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Grupo de Trabalho:
GT107: Políticas culturales, performances y expresiones artísticas en ciudades
latinoamericanas
Título do Trabalho:
Sarau da Cooperifa: circuito e trajetos da poesia na zona sul da cidade de São
Paulo.
Introdução
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Para mais esclarecimentos sobre essas e as demais categorias, ver Magnani: Da Periferia ao
centro: trajetórias de pesquisa em Antropologia Urbana, 2012
Cultura, na periferia
A partir dos anos 1990, a periferia da cidade passa a ser “um lugar onde se
produz e consome arte e cultura” (NASCIMENTO, 2019, p. 18), onde
Sarau da Cooperifa
No final dos anos 90, Sérgio Vaz decidiu dedicar-se a viver economicamente de
poesia. No início, com dificuldades, foi apelidado de “tiozinho da poesia” pois
aproveitava os intervalos dos shows de rap para recitar poesia e divulgar seu
trabalho. Nas primeiras vezes pediu para entrar no palco de música usando a
ideia de que rap faz música e poesia, porém faltava a poesia falada diferente da
poesia cantada = música. “Um belo dia deu um problema técnico na pikcup3 e
para fechar o tempo sem tirar o público da plateia eu fui convidado. ‘Chama o
tiozinho da poesia ai! ’” (Depoimento de Sérgio Vaz ao microfone da Coopeirfa).
Assim, por insistência e por acreditar que a poesia poderia trazer produzir bons
efeitos na periferia, aos poucos passa a ser convidado.
Neste interim, surge o grupo das Quintas Malditas no bar do Portuga, em
Taboão da Serra. Grupo de amigos que se reuniam nos bares, nas quintas feiras
a noite, após o trabalho, para bater papo, trocar ideia e falar de poesia. É a partir
desse grupo que o Sarau da Cooperifa nasce em 2001 num terreno cedido de
uma fábrica abandonada em Taboão da Serra. Segundo Rose Dorea, (produtora
da Cooperifa) “começou com 17 pessoas e hoje movimenta centenas de pessoas
toda semana”, a partir da ideia de cooperação entre as pessoas da periferia. O
primeiro ano de atuação aconteceu no Bar Garajão em Taboão da Serra até o
bar ser vendido. Sem aviso prévio, quando os amigos chegam para o sarau e
encontram pessoas “chorando na porta pois o bar tinha sido vendido e ninguém
tinha sido comunicado” (Relato de Sérgio Vaz).
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Equipamento de som utilizado nos shows de música.
Diante da negativa, por parte da nova direção do bar, de cessão do espaço para
o sarau, era necessário encontrar outro lugar. Então surge a proposta de levar o
evento para o Bar do Zé Batidão, bar que anos atrás pertencia ao pai do poeta
Sérgio Vaz. Assim ,o sarau se estabelece como uma atividade cultural com dia
da semana, horário e espaço físico estabelecidos na periferia. E, segundo a
etnografia de Fernandez e Leite (2019), até os dias de hoje a toda terça-feira se
torna um acontecimento poético.
Sua criação e trajetória estão registradas pelo poeta e fundador Sérgio Vaz em
Cooperifa: antropofagia periférica, (2008). A manutenção do evento
semanalmente, ao longo desses anos, tem sido inspiração para inúmeros saraus
nas periferias, até mesmo em outras cidades longe de São Paulo e, a cada dia
“aprimorando o sentido da palavra que nomeia o Sarau: Cooperifa = cooperação
+ periferia” (FERNANDEZ e LEITE, 2019, p. 474), com o
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https://vermelho.org.br/prosa-poesia-arte/sergio-vaz-manifesto-da-antropofagia-periferica/
5 https://cdn.culturagenial.com/arquivos/manifesto-antropofago.pdf
indo para o centro da cidade como o Theatro Municipal de São Paulo, Biblioteca
Mario de Andrade e Paço das Artes. Ainda segundo Marinho 2015, o manifesto
teve
Assim, cada “circuito”, a partir de sua dinâmica própria, junta “usuários, adeptos
ou frequentadores” que se movimentam a partir instituindo seus “trajetos”.
(MAGNANI, 2012, p.128 e p.138). É o que ocorre no Sarau da Cooperifa, onde
Pode-se dizer que o Sarau da Cooperifa está no centro do circuito dos saraus da
zona sul, ou mais ainda, no circuito dos saraus da cidade de São Paulo, pois ao
longo de duas décadas de existência e resistência se mantem-se ativo vivo sem
passar por interrupções. A ideia de utilizar a poesia declamada nos espaços de
bares da periferia influenciou a fundação de vários outros saraus tanto em São
Paulo quanto em outras cidades como Salvador, Porto Alegre, Rio de Janeiro,
Arco Verde (PE).
Como exemplo, eis alguns saraus cujos poetas e fundadores estão presentes na
Cooperifa semanalmente:
- Sarau do Binho6: fundado em 2004 pelo Binho e pela Suzi, no bar que eles
mantinham na região do Campo Limpo, periferia da zona sul de São Paulo. Hoje
o sarau acontece de forma itinerante na escolas e bibliotecas da região.
- Sarau Elo da Corrente7: fundado por Michel Yakini em 2007, no bairro de
Pirituba em São Paulo, realizado no bar do Santista.
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http://saraudobinho.blogspot.com/
7 http://elo-da-corrente.blogspot.com/p/quem-somos.html
- Sarau do Ademar8: fundado em 2008 na Cidade Ademar, bairro da zona sul de
São Paulo.
- Sarau Poesia na Brasa9: fundado em 2008 na Brasilândia, idealizado Sônia
Bischain, Zona Norte da cidade, e acontecia Bar do Cardoso e depois Bar do
Carlita.
- Sarau da Vila Fundão10: fundado por Fernando Ferrai, em 2009 e acontece toda
quinta feira no Capão redondo, zona sul de São Paulo.
- Suburbano Convicto11: fundado por Alessandro Buzo em 2010, no bairro do
Bexiga, em São Paulo, e em 2015 abre um segundo espaço em São Sebastião,
litoral do estado, passando a ser o único sarau que acontece em duas cidades
diferentes.
- Sarau da Pretas12: fundado em 2016 por Débora Garcia, Elizandra Souza,
Amanda Telles, Lilian Rocha e Oluwa Seyi, integrante de um coletivo de
mulheres pretas da periferia da zona sul de São Paulo.
Além de incentivar novos espaços de literatura na periferia, a Cooperifa também
fomenta a presença das pessoas do bairro no sarau concedendo premiações
com menções honrosas a grupos que atuam na comunidade, inclusive
partilhando as mesmas ideias ou que tiveram a Cooperifa como inspiração para
suas fundações. Segundo Sérgio, “os grupos se ligam pela forma de fazer ou de
viver a poesia na quebrada”. Como por exemplo o Samba da Vela13: grupo
liderado pelo sambista Chapinha que anualmente lança novos nomes no
panorama musical da cidade e o Pagode da 27 grupo de músicos que realizam
apresentações de samba numa rua anos atrás marcada pela violência na qual,
hoje o bar está aberto para a dança e a música. 14. Além de música, o futebol de
várzea também está presente no sarau recebendo incentivo pois “os jogadores
vêm no sarau com as suas famílias, e a gente ajuda doando o uniforme do time.”
(Relato de Sérgio Vaz)
8 http://saraudaademar.blogspot.com/
9 http://brasasarau.blogspot.com/
10 https://juntos.org.br/2011/02/sarau-vila-fundao/
11 http://sarausuburbano.blogspot.com/
12 https://ims.com.br/eventos/sarau-das-pretas/
13 https://pt.wikipedia.org/wiki/Comunidade_Samba_da_Vela
14 https://www.agenciamural.org.br/pagode-da-27-cria-novo-espaco-cultural-casa-27/
O Sarau
Povo lindo, povo inteligente, é tudo nosso! Com essa frase, o sarau é aberto as
20h. A organização da Cooperifa tem um acordo com a comunidade do entorno
ao bar de modo que o evento deve acabar as 22h. Esse acordo diz respeito ao
barulho e também estabelece um limite de tempo para as apresentações: duas
horas para acontecer a poesia, no cenário que é constituído pelo bar, um
microfone e duas caixas de som.Três grupos de pessoas têm funções
estabelecidas dentro desse cenário para que a poesia aconteça: são os
organizadores da Cooperifa, os poetas e o público.
Os organizadores
- Seu Zé, com sua esposa e uma garçonete organizam a cozinha do bar. Eles
produzem o !escondidinho” de carne seca como o carro chefe da noite de terça
feira. Além do torresmo que ele frita momentos antes do começo das atividades
para servir fresquinho e crocante. Quando começa o sarau, os pedidos são feitos
e retirados no balcão; não há serviço de mesa, principalmente porque o bar fica
muito cheio e se torna inviável o trânsito do serviço. Logo que o sarau acaba,
os funcionários do bar começam a limpeza das mesas que se tornam
aglomerados de pratos e copos deixados ao longo das apresentações.
- Cocão fica responsável pela montagem do microfone, mesa de som, caixas de
som e manter tudo funcionando.
- Lu Souza fica com a recepção dos poetas anotando os nomes dos
declamadores do dia.
- Rose Doria, Jairo Periafricania, Marcio Batista, Caio Paraguaio trabalham como
mestres de cerimônia dividindo a tarefa de anunciar o próximo poeta, além de
cuidarem para a manutenção do silêncio.
- Esposa e a filha do poeta Sérgio Vaz ficam na venda de produtos como
camisetas, bonés, jaquetas.
Toda essa equipe faz parte da Cooperifa; todos trabalham para a manutenção
do evento de modo que tudo aconteça sempre da mesma forma, com a mesma
regularidade de todos os dias.
O silêncio é uma prece! Esta é a frase que funciona como mantra para a
manutenção do silêncio enquanto se declama poesia. Ela é pronunciada ao
microfone por um dos mestres de cerimônia e, prontamente, o silêncio e
estabelecido como numa igreja.
Pode bater palma com vontade! É a frase que é proferida tanto para apresentar
um poeta ao microfone, como quando acaba a declamação do poeta e o público
recebe com palmas. Se as palmas começam a cair de volume, logo surge a Rose
Dorea dizendo: Pode bater palma por igual!
Hu! Cooperifa, hu! Cooperifa! É o mote para fechar a noite. Após o último poeta
declamar sua poesia, o mestre de cerimônia em vez de anunciar mais um nome,
faz essa chamada que define o final do sarau. Todos os presentes repetem a
exclamação várias vezes que concluída por uma salva de palmas. Em seguida
já entra uma música na caixa de som e o bar se transforma voltando rapidamente
a ser um bar convencional, como nos outros dias da semana.
Os poetas
- Os poetas: pessoas que são profissionais da literatura ou não, mas que tem o
prazer de declamar poesias de autoria própria ou de outros poetas no microfone
do sarau, pois
Muitos desses poetas viajam longas distancias na cidade para ter alguns minutos
ao microfone declamando sua poesia. Muitos gastam viajam cerca de 2h ou 3h
de transporte público para tal, vindo da zona leste, Carapicuíba, Osasco, de
modo que Sérgio Vaz fala que o “sarau pode ser considerado como o movimento
dos sem palco, porque todos podem falar sua poesia e todos vão ouvir em
silêncio”.
O acordo com a comunidade do bairro para o sarau terminar até as 22h limita o
tempo em que os poetas têm de microfone, pois há noites em que as duas horas
da sessão é dividida entre 40 ou 50 poetas inscritos. A preferência sempre é
para os mais assíduos, mas a oportunidade de inscrição é dada a todos que
comparecerem na noite, de modo que os “novatos” ou “visitantes” ficam para o
final.
O último poeta que fecha o sarau sempre tem a reponsabilidade da melhor
performance. Muitas das vezes ficam a cargo de um rapper ou de uma cantora
que ao transformar suas músicas em poesia declamada é acompanhada pelo
público que bate palmas ou canta as melodias dos refrãos. Cantoras como Ana
Cannas, Izzi Gordon; Mcs Gaspar Z’Africa, Fino do Rap; Dj KLJay entre outros
são nomes que fazem esse fechamento do sarau, quando presentes.
O público
- O público: professores que trazem seus alunos, oriundos das escolas pulicas,
poetas que circulam no circuito dos Saraus da zona sul, familiares dos
organizadores ou os poetas e amigos em geral. Lucia Tennina reproduz uma
crítica de Fernando Ferrai, criador do Sarau da Vila Fundão, na qual ele afirma
perceber “que às vezes é o mesmo público: o mesmo público que frequenta o
Binho, a Fundão, frequenta a Cooperifa. E não é isso que eu quero. Eu quero
que a comunidade esteja presente”. (TENNINA, 2018, p. 76)
Situação que nem sempre se pode levar ao pé da letra pois os poetas, os
professores e demais frequentadores do sarau, e realizam ações pedagógicas
nas escolas formando novos leitores e frequentadores, a cada semana e até em
penitenciárias. Em certa ocasião, numa antiga FEBEM, hoje Fundação Casa15,
Sergio Vaz perguntou se os meninos gostavam de poesia e a resposta foi:
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https://pt.wikipedia.org/wiki/Funda%C3%A7%C3%A3o_CASA
“Não”! Logo em seguida pergunta se eles gostam de Racionais MC’s16 e a pronta
resposta: “Logico!”. “Então vocês gostam de poesia, só não sabiam o que era”.
A literatura
Pode vir do nó da madeira
Ou do bloco de cimento.
Se ela desce do pedestal
Tem o poder de nos fazer entender
Quem nós somos
E quem são os nós.
(Poeta Sérgio Vaz)17
16
Grupo de rap muito conhecido na cidade de São Paulo.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Racionais_MC%27s
17
Poesia de Sérgio Vaz: Flores da Batalha, 2023.
Bibliografia