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Posfácio
Direito Internacional e Estudos Latino-Americanos
TOLEDO–PR
2022
© 2022 Júlio da Silveira Moreira
Todos os direitos reservados ao autor
ISBN 978-65-87843-32-2
DOI: https://doi.org/10.58942/eqs.37
Mao Tsetung
Notas do autor sobre esta edição
2 MASCARO, Alysson Leandro. Estado e Forma Política. São Paulo: Boitempo Editorial,
2013.
3 OSÓRIO, Luiz Felipe. Imperialismo, Estado e Relações Internacionais. Editora Ideias &
Introdução ..................................................................................................... 25
Metodologia .................................................................................................... 25
Abordagem crítica do Direito Internacional ............................................. 26
Plano da obra .................................................................................................. 29
Capítulo 1 – As declarações de direitos ................................................ 33
Capítulo 2 – Bases da filosofia política moderna .............................. 39
O encerramento histórico da revolução burguesa ................................... 42
Capítulo 3 – Economia política e forma jurídica .............................. 45
Teoria marxista do conhecimento............................................................... 46
Equivalência e valor ....................................................................................... 49
A categoria trabalho....................................................................................... 51
Capítulo 4 – Sujeito de direito ................................................................. 57
Relações jurídicas ........................................................................................... 60
A forma contrato ........................................................................................... 62
Releitura dos direitos fundamentais ............................................................ 65
Capítulo 5 – Ideologia e fetichismo jurídico ...................................... 67
Fetichismo da norma jurídica....................................................................... 71
Capítulo 6 – Estado e sociedade capitalista ....................................... 79
Capítulo 7 – Fundamentos do Direito Internacional....................... 89
Vitoria: o direito no encontro colonial ....................................................... 90
Grotius: o modelo de Westphalia................................................................ 96
Kant: a universalização do Estado de Direito......................................... 100
Diálogos .........................................................................................................103
Capítulo 8 – Teoria do Imperialismo.................................................. 115
Conceitos fundamentais da Teoria do Imperialismo ............................. 117
Da acumulação primitiva ao monopólio.................................................. 118
O surgimento do capital financeiro ..........................................................123
Exportação de capitais ................................................................................129
24 Direito Internacional: para uma crítica marxista
Metodologia
2 Engels, 2000.
3 Mao Tsetung, 2011b.
4 Miaille, 1979, p. 18.
5 Mascaro, 2010, p. 16.
Introdução 27
11 1984b.
12 Chimni, 2006, p. 22.
13 2004.
Introdução 29
Plano da obra
14 1988.
15 2006.
30 Direito Internacional: para uma crítica marxista
1 2004.
2 Ibid., p. 22.
3 Marx e Engels, 1980.
4 Ibid., p. 18.
5 Marx, 1987c.
6 Ibid., 2ª tese, p. 161.
7 Ibid., 6ª tese, p. 162.
Capítulo 2 – Bases da filosofia política moderna 41
15 Ibid., p. 44.
16 Id., 2008, p. 211-212.
44 Direito Internacional: para uma crítica marxista
determina o seu ser, mas, ao contrário, é o seu ser social que determina
sua consciência. 2
[...] até mesmo as categorias mais abstratas [...], apesar de sua validade
para todas as épocas, são, contudo, na determinidade desta abstração,
igualmente produto de condições históricas, e não possuem plena
validez senão para estas condições e dentro dos limites destas. 9
Equivalência e valor
11 Ibid., p. 20.
12 1988, p. 35.
13 Ibid., p. 24.
14 Apud Naves, 2000.
15 Miaille, 1979, p. 23.
50 Direito Internacional: para uma crítica marxista
A categoria trabalho
23 1988b, p. 252
24 Ibid., p. 267.
25 Naves, 2008.
54 Direito Internacional: para uma crítica marxista
Para que seu possuidor [da força de trabalho] venda-a como mercadoria,
ele deve poder dispor dela, ser, portanto, livre proprietário de sua
capacidade de trabalho, de sua pessoa. Ele e o possuidor de dinheiro se
encontram no mercado e entram em relação um com o outro como
possuidores de mercadorias, iguais por origem, só se diferenciando por
um ser comprador e o outro, vendedor, sendo portanto ambos pessoas
juridicamente iguais. 1
Relações jurídicas
A forma contrato
vincula a um patrão não por força bruta, mas por força de um contrato de
trabalho em que cabem direitos e deveres a ambas as partes. A dominação
é indireta: na esfera da circulação, vendedor – contrato mercantil –
comprador; na esfera da produção, capitalista – contrato de trabalho –
trabalhador 20. Para que essa relação exista, deve pressupor igualdade
jurídica e liberdade formal. Trata-se, portanto, da escravidão assalariada,
que maximiza a exploração da força de trabalho.
A esfera da circulação de mercadorias (relações de troca mediadas
pelo conceito de justo, onde se inclui a força de trabalho oferecida como
mercadoria) realiza os direitos fundamentais de liberdade, igualdade e
propriedade; ela é, portanto, “um verdadeiro éden dos direitos naturais do
homem” 21.
Ao se adentrar na esfera da produção, onde a mais-valia é
produzida para depois ser apropriada, a relação se desiguala: de um lado,
o capitalista, “cheio de importância, sorriso satisfeito e ávido por
negócios”, de outro, o trabalhador, “tímido, contrafeito, como alguém que
levou a sua própria pele para o mercado e agora não tem mais nada a
esperar, exceto o – curtume” 22.
É muito claro como isso se aplica nas relações de trabalho
contemporâneas. Na esfera da circulação, o trabalhador faz parte do
“mercado de trabalho”, baseado na visão romântica da concorrência e
escolha dos candidatos ao emprego. É a vitrine do capitalismo, onde
repousa a sua propaganda liberal. Quando o trabalhador entra na esfera da
produção, restam as duras pressões e estratégias de exploração máxima da
força de trabalho, com a disciplina militarizada da fábrica.
Eis o papel do direito na sociedade capitalista: ao afirmar o estatuto
da liberdade e igualdade para exploradores e explorados, não só oculta a
exploração, mas assegura que ela aconteça. Reafirmando esse caráter
contraditório entre universalidade abstrata e totalidade concreta, e
acrescentando a noção de reificação como objetivação do indivíduo. No
mundo da troca mercantil, “a realização do ser social é a sua perdição, a
20 Mascaro, 2007.
21 Marx, 1988a, p. 141.
22 Ibid., p. 141.
Capítulo 4 – Sujeito de direito 65
[...] para viver, [o operário] tem apenas o seu salário, de modo que é
obrigado a aceitar o trabalho quando, onde e como se lhe apresenta. Já
o ponto de partida não é equitativo para o operário. A fome representa
para ele uma terrível desvantagem. 25
9 Naves, 2001
10 Engels, 1881, s/p.
Capítulo 5 – Ideologia e fetichismo jurídico 71
Não deve esquecer-se de que luta contra os efeitos, mas não contra as
causas desses efeitos; que logra conter o movimento descendente, mas
não fazê-lo mudar de direção; que aplica paliativos, mas não cura a
enfermidade. Não deve, portanto, deixar-se absorver por essas
inevitáveis lutas de guerrilhas, provocadas continuamente pelos abusos
incessantes do capital ou pelas flutuações do mercado. 11
A classe operária deve saber que o sistema atual, mesmo com todas as
misérias que lhe impõe, engendra simultaneamente as condições
materiais e as formas sociais necessárias para uma reconstrução
econômica da sociedade. Em vez do lema conservador de: “Um salário
justo para uma jornada de trabalho justa!”, deverá inscrever na sua
bandeira esta divisa revolucionária: “Abolição do sistema de trabalho
assalariado!” 12
19 Ibid., p. 230.
20 Ibid., p. 232.
21 Ibid., p. 233.
74 Direito Internacional: para uma crítica marxista
Os cursos jurídicos não dão conta (ou não querem fazê-lo) de captar as
contradições da realidade. A sua busca de autossuficiência no jurídico os
torna impotentes para entenderem qualquer fenômeno a um palmo do
código.26
A relação jurídica não poderia, de qualquer modo, ter por base uma
relação social preexistente, pois o ponto de vista normativista só pode
partir da ideia de que a relação mesma só se constitui pela norma jurídica,
ou seja, de que a relação é logicamente gerada pela norma, de que a
norma é que preexiste à relação. A norma cria os sujeitos, dita o dever,
fixa as modalidades de seu cumprimento, por isso nada pode ser anterior
à norma. A conclusão de Kelsen, não se pode negar, é logicamente
perfeita. Mas a perfeita coerência lógica leva à conclusão pouco plausível
de que não é a existência de uma estrutura social que, por sua
organização específica, demanda uma forma de direito, mas uma forma
de direito que, por sua existência, determina a organização social. 27
assim como “uma causa última ou primeira não tem lugar dentro de um
sistema de realidade natural” 29.
Em oposição a Kelsen, Pachukanis mostra que a norma não pode
ser o critério do direito, porque ela própria decorre das relações sociais. A
criação da norma só pode se dar a partir das relações sociais previamente
existentes ou, no máximo, pode constituir a previsão para futuras relações
numa margem de probabilidade, podendo restar apenas como um ensaio
de criação do direito. Só assim se pode pensar o direito sem o erro do
dogmatismo:
29 Ibid., p. 163.
30 Pachukanis, 1988, p. 49.
31 Ibid., p. 47.
32 Kashiura Jr., 2009, p. 79.
Capítulo 5 – Ideologia e fetichismo jurídico 77
2 2004.
3 1987.
4 Engels, 1987, p. 191.
5 Engels, 1987, p. 191.
Capítulo 6 – Estado e sociedade capitalista 81
6 Ibid., p. 193.
7 Ibid., p. 194.
82 Direito Internacional: para uma crítica marxista
[...] mas os titulares desta autoridade já não são, como nas formas de
produção anteriores, senhores políticos ou teocráticos; se a detém, é
simplesmente porque personificam os meios de trabalho frente ao
trabalho. 8
[...] ela deve aparecer antes como uma coação proveniente de uma pessoa
coletiva, abstrata e que é exercida não no interesse do indivíduo donde
provém, [...] porém, no interesse de todos os membros que participam
nas relações jurídicas. 10
sociedade e dela se distancia cada vez mais. Essa separação encontra seu
fundamento no processo das revoluções que puseram fim ao feudalismo:
16 Ibid., p. 111.
17 Lênin, 1985, p. 203.
18 1982.
19 1977.
86 Direito Internacional: para uma crítica marxista
1 1998a.
2 1998b.
Capítulo 7 – Fundamentos do Direito Internacional 91
Um bravo defensor dos direitos dos índios em seu tempo, seu trabalho
poderia também ser lido como uma justificação particularmente
insidiosa da conquista deles, precisamente porque apresentada na
linguagem da liberalidade e mesmo da igualdade4.
todo o dano que puder, como convém a vassalos que não obedecem a
seu senhor, não querem recebê-lo, resistem a ele e o contradizem. 5
[...] alguém leu para eles o Requerimiento, sem conhecer sua língua e seus
intérpretes; nem o leitor nem os índios se entendiam. Mesmo depois de
alguém que compreendia sua língua lhes ter explicado, os índios não
tiveram nenhuma chance de responder, pois foram imediatamente
levados prisioneiros. 6
10 Ibid., p. 135-138.
11 Id., 1998b, p. 152.
12 Ibid., p. 174.
96 Direito Internacional: para uma crítica marxista
Há alguns que não têm nem razões aparentes, nem causas justas, para
pleitear hostilidades, os quais, como diz Tácito, envolvem-se pelo amor
à empresa e ao perigo.
17 Ibid., p. 924.
18 Ibid., p. 159.
19 Aristóteles apud Grotius, 2005, p. 174.
20 Grotius, 2005, p. 176.
21 Aurelius Augustinus apud Grotius, 2005, p. 169.
98 Direito Internacional: para uma crítica marxista
25 2010, p. 49.
100 Direito Internacional: para uma crítica marxista
relação entre Estados. Sua obra fundamental nessa temática é Sobre a paz
perpétua.
Assim como o Direito moderno erigiu-se sobre a abominação da
sociedade feudal absolutista, o Direito das Gentes de Kant surge
abominando as guerras de extermínio e buscando impor regras morais
sobre os conflitos armados. Inserindo a guerra nos marcos do Direito, a
define como “o meio tristemente necessário no Estado natural para
afirmar o direito pela força”. Na ausência de um tribunal que declare uma
das partes como injusta, é o resultado do conflito que decide do lado de
quem está o direito. Por isso, repudiam-se as guerras de extermínio
(aquelas baseadas em traição, quebra de acordo, atentados,
envenenamentos etc.) pois a única paz perpétua que essas guerras podem
possibilitar é a do “grande cemitério da espécie humana” 29.
Para Kant, o sistema conceitual do Contrato Social, aplicado à
constituição da sociedade e do Estado, também se aplica às relações entre
Estados. Nesse caso, o estado de natureza não pode ser senão um estado
de guerra. Mesmo quando não há hostilidades, elas permanecem como
uma constante ameaça. A passagem para a etapa contratual se expressa,
portanto, no estado de paz.
A paz perpétua depende de uma constituição jurídica perfeita que
integre e unifique três dimensões de aplicação: o direito estatal, como
direito interno de cada Estado; o Direito das Gentes, expresso na relação
entre Estados, e uma nova esfera, do direito cosmopolita, que considera
indivíduos e Estados como “cidadãos de um estado universal da
humanidade” 30.
O passo inicial desse cosmopolitismo é que cada Estado assuma
uma constituição republicana, com os seguintes princípios a embasar todas
as normas jurídicas de um povo:
31 Ibid., p. 67.
32 Kant apud Mascaro, 2010, p. 235.
Capítulo 7 – Fundamentos do Direito Internacional 103
Diálogos
48 Miéville, 2005.
49 Lambert, 2004, p. 74.
Capítulo 7 – Fundamentos do Direito Internacional 111
50 Anghie, 2004
51 Ibid., p. 6.
52 Miéville, 2005, p. 178.
53 Pachukanis, 2006, p. 322.
Capítulo 7 – Fundamentos do Direito Internacional 113
1 1980.
2 Lênin, 1984b, p. 355.
3 Segal, 1946, p. 469-470.
Capítulo 8 – Teoria do Imperialismo 117
22 Ibid., p. 323.
23 Ibid., p. 329.
Capítulo 8 – Teoria do Imperialismo 127
24 Benayon, 2010.
25 Lênin, 1984b, p. 339.
26 Veiga, 2007, p. 22.
128 Direito Internacional: para uma crítica marxista
27 Bauman, 1999, p. 7.
28 Ianni, 1996, p. 131.
29 Marques, 1996, p. 136-137.
Capítulo 8 – Teoria do Imperialismo 129
Exportação de capitais
30 Segal, 1946.
130 Direito Internacional: para uma crítica marxista
A repartilha do mundo
Tal fato, mais que uma viragem histórica, representou uma nova
situação política em que as contradições entre monopólios e entre
potências imperialistas haviam aumentado extraordinariamente, pois, para
se “conquistar” uma esfera de influência, é preciso retirá-la das mãos de
outro “dono” que ali já se encontra. A nova política colonial é a pugna
pela “posse monopolista dos territórios do globo já inteiramente
repartido”34, que possui dois aspectos com características próprias: a
[...] o capital financeiro é uma força tão considerável, pode dizer-se tão
decisiva, em todas as relações econômicas e internacionais que é capaz
de subordinar, e subordina realmente, mesmo os Estados que gozam da
independência política mais completa. 23
Marini prossegue:
2 Anghie, 2004.
3 Schmitt apud Miéville, 2006, p. 291.
160 Direito Internacional: para uma crítica marxista
4 Miéville, 2006.
5 Segal, 1946 p. 469-470.
Capítulo 11 – Colonialismo e Direito Internacional 161
7 Ibid., p. 230.
Capítulo 11 – Colonialismo e Direito Internacional 163
11 Ibid., p. 270.
12 Petras e Weltmeyer, 2007, p. 23-24.
166 Direito Internacional: para uma crítica marxista
A luta continua, seu conteúdo não muda. Luta-se para obter a maior
parte possível na exploração de todo o globo terrestre por um pequeno
grupo de magnatas imperialistas ‘avançados’. As formas da luta, porém,
variam desde as ‘pacíficas’ tais como os acordos temporais (formação de
cartéis), até a colisão armada aberta: a guerra. 3
4 Fiori, 2007.
176 Direito Internacional: para uma crítica marxista
[...] praticar a tolerância e viver em paz, uns com os outros, como bons
vizinhos, e unir as nossas forças para manter a paz e a segurança
internacionais, e a garantir, pela aceitação dos princípios e a instituição
dos métodos, que a força armada não será usada a não ser no interesse
comum. 5
11 2004.
12 Lambert, 2004, p. 229.
Capítulo 12 – Fundamentos das organizações internacionais 181
Promete-se, é claro, que as Nações Unidas serão mais eficazes que a Liga
das Nações, mas tropeça-se sobre os mesmos problemas e não somente
o da escolha dos membros do Conselho de Segurança. Da mesma forma
que em 1918, a ideia de uma força armada própria à organização não é
levada em consideração. A mesma impotência não tarda a se manifestar
sobre os problemas do desarmamento, da prevenção, do controle dos
orçamentos militares. 14
13 D’Souza, 2006.
14 Ferro, 2003, s/p.
182 Direito Internacional: para uma crítica marxista
17 Schwerin, 2002.
Capítulo 12 – Fundamentos das organizações internacionais 185
métodos pelos quais esse material pudesse ser usado para as necessidades
humanas:
Mas quando o jogo é jogado por eminentes estadistas, que arriscam não
só suas próprias vidas, mas as de muitas centenas de milhões de seres
humanos, acredita-se em ambos os lados que os estadistas de um lado
estão exibindo um alto grau de sabedoria e coragem, e só os estadistas
Capítulo 12 – Fundamentos das organizações internacionais 191
E ainda,
armas nucleares] nem fazer chantagens nucleares, nem fazer apostas nas
armas nucleares” 26, tal como fazia a URSS.12
O Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP), em 1968,
reafirmava a diplomacia de risco e de pacto monopolista em que EUA e
URSS já haviam se envolvido nos anos anteriores. O debate realizado no
Parecer Consultivo da Corte Internacional de Justiça sobre a Legalidade
da Ameaça ou Uso das Armas Nucleares, em 1996, expressa as críticas ao
sistema do TNP. A juíza Higgins afirmava que o uso ou ameaça de uso
das armas nucleares era legítimo ante o Direito Internacional, como um
imperativo de legítima defesa. O juiz Weeramantry apontava que a
existência de dois regimes diferentes sobre o direito ao uso de armas
nucleares era uma injustiça inerente ao sistema, e afrontava o princípio da
igualdade soberana entre Estados27.
Outro problema que recai sobre os efeitos do TNP é o problema
próprio da força obrigatória dos tratados internacionais. Pelo princípio
jurídico da autonomia da vontade, um tratado é um acordo de vontades
entre Estados, e suas normas são obrigatórias apenas aos Estados que
tenham manifestado por fazer parte desse acordo, pelos métodos jurídicos
próprios, conforme as suas particularidades (“assinatura, troca dos
instrumentos constitutivos do tratado, ratificação, aceitação, aprovação ou
adesão” 28).
Por isso, não são apenas os “Estados nuclearmente armados” do
TNP que mantém juridicamente o monopólio do armamento atômico. As
potências nucleares que não fizerem parte do TNP também podem
desenvolver seu armamento atômico e usar seu potencial destrutivo para
seus interesses geopolíticos, pois não estão sujeitas às verificações
(salvaguardas) da AIEA. Índia, Paquistão, Israel e Coreia do Norte, por
exemplo, estão nessa situação. Os dois primeiros, inclusive, admitiram
possuir armas nucleares, enquanto Israel não admite, mas têm indícios
notórios de possuí-las com grande potencial destrutivo, especialmente
depois que venceu a Guerra dos Seis Dias contra os países árabes, em
26 Ibid., p. 250.
27 Anghie, 2004.
28 Art. 11 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969.
194 Direito Internacional: para uma crítica marxista
foi produzido pelo senso comum da polícia, mas armado para a polícia
pela corporação médica racista.
Durante e após a Segunda Guerra Mundial, o repúdio ao direito
penal autoritário fez consolidar uma tendência a um direito penal liberal.
Mas, em reação a essa crítica, formou-se um direito penal antiliberal, que
retornava ao positivismo criminológico do século XIX, e renovando o
discurso do inimigo para apregoar a necessidade de ações preventivas. É
exatamente essa tendência conservadora que nutre a política da Guerra ao
Terror:
10 Ibid., p. 154.
Capítulo 13 – Guerra ao Terror 201
11 Ibid., p. 156.
202 Direito Internacional: para uma crítica marxista
Em suma, a posição atual dos EUA parece ser de que a legítima defesa
preventiva contra qualquer regime nocivo é legal e que, além disso, a
transformação da sociedade ofensora em uma democracia é a forma mais
eficaz de garantir que não represente qualquer ameaça futura. 16
17 Ibid., p. 286.
18 Ibid., p. 287.
206 Direito Internacional: para uma crítica marxista
19 Ibid., p. 292.
20 Hobsbawm, 2007, p. 14.
21 Ibid., p. 16.
Capítulo 13 – Guerra ao Terror 207
22 Ibid., p. 17.
23 Chossudovsky, 2004.
24 Cassesse apud Anghie, 2004.
208 Direito Internacional: para uma crítica marxista
de paz. O documento diz ainda que “a resposta dos EUA a essas ameaças
pode ser controversa, porque elas podem ser provocadas por queixas
legítimas”, que a decisão de agir em qualquer uma dessas categorias é
essencialmente política, e também que os CBI apresentam difíceis desafios
éticos e morais aos EUA e suas forças armadas.
O terrorismo não pode ser considerado a “arma dos fracos”, pois
o que acontece é um problema de terminologia, e quando as potências
empregam práticas terroristas, elas não são nominadas como tal, mas sim
como seu oposto: “contra-terrorismo”. Em termos militares, aquilo que é
chamado de contra-terrorismo deveria ser, sim, chamado de contra-
insurgência ou conflito de baixa intensidade.
2 Mascaro, 2007.
3 Kashiura Jr., 2009, p. 89
Capítulo 215
era preciso afirmar a igualdade entre povos (no caso, cristãos europeus e
nativos americanos). Não se tratava de uma igualdade absoluta, mas sim
na forma jurídica. Uma vez que ambos possuíam o atributo da razão, a
ambos se aplicava o direito natural, que contém a liberdade de comércio.
A afirmação do Direito Internacional era a universalização da forma
jurídica para que as sociedades capitalistas pudessem seguir no processo
de acumulação de capital a partir das conquistas coloniais. Por isso, o
conflito colonial é central para o desenvolvimento do Direito
Internacional e faz parte de sua estrutura4.
Um conceito fundamental para o Direito Internacional é o de
soberania, que não se confunde com a forma jurídica. Ali onde Vitoria
afirmava igualdade jurídica, não afirmava igualdade soberana. Afinal, se
colonizador e colonizado são juridicamente iguais, algo precisaria
diferenciá-los para justificar a superioridade do primeiro. A soberania dos
povos colonizados não poderia ser oposta para resistir à imposição da
cultura cristã europeia. Porque a soberania dos civilizados é diferente da
soberania dos não civilizados. A doutrina tradicional, que se baseia no
modelo de Westphalia, é incapaz de lidar com esse problema, porque une
igualdade e soberania num só princípio (igualdade soberana entre
Estados).
A Teoria do Imperialismo é fundamental para compreender o
Direito Internacional. O imperialismo não pode ser identificado apenas
com uma política externa de agressividade militar. Primeiro, porque sua
raiz é econômica, ele corresponde ao surgimento do capitalismo
monopolista em que as potências precisam reforçar as conquistas e a única
forma que encontram é disputando entre si os territórios já conquistados.
Segundo, porque o imperialismo não conhece apenas as práticas militares,
mas um complexo de relações de subordinação que vão desde formas
pacíficas, como a diplomacia e os acordos comerciais (as malhas da
dependência financeira e diplomática), até as formas violentas expressas
nas guerras.
4 Anghie, 2004.
Capítulo 217
6 Miaille, 1979.
7 Anghie, 2004.
8 Naves, 1995, p. 19.
9 Engels; Kautsky, 1995.
10 Marx, 1988b, p. 284.
Capítulo 221
1 Introdução
5 1995.
Posfácio – Direito Internacional e Estudos Latino-Americanos 235
6 Todorov, 1983, p. 8.
7 1985.
236 Direito Internacional: para uma crítica marxista
3 Filosofia latino-americana
Hacia mediados del siglo XIX, la idea de América como un todo empezó
a dividirse, no de acuerdo con los Estados-nación que iban surgiendo
sino según las distintas historias imperiales del hemisferio occidental, de
modo que que dó configurado con América Sajona al norte y América
Latina al sur. En ese momento, «América Latina» fue el nombre elegido
para denominar la restauración de la «civilización» de la Europea
meridional, católica y latina en América del Sur y, al mismo tiempo,
reproducir las ausencias (de los in dios y los africanos) del primer período
colonial. 12
11 2005, p. 16.
12 Mignolo, 2005, p. 81.
240 Direito Internacional: para uma crítica marxista
7 Considerações finais
22 2005, p. 237.
250 Direito Internacional: para uma crítica marxista
Referências
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