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AURORA ano II número 2 - JUNHO DE 2008 https://doi.org/10.36311/1982-8004.2008.v1n2.1173 ISSN: 1982-8004 www.marilia.unesp.

br/aurora

NEOLIBERALISMO E ONGs
NA AMÉRICA LATINA

ELIZABETH BORELLI*

Resumo: Este artigo pretende analisar o papel desempenhado pelas organizações não-governamentais na
América Latina, historicamente situado, enquanto canal dos mecanismos de ajuda internacional ao
desenvolvimento, dentro de um projeto político neoliberal. É nesse contexto que se coloca o ajuste estrutural,
instaurando uma nova ordem político-econômica, em que o modelo de acumulação aprofunda a separação
entre o público e o privado, através da prática de uma política monetária restritiva. Nessa perspectiva, as
ONGs passam a desempenhar funções antes assumidas pelo Estado, confirmando sua inserção no projeto
neoliberal, com o conseqüente enfraquecimento dos movimentos populares de resistência política.
Palavras-Chave: organizações não-governamentais, neoliberalismo, Estado e América Latina.

INTRODUÇÃO americana baseada na exportação de capital –


processo este que viria se consolidar na década de 80.
Para uma reflexão acerca da estrutura e ideologia Nesse período, nos Estados Unidos, um
das ONGs, e , mais especificamente, de sua inserção novo grupo – a “Nova Direita”- integrante do
no contexto latino-americano, julgamos oportuno Partido Republicano, chega ao poder com Ronald
situar, ainda que brevemente, os principais marcos Reagan ; a política dos direitos humanos, de Jimmy
históricos que propiciaram a existência dessas Carter, é então substituída pelo “realismo
formações sociais. Nesse sentido, julgamos oportuno pragmático”, que caracterizaria, também, o governo
destacar, retrospectivamente, alguns momentos de George Bush.
determinantes do cenário da política externa da A partir daí, observa-se, por parte dos
América Latina. Estados Unidos em relação à América Latina, a
Após três séculos de período colonial, a prática de uma política externa voltada a um
Revolução Independentista, no início do século XIX, enquadramento político e econômico, uma
promovida pelas frágeis burguesias latino-americanas, política de nivelamento, valendo-se, para tanto, de um
não se configurou num movimento hegemônico, intervencionismo agressivo, com o intuito de
resultando, antes, numa forma de neocolonialismo. incorporá-la ao sistema capitalista como bloco
Esse novo tipo de dependência desembocou, já no subalterno ao Mercado Comum da América do Norte
século XX, no imperialismo, com a emergência norte- - Eucanmex – surgido do Acordo Estados Unidos /
Canadá / México (onde a função do México se

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resume a funcionar como depósito de mão-de-obra países, conforme a inserção internacional de suas
disponível e mercado para os produtos norte- economias, tendo em comum, contudo, um
americanos). movimento de fragilização do “estatismo”, com a
conseqüente perda de autonomia por parte dos
Como os blocos econômicos
Estados.
contemporâneos se caracterizam pela busca da auto-
suficiência, as possibilidades de exportação por parte Este contexto propiciou a retomada de teses
da América Latina, naturalmente, se reduzem, e com ortodoxas, embasadas no liberalismo econômico,
elas, suas perspectivas econômicas, acarretando um originando o modelo neoliberal - um conjunto
crescente empobrecimento, dada a relação entre a particular de receitas econômicas e programas
dívida externa e a miséria interna, gerada pela recessão políticos, inspirados nas obras de Milton Friedmann 1
imposta pela política dos Estados Unidos. – e que passa a orientar as políticas econômicas de
boa parte dos países, a partir do final dos anos 70 do
Nesse contexto, tendo em vista a
século XX.
disponibilidade de recursos materiais e de mão-de-
obra desses países, o governo Bush lançou, em 1990, Esse novo modelo introduz um novo padrão
o “Plano Iniciativa para as Américas”, propondo a social de acumulação; ao favorecer a constituição do
liberalização de mercados, como “chave para o mercado informal de trabalho, consolida uma
crescimento sustentado e a estabilidade política”. redefinição global do campo econômico, político-
institucional e das relações sociais, assumindo a
O Plano propõe, ainda, um fundo de
pobreza como categoria efetiva para o seu
investimento e um novo programa de financiamento
funcionamento, num mercado onde necessariamente
do Banco Interamericano de Desenvolvimento –
deverão coexistir ganhadores e perdedores, fortes e
BIRD, dirigido aos países que “suavizassem” os
fracos.
obstáculos à inversão externa, e, por outro lado,
incentivassem a criação de zonas de livre comércio, Como coloca Bourdieu, a ideologia da
sob a condição de que fossem firmados acordos com competência convém para justificar uma oposição que
o Fundo Monetário Internacional – FMI e o Banco se assemelha à dos senhores e dos escravos: de um
Mundial. lado, os cidadãos de primeira classe, com qualidades e
capacidades raras, em condições de conseguir os
Na América Latina, as conseqüências
melhores salários do mercado de trabalho
desastrosas da crise financeira, acompanhada pela
internacional; enquanto que do outro lado, encontra-
explosão da dívida externa, na década de oitenta,
se uma massa de indivíduos destinados a empregos
levaram a um ajuste estrutural contendo propostas de
precários ou ao desemprego crônico. (Bourdieu, 1998
mudanças por meio de políticas liberalizantes,
: 58-61).
privatizantes e de mercado. No curto prazo,
propugnava-se a redução do déficit fiscal através da A força da ideologia neoliberal se apóia numa
redução das despesas públicas, além da visão mundialista de dominação, segundo a qual são
implementação de uma política monetária restritiva, os mais competentes que governam e que têm lugar
para o combate à inflação. No médio prazo, no mercado de trabalho; assim sendo, os que não são
objetivava-se um maior impulso às exportações, com competentes, são excluídos.
liberalização do comércio exterior, de forma a se
Nesse enfoque, os pobres mantêm sua
concentrar o
condição de pobres, tornando-se alvo de políticas
investimento no setor privado da economia, dentro assistenciais, coerentes com a sustentação ideológica
de uma ideologia centrada no livre jogo das forças de do modelo, baseada no individualismo. O novo
mercado. padrão de acumulação traz em seu bojo a perda da
identidade dos direitos sociais, além do
aprofundamento da separação entre o público e o
O MODELO NEOLIBERAL privado; a legislação trabalhista dirige-se para uma
maior mercantilização, reduzindo, conseqüentemente,
a proteção da força de trabalho, onde o papel do
A crise global da economia no século XX, Estado se reduz a uma atuação assistencialista.
manifestada pela crise financeira e do comércio (Grassi; Hintze; Neufeld, 1994 :11-21).
internacional, assumiu diferentes contornos entre os

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É parte essencial do projeto neoliberal uma O neoliberalismo se coloca como uma nova
reestruturação do Estado, visando privatizações em estratégia do capitalismo: os Estados se reformulam
massa, ou seja, um Estado sem projeto e sem espaço nesse enfoque altamente individualizante, embora
nacional, inteiramente submisso às leis de mercado, e, com um discurso coletivizante, dentro de um
em última instância, aos interesses dos grandes pretenso “processo de globalização”.
monopólios, num mecanismo de transferência da
renda nacional para o pagamento da dívida pública,
tendo como credores os grandes monopólios do A FUNÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES NÃO-
capital financeiro. GOVERNAMENTAIS

Em outras palavras, o modelo neoliberal


aponta para o desmanche do Estado nacional; o Plano É exatamente nesse cenário, onde, ao mesmo
Bush pressupõe um vínculo com a questão da dívida tempo em que a distribuição interna da riqueza ocorre
externa, ou seja, os Estados Unidos se colocam como de forma perversa, associada a um crescimento
representantes do sistema financeiro transnacional, urbano desordenado, que surge a importância das
utilizando a situação de endividamento dos países Organizações Não-Governamentais, popularmente
como instrumento de pressão política. (Altmann, denominadas ONGs.
1994: 39-47).
Partindo de uma função de socorro às vítimas
Como resultado, obteve-se o aumento do da Segunda Guerra Mundial, as ONGs,
endividamento, da desnacionalização e da posteriormente, passam a prestar assistência a vítimas
dependência, em benefício das grandes potências e da fome, estiagens ou guerras do Terceiro Mundo.
em detrimento do desenvolvimento nacional.
O termo ONG foi usado pela primeira vez
A um nível interno, medidas que resultem em 1950 pela ONU (Organização das Nações Unidas)
numa queda drástica do padrão de vida dos para definir toda organização da sociedade civil que
trabalhadores são ingredientes comuns da receita não estivesse vinculada a um governo, simbolizando o
neoliberal; observa-se a derrogação de legislações espaço de participação da sociedade civil organizada.
trabalhistas e previdenciárias, além do aumento do
nível de desemprego e degradação das condições de Entretanto, a palavra ONG – que se
trabalho. A meta é a busca da maximização dos lucros identifica por uma negação: “não governamental” –
das empresas transnacionais e significativa redução do vem sendo utilizada como um conceito que permite
custo fixo – essência econômica do neoliberalismo. incluir associações de natureza e fins muito diversos,
desde que identificados como sendo não-
Na América Latina, o neoliberalismo, governamentais e sem fins lucrativos.
impulsionado diretamente pelos Estados Unidos,
através de seu próprio governo, seu sistema Mais recentemente, alguns autores, seguindo
financeiro, suas empresas transnacionais, e a análise de Wolfe, têm se referido às ONGs como
organismos internacionais diretamente controlados parte de um terceiro setor – o da sociedade civil
por esse país (sobretudo o FMI e o Banco Mundial), organizada – distinto dos
bem como pelas próprias elites locais aliadas - tem outros dois setores tradicionalmente considerados
como objetivo reforçar a absoluta hegemonia norte- importantes : o Estado e o mercado. (Wolfe, 1992:10).
americana na região, de forma a obter superganhos e
Nesse sentido, um aspecto a ser destacado, é
marcar posição no campo das contradições
que tratam-se de “ grupos com alguma organização formal
interimperialistas.
que atuam tendo em vista a transformação de aspectos da
Isto equivale à imposição de um tipo realidade social considerados como negativos”. (Scherer-
particular de aparelho de Estado – o neoliberal - Warren, 1998:161).
tendo ocorrido no Chile o primeiro caso de
Assim, podem ser entendidas como
neoliberalização da América Latina. Por força do
organizações formais, privadas, porém com fins
violento golpe do general Pinochet, apoiado pelo
públicos, não lucrativos, auto-governadas e com
governo dos EUA contra Salvador Allende (eleito
participação de parte de seus membros como
democraticamente em Setembro de 1973), os
voluntários.
conselheiros econômicos dos EUA deram suporte à
instalação do Estado neoliberal no país.

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No enfoque do movimento histórico, Viola uma vez que recebem fundos de governos externos,
considera as organizações não-governamentais e atuam em projetos dos governos locais e/ou recebem
grupos comunitários como parte de um movimento subsídios de fundações privadas que mantêm relações
mais amplo, que inclui: setores do empresariado, cujos de trabalho com o Estado. Considera que, na década
sistemas produtivos preencham, em medida de 70, as ONGs representaram um papel importante,
significativa, o critério da sustentabilidade; grupos e enquanto canal de participação política para os
instituições científicos cujo esforço de pesquisa se diferentes grupos sociais, na América Latina, opondo-
insira no rumo da sustentabilidade; setores da se às estratégias políticas e econômicas dos governos
estrutura estatal e agências autoritários, articulando a organização
intergovernamentais.(Viola, 1992 : 50). popular.(Petras, 2000 : 1)
Nos países de Primeiro Mundo, tratam-se, “As ONGs parecem ter um papel contraditório na
praticamente, de entidades voltadas a populações política. Por um lado, criticam as ditaduras e as
mais carentes ou para situações sociais problemáticas, violações aos direitos humanos. Por outro lado,
atuando através de projetos assistenciais, de competem com os movimentos sociopolíticos radicais
desenvolvimento ou de defesa de direitos humanos e ao tentar canalizar os movimentos populares para
ambientalistas. relações colaborativas com as elites sociais
dominantes.” ( Petras, 2000 : 180-181).
No caso latino-americano, as ONGs têm se
voltado , prioritariamente, às questões ligadas à Com a abertura democrática, as ONGs
cidadania e aos problemas ambientais, com foco em deixaram de se preocupar com o apoio organizacional
áreas temáticas, tais como : pobreza, discriminação e voltaram-se à implementação de projetos de
racial ou de sexo, destruição ambiental, violência, desenvolvimento, em nome das agências de
ou carências coletivas (transporte, saneamento, desenvolvimento internacionais e nacionais.
assistência à saúde, moradia, educação, direitos
Essa mudança de postura pode ser explicada
humanos, entre outros).
pelo vínculo entre elas e os governos democráticos
No âmbito da concepção neoliberal de eleitos, bem como pela crise financeira que compeliu
desenvolvimento, a defasagem em que se encontram esses governos a reduzir gastos sociais, além da opção
os países do Terceiro Mundo pode ser atenuada ideológica por uma maior participação do setor
através de um processo educacional, do efeito privado - característica das políticas econômicas
demonstração e da introdução de tecnologias neoliberais.
apropriadas, cuja consecução, contudo, requer apoio
Nessa perspectiva, as ONGs passam a
financeiro, a ser captado do setor privado da
desempenhar funções antes assumidas pelo Estado,
economia.
que têm, assim, sua responsabilidade diminuída em
Essa ótica de desenvolvimento envolve a termos da manutenção do bem-estar da população.
necessidade de se promover um ajuste estrutural, de
Petras coloca que :
forma a fazer frente às questões sociais, representadas
pelo aumento da miséria e da degradação ambiental “Como principais receptoras dos recursos
que caracterizam essas sociedades. Nesses termos, a destinados ao desenvolvimento da população, as
questão ambiental se reveste de fundamental ONGs situam-se entre as organizações
importância, justificando aportes de capital advindos populares e as agências estatais, qualificando-se
de mecanismos de cooperação internacional, num para atuar como intermediárias do
processo de transferência de recursos para setores desenvolvimento”. (Petras, 1999 : 72).
organizados da sociedade civil.
No decorrer das décadas de 80 e 90, as
O fluxo de capital proveniente de agências ONGs proliferaram em toda a América Latina,
governamentais internacionais, voltados a projetos de privilegiando a formulação e a execução de projetos
natureza assistencialista ou desenvolvimentista para a de desenvolvimento, sendo que a crise econômica que
América Latina, constitui-se na mais evidente afetou os governos latino-americanos, no período,
expressão dos princípios neoliberais. constituiu-se em fator decisivo a sua expansão.
Segundo Petras, pode-se interpretar que as Observa-se que o aumento do número de
ONGs não são organizações não-governamentais, ONGs , no período, ocorreu de forma diretamente

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proporcional ao aumento dos níveis de pobreza


registrados nos países latino-americanos : enquanto o
A análise do fenômeno da proliferação do
setor urbano informal expandiu-se em torno de 39% ,
número de ONGs comporta uma avaliação a um
entre 1980 e
nível, podemos dizer, interno, e a um outro, externo.
1985, o percentual referente à população urbana
Como questão interna, coloca-se o seu papel
assalariada passou de 70% em 1980 para 64% em
como agente promotor de empregos urbanos,
1985.( Roddick, 1988: 98 in Petras, 1999: 74).
absorvendo contingentes de força de trabalho que, até
A redução do número de empregos da então, tinham o Estado como fonte geradora de
economia formal se deu em função da falência de emprego 2. O âmbito externo está relacionado com o
indústrias privadas voltadas ao consumo do mercado caráter neoliberal das medidas de ajuste estrutural
interno, que não suportaram a concorrência dos impostas à América Latina, penalizando os setores
produtos importados. Paralelamente, as empresas públicos, mais especificamente, aqueles relacionados à
estatais, endividadas e enfraquecidas por gestões prestação de serviços sociais.
administrativas ineficientes, mostraram-se incapazes
O neoliberalismo provocou a fragilização do
de continuar mantendo a função do Estado enquanto
Estado - notadamente nos países do Terceiro Mundo
gerador de empregos e promotor de serviços sociais.
- além de destruir as diversas formas de expressão dos
Por outro lado, como coloca Petras, à medida movimentos populares de resistência política , como
que os regimes neoliberais foram responsáveis pelo os sindicatos.
retrocesso das leis trabalhistas, gerando contingentes
Nessa perspectiva, as ONGs passaram a
de trabalhadores mal remunerados e desempregados,
assumir o papel de executoras da prestação de
as ONGs foram recebendo financiamentos para
assistência ao desenvolvimento – o que, na verdade,
projetos de “auto-ajuda”, “educação popular”,
representou uma distorção de suas finalidades
treinamentos visando absorver temporariamente
originais ; as inúmeras ONGs criadas na América
grupos de pessoas pobres, com a cooptação de líderes
Latina passaram a atender ao propósito de absorver
locais, de forma a fragilizar as lutas sociais contra o
parte do capital internacional , considerando-se a
sistema.(Petras, 1999: 45-46).
progressiva queda da oferta de empregos nos
Dessa forma, enquanto, por força da política diversos setores econômicos.
neoliberal, empresas estatais lucrativas eram
A idéia de aparente neutralidade que permeia
transferidas ao setor privado, as ONGs promoviam o
a proposta de trabalho das ONGs, na verdade, oculta
discurso da “livre iniciativa”, numa ótica anti-
interesses econômicos e políticos bem definidos ; sua
estatizante, desencadeadora de um processo de
própria visão assistencialista confirma a sua inserção
despolitização de segmentos da sociedade.
no modelo neoliberal, ao assumir funções que
Por outro lado, o caráter de “atividade deveriam estar sendo executadas pelo Estado .
voluntária privada” que caracteriza as ONGs depõe
O papel de agente de atenuação da pobreza –
contra o sentido de “coisa pública”, à medida que tira
que acaba sendo perpetuada pelos instrumentos da
do Estado a responsabilidade política de cuidar dos
ação neoliberal ( tendo as ONGs como braço), ou
indivíduos, enquanto cidadãos, atribuindo ao setor
ainda, da denúncia de problemáticas sócio-ambientais
privado o papel de solucionador das questões sociais ,
– comprova a presença do projeto neoliberal como
utilizando-se de recursos privados.
estofo de propostas, mascarando, contudo, interesses
O trabalho desenvolvido pelas ONGs particulares .
enfatiza projetos e não movimentos ; sua ajuda afeta
Por outro lado, questionamentos de diversas
pequenas parcelas da população, fragmentando as
ordens surgem em torno das ONGs; tanto em termos
comunidades, numa visão conservadora de estrutura
de legitimidade, cabendo perguntar-se a quem elas
de poder
representam e a quem prestam contas, bem como
acerca de seu próprio papel, em relação aos efeitos
práticos de sua ação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS É importante analisar o papel das ONGs no


que se refere à sociedade propriamente dita, à luta

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social, e a sua forma de utilização pelo sistema. PETRAS, James F. 1999. Neoliberalismo : América
Observa-se, de maneira geral, que o surgimento das Latina, Estados Unidos e Europa.
ONGS tem se configurado, na maioria das vezes, em
Blumenau: FURB.
ação desmobilizadora das lutas populares, num
mecanismo de cooptação, onde a aparente retórica de
esquerda vincula-se, na verdade, à ideologia das
PETRAS, James F. 2000. Hegemonia dos Estados
agências financiadoras de projetos que condicionam a
Unidos no novo milênio. Petrópolis:
ação prática ao conformismo conservador.
Vozes.
Os movimentos de ações políticas
independentes enfraquecem, sob a égide do
neoliberalismo, tendo as ONGs como seu SCHERER-WARREN, Ilse . 1998. “ONGs na
instrumento, onde o antiestatismo é a bandeira América Latina : trajetória e perfil”. In :
ideológica dominante - em posição coincidente à do
Banco Mundial - pautado na auto-organização dos Vários autores. Meio ambiente, desenvolvimento e
cidadãos, representada pelas organizações não cidadania. São Paulo: Cortez : 161-180.
governamentais.
Na década de 70, em meio às ditaduras latino- SOARES, Laura T. 2002. Os custos sociais do ajuste
americanas, tornou-se difuso o caráter político das neoliberal na América Latina. São Paulo : Cortez.
ONGs, dado o seu trabalho de defesa dos direitos
humanos, em contraposição aos excessos do
autoritarismo – o que lhes valeu uma imagem positiva VIOLA, Eduardo. 1992. “O movimento
entre amplos setores da sociedade; contudo, em ambientalista no Brasil (1971-1991): denúncia e
nenhum momento, as violações aos direitos humanos conscientização pública para a institucionalização
eram creditadas às políticas neoliberais. Assim, a e o desenvolvimento sustentável”. In :
aparência de solidariedade e ação social acaba por GOLDENBERG (org ). Ecologia, ciência e política.
mascarar uma postura conservadora diante da Rio de Janeiro : Revan : 49-76.
estrutura de poder internacional.

WOLFE, Alan. 1992. “Três caminhos para o


desenvolvimento : mercado, Estado e sociedade
civil.” In : Vários autores. Desenvolvimento,
REFERÊNCIAS
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IBASE-PNUD : 24-42.
ALTMANN, Werner. 1994. “A América Latina
no limiar do ano 2000”. In : RESENDE, Paulo -
Edgard de Almeida (org.) .Ecologia, sociedade e
Estado. São Paulo: EDUC: 39-54.

BOURDIEU, Pierre. 1998. Contrafogos : táticas


para enfrentar a invasão neoliberal. Rio de
Janeiro: Zahar.
* Professora da Faculdade de Economia, Administração,
GRASSI,E. ; HINTZE, S. & NEUFELD, M. R. Ciências Contábeis e Atuariais da PUC-SP, Doutora em
1994. Políticas socials. Crisis y ajuste structural. Sociologia e Mestre em Economia Política.
Buenos Aires : Espacio Editorial.

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