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net/publication/313832485
MEDICALIZAÇÃO EM PSIQUIATRIA.
Article in Cadernos de saúde pública / Ministério da Saúde, Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública · January 2017
DOI: 10.1590/0102-311x00162316
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1 author:
Luciana Brito
University of Brasília
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All content following this page was uploaded by Luciana Brito on 24 March 2017.
O Mito Científico do Desequilíbrio Psíquico e su- tico não é o mesmo que negar a existência dessas
as Doenças é o quarto capítulo do livro. Os auto- experiências mesmas. Freitas & Amarante reco-
res discutem como, a partir da segunda metade nhecem que tais vivências são reais, mas que há
do século XX, a construção social da doença foi uma variação histórica sobre como elas têm sido
paulatinamente substituída por uma construção descritas. Nesse sentido é que os autores pro-
“corporativa da doença” (p. 77); nesse sentido, as põem “colocar entre aspas o que é apresentado como
doenças mentais foram transformadas pela in- determinado cientificamente para se buscar ma-
dústria farmacêutica em causalidades biológicas. neiras distintas de se aproximar e lidar com tais ex-
Freitas & Amarante nos apresentam o percurso periências” (grifos no original, p. 131-2). E fazem
histórico da introdução dos psicotrópicos no de maneira magistral ao longo deste pequeno e
tratamento da doença mental com base na cons- grande livro.
trução de uma argumentação lógica baseada nas Por último e não menos importante, os au-
premissas da teoria biológica. Os autores discor- tores apresentam sugestões de leituras e filmes.
rem pela perspectiva crítica sobre o paradigma Mas se engana a leitora que imagina apenas uma
da psiquiatria biológica e apresentam, com au- lista com referências numeradas. Os autores fa-
xílio da revisão de resultados de pesquisa, que a zem um diálogo com seus possíveis leitores e
teoria do desequilíbrio psíquico para justificar lançam as sugestões com um parágrafo explica-
o uso de medicamentos e internação faz pouco tivo sobre o contexto das obras sugeridas e por
ou nenhum sentido quando comparado aos tra- que elas poderiam interessar aqueles que dese-
tamentos alternativos à psiquiatria ortodoxa, jam se aprofundar no tema. Vale a pena seguir a
como, por exemplo, o tratamento com aborda- rota proposta. Ela certamente é uma leitura para
gens psicossociais. todas – profissionais de saúde, leigas ou estu-
Se o capítulo 5, Ninguém Pode Escapar, faz um diosas – as interessadas em compreender de que
alerta para a expansão do “mercado da psiquiatria” modo a medicalização afeta cotidianamente a
(p. 105), no qual qualquer experiência humana existência dos sujeitos. Em um contexto em que
poderia ser tornada uma doença mental e, por- a máxima de perto ninguém é normal está sendo
tanto, medicamente tratável; no capítulo 6, A levada cada vez mais a sério pela ciência psiqui-
Desmedicalização é Possível: Experiências, os auto- átrica das classificações, o livro é um convite ao
res não nos deixam desamparados e apresentam conhecimento no tema e reflexão.
experiências exitosas no campo do cuidado em
saúde mental. A experiência de Soteria, o pro-
jeto Open Dialogue de origem finlandesa com Luciana Stoimenoff Brito 1,2
base psicossocial são exemplos trazidos e discu-
tidos em detalhes que revelam a possibilidade de
1 Universidade de Brasília, Brasília, Brasil.
2 Anis – Instituto de Bioética, Brasília, Brasil.
provocar fissuras no fenômeno da medicalização l.brito@anis.org.br
psiquiátrica do sofrimento mental.
Reconhecer a medicalização das experiências
individuais ou coletivas como fenômeno biopolí-