a conclusão do estudo.

2. Contextualização
Nesta seção são apresentados tópicos relativos ao processo de uberização encontrados na
literatura sobre o tema.

2.1. Uberização e indústria 4.0


O Portal da Indústria (2021) afirma que o conceito de Indústria 4.0 também chamada de
Quarta Revolução Industrial representa:
A automação industrial e a integração de diferentes tecnologias como inteligência
artificial, robótica, internet das coisas e computação em nuvem com o objetivo de
promover a digitalização das atividades industriais melhorando os processos e
aumentando a produtividade (Portal da Indústria).

De acordo com Schwab (2016) a quarta revolução cresce de forma significativa, ocorrendo
geralmente na maioria dos setores em todas as nações. E a extensão e intensidade das
mudanças alteram sistemas inteiros de produção, gestão e governança.
Segundo Schwab (2016), a indústria 4.0 difere das revoluções anteriores devido à união das
tecnologias e à interligação entre os domínios digitais, físicos e biológicos. A conectividade
das pessoas e o avanço da Inteligência Artificial aumentaram a disponibilidade de diversos
produtos e serviços como carros autônomos, drones, assistentes virtuais, softwares que
traduzem, investem e descobrem novos medicamentos. Com a computação e a
disponibilidade de grandes quantidades de dados, algoritmos preveem interesses culturais das
pessoas.
Segundo Giniyatullin (2019), a uberização está se desenvolvendo com rapidez na prestação de
serviços, principalmente no setor de transporte.
As empresas tecnológicas, que intermediam oferta e demanda, definem o valor e a variação
do trabalho, e têm ferramentas de avaliação e controle da produtividade que não possuem
regras claras (ABÍLIO, 2021).
Uma das vantagens do uso de sites da Internet como parte da uberização é agregar grande
número de propostas, expandir o sortimento, reduzir custos para os participantes do mercado,
e monitorar os concorrentes da empresa (GURINA, 2019).
Essa revolução está modificando o modo de produzir e de negociar no Brasil e no mundo,
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afetando as condições e relações de trabalho. Segundo Coutinho (2021), devido à variedade


de tarefas realizadas nas profissões é um desafio ao Direito do Trabalho e às organizações
sindicais regularem atividades que podem acabar futuramente.
Foi verificado que a indústria 4.0 tem o potencial de aumentar a desigualdade social, pois para
permanecer no mercado o indivíduo deve estar em constante atualização, possuir acesso e
aprender a utilizar as tecnologias digitais.

2.2. Uberização do trabalho


Conforme Giniyatullin (2019), a uberização elimina os intermediários, as plataformas
tecnológicas conectam diretamente consumidores e fornecedores de bens e serviços e
permitem realizar várias operações ao mesmo tempo: busca, seleção, pedido, fornecimento e
pagamento.
Para David (2016) a uberização é a cooperação entre consumidores, solicitantes do serviço, e
provedores usando uma plataforma de compartilhamento. No setor de transporte a plataforma
localiza um motorista que está próximo ao cliente.
Segundo Abílio (2019), o conceito de uberização do trabalho reporta-se à inovação no modo
de administrar, controlar e organizar as atividades e permeia mundialmente o âmbito do
trabalho.
Para Antunes (2020), a uberização aumenta o individualismo e mascara as relações de
trabalho, que assumem o aspecto de “prestação de serviços” onde são suprimidos direitos
trabalhistas e intensificada a exploração do trabalho.
Abílio (2020) relata que a uberização é uma tendência mundial em curso e consolida o
trabalhador como um autogerente subordinado disponível, sem garantias e direitos,
denominado de trabalhador just-in-time. As empresas que se apresentam como mediadoras, na
verdade operam novos modelos de subordinação e controle do trabalho, chamado
gerenciamento algorítmico do trabalho.
Para Abílio (2020) ser just-in-time significa que são transferidos ao trabalhador custos e riscos
da atividade; estando desprovido de direitos associados ao trabalho, não tendo garantias sobre
sua carga de trabalho e sua remuneração. O trabalhador fica à disposição esperando uma nova
solicitação de serviço via aplicativo, sendo que somente as horas trabalhadas são
remuneradas.
No trabalho uberizado o trabalhador é classificado como autônomo, num trabalho
individualizado, assumindo todos os riscos e sem nenhuma garantia, sendo um prestador de
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serviços, considerado “parceiro”. Mas na realidade, apesar da negação de vínculo, ele está
sujeito a um aplicativo que indica o cliente, local e tipo de serviço a realizar, seja transporte,
entrega, dentre outros, onde sua remuneração é baixa o que permite uma maior apropriação do
valor pela empresa, elevando seus lucros (ABÍLIO, 2020).

2.2.1. Precarização do trabalho


Segundo Filgueiras (2020) e Coutinho (2021) a precarização favorece a subordinação dos
trabalhadores às imposições da empresa. A precarização surge como uma consequência da
uberização do trabalho, pois nesse processo o trabalhador não tem vínculo empregatício com
a empresa e sim perdas de direitos trabalhistas como férias, plano de saúde, contribuição de
INSS e proteções contra os riscos para o trabalhador.
Em relação à transferência de riscos e custos operacionais pode-se citar: custo do
combustível, desgaste do meio de trabalho (carro, moto, bicicleta, etc.), acidentes, exposição a
assaltos, roubos e furtos, remuneração apenas das horas trabalhadas sem considerar o tempo
em que fica à disposição da empresa, jornadas longas de trabalho, avaliação de desempenho
realizada pelo cliente e desligamento do aplicativo sem aviso prévio como exemplos.
O trabalhador fica responsável pelos gastos para a realização do trabalho, em caso de acidente
não tem seguro, estando sujeito a assalto e violência sem ter a quem recorrer. Todos os riscos
são por sua conta, além de uma jornada que pode ultrapassar o limite de horas que seria
normal para um trabalhador numa empresa que respeite as leis trabalhistas. O lucro maior é
das empresas que apenas fazem o contato prestador-usuário, e consideram o trabalhador um
parceiro e não funcionário. Para Coutinho (2021) as plataformas digitais são utilizadas por
firmas de grande porte para conter custos de produção através da precarização laboral.
Fleming (2019) relata que a uberização além de explorar os trabalhadores uberizados gera
insegurança em profissionais com empregos mais estáveis, pois direitos arduamente
adquiridos parecem privilégios discutíveis.

2.3. Opção ao desemprego


Os trabalhadores, que perderam o emprego com carteira assinada, em sua maioria, buscaram
um trabalho informal, aumentando o número de trabalhadores por aplicativos, como
motoristas, motoboys e ciclistas. Muitos adotam esta estratégia como recurso imediato para
suas necessidades, mas que acabam prolongando este tipo de atividade por não encontrarem

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opções de emprego formal com direitos e garantias. Outros podem adotá-la para
complementar sua renda, pois o que ganham não é suficiente para manter uma família.
De acordo com Amorim (2021) a pandemia intensificou a utilização do trabalho por
aplicativo, devido ao isolamento social, ao aumento do desemprego e à facilidade de acesso
ao trabalho. As pessoas que ficaram desempregadas ou tiveram redução de renda aderiram ao
trabalho por aplicativo, mas tiveram que se sujeitar a uma jornada de trabalho maior para
garantir seu sustento.
Apesar das plataformas possibilitarem a execução de um trabalho e reduzir o impacto
negativo do desemprego, o trabalhador just-in-time não tem direitos trabalhistas e nem poder
de barganha. A pesquisa de Abílio (2019) sobre a uberização revela como empresas utilizam
de modo vantajoso para si as condições de vida e a fragilidade social.

2.4. O falso empreendedorismo


O conceito de empreendedorismo vem se modificando com a inovação do seu uso, a partir do
estabelecimento do neoliberalismo, do crescimento do desemprego e do trabalho autônomo
(ABÍLIO, 2019).
Para Zen (2008) um dos conceitos de empreendedor é o que promove a inovação, não é um
inventor, mas introduz a invenção na indústria, e tem capital para agir.
Atualmente, um conceito distorcido de empreendedorismo é utilizado para informalizar o
trabalho e transferir riscos para o trabalhador, que apesar de ser subordinado, é intitulado
como empreendedor (ABÍLIO, 2019). A designação do trabalhador como “empreendedor”
não se sustenta frente ao conflito entre as responsabilidades dos envolvidos neste trabalho.
Algumas empresas que utilizam algoritmo para contratar serviços fazem propagandas
incentivando o trabalhador a ser um empreendedor, como a empresa Uber, que convida o
motorista a ser “seu próprio chefe”. Esse processo é chamado de falso empreendedorismo
conforme Abílio (2019), sendo utilizado em várias profissões há alguns anos, numa crescente
tentativa de transferir responsabilidade para o trabalhador de todos os riscos e custos, ficando
com uma menor remuneração em relação ao trabalho que executa. Esta transferência permite
que o empresário detenha uma maior parcela do lucro, pois não precisa arcar com vários
riscos e despesas, sendo responsável apenas por unir o trabalhador ao usuário.
O trabalhador não é contratado por estas empresas, e sim adere a um aplicativo, sendo seu
auto gerente subordinado, visando a subsistência em uma sociedade onde a precariedade
prevalece (ABÍLIO, 2019).
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Esse modo de trabalho vem se desenvolvendo em vários países, trazendo mudanças


consideráveis no sistema trabalhista, onde os trabalhadores têm perdas gradativas em relação
aos seus direitos anteriormente conquistados.

3. Metodologia
A metodologia do trabalho é uma pesquisa com a utilização do método survey. Foram
entrevistados 30 motoristas na região metropolitana do Rio de Janeiro de outubro de 2021 a
março de 2022. As perguntas foram realizadas durante o trajeto de aproximadamente 20
minutos.
Para a realização da coleta de dados, foi utilizado um questionário baseado no artigo de
Moraes (2019). Foram utilizadas as questões mais relacionadas à opinião dos motoristas em
trabalhar por meio de um aplicativo. Também foram incluídas questões com o objetivo de
analisar o sentimento do motorista quanto ao cansaço e estresse.
O questionário compreende questões objetivas fechadas. As entrevistas foram realizadas no
período da manhã ou à tarde devido o fluxo do trânsito estar menos intenso.
O questionário foi testado com três motoristas a fim de analisar a clareza das perguntas
utilizadas. O tempo médio da entrevista foi de 20 minutos.
Foram coletadas as informações dos 30 respondentes escolhidos de forma aleatória. A
pesquisa avaliou os dados através da análise estatística procurando relações das respostas
obtidas pelo questionário baseadas na literatura, e eventuais relações entre elas.

4. Resultados
Através da tabela 1, verifica-se que 16,67% dos motoristas utilizam o aplicativo há 1 ano,
provavelmente por falta de emprego devido à crise política, econômica e social. Quando este
valor é somado com o percentual de motoristas que utilizam o aplicativo há mais de um ano e
a menos de 3 anos, ou seja, desde 2020, início da pandemia SARS-CoV-2, o novo
Coronavírus que causa a doença COVID-19; o percentual atinge 50%.
Uma hipótese plausível para a causa desse alto número de trabalhadores por aplicativos há um
pouco mais de 2 anos, pode ser o desemprego e agravo da crise no Brasil pela pandemia do
Coronavírus. Tal hipótese não foi verificada neste estudo.

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Tabela 1 – Tempo que trabalha por aplicativo

Fonte: Autoria própria


Pela tabela 2, verifica-se que 63,33% dos motoristas que trabalham por aplicativo se sentem
cansados no seu dia a dia, esse resultado é provavelmente devido à longa jornada de trabalho
a que os motoristas se submetem para atingir a meta de renda para pagar suas despesas.
Conforme Fleming (2019) com base em estudos realizados no Reino Unido afirma que os
trabalhadores por aplicativos que têm como fonte de renda principal este ofício devem laborar
longas horas para arcar com seus custos e despesas. Constatou-se também que 66,67% dos
entrevistados possui o trabalho por aplicativo como fonte única de renda.

Tabela 2 – Se o motorista se sente cansado e se o trabalho com aplicativo é a sua única fonte de renda

Fonte: Autoria própria


Através da tabela 3, verifica-se que 46,67% dos motoristas não se sentem estressados, que
30% se sentem mais ou menos e somente 6,67% se sente muito estressado, esse resultado
provavelmente é devido a entrevista ter sido realizada no horário mais cedo, em que o
trabalhador ainda não foi exposto ao tráfego intenso e a uma jornada de trabalho muito longa.
Constatou-se que nesta amostra 2 trabalhadores responderam que se sentem muito estressados
e cansados no dia a dia, um deste disse que trabalha 7 dias da semana durante 10 horas e o
outro informou que trabalha 6 dias da semana de 10 a 12 horas por dia. Esses dados
corroboram com a autora Abílio (2020) sobre o trabalhador just-in-time que não possui
garantias sobre sua carga de trabalho e sua remuneração. Com isso o colaborador fica à

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disposição aguardando nova solicitação de serviço via aplicativo.

Tabela 3 – O quanto estressado o motorista se sente

Fonte: Autoria própria


Pela Tabela 4, 63,33% dos motoristas começaram a trabalhar na Uber, pois ficaram
desempregados. Conforme Amorim (2020), o número de brasileiros a utilizar aplicativos
aumentou devido ao desemprego. Segundo ABÍLIO (2019), os aplicativos são uma opção
rápida para os trabalhadores conseguirem um novo emprego, pois exige uma menor
especialização dos trabalhadores.

Tabela 4 – Trabalha na Uber porque ficou desempregado

Fonte: Autoria própria


Pela Tabela 5, é verificado que 93,33% dos motoristas gostam da possibilidade de trabalhar o
horário que desejar. Percebe-se que os dados estão de acordo com a pesquisa informada no
site UberNewsroom e realizada pelo Instituto de Pesquisa Datafolha de 13 de agosto a 20 de
setembro de 2021 que notabiliza que motoristas e entregadores preferem ser profissionais
independentes, mas desejam mais proteção. De acordo com esta pesquisa, a flexibilidade de
horário é um dos principais atrativos de motoristas e entregadores para a atividade, 87%
afirmam que “ter horário flexível” foi um dos motivos pelos quais optaram pelo trabalho por
aplicativo.
Também nota-se que a questão da flexibilidade do horário para obter uma remuneração é
utilizada no site da Uber para atrair novos motoristas.

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Tabela 5 – Flexibilidade do horário de trabalho

Fonte: Autoria própria


Pela Tabela 6, verifica-se que mais da metade dos trabalhadores não se consideram como
empreendedor, e que 36,67% se considera um empreendedor. Apesar, do questionário ser de
questões fechadas, infere-se pelos relatos dos motoristas que esta questão não é bem definida.
Alguns motoristas relataram que não se sentiam como empreendedores somente por trabalhar
na Uber. Já outros se sentem como empreendedores por terem mais autonomia no seu
trabalho. Alguns autores acreditam que empreendedorismo é fazer cada pessoa se sentir o
único responsável por seu sustento. Na opinião de Amorim (2021) o discurso atua para
mistificar o enorme grau de precariedade que existe no mercado de trabalho, estando os
trabalhadores sujeitos a um alto grau de exploração e risco na sua atividade.

Tabela 6 – Percepção de ser um empreendedor

Fonte: Autoria própria


Pela Tabela 7, verifica-se que 80% dos trabalhadores consideram que os custos de
manutenção do carro deveriam ser divididos com a Uber. Segundo Abílio (2019), atualmente,
as plataformas são apenas intermediários entre o consumidor e o trabalhador. O trabalhador
não é contratado, e não possuiu garantias, direitos ou segurança associados ao trabalho, sendo
o responsável pelos custos de sua atividade. Os autores Filgueiras e Cavalcante (2020) dizem
que a precarização torna os trabalhadores mais submetidos às exigências das empresas.

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Tabela 7 – Responsabilidade dos custos de manutenção do carro

Fonte: Autoria própria


Na Tabela 8, verifica-se que a opinião dos motoristas sobre o sistema de avaliação da Uber se
divide igualmente entre acham justo e não acham justo. Alguns acham justo, pois
normalmente são bem avaliados, outros não acham porque apesar de prestarem um bom
serviço às vezes ocorre algum problema, como por exemplo deixar o passageiro fora do
destino devido algum impedimento, ter ciclovia, não ser permitido estacionar, e por isto são
mal avaliados.
De acordo com Amorim (2021) os motoristas ficam preocupados com as estrelas, pois pode
haver desligamento da plataforma e punição, relatando que os motoristas se tornam escravos
das estrelas.
O gerenciamento algorítmico fornece incentivos e condições de “gamificação” para que os
trabalhadores continuem utilizando a plataforma.

Tabela 8 – Sistema de avaliação da Uber

Fonte: Autoria própria

5. Conclusão
O artigo buscou analisar a opinião dos motoristas por aplicativo em relação às condições de
trabalho a partir de uma survey conduzida no interior dos veículos, durante a prestação do
serviço de transporte.
Verificou-se que o número de trabalhadores por aplicativos aumentou, provavelmente devido
ao aumento do desemprego, acentuado pela crise no Brasil e pela pandemia do Coronavírus.
Também foi verificado que a maior parte dos motoristas tem o trabalho por aplicativo como
sua única fonte de renda, e se sentem cansados no dia a dia. A observação de que maioria não

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se declarou estressada provavelmente se deve ao fato de a entrevista ter sido realizada no


horário mais cedo, em que o trabalhador ainda não foi exposto ao tráfego intenso e a uma
jornada de trabalho muito longa. Foi averiguado que trabalhadores que se declararam muito
estressados possuem uma longa jornada de trabalho semanal, pois é um trabalhador que está
disponível o máximo de tempo para realizar corridas objetivando ter uma renda adequada para
saldar seus gastos.
Além disso, a maioria dos entrevistados disse que é motorista por aplicativo por ter ficado
desempregado, reforçando a hipótese de que por ser um trabalho que exige menores barreiras
de entrada torna-se uma opção mais imediata ao desemprego.
Conclui-se que o trabalho por aplicativo, na pandemia, cumpriu um papel de proporcionar
uma fonte alternativa de renda, ainda que precária. Os dados parecem sugerir que será mais
comum no dia a dia e no futuro da sociedade, as pessoas utilizaram desse recurso para não
ficarem desempregadas e terem alguma renda para sustentar suas famílias. A flexibilidade de
horário parece ser mais um incentivo para realizar atividades laborais dentro deste modelo.
Entretanto, apesar da publicidade sobre o trabalhador ser seu próprio chefe, promovendo a
ideia de ser um empreendedor, foi verificado que mais da metade dos entrevistados não se
considera um empreendedor. Este achado corrobora o que alguns autores como Abílio (2019)
e Amorim (2021) afirmam que esse discurso serve apenas para disfarçar a precariedade do
mercado de trabalho.
Constatou-se, ainda, que a maioria dos trabalhadores gostaria que os custos de manutenção
com o carro fossem divididos com a Uber, pois assim teriam um ganho maior. Ficou dividida
a opinião sobre o sistema de avaliação, enquanto alguns concordam e acham justo o usuário
avaliá-los, outros discordam, pois, devido a alguma pequena intercorrência são mal avaliados
e isso pode prejudicá-los diretamente na sua condição de trabalho, sendo penalizado ou
desligado do aplicativo, podendo ficar sem a sua única fonte de renda.
Alguns pontos de demanda de melhoria das condições por parte dos trabalhadores apareceram
na pesquisa como: regularização da jornada de trabalho, maior transparência nos critérios de
avaliação e de punição, além da questão dos gastos e custos para prestação do serviço.
Como a amostra é pequena propõe-se, para estudos futuros, aumentar o tamanho da amostra
para ter uma avaliação mais precisa.
Para contribuir com estudos sobre o tema da uberização, trabalho por aplicativo, indústria 4.0
e condições de trabalho, sugere-se estudos mais qualitativos que avaliem a essência desse

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fenômeno da uberização, como a sociedade pode se preparar para que a desigualdade social
não aumente, além da importância da qualificação dos trabalhadores.

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ABÍLIO, Ludmila Costhek. UBERIZAÇÃO E JUVENTUDE PERIFÉRICA: Desigualdades, autogerenciamento


e novas formas de controle do trabalho. Novos estudos CEBRAP, v. 39, p. 579-597, 2021.

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