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Organização: Financiamento:

CURSO DE EXTENSÃO

Sistemas
Agroflorestais
em Regiões
Semiáridas

Módulo i - Unidade i
Introdução SAFs em Regiões Semiáridas
Sistemas agroflorestais – Definições e conceitos
Sílvio Nolasco de Oliveira Neto
CURSO DE EXTENSÃO

Sistemas
Agroflorestais
em Regiões
Semiáridas

CURSO DE EXTENSÃO – SISTEMAS AGROFLORESTAIS EM REGIÕES SEMIÁRIDAS

FICHA TÉCNICA

Realização: Projeto AKSAAM – Adaptando Conhecimento para a Agricultura


Sustentável e o Acesso a Mercados, Instituto de Políticas Públicas e Desenvol-
vimento Sustentável - IPPDS/UFV, Fundação Arthur Bernardes - FUNARBE e
Universidade Federal de Viçosa - UFV.

Financiamento: Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola - FIDA

Coordenador projeto AKSAAM: Marcelo José Braga

Coordenadores curso: Ricardo Henrique Silva Santos e Alex Carlos Silva Pi-
mentel

Autor: Sílvio Nolasco de Oliveira Neto

Layout: Adriana Helena de Almeida Freitas

Diagramação: Bárbara Elen Sampaio

Revisão linguística: Cinthia Maritz dos Santos Ferraz Machado


Organização: Financiamento:

Organização: Financiamento: 2
Aula I
Sistemas agroflorestais – Definições e conceitos

Introdução

A origem de sistemas agroflorestais é relatada na literatura como


associada quase ao começo da agricultura, havendo, inclusive, relatos
bíblicos sobre jardins arborizados provendo igualmente beleza e alimento.
Esta é, talvez, uma das primeiras descrições de árvores compondo sistemas
de produção atualmente denominados agroflorestais (MACDICKEN;
VERGARA, 1990). Compreende-se, assim, que sistemas agroflorestais
foram baseados em costumes de povos antigos, quando eram praticados
evidentemente de maneira empírica, sem técnicas específicas. No Brasil,
sistemas agroflorestais têm suas origens frequentemente associadas às
comunidades indígenas e tradicionais (ribeirinhas, quilombolas, caiçaras,
entre outras), com relatos na literatura agrícola no início do século passado.

A partir da década de 1970, incrementaram-se as


discussões a respeito do desenvolvimento sustentável.
Entre outras abordagens, destacavam-se aquelas
relacionadas aos desmatamentos, principalmente em
regiões tropicais, motivados pela crise energética mundial
e ampliação de áreas para a agricultura, que em muitas
situações contribuíram para a promoção de degradação
ambiental.

Em regiões menos desenvolvidas e desprovidas de recursos e acesso


a tecnologias, a agricultura tornou-se de prioritária atenção em face da
necessidade de modelos alternativos de produção, com especial foco
em sustentabilidade ambiental, entre as quais está a prática de sistemas
agroflorestais como mais uma estratégia de combate à pobreza e à fome.
Assim, em meados da década de 1970 foi criado o Centro Internacional de
Pesquisa Agroflorestal (ICRAF) e, a partir das décadas de 80 e 90, a nível
mundial, as ações avançaram, assim consolidando a Agrossilvicultura
(área da ciência que aborda os sistemas agroflorestais).

Estes sistemas passaram a ser discutidos de forma mais intensa nas


últimas décadas e entendidos como estratégia capaz de contribuir com a
agricultura, principalmente aquela em pequena e média escala.

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A principal expectativa é de sejam capazes de promover a
diversificação da produção e da renda, mantendo a capacidade produtiva
das terras em decorrência de processos ecológicos decorrentes da
diversidade de espécies, e contribuindo com a conservação ambiental em
detrimento dos impactos decorrentes do uso desordenado dos recursos
naturais e de determinados modelos tecnológicos de produção agrícola.

Concomitantemente, as composições, funções e adotabilidade destes


sistemas têm sido debatidas em inúmeros fóruns e países, gerando várias
literaturas técnicas e científicas em diversos idiomas. Este processo gerou
inúmeros termos referentes a sistemas agroflorestais, que em alguns casos
têm gerado diferentes interpretações.

Nas abordagens sobre sistemas agroflorestais, seja no contexto


técnico ou de adoção como modelo de produção, é de fundamental
importância o conhecimento sobre suas definições e conceitos. Assim, este
tópico tem por objetivo tratar desta abordagem.

Definição de sistema agroflorestal

Sistemas agroflorestais podem ser definidos de diversas formas, e


isto muitas vezes tem gerado dúvidas e discussões que necessitam ser
compreendidas por aqueles interessados em conhecer estes sistemas.
Apresentamos aqui alguns conceitos com o objetivo de elucidar o
entendimento, conforme a seguir:

- “sistema de manejo e uso da terra, baseado nos


princípios de rendimento sustentado, que busca aumentar
a produção total, combinando culturas agrícolas com
árvores e plantas da floresta e/ou animais, simultânea
ou sequencialmente, aplicando-se práticas de gestão
compatíveis com os padrões culturais da população
local” (BENE et al., 1977, p.39).

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- “práticas de uso e manejo dos recursos naturais
nas quais espécies lenhosas e arbustivas são utilizadas
em associações deliberada com culturas agrícolas e, ou,
com animais, na mesma área, de maneira simultânea ou
em sequência temporal, com interações ecológicas e, ou,
econômicas entre os componentes” (ICRAF, 1983, p.2).
- “sistemas de uso da terra e tecnologias em que
plantas lenhosas perenes (árvores, arbustos, palmeiras,
bambus) são cultivadas em associação com plantas
herbáceas (culturas agrícolas e/ou pastagens) e/ou
animais, em uma mesma unidade de manejo, e de acordo
com um arranjo espacial, temporal ou ambos; nos quais
deve haver tanto interações ecológicas como econômicas
entre os componentes lenhosos e não lenhosos no sistema”
(YOUNG, 1991, p.11).
- “denominação genérica para sistemas de uso da terra
onde espécies lenhosas perenes como árvores, arbustos,
palmeiras, bambus, etc..., são deliberadamente utilizadas
nas mesmas unidades de área com culturas agrícolas e/
ou animais, em determinado arranjo espacial e temporal”
(NAIR, 1993, p.14).
- “sistemas baseados na dinâmica, na ecologia e na
gestão dos recursos naturais que, por meio da integração
de árvores na propriedade e na paisagem agrícola,
diversificam e sustentam a produção com maiores benefícios
sociais, econômicos e ambientais para todos aqueles quem
usam o solo em diversas escalas” ( JOSE, 2009, p.2).

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O aumento das experiências e os resultados de pesquisas ampliaram
os entendimentos do potencial de sistemas agroflorestais em promover
conservação e/ou recuperação ambiental. Neste sentido, no Brasil,
instrumentos normativos (leis, medidas provisórias, portarias etc.),
passaram a tratar a adoção de sistemas agroflorestais como técnica
alternativa aos modelos convencionais de reflorestamento visando à
recuperação ambiental. Neste contexto, surgem novas adaptações ao
conceito de sistema agroflorestal, conforme o proposto pela Resolução No
429, do Conselho Nacional do Meio Ambiente, de 28 de fevereiro de 2011,
que dispõe sobre a metodologia de recuperação das Áreas de Preservação
Permanente – APPs, assim definido:

- “sistemas de uso e ocupação do solo em que


plantas lenhosas perenes são manejadas em associação
com plantas herbáceas, arbustivas, arbóreas, culturas
agrícolas, e forrageiras, em uma mesma unidade de
manejo, de acordo com arranjo espacial e temporal, com
diversidade de espécies nativas e interações entre estes
componentes” (BRASIL, 2011, p.1).

Seguindo esta mesma contextualização, a Secretaria do Meio


Ambiente do Estado de São Paulo define, na Resolução n. 32, de 03 de
abril de 2014, as orientações, diretrizes e critérios sobre a restauração
ecológica da seguinte maneira:

- “sistema de uso e ocupação do solo em que


plantas lenhosas perenes são manejadas em associação
com plantas herbáceas, arbustivas, arbóreas, culturas
agrícolas, forrageiras em uma mesma unidade de
manejo, de acordo com arranjo espacial e temporal, com
alta diversidade de espécies e interações entre estes
componentes” (SÃO PAULO, 2014. p.3).

Destacam-se nestes dois últimos conceitos os termos “com diversidade


de espécies nativas” e “com alta diversidade de espécies”. A diversidade
torna-se, assim, um novo elemento abordado, e tem sido frequentemente
integrado nas discussões sobre sistemas agroflorestais.

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Nair (1993) apresenta uma abordagem também interessante para o
entendimento conceitual de sistema agroflorestal, assim contextualizada:

- a introdução de espécies lenhosas no sistema é feita de forma


deliberada;
- duas ou mais espécies de plantas ou animais estarão sempre
presentes, sendo no mínimo uma lenhosa;
- sempre há dois ou mais produtos;
- ciclo é sempre mais que um ano;
- mesmo o sistema mais simples é sempre mais complexo ecológica
e economicamente que os monocultivos.

É importante compreender que, baseando-se nas


definições de sistemas agroflorestais apresentadas,
podemos imaginar diversas formas de compor estes
sistemas, considerando as variações na composição de
espécies (arbórea, agrícola e animal), arranjos espaciais
(espaçamentos de plantio), intensidades de misturas
e arranjo temporal (variações das composições nos
tempos) e, consequentemente, nas fisionomias e aspectos
ecológicos. Estas variações podem proporcionar diversos
tipos/modelos de sistemas agroflorestais, variando entre
os mais simplificados, com poucas espécies e baixa
intensidade de manejo, até sistemas mais complexos,
com alta biodiversidade e intensidade de manejo,
assim como sistemas intermediários. A estas variações
estarão associados os potenciais benefícios ambientais
e socieconômicos das propostas agroflorestais, sobre os
quais apresentaremos algumas abordagens na sequência
do presente Curso.

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Com o avanço do interesse pelos sistemas agroflorestais, foram
surgindo também estudos e pesquisas que auxiliaram a Agrossilvicultura
a tratar dos sistemas agroflorestais de maneira mais técnica, inclusive,
classificando os sistemas de forma a contribuir para a sua melhor
compreensão. Uma destas classificações geraram termos, frequentemente
encontrados na literatura, que se associam às questões conceituais. É
baseada na natureza dos componentes de sistemas agroflorestais (arbóreo,
agrícola e pastagem/animal), resultando nas seguintes denominações:

Sistema agrossilvicultural ou silvíagrícola (cultivos agrícolas + árvores)

Fonte: Elaborado a partir de Cordero e Boshier (2003).

Sistema silvipastoril (pastagem/animais + árvores)

Fonte: Elaborado a partir de Cordero e Boshier (2003).

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Sistema agrossilvipastoril (cultivos agrícolas + pastagem/animais + árvores)

Fonte: Elaborado a partir de Cordero e Boshier (2003).

Outra abordagem interessante que pode contribuir para melhor


compreensão desta discussão é apresentada por Nair (1993), que menciona
sobre sistema e prática agroflorestal, assim definidos:

- Prática agroflorestal: disposição distinta de componentes no espaço


e no tempo;
- Sistema agroflorestal: exemplo específico de uma prática em
determinado local.
Estas definições também podem trazer contribuições do ponto
de vista técnico para tratar dos diferentes modelos (assim comumente
denominados) de sistemas agroflorestais, como: Culturas em Aleias,
Taungya, Agrofloresta ou Sistema Agroflorestal Sucessional, Quintais
Agroflorestais, SAF Cabruca; entre outros, a exemplo daqueles com
denominações regionais do Semiárido brasileiro, que serão abordados
no presente curso: SAFs Malhadas, SAFs Cercados, SAFs Fundos de Pastos,
SAFs Semeio, Quintais Produtivos.

Compreende-se, então, que existem diferentes


práticas (modelos) agroflorestais, que poderão compor
diferentes sistemas, com arranjos e espécies específicos em
determinado local.

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Em relação às definições e conceitos de sistema agroflorestal,
observa-se que são variáveis, porém, bem norteados em relação ao que
se refere à composição arbórea, agrícola e pastagem/animal. A inserção
de termos, como sustentabilidade, biodiversidade, ecologia, conservação,
produtividade, economia, entre outros, frequentemente é observada nas
propostas conceituais, normalmente associadas às expectativas e ao
potencial que os sistemas podem apresentar. Estas expectativas devem
ser criteriosamente analisadas levando-se em consideração os aspectos
ambientais, culturais e sociais regionais, visando a composições de
sistemas agroflorestais, que podem ser variadas, e a manejos que sejam
realmente capazes de promover melhorias para o desenvolvimento rural.

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Referências

BENE, J.G.; BEALL, H.W.; CÔTÉ, A. Trees, Food and People. IDRC,
Ottawa, Canada. 1977. 52p.

BRASIL. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução No 429, de


28 de fevereiro de 2011. Dispõe sobre a metodologia de recuperação das
Áreas de Preservação Permanente – APPs. Disponível em: http://www.
ibama.gov.br/sophia/cnia/legislacao/CONAMA/RE0429-280211.PDF.
Acesso em: 21 abr. 2022.

CORDERO, J.; BOSHIER, D. H. (Ed.). Árboles de Centroamérica: un


manual para extensionistas. Turrialba: Catie, 2003. 1.079 p.

ICRAF – International Council for Research in Agroforestry. Resources


for agroforestry diagnosis and design (Working Paper 7) ICRAF: Nairobe,
1983. 292p.

JOSE, S. Agroforestry for ecosystem services and environmental


benefits: An overview. Agroforestry Systems, v. 76, p. 1-10, 2009.

MACDICKEN, K.G.; VERGARA, N.T. Agroforestry: classification and


management. New York: John Wiley & Sons. 1990. 328p.

NAIR, P.K.R. An introduction to agroforestry. Dordrecht: Kluwer


Academic Publishers, 1993. 499p.

SÃO PAULO. Secretaria do Meio Ambiente. Resolução Nº 32, de 3


de abril de 2014. Estabelece as orientações, diretrizes e critérios sobre s
restauração ecológica no Estado de São Paulo. São Paulo: Diário Oficial
da República Federativa do Brasil, 2014.

YOUNG, A. Agroforestry for soil conservation. Wallingford: CAB


International, 1991, 275p.

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