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Corpo e movimento

A dança é um ato de intencionalidade do corpo para expressar e comunicar


sentimentos, ações, pensamentos, conceitos, julgamentos, entre outros. Durante a
dança, movimentos e percepções das próprias experiências de vida são
processados de maneira a expandir imagens e sentidos. O corpo e o ambiente são
correlacionados e corresponsáveis um pelo outro; assim, o dentro e o fora do corpo
são indissociáveis. Por isso, a dança trabalha com o que é interno e externo ao
corpo, simultaneamente.
Rudolf Laban foi um bailarino, coreógrafo e educador que desenvolveu um
sistema de movimento. Laban desenvolveu grande parte do seu trabalho na
Alemanha, mas seus estudos atravessaram fronteiras geográficas e períodos
históricos, estando presentes até os dias de hoje e pautando inúmeros processos de
pesquisa, criação, ensino e aprendizagem em dança.
Laban questionou e criticou premissas, como a de “perfeição”, rigidez
técnica ou mecânica, substituindo-as pela noção de expressão criativa. Os
elementos do movimento corporal propostos e desenvolvidos por Laban tratam os
movimentos de uma maneira ampla. Na pesquisa de movimento, podem-se
reconhecê-los, identificar os que estão sendo priorizados, fazer escolhas entre isolar,
associar, sobrepor, fragmentar, destacar, concatenar, etc. São infinitos os caminhos
para acioná-los, mesmo porque Laban não propôs um modelo de trabalho, mas
elementos a serem explorados amplamente.
Dança: expressividade e comunicação
A expressividade em dança depende de uma troca constante entre as
experiências pessoais e coletivas. Por isso, não há uma técnica ou método
indispensável à dança: cada um desenvolverá certos elementos em prol de outros e,
desse modo, trará entendimentos diversos sobre o mundo. A improvisação é um
meio de investigação da expressividade do corpo e do movimento, assim como a
exploração dos sentidos e a percepção das transformações do corpo em cada
situação.
O trabalho Se você quiser..., do Grupo X, integra componentes da história do
grupo, reunindo elementos de espetáculos anteriores, da memória dos dançarinos e
da interação com o público. Ele foi criado para ambientes externos e conta com
improvisações, possibilitando que os intérpretes-criadores reconfigurem o trabalho
em tempo real, a partir dos encontros com os espectadores e com o espaço.
O Grupo X de improvisação em dança foi fundado em 1998, como projeto de
extensão da Escola de Dança da Universidade Federal da Bahia (UFBA), pelos
professores Fafá Daltro e David Iannitelli. O grupo desenvolve pesquisa acadêmica
e criação artística, focando na improvisação cênica como eixo condutor da dança e
em questões relacionadas à acessibilidade. A improvisação em dança pode
acontecer sem acordos prévios, cujo fim é a própria experimentação, ou com
acordos anteriormente definidos, quando se escolhem algumas condições e regras
para a improvisação, podendo- -se almejar muitos objetivos diferentes, como
desenvolver estudos do corpo e do movimento para, a partir deles, compor uma
dança.
Para que uma dança comunique algo é preciso que atinja o espectador e
crie sentidos para ele. O significado de um trabalho não está fechado; o artista é
impulsionado por questões, mas não tem o domínio de tudo o que a sua criação
pode gerar. A arte tem a capacidade de expandir ou até mesmo se deslocar de uma
ideia inicial, pois sempre depende das interpretações dos espectadores. Por esse
motivo, a arte atravessa fronteiras e períodos com facilidade. Ainda assim, é
importante que o espectador tenha alguma familiaridade com o contexto de um
trabalho artístico. Obviamente, mesmo sem conhecer um certo código de dança, é
possível ter sensações e imagens a partir de um contato com a obra artística, mas a
aproximação cada vez maior com a linguagem, com processos de pesquisa e
criação auxilia o espectador no desenvolvimento da complexidade da fruição.
Para que o movimento se torne dança, ele precisa expressar e comunicar
algo. Para haver dança é preciso uma capacidade de se autorressignificar
continuamente, tanto em quem dança quanto em quem frui. Uma dança é uma
produção de conhecimento, pois questiona, reflete, critica, reforça ou propõe outras
visões de mundo. Ela expõe atitudes físicas e simbólicas perante a arte e a vida.
É preciso lembrar que, na dança contemporânea, diferentes referências
podem se entrecruzar e novos conhecimentos podem surgir a partir de encontros. É
preciso estar atento às crenças em verdades absolutas ou a modos rígidos de
pesquisar e criar; o que percebemos depende do que fazemos, do que sabemos que
fazemos ou do que desejamos fazer.
Ao longo da nossa vida, aprendemos posturas e gestos que nos categorizam
em determinados grupos sociais. Sem nos darmos conta, os repetimos
constantemente. Também exigimos do outro certas posturas que satisfaçam a
representação prévia que temos dele. São configurações definidas pelas ordens
sociais, mas, justamente por serem acordos construídos histórica e culturalmente,
são passíveis de transformação ou, ao menos, poderiam ser. Especialmente sobre a
ideia de feminino, isso é muito forte. Questionar padrões de corpo, de beleza, de
postura e de gesto é uma forma de atuar socialmente, respeitando as diferenças e
promovendo a autonomia.
O corpo no teatro
O corpo e suas interações com outras pessoas, objetos, sons, imagens e
sensações são a base do trabalho com o teatro. É por meio dos cinco sentidos
físicos (tato, olfato, gustação, audição e visão) que todos nós nos entendemos e nos
comunicamos com o mundo à nossa volta.
Desde a década de 1970, a vertente teatral baseada em práticas corporais,
chamada por alguns estudiosos de teatro físico, colocou o trabalho corporal do ator
como um importante elemento de criação, desvinculando-o da supremacia do texto
dramático que, até então, era o condutor do teatro. Dessa forma, o corpo passou a
ser um importante meio de produção de simbologias e sentidos na linguagem
cênica, gerando processos criativos e espetáculos muito visuais, em que a
gestualidade e a movimentação muitas vezes substituem o próprio texto teatral,
cenários e outros elementos de cena.
Muitos artistas, como Laban, Pina Bausch e o próprio grupo LUME,
preocuparam-se com a rigidez mecânica dos atores e bailarinos e desenvolveram
formas de equilibrar o rigor técnico e a espontaneidade. Entre eles estava o polonês
Jerzy Grotowski (1933-1999), considerado um dos principais diretores teatrais do
século XX a propor formas de evitar um possível “teatro morto”, em que as
representações perdessem frescor e vida ao longo das apresentações.
Para Grotowski, equilibrar o binômio técnica-espontaneidade é fundamental
para o trabalho do ator, pois é esse equilíbrio, em conjunto com o contato e a
interação entre atores e público, que pode gerar um acontecimento teatral dinâmico,
vivo, vibrante e significativo. O diretor classifica esse binômio em dois polos
complementares: o polo artificial (técnico e estrutural) e o polo orgânico (sensações,
interações e emoção).
No primeiro polo estão as ações de preparação física do ator: o pleno
domínio gestual e de uso da voz e a criação de códigos e signos corporais para
estabelecer interação com o público. No segundo polo estão as formas e os
momentos de interação entre os atores e destes com a plateia, que despertam
sensações, emoções, memórias e trazem frescor e novidade à cena.
Alguns exemplos de gêneros teatrais que se valem do domínio técnico do
corpo e preservam significados profundos das culturas tradicionais de seus povos
são as formas de teatro clássico oriental, como a Ópera de Pequim, da China, o
Teatro Noh (Nô) e o Teatro Kabuki, do Japão, e o Teatro-dança Kathakali, da Índia.
Teatro Noh
Noh significa “habilidade”, “talento”. É conhecido como teatro de máscaras
porque é como, geralmente, o protagonista (shite) e seu acompanhante, ambos
espíritos, aparecem nas apresentações, usando vestimentas pesadas com várias
camadas de tecido. Também é conhecido como teatro das essências, com o mínimo
de movimentos, chamados kata.
Kathakali
O Kathakali (katha, “estória”; kali, “jogo”) é uma manifestação cultural e
religiosa que une dança e teatro, originária do Kerela, no extremo sul da Índia. Os
atores representam personagens do universo mítico-religioso indiano, como deuses,
seres sobrenaturais e demônios. Uma de suas funções é transmitir os ensinamentos
do Vedas (escrituras sagradas do hinduísmo).
Os movimentos corporais utilizados pelos atores têm alto grau de
refinamento, principalmente das expressões faciais, que possuem grande
simbologia. A maquiagem e os ornamentos utilizados nas apresentações são
complexos, as cores representam diferentes personagens ou espíritos da natureza,
como se pode ver na imagem ao lado, em que a pintura facial verde representa
selvagens com características heroicas.

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