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Bibliografia.
ISBN 978-85-442-3563-8.
1. Direito Penal. 2. Direito de Execuções Penais. I. Lima, Renato Brasileiro de. II. Título.
CDD 341.58
temas relacionados à execução penal, sem embargo de enfrentar, com auxílio da juris
prudência dos Tribunais Superiores, as principais discussões e controvérsias existentes
em torno do tema, principalmente à luz do Pacote Anticrime. Como se poderá notar,
o enorme descompasso entre os marcos legais e a caótica realidade prisional faz com
que decisões do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça e de Cortes
Internacionais de Direitos Humanos definam parâmetros imprescindíveis para uma
postura de redução de danos e limites à política penal do Estado, sempre tratada como
política pública sujeita à reserva do possível.
Esperamos, portanto, que o livro permita que estudantes de graduação, bacharéis,
candidatos que se preparam para o Exame da Ordem dos Advogados do Brasil ou
a concursos de ingresso nas diversas carreiras jurídicas, e os inúmeros profissionais
que militam na área, sejam eles Juizes, Defensores, Promotores de Justiça, Delegados
de Polícia ou Advogados, conheçam o universo das inúmeras regras atinentes à exe
cução penal. Se assim conseguirmos, certamente teremos alcançado nosso objetivo
maior, qual seja, o de trazer um pouco de luz para o estudo e aplicação prática do
Direito de Execução Penal, deixando de tratá-lo como o “primo pobre” do Direito
Penal e do Direito Processual Penal.
Ao leitor, esperamos propiciar uma agradável leitura, aguardando as eventuais
críticas, sugestões e observações que certamente surgirão ao longo da leitura do livro.
Para revisões, vídeos, perguntas, respostas, sugestões e críticas, pedimos que utilizem
nossas redes sociais, notadamente o instagram: @profrenatobrasileiro
Valinhos/SP, 3 de janeiro de 2022.
» Capítulo I
NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
1. Ressocialização do preso, falência do sistema carcerário e redução de danos
na execução penal .......................................................................................................................... 25
2. Direito Penitenciário e Direito de Execução Penal ........................................................... 26
3. Objeto da Lei de Execução Penal ............................................................................................ TI
4. Âmbito de aplicação da Lei de Execução Penal ............................................................... TI
4.1. Preso provisório (ou cautelar) ........................................................................................ 28
4.2. Condenado pela Justiça Eleitoral ou Militar, quando recolhido a esta
belecimento sujeito à jurisdição ordinária .............................................................. 29
5. Natureza jurídica da execução penal ..................................................................................... 30
6. Início do processo de execução .............................................................................................. 31
7. Sujeitos da execução penal ........................................................................................................ 32
8. Suspensão dos direitos políticos .............................................................................................. 32
9. Princípios da execução penal ................................................................................................... 33
9.1. Princípio da legalidade ...................................................................................................... 34
9.2. Princípio da humanidade .................................................................................................. 35
9.3. Princípio da personalidade ou intranscendência dapena .................................. 37
9.4. Princípio da individualização da pena ........................................................................ 38
9.5. Princípio da responsabilidade penal subjetiva (ou daculpabilidade) ........... 39
9.6. Princípio da jurisdicionalidade ....................................................................................... 40
9.7. Princípio da isonomia e vedação à discriminação ................................................ 41
10. Execução provisória da pena ..................................................................................................... 41
10.1. (Des) necessidade do trânsito em julgado para fins de execução de
pena privativa de liberdade ........................................................................................... 42
10.2. Execução provisória da pena no caso de condenação pelo Tribunal do
Júri a uma pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão ........... 44
10.2.1. (In) constitucionalidade da execução provisória da pena no
âmbito do Júri ...................................................................................................... 45
10.3. Concessão antecipada de benefícios da execução penal ao preso cau
telar ............................................................................................................................................ 48
10 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
» Capítulo II
CLASSIFICAÇÃO DO CONDENADO E DO INTERNADO
1. Noções introdutórias ..................................................................................................................... 51
2. Exame dos antecedentes ............................................................................................................ 52
3. Exame da personalidade ............................................................................................................. 52
4. Comissão Técnica de Classificação .......................................................................................... 53
5. Exame criminológico ..................................................................................................................... 55
5.1. (In) admissibilidade do exame criminológico para fins de progressão
de regimes, livramento condicional ou outros benefícios prisionais ......... 56
6. Identificação do perfil genético ................................................................................................ 57
6.1. (Im) possibilidade de utilização da amostra biológica do condenado
para fins de fenotipagem genética ou de busca familiar ................................ 63
6.2. Obrigatoriedade de descarte imediato da amostra biológica tão logo
identificado o perfil genético ........................................................................................ 64
6.3. Obrigatoriedade de coleta da amostra biológica e elaboração do res
pectivo laudo por perito oficial ................................................................................... 65
6.4. (In) constitucionalidade da identificação do perfil genético .......................... 67
» Capítulo III
ASSISTÊNCIA AO PRESO
1. Noções introdutórias ..................................................................................................................... 69
2. Assistência material ........................................................................................................................ 70
3. Assistência à saúde ......................................................................................................................... 72
4. Assistência jurídica .......................................................................................................................... 73
5. Assistência educacional ................................................................................................................ 76
6. Assistência social ............................................................................................................................. 78
7. Assistência religiosa ........................................................................................................................ 80
8. Assistência ao egresso ................................................................................................................... 81
» Capítulo IV
TRABALHO DO PRESO
1. Noções introdutórias ..................................................................................................................... 83
2. Sujeição do trabalho do preso ao regime da Consolidação das Leis do Tra
balho ...................................................................................................................................................... 85
3. Remuneração ..................................................................................................................................... 86
3.1. Destinação do produto daremuneração .................................................................. 88
3.2. Não remuneração da prestação de serviços à comunidade ......................... 89
4. Trabalho interno .............................................................................................................................. 90
4.1. Obrigatoriedade do trabalho ......................................................................................... 91
4.2. Jornada de trabalho ........................................................................................................... 92
SUMÁRIO 11
» Capítulo V
DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA
1. Deveres do preso ......................................................................................................................... 103
1.1. Rol de deveres do preso especificados pela LEP .............................................. 103
1.2. Deveres do preso cautelar ........................................................................................... 106
2. Direitos do preso .......................................................................................................................... 106
2.1. Respeito à integridade física e moral do preso ................................................. 107
2.1.1. Uso de algemas ................................................................................................. 109
2.1.1.1. Vedação ao uso de algemas em mulheres grávidas
durante o parto e em mulheres durante a fase de
puerpério imediato ...................................................................... 111
2.1.2. Caso Damião Ximenes Lopes ...................................................................... 112
2.1.3. Revista íntima em presídios .......................................................................... 113
2.2. Rol exemplificativo de direitos do preso previstos na Lei de Execução
Penal ....................................................................................................................................... 116
2.2.1. Alimentação suficiente e vestuário ............................................................ 117
2.2.2. Atribuição de trabalho e suaremuneração ............................................. 117
2.2.3. Previdência social .............................................................................................. 117
2.2.3.1. Auxílio-reclusão ............................................................................. 118
2.2.4. Constituição de pecúlio .................................................................................. 118
2.2.5. Proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o
descanso e a recreação .................................................................................. 119
2.2.6. Exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e
desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução
da pena .................................................................................................................. 119
2.2.7. Assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e reli
giosa ........................................................................................................................ 119
2.2.8. Proteção contra qualquer forma de sensacionalismo (Perp
walk) ........................................................................................................................ 119
12 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
» Capítulo VI
ÓRGÃOS DA EXECUÇÃO PENAL
1. Noções introdutórias ................................................................................................................... 197
2. Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária ............................................. 197
3. Juízo da Execução ........................................................................................................................ 198
3.1. Fixação da competência do juízo da execução com base na natureza
do estabelecimento prisional em que se encontrar o condenado (ou
preso provisório) ............................................................................................................... 200
3.2. Competência do Juízo Federal da Execução Penal ......................................... 201
3.3. Competência territorial .................................................................................................. 204
SUMÁRIO 15
» Capítulo VII
ESTABELECIMENTOS PENAIS
1. Regras gerais .................................................................................................................................... 225
1.1. Classificação dos estabelecimentos penais .......................................................... 225
1.2. Instalações adequadas .................................................................................................... 226
1.3. Recolhimento de presos a estabelecimento próprio e adequado ao seu
respectivo sexo e idade ................................................................................................ 1T1
1.4. (Im) possibilidade de terceirização nos estabelecimentos prisionais ...... 229
1.5. Separação de presos ...................................................................................................... 230
1.6. Prisão Especial .................................................................................................................... 233
1.7. Sala de Estado-Maior ...................................................................................................... 236
1.8. Prisão de índios ................................................................................................................. 238
1.9. Local de cumprimento da pena ................................................................................. 239
1.10. Capacidade das prisões ................................................................................................. 241
1.10.1. (Im) possibilidade de manutenção de condenado em regime
prisional mais gravoso na hipótese de falta de estabelecimento
penal adequado ................................................................................................. 242
1.10.2. (Im) possibilidade de concessão imediata da prisão domiciliar
sem prévia observância dos parâmetros traçados no RE 641.320/
RS .............................................................................................................................. 243
1.10.3. Precariedade das condições de encarceramento e obrigação do
Estado de ressarcir os danos, inclusive morais ................................... 244
1.10.4. (Im) possibilidade de o Judiciário impor à Administração Pública
a obrigação de promover melhorias em estabelecimentos pri
sionais ..................................................................................................................... 245
16 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
» Capítulo VIII
EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE
1. Noções introdutórias ................................................................................................................... 273
1.1. Execução da sentença ................................................................................................... 274
1.2. Guia de recolhimento .................................................................................................... 274
1.2.1. Requisitos da guia de recolhimento ........................................................ 276
1.2.2. Guia de recolhimento provisória ............................................................... 278
1.2.3. Cálculo de liquidação de penas ................................................................ 280
SUMÁRIO 17
» Capítulo IX
EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS
1. Noções introdutórias ................................................................................................................... 441
2. (Des) necessidade do trânsito em julgado para fins de execução da pena
restritiva de direitos ...................................................................................................................... 441
3. Natureza jurídica e características essenciais ................................................................... 443
4. Duração .............................................................................................................................................. 444
5. Requisitos para a substituição da pena privativa de liberdade .............................. 445
6. Questões controversas ............................................................................................................... 450
6.1. (Im) possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos nos casos de crimes hediondos e equiparados ...... 450
6.2. (Im) possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos nos casos de infrações penais praticadas no con
texto da violência doméstica e familiar contra a mulher ............................. 452
6.3. (Im) possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos em relação aos crimes de homicídio culposo e
lesão corporal culposa na direção de veículo automotor qualificados
pela embriaguez ao volante ....................................................................................... 454
6.4. (Im) possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos no caso de crimes militares ............................................. 455
6.5. (Im) possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos em relação a estrangeiros ................................................. 456
7. Momento adequado para a substituição .......................................................................... 456
8. Critérios de substituição ............................................................................................................. 456
8.1. (Im) possibilidade de substituição da prisão por multa quando comi
nadas cumulativamente, em lei especial, penas privativa de liberdade
e pecuniária ........................................................................................................................ 458
22 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
» Capítulo X
EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA
1. Noções introdutórias .................................................................................................................. 479
2. Critério adotado para fins de aplicação da pena de multa ...................................... 480
3. Pagamento voluntário da multa ........................................................................................... 482
4. Execução da pena de multa ................................................................................................... 483
5. (Im) possibilidade de extinção da punibilidade em caso de cumprimento integral
da pena privativa de liberdade e inadimplemento da pena de multa ..................... 486
6. Inadimplemento deliberado da pena de multa e possibilidade de progressão
de regime prisional ...................................................................................................................... 488
7. (Im) possibilidade de substituição da prisão por multa quando cominadas cumu
lativamente, em lei especial, penas privativa de liberdade e pecuniária ................... 488
8. Cabimento de habeas corpus em se tratando de persecução penal referente
à infração penal à qual seja cominada tão somente a pena de multa .............. 488
9. Multa coercitiva prevista na Lei n. 11.343/06 para assegurar o cumprimento das
penas previstas para o crime de porte de drogas para consumo pessoal .............. 489
10. Pena de multa nos crimes em licitações e contratos administrativos ................ 492
11. Pena de multa no âmbito da violência doméstica e familiar contra a mulher ...... 493
» Capítulo XI
EXECUÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA
1. Noções introdutórias ..................................................................................................................... 495
2. Distinção entre pena e medida de segurança ................................................................ 496
3. Pressupostos .................................................................................................................................... 496
4. Aplicação da medida de segurança ...................................................................................... 498
4.1. Absolvição sumária imprópria .................................................................................... 499
SUMÁRIO 23
» Capítulo XII
INCIDENTES DA EXECUÇÃO
1. Noções introdutórias .......................................................................................................... 519
2. Conversões ....................................................................................................................................... 520
2.1. Conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos ....... 520
2.2. Conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de liberda
de 522
2.3. Conversão da multa em pena privativa de liberdade .................................... 522
2.4. Conversão da multa em pena restritiva de direitos ......................................... 523
2.5. Conversão da pena privativa de liberdade em medida de segurança e
conversão do tratamento ambulatorial em internação ................................. 523
3. Excesso ou desvio daexecução .............................................................................................. 523
4. Anistia e indulto ............................................................................................................................ 525
4.1. Regras gerais ...................................................................................................................... 525
4.2. Anistia .................................................................................................................................... 525
4.3. Graça (ou indulto individual) ...................................................................................... 527
4.4. Indulto coletivo ................................................................................................................. 528
4.4.1. Prática de falta grave e (im) possibilidade de interrupção do
prazo para fins de comutação de pena ou indulto ......................... 532
4.4.2. Indulto e medidas de segurança ............................................................... 533
4.4.3. Crimes hediondos e equiparados ............................................................. 534
4.4.4. Questões controvertidas ................................................................................ 537
5. Incidentes da execução nos casos de colaboração premiada ................................ 540
24 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
» Capítulo XIII
PROCEDIMENTO JUDICIAL
1. Procedimento judicial ................................................................................................................ 543
2. Iniciativa do procedimento judicial ......................................................................... 544
3. /ter procedimental ......................................................................................................................... 545
4. Agravo em execução ................................................................................................................. 547
4.1. Hipóteses de cabimento ............................................................................................... 547
4.2. Revogação tácita dediversas hipóteses de cabimento do recurso em
sentido estrito ................................................................................................................... 548
4.3. Procedimento .................................................................................................................... 550
4.4. Prazo ...................................................................................................................................... 551
4.5. Efeitos .................................................................................................................................... 551
Cabimento de mandado de segurança para atribuir efeito
4.5.1.
suspensivo a agravo em execução interposto pelo Ministério
Público ................................................................................................................... 551
5. Revisão criminal ............................................................................................................................ 553
6. Habeas Corpus no âmbito da Execução Penal ................................................................. 554
6.1. Habeas corpus substitutivo de recurso ordinário ............................................... 555
6.2. (Im) possibilidade de dilação probatória ............................................................... 556
6.3. Habeas corpus coletivo .................................................................................................. 556
» Capítulo XIV
REABILITAÇÃO
1. Conceito ............................................................................................................................................ 561
2. Natureza jurídica ........................................................................................................................... 561
3. Modalidades de reabilitação previstas no Código Penal ........................................... 562
3.1. Sigilo das condenações ................................................................................................. 562
3.2. Efeitos secundários de natureza extrapenal e específicos da condena
ção ........................................................................................................................................... 563
4. Legitimidade para o reguerimento de reabilitação ...................................................... 564
5. Juízo competente para a apreciação do pedidode reabilitação ............................ 564
6. Pressuposto da reabilitação ..................................................................................................... 564
7. Requisitos da reabilitação ........................................................................................................ 565
7.1. Requisitos objetivos ........................................................................................................ 565
7.2. Requisitos subjetivos ...................................................................................................... 566
8. Medida segurança detentiva .................................................................................................. 566
9. Decisão judicial .............................................................................................................................. 566
10. Recurso de ofício .......................................................................................................................... 567
11. Cabimento de habeas corpus ................................................................................................. 567
12. Comunicação aos órgãos de identificação ....................................................................... 568
13. Revogação da reabilitação ....................................................................................................... 568
1 ROXIN, Claus. Problemas Fundamentais do Direito Penal. Lisboa: Veja, 1986. P. 40.
2 De acordo com relatório elaborado pelo Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) em junho de 2014,
o déficit de espaço nas prisões brasileiras ultrapassou a soma de 230 mil vagas. Disponível em: http://
www.justica.gov.br/seus-direitos/politica-penal/relatorio-depen-versao-web.pdf/view. Acesso em 13.12.21.
26 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
3 ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução penal: teoria crítica. 5a ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021.
p. 18.
Cap. I • NOÇÕES INTRODUTÓRIAS 27
7 Para mais detalhes acerca da Justiça competente para deliberar sobre os incidentes da execução atinente
ao condenado pela Justiça Eleitoral ou Militar recolhido a estabelecimentos sujeitos à jurisdição ordiná
ria, remetemos o leitor ao capítulo atinente aos órgãos da execução penal, mais precisamente ao tópico
atinente à competência do Juízo da Execução Penal.
8 STF, 2a Turma, HC 73.920-RJ, Rei. Min. Carlos Velloso, j. 20.08.1996, DJ 08.11.1996.
9 STF, 2a Turma, HC 104.174-RJ, Rei. Min. Ayres Britto, j. 29.03.2011, DJe 18.05.2011.
10 AVENA, Norberto. Execução penal esquematizado. 2a ed. São Paulo: Método, 2015, p. 13.
30 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
11 BRITO, Alexis Couto de. Execução Penal. 6a ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. p. 39.
12 GRECO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. 7a ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 110.
Cap. I • NOÇÕES INTRODUTÓRIAS 31
13 GRINOVER, Ada Pellegrini. Execução Penal. São Paulo: Max Limonad, 1987. p. 7.
14 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. Vol. 3. 33a ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 191.
32 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
De acordo com o art. 15, inciso III, da Constituição Federal, é vedada a cas
sação de direitos políticos, cuja perda (privação definitiva) ou suspensão (privação
temporária) só se dará, entre outros casos, na hipótese de “condenação criminal
transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos”. De se notar que se trata de
consequência automática e obrigatória do trânsito em julgado da sentença conde
natória, pouco importando a existência (ou não) de fundamentação expressa na
sentença nesse sentido. Noutro giro, como o art. 15, III, da CF não faz qualquer
ressalva em sentido diverso, o ideal é concluir que pouco importa o tipo de infra
ção penal cometida pelo agente, é dizer, dolosa ou culposa, crime ou contravenção
penal, e independentemente da aplicação (ou não) de pena privativa de liberdade,
já que a ratio legis do dispositivo é permitir que os cargos públicos eletivos sejam
reservados somente para os cidadãos insuspeitos, preservando-se a dignidade da
representação democrática.
Cuida-se, portanto, de causa de suspensão dos direitos políticos, já que a própria
Constituição Federal ressalta que esta privação temporária deverá se estender pelo
menos enquanto durarem seus efeitos, ou seja, pelo menos até que seja cumprida
ou extinta a pena, não importando o fato de encontrar-se em gozo de livramento
condicional, suspensão condicional da pena ou prisão domiciliar. A propósito, eis
Cap. I • NOÇÕES INTRODUTÓRIAS 33
15 Paradigma: STF, RE 601.182/MG, Rei. Min. Alexandre de Moraes, j. 08.05.2019, DJ 02.10.2019. Ainda
no sentido de que a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não impede
a suspensão dos direitos políticos: STF, 1a Turma, RE 577.012 AgR/MG, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j.
09.11.2010, DJ 25.03.2011.
34 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
de novatio legis in pejus, de aplicação restrita, portanto, aos crimes cometidos após
a vigência do Pacote Anticrime (23/01/2020).
Com raciocínio semelhante, porém em relação às transgressões disciplinares,
cite-se o exemplo da Lei n. 11.466/07, que passou a tipificar como falta grave a
conduta do condenado de ter em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho telefô
nico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com
o ambiente externo (LEP, art. 50, VII). Ora, por se tratar de evidente exemplo de
novatio legis in pejus, referido diploma normativo há de ser considerado irretroativo,
já que passou a definir como falta grave fatos que antes não eram tipificados ou
que eram previstos como faltas leves ou médias.16
Por outro lado, na eventualidade de estarmos diante de uma novatio legis in
mellius, a retroatividade será obrigatória. Tome-se, como exemplo, a Lei n. 12.433/11,
que conferiu nova redação ao art. 127 da LEP: “Em caso de falta grave, o juiz po
derá revogar até 1/3 (um terço) do tempo remido, observado o disposto no art. 57,
recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar”. Desde então, a
perda de dias remidos não mais poderá incidir sobre a totalidade do tempo remido,
como autorizava até então a súmula vinculante n. 9,17 mas tão somente até o limite
de 1/3 (um terço) desse montante. Nesse ponto, cuida-se, a Lei n. 12.433/11, de
evidente exemplo de novatio legis in mellius. Deverá, portanto, à luz do art. 5o, XL,
da Constituição Federal, retroagir em favor dos condenados que tiveram declarada
a perda da integralidade dos dias remidos, desde que, logicamente, ainda não tenha
ocorrido a extinção da pena. Enfim, observado o limite máximo de 1/3 da perda
dos dias remidos, deverá o juízo da execução restituir aos executados atingidos pela
redação original do art. 127 da LEP, no mínimo, o equivalente aos 2/3 (dois terços)
que haviam perdido.18
16 STJ, 5a Turma, HC 155.372/SP, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 02/08/2012, DJe 15/08/2012; STJ, 6a Turma,
HC 236.090/SP, Rei. Min. Ericson Maranho - Desembargador convocado do TJ/SP -, j. 24/03/2015, DJe
31/03/2015.
17 Súmula vinculante n. 9: "O disposto no art. 127 da Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal) foi recebido
pela ordem constitucional vigente, e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do art. 58". Para
mais detalhes acerca da remição, consultar capítulo referente à execução da pena privativa de liberdade.
18 STF, 2a Turma, HC 110.566/SP, Rei. Min. Ayres Britto, j. 28/02/2012, DJe 111 06/06/2012. No mesmo contexto:
STF, 2a Turma, HC 110.317/MS, Rei. Min. Ayres Britto, j. 07/02/2012, DJe 73 13/04/2012; STF, 2a Turma, HC
110.040/RS, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 08/11/2011, DJe 226 28/11/2011; STJ, 5a Turma, HC 230.659-SP, Rei.
Min. Laurita Vaz, j. 05.11.2013, Dje 19.11.2013; STJ, 5a Turma, Edcl nos EDcl no REsp 1.238.276-SP, Rei. Min.
Marilza Maynard - Desembargadora convocada do TJ-SE -, j. 13.08.20113, DJe 30.08.2013; STJ, 5a Turma,
HC 426.740-SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 15.05.2018, Dje 24.05.2018; STJ, 5a Turma, HC 210.062-SC, Rei. Min.
Gurgel de Faria, j. 19.03.2015, Dje 06.04.2015.
36 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
19 Paradigma: STF, Pleno, RE 592.581/RS, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 13.08.2015, DJ 01.02.2016. Para
mais detalhes acerca da tese em questão, remetemos o leitor ao capítulo referente aos estabelecimentos
penais.
Cap. I • NOÇÕES INTRODUTÓRIAS 37
22 As Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos, também conhecidas como Regras
de Nelson Mandela - a nomenclatura foi cunhada em homenagem ao ex-Presidente da África do sul
e ex-presidiário - não pretendem descrever em pormenor um modelo de sistema prisional. Procuram,
unicamente, com base no consenso geral do pensamento atual e nos elementos essenciais dos sistemas
contemporâneos mais adequados, estabelecer o que geralmente se aceita como sendo bons princípios e
práticas no tratamento dos reclusos e na gestão dos estabelecimentos prisionais.
23 FRANCO, Alberto Silva. Crimes hediondos. 4a ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. p. 163.
Em sentido semelhante: NUCCI, Guilherme de Souza. Individualização da pena. 2a ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2007. p. 338.
Cap. I • NOÇÕES INTRODUTÓRIAS 39
24 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. 2a ed. São Paulo: Editora Revista dos Tri
bunais, 2006. p. 447.
40 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
25 STJ, 6a Turma, AgRg no HC 567.191-SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 19.05.2020, DJe 03.06.2020. Na mesma linha:
STJ, 5a Turma, HC 399.047-SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 08.08.2017, DJe 15.08.2017. No sentido de que, ainda
que sejam fortes as suspeitas de que algum condenado tenha solicitado a terceiros que se lhe enviasse,
via correios, aparelho celular ou algum de seus acessórios, tal ilação, por si, desamparada de qualquer
outro elemento concreto que indique essa solicitação, não se mostra suficiente para que seja imputada
falta disciplinar ao preso, em razão, sobretudo, da intranscendência penal, cuja aplicação é perfeitamente
aceitável em sede de execução penal: STJ, 6a Turma, HC 291.774-SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j.
10.06.2014, DJe 18.11.2014.
Cap. I • NOÇÕES INTRODUTÓRIAS 41
28 Para mais detalhes acerca da (des) necessidade do trânsito em julgado para fins de execução das chamadas
penas alternativas, consultar capítulo atinente à execução das penas restritivas de direitos.
29 Nesse contexto: STF, Ia Turma, HC 91.675/PR, Rei. Min. Cármen Lúcia, j. 04/09/2007, Dje 157 06/12/2007.
30 HC 84.078, Rei. Min. Eros Grau. Informativo n° 534 do STF - Brasília, 2 a 6 de fevereiro de 2009. No mesmo
sentido: STF, 2a Turma, HC 88.174/SP, Rei. Min. Eros Grau, j. 12/12/1996, DJe 092 30/08/2007; STF, 2a Turma,
Cap. I • NOÇÕES INTRODUTÓRIAS 43
HC 89.754/BA, Rei. Min. Celso de Mello, j. 13/02/2007, DJe 04 26/04/2007; STF, 2a Turma, HC 91.232/PE,
Rei. Min. Eros Grau, j. 06/11/2007, DJe 157 06/12/2007; STJ - HC 122.191/RJ - 5a Turma - Rei. Min. Arnaldo
Esteves Lima - Dje 18/05/2009.
31 STF, Pleno, HC 126.292/SP, Rei. Min. Teori Zavascki, j. 17/02/2016, DJe 100 16/05/2016.
32 STF, Pleno, ADC 43 MC/DF, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 05/10/2016; STF, Pleno, ADC 44 MC/DF, Rei. Min.
Marco Aurélio, j. 05/10/2016.
33 STF, Pleno, ARE 964.246 RG/SP, Rei. Min. Teori Zavascki, j. 10/11/2016, DJe 251 24/11/2016).
34 Rei. Min. Marco Aurélio, j. 07/11/2019.
44 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
37 É nesse sentido a lição de Rafael Schwez Kurkowski: Projeto de Lei Anticrime. Coordenadores: Antônio
Henrique Graciano Suxberger, Renee do Ó Souza, Rogério Sanches. Salvador: Editora Juspodivm, 2019. p.
421.
46 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
nada (juízo rescindente), então também teríamos que aguardar ad aeternum pelo
julgamento de possível revisão criminal, já que esta, à semelhança da apelação
do art. 593, III, “d”, do CPP, também pode ser ajuizada objetivando a cassação
da decisão impugnada quando a decisão condenatória for contrária à evidência
dos autos (CPP, art. 621, I, in fine),™ diferenciando-se, porém, pelo fato de que a
ação autônoma de impugnação pode ser ajuizada a qualquer tempo, mesmo após
a morte do acusado (CPP, art. 623);
b) Inconstitucionalidade do art. 492, I, alínea “e”, do CPP, com redação dada
pela Lei n. 13.964/19 (nossa posição): com a devida vênia aos adeptos da Ia cor
rente, a busca por um sistema penal mais eficiente não autoriza a conclusão no
sentido de que a soberania dos veredictos admite a execução provisória de decisão
condenatória proferida pelo Júri. Se a permanência do acusado em liberdade após
a condenação em primeira instância pelo Júri representa um risco à execução da
pena ou à garantia da ordem pública, impõe-se a decretação da prisão cautelar.
Agora, ausente o periculum libertatis a que se refere o art. 312 do CPP, não se
pode admitir a execução provisória de uma prisão penal, sob pena de se negar
ao acusado perante o Júri não apenas o respeito à presunção de inocência, que a
Constituição Federal estende até o trânsito em julgado de sentença penal condena
tória (STF - ADCs 43, 44 e 54), ou, mesmo na vigência do antigo entendimento
do Supremo (HC 126.292), era tido como inviolável pelo menos até o esgota
mento da instância nos Tribunais de Apelação, respeitando-se, assim, ao menos o
direito ao duplo grau de jurisdição, explicitamente previsto na CADH (art. 8o, n.
2, alínea “h”). Por mais que se queira argumentar que a soberania dos veredictos
funciona como óbice para que um Tribunal formado por juizes togados possa
modificar, no mérito, a decisão proferida pelos jurados, daí não se pode concluir,
em hipótese alguma, que as decisões do Júri sejam definitivas e irrecorríveis, logo,
exequíveis de imediato, sob pena de se admitir que se trata de um poder absoluto,
incontrastável, o que, à evidência, é impensável em um Estado Democrático de
Direito. A soberania dos veredictos prevista na Constituição Federal ostenta valor
meramente relativo, do que se conclui que as decisões do Conselho de Sentença
não se revestem de intangibilidade, sendo plenamente possível que o Juízo ad
quem determine a cassação da decisão de Ia instância do Júri para que o acusa
do seja submetido a novo julgamento, se acaso restar evidenciado que a decisão
seria manifestamente contrária à prova dos autos (CPP, art. 593, III, “d” e §3°). É
dizer, o fato de o Tribunal de Justiça (ou TRF) não estar legitimado a proceder
ao juízo rescisório por ocasião do julgamento de apelação contra decisão do Júri
não guarda nenhuma relação direta com a execução imediata da sentença conde
natória, visto que subsiste a competência do juízo ad quem para efetuar o juízo
rescindente e determinar, em se tratando de decisão manifestamente contrária à
prova dos autos, um novo julgamento. Ora, como se pode justificar a execução*
38 Nessa linha: FERNANDES, Cleander César da Cunha; PINHO, Manoel Veridiano Fukuara Rebello; ALMEDIDA,
Saulo Jerônimo Leite Barbosa. A execução imediata da pena após o julgamento pelo Tribunal do Júri. In:
Tribunal do júri: o MP em defesa da Justiça. Salvador: Juspodivm, 2019. p. 19.
Cap. I • NOÇÕES INTRODUTÓRIAS 47
39 Nesse sentido, em momento anterior à entrada em vigor da Lei n. 13.964/19: PAIVA, Caio. Soberania dos
veredictos não autoriza execução imediata da condenação. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2017-
-mar-28/tribuna-defensoria-soberania-veredictos-nao-autoriza-execucao-imediata-condenacao Acesso em:
13/12/2018.
48 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
40 STJ, 5a Turma, RHC 31.222-RJ, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 24.04.2012, DJe 30.04.2012; STJ, 5a Turma, HC 212.521-
SP, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 04.10.2011, DJe 14.10.2011.
Cap. I • NOÇÕES INTRODUTÓRIAS 49
lhimento em local distinto da prisão comum. Com efeito, segundo o disposto no art.
295 do CPP, só há falar em direito à prisão especial quando o agente estiver sujeito
à prisão antes de condenação definitiva. Logo, se se trata, o preso especial, de espécie
de preso cautelar, nada mais lógico do que lhe assegurar os mesmos benefícios. Por
isso, como o preso cautelar tem direito à progressão de regimes (súmula n. 716 do
STF), é evidente que o preso especial, por se tratar de preso cautelar, também faz
jus aos mesmos benefícios (súmula n. 717 do STF).
II
CLASSIFICAÇÃO DO CONDENADO
E DO INTERNADO
1. NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
à luz dos dados de que se dispõe sobre as suas necessidades individuais, as suas
capacidades e o seu estado de espírito” (Regras 93 e 94).
Cuida-se, portanto, a classificação, de verdadeiro direito do condenado, visando
à diferenciação dos demais sentenciados, a fim de que cada um receba um trata
mento adequado e individualizado objetivando a sua reinserção social. De se notar
que, enquanto o processo de conhecimento visa olhar para o passado do acusado,
remontando ao tempo do crime (juízo de diagnose), a execução deve se voltar para
o futuro, com o objetivo de punir o sentenciado, mas, ao mesmo tempo, propor
cionar sua harmônica reintegração à sociedade (juízo de prognose), o que justifica
a importância da elaboração desse programa individualizador logo no início do
cumprimento da pena privativa de liberdade.1
Na prática, todavia, é sabido que todo esse ideal de classificação do condenado
preconizado pela LEP não passa de letra morta. Na verdade, diante da preocupação
da autoridade penitenciária com a manutenção da ordem, e, por consequência,
da preservação da segurança dos detentos e funcionários, a única classificação
efetivamente existente é aquela que leva em consideração os riscos eventualmente
produzidos pela colocação do preso neste ou naquela galeria, ala etc. Presos com
acusações por crimes sexuais, por exemplo, costumam ser isolados dos demais por
conta do risco real de serem agredidos ou feitos reféns no primeiro motim. Por
outro lado, presos que integram uma mesma organização criminosa costumam ser
colocados em um mesmo local.2
3. EXAME DA PERSONALIDADE
1 MIRANDA, Rafael de Souza. Manual de Execução Penal: teoria e prática. 2a ed. Salvador: Editora Juspodivm,
2020. p. 35.
2 GIAMBERARDINO, André Ribeiro. Comentários à Lei de Execução Penal. 3a ed. Belo Horizonte: CEI, 2021. p.
49.
Cap. II • CLASSIFICAÇÃO DO CONDENADO E DO INTERNADO 53
3 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Execução Penal. 14a ed. São Paulo: Atlas, 2018. p. 36.
54 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
5. EXAME CRIMINOLÓGICO
exame (art. 8o, parágrafo único). Como se pode notar, em relação ao condenado ao
cumprimento da pena em regime fechado, o exame criminológico é obrigatório. Para
aqueles, todavia, que dão início ao cumprimento da pena no regime semiaberto, sua
realização é apenas facultativa. Operou-se, pois, a revogação tácita do art. 35, caput,
do CP, que indica ser obrigatória a realização do exame criminológico para quem
dá início à execução da pena no regime semiaberto. Como o art. 8o da LEP não
faz qualquer menção àqueles condenados em regime aberto, ou no cumprimento
de pena restritiva de direitos, o ideal é concluir que, in casu, não há necessidade de
realização do exame criminológico.
Noutro giro, como o legislador é expresso ao se referir aos condenados, sem
qualquer referência aos presos cautelares, é de se concluir que a realização do exame
criminológico, obrigatória (regime fechado) ou facultativamente (semiaberto), deverá
abranger apenas aqueles que já tem contra si sentença condenatória transitada em
julgado. Justifica-se a distinção em apreço à luz do princípio da presunção de ino
cência, admitindo-se a realização do exame criminológico apenas em relação àqueles
que já tiveram sua culpa ou periculosidade declaradas em decisão irrecorrível.8
11 No sentido de que o cometimento de falta disciplinar de natureza grave no curso da execução penal justi
fica a exigência de exame criminológico para fins de progressão de regime: STJ, 5a Turma, HC 556.422-SP,
Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 05.03.2020, Dje 23.03.2020; STJ, 5a Turma, HC 519.383-SP, Rei. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, j. 17.09.2019, Dje 25.09.2019; STJ, 6a Turma, HC 457.713-SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j.
09.10.2018, DJe 26.10.2018.
12 No sentido de que a nova redação do art. 112 da Lei de Execuções Penais, conferida pela Lei 10.792/03,
deixou de exigir a submissão do condenado a exame criminológico, anteriormente imprescindível para fins
de progressão do regime prisional, sem, no entanto, retirar do Juiz a faculdade de requerer sua realização
quando, de forma fundamentada e excepcional, entender absolutamente necessária sua confecção para
a formação de seu convencimento: STJ, 5a Turma, RHC 20.698/RJ, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 24/04/2007, DJ
04/06/2007 p. 380; STJ, 5a Turma, HC 103.352/RS, Rei. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 11/11/2008, DJe
15/12/2008; STJ, 5a Turma, HC 114.882/SP, Rei. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 27/04/2009, DJe 25/05/2009.
Admitindo a realização de exame criminológico na hipótese de fuga do condenado: STJ, 6a Turma, HC
105.337/RS, Rei. Min. Jane Silva - Desembargadora convocada doTJ/MG -, j. 26/08/2008, DJe 08/09/2008.
13 No sentido de que se defere ao juízo da execução a faculdade de requisitar o exame criminológico e
utilizá-lo como fundamento da decisão que julga o pedido de progressão, concluindo, ademais, que a
adoção de textos semelhantes em despachos relacionados a procedimentos idênticos não viola o prin
cípio da individualização da pena nem gera nulidade por falta de fundamentação quando o conteúdo
tratar de especificidades do caso concreto sob análise: STF, 2a Turma, Rcl 27.616 AgR/SP, Rei. Min. Ricardo
Lewandowski, j. 09/10/2018.
58 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
14 CPP: "Art. 158. A cadeia de custódia compreende o rastreamento do vestígio nas seguintes etapas: (...)
II - isolamento: ato de evitar que se altere o estado das coisas, devendo isolar e preservar o ambiente
imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local do crime; (...)".
15 Nesse contexto: SILVA, Emílio de Oliveira. Identificação genética para fins criminais. Belo Horizonte: Editora
Dei Rey, 2014. p. 2-40. Como observa o autor (op. cit. p. 45), à semelhança da datiloscopia, "o exame ge
nético é um método biométrico que singulariza características físicas, porém, em dimensões moleculares.
Sua finalidade é a obtenção do perfil genético do sujeito, o qual será representado por codificações
alfanuméricas que possibilitam individualizar a pessoa. Em uma simples metáfora: é o 'CPF genético' do
ser humano".
16 O Decreto n° 7.950/13 instituiu o Banco Nacional de Perfis Genéticos e a Rede Integrada de Bancos de
Perfis Genéticos: aquele tem como objetivo armazenar dados de perfis genéticos coletados para subsidiar
ações destinadas à apuração de crimes; esta visa permitir o compartilhamento e a comparação de perfis
genéticos constantes dos bancos de perfis genéticos da União, dos Estados e do Distrito Federal.
17 SUXBERGER, Antônio Henrique Graciano. Projeto de Lei "Anticrime" e as modificações no regime legal da
identificação criminal e do banco de perfis genéticos. In Projeto de Lei Anticrime. Salvador: Editora Juspodivm,
2019. p. 26.
Cap. II • CLASSIFICAÇÃO DO CONDENADO E DO INTERNADO 59
18 Referindo-se o dispositivo, em sua redação original, apenas aos crimes hediondos, não se poderia admitir
a obrigatoriedade de identificação genética para os condenados por crimes equiparados a hediondos (v.g.,
tráfico de drogas), sob pena de evidente violação ao princípio da legalidade, salvo se tal delito também
fosse cometido dolosamente com violência de natureza grave contra pessoa (v.g., tortura).
19 Mesmo ainda subaproveitados, até o dia 28 de novembro de 2020 os bancos de DNA no Brasil já auxi
liaram 1977 investigações, apresentando ao poder público 2662 coincidências confirmadas, sendo 2088
60 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
12.037/09, não há, no caso da LEP, necessidade de prévia autorização judicial para
fins de coleta do material biológico. Na verdade, a autorização judicial só se faz
necessária para que a autoridade policial, federal ou estadual, no caso de inquérito
instaurado, tenha acesso ao banco de dados de identificação de perfil genético (LEP,
art. 9°-A, §2°).
Eis que surge, então, o Pacote Anticrime, pretendendo, dentre outras mu
danças na LEP, ampliar sobremaneira os condenados que estariam sujeitos à
identificação compulsória do perfil genético. Ocorre que o Presidente da Repú
blica acabou vetando a nova redação conferida ao caput do art. 9°-A da LEP, com
base nos seguintes argumentos: “A proposta legislativa, ao alterar o caput do art.
9°-A, suprimindo a menção expressa aos crimes hediondos, previstos na Lei n.
8.072/90, em substituição somente a tipos penais específicos, contraria o interesse
público, tendo em vista que a redação acaba por excluir alguns crimes hediondos
considerados de alto potencial ofensivo, a exemplo do crime de genocídio e o de
posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito, além daqueles que serão
incluídos no rol de crimes hediondos com a sanção da presente proposta, tais
como os crimes de comércio ilegal de armas, de tráfico internacional de arma e
de organização criminosa”.
O veto presidencial, todavia, não durou muito tempo, eis que o Congresso
Nacional optou por rejeitá-lo. Com isso, o art. 9°-A, caput, da LEP, passou a ter
a seguinte redação: “Art. 9°-A. O condenado por crime doloso praticado com
violência grave contra a pessoa, bem como por crime contra a vida, contra a
liberdade sexual ou por crime sexual contra vulnerável, será submetido, obriga
toriamente, à identificação do perfil genético, mediante extração de DNA (ácido
desoxirribonucleico), por técnica adequada e indolor, por ocasião do ingresso no
estabelecimento prisional”. Da comparação entre as duas redações, podemos extrair
algumas importantes conclusões:
a. foi mantida na Lei de Execução Penal a identificação obrigatória do per
fil genético nos crimes dolosos praticados com violência grave contra pessoa. Sem
embargo do caráter dúbio e controverso dessa expressão, queremos crer que o
legislador se refere a crimes dos quais resultem lesões graves, gravíssimas, ou a
morte da vítima, tais como lesão corporal seguida de morte, homicídio simples
ou qualificado etc.;
b. enquanto o crime praticado com violência grave contra a pessoa deve neces
sariamente ser doloso, porque o art. 9°-A, caput, da LEP, é explícito nesse sentido,
ao se referir aos crimes contra a vida, contra a liberdade sexual ou por crime sexual
contra vulnerável, o legislador não faz semelhante ressalva. Logo, com base na regra
da hermenêutica segundo a qual não é dado ao intérprete restringir onde a lei não
o fez, o ideal é concluir que, neste último caso, pouco importa se o delito é doloso
ou culposo (v.g., homicídio culposo);
entre vestígios e 574 entre vestígio e indivíduo cadastrado criminalmente. Nesse sentido: BRASIL. RIBPG.
XIII Relatório da Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéticos, p. 31.
Cap. II • CLASSIFICAÇÃO DO CONDENADO E DO INTERNADO 61
20 Originalmente, o art. 122 do CP incriminava tão somente o induzimento, instigação ou auxílio a suicídio, nos
seguintes termos: "Art. 122. Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça".
À época, dúvida nenhuma havia quanto ao fato de se tratar de crime contra a vida. Eis que surge, então,
a Lei n. 13.968, com vigência em data de 27/12/2019, conferindo ao referido delito não apenas uma nova
rubrica marginal - induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação mas também
uma nova redação típica, nos seguintes termos: "Art. 122. Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a
praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio para que o faça". Em que pese o legislador ter introduzido
esta novel figura delituosa de participação em automutilação no art. 122 do CP, logo, dentro do Capítulo
da Parte Especial que versa sobre os "crimes contra a vida", é de todo evidente que estamos diante de
um verdadeiro crime contra a integridade corporal, o qual, por consequência, deveria ter sido alocado no
art. 129 do CP. Destarte, por não se tratar de crime contra a vida, queremos crer que o condenado pela
prática do referido delito não está sujeito à identificação do perfil genético.
62 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
21 Banco Nacional de Perfis Genéticos: uma ferramenta eficiente para elucidação de crimes. Disponível
em: <https://www.justica.gov.br/news/collective-nitf-content-1556212211.45> Acesso em 26/02/2020
às 06:35.
Cap. II • CLASSIFICAÇÃO DO CONDENADO E DO INTERNADO 63
qualquer violação ao princípio da irretroatividade da lei penal mais gravosa, por não
estarmos diante de norma que versa sobre o ius puniendi do Estado.
A Lei n. 13.964/19 promoveu outras 2 (duas) mudanças relevantes no art. 9o-A
da LEP: a) do regulamento a ser expedido pelo Poder Executivo com o objetivo de
dispor sobre o banco de dados sigiloso em que será armazenada a identificação do
perfil genético deverão constar garantias mínimas de proteção de dados genéticos,
observando as melhores práticas da genética forense (LEP, art. 9°-A, §1°-A); b) obje
tivando resguardar o exercício da ampla defesa em relação à colheita desse material
biológico, deve ser viabilizado ao titular dos dados genéticos o acesso aos seus dados
constantes nos bancos de perfis genéticos, bem como a todos os documentos da
cadeia de custódia que gerou esse dado, de maneira que possa ser contraditado pela
defesa (LEP, art. 9°-A, §3°).
O Pacote Anticrime também aprimorou a Lei de Execução Penal ao prever,
expressamente, que a recusa do condenado em submeter-se ao procedimento de
identificação do perfil genético constitui falta grave (LEP, art. 9°-A, §8°, e art. 50,
VIII). Pelo menos até a entrada em vigor da Lei n. 13.964/19, não havia regramen
to explícito nesse sentido. Na verdade, havia quem dissesse que, como a coleta do
material biológico era compulsória, não podendo dela se esquivar o condenado,
eventual resistência de sua parte implicaria, de per si, em falta no curso da execu
ção penal, eis que o apenado estaria se negando a cumprir uma ordem recebida,
violando, pois, um dos deveres a que está sujeito (LEP, art. 39, V).22 De modo a se
afastar a necessidade de todo esse esforço interpretativo, andou bem o legislador ao
prever, explicitamente, que a recusa do condenado em submeter-se ao procedimento
de identificação do perfil genético terá, doravante, de maneira direta e imediata, o
condão de caracterizar falta grave.
Por ocasião da tramitação do Projeto Legislativo que deu origem à Lei n.
13.964/19, 3 (três) outros parágrafos do art. 9°-A da Lei de Execução Penal também
foram inicialmente vetados pelo Presidente da República. Todavia, à semelhança
dos anteriores, esses vetos foram igualmente rejeitados pelo Congresso Nacional.
Vejamos, então, os novos dispositivos legais introduzidos à identificação do perfil
genético de condenados prevista na Lei de Execução Penal.
22 LEP: "Art. 39. Constituem deveres do condenado: (...) V - execução do trabalho, das tarefas e das ordens
recebidas-, (...)".
64 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
Todavia, o novel dispositivo legal foi vetado pelo Presidente da República com
base nas seguintes razões: “A propositura legislativa, ao vedar a utilização da amostra
biológica coletada para fins de fenotipagem e busca familiar infralegal, contraria o
interesse público por ser uma técnica que poderá auxiliar no desvendamento de crimes
reputados graves, a exemplo de identificação de irmãos gêmeos, que compartilham
o mesmo perfil genético, e da busca familiar simples para identificar um estuprador,
quando o estupro resulta em gravidez, valendo-se, no caso, do feto abortado ou, até
mesmo, do bebê, caso a gestação seja levada a termo.”
Andou bem o legislador ao derrubar o veto presidencial, eis que o §5° do art.
9o-A da LEP, incluído pela Lei n. 13.964/19, simplesmente busca se alinhar ao art. 5o-A,
§1°, da Lei n. 12.037/09, incluído pela Lei n. 12.654/12, segundo o qual as informações
genéticas contidas nos bancos de dados de perfis genéticos não poderão revelar traços
somáticos ou comportamentais das pessoas, exceto determinação genética de gênero,
consoante as normas constitucionais e internacionais sobre direitos humanos, genoma
humano e dados genéticos. Dado o caráter invasivo inerente à identificação do perfil
genético, não se pode admitir sua utilização para outros fins. Louvável, portanto, a
vedação expressa às práticas de fenotipagem genética23 ou de busca familiar, pois assim
se poderá evitar um possível excesso de invasão no patrimônio genético das pessoas.
23 Marina Virmond, Anny Robert, Priscila Brito e Thiago Massuda esclarecem que "(...) o fenótipo pode ser
definido como as características morfológicas, fisiológicas e comportamentais detectáveis em um orga
nismo, como produto da composição genética do mesmo e da influência de fatores ambientais. Assim,
as proteínas que o genótipo codifica determinam, em conjunto com o ambiente, as CEV's (características
externamente visíveis) de um indivíduo (...)", acrescentando que, atualmente, "(...) as CEV's associadas à
pigmentação (cor dos olhos, da pele e do cabelo) são as melhores representantes da aplicação prática da
fenotipagem forense pelo DNA (...)". (Fenotipagem forense pelo DNA através de SNP's. Revista Brasileira de
Criminalística, v. 5, n. 2, p. 37, 2016. Disponível em: file:///C:/Users/Marcos/Downloads/Fenotipagem_foren-
se_pelo_DNA_atraves_de_SNPs.pdf. Acesso em: 28.04.2021 às 22:35.
Cap. II • CLASSIFICAÇÃO DO CONDENADO E DO INTERNADO 65
24 Em sentido diverso, Alencar e Távora (Curso de Direito Processual Penal. 8a ed. Salvador: Editora Juspodivm,
2013. p. 124) sustentam que, diante do princípio da vedação à autoincriminação, havendo recursa do
capturado ou indiciado em fornecer material biológico para obtenção de seu perfil genético, não se pode
obrigá-lo ao fornecimento. Em sentido semelhante: ALVES, Reinaldo Rossano. Direito processual penal. 8a
ed. Niterói/RJ: Editora Impetus, 2013, p. 34; MIRANDA, Rafael de Souza. Manual de Execução Penal: teoria e
prática. 2a ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2020. p. 37.
25 Nesse contexto: AVENA, Norberto. Execução penal esquematizado. 2a ed. São Paulo: Método, 2015. p. 29.
Para Nucci (Op. cit. p. 28), essa modalidade de identificação é apenas uma espécie de identificação criminal,
não constituindo, por si só, constrangimento ilegal ou afronta a qualquer direito individual.
68 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
26 Para Nucci (op. cit. p. 416), a colheita de material biológico para a obtenção do perfil genético não produz
nenhuma invasão à intimidade ou à vida privada, nem tampouco a qualquer direito ou garantia na área
processual penal, pois se volta à correta identificação individual, algo que não se encontra abrangido por
qualquer direito vinculado à defesa do acusado. Segundo Emílio de Oliveira e Silva (op. cit. p. 62), apesar
de não haver definição legal sobre o método de extração do material biológico, a análise do DNA contido
na saliva ou nos cabelos pode ser utilizada no Brasil, uma vez que são consideradas técnicas indolores
que atendem ao disposto no art. 9°-A da LEP, inserido pela Lei n° 12.654/12.
27 STF, Pleno, HC 71.373/RS, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 10/11/1994, DJ 22/11/1996.
28 De se lembrar que, no caso envolvendo a cantora mexicana G.T., mesmo contra a vontade da parturiente,
o Supremo considerou válida a coleta da placenta para que fosse possível a realização de exame de DNA,
já que se tratava de objeto expelido do corpo humano como consequência natural do parto: STF, Pleno,
Rcl-QO 2.040/DF, Rei. Min. Néri da Silveira, DJ 27/06/2003, p. 31.
29 Op. cit. p. 36.
III
ASSISTÊNCIA AO PRESO
1. NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
2. ASSISTÊNCIA MATERIAL
2 GIAMBERARDINO, André Ribeiro. Comentários à Lei de Execução Penal. 3a ed. Belo Horizonte: CEI, 2021. p.
60.
3 STJ, 2a Turma, REsp 1.537.530-SP, Rei. Min. Herman Benjamin, j. 27.04.2017, DJe 27.02.2020.
72 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
sobretudo das pessoas que estão custodiadas longe de seus familiares, tendo acesso,
portanto, apenas à alimentação, roupas e itens de higiene fornecidos pelo Estado.
3. ASSISTÊNCIA À SAÚDE
4 Para mais detalhes acerca da prisão domiciliar, remetemos o leitor ao capítulo atinente à execução da
pena privativa de liberdade.
Cap. III • ASSISTÊNCIA AO PRESO 73
4. ASSISTÊNCIA JURÍDICA
5 STJ, 5a Turma, HC 31.011-SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 23.03.2004, DJ 31.05.2004. Nesse sentido, tratando,
porém, de presas cautelares: STF, 2a Turma, HC 143.641-SP, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 20.02.2018.
6 Na visão do STF, a Defensoria Pública pode prestar assistência jurídica às pessoas jurídicas que preencham
os requisitos constitucionais. De fato, existe a possibilidade de que pessoas jurídicas sejam hipossuficientes.
As expressões "insuficiência de recursos" e "necessitados", previstas, respectiva mente, nos arts. 5o, LXXIV, e
74 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
134, ambos da Constituição Federal, podem aplicar-se tanto às pessoas físicas quanto às pessoas jurídicas.
Nesse contexto: STF, Pleno, ADI 4.636/DF, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 3.11.2021.
7 GIAMBERARDINO. Op. cit. p. 69.
8 STJ, 5a Turma, HC 332.895/SC, Rei. Min. Felix Fischer, j. 20.10.2016, DJe 03.11.2016.
9 LC n. 80/94: "Art. 4°-A. São direitos dos assistidos da Defensoria Pública, além daqueles previstos na le
gislação estadual ou em atos normativos internos: (...) IV - o patrocínio de seus direitos e interesses pelo
natural".
10 STF, Pleno, ADI 4.163/SP, Rei. Min. Cezar Peluso, j. 29/02/2012.
Cap. III • ASSISTÊNCIA AO PRESO 75
11 STF, Pleno, ADI 3.892/SC, ADI 4.270/SC, Rei. Min. Joaquim Barbosa, j. 14/03/2012.
12 Há dispositivos similares na Lei Orgânica da Defensoria Pública (Lei Complementar n. 80/94), como, por
exemplo, o art. 4o, §11, que prevê que os estabelecimentos penais "reservarão instalações adequadas ao
atendimento jurídico dos presos e internos por parte dos Defensores Públicos, bem como a esses forne
cerão apoio administrativo, prestarão as informações solicitadas e assegurarão acesso à documentação
dos presos e internos, aos quais é assegurado o direito de entrevista com os Defensores Públicos".
13 É nesse sentido, aliás, o teor da Tese de Repercussão Geral fixada no tema n. 1.074: "É inconstitucional
a exigência de inscrição do Defensor Público nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil". Paradigma:
STF, Pleno, RE 1,240.999/SP, Rei. Min. Alexandre de Moraes, j. 03.11.2021.
76 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
soria Pública da União, do Distrito Federal, e prescreve normas gerais para sua
organização nos Estados. Tome-se, como exemplo, o art. 4o, inciso XVII, do referido
diploma normativo, incluído pela LC n. 132/09, que elenca, dentre outras funções
institucionais da Defensoria Pública, a de “atuar nos estabelecimentos policiais,
penitenciários e de internação de adolescentes, visando assegurar às pessoas, sob
quaisquer circunstâncias, o exercício pleno de seus direitos e garantias fundamentais”.
Sem embargo de opiniões em sentido contrário, parece-nos que a Constituição
Federal e a Lei de Execução Penal outorgam à Defensoria Pública a prestação de
assistência jurídica apenas em favor de presos e internados sem recursos financeiros
para constituir advogado. Isso porque, ao cuidar de suas atribuições, o art. 134 da
Constituição Federal dispõe expressamente que à Defensoria Pública incumbe a
orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art.
5o, LXXIV, o qual faz menção à assistência jurídica integral e gratuita tão somente
aos que comprovarem insuficiência de recursos. Na mesma linha, seja no art. 15,
seja no art. 16, a Lei de Execução Penal é categórica ao afirmar que a assistência
jurídica, prestada pela Defensoria Pública, deve ser destinada aos presos e aos in
ternados sem recursos financeiros para constituir advogado. Logo, considerando-se
que a ampla defesa é um direito de todos os presos, sem exceção (LEP, art. 41, VII),
se determinado preso possuir condições financeiras, sua defesa técnica no curso
da execução penal deverá ser patrocinada por advogado por ele constituído. Em
tal hipótese, não se afigura possível a nomeação de Defensor Público para prestar
assistência jurídica, sob pena de desvirtuamento de suas atribuições constitucionais,
e consequente desvio dos parcos recursos humanos do órgão em prol de pessoas
abastadas, negando àqueles realmente necessitados o direito constitucional à assis
tência jurídica integral e gratuita. Em sentido diverso, todavia, há quem entenda que
a Defensoria Pública pode peticionar e atuar não apenas em favor de presos sem
recursos financeiros para constituir advogado, mas inclusive em prol de reclusos
com advogado constituído, sendo no interesse e de vontade do preso, na qualidade
de órgão da execução penal (LEP, arts. 81-A e 81-B), e na condição não de repre
sentante da parte, mas sim como custos vulnerabilis ou custos libertatis, em nome
próprio, como já vem reconhecendo o Judiciário, com base no art. 81-A da LEP,
similarmente à hipótese prevista no art. 554, §1°, do CPC.14
5. ASSISTÊNCIA EDUCACIONAL
15 Incluído pela Lei n. 13.163, de 2015, o art. 21-A da LEP passou a prever a realização de um censo pe
nitenciário, que deverá apurar: I - o nível de escolaridade dos presos e das presas; II - a existência de
cursos nos níveis fundamental e médio e o número de presos e presas atendidos; III - a implementação
de cursos profissionais em nível de iniciação ou aperfeiçoamento técnico e o número de presos e presas
atendidos; IV - a existência de bibliotecas e as condições de seu acervo; V - outros dados relevantes para
o aprimoramento educacional de presos e presas.
78 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
6. ASSISTÊNCIA SOCIAL
16 A possibilidade de remição em virtude da leitura e resenha de livros será objeto de análise detalhada no
capítulo atinente à execução da pena privativa de liberdade.
17 Publicado em 2018 pela Secretaria Nacional de Assistência Social, especial atenção deve ser dispensada
ao documento denominado "Atenção às famílias das mulheres grávidas, lactantes e com filhos até 12 anos
incompletos ou com deficiência privadas de liberdade". Cuida-se de um conjunto de orientações para exe
cução da Resolução n. 2/2017, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, recomendando
que no momento da prisão em flagrante de mulheres com filhos seja feito o encaminhamento de uma
cópia do auto de prisão ou boletim de ocorrência ao Centro de Referência de Assistência Social (CRAS)
mais próximo da residência da pessoa custodiada, com a indicação do responsável pelo cuidado de seus
filhos, para análise de vulnerabilidade e oferta de serviços pela Proteção Social Básica.
Cap. III • ASSISTÊNCIA AO PRESO 79
para obter uma renda lícita. De modo a consolidar o processo de reinserção social,
impedindo, ademais, que toda essa ansiedade e medo acabem por conduzir o as
sistido novamente à vida criminosa, incumbe à assistência social promover a sua
orientação na fase final do cumprimento da pena, sobretudo buscando manter ou
melhorar as relações entre ele e sua família;
VI - providenciar a obtenção de documentos, dos benefícios da Previdência
Social e do seguro por acidente no trabalho: não é de todo incomum que presos
não possuam qualquer documentação ao serem colocados em liberdade, capazes de
habilitá-los à prática de atos da vida civil ou mesmo à obtenção de emprego (v.g.,
cédula de identidade, carteira de trabalho, título de eleitor etc.). O serviço social
poderá, então, auxiliá-lo na obtenção desses documentos, devendo, ademais, promover
ou dar andamento a pedidos de benefícios da previdência social e do seguro por
acidente de trabalho de que, eventualmente, o condenado ou sua família possa dispor;
VII - orientar e amparar, quando necessário, a família do preso, do inter
nado e da vítima: por mais que a Constituição Federal estabeleça que a pena não
deverá passar da pessoa do condenado (art. 5o, XLV), é inegável que a família do
preso (ou do internado) também sofre as consequências secundárias da execução
da pena em virtude da ausência do principal responsável pelo encargo de mantê-la
(v.g., pai, mãe, marido, esposa). Logo, de modo a auxiliar os familiares do preso
(ou do internado), por exemplo, a conseguir emprego, quando se mudam de cidade
para acompanhar, de perto, a execução da pena de um de seus integrantes, recai
sobre o serviço de assistência social a tarefa de lhes prestar orientação e acompa
nhamento, que, aliás, também deve ser estendido a família da vítima, notadamente
nas hipóteses de morte do ente querido.
7. ASSISTÊNCIA RELIGIOSA
A assistência religiosa, todavia, não pode ser usada de modo a obrigar o recluso
a praticar determinada religião. Como preveem as Regras de Mandela, “o direito
de entrar em contato com um representante qualificado da sua religião nunca deve
ser negado a qualquer recluso. Por outro lado, se um recluso se opõe à visita de um
representante de uma religião, a sua vontade deve ser plenamente respeitada” (Regra
n. 65.1). De fato, a Constituição Federal garante a plena liberdade de consciência
(art. 5o, VI), não sendo possível privar-se qualquer pessoa de seus direitos por
motivos de crença religiosa (art. 5o, VIII). Por conseguinte, diante da liberdade de
culto, nenhum preso (ou internado) poderá ser obrigado a participar de atividade
religiosa (LEP, art. 24, §2°).
8. ASSISTÊNCIA AO EGRESSO
1. NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
1 GIAMBERARDINO, André Ribeiro. Comentários à Lei de Execução Penal. 3a ed. Belo Horizonte: CEI, 2021. p.
82.
84 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
na medida de suas aptidões e capacidades (art. 31), sendo sua execução um dever
do apenado (art. 39, V). Mais adiante, classifica como falta grave do condenado à
pena privativa de liberdade a inobservância do dever de execução do trabalho (art.
50, VI), havendo previsão semelhante em relação àquele condenado à pena restritiva
de direitos (art. 51, III). De todo modo, na perspectiva que define o trabalho como
elemento do tratamento penitenciário, decisivo, portanto, para sua ressocialização,
será atividade não aflitiva, remunerada e obrigatória.
O fato de ser obrigatório, porém, não equivale a dizer que o trabalho é forçado.
Isso porque o condenado não poderá ser constrangido a trabalhar caso se recuse
a fazê-lo, porém tal conduta implicará cometimento de falta grave, sujeitando-o
às respectivas sanções disciplinares. À luz do art. 5o, XLVII, “c”, da Constituição
Federal, o trabalho forçado constitucionalmente proibido é aquele não remunerado
e obtido do preso com o uso de castigos físicos.2
À luz do princípio da não aflitividade, constante do art. 56, I, da Resolução
n. 14 do CNPCP, que acolhe as orientações da ONU e define as regras mínimas
para o tratamento do preso no Brasil (Regras de Mandela), há de se diferenciar,
portanto, o trabalho como elemento do tratamento dispensado ao preso, e o trabalho
como forma de pena, este sim aflitivo por definição e expressamente vedado pela
Constituição Federal (art. 5o, XLVII, “c”). Nesse sentido, como já se manifestou o
STJ, “(...) a pena de trabalho forçado, vedada no art. 5o, XLVIIII, “c”, da CF, não
se confunde com o dever de trabalho imposto ao apenado, ante o disposto no art.
6o, 3, da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa
Rica), segundo o qual os trabalhos ou serviços normalmente exigidos de pessoa
reclusa em cumprimento de sentença ou resolução formal expedida pela autoridade
judiciária competente não constituem trabalhos forçados ou obrigatórios vedados
pela Convenção”.3
De acordo com o art. 28, caput, da LEP, o trabalho do condenado, como dever
social e condição da dignidade humana, terá 2 (duas) finalidades: a) educativa: a
ideia nesse caso é manter em atividade o preso que já trabalhava, ou criar o hábito
de trabalhar naquele que não exercia qualquer atividade lícita antes de ser preso,
o que, pelo menos em tese, permitirá que aprenda um ofício ao qual poderá dar
continuidade quando for posto em liberdade; b) produtiva: sem embargo das limi
tadas possibilidades do trabalho penitenciário, a aquisição de um ofício ou de uma
profissão, fator decisivo à reincorporação social do preso, certamente contribuirá
para facilitar-lhe a estabilidade econômica assim que retomar sua liberdade.4
Dada a necessidade de se equiparar, dentro dos limites possíveis, o trabalho
penitenciário àquele mantido por uma pessoa em liberdade, devem ser asseguradas
ao preso as mesmas exigências do ponto de vista de higiene (v.g., limpeza, aeração)
e das prescrições preventivas de segurança (v.g., equipamentos de proteção individu
al). Daí dispor o art. 28, §1°, da LEP, que se aplicam à organização e aos métodos
2 MASSON, Cleber. Direito penal: parte geral (arts. 1o a 120). 14a ed. São Paulo: Método, 2020. p. 554.
3 STJ, 6a Turma, HC 264.989/SP, Rei. Min. Ericson Maranho, j. 04.08.2015.
4 AVENA. Op. cit. p. 48
Cap. IV • TRABALHO DO PRESO 85
5 No sentido de que a ação em que o apenado pretende o pagamento de indenização por danos morais
e materiais decorrentes de acidente do trabalho ocorrido no interior das instalações do estabelecimento
prisional onde cumpre pena não pode ser processada e julgada perante a Justiça obreira, tendo em vista
que não se trata, na espécie, de relação de emprego, porquanto o trabalho do apenado não está sujeito
às regras contidas a CLT, mas na Lei de Execução Penal: STJ, Ia Seção, CC 99.490-SP, Rei. Min. Benedito
Gonçalves, j. 25.03.2009, DJe 06.04.2009; STJ, 1a Seção, CC 66.974-PR, Rei. Min. Luiz Fux, j. 13.06.2007, DJ
13.08.2007.
6 STJ, 3a Seção, CC 92.851-MS, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 13.08.2008, DJe 19.09.2008. No sentido de que o
trabalho desempenhado pelo apenado não possui natureza de relação de trabalho capaz de suscitar a
competência da justiça trabalhista (art. 114 da CF): STJ, 1a Turma, REsp 1.124.152-DF, Rei. Min. Arnaldo
Esteves Lima, j. 09.11.2010, DJe 22.11.2010.
86 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
da doutrina sustenta ser aplicável o disposto no art. 28, §2°, da LEP. Outros, no
entanto, entendem que referido dispositivo não pode servir de óbice ao reconheci
mento da relação de emprego entre as partes quando se trata de trabalho externo
prestado por condenado em regime semiaberto em condições semelhantes àquele
prestado por um trabalhador livre, sob pena de odiosa e indevida violação ao prin
cípio da isonomia. Por fim, é firme o entendimento doutrinário e jurisprudencial
que o trabalho externo prestado por condenado em regime aberto não configura o
trabalho prisional previsto na Lei de Execução Penal, daí por que eventual relação
empregatícia obrigatoriamente deverá se sujeitar ao regime da CLT.
3. REMUNERAÇÃO
Por razões éticas, o art. 29, caput, da LEP, dispõe que o trabalho do preso será
remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a % (três quartos)
do salário mínimo. Impossível, portanto, a utilização de mão de obra carcerária
gratuita. Cuida-se, porém, de patamar mínimo, e não máximo. Ou seja, a vedação à
remuneração inferior a % (três quartos) do salário mínimo deve ser compreendida
como um piso mínimo do qual se deve partir, e não de um limite máximo.7
À legislação local incumbe determinar os parâmetros para a fixação da re
muneração do preso (ou do internado) e poderá ser efetuada por hora trabalhada
ou por tarefa executada, a depender da natureza do serviço e da conveniência da
terapêutica exigida, sempre respeitando-se os limites estabelecidos na Lei de Exe
cução Penal, inclusive quanto à duração da jornada de trabalho. Como destaca a
própria Exposição de Motivos da LEP (item n. 53), o dispositivo em questão visa
evitar que o Estado se utilize das aptidões profissionais dos presos em trabalhos
gratuitos.
Tendo em vista a possibilidade de desempenho de atividade remunerada na
prisão ou fora dela, a depender do regime prisional do cumprimento da pena,
com o recebimento da respectiva remuneração, é correto afirmar, então, que o
fato de o devedor de alimentos estar recolhido à prisão pela prática de crime
não tem o condão de afastar sua obrigação alimentar. O dever dos genitores em
assistir materialmente seus filhos é previsto constitucionalmente (arts. 227 e 229),
bem como na legislação infraconstitucional (CC, art. 1.634; ECA, art. 22). Logo, a
mera condição de presidiário não pode funcionar como um alvará para exonerar
o devedor da obrigação alimentar, especialmente em virtude da independência
das instâncias cível e criminal. Indispensável identificar, portanto, se o preso
possui bens, valores em conta bancária ou se é beneficiário do auxílio-reclusão,
benefício previdenciário previsto no art. 201 da Constituição Federal, destinado
aos dependentes dos segurados de baixa renda presos, o que, em tese, pode ser
aferido com o encaminhamento de ofícios a cartórios, à unidade prisional e ao
próprio INSS.8
9 ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução penal: teoria crítica. 5a ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021.
p. 134. Com entendimento semelhante: GIAMBERARDINO. Op. cit. p. 85.
10 STF, Pleno, ADPF 336/DF, Rei. Min. Luiz Fux, j. 27.2.2021.
88 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
4. TRABALHO INTERNO
no interior dos presídios, tornou-se comum Brasil afora que presos passassem a
trabalhar na montagem de objetos decorativos de ínfimo valor. Por se tratar de
tarefa que pouco irá contribuir para o seu aprimoramento profissional, dificultando,
assim, futura reinserção do preso no mercado de trabalho quando for colocado em
liberdade, e diante da necessidade de se agregar qualificação profissional enquanto
o indivíduo está custodiado, há uma proibição relativa para esse trabalho artesa-
nal, que, todavia, poderá ser permitido se acaso dotado de expressão econômica
em regiões de turismo, assim como quando não for possível a execução de outra
espécie de trabalho naquele estabelecimento prisional, hipótese em que fará jus
à devida remição.12
12 STJ, 5a Turma, AgRg no REsp 1.720.785-RO, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 03.05.2018, DJe 11.05.2018; STJ, 6a
Turma, AgRg no HC 515.431-RS, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 19.09.2019, DJe 01.10.2019.
13 Em sentido diverso, há quem entenda que as novas figuras delituosas introduzidas no Código Penal pela
Lei n. 14.197/21 não podem ser rotuladas como crimes políticos. Nesse sentido: SILVARES, Ricardo; CUNHA,
Rogério. Crimes contra o Estado Democrático de Direito: Lei n. 14.197, de 2 de setembro de 2021. São Paulo:
Editora Juspodivm, 2021. p. 182-183.
92 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
5. TRABALHO EXTERNO
15 Em virtude do art. 193, II, da nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, a Lei n. 8.666/93 será
revogada após decorridos 2 (dois) anos da publicação oficial da Lei n. 14.133, o que se deu em data de
1o de abril de 2021.
16 MIRABETE. Op. cit. p. 98.
Cap. IV • TRABALHO DO PRESO 95
apenas o trabalho dos presos que se encontrem no regime semiaberto. O art. 36,
caput, da LEP, agora em sua parte final, dispõe expressamente que a execução
de trabalho externo por presos do regime fechado em serviço ou obras públicas
só poderá ser autorizada pela direção do estabelecimento se tomadas as cautelas
contra a fuga e em favor da disciplina, entendendo-se, este último trecho, como
a necessidade de escolta policial, o que invariavelmente acaba inviabilizando o
benefício, ainda que eventualmente autorizado pelo Diretor da Unidade prisio
nal. Nessa linha, como já se pronunciou o STJ, “(...) sobressai a impossibilidade
prática de concessão da medida, se evidenciado que não há como se designar
um policial, diariamente, para acompanhar e vigiar o preso durante a realização
dos serviços extramuros”.17 Dadas as dificuldades para a obtenção de escola, há
quem entenda possível que a autorização para o trabalho externo seja deferida
mediante colocação de tornozeleira eletrônica, eis que também se trata de dis
positivo destinado a evitar possível fuga, como exige o art. 36, caput, in fine,
da LEP.18 Evidentemente, na hipótese de trabalho externo, caberá ao órgão da
administração, à entidade ou à empresa privada (v.g., empreiteira) a remune
ração do preso (LEP, art. 36, §2°). Outrossim, diversamente do que ocorre em
relação ao trabalho interno, o trabalho externo do preso prestado à entidade
privada depende de seu consentimento expresso (LEP, art. 36, §3°). Ainda que
se trate de serviço ou obra pública, não haverá vínculo empregatício entre o
condenado e a Administração ou empresa privada que executa tais obras, já que
as normas que disciplinam o trabalho prisional são regidas pelo Direito Público
e não estão sujeitas à Consolidação das Leis do Trabalho (LEP, art. 28, §2°). Na
verdade, a possibilidade de celebração de um contrato de trabalho sob a égide
da CLT é viável apenas para o condenado que se encontra em regime aberto
(e semiaberto, para parte da doutrina). De acordo com o art. 36, §1°, da LEP,
o limite máximo do número de presos será de 10% (dez por cento) do total de
empregados da obra. Justifica-se a ressalva em questão não apenas para se ter
condições mais adequadas de controle e vigilância sobre os presos do regime
fechado, mas também de modo a permitir melhor integração com trabalhadores
livres, algo que certamente não ocorrería se 100% (cem por cento) dos empre
gados da obra fossem presos;
b. Presos do regime semiaberto: o trabalho externo também é admissível em
relação àquele que cumpre pena no regime semiaberto, como previsto, aliás, no art.
35, §2°, do Código Penal. Diversamente do que ocorre em relação aos presos do re
gime fechado, no caso do semiaberto o trabalho externo não necessariamente precisa
ser prestado em serviço ou obras públicas, ou seja, pode ser executado em serviços,
em obras públicas ou em entidades privadas. Ademais, não há qualquer referência
17 STJ, 5a Turma, HC 44.369-DF, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 13.09.2005, DJ 03.10.2005. Com entendimento se
melhante: STJ, 6a Turma, AgRg no REsp 1,695.783-RO, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 08.02.2018, DJe
19.02.2018; STJ, 5a Turma, HC 324.829-PA, Rei. Min. Gurgel de Faria, j. 01.10.2015, DJe 19.10.2015. No sentido
de que é inviável a concessão do trabalho externo quando o Estado não dispuser de escolta policial a fim
de assegurar as cautelas necessárias contra a fuga e em favor da disciplina: STJ, 5a Turma, HC 41.940/DF,
Rei. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 24/05/2005, DJ 01/08/2005 p. 496.
18 GIAMBERARDINO. Op. cit. p. 91.
96 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
tenha mais subsídios para formar seu convencimento. Aplica-se, in casu, o mesmo
raciocínio constante do teor súmula vinculante n. 2625 e da súmula n. 439 do STJ;26
b. Pressuposto objetivo: o deferimento do trabalho externo também depende
do preenchimento de requisito de natureza objetiva. A propósito, dispõe o art. 37,
caput, in fine, da LEP, que a prestação de trabalho externo, a ser autorizada pela
direção do estabelecimento, dependerá de aptidão, disciplina e responsabilidade,
além do cumprimento mínimo de 1/6 da pena. A observância desse pressuposto,
todavia, deve ser analisada separadamente, conforme o regime de cumprimento
da pena:
b.l. Regime fechado: nesse caso, é necessário o implemento do lapso mínimo
de 1/6 (um sexto) da pena, consoante disposto no art. 37 da LEP;
b.2. Regime semiaberto: sempre houve controvérsias acerca da necessidade
de observância desse tempo mínimo de pena cumprida para o deferimento do
benefício em relação ao condenado do regime semiaberto. De modo a resolver a
polêmica, foi aprovado o enunciado da súmula n. 40 do STJ, nos seguintes termos:
“Para obtenção dos benefícios de saída temporária e trabalho externo, considera-
-se o tempo de cumprimento da pena no regime fechado”. Ao fazer referência
ao condenado que ingressou no sistema carcerário no regime fechado, tendo,
posteriormente, progredido ao semiaberto, tal verbete estabelece que, para fins de
obtenção do benefício do trabalho externo, considera-se o tempo de cumprimento
da pena no regime fechado. Sugere, pois, a necessidade de observância do lapso
temporal de 1/6 (um sexto) da pena e a possibilidade de se considerar, para im
plementação desse tempo, o período de pena cumprido no regime fechado. Ocorre
que essa orientação jurisprudencial consolidada na súmula n. 40 não corresponde
ao entendimento atual do Superior Tribunal de Justiça. Deveras, atualmente, o
referido Tribunal Superior defende a tese de que, seja para o preso que ingressou
no regime semiaberto em virtude de progressão, seja para aquele que já iniciou o
cumprimento da pena nesse regime, não há necessidade de cumprimento míni
mo de 1/6 (um sexto) da pena para a concessão do trabalho externo, conquanto
estejam preenchidos os requisitos de natureza subjetiva relacionados ao mérito
do condenado.27 Na verdade, esse montante de 1/6 (um sexto) refere-se apenas ao
trabalho externo quando em regime fechado.
25 Súmula vinculante n. 26: "Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime he
diondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2o da Lei n. 8.072,
de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos
e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame
criminológico".
26 Súmula n. 439 do STJ: "Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em
decisão motivada".
27 No sentido de que o trabalho externo é admissível aos condenados ao regime semiaberto, independen
temente do cumprimento de 1/6 (um sexto) da pena: STJ, 5a Turma, HC 184.291/RS, Rei. Min. Gilson Dipp,
j. 26/04/2011, DJe 16/05/2011; STJ, 5a Turma, HC 98.849/SC, Rei. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 05/05/2009,
DJe 15/06/2009.
Cap. IV • TRABALHO DO PRESO 99
28 STJ, 5a Turma, HC 180.780-RJ, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 28.06.2011, DJe 01.08.2011.
29 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 580.495/SC, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 09/06/2020, DJe 17/06/2020.
100 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
30 STJ, 6a Turma, HC 575.495/MG, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 02/06/2020, DJe 08/06/2020.
31 Com entendimento semelhante: MIRABETE. Op. cit. p. 103; AVENA. Op. cit. p. 58.
32 STJ, 6a Turma, HC 35.004/DF, Rei. Min. Paulo Medina, j. 24/02/2005, DJ 18/04/2005. Na mesma linha: STJ,
6a Turma, HC 45.392/DF, Rei. Min. Hamilton Carvalhido, j. 09/03/2006, DJ 03/04/2006.
33 Súmula n. 526 do STJ: “O reconhecimento de falta grave decorrente do cometimento de fato definido
como crime doloso no cumprimento da pena prescinde do trânsito em julgado de sentença penal con
denatória no processo penal instaurado para apuração do fato"
Cap. IV • TRABALHO DO PRESO 101
ato de indisciplina, salvo, obviamente, se se tratar de crime doloso, eis que, nesse
caso, o trabalho externo será revogado com base na hipótese anterior;
c. Comportamento contrário aos requisitos estabelecidos neste artigo: como
exposto anteriormente, para que o apenado faça jus ao trabalho externo deverá de
monstrar aptidão, disciplina e responsabilidade. Por consequência, eventuais atos de
indisciplina ou de irresponsabilidade, quer no exercício da sua atividade laborativa,
quer no âmbito do cárcere, também deverão dar ensejo à revogação do benefício.
Tome-se como exemplo a hipótese em que o apenado se aproveita da autorização do
trabalho externo para comparecer a locais diversos, ou quando apresenta sucessivos
atrasos no retorno ao presídio após o fim do expediente de trabalho.
A competência para determinar a revogação do trabalho externo recai sobre a
mesma autoridade que concedeu o benefício. Logo, tendo em vista a competência
revogatória implícita da Administração Pública, recai sobre o diretor do presídio a
atribuição de revogar o trabalho externo, se acaso presente uma das hipóteses aci
ma detalhadas. Logicamente, para aqueles que sustentam que a competência para
deferir o benefício seria exclusiva do Juízo da Execução, caberia igualmente a ele
revogar o trabalho externo.
V
DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA
1. DEVERES DO PRESO
2. DIREITOS DO PRESO
1 Nessa linha: STF, 2a Turma, HC 91.386/BA, Rei. Min. Gilmar Mendes, DJe 088 15/05/2008.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 107
“b”, e LXXII, “a” e “b”); integridade física e moral (CF, art. 5o, XLIX); assistência
judiciária (CF, art. 5o, LXXIV); e indenização pelo erro judiciário (CF, art. 5o, LXXV).
Noutro giro, a título de exemplos de direitos assegurados pela legislação in-
fraconstitucional, especial atenção deve ser dispensada aos seguintes: alimentação,
vestuário e instalações higiênicas (LEP, art. 12); trabalho remunerado (LEP, art. 41,
II); assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa (LEP, art. 41,
VII); proteção contra qualquer forma de sensacionalismo (LEP, art. 41, VIII); uso do
nome (LEP, art. 41, XI); audiência especial com o diretor do estabelecimento (LEP,
art. 41, XIII); atestado de pena a cumprir, emitido anualmente (LEP, art. 41, XVI).
Em conclusão, figuram como exemplos de direitos que podem ser atingidos ou
sofrer restrições em virtude da condenação: liberdade de locomoção, sobretudo no
caso de condenação à pena privativa de liberdade; naturalização (CF, art. 12, II, “b”);
direitos políticos (CF, art. 15, III); propriedade dos bens adquiridos com o proveito
do crime (CP, art. 91, II, “b”); exercício de cargo, função ou emprego público (CF,
art. 92, I; Lei n. 7.716-89, art. 16; Lei n. 9.455-97, art. Io, §5°; Lei n. 9.613-98, art.
7o, II); exercício de mandato eletivo (CP, art. 92, I); exercício do poder familiar,
tutela ou curatela (CP, art. 92, II); direção de veículo automotor (CP, art. 92, III).
2 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil: interpretada e legislação constitucional. 5a ed. São Paulo: Atlas,
2005. 338.
3 STJ, 6a Turma, HC 142.513/ES, Rei. Min. Nilson Naves, j. 23/03/2010, DJe 10/05/2010.
108 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
4 STJ, 5a Turma, REsp 856.706/AC, Rei. Min. Felix Fischer, j. 06/05/2010, DJe 28/06/2010.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 109
8 STF, HC 91.952/SP, Tribunal Pleno, Rei. Min. Marco Aurélio, DJe 241 18/12/2008.
9 Na visão da 1a Turma do STF (Rcl. 7.116/PE, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 24/05/2016), a apresentação de
custodiado algemado à imprensa pelas autoridades policiais não afronta a súmula vinculante n° 11.
10 STF, 2a Turma, HC 152.720/DF, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 10/04/2018.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 111
nada impede que essa justificativa seja lavrada quando da chegada do indivíduo à
delegacia de polícia.11
Quando aprovado pelo Congresso Nacional, o art. 17 do Projeto de Lei n. 7.596/17
(n. 85/17 no Senado Federal), que deu origem à nova Lei de Abuso de Autoridade
(Lei n. 13.869/19), tinha a seguinte redação: “Art. 17. Submeter o preso, internado
ou apreendido ao uso de algemas ou de qualquer outro objeto que lhe restrinja o
movimento dos membros, quando manifestamente não houver resistência à prisão,
internação ou apreensão, ameaça de fuga ou risco à integridade física do próprio
preso, internado ou apreendido, da autoridade ou de terceiro: Pena - detenção, de 6
(seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. Parágrafo único. A pena é aplicada em dobro
se: I - o internado tem menos de 18 (dezoito) anos de idade; II - a presa, interna
da ou apreendida estiver grávida no momento da prisão, internação ou apreensão,
com gravidez demonstrada por evidência ou informação; III - o fato ocorrer em
penitenciária.” Ocorre que o dispositivo foi vetado pelo Presidente da República
nos seguintes termos: “A propositura legislativa, ao tratar de forma genérica sobre
a matéria, gera insegurança jurídica por encerrar tipo penal aberto e que comporta
interpretação. Ademais, há ofensa ao princípio da intervenção mínima, para o qual
o Direito Penal só deve ser aplicado quando estritamente necessário, além do fato
de que o uso de algemas já se encontra devidamente tratado pelo Supremo Tribunal
Federal, nos termos da Súmula Vinculante n° 11, que estabelece parâmetros e a
eventual responsabilização do agente público que o descumprir.” À semelhança do
que ocorreu com os arts. 11, 14, 20, inciso II, 26, 29, parágrafo único, 34 e 35, este
veto ao art. 17 não foi rejeitado pelo Congresso Nacional. Sem embargo, a depender
do caso concreto, é perfeitamente possível a tipificação dos crimes dos incisos I e II
do art. 13,12 desde que presentes as respectivas elementares, e conquanto presente
o elemento subjetivo especial do art. Io, §1°, da nova Lei de Abuso de Autoridade.
11 Nesse sentido: STJ - HC 138.349/MG - 6a Turma - Rei. Min. Celso Limongi - Desembargador convocado
do TJ/SP - Dje 07/12/2009.
12 Lei n. 13.869/19: "Art. 13. Constranger o preso ou o detento, mediante violência, grave ameaça ou redução
de sua capacidade de resistência, a: I - exibir-se ou ter seu corpo ou parte dele exibido à curiosidade
pública; II - submeter-se a situação vexatória ou a constrangimento não autorizado em lei; (...)".
112 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
13 Segundo a doutrina - FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina legal. 10a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
2015. P. 687 - compreende-se por puerpério o período de tempo compreendido entre o desprendimento
da placenta até o retorno do organismo materno às condições anteriores à gestação. Puerpério imediato,
por sua vez, compreende esse estado do Io ao 10° dia após o parto.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 113
danos materiais e imateriais, nos termos do art. 63.1 da CADH, a quantia de US$
146.000,00, além do pagamento de todas as despesas que estes tenham realizado
nos processos na Justiça Brasileira e no exterior. Determinou, ainda, no prazo de
um ano, que o Brasil apresentasse à Corte um relatório sobre as medidas adotadas
para o seu cumprimento.
cães ou animais farejadores, ainda que treinados para esse fim; d) agachamentos
ou saltos. De acordo com o CNPCP, a revista pessoal deve ser feita por meio
de equipamentos eletrônicos e estão vedadas quaisquer formas de revista que
atentem contra a integridade física e psicológica dos visitantes. Também merece
ser lembrada a Lei n. 13.271/16, cujo art. Io dispõe que as empresas privadas, os
órgãos e entidades da administração pública, direta e indireta, ficam proibidos
de adotar qualquer prática de revista íntima de suas funcionárias e de clientes
do sexo feminino.15 Portanto, havendo suspeita de transporte de drogas, e, de
modo a se evitar a extrema invasividade no corpo da suspeita, podem ser rea
lizadas medidas alternativas, tais como impedir sua entrada, acompanhar seus
movimentos no interior do cárcere, limitar o direito de visitação, mas jamais
submetê-la ao constrangimento de uma revista íntima, sob pena de ilicitude das
provas assim obtidas. Como sugere a doutrina,16 em fiel observância ao princípio
da intranscendência mínima, a revista (sobretudo íntima) não deve ser realizada
no visitante, mas na própria pessoa presa, em seu retorno da visitação para a
galeria ou cela;
b) Possibilidade de realização de revista íntima em estabelecimentos pri
sionais como medida de ultima ratio (nossa posição): pelo menos em regra, a
revista pessoal deve ser realizada por inspeção visual e por detector de metal
ou outro equipamento próprio para detecção de materiais ilícitos. Todavia, em
caso de visitante suspeito de portar material ilícito ou de mulheres em período
menstruai, admite-se a realização de revista íntima, a qual pode ser recusada
pelo visitante, situação em que será ele proibido de ingressar no estabelecimento
prisional. Admite-se a realização de revista íntima com base em uma ponderação
de interesses, já que existe uma necessidade de que seja controlada a entrada de
produtos proibidos nos presídios - armas, bebidas, drogas, celulares, etc. -, de
forma que, por questão de segurança pública e em nome da segurança prisional,
estaria autorizada a medida, desde que, obviamente, fossem tomadas as cautelas
devidas, tais como, por exemplo, a impossibilidade de se adotar qualquer proce
dimento invasivo, a realização de revista em mulheres por agentes públicos do
sexo feminino em sala reservada, a vedação a qualquer forma de contato físico
com a profissional responsável pela revista, etc. Cuida-se, tal procedimento,
quando realizado com estrita observância a procedimento legal e com respeito
aos princípios e às garantias constitucionais, de legítimo exercício do poder de
polícia do Estado, de cunho preventivo, o qual objetiva garantir a segurança
social e os interesses públicos, daí por que não há falar em ilicitude de eventuais
objetos apreendidos com o visitante. Vejamos um caso concreto: uma mulher,
15 Quando aprovado pelo Congresso Nacional, o art. 3o da Lei n. 13.271/16 tinha a seguinte redação: "Nos
casos previstos em lei, para revistas em ambientes prisionais e sob investigação policial, a revista será
unicamente realizada por funcionários servidores femininos". Ocorre que este dispositivo foi vetado pelo
Presidente da República, nos seguintes termos: "A redação do dispositivo possibilitaria interpretação no
sentido de ser permitida a revista íntima nos estabelecimentos prisionais. Além disso, permitiría interpre
tação de que quaisquer revistas seriam realizadas unicamente por servidores femininos, tanto em pessoas
do sexo masculino, quanto feminino".
16 ROIG. Op. cit. p. 58.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 115
17 STJ, 6a Turma, REsp 1.523.735/RS, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 20/02/2018, DJe 26/02/2018. É firme a
jurisprudência do STJ no sentido de que não viola o princípio da dignidade da pessoa humana a revista
íntima realizada conforme as normas administrativas que disciplinam a atividade fiscalizatória, quando
houver fundada suspeita de que o visitante esteja transportando drogas ou outros itens proibidos para
o interior do estabelecimento prisional. Nessa linha: STJ, 5a Turma, HC 460.234/SC, Rei. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, j. 11/09/2018, DJe 20/09/2018; STJ, 5a Turma, AgRg no REsp 1.687.496/RS, Rei. Min.
Jorge Mussi, j. 20/03/2018, DJe 27/03/2018; STJ, 6a Turma, AgRg no REsp 1,696.487/RS, Rei. Min. Nefi
Cordeiro, j. 13/03/2018, DJe 26/03/2018; STJ, 5a Turma, AgRg no REsp 1.652.864/RS, Rei. Min. Jorge Mussi,
DJe 21/06/2017, STJ, 5a Turma, HC 328.843/SP, Rei. Min. Felix Fischer, DJe 09/11/2015; STJ, 5a Turma, HC
238.973/SP, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 16/08/2012, DJe 05/09/2012.
18 STJ, 6a Turma, REsp 1.695.349/RS, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 08/10/2019, DJe 14/10/2019.
116 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
à medida de segurança, no que couber, o disposto naquela Seção, que versa sobre
os direitos do preso.
2.2.3.1. Auxílio-reclusão
Cuida-se de benefício previdenciário devido aos dependentes de segurado
recolhido à prisão em regime fechado, desde que o segregado não esteja recebendo
remuneração da empresa, aposentadoria de qualquer espécie, pensão por morte,
salário maternidade, abono de permanência em serviço (benefício extinto) ou auxílio-
-doença, nos termos do art. 80 da Lei n. 8.213/91, modificado pela Lei n. 13.846/19.19
O auxílio-reclusão será pago apenas nas condenações impostas sob regime
fechado, não sendo devido o benefício na hipótese de regime aberto, na forma do
art. 116, §5°, do RPS, haja vista a determinação do detento trabalhar fora do esta
belecimento prisional, conforme o art. 36 do Código Penal, apenas sendo recolhido
no período noturno e nos dias de folga. Outrossim, por força da MP n. 871/19,
convertida na Lei n. 13.846/19, regramento que deve ser aplicado às prisões a contar
de 18 de janeiro de 2019, o regime prisional semiaberto não mais enseja a concessão
do auxílio-reclusão. Por sua vez, o cumprimento de pena em prisão domiciliar não
impede o recebimento do benefício de auxílio-reclusão pelo dependente, se o regi
me previsto for o fechado, assim como a monitoração eletrônica do instituidor do
benefício de auxílio-reclusão não interfere no direito do dependente ao recebimento
do benefício, uma vez que tem a função de fiscalizar o preso, desde que mantida
a prisão domiciliar. Apesar da omissão regulamentar, será cabível o benefício nos
casos de prisão cautelar (temporária e preventiva), pois o segurado de baixa renda
não poderá exercer atividade laborativa para sustentar os seus dependentes, tendo
essas prisões equivalência ao regime fechado.
Com a entrada em vigor da Emenda Constitucional n. 20/98, houve uma
restrição da proteção social do auxílio-reclusão, passando a ser exigido que o segu
rado preso seja enquadrado como baixa renda, conforme nova redação conferida
ao inciso IV do art. 201 da CF. Na visão do STF, a renda do segurado preso é a
que deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício, e não a de
seus dependentes.20
19 AMADO, Frederico. Manual de Direito Previdenciário. Salvador: Editora Juspodivm, 2021. p. 740.
20 STF, Pleno, RE 587.365-SC, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 25.03.2009, DJ 08.05.2009.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 119
marcados para registrar tudo. Tais imagens, depois, são exploradas à exaustão nos
telej ornais, o que é feito supostamente a título de informar a população. Daí, aliás,
o surgimento da expressão Perp walk - em inglês, desfile do acusado -, termo que
se refere à prática policial de expor, intencionalmente, o acusado preso de forma
sensacionalista em local público, de modo que a mídia possa observar, gravar e
divulgar o evento. O suspeito geralmente é algemado ou imobilizado de alguma
forma, e, muitas vezes, traja uniforme de presidiário.
Não olvidamos a importância da liberdade de expressão, compreendida como
a possibilidade de difundir livremente os pensamentos, idéias e opiniões, mediante
a palavra escrita ou qualquer outro meio de reprodução. No entanto, se aos órgãos
de informação é assegurada a maior liberdade possível em sua atuação, também se
lhes impõe o dever de não violar princípios basilares do processo penal, substituindo
o devido processo legal previsto na Constituição por um julgamento sem processo,
paralelo e informal, mediante os meios de comunicação. Oportuna, nesse sentido, a
lição do Min. Marco Aurélio: “(•••) Ninguém desconhece a necessidade de adoção
de rigor no campo da definição de responsabilidade, mormente quando em jogo
interesses públicos da maior envergadura. No levantamento de dados, no acompa
nhamento dos fatos, no esclarecimento da população, importante é o papel exercido
pela imprensa. Todavia, há de se fazer presente advertência de Joaquim Falcão,
veiculada sob o título A imprensa e a justiça, no Jornal O Globo, de 06.06.93: 'Ser
o que não se é, é errado. Imprensa não é justiça. Esta relação é um remendo. Um
desvio institucional. Jornal não é fórum. Repórter não é juiz. Nem editor é desembar
gador. E quando, por acaso, acreditam ser, transformam a dignidade da informação
na arrogância da autoridade que não têm. Não raramente, hoje, alguns jornais, ao
divulgarem a denúncia alheia, acusam sem apurar. Processam sem ouvir. Colocam
o réu, sem defesa, na prisão da opinião pública. Enfim, condenam sem julgar'.”22
Especificamente em relação à divulgação da imagem de pessoas presas, o que
se vê no dia a dia é uma crescente degradação da imagem e da honra produzida
pelos meios de comunicação de massa com a conivência das autoridades estatais,
por meio da reprodução da imagem do preso sem que haja prévia autorização do
preso, nem tampouco um fim social na sua exibição. Utilizam sua imagem, pois,
como produto da notícia, a fim de saciar a curiosidade do povo. Os programas
sensacionalistas do rádio e da televisão saciam curiosidades perversas extraindo sua
matéria-prima da miséria de cidadãos humildes que aparecem algemados e exibidos
como verdadeiros troféus.23
Queremos crer, com base na lição de Ana Lúcia Menezes Vieira,24 que a repro
dução pública da imagem de pessoas envolvidas em crimes deve ser vedada se ela
resulta de modo antissocial, aflitivo ou degradante, a não ser que haja autorização
do titular da imagem, ou se necessária à administração da justiça - exemplo seria
o retrato falado ou a própria fotografia, para fins investigativos.
Ora, como dito acima, a condição de cidadão preso não lhe retira o direito ao
respeito à integridade moral e à dignidade.25 Seus direitos personalíssimos devem
ser tutelados de forma mais eficaz, não só por jornalistas, como também por auto
ridades policiais e membros do Ministério Público, que devem se abster de exibir
presos à mídia. E isso não só para preservar os direitos personalíssimos do preso,
como também para evitar que inocentes sejam identificados indevidamente como
autores de delitos.
Infelizmente, não são poucos os exemplos de pessoas que são exibidas à mídia
como suspeitas da prática de delitos, mas cuja inocência é posteriormente reconhe
cida. O célebre episódio da “Escola Base” é um dos mais emblemáticos casos de
assassinato moral de inocentes, na dicção de Vieira. Os responsáveis pela referida
escola foram dados pela mídia como autores de abusos sexuais contra crianças de
classe média. A escola foi alvo de depredação, seus proprietários tiveram que aban
donar os empregos, e também não podiam sair às ruas, porque corriam o risco de
sofrer agressões em público, na medida em que a imprensa divulgava suas fotos. O
inquérito policial, no entanto, acabou sendo arquivado por falta de elementos de
informação que evidenciassem a prática dos crimes sexuais.
Outro caso recente é o denominado crime do Bar Bodega: em uma choperia em
Moema, bairro nobre na cidade de São Paulo, dois jovens da classe média paulistana
foram assassinados no dia 10 de agosto de 1996. Pressionada pela comoção social
que o delito gerou, a polícia apresentou cinco jovens negros e pobres, moradores da
periferia, como os responsáveis pelos homicídios. Como anota Eduardo Araújo Silva,
“expostos à imprensa como animais bravios, algemados e com placas dependuradas
em seus corpos, indicando números, foram fotografados, filmados e entrevistados
por dezenas de repórteres de rádio, tevês, jornais e revistas”.26 Pouco tempo depois,
porém, foram postos em liberdade, pois o Ministério Público não encontrou elementos
de informações suficientes para oferecer denúncia. Na verdade, foram identificados
indicativos de que teriam confessado a prática do delito mediante tortura.
Pelo menos até a entrada em vigor do Pacote Anticrime (Lei n. 13.964/19), a
legislação brasileira ainda se mostrava muito tímida em regulamentar explicitamente
a publicidade das investigações, dos atos judiciais e da própria execução penal, de
modo a preservar os direitos personalíssimos do preso (CF, art. 5o, incisos X e XLIX).
A título de exemplo, já era possível encontrar alguma normatização do assunto
através de Portarias e Regulamentos dos próprios órgãos policiais. Nesse sentido, o
art. 11 da Portaria n° 18 da Delegacia Geral de Polícia do Estado de São Paulo dispõe
que as autoridades policiais devem zelar pela preservação dos direitos à imagem, ao
nome, à privacidade e à intimidade das pessoas submetidas à investigação policial,
detidas em razão da prática de infração penal ou a sua disposição na condição de
vítimas, a fim de que a elas e a seus familiares não sejam causados prejuízos irrepará
veis, decorrentes da exposição de imagem ou de divulgação liminar de circunstância
25 SUANNES, Adauto. Os fundamentos éticos do devido processo penal. 2a ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2004. p. 181.
26 SILVA, Eduardo Araújo. O papel da imprensa no caso do Bar Bodega. Isto é, 4 dez. 1996, p. 151. Apud VIEIRA,
Ana Lúcia Menezes. Processo penal e mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p. 169.
122 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
objeto de apuração. Após orientadas sobre seus direitos constitucionais, tais pessoas
somente serão fotografadas, entrevistadas ou terão suas imagens por qualquer meio
registradas, se expressamente o consentirem mediante manifestação explícita de
vontade, por escrito ou por termo devidamente assinado.27
Por sua vez, o art. 198 da LEP prevê que é defesa ao integrante dos órgãos da
execução penal, e ao servidor, a divulgação de ocorrência que perturbe a segurança
e a disciplina dos estabelecimentos, bem como exponha o preso à inconveniente
notoriedade, durante o cumprimento da pena. Considerando-se, pois, que a imagem
do indivíduo submetido ao cumprimento de uma pena privativa de liberdade já é
naturalmente atingida em virtude da condenação e do seu recolhimento à prisão,
não há necessidade de sensacionalismos infundados acerca da sua pessoa, algo que
certamente contribuirá para marginalizar o apenado ainda mais.28
Com a entrada em vigor da Lei n. 13.964/19, passou a constar do CPP dispo
sitivo expresso acerca do assunto, senão vejamos: “Art. 3°-F. O juiz das garantias
deverá assegurar o cumprimento das regras para o tratamento dos presos, impedindo
o acordo ou ajuste de qualquer autoridade com órgãos da imprensa para explorar a
imagem da pessoa submetida à prisão, sob pena de responsabilidade civil, adminis
trativa e penal. Parágrafo único. Por meio de regulamento, as autoridades deverão
disciplinar, em 180 (cento e oitenta) dias, o modo pelo qual as informações sobre a
realização da prisão e a identidade do preso, serão, de modo padronizado e respeitada
a programação normativa aludida no caput deste artigo, transmitidas à imprensa,
assegurados a efetividade da persecução penal, o direito à informação e a dignida
de da pessoa submetida à prisão”. É dentro desse mesmo contexto que devemos
compreender os tipos penais dos incisos I e II do art. 13 da nova Lei de Abuso de
Autoridade (Lei n. 13.869/19): “Art. 13. Constranger o preso ou o detento, mediante
violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade de resistência, a: I - exibir-se
ou ter seu corpo ou parte dele exibido à curiosidade pública; II - submeter-se a
situação vexatória ou a constrangimento não autorizado em lei; (...)”. Ambos têm
como objetivo precípuo evitar que presos (ou detentos) continuem a ser exibidos à
curiosidade pública, sem qualquer finalidade social na sua exibição, ou que sejam
submetidos a situações vexatórias ou a constrangimentos não autorizados em lei.
da OAB, que prevê como direito do advogado “comunicar-se com seus clientes,
pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração, quando estes se achem presos,
detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados
incomunicáveis”29 (Lei n. 8.906/94, art. 7o, III).
Por ocasião da realização da entrevista com seu cliente preso, o advogado poderá
lhe mostrar peças impressas do processo, como, por exemplo, laudos periciais, de
poimentos de testemunhas, denúncias etc. Justifica-se, porém, a restrição ao ingresso
de notebooks e outros dispositivos eletrônicos em unidades prisionais pelo risco de
ofensa à segregação prisional. Logo, se a defesa técnica teve pleno acesso aos autos
do processo penal, anexos e mídias eletrônicas, a negativa de ingresso de notebook
na unidade prisional para que o custodiado visualizasse as peças eletrônicas não
configura violação do princípio da ampla defesa.30
Diante do teor do art. 7o, III, da Lei n. 8.906/94, o qual destaca que esse direito
de comunicação pessoal e reservada do advogado com seu cliente poderá ser exercido
mesmo sem procuração, é de rigor a conclusão no sentido de que é dispensável que
o defensor, para manter entrevista com o preso, já seja seu procurador constituído
ou designado, até mesmo porque o preso poderá decidir-se durante a comunicação
pessoal por constituí-lo.
A comunicação em questão deve ser pessoal e reservada. Pessoal denota que é
o próprio preso, em pessoa, que deve estar ali, diante do advogado. Reservadamen
te, por sua vez, diz respeito ao fato de que essa comunicação não pode ocorrer na
presença de mais ninguém além do preso e de seu defensor, ou seja, ninguém mais
pode ter acesso à referida comunicação, preservando-se, assim, o sigilo inerente ao
exercício da advocacia, daí por que deve se destinar um lugar apropriado e digno
no estabelecimento penitenciário para essa comunicação pessoal. Pelo menos em
regra,31 a comunicação deve ser feita sem qualquer tipo de monitoramento, seja
por outras pessoas, seja por quaisquer equipamentos capazes de registrar em áudio
ou vídeo a conversa. Logicamente, o direito em questão não autoriza o advogado
a falar com seu cliente preso a qualquer momento do dia. Devemos observar a
reserva do possível, daí por que devem ocorrer nos horários e dias determinados
pelo estabelecimento prisional.
Na visão dos Tribunais Superiores, regulamentos e portarias locais que preveem o
prévio agendamento das visitas, mediante requerimento à Direção do estabelecimento
prisional, violam o direito do advogado de comunicar-se com cliente recolhido a
29 Esta incomunicabilidade a que se refere a parte final do inciso III do art. 7° da Lei n. 8.906/94 consta do art.
21 do CPP, tido como não recepcionado pela Constituição Federal. A uma porque a Constituição Federal
assegura que toda prisão será comunicada imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à
pessoa por ele indicada (art. 5o, LXII) e que o preso terá direito à assistência da família e de advogado (art.
5o, LXIII). A duas porque, ao tratar do Estado de Defesa, onde há supressão de várias garantias constitucio
nais, a própria Constituição Federal estabelece que é vedada a incomunicabilidade do preso (art. 136, §
3o, IV). Ora, se numa situação de exceção como o Estado de Defesa não se admite a incomunicabilidade,
o que dizer, então, em um estado de normalidade?
30 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 631.960-SP, Rei. Min. João Otávio de Noronha, j. 23.11.2021, DJe 26.11.2021.
31 Quanto à possibilidade excepcional de monitoramento da conversa do preso com seu advogado, reme
temos o leitor aos comentários acerca do regime disciplinar diferenciado.
124 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
32 STJ, 2a Turma, RESp 673.851-MT, Rei. Min. Eliana Calmon, j. 08.11.2005, DJ 21.11.2005; STJ, 2a Turma, REsp
1,028.847-SP, Rei. Min. Herman Benjamin, j. 12.05.2009, DJe 21.08.2009.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 125
33 STJ, 6a Turma, AgRg no AREsp 1.650.427-DF, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 30.06.2020, DJe 06.08.2020. No
mesmo contexto: STJ, 6a Turma, AgRg no AREsp 1.227.471-DF, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j.
15.03.2018, DJe 27.03.2018. No sentido de que o fato de o visitante estar em livramento condicional, por
si só, também não pode impedir o acesso ao sistema prisional para visitação: STJ, 5a Turma, AgRg no REsp
1.475.961-DF, Rei. Min. Leopoldo de Arruda Raposo - Desembargador convocado doTJ-PE -, j. 1°.10.2015,
DJe 13.10.2015.
34 STF, 2a Turma, HC 107.701-RS, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 13.09.2011, DJe 61 23.03.2012.
35 A discussão em torno da possibilidade de revista íntima em presídios foi objeto de análise no tópico
atinente ao respeito à integridade física e moral do preso, para onde remetemos o leitor.
126 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
36 Uma experiência democrática na administração penitenciária, RT 657/386-390. Apud: MIRABETE. Op. cit. p.
121.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 127
O preso tem direito a ser chamado por seu próprio nome, sendo proibidas outras
formas de tratamento ou designação, como, por exemplo, números, alcunhas etc. O
direito previsto no art. 41, inciso XI, da LEP, visa preservar a dignidade do preso, por
quanto não há nada mais vexatório e humilhante do que ser tratado como um objeto
dotado de um rótulo, e não como um ser humano.
41 Para Avena (Op. cit. p. 71), não é lícito ao preso ingressar em causa própria (salvo se for advogado, logi
camente) com mandado de segurança e revisão criminal, pois tais providências exigem a subscrição por
quem detenha o jus postulandi.
130 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
e b) através de visitas (Regra n. 58). Também dispõem que os reclusos devem ser
mantidos regularmente informados das notícias mais importantes através da leitura
de jornais, publicações periódicas ou institucionais especiais, através de transmis
sões de rádio, conferências ou quaisquer outros meios semelhantes, autorizados ou
controlados pela administração prisional (Regra n. 63).
Nos estabelecimentos prisionais, a comunicação telefônica não pode ser livre
mente exercida pelo preso, configurando falta grave a posse de aparelho telefônico, de
rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente
externo (LEP, art. 50, VII, incluído pela Lei n. 11.466/07). Considerando, ademais,
a crescente utilização de aparelhos telefônicos pelos presos, principalmente para a
manutenção de suas atividades criminosas no meio externo, a lei também passou a
prever que os estabelecimentos penitenciários devem ser equipados, obrigatoriamente,
com bloqueadores de telecomunicação para telefones celulares, radiotransmissores
e outros meios de comunicação (Lei n. 10.792/03, art. 4o), sendo criminalizadas
as condutas do funcionário que se omite em seu dever de fiscalização de evitar o
acesso do preso a tais aparelhos (CP, art. 319-A, incluído pela Lei n. 11.466/07) e
de quem ingressa, promove ou facilita a sua entrada nos estabelecimentos prisionais
(CP, art. 349-A, incluído pela Lei n. 12.012/09).
42 STF, Tribunal Pleno, MS 23.452/RJ, Rei. Min. Celso de Mello, j. 16/09/1999, DJ 12/05/2000.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 131
art. 66, X). Justifica-se a existência desse direito em virtude da necessidade de se for
necer ao preso, pelo menos uma vez por ano, um atestado com a indicação exata do
saldo de pena a cumprir. Ora, nem sempre o cálculo da pena se resume a uma simples
operação aritmética capaz de revelar ao preso o total já cumprido e o quanto ainda há
pela frente, já que alguns benefícios podem acarretar a diminuição do quantum final
de pena a cumprir (v.g., remição), enquanto outras situações podem alterar o saldo
final (v.g, unificação de penas).
De acordo com o art. 12 da Resolução n. 113, de 20 de abril de 2010, do Conselho
Nacional de Justiça, a emissão de atestado de pena a cumprir a a respectiva entrega ao
apenado, mediante recibo, deverão ocorrer: I - no prazo de sessenta dias, a contar da
data do início da execução da pena privativa de liberdade; II - no prazo de sessenta
dias, a contar da data do reinicio do cumprimento da pena privativa de liberdade; e III
- para o apenado que já esteja cumprindo pena privativa de liberdade, até o último dia
do mês de janeiro de cada ano. Deverão constar do atestado anual de cumprimento de
pena, dentre outras informações consideradas relevantes, as seguintes: a) o montante
da pena privativa de liberdade; b) o regime prisional de cumprimento da pena; c) a
data do início do cumprimento da pena e a data, em tese, do término do cumprimen
to integral da pena; e d) a data a partir da qual o apenado, em tese, poderá postular a
progressão do regime prisional e o livramento condicional (Resolução n. 113/10 do
CNJ, art. 13).
47 MIRABETE. Op. cit. p. 127; AVENA. Op. cit. p. 74. Em sentido diverso, Nucci (Op. cit. p. 219) sustenta que
"tais ações da direção devem ter por base a aplicação de sanção disciplinar".
134 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
com seu genitor, situação que perdura há mais de sete anos. Está caracterizado o
excesso de prazo da medida, que deveria subsistir por prazo razoável à implemen
tação de sua finalidade, porquanto até mesmo nos casos de homologação de faltas
graves (fuga, subversão da disciplina etc.) ou de condenações definitivas existe, nos
regimentos penitenciários ou no art. 94 do CP, a possibilidade de reabilitação. Toda
pena deve atender ao caráter de temporariedade. Recurso em mandado de segurança
provido a fim de restabelecer o direito de o recorrente receber visitas de seu genitor,
sem prejuízo de novo cancelamento do registro do visitante, por prazo razoável,
se houver reiteração de condutas ofensivas à segurança das unidades prisionais”.48
3. DISCIPLINA
48 STJ, 6a Turma, RMS 48.818-SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 26.11.2019, DJe 29.11.2019.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 135
Apesar de o art. 45, caput, da LEP, dispor que não haverá falta nem sanção
disciplinar sem previsão legal ou regulamentar, a própria lei federal define as faltas
disciplinares graves e as sanções aplicáveis (arts. 50 a 52), deixando à lei local a
previsão das faltas médias e leves, bem como as respectivas sanções (art. 49). De
se notar, portanto, que não se pode instituir pelos regulamentos dos presídios
qualquer outra falta disciplinar, senão de natureza leve ou média, nem tampouco
criar outras sanções disciplinares além daquelas previstas na Lei de Execução Pe
nal e nas leis locais. Não por outro motivo, em caso concreto de condenado no
regime semiaberto que teria se ausentado momentaneamente da comarca onde
deveria permanecer, sendo, por tal motivo, punido por uma suposta falta grave,
concluiu o STJ: “(...) se a conduta praticada pelo agente não está prevista na Lei
de Execução Penal, não pode ele ser punido por prática de falta disciplinar grave,
sob pena de afronta ao princípio da legalidade. O executado é advogado e exerce
essa função, pelo que sua ida a outra comarca, para atender a um detento, não
configura falta grave. (...)”.50
50 STJ, 6a Turma, HC 141.127/SP, Rei. Min. Celso Limongi - Desembargador convocado doTJ/SP -, j. 04.02.2010,
DJe 26.04.2010.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 137
55 CP: "Art. 352. Evadir-se ou tentar evadir-se o preso ou o indivíduo submetido a medida de segurança de
tentiva, usando de violência contra a pessoa: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, além da
pena correspondente à violência".
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 139
56 Em sentido diverso, Renato Marcão (Curso de Execução Penal. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 72) sustenta que,
tentada ou consumada, a conduta ensejadora de falta disciplinar grave, caberá a mesma sanção, sem
qualquer abrandamento.
140 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
De acordo com o art. 48, parágrafo único, da LEP, “nas faltas graves, a autori
dade representará ao Juiz da Execução para os fins dos arts. 118, inciso I, 125, 127,
181, §§1°, letra d, e 2o desta Lei”. Conquanto inserido como parágrafo no dispositivo
que cuida do poder disciplinar no curso das penas restritivas de direitos, o preceito
em questão faz referência a dispositivos atinentes à prática de falta grave por quem
cumpre pena privativa de liberdade. Com efeito, à exceção do art. 181, §§1° e 2o,
que dizem respeito à reconversão da pena restritiva de direitos em pena privativa
de liberdade, os demais dispositivos citados guardam relação com o cumprimento
de pena privativa de liberdade: o art. 118, I, trata da regressão de regime quando o
condenado praticar fato definido como crime doloso ou falta grave; o art. 125 trata
da revogação da saída temporária; e o art. 127 determina que o juiz poderá revo
gar até 1/3 (um terço) do tempo remido em caso de falta grave. Topograficamente,
portanto, o legislador deveria ter inserido a parágrafo único do art. 48 como uma
regra autônoma. Sem embargo, essa representação por falta grave ali prevista pode
ser interpretada nos seguintes termos:57
a. Condenado no cumprimento de pena privativa de liberdade: no exercício
de seu poder disciplinar, a autoridade administrativa poderá impor as sanções de
suspensão ou restrição de direitos, e isolamento na própria cela, como consequência
decorrente da prática de falta disciplinar de natureza grave, já que a advertência e a
repreensão são punições reservadas a faltas leves e médias, ao passo que a inclusão
no regime disciplinar diferenciado depende de autorização judicial prévia. A despeito
de a administração da casa possuir poder disciplinar para aplicar sanções ao preso
(LEP, art. 47), caberá a ela, diante da prática de falta grave, representar ao Juízo da
Execução Penal com vista à revogação de benefícios (LEP, art. 48, parágrafo único).
É o que ocorre, por exemplo, no caso da regressão de regime (art. 118, I), perda
do direito à saída temporária (art. 125) e perda de até 1/3 (um terço) do tempo
remido (art. 127);
b. Condenado no cumprimento de pena restritiva de direitos: tratando-se
de faltas médias e leves, o poder disciplinar será exercido pela autoridade admi
nistrativa a que estiver sujeito o condenado, nos termos do art. 48, caput, da LEP.
Tome-se como exemplo a limitação de final de semana, que impõe ao condenado
a obrigação de permanecer, aos sábados e domingos, por cinco horas diárias, em
casa de albergado ou lugar adequado. Em tal hipótese, cometida falta disciplinar leve
ou média, caberá à autoridade administrativa do respectivo local aplicar a devida
punição. Na hipótese de falta grave - descumprimento injustificado da restrição
imposta, retardamento injustificado do cumprimento da obrigação imposta ou
inobservância dos deveres previstos nos incisos II e V do art. 39 (LEP, art. 51, I, II
e III) -, porém, caberá à administração carcerária representar ao Juízo da Execução
para fins de reconversão da restritiva em pena privativa de liberdade, nos termos
do art. 181, §§1°, “d”, e 2o, ao qual também deve ser acrescentado o §3°, que diz
respeito à interdição temporária de direitos, estranhamento omitido da remissão
do art. 48, parágrafo único.
58 As faltas disciplinares de natureza leve e média serão objeto de análise mais adiante.
59 STJ, 6a Turma, HC 481.699-RS, Rei. Min. Sebastião Reis Júnoir, j. 12.03.2019, DJe 19.03.2019; STJ, 6a Turma,
REsp 1.519.802-SP, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 10.11.2016, DJe 24.11.2016; STJ, 6a Turma, HC
284.829-SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 30.06.2015, DJe 03.08.2015.
60 STJ, 6a Turma, HC 108.616-SP, Rei. Min. Jane Silva - Desembargadora convocada do TJ-MG j. 06.02.2009,
DJe 02.03.2009.
142 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
Como exposto anteriormente, o rol de faltas graves não está restrito aos
incisos do art. 50 da LEP. Isso porque, consoante disposto no art. 52 da LEP, a
prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando oca
sione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeitará o preso provisório,
ou condenado, nacional ou estrangeiro, sem prejuízo da sanção penal, ao regi
me disciplinar diferenciado. Como se pode notar, configura falta grave, tanto
para os condenados que cumprem pena privativa de liberdade, como, em regra,
àqueles submetidos às penas restritivas de direitos, a prática de fato previsto
como crime doloso.
O legislador não faz qualquer distinção quanto à espécie de crime doloso, se
punido com pena de reclusão ou detenção, conceito dentro do qual estão inseridos os
crimes preterdolosos, que, em última análise, são também dolosos quanto à conduta
antecedente. A prática de crime culposo não caracteriza falta grave, o que não afasta
a possibilidade de a legislação local tipificá-lo como falta média ou leve. O mesmo
ocorre em relação às contravenções penais, salvo se o fato não constituir, de per si,
falta disciplinar grave, como ocorre, a título de ilustração, com aquele que possui,
indevidamente, instrumento capaz de ofender a integridade física de outrem (Lei
das Contravenções Penais, art. 19).
Firmada a premissa de que a prática de fato previsto como crime doloso cons
titui falta grave, é correto afirmar que a posse de drogas no curso da execução penal,
ainda que para uso próprio, constitui falta grave.61 Isso porque o Supremo Tribunal
Federal reconheceu que a Lei n. 11.343/06 não promoveu a descriminalização de tal
conduta, que continua ostentando a natureza jurídica de “crime”.62 É dizer, o fato
de o art. Io da Lei de Introdução ao Código Penal estabelecer um critério que per
mite distinguir quando se está diante de um crime ou de contravenção não impede
que o legislador ordinário adote outros critérios gerais de distinção, ou até mesmo
estabeleça para determinado crime, como o fez para o art. 28 da Lei de Drogas,
pena diversa da privativa de liberdade, a qual é apenas uma das opões constitucio
nais passíveis de adoção pela lei incriminadora (CF, art. 5o, XLVI). Nesse caso, é
imprescindível a confecção de laudo toxicológico para comprovar a materialidade
da infração disciplinar e a natureza da substância encontrada com o apenado no
interior de estabelecimento prisional.63
61 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 547.354/DF, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 06.02.2020, Dje 13.02.2020;
STJ, 6a Turma, AgRg no HC 547.553/DF, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 17.12.2019, DJe 19.12.2019; STJ,
6a Turma, AgRg no HC 528.947/DF, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 26.11.2019, DJe 29.11.2019; STJ, 6a
Turma, AgRg no HC 525.107/SP, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 01.10.2019, DJe 08.10.2019.
62 STF, Ia Turma, RE 430.105 QO/RJ, Rei. Min. Sepúlveda Pertence, j. 13.02.2007, DJ 27.04.2007.
63 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 547.354-Df, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 06.02.2020, Dje 13.02.2020;
STJ, 5a Turma, AgRg no HC 448.115-SP, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 23.04.2019, DJe 07.05.2019; STJ, 6a Turma,
HC 406.154-MG, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 28.11.2017, DJe 04.12.2017; STJ, 6a Turma, AgRg
no HC 394.873-MG, Rei. Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. 21.09.2017, DJe 04.10.2017.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 143
fixada no tema n. 655).64 Com conclusão semelhante, eis o teor da Tese de Reper
cussão Geral fixada no tema n. 758: “O reconhecimento de falta grave consistente
na prática de fato definido como crime doloso no curso da execução penal dispensa
o trânsito em julgado da condenação criminal no juízo do conhecimento, desde
que a apuração do ilícito disciplinar ocorra com observância do devido processo
legal, do contraditório e da ampla defesa, podendo a instrução em sede executiva
ser suprida por sentença criminal condenatória que verse sobre a materialidade, a
autoria e as circunstâncias do crime correspondente à falta grave”.65
Mas o que fazer se o condenado vier a ser absolvido em ulterior processo cri
minal contra ele instaurado em virtude da prática desse fato previsto como crime
doloso que deu ensejo ao reconhecimento da falta grave? Referida decisão também
faria coisa julgada no âmbito administrativo? O raciocínio, nesse caso, é bem seme
lhante àquele trabalhado em relação à ação civil ex delicto, em que se entende que
eventual absolvição criminal deverá fazer coisa julgada no cível, conquanto tenha
sido reconhecida categoricamente a inexistência material do fato ou a negativa de
autoria. É possível afirmar, então, que a decisão que reconhece a prática de falta
grave disciplinar deverá ser desconstituída diante das hipóteses de arquivamento de
inquérito policial ou de posterior absolvição na esfera penal, por inexistência do fato
ou negativa de autoria, tendo em vista a atipicidade da conduta.66
64 Paradigma: STJ, 3a Seção, REsp 1,336.561-RS, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 25.09.2013. Com raciocínio semelhante:
STJ, 6a Turma, HC 262.572-RS, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 12.11.2013, DJe 28.11.2013; STJ,
3a Seção, REsp 1.336.561-RS, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 25.09.2013, DJe 01.04.2014; STJ, 5a
Turma, HC 267.886-RS, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 15.08.2013, DJe 26.08.2013.
65 Paradigma: STF, Pleno, RE 776.823/RS, Rei. Min. Edson Fachin, j. 04.12.2020.
66 STJ, 5a Turma, HC 524.396-SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 15.10.2019, DJe 22.10.2019; STJ, 5a
Turma, HC 462.463-RS, Rei. Min. Felix Fischer, j. 13.12.2018, DJe 01.02.2019; STJ, 6a Turma, RHC 33.827-RJ,
Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 20.11.2014, Dje 12.12.2014.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 145
viabilizar a falta grave. A título de exemplo, basta imaginar que, tão logo encerrado
o horário do banho de sol, os presos se recusem a retornar às suas celas, causando
tumulto generalizado em prejuízo à ordem e à disciplina do ambiente carcerário.
Firmada a premissa de que a tentativa é punida com a sanção correspondente
à falta consumada (LEP, art. 49, parágrafo único), é certo afirmar que eventual ins
tigação será punível ainda que o movimento coletivo não seja levado adiante pelos
demais presidiários. Como o art. 50, inciso I, da LEP, faz menção, genericamente,
apenas a movimento para subverter a ordem ou a disciplina, revela-se desnecessário
o emprego de violência ou grave ameaça, a exemplo do que ocorre em movimentos
pacíficos de recusa ao trabalho, “greve de fome” etc.
Segundo a doutrina,67 pouco importa o fim visado pelo movimento, que pode
até ser considerado ‘justo’, como, por exemplo, o de pretender melhores condições de
trabalho, oportunidades de recreação etc., já que tais reivindicações devem ser feitas
pelos canais regulares de comunicação. Em conclusão, convém destacar que, desde
que preenchidas as respectivas elementares, é possível que a falta grave ora em análise
também configure o crime de motim de presos (CP, art. 354).68 Para a configuração do
delito, todavia, exige-se a presença de certo número de presos - pelo menos 3 (três)
pessoas -, aspecto que o diferencia da falta grave prevista no art. 50, I, da LEP, que
restará configurada até mesmo com o envolvimento de um único preso.
3.3.3. Fuga
Consoante disposto no art. 50, II, da LEP, comete falta grave o condenado à
pena privativa de liberdade que fugir. Para fins de caracterização do crime de eva
são mediante violência contra a pessoa, previsto no art. 352 do Código Penal, há
necessidade do uso de violência contra a pessoa. Em sentido diverso, a falta grave
prevista no art. 50, inciso II, da LEP, igualmente punível na modalidade tentada,
configura-se mesmo quando o preso não se utilizar da violência para deixar a prisão.
É indiferente, ademais, diante do silêncio da lei, qualquer espécie de dano ao
patrimônio ou favorecimento por parte de terceiros (v.g., outros presos ou policiais
penais). Como o dispositivo faz menção, genericamente, à fuga, sem especificar se
em tal momento o agente estaria (ou não) no interior do estabelecimento prisional,
prevalece o entendimento de que a falta grave restará caracterizada ainda quando
a fuga for realizada durante a permanência do condenado fora do estabelecimento,
a exemplo do que ocorre, por exemplo, nos casos de trabalho externo, saídas auto
rizadas, internação em estabelecimento médico69 etc.
70 STJ, 6a Turma, AgRg no HC 475.585-DF, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 07.11.2019, DJe 22.11.2019; STJ,
5a Turma, HC 476.948-DF, Rei. Min. Felix Fischer, j. 07.02.2019, DJe 19.02.2019; STJ, 6a Turma, AgRg no HC
460.890-SC, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 08.11.2018, DJe 22.11.2018.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 147
o externo, até mesmo porque a lei não faz nenhuma distinção entre eles para fins
de disciplina, porém não abrange o trabalho do preso albergado. Isso porque este
não é submetido à disciplina prisional, prevista na LEP, mas regido apenas pela
Consolidação das Leis do Trabalho. Logo, a provocação de acidente de trabalho
pelo albergado poderá, a depender do caso concreto, tipificar determinado delito
(v.g., dano), constituindo falta grave nos termos do art. 52, caput, Ia parte, da LEP.
Noutro giro, e mais uma vez diante do silêncio da lei, pouco importa se o
acidente de trabalho provocado pelo apenado produziu ou não dano ao patrimônio
do presídio ou a materiais empregados na confecção do trabalho, bem como da
provocação de ferimentos no próprio preso ou em terceiros.
71 No sentido de que a desobediência aos agentes penitenciários configura falta de natureza grave, a teor
da combinação entre os art. 50, VI, e art. 39, II e V, da Lei de Execução Penal: STJ, 5a Turma, AgRg no HC
550.207-SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 18.02.2020, DJe 28.02.2020; STJ, 5a Turma, AgRg no HC
516.423-SP, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 10.12.2019, DJe 17.12.2019; STJ, 5a Turma, AgRg no HC 510.452-SP,
Rei. Min. Jorge Mussi, j. 22.10.2019, DJe 08.11.2019.
148 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
72 Nesse sentido: STJ, 5aTurma, AgRg no HC 429.608-SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 17.04.2018, DJe 27.04.2018; STJ,
6a Turma, HC 264.989-SP, Rei. Min. Ericson Maranho - Desembargador convocado doTJ-SP -, j. 04.08.2015,
DJe 19.08.2015.
73 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 474.327-TO, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 12.03.2019, DJe 19.03.2019; STJ, 5a Turma,
HC 462.719-RS, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 09.10.2018, DJe 24.10.2018; STJ, 5a Turma, HC 438.756-RS,
Rei. Min. Felix Fischer, j. 05.06.2018, Dje 11.06.2018.
74 STJ, 6a Turma, AgRg no REsp 1.766.006-TO, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 06.12.2018, Dje 19.12.2018;
STJ, 6a Turma, HC 342.466-SP, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 02.06.2016, DJe 14.06.2016.
75 STJ, 5a Turma, HC 465.565-RS, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 25.09.2018, DJe 02.10.2018; STJ, 5a
Turma, HC 460.440-RS, Rei. Min. Felix Fischer, j. 18.09.2018, DJe 25.09.2018; STJ, 6a Turma, AgRg no AREsp
708.127-RO, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 28.03.2017, DJe 06.04.2017.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 149
76 STJ, 5a Turma, HC 260.122/RS, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 21.03.2013, DJe 02.04.2013; STJ, 5a Turma,
HC 226.745-RS, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 06.03.2012, DJe 19.03.2012; STJ, 5a Turma, HC 297.150-SP, Rei. Min.
Marco Aurélio Bellizze, j. 19.08.2014, DJe 27.08.2014.
77 Nesse contexto: STJ, 6a Turma, AgRg no HC 522.425-SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 10.09.2019, Dje 30.09.2019;
STJ, 6a Turma, AgRg no HC 438.835-SP, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 27.11.2018, DJe 07.12.2018.
150 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
78 Para a 5a Turma do STJ (HC 619.776-DF, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 20.04.2021), a conduta de ingressar em
estabelecimento prisional com chip de celular não se subsome ao tipo penal previsto no art. 349-A do
Código Penal. Na visão do referido colegiado, o legislador se limitou em punir - basicamente - o ingresso
ou o auxílio na introdução de aparelho telefônico móvel ou similar em estabelecimento prisional, não
fazendo referência a qualquer outro componente ou acessório utilizado para viabilizar o funcionamento
desses equipamentos. Portanto, em decorrência da principiologia básica do direito penal (legalidade), na
falta de lei prévia que defina o ingresso de chip em estabelecimento prisional como comportamento típico
(nullum crimen sine lege), impõe-se o reconhecimento da atipicidade da referida conduta.
79 STJ, 6a Turma, AgRg no HC 506.102-SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 05.12.2019, DJe 17.12.2019; STJ, 5a Turma,
AgRg no HC 501.489-SP, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 01.10.2019, DJe 10.10.2019; STJ, 5a Turma, AgRg no HC
447.961-SP, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 16.05.2019, DJe 23.05.2019.
80 No sentido de que, após a vigência da Lei n. 11.466, de 28 de março de 2007, constitui falta grave a posse
de aparelho celular ou de seus componentes, tendo em vista que a ratío essendi da norma é proibir a
comunicação entre os presos ou destes com o meio externo: STJ, 6a Turma, HC 278.584-SP, Rei. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, j. 07.11.2013, DJe 20.11.2013; STJ, 5a Turma, HC 230.659-SP, Rei. Min. Laurita Vaz,
j. 05.11.2013, DJe 19.11.2013; STJ, 5a Turma, HC 260.122-RS, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 21.03.2013,
DJe 02.04.2013.
81 STJ, 5a Turma, HC 155.372/SP, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 02/08/2012, DJe 15/08/2012. Com entendi
mento semelhante: STJ, 6a Turma, HC 236.090/SP, Rei. Min. Ericson Maranho - Desembargador convocado
do TJ/SP -, j. 24/03/2015, DJe 31/03/2015.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 151
isolamento na própria cela, e que tais sanções disciplinares são incompatíveis com
o condenado que cumpre pena restritiva de direitos, outra opção não haverá para
a autoridade administrativa senão representar ao Juízo da Execução com vista à re
conversão da pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade, nos termos
do art. 48, parágrafo único, da LEP.
84 Lei n. 8.112/90: "Art. 142. A ação disciplinar prescreverá: I - em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis
com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão; II - em
2 (dois) anos, quanto à suspensão; III - em 180 (cento e oitenta) dias, quanto à advertência. §1° O prazo
de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido. §2° Os prazos de prescrição
previstos na lei penal aplicam-se às infrações disciplinares capituladas também como crimes. §3° A aber
tura de sindicância ou a instauração de processo disciplinar interrompe a prescrição, até a decisão final
proferida pela autoridade competente. §4° Interrompido o curso da prescrição, o prazo começará a correr
a partir do dia em que cessar a interrupção.
85 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 687.570-SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 14.09.2021, DJe 20.09.2021.
No mesmo contexto: STJ, 6a Turma, AgRg no HC 654.281-SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 15.06.2021,
DJe 23.06.2021; STJ, 5a Turma, AgRg no HC 650.316-SC, Rei. Min. Felix Fischer, j. 18.05.2021, DJe 31.05.2021;
STJ, 5a Turma, AgRg nos EDcl no REsp 1.248.357-MS, Rei. Min. Regina Helena Costa, j. 19.11.2013, DJe
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 155
25.11.2013; STJ, 6a Turma, AgRg no REsp 1.414.267-MG, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 05.11.2013, DJe
25.11.2013.
86 No sentido de que normas penitenciárias não têm o condão de regular a perda do direito disciplinar, pois
compete privativamente à União legislar sobre o assunto: STJ, 6a Turma, AgRg no HC 654.281-SP, Rei. Min.
Rogério Schietti Cruz, j. 15.06.2021, DJe 23.06.2021.
87 STJ, 5a Turma, HC 527.625-SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 12.11.2019, DJe 26.11.2019; STJ, 6a
Turma, AgRg no REsp 1.781.494-CE, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 05.11.2019, DJe 11.11.2019.
88 STJ, 5a Turma, HC 527.625-SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 12.11.2019, DJe 26.11.2019; STJ, 6a
Turma, AgRg no REsp 1.781.494-CE, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 05.11.2019, DJe 11.11.2019; STJ, 5a Turma,
HC 490.653-SP, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 26.03.2019, DJe 08.04.2019.
156 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
91 Com esse entendimento: STJ, 5aTurma, HC 554.833/SP, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 03.03.2020, Dje 16.03.2020;
STJ, 6a Turma, AgRg no HC 552.895/SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 18.02.2020, Dje 26.02.2020; STJ,
5a Turma, HC 487.885/MG, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 07.02.2019, DJe 15.02.2019.
92 Nessa linha: STJ, 5a Turma, HC 222.791/SP, Rei. Min. Moura Ribeiro, j. 12.11.2013, DJe 20.11.2013; STJ, 6a
Turma, HC 271.517/SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 07.11.2013, DJe 21.11.2013; STJ, 6a Turma, HC
274.397/RS, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 24.10.2013, DJe 05.11.2013.
93 No sentido de que o cometimento de falta grave enseja a regressão para regime de cumprimento de pena
mais gravoso: STJ, 6a Turma, HC 259.417/SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 12.11.2013, DJe 29.11.2013;
STJ, 5a Turma, HC 230.659/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 05.11.2013, DJe 19.11.2013.
94 STJ, 5a Turma, AgRg no Resp 1.778.649/PA, Rei. Min. Ribeiro DAntas, j. 18.02.2020, DJe 28.02.2020; STJ, 6a
Turma, AgRg no HC 525.652/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 19.11.2019, DJe 05.12.2019; STJ, 6a Turma, AgRg
no REsp 1.789.438/RO, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 06.08.2019, DJe 13.08.2019; STJ, 6a Turma, AgRg
no REsp 1.743.956/RO, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 27.11.2018, DJe 06.12.2018.
95 STJ, 5aTurma, AgRg no REsp 1.773.347/RO, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 27.11.2018, DJe 10.12.2018;
STJ, 6a Turma, AgRg no HC 471.732/SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 18.10.2018, DJe 08.11.2018; STJ,
6a Turma, AgRg nos EDcl no REsp 1,703.504/RO, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 22.05.2018, DJe
04.06.2018; STJ, 6a Turma, Aglnt no REsp 1,632.060/MS, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 08.05.2018, DJe 21.05.2018.
160 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
96 STJ, 5a Turma, HC 514.230-RJ, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 17.09.2019, Dje 24.09.2019; STJ, 5a Turma, HC
487.885-MG, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 07.02.2019, Dje 15.02.2019.
97 STJ, 6a Turma, HC 259.417/SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 12.11.2013, Dje 29.11.2013; STJ, 6a Turma,
HC 262.572/RS, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 12.11.2013, DJe 28.11.2013; STJ, 5a Turma, HC
230.659/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 05.11.2013, DJe 19.11.2013.
98 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 550.207/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 18.02.2020, DJe 28.02.2020;
STJ, 5a Turma, HC 487.886/MG, Rei. Min. Felix Fischer, j. 07.02.2019, DJe 19.02.2019; STJ, 5a Turma, HC
328.236/RS, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 07.06.2016, DJe 13.06.2016.
99 STJ, 5a Turma, HC 238.733/SP, Rei. Min. Moura Ribeiro, j. 17.12.2013, DJe 03.02.2014; STJ, 3a Seção, AgRg
nos EREsp 1.238.180/SP, Rei. Min. Regina Helena Costa, j. 27.11.2013, DJe 09.12.2013; STJ, 6a Turma, HC
194.573/SP, Rei. Min. Assusete Magalhães, j. 21.11.2013, DJe 19.12.2013.
100 STJ, 5a Turma, HC 496.728/RS, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 09.04.2019, DJe 06.05.2019; STJ, 5a
Turma, AgRg no AREsp 1.374.816/ES, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 07.02.2019, DJe 15.02.2019; STJ, 3a Seção,
EREsp 1.477.886/RS, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 08.08.2018, DJe 17.08.2018.
101. STJ, 6a Turma, AgRg no Resp 1.659.676-RS, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 12.12.2017, DJe 19.12.2017;
STJ, 6a Turma, Aglnt no AREsp 881.688-RS, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 27.06.2017, DJe 01.08.2017.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 161
parágrafo único do art. 37 dispõe que a autorização de trabalho externo deverá ser
revogada se o preso for punido por falta grave.
3.8. Recompensas
Se as sanções exercem papel fundamental para dissuadir o condenado de pra
ticar faltas leves, médias ou graves, preservando-se, assim, a disciplina no âmbito
carcerário, igual relevância há de ser conferida às recompensas, que funcionam, em
sentido diverso, como verdadeiro prêmio ao condenado que apresenta um bom
comportamento prisional, nitidamente direcionado à ressocialização.
É dentro desse contexto que o art. 55 da Lei de Execução Penal prevê que as
recompensas têm em vista o bom comportamento reconhecido em favor do condenado,
de sua colaboração com a disciplina e de sua dedicação ao trabalho. Com raciocínio
semelhante, a Lei n. 10.792/03 dispõe em seu art. 5o, inciso V, que os Estados e o
Distrito Federal poderão regulamentar o regime disciplinar diferenciado, em espe
cial para elaborar programa de atendimento diferenciado aos presos provisórios e
condenados, visando a sua reintegração ao regime comum e recompensando-lhes o
bom comportamento durante o período de sanção disciplinar.
A Lei de Execução Penal não prevê, expressamente, os fatos meritórios que
poderão dar ensejo à concessão das recompensas, diferenciando-se, nesse ponto,
da previsão legal do rol taxativo de faltas graves do condenado à pena privativa
de liberdade (art. 50, incisos I a VIII). A doutrina102 sugere, então, que, diante
das especificidades de cada estabelecimento prisional, sejam os fatos meritórios
aferidos a partir da reiterada e correta posição do condenado diante da discipli
na e do trabalho, assim como de ótimo aprendizado na escola (ou na oficina), e
da colaboração com os funcionários, do excelente asseio na cela etc., sempre se
lembrando que a recompensa deve ser compreendida como um ato de justiça, e
não um mero favor pessoal.
De acordo com o art. 56 da Lei de Execução Penal, são recompensas:
I - elogio: cuida-se de espécie de distinção, reconhecendo-se a boa conduta
do apenado nos diversos setores de atividades por ele desenvolvidas (v.g., estudo,
trabalho, disciplina etc.). Deve ser concedido verbalmente e constar do prontuário do
condenado, o que certamente lhe será extremamente útil mais adiante na obtenção
de benefícios prisionais;
II - concessão de regalias: por se tratar de recompensa decorrente do bom
comportamento carcerário do condenado, tais regalias devem ir além dos direitos já
assegurados ao preso no art. 41 da LEP. Há de se tratar, portanto, de um plus com
referência aos demais presos que não fizeram por merecer semelhantes prêmios.
De modo a se evitar qualquer tipo de discricionariedade na sua concessão, o art.
56, parágrafo único, da LEP, prevê que a legislação local e os regulamentos deverão
ser declaradas judicialmente, fato é que a Lei de Execução Penal não prevê, pelo
menos para fins de aplicação da respectiva sanção disciplinar (v.g., suspensão
ou restrição de direitos), a necessidade de uma decisão judicial homologatória
de todo e qualquer procedimento administrativo do qual resulte a imposição de
uma penalidade administrativa dessa natureza. É dizer, uma coisa é a aplicação
da respectiva sanção disciplinar pela autoridade administrativa no exercício do
seu poder disciplinar (LEP, art. 47), outra coisa é a necessidade de tal autoridade
representar ao Juízo da Execução com vista à revogação de benefícios (LEP, art.
48, parágrafo único).
Isso, porém, não significa dizer que o condenado (ou preso cautelar) não possa
se insurgir contra a sanção disciplinar que lhe foi imposta pela autoridade admi
nistrativa. Ora, se a própria Lei de Execução Penal assegura ao preso o direito de
representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito (art. 41, XIV),
e se o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5o, XXXV)
prevê que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a
direito, não se pode admitir que o condenado seja privado do direito de ingressar
em juízo para discutir aspectos relativos à legalidade do procedimento administrativo
disciplinar. Destarte, se compete ao Juiz da Execução zelar pelo correto cumpri
mento da pena e da medida de segurança (LEP, art. 66, VI), é certo afirmar que o
Poder Judiciário está autorizado a desconstituir toda e qualquer decisão proferida
no procedimento administrativo disciplinar, sempre que restar evidenciado algum
tipo de ilegalidade ou abuso de poder, a exemplo do que ocorre no caso de falta de
motivação da decisão, inobservância do direito de defesa, etc. Esse controle poderá
ser exercido pelo Juiz da Execução de ofício, por provocação do Ministério Público,
do condenado ou de seu defensor, ou, ainda, de qualquer dos legitimados a suscitar
incidente de excesso ou desvio de execução (LEP, art. 186).103
À possibilidade de controle da legalidade do procedimento administrativo disci
plinar pelo Poder Judiciário se contrapõe a impossibilidade de controle jurisdicional
de aspectos que tangenciam a conveniência e oportunidade dos atos administrati
vos, leia-se, o mérito dos atos discricionários. É dizer, ao Juízo da Execução não
é dada a possibilidade de proceder à revisão do mérito da decisão administrativa
para fazer prevalecer a sua apreciação subjetiva e a sua convicção pessoal sobre os
juízos valorativos que foram formulados pelo diretor do estabelecimento prisional
dentro dos limites de discricionariedade fixados pela lei. Isso, todavia, não impede o
magistrado de averiguar os fatos e as provas produzidas no curso do procedimento
administrativo disciplinar de modo a verificar a ocorrência de possível desvio ou
abuso de autoridade no julgamento da falta disciplinar, hipótese em que poderá des
constituir a decisão administrativa que reconheceu a falta grave. A título de exemplo,
se ao Juízo da Execução se defere a possibilidade de declarar a nulidade de sanção
103 No sentido de que a decisão proferida pela autoridade administrativa prisional em processo administrativo
disciplinar (PAD) que apura o cometimento de falta grave disciplinar no âmbito da execução penal é ato
administrativo, portanto, passível de controle de legalidade pelo Poder Judiciário: STJ, 5a Turma, AgRg no
AREsp 1.439.580-SP, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 15.10.2019, DJe 28.10.2019; STJ, 5a Turma, AgRg no REsp
1.813.064-MG, Rei. Min. Felix Fischer, j. 25.06.2019, DJe 01.08.2019; STJ, 6a Turma, AgRg no HC 471.732-SP,
Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 18.10.2018, DJe 08.11.2018.
164 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
disciplinar de isolamento que perdura por prazo maior que 30 (trinta) dias, dada
a sua manifesta ilegalidade à luz do art. 58, caput, da LEP, o mesmo não se pode
dizer em relação à hipótese em que o magistrado considerar por demais rigorosa
a sanção imposta pelo diretor do estabelecimento prisional, sob pena de indevida
análise do mérito do ato administrativo pelo Poder Judiciário.
Superada tal questão, é possível afirmar que, uma vez concluído o procedi
mento administrativo disciplinar instaurado no âmbito da casa prisional de modo
a aplicar uma das sanções previstas no art. 53, I, II, III e IV, as seguintes situações
poderão ocorrer:104
i. Não reconhecimento da falta disciplinar ou negativa de autoria: se o pro
cedimento administrativo disciplinar chegar à conclusão de que não houve a falta
disciplinar ou que o condenado a quem fora imputada a infração não a cometeu,
nenhuma sanção disciplinar poderá ser imposta, aplicando-se, por analogia, o dis
posto no art. 386, inciso I, II, IV, V e VII do Código de Processo Penal;
ii. Reconhecimento da prática de falta disciplinar de natureza leve ou média:
em tal hipótese, caberá ao diretor do estabelecimento prisional, à luz dos arts. 47 e
54, caput, da LEP, no exercício de seu poder disciplinar, determinar a aplicação da
sanção cabível, qual seja, a advertência verbal ou a repreensão, eis que as demais
sanções previstas no art. 53 tem aplicação restrita às infrações de natureza grave
(LEP, art. 57, parágrafo único);
iii. Reconhecimento da prática de falta disciplinar de natureza grave: a depender
do caso concreto, as consequências serão diversas. Vejamos: a. Na eventualidade de
o diretor da casa prisional concluir que a sanção adequada é a suspensão ou restri
ção de direitos ou o isolamento em cela individual, poderá, desde já, determinar a
sua aplicação, ex vi do art. 54, caput, Ia parte, da LEP. Deverá, ademais, representar
perante o Juízo da Execução Penal para fins de aplicação das demais consequências
decorrentes da prática de falta grave, como, por exemplo, a regressão de regime (LEP,
art. 118, I), a revogação de saídas temporárias (LEP, art. 125) e a perda de dias re
midos (LEP, art. 127); b. Se, todavia, o Diretor do Estabelecimento prisional concluir
que houve a prática de fato previsto como crime doloso que ocasionou subversão da
ordem ou disciplina internas, diante da sua incompetência para determinar a inclu
são do condenado no regime disciplinar diferenciado (LEP, art. 54, caput, in fine),
deverá encaminhar ao Juízo da Execução requerimento circunstanciado solicitando
a inclusão do preso no RDD, nos termos do art. 54, §1°, da LEP, hipótese em que,
pelo menos em regra, a decisão judicial deverá ser precedida de manifestação do
Ministério Público e da Defesa no prazo máximo de 15 dias. Em conclusão, convém
destacar que, aos olhos dos Tribunais Superiores, quando não houver regressão de
regime prisional, é dispensável a realização de audiência de justificação no proce
dimento administrativo disciplinar para apuração de falta grave.105
106 STF, Pleno, RE 434.059/DF, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 07/05/2008, DJe 172 11/09/2008.
107 Em sentido diverso, Nucci (Op. cit. p. 488) sustenta que não há necessidade de defesa técnica no curso do
procedimento administrativo disciplinar, sobretudo para não burocratizar e emperrar o PAD, que necessita
ser célere para a garantia da ordem e disciplina internas do estabelecimento penal.
166 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
109. Com esse entendimento: STF, 2a Turma, RE 398.269/RS, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 15/12/2009, DJe 35
25/02/2010; STJ, 3a Seção, REsp 1.378.557/RS, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 23/10/2013, DJe 21/03/2014;
STJ, 5a Turma, HC 281.014/RS, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 20/02/2014, DJe 27/02/2014.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 169
110 Paradigma: STJ, 3a Seção, REsp 1.378.557/RS, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 23.10.2013. No mesmo
contexto: STJ, 6a Turma, HC 175.251/RS, Rei. Min. Assusete Magalhães, j. 12.11.2013, DJe 13.12.2013.
111 Nesse contexto: STJ, 5a Turma, HC 484.815/RS, Rei. Min. Felix Fischer, j. 11.04.2019, Dje 22.04.2019; STJ, 6a
Turma, AgRg no HC 444.488/SP, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 17.05.2018, DJe 01.06.2018; STJ, 5a Turma,
AgRg no HC 444.226/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 15.05.2018, DJe 24.05.2018. No sentido
de que a ausência de defesa técnica em procedimento administrativo disciplinar instaurado para apuração
de falta grave em execução penal viola os princípios do contraditório e da ampla defesa e enseja nulidade
absoluta do PAD: STJ, 6a Turma, AgRg no HC 483.907/RJ, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 06.08.2019, DJe
15.08.2019; STJ, 6a Turma, HC 458.384/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 18.10.2018, DJe 07.11.2018; STJ, 6a Turma,
AgRg no HC 438.399/SP, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 21.08.2018, DJe 03.09.2018.
112 AVENA, Norberto. Execução penal esquematizado. 2a ed. São Paulo, Método, 2015, p. 83.
170 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
os princípios do contraditório e da ampla defesa (art. 5o, LIV e LV, da CF), como
torna desnecessário o prévio procedimento administrativo, o que atende, por igual,
ao princípio da eficiência de que cuida o art. 37 da Constituição Federal. Com base
nesses argumentos, o Plenário do Supremo deu provimento ao RE 972.598/RS,
com a fixação da Tese de Repercussão Geral fixada no tema n. 941: “A oitiva do
condenado pelo Juízo da Execução Penal, em audiência de justificação realizada na
presença do defensor e do Ministério Público, afasta a necessidade de prévio Pro
cedimento Administrativo Disciplinar (PAD), assim como supre eventual ausência
ou insuficiência de defesa técnica no PAD instaurado para apurar a prática de falta
grave durante o cumprimento da pena”.113 Fundado nesta recente orientação do
Supremo, o STJ também passou a proferir decisões no sentido de que a Súmula n.
533 do STJ deve ser relativizada, sobretudo em casos em que o reeducando praticar
a falta grave fora do estabelecimento prisional e não for realizado o PAD, porém
tiver sido efetuada audiência de justificação, garantindo ao sentenciado o direito ao
contraditório e à ampla defesa, pois, dessa forma, a ausência de realização do PAD
não causaria prejuízo à defesa do apenado.114
113 Paradigma: STF, Pleno, RE 972.598-RS, Rei. Min. Roberto Barroso, j. 04.05.2020, DJe 06.08.2020. Na mesma
linha: STF, Ia Turma, HC 110.278/RS, Rei. Min. Luiz Fux, j. 25/06/2013, DJe 159 14/08/2013.
114 STJ, 5a Turma, HC 577.233/PR, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 18.08.2020.
115 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 550.207/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 18.02.2020, DJe 28.02.2020;
STJ, 5a Turma, AgRg no HC 527.087/SP, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 17.10.2019, DJe 24.10.2019; STJ, 5a
Turma, HC 468.742/RS, Rei. Min. Felix Fischer, j. 23.10.2018, Dje 31.10.2018.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 171
116 STJ, 5a Turma, HC 483.451/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 26.02.2019, DJe 15.03.2019; STJ, 6a
Turma, AgRg no HC 369.712/SP, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 17.05.2018, DJe 01.06.2018.
117 STJ, 6a Turma, Aglnt no HC 532.846/SC, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 03.12.2019, DJe 09.12.2019; STJ, 5a Turma,
AgRg no HC 533.904/SP, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 22.10.2019, DJe 28.10.2019; STJ, 6a Turma, AgRg no
Resp 1,809.333/MS, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 10.09.2019, Dje 19.09.2019.
172 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
118 O Regime Disciplinar Diferenciado, como um todo, será objeto de análise na sequência.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 173
pode-se trabalhar com a mesma lógica constante da Súmula n. 639 do STJ: “Não
fere o contraditório e o devido processo decisão que, sem ouvida prévia da defesa,
determine transferência ou permanência de custodiado em estabelecimento peni
tenciário federal”.
De modo a coibir eventuais abusos e excessos na utilização dessa prerrogativa,
assegurando-se, ademais, a pronta apuração do ato de indisciplina através do devido
procedimento administrativo legal, é terminantemente proibido que esse isolamento
preventivo seja decretado por prazo superior a 10 (dez) dias, o que, aliás, a depen
der do caso concreto, poderá inclusive caracterizar o crime de abuso de autoridade
previsto no art. 9o da Lei n. 13.869/19.119
119 Lei n. 13.869/19: "Art. 9o. Decretar medida de privação da liberdade em manifesta desconformidade com
as hipóteses legais: Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa".
174 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
independentemente da prática de falta grave (LEP, art. 52, §1°, incisos I e II, com
redação dada pela Lei n. 13.964/19).120
O regime disciplinar diferenciado tem sido alvo de inúmeras críticas por parte
de alguns doutrinadores. Em apertada síntese, alega-se que a medida é inconstitu
cional por violar a dignidade da pessoa humana (CF, art. Io, III) e por se tratar de
verdadeira pena cruel (CF, art. 5o, XLVII, “e”). Com a devida vênia, por mais que
não se possa negar que se trata de uma forma especial de cumprimento da pena
muito mais severa e rígida, cuida-se de medida absolutamente necessária não apenas
à tutela da segurança interna e externa dos estabelecimentos prisionais, mas também
da própria segurança da coletividade como um todo, porquanto, não raras vezes,
integrantes de organizações criminosas continuam ordenando a prática de crimes
do interior dos presídios. A aplicação desse regime também vem ao encontro do
princípio da individualização da pena privativa de liberdade (CF, art. 5o, XLVI) no
curso da execução penal, porque permite tratamento penitenciário diferenciado a
presos que se encontram em situações absolutamente diversas, seja pela falta grave
consubstanciada no cometimento de crime doloso capaz de ocasionar subversão da
ordem ou disciplina internas (LEP, art. 52, caput), seja pelo alto risco para a ordem
e segurança do estabelecimento penal ou da sociedade ou pelo envolvimento com a
criminalidade organizada (LEP, art. 52, §1°, I e II, incluídos pela Lei n. 13.964/19).
Nos Tribunais Superiores, tem prevalecido o entendimento de que, tendo em
conta que os princípios fundamentais consagrados na Carta Magna não são ilimitados
(princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas), vislumbra-se que
o legislador, ao instituir o Regime Disciplinar Diferenciado, atendeu ao princípio
da proporcionalidade. Afigura-se legítima, portanto, a atuação estatal, porquanto
o RDD busca dar efetividade à crescente necessidade de segurança nos estabeleci
mentos penais, bem como resguardar a ordem pública, que vem sendo ameaçada
por criminosos que, mesmo encarcerados, continuam comandando ou integrando
facções criminosas que atuam no interior do sistema prisional - liderando rebeliões
que não raro culminam com fugas e mortes de reféns, agentes penitenciários e/ou
outros detentos - e, também, no meio social.121
120 MIRABETE, Julio Fabrini. Lei de Execuções Penais. São Paulo: Atlas, 2012, p. 149.
121 Nesse sentido: STJ, 5a Turma, HC 40.300/RJ, Rei. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 07/06/2005, DJ 22/08/05
p. 312. Como destaca Cleber Masson, "nos casos 'Labita c. Itália', de 2000, e 'Paolello c. Itália', de 2015, a
Corte Européia de Direitos Humanos decidiu que a imposição de medidas especiais e mais severas durante
a execução da pena, no caso de integrantes de organizações criminosas, é perfeitamente compatível com
os postulados de defesa dos direitos humanos" (op. cit. Vol. 1. p. 529). A (in) constitucionalidade do regime
disciplinar diferenciado deverá ser dirimida em breve pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI
n. 4.162, ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil em face dos arts. 52, 53, V, 54, 57 (parte referente
ao art. 53), 58 (parte sobre o RDD) e 60, caput e parágrafo único, todos da LEP.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 175
122 STJ, 6a Turma, HC 262.572/RS, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 12/11/2013, DJe 28/11/2013; STJ,
3a Seção, REsp 1.336.561/RS, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 25/09/2013, DJe 01/04/2014; STJ,
5a Turma, HC 267.886/RS, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 15/08/2013, DJe 26/08/2013; STJ, 5a Turma, HC 189.899/
RS, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 27/11/2012, DJe 04/12/2012; STJ, 6a Turma, HC 247.453/RS, Rei. Min.
Assusete Magalhães, j. 20/09/2012, DJe 01/10/2012; STJ, 5a Turma, REsp 1.113.600/RS, Rei. Min. Jorge Mussi,
j. 29/09/2009, DJe 30/11/2009.
123 AVENA. Op. cit. p. 93.
124 STJ, 5a Turma, HC 524.396/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 15/10/2019, DJe 22/10/2019; STJ, 5a
Turma, HC 462.463/RS, Rei. Min. Felix Fischer, j. 13/12/2018, DJe 01/02/2019; STJ, 6a Turma, RHC 33.827/
RJ, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 20/11/2014, DJe 12/12/2014.
176 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
125 Consoante disposto no art. Io, §1°, da Lei n. 12.850/13, "considera-se organização criminosa a associação
de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que
informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante
a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de
caráter transnacional".
126 Com a redação dada pela Lei n. 12.850/13, o crime de associação criminosa previsto no art. 288 do Código
Penal pode ser conceituado como a associação estável e permanente de 3 (três) ou mais pessoas para o
fim específico de cometer crimes.
127 Ao citar a rubrica marginal ou nomen iuris do crime de "milícia privada", queremos crer que o legislador
pretendeu se referir ao delito previsto no art. 288-A do CP ("Constituir, organizar, integrar, manter ou custear
organização paramilitar, milícia particular, grupo ou esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos
crimes previstos neste Código"), incluído pela Lei n. 12.720/12, como um todo, que abrange não apenas
a milícia particular propriamente dita, mas também as organizações paramilitares e grupos ou esquadrões
(grupos de extermínio).
128 Com entendimento semelhante: MIRANDA, Rafael de Souza. Manual de Execução Penal: teoria e prática. 2a
ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2020. p. 79.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 177
129 Regra 12: "1. As celas ou locais destinados ao descanso noturno não devem ser ocupados por mais de
um recluso. Se, por razões especiais, tais como excesso temporário de população prisional, for necessário
que a administração prisional central adote exceções a esta regra deve evitar-se que dois reclusos sejam
alojados numa mesma cela ou local".
130 IANHEZ, Caroline. Primeiras impressões do regime disciplinar diferenciado e lei dos crimes hediondos sob
a ótica do pacote anticrime. In Lei Anticrime: comentários à Lei 13.964/2019. Organizador: Renee do Ó Souza.
São Paulo: D'Plácido, 2020. p. 198.
131 Constituição Federal: "Art. 5o. (...) XLVII - não haverá penas: (...) e) cruéis".
178 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
Pelo contrário. É a superlotação em celas que deveriam ser ocupadas por um único
indivíduo que pode gerar questionamentos de tal natureza.132
4.3.3.1. Visitas quinzenais de duas pessoas por vez com duração de duas horas
A periodicidade de visitas na redação conferida pela Lei n. 10.792/03 era se
manal. Com a entrada em vigor do Pacote Anticrime em data de 23 de janeiro de
2020, passou a ser quinzenal. A duração da visita, porém, permanece idêntica, qual
seja, duas horas.
Na eventualidade de o interessado em fazer a visita ser alguém de fora da
relação familiar, a visita depende de autorização judicial prévia. Ao sujeitar a visita
de terceiros estranhos ao quadro familiar à chancela do Poder Judiciário, o legisla
dor visa evitar o ingresso no estabelecimento prisional não apenas de pessoas com
comportamento danoso ao ambiente carcerário (v.g, traficantes de drogas, pros
titutas), mas também de eventuais integrantes da organização criminosa à qual o
preso estava (ou está) associado, preservando-se, assim, a própria paz pública. Logo,
não obstante o direito do preso à visita do cônjuge, da companheira, de parentes e
amigos em dias determinados (LEP, art. 41, X), recairá sobre o juízo da execução
penal, e não sobre o Diretor do Estabelecimento prisional, a competência para
deliberar sobre o terceiro que pode (ou não) visitar o preso, devendo, para tanto,
averiguar a presença de elementos concretos demonstrando o vínculo de amizade
entre o pretenso visitante e o preso.
Há controvérsias acerca da possibilidade de crianças visitarem presos sujeitos ao
RDD. De um lado, há quem entenda que, por força de princípios basilares traçados
pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, tais como prevenção geral e especial do
atendimento integral à criança, proteção estatal, prevalência dos interesses do menor,
o ideal é evitar as visitas de crianças em unidades prisionais em que presos estejam
132 Como destaca Nucci,"(...) o regime disciplinar diferenciado tornou-se um mal necessário, mas está longe
de representar uma pena cruel. Severa, sim; Desumana, não. Aliás, proclamar a inconstitucionalidade desse
regime, mas fechando os olhos aos imundos cárceres aos quais estão lançados muitos presos no Brasil
é, com a devida vênia, uma imensa contradição. É sem dúvida, pior ser inserido em uma cela coletiva,
repleta de condenados perigosos, com penas elevadas, muitos deles misturados com presos provisórios,
sem qualquer regramento e completamente insalubre, do que ser colocado em cela individual, longe
da violência de qualquer espécie, com mais higiene e asseio". (NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e
processuais penais comentadas. 7a ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p. 232).
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 179
Pelo menos até a vigência do Pacote Anticrime, não havia qualquer dispositi
vo legal que determinasse a obrigatoriedade de gravação da visita e das conversas
133 "Art. 4o. A visita íntima não deve ser proibida ou suspensa a título de sanção disciplinar, excetuados os
casos em que a infração disciplinar estiver relacionada com o seu exercício".
180 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
entre o preso incluído no RDD e o visitante. Por isso, era possível encontrarmos
alguns precedentes dos Tribunais Superiores no sentido de que havia necessidade de
autorização judicial para o monitoramento, escuta, captação e gravação ambiental
de diálogos, imagens e/ou documentos dos contatos de presos com visitantes, aí
incluídos seus advogados.134
Doravante, o art. 52, §6°, da LEP, passa a dispor expressamente que a visita
deverá ser gravada em sistema de áudio ou de áudio e vídeo e, com autorização
judicial, fiscalizada por agente penitenciário. Justifica-se a inovação para o fim de
isolar as lideranças criminosas e impedir que, mesmo cumprindo pena (ou prisão
cautelar), continuem no comando das organizações criminosas através de mensagens
orais que são levadas para dentro (e para fora) dos presídios por meio de visitantes.
A medida em questão encontra respaldo nas Regras de Mandela (n. 58.1), que faz
menção ao direito do recluso se comunicar periodicamente com famílias e amigos,
sob a necessária supervisão.135
Interessante perceber que o legislador faz uso do termo gravação do áudio e
das imagens, sem usar, porém, os termos interceptação ambiental, escuta ambiental
e gravação ambiental, nem tampouco “captação ambiental de sinais eletromagnéti
cos, ópticos ou acústicos”,136 como o fazem a Lei das Organizações Criminosas (Lei
n. 12.850/13, art. 3o, II) e a Lei das Interceptações Telefônicas (Lei n. 9.296/96, art.
8o-A, incluído pela Lei n. 13.964/19). A opção em questão revela-se absolutamente
correta. A uma porque enquanto a captação ambiental prevista na Lei n. 12.850/13
e na Lei n. 9.296/96 tem natureza jurídica de meio de obtenção de prova, objetivan
do, pois, identificar fontes de prova e coletar elementos de informação no curso de
investigação preliminar instaurada contra determinada pessoa, a gravação do áudio
(e/ou das imagens) prevista no art. 52, §6°, da LEP, incluído pela Lei n. 13.964/19, é
uma medida de caráter eminentemente administrativo, que tem como objetivo pre-
cípuo prevenir riscos e promover a segurança interna e externa do estabelecimento
prisional. A duas porque a medida prevista na LEP é do conhecimento de ambos
os interlocutores. Se o preso e o visitante têm conhecimento prévio da intromissão
de terceiro, in casu, a Administração Carcerária, por meio do monitoramento de
imagens e sons, não há falar em ofensa ao direito à intimidade e à vida privada (CF,
art. 5o, X), daí por que a própria lei dispensa a necessidade de autorização judicial
prévia para a execução da medida.
Por mais que se queira objetar que haveria uma ingerência da Administração
Penitenciária na conversa de duas ou mais pessoas por meio da captação de imagens
e sons, como se trata de conversa entabulada em ambiente não privado do prédio
onde funciona o estabelecimento prisional, tendo os interlocutores sido expressamente
cientificados da gravação em curso, não há, por parte destes, nenhuma expectativa
137 É exatamente nesse sentido a lição de Caroline lanhez (Op. cit. p. 201).
138 Lei n. 11.671/08: "Art. 3o. (...) §3° As gravações das visitas não poderão ser utilizadas como meio de prova
de infrações penais pretéritas ao ingresso do preso no estabelecimento", (nosso grifo)
182 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
prisional pretendido pelo Pacote Anticrime não visa concorrer para a elucidação
e condenação do preso pelo fato gerador da sua prisão ou outros ilícitos eventual
mente praticados antes do momento da sua custódia. Pelo contrário. As mudanças
levadas a efeito pela Lei n. 13.964/19 na LEP e na Lei n. 11.671, que dispõe sobre a
transferência de presos para estabelecimentos penais federais de segurança máxima,
têm “como mote extirpar os mecanismos utilizados pelo preso para planejar crimes
do interior do presídio, valendo-se de informações repassadas por visitantes e, nesta
esteira, a comunicação feita com estes, caso tenha a propensão à prática atual ou
futura de crimes poderá ser objeto de gravação”.139
Por fim, convém destacar que aos funcionários públicos responsáveis pelo
monitoramento de áudio e vídeo não é dado conferir publicidade às gravações,
sob pena de responder pelo crime de violação de sigilo funcional previsto no art.
325 do Código Penal,140 ex vi do art. 3o, §5°, da Lei n. 11.671/08, incluído pela Lei
n. 13.964/19.
139 SILVA, Ludmila de Paula Castro. Projeto de Lei "Anticrime" e as medidas para alterar o regime jurídico dos
estabelecimentos penais federais. In Projeto de Lei Anticrime. Coordenadores: Antônio Henrique Graciano
Suxberger; Renee do Ó Souza; Rogério Sanches Cunha. Salvador: Editora Juspdovim, 2019. p. 311.
140 CP: "Art. 325. Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo,
ou facilitar-lhe a revelação: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa, se o fato não
constitui crime mais grave".
141 IANHEZ, Caroline. Op. cit. p. 203-204.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 183
não receber a visita de que trata o inciso III do caput deste artigo poderá, após
prévio agendamento, ter contato telefônico, que será gravado, com uma pessoa da
família, 2 (duas) vezes por mês e por 10 (dez) minutos”.
É fato que, a depender da localização da unidade prisional à qual estiver re
colhido o preso submetido ao RDD, nem sempre será possível o comparecimento
quinzenal de seus familiares, geralmente por conta da dificuldade de arcar com os
custos da viagem de uma localidade para outra mais distante. Daí o porquê do novel
dispositivo legal. Esse contato telefônico, porém, apresenta algumas diferenças em
relação à visita prevista no art. 52, III, da LEP, a saber:
1) Enquanto o preso submetido ao RDD tem direito à visita de 2 (duas) pessoas
por vez, a cada 15 (quinze) dias, a ligação telefônica pode ser feita com uma única
pessoa por vez, 2 (duas) vezes por mês;
2) Enquanto a visita presencial tem duração de 2 (duas) horas, cada ligação
telefônica pode se estender por, no máximo, 10 (dez) minutos;
3) O direito às visitas quinzenais é automático, ou seja, tão logo submetido
ao RDD, o preso já poderá exercê-lo. Em sentido diverso, para que faça jus ao
contato telefônico, há necessidade do decurso dos primeiros 6 (seis) meses de
RDD sem o recebimento de visitas presenciais. Nesse ponto, parece-nos que houve
um certo excesso por parte do legislador. De fato, se o indivíduo está preso, por
exemplo, em Porto Velho/RO, e declara, assim que submetido ao RDD, que seus
familiares não terão condição de visitá-lo, porquanto residem no Rio Grande do
Sul, por que não se admitir o imediato direito ao contato telefônico, evitando-
-se, assim, seu isolamento absoluto e a preservação mínima de seus vínculos
familiares, o que, em última análise, é de fundamental importância para fins de
ressocialização?142
4) As visitas presenciais ao preso submetido ao RDD podem ser feitas não
apenas por pessoas da família, como também por terceiros, desde que, neste últi
mo caso, haja autorização judicial. O contato telefônico, após prévio agendamento,
poderá ser feito exclusivamente com uma pessoa da família do preso. Justifica-se a
restrição em questão por conta da dificuldade natural da administração penitenciária
em exercer qualquer tipo de controle quanto à verdadeira identidade desse “terceiro”
em contato telefônico com o preso, que poderia muito bem ser um integrante da
organização criminosa à qual o preso está associado. Some-se a isso o fato de que
esse “terceiro” não estaria dentro do presídio, como ocorre numa visita presencial, e
sim em local incerto e não sabido, dificultando, pois, a adoção imediata de qualquer
medida contra a sua pessoa (v.g., prisão em flagrante por associação criminosa).
Daí a previsão legal no sentido de que o contato telefônico poderá ser feito apenas
com pessoas da família. Aliás, interpretando-se progressivamente o §7° do art. 52
142 A propósito, eis o teor da Regra n. 58 das Regras de Mandela: "1. Os reclusos devem ser autorizados, sob
a necessária supervisão, a comunicar periodicamente com as suas famílias e com amigos: (a) por corres
pondência e utilizando, se possível, meios de telecomunicação, digitais, eletrônicos e outros; e (b) através
de visitas".
184 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
da LEP, queremos crer que, se possível, o ideal é proceder ao contato telefônico por
aplicativos de celular que permitam a transmissão em tempo real de sons e ima
gens (v.g., facetime, whatsapp, etc.), não apenas para se ter maior grau de certeza
acerca da pessoa que está conversando com o preso, é dizer, se se trata realmente
de pessoa da família, mas também de modo a permitir uma maior interação entre
os interlocutores, algo que inevitavelmente poderá ser útil para a preservação dos
vínculos familiares do preso.
Superadas as diferenças entre a visita presencial e a ligação telefônica, convém
destacar que há um ponto de semelhança entre esses dois direitos do preso subme
tido ao RDD, qual seja, o fato de que ambas deverão ser objeto de gravação pela
administração penitenciária (LEP, art. 52, §§6° e 7o).
4.3.4. Direito do preso à saída da cela por 2 (duas) horas diárias para
banho de sol, em grupos de até 4 (quatro) presos, desde que não haja
contato com presos do mesmo grupo criminoso
Sem embargo do maior grau de isolamento que é inerente ao regime disci
plinar diferenciado, há de se assegurar ao encarcerado o direito a sair da cela em
determinados períodos. Não por outro motivo, desde a redação dada pela Lei n.
10.792/03, já se assegurava ao preso o direito ao banho de sol por duas horas di
árias, do que se conclui, a contrario sensu, que deveria permanecer recolhido por
vinte e duas horas diárias.
O que fazer, porém, quando não houver sol7. Ao referido questionamento,
Nucci assevera que “essas duas horas precisam ser sempre garantidas, haja sol ou
não. Na realidade, fator maior a ser considerado é a possibilidade de deixar a cela
por alguns momentos, sendo levado para outro ambiente, seja qual for. Havendo
sol, pode ir para o pátio. Se não houver, parece-nos razoável que saia da cela para
ser levado a outro lugar qualquer no interior do presídio (ex: uma sala de leitura
ou em local de lazer controlado)”.143
Outrossim, levando-se em consideração que o art. 52, IV, da LEP, faz
referência ao direito do preso à saída da cela por 2 (duas) horas diárias para
banho de sol, queremos crer que ao apenado sujeito ao RDD não se assegura o
direito a sair da cela para o trabalho em outras áreas do presídio. Este, o tra
balho, deve ser levado a efeito no interior da cela. É nesse sentido, aliás, o teor
do art. 98, §2°, do Decreto n. 6.049/07, segundo o qual o trabalho aos presos
em regime disciplinar diferenciado terá caráter remuneratório e laborterápico,
sendo desenvolvido na própria cela ou em local adequado, desde que não haja
contato com outro presos.
Na vigência da redação conferida pela Lei n. 10.792/03, o art. 52, inciso IV,
da LEP, fazia referência ao banho de sol, mas nada dispunha acerca da (im) pos
sibilidade de o preso ter contato com outros encarcerados nesse momento. Com
a vigência do Pacote Anticrime, o inciso IV passou a fazer referência expressa ao
banho de sol em grupos de até 4 (quatro) presos. Ou seja, a Lei n. 13.964/19 passou
a admitir que o isolamento social do preso sujeito ao RDD, decorrente do recolhi
mento em cela individual (LEP, art. 52, II), seja quebrado ao menos nessas 2 (duas)
horas. A mudança em questão tem o objetivo precípuo de adaptar a execução do
regime disciplinar diferenciado às “Regras de Mandela” (n. 44), que define como
confinamento solitário, tida como prática proibida pelas regras mínimas das Nações
Unidas para o Tratamento de Reclusos, o confinamento do recluso por 22 horas ou
mais, por dia, sem contato humano significativo.
De modo a resguardar a segurança interna da unidade prisional, evitando-se,
assim, o planejamento de possíveis fugas, rebeliões, e crimes em geral, o art. 52, IV,
da LEP, com redação dada pela Lei n. 13.964/19, dispõe expressamente que o banho
de sol, em grupos de até 4 (quatro) presos, deve ser levado a efeito sem contato com
presos do mesmo grupo criminoso. Sem embargo das evidentes dificuldades que a
execução dessa medida possa acarretar para a Administração Penitenciária, também
não se pode permitir o contato, durante o banho de sol, com presos de grupos ri
vais, sob pena de se colocar em risco a integridade física dos detentos, e a própria
segurança interna da unidade prisional. Há de se aplicar, por analogia, o quanto
disposto no art. 52, §5°, in fine, da LEP, também incluído pelo Pacote Anticrime.144
144 LEP: "Art. 52. (...) §5° Na hipótese prevista no §3° deste artigo, o regime disciplinar diferenciado deverá
contar com alta segurança interna e externa, principalmente no que diz respeito à necessidade de se evitar
contato do preso com membros de sua organização criminosa, associação criminosa ou milícia privada,
ou de grupos rivais", (nosso grifo)
145 LEP: "Art. 52. (...) §6° A visita de que trata o inciso III do caput deste artigo será gravada em sistema de
áudio ou de áudio e vídeo e, com autorização judicial, fiscalizada por agente penitenciário".
186 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
148 Com entendimento semelhante: SILVA, Ludmila de Paula Castro. Op. cit. p. 312. De modo a corroborar a
tese de que o advogado não goza de imunidades absolutas, a autora faz referência à Lei n. 11.767/08,
que alterou os §§6° e 7° do art. 7° do Estatuto da OAB (Lei n. 8.906/94) para enfatizar que atividades
desvinculadas do exercício da advocacia não só podem como devem ser coibidas com rigor, justificando,
em caso de prática de conduta criminosa pelo advogado com seu cliente, a quebra da inviolabilidade. A
propósito, observe-se a redação dos dispositivos citados: "Lei n. 8.906/94. Art. 7o. (...) §6° Presentes indícios
de autoria e materialidade da prática de crime por parte de advogado, a autoridade judiciária competente
poderá decretar a quebra da inviolabilidade de que trata o inciso II do caput deste artigo, em decisão
motivada, expedindo mandado de busca e apreensão, específico e pormenorizado, a ser cumprido na
presença de representante da OAB, sendo, em qualquer hipótese, vedada a utilização dos documentos, das
mídias e dos objetos pertencentes a clientes do advogado averiguado, bem como dos demais instrumentos
de trabalho que contenham informações sobre clientes. §7° A ressalva constante do §6° deste artigo não
se estende a clientes do advogado averiguado que estejam sendo formalmente investigados como seus
partícipes ou coautores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra da inviolabilidade".
149 Nesse sentido, referindo-se, porém, à interceptação telefônica da conversa do investigado com seu advo
gado, e não à ambiental: STJ, 5a Turma, HC 20.087/SP, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 19/08/2003, DJ 29/09/2003
p. 285; STJ, 6a Turma, RMS 58.898/SE, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 08/11/2018, DJe 23/11/2018; STJ, 6a Turma,
RHC 73.498/DF, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 14/08/2018, DJe 23/08/2018; STJ, 6a Turma, Resp 1,465.966/PE,
Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 10/10/2017, DJe 19/10/2017; STJ, 6a Turma, AgRg no AREsp 457.522/SC,
Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 10/11/2015, DJe 25/11/2015.
150 O estudo do presente tópico deverá ser feito tão somente após a leitura do item "(In) constitucionalidade
da interceptação da correspondência do preso pela administração carcerária", constante do capítulo sobre
direitos, deveres e disciplina.
188 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
151 IANHEZ. Op. cit. p. 207. No mesmo sentido, aliás, há mais de 20 anos, quando sequer se falava em orga
nizações criminosas, Alexandre de Moraes já asseverava:"(...) nenhuma liberdade individual é absoluta e,
por isso, é possível que, respeitando-se certos limites, interceptem-se as correspondências e comunicações
sempre que as liberdades públicas estiverem sendo utilizadas como instrumento de salvaguarda de práticas
ilícitas". (Direitos Humanos Fundamentais. São Paulo: Atlas, 1997, p. 145).
152 Por força do art. 185, §8°, do CPP, incluído pela Lei n. 11.900/09, também se admite a utilização da vide
oconferência para a realização de outros atos processuais que dependam da participação de pessoa que
esteja presa, como acareação, reconhecimento de pessoas e coisas, e inquirição de testemunha ou tomada
de declarações do ofendido.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 189
ca, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa
ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento; II - viabilizar a
participação do réu no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade
para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra circunstância pessoal;
III - impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que
não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência, nos termos do
art. 217 deste Código; IV - responder à gravíssima questão de ordem pública.
Se, no âmbito do CPP, a videoconferência é medida de natureza excepcional,
pelo menos em regra, raciocínio diverso deve ser aplicado ao preso submetido ao
RDD. Deveras, por força do art. 52, VII, da LEP, incluído pelo Pacote Anticrime,
uma das características do regime disciplinar diferenciado passa a ser, doravante,
a participação em audiências judiciais preferencialmente por videoconferência,
garantindo-se a participação do defensor no mesmo ambiente do preso.
Diante do uso do advérbio “preferencialmente”, denota-se que a regra para o
preso submetido ao RDD é a participação em audiências judiciais por videoconfe
rência. Não é necessário, portanto, que o juiz fundamente a escolha desse sistema,
que, em tese, já estaria justificada pela simples sujeição do detento à medida extrema,
conforme art. 52, caput, e §1°, incisos I e II, da LEP. Há, portanto, uma presunção
legal de que a saída do preso submetido ao RDD acarreta, de per si, risco à segurança
pública, daí por que o seu direito de presença e audiência nos atos instrutórios e
no seu interrogatório deverão ser exercidos de maneira remota.
Nesse caso, de modo a se preservar a mais ampla defesa, impõe-se a partici
pação do defensor no mesmo ambiente do preso (LEP, art. 52, VII, in fine), sem
prejuízo de se assegurar o acesso a canais telefônicos reservados para comunicação
entre o defensor que esteja no presídio e o advogado presente na sala de audiência
do Fórum, e entre este e o preso (CPP, art. 185, §5°, incluído pela Lei n. 11.900/09).
Em conclusão, reputamos não haver nenhuma inconstitucionalidade no fato de
a LEP estabelecer a participação do preso submetido ao RDD em audiências judiciais,
preferencialmente, por videoconferência. A medida em questão atende não somente
aos objetivos de agilização, economia e desburocratização da justiça, mas também
à segurança da sociedade, do magistrado, do membro do Ministério Público, dos
defensores, dos presos, das testemunhas e das vítimas, razão pela qual não pode
ser tachada de inconstitucional. Se é verdade que direitos e garantias individuais
do cidadão funcionam como limites intransponíveis aos poderes persecutórios do
Estado, não menos correto é que tais direitos e garantias não são absolutos, poden
do sofrer limitações, desde que tais restrições estejam fundamentadas em lei e se
mostrem compatíveis com o princípio da proporcionalidade.
Ao acusado se assegura a mais ampla defesa, não só pela presença de dois
defensores - um no presídio e outro no fórum - como também pela possibilidade
de se comunicar com cada um deles por meio de canais telefônicos reservados,
preservando-se, ademais, seu direito de presença remota de acompanhar os demais
atos da instrução processual. Quanto ao argumento de que a Convenção Americana
sobre Direitos Humanos e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos não
se referem à videoconferência, há de se ter em mente que ambos foram elaborados
190 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
153 Era nesse sentido a lição de Norberto Avena (Op. cit. p. 94). A propósito, em precedente anterior à vigência
do Pacote Anticrime, assim já havia se posicionado o STJ:"(...) O regime diferenciado, afora a hipótese da
falta grave que ocasiona subversão da ordem ou da disciplina internas, também se aplica aos presos pro
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 191
visórios e condenados, nacionais ou estrangeiros, "que apresentem alto risco para a ordem e a segurança
do estabelecimento penal ou da sociedade". A limitação de 360 dias, cuidada no inciso I do artigo 52 da
Lei n° 7.210/84, é, enquanto prazo do regime diferenciado, específica da falta grave, não se aplicando à
resposta executória prevista no parágrafo primeiro do mesmo diploma legal, pois que há de perdurar pelo
tempo da situação que a autoriza, não podendo, contudo, ultrapassar o limite de 1/6 da pena aplicada. Em
obséquio das exigências garantistas do direito penal, o reexame da necessidade do regime diferenciado
deve ser periódico, a ser realizado em prazo não superior a 360 dias. Ordem denegada". (STJ, 6a Turma,
HC 44.049/SP, Rei. Min. Hamilton Carvalhido, j. 12/06/2006, DJ 19/12/2007 p. 1.232).
192 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
154 LEP: "Art. 66. Compete ao Juiz da execução: (...) III - decidir sobre: (...) f) incidentes da execução".
155 Entre outros, é nesse sentido a lição de Renato Marcão (Op. cit. p. 80) e Avena (Op. cit. p. 97).
156 Op. cit. p. 156.
194 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
ao procedimento judicial perante o Juízo da Execução Penal (art. 195), parece não
haver muita lógica em se negar ao órgão ministerial a possibilidade de postular a
inclusão do preso no RDD.
Superada tal controvérsia, convém destacar que a decisão judicial sobre a inclusão
do preso no RDD punitivo (ou cautelar) deverá ser precedida de manifestação do
Ministério Público, se acaso não tiver sido ele o autor do requerimento, e da defesa
(LEP, art. 54, §2°, incluído pela Lei n. 10.792/03).157 Ante a omissão do legislador
em estabelecer um prazo para tal manifestação, o ideal é aplicar por analogia o art.
196 da LEP, que outorga às partes um prazo de 3 (três) dias. Na sequência, o juízo
da execução penal deverá prolatar sua decisão no prazo máximo de 15 (quinze)
dias, valendo destacar que o recurso adequado contra esse pronunciamento judicial,
seja quando deferir a medida, seja quando indeferi-la, será o agravo em execução,
ex vi do art. 197 da LEP.
Em conclusão, convém destacar que, ao tratar do procedimento destinado à
apuração de faltas disciplinares, onde, pelo menos em regra, é de rigor a observância
do direito de defesa, o art. 60, caput, in fine, da LEP, com redação determinada
pela Lei n. 10.792/03, prevê que “a autoridade administrativa poderá decretar o
isolamento preventivo do faltoso pelo prazo de até dez dias. A inclusão do preso
no regime disciplinar diferenciado, no interesse da disciplina e da averiguação do
fato, dependerá de despacho do juiz competente”. Como se pode notar, o dispositivo
admite a inclusão preventiva do preso no RDD (punitivo ou cautelar), justificada
pelo magistrado no interesse da disciplina e da averiguação do fato, sem a oitiva
prévia do Ministério Público e da Defesa, tal qual exigido pelo art. 54, §2°, da LEP,
pelo prazo máximo de 10 (dez) dias, findo o qual deverá o juiz deliberar sobre a
inclusão do preso no RDD de maneira definitiva, ou, em sentido diverso, restabelecer
sua condição de detento comum.
De um lado, parte da doutrina sustenta que o preceito em questão revela-se
incompatível com os princípios do contraditório e da ampla defesa. Prevalece, po
rém, a orientação de que determinadas situações urgentes demandam uma pronta e
imediata intervenção judicial, postergando-se a oitiva das partes para um momento
subsequente. Basta imaginar, a título de exemplo, uma rebelião em um presídio,
ou uma escalada da violência em determinada cidade (ou Estado) em virtude de
ordens emanadas de indivíduos custodiados em determinado estabelecimento pri
sional. Nesse sentido, aliás, porém em relação a transferência de custodiados para
presídios federais, eis o teor da Súmula n. 639 do STJ: “Não fere o contraditório e
o devido processo decisão que, sem ouvida prévia da defesa, determine transferência
ou permanência de custodiado em estabelecimento penitenciário federal”.
De todo modo, levando-se em consideração que o prazo máximo de inclusão
preventiva de custodiado no RDD é de 10 (dez) dias, o ideal é concluir que, dentro
desse prazo, deverá o juiz da execução não apenas ouvir o Ministério Público e o
Defensor, como também proferir sua decisão. Não se aplica, in casu, o prazo de 15
157 Para o Supremo, o regime disciplinar diferenciado é sanção disciplinar. Logo, sua aplicação depende de
prévia instauração de procedimento administrativo para apuração dos fatos imputados ao custodiado: STF,
2a Turma, HC 96.328/SP, Rei. Min. Cezar Peluso. J. 02/03/2010, DJe 062 08/04/2010.
Cap. V • DEVERES, DIREITOS E DISCIPLINA 195
(quinze) dias a que se refere o art. 54, §2° da LEP. Outrossim, consoante disposto
no art. 60, parágrafo único, da LEP, o tempo de isolamento ou inclusão preventiva
no regime disciplinar diferenciado será computado no período de cumprimento da
sanção disciplinar (detração).
1. NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
Em seus oito incisos, o art. 61 da Lei de Execução Penal alinha, sem nenhum
rigor hierárquico, os diversos órgãos encarregados da execução penal, atribuindo
a cada um deles, nos artigos subsequentes (arts. 62 a 81-B), suas respectivas com
petências e atribuições. São órgãos da execução penal: I - o Conselho Nacional de
Política Criminal e Penitenciária; II - o Juízo da Execução; III - o Ministério Pú
blico; IV - o Conselho Penitenciário; V - os Departamentos Penitenciários; VI - o
Patronato; VII - o Conselho da Comunidade; VIII - a Defensoria Pública.
A Exposição de Motivos da LEP (item n. 88) deixa transparecer que as atribuições
pertinentes a cada um desses órgãos foram estabelecidas de modo a evitar confli
tos, destacando-se, pelo contrário, a possibilidade de atuação conjunta, objetivando
suprir os graves inconvenientes do conceito antigo de que a execução das penas e
das medidas de segurança seria assunto de natureza eminentemente administrativa.
3. JUÍZO DA EXECUÇÃO
2 Para mais detalhes acerca da possibilidade de exercício das competências da execução penal por órgãos
colegiados de magistrados introduzida no nosso ordenamento jurídico pela Lei n. 12.694/12, e, depois,
ampliada, pelo Pacote Anticrime, consultar comentários ao capítulo atinente aos estabelecimentos penais,
mais precisamente ao tratarmos dos estabelecimentos penais federais de segurança máxima.
200 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
3 STJ, 3a Seção, CC 149.442/RJ, Rei. Min. Joel llan Paciornki, j. 09/05/2018, DJe 17/05/2018.
4 Crimes hediondos. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1991. p. 115.
5 . STJ, 3a Seção, CC 149.442/RJ, Rei. Min. Joel llan Paciornki, j. 09/05/2018, DJe 17/05/2018.
Cap. VI • ÓRGÃOS DA EXECUÇÃO PENAL 201
6 STJ, 3a Seção, CC 19.119/RS, Rei. Min. Fernando Gonçalves, DJ 12/08/97. Relembre-se que o militar só pode
ser recolhido a estabelecimento prisional comum após sua exclusão da Força Pública (Lei n. 6.880, art.
73, parágrafo único, "c"). Nessa linha: STF, 2a Turma, HC 72.785, Rei. Min. Néri da Silveira, DJ 08/03/1996.
Portanto, compete à Justiça Comum a execução da pena (ou medida de segurança) imposta pela Justiça
Castrense quanto à prática de crime militar, quando o condenado for excluído da Corporação Militar. A
propósito, confira-se: STJ, 3a Seção, CC 109.355/RJ, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 27/04/2011,
DJe 30/05/2011; STJ, 3a Seção, CC 149.442/RJ, Rei. Min. Joel llan Paciornki, j. 09/05/2018, DJe 17/05/2018.
7 STJ, 3a Seção, AgRg no CC 136.407-PR, Rei. Min. Ericson Maranho - Desembargador convocado do TJ-SP
-, j. 09.09.2015, DJe 16.09.2015.
202 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
8 STJ, 3a Seção, CC 90.702/PR, Rei. Min. Og Fernandes, DJe 13/05/2009. E ainda: STJ, 3a Seção, CC 110.576/
AM, Rei. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 9/6/2010. A interpretação atribuída pela Terceira Seção
do STJ ao verbete da Súmula n. 192 é a de que se transfere ao Juízo do local onde se cumpre a pena
não apenas a fiscalização da execução da reprimenda, mas, também, os incidentes relacionados, dentre
os quais se destacam os pedidos de progressão de regime e de livramento condicional. Nesse sentido:
STJ, 3a Seção, AgRg no CC n. 164.523/PR, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 13/5/2019; STJ, 3a
Seção, CC n. 163.091/SP, Rei. Min. Joel llan Paciornik, DJe de 25/3/2019. No sentido de que a Resolução n°
502/2006 do Conselho da Justiça Federal é constitucional, ao permitir o cumprimento de pena imposta por
decisão da Justiça estadual em estabelecimento federal sob competência do juízo de Execução Criminal
da Justiça Federal: STJ, HC 116.301/RJ, Rei. Min. Jorge Mussi, julgado em 10/11/2009.
9 Constituição Federal: "Art. 109. Aos juizes federais compete processar e julgar: (...) IV - os crimes políticos e
as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entida
des autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça
Militar e da Justiça Eleitoral; (...)".
Cap. VI • ÓRGÃOS DA EXECUÇÃO PENAL 203
10 Como destaca Ludmila de Paula Castro Silva (Op. cit. p. 62), o dispositivo em questão - art. 2o, parágrafo
único, da Lei n. 11.671/08, incluído pelo Pacote Anticrime - "apresenta uma presunção de que os fatos
ou incidentes relacionados à execução da pena ou infrações penais ocorridas no estabelecimento penal
federal afetam bens e interesses da União, até mesmo por macular a segurança máxima que justifica a
própria existência desta espécie de presídio".
204 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
11 Nesse contexto: STJ, 3a Seção, CC 168.815-PR, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 10.06.2020, DJe 16.06.2020.
Cap. VI • ÓRGÃOS DA EXECUÇÃO PENAL 205
12 No sentido de que compete ao Juízo da Vara das Execuções Penais da comarca onde se situa o estabele
cimento penitenciário onde o condenado cumpre pena decidir sobre os incidentes de execução, mesmo
sendo esta imposta por Juízo de outro Estado: STJ, 3a Seção, CC 33.186/AM, Rei. Min. Vicente Leal, DJ
04/02/2002 p. 285; STJ, 3a Seção, CC 25.986/AC, Rei. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ 18/10/1999.
13 NUCCI. Op. cit. p. 277-278.
14 STJ, 3a Seção, CC 90.702/PR, Rei. Min. Og Fernandes, DJe 13/05/2009.
206 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
18 Para o STJ, "é do Juízo Comum a competência para a execução das penas restritivas de direito, privativas
de liberdade e multa, quando aplicada cumulativamente com aquelas, conforme a exegese do art. 86 da
Lei 9.099/95. Reservada a competência do Juizado especial à pena de multa quando aplicada isoladamente.
(STJ, 3a Seção, CC 97.080/MG, Rei. Min. Og Fernandes, DJe 07/11/2008). E ainda: STJ, 3a Seção, CC 47.894/
RS, Rei. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ 08/06/2005 p. 147. No sentido de que a competência para a
execução das penas privativas de liberdade impostas no âmbito dos juizados especiais criminais pertence
aos Juízos das Execuções Criminais, integrantes da Justiça Comum: STJ, 3a Seção, CC 62.662/SP, Rei. Min.
Maria Thereza de Assis Moura, j. 28/03/2008, DJe 22/04/2008.
208 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
competência para aplicar aos casos julgados lei posterior que de qualquer modo
favorecesse o condenado recairia sobre o juiz da execução, pouco importando se a
condenação anterior fora firmada por juízo de Io grau ou por qualquer Tribunal.
Prova disso, aliás, é o teor da Súmula n. 611 do STF: “Transitada em julgado a
sentença condenatória, compete ao Juízo das Execuções a aplicação da lei mais
benigna”. Conquanto, à primeira vista, pareça não haver maiores discussões acerca
da competência para aplicação da lex mitior após o trânsito em julgado da sentença
penal condenatória, deve se entender que compete ao juízo das execuções a apli
cação da lei mais benéfica apenas quando tal aplicação importar em mero cálculo
matemático. A contrario sensu, toda vez que o juiz da Vara de Execuções, de modo
a aplicar a lex mitior, tiver de, necessariamente, adentrar no mérito da ação penal
de conhecimento, já não possuirá competência para tanto, sendo necessário o ajui-
zamento de revisão criminal. Rogério Greco cita um exemplo: “suponhamos que a
nova lei penal tenha criado uma causa geral de diminuição de pena por considerar
a idade do agente ao tempo da ação ou da omissão. O juiz, para aplicar a referida
redução, bastará conferir o documento de identidade existente nos autos. Se o
agente se adequar às novas disposições, fará jus à redução. O cálculo, neste caso,
é meramente matemático, objetivo. Agora, tomando de empréstimo o exemplo de
Alberto Silva Franco, se o juiz tiver de avaliar a participação do agente para poder
chegar à conclusão de que fora de menor importância, deverá, obrigatoriamente,
reavaliar o mérito da ação penal. Em casos como tais, a competência não mais será
do juiz das execuções, ficando a cargo do tribunal competente para a apreciação
do recurso, via revisão criminal, pois que entendimento contrário conduziría a
transformar o juiz da execução penal num ‘superjuiz’ com competência até para
invadir a área privativa da segunda instância, alterando qualificações jurídicas
definitivamente estatuídas”.19 Perceba-se que a competência para aplicação da nor
ma penal mais benéfica somente recai sobre o juízo das execuções nas hipóteses
em que já houve o trânsito em julgado da sentença condenatória. Por isso, se o
processo ainda estiver em andamento no primeiro grau de jurisdição, caberá ao
próprio juiz do processo de conhecimento a aplicação da lex mitior. Lado outro,
se o processo estiver em grau recursal, caberá ao respectivo Tribunal a aplicação
da norma penal mais favorável, pouco importando se se trata de julgamento de
recurso exclusivo da acusação, sob pena de flagrante desrespeito à norma cons
titucional do art. 5o, XL, sendo desnecessária a devolução dos autos à primeira
instância. Sobre o assunto, a Súmula 88 das Mesas de Processo Penal da Faculdade
de Direito da Universidade de São Paulo dispõe: “Antes do trânsito em julgado da
sentença condenatória, compete ao Tribunal de 2o grau, na pendência de recurso,
aplicar a lei mais benéfica, não ocorrendo na hipótese supressão de um grau de
jurisdição, por existirem outros meios de impugnação aberto às partes”;
II - declarar extinta a punibilidade: o art. 107 do Código Penal traz um rol não
taxativo das causas extintivas da punibilidade. Há outras previstas no Código Penal e
na legislação especial. Certas causas extintivas da punibilidade podem ocorrer antes
ou depois do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. É o que ocorre,
19 GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 5a ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2005. p. 125.
Cap. VI • ÓRGÃOS DA EXECUÇÃO PENAL 209
por exemplo, com a morte do agente, a prescrição etc. Outras, todavia, somente
após a formação da coisa julgada (decurso do prazo da suspensão condicional da
pena e do livramento condicional, prescrição da pretensão executória etc.). Portanto,
quando o art. 66, inciso II, da LEP, dispõe que compete ao Juiz da Execução declarar
a extinção da punibilidade, deve se entender que o dispositivo se refere apenas às
hipóteses de causas ocorridas após o trânsito em julgado da sentença condenatória,
e não àquelas que o antecedem, eis que, nesse caso, a competência seria do Juiz
(ou Desembargador) do processo de conhecimento (v.g., decadência, renúncia ao
direito de queixa, perdão do ofendido etc). A título de exemplo, basta supor que,
após a condenação irrecorrível de agente que esteja cumprindo pena, sobrevenha
a abolitio criminis (CP, art. 2o, caput). Se acaso o juiz da execução (LEP, art. 66,
I) não reconhecer que tal conduta deixou de ser considerada como fato criminoso,
seria cabível, em tese, o agravo em execução, nos termos do art. 197 da LEP. Todavia,
ante a urgência em se obter o reconhecimento do constrangimento ilegal, a via do
habeas corpus será mais adequada para a imediata restauração do direito de ir, vir
e ficar. Para tanto, o writ poderá ser impetrado com fundamento no art. 648, VII,
do CPP, c/c art. 107, III, do CP;
III - decidir sobre:
a) soma ou unificação de penas: a soma de penas é mencionada pelo Código
Penal (arts. 75, §1°, e 84), pelo Código de Processo Penal (art. 82, 2a parte), e pela
Lei de Execução Penal (arts. 66, III, “a”, 111 e 141). Também é possível que as penas
tenham que ser unificadas pelo Juízo da Execução, quer por se tratar de concurso
formal próprio ou crime continuado (CP, arts. 70 e 71; CPP, art. 82, 2a parte), quer
nos casos em que houver necessidade de se respeitar o limite máximo de 40 (qua
renta) anos de cumprimento de pena previsto no art. 75, caput, do CP, com redação
dada pela Lei n. 13.964/19;20
b) progressão ou regressão nos regimes: a progressão de regime é a transferência
do acusado do regime mais gravoso para o mais brando (fechado para o semiaber
to ou do semiaberto para o aberto). A regressão, por sua vez, é a transferência do
acusado do regime mais brando para o mais gravoso (aberto para o semiaberto ou
de qualquer destes para o fechado);21
c) detração e remição da pena: a detração é uma operação matemática em
que se subtrai da pena privativa de liberdade (ou da medida de segurança) aplicada
ao acusado no final do processo, o tempo de prisão provisória (ou internação em
hospital de custódia e tratamento psiquiátrico) que o condenado já cumpriu ante
riormente. Trata-se de instituto que pretende amenizar as consequências de uma
custódia cautelar, abatendo-se da pena efetivamente aplicada o período em que o
acusado esteve preso por meio da referida medida, seja em razão de prisão provisó
ria, seja em virtude de internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico.
20 Para mais detalhes acerca da soma e da unificação de penas, consultar capítulo referente à execução da
pena privativa de liberdade, mais precisamente item atinente ao cálculo de liquidação de penas.
21 Ambos os institutos serão objeto de estudo no capítulo atinente à execução da pena privativa de liberdade,
para onde remetemos o leitor.
210 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
22 De modo a evitarmos repetições desnecessárias, remetemos o leitor mais uma vez ao capítulo atinente à
execução da pena privativa de liberdade, onde a detração e a remição serão objeto de análise detalhada.
23 Para mais detalhes acerca do livramento condicional, remetemos o leitor ao capítulo atinente à execução
da pena privativa de liberdade.
Cap. VI • ÓRGÃOS DA EXECUÇÃO PENAL 211
parágrafo único), a saída temporária deve ser concedida por ato motivado do
juízo da execução, ouvidos o Ministério Público e a administração penitenciária
(LEP, art. 123);
V - determinar:
a) a forma de cumprimento da pena restritiva de direitos e fiscalizar
sua execução: conquanto recaia sobre o juiz do processo de conhecimento a
competência para verificar a presença dos requisitos legais do art. 44 do Código
Penal, determinado, em caso afirmativo, a substituição da sanção privativa de
liberdade por uma das penas alternativas, incumbe ao Juiz da Execução esta
belecer a forma de cumprimento da pena restritiva de direitos e fiscalizar sua
execução, observando, para tanto, os limites constantes da sentença condenatória
transitada em julgado;
b) a conversão da pena restritiva de direitos e de multa em privativa de
liberdade: de nada adianta a imposição de uma pena restritiva de direitos se a ela
não se emprestar força coercitiva. É nesse sentido que se destaca a importância
dos §§4° e 5o do art. 44 do Código Penal, que preveem, respectivamente, causas de
conversão obrigatórias e facultativas das penas alternativas em privativas de liberda
de.24 Noutro giro, conquanto o art. 66, V, alínea “b”, da Lei de Execução Penal, faça
referência à conversão da pena de multa em privativa de liberdade, é dominante
o entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que tal preceito foi
tacitamente revogado pela Lei n. 9.268/96, que, à época, atribuiu nova redação ao
art. 51 do Código Penal, para prever que a multa será considerada dívida de valor,
implicando o seu não pagamento, portanto, em ser executada como tal, e não mais
convertida em prisão, como ocorria até então;
c) a conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos:
como exposto anteriormente, cabe ao magistrado do processo de conhecimento,
por ocasião da prolação da sentença condenatória - ou do acórdão que reformar
a sentença absolutória -, após fixar a pena privativa de liberdade de acordo com o
sistema trifásico e estabelecer o regime inicial de cumprimento da pena privativa de
liberdade, deliberar sobre o cabimento das penas restritivas de direitos, analisando a
presença (ou não) dos requisitos do art. 44 do Código Penal. Caso isso não ocorra,
o art. 180 da LEP admite a substituição da pena privativa de liberdade não supe
rior a dois anos durante o curso da execução penal, desde que: I - o condenado a
esteja cumprindo em regime aberto; II - tenha sido cumprido pelo menos ¥* (um
quarto) da pena; III - os antecedentes e a personalidade do condenado indiquem
ser a conversão recomendável;
d) a aplicação da medida de segurança, bem como a substituição da pena
por medida de segurança: determinada a aplicação de medida de segurança pelo
juiz do processo de conhecimento, sua execução ficará a cargo do Juízo da Execução,
porquanto estamos diante de verdadeira espécie de sanção penal. Por outro lado,
24 Para mais detalhes acerca das chamadas penas alternativas, remetemos o leitor ao capítulo atinente às
penas restritivas de direitos.
212 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
25 Para mais detalhes acerca da internação e do tratamento ambulatorial, inclusive em relação às diversas
decisões que podem ser proferidas pelo Juízo da Execução no curso do seu cumprimento (LEP, art. 66, V,
alíneas d, e, f e g, remetemos o leitor ao capítulo atinente às medidas de segurança.
26 NUCCI. Op. cit. p. 255.
Cap. VI • ÓRGÃOS DA EXECUÇÃO PENAL 213
ser realizada a remoção. O Juízo da Execução não perde sua competência, todavia,
em relação ao sentenciado que é transferido apenas provisoriamente para comarca
sujeita à outra jurisdição;27
h) a remoção do condenado na hipótese prevista no § Io, do artigo 86,
desta Lei: de acordo com o art. 86, §1° da LEP, com redação dada pela Lei n.
10.792/03, a União Federal poderá construir estabelecimento penal em local dis
tante da condenação para recolher os condenados, quando a medida se justifique
no interesse da segurança pública ou do próprio condenado. A competência para
deliberar sobre a remoção do condenado em tais hipóteses recai sobre o Juízo da
Execução;
VI - zelar pelo correto cumprimento da pena e da medida de seguran
ça: como espécie de atribuição de caráter administrativo, o inciso VI do art.
66 da LEP prevê, de maneira ampla e genérica, que cabe ao juiz da execução
tomar as medidas necessárias para que sejam obedecidos todos os dispositivos
concernentes à execução penal, já que é dever dele zelar pela correta aplicação
da Lei n. 7.210/84;
VII - inspecionar, mensalmente, os estabelecimentos penais, tomando pro
vidências para o adequado funcionamento e promovendo, quando for o caso, a
apuração de responsabilidade: para verificar o correto cumprimento da pena e da
medida de segurança (LEP, art. 66, VI), nada mais importante que a realização de
inspeções mensais dos estabelecimentos penais pelo juiz da execução, oportunidade
em que poderá verificar in loco a situação desses estabelecimentos, tornando efetivas
as determinações legais e judiciais, e promovendo, quando necessário, a apuração
da responsabilidade, seja determinando a instauração do respectivo procedimento
administrativo disciplinar, seja remetendo cópia dos autos ao Ministério Público
para apuração de crime de ação penal pública. Como destaca a doutrina, já “não
há mais espaço para a permanência da doutrina do hands off, por muito tempo uti
lizada para legitimar o afastamento do Poder Judiciário das questões cotidianas da
execução penal, eximindo-o de responsabilidade sobre a proteção direta dos direitos
das pessoas presas. Muito menos há lugar para a permanência da teoria das relações
especiais de sujeição, que parte do pressuposto de que a Administração Peniten
ciária é legitimada e apta, por si só, para reger as relações com as pessoas presas,
criando zonas impermeáveis à intervenção jurisdicional”.28 A denominada inspeção
carcerária, a ser realizada pessoal e mensalmente pelos juizes de execução criminal
nos estabelecimentos penais sob sua responsabilidade, encontra-se disciplinada,
atualmente, pela Resolução n. 47, de 18.12.2007, do Conselho Nacional de Justiça,
que impõe a elaboração de um relatório a ser enviado à Corregedoria do respectivo
Tribunal até o dia 05 do mês subsequente, sem prejuízo das providências imediatas
para o regular funcionamento do estabelecimento penal. Por fim, convém destacar
que a competência de inspeção dos estabelecimentos prisionais atribuída ao Juiz da
29 STJ, 2a Turma, RMS 46.701/MG, Rei. Min. Herman Benjamin, j. 05.05.2016, DJe 25.05.2016.
30 STJ, 2a Turma, Aglnt no RMS 50.218/MG, Rei. Min. Mauro Campbell Marques, j. 21.11.2019, DJe 27.11.2019;
STJ, 5a Turma, RMS 31.392-ES, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 05.04.2016, DJe 15.04.2016.
Cap. VI • ÓRGÃOS DA EXECUÇÃO PENAL 215
4. MINISTÉRIO PÚBLICO
34 STJ, 6a Turma, AgRg no AREsp 280.063-MT, Rei. Min. Og Fernandes, j. 19.03.2013, DJe 05.04.2013; STJ, 5a
Turma, HC 289.112-RS, Rei. Min. Felix Fischer, j. 23.09.2014, DJe 03.10.2014.
Cap. VI • ÓRGÃOS DA EXECUÇÃO PENAL 217
5. CONSELHO PENITENCIÁRIO
6. DEPARTAMENTOS PENITENCIÁRIOS
35 Como já decidiu o STJ,"(...) a nova redação do art. 112 da LEP, dada pela Lei n. 10.792/03, que estabeleceu
novo procedimento para a concessão da progressão do regime, determinando que o mesmo proceder
fosse aplicado na concessão do livramento condicional, deixa para trás a exigência de prévia oitiva do
Conselho Penitenciário, exigida no art. 131 da LEP, para a concessão do livramento condicional. A mes
ma Lei n. 10.792/03 acabou por modificar, também, o inciso I do art. 70 da LEP, retirando desse órgão a
atribuição para emitir parecer sobre livramento condicional, constante na redação original do dispositivo"
(STJ, 5a Turma, REsp 773.635-DF, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 14.03.2006, DJ 03.04.2006.
220 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
penal sejam aplicadas de forma adequada em todo o território nacional. Por outro
lado, os Departamentos Penitenciários Estaduais (ou órgãos similares) poderão ser
criados pela legislação estadual.
Consoante disposto no art. 72 da LEP, são atribuições do Departamento Peni
tenciário Nacional: I - acompanhar a fiel aplicação das normas de execução penal
em todo o Território Nacional; II - inspecionar e fiscalizar periodicamente os esta
belecimentos e serviços penais; III - assistir tecnicamente as Unidades Federativas na
implementação dos princípios e regras estabelecidos nesta Lei; IV - colaborar com
as Unidades Federativas mediante convênios, na implantação de estabelecimentos e
serviços penais; V - colaborar com as Unidades Federativas para a realização de cursos
de formação de pessoal penitenciário e de ensino profissionalizante do condenado
e do internado; VI - estabelecer, mediante convênios com as unidades federativas,
o cadastro nacional das vagas existentes em estabelecimentos locais destinadas ao
cumprimento de penas privativas de liberdade aplicadas pela justiça de outra unidade
federativa, em especial para presos sujeitos a regime disciplinar; VII - acompanhar
a execução da pena das mulheres beneficiadas pela progressão especial de que trata
o § 3o do art. 112 desta Lei, monitorando sua integração social e a ocorrência de
reincidência, específica ou não, mediante a realização de avaliações periódicas e
de estatísticas criminais: os resultados obtidos por meio do monitoramento e das
avaliações periódicas previstas no presente inciso serão utilizados para, em função
da efetividade da progressão especial para a ressocialização das mulheres de que
trata o §3° do art. 112 da LEP, avaliar eventual desnecessidade do regime fechado
de cumprimento da pena para essas mulheres nos casos de crimes cometidos sem
violência ou grave ameaça (LEP, art. 72, §2°, incluído pela Lei n. 13.769/18). Incum
be também ao Depen a coordenação e supervisão dos estabelecimentos penais e de
internamento federais (LEP, art. 72, §1°, com redação dada pela Lei n. 13.769/18).
No que tange aos Departamentos Penitenciários Estaduais, estes têm por fina
lidade supervisionar e coordenar os estabelecimentos penais da Unidade da Federação
a que pertencerem (LEP, art. 74, caput), com as atribuições que a lei local estabelecer.
A depender do Estado da Federação, tais atribuições ora são outorgadas à Superinten
dências dos Serviços Penitenciários (v.g, Rio Grande do Sul), órgãos estaduais vincu
lados à Secretaria de Segurança Pública, ora às Secretarias de Administração Peniten
ciária (v.g., São Paulo e Rio de Janeiro).
7. PATRONATO
8. CONSELHO DA COMUNIDADE
9. DEFENSORIA PÚBLICA
Por mais incrível que possa parecer, à época da sua vigência, a Lei de Execução
Penal não elencava a Defensoria Pública como um dos órgãos da Execução Penal.
E isso, apesar de admitir, expressamente, a situação de vulnerabilidade enfrentada
pelo coletivo carcerário: “A impotência da pessoa presa ou internada constitui po
deroso obstáculo à autoproteção de direitos ou ao cumprimento dos princípios de
legalidade e justiça que devem nortear o procedimento executivo. Na ausência de
tal controle, necessariamente judicial, o arbítrio torna inseguras as suas próprias
vítimas, e o descompasso entre o crime e sua punição transforma a desproporcio-
nalidade em fenômeno de hipertrofia e de abuso de poder” (Item 171 da Exposição
de Motivos da LEP).
Eis que surge, então, a Lei n. 12.313/10, acrescentando ao rol dos órgãos da
execução penal constante do art. 61 da LEP a Defensoria Pública, ao mesmo tempo
em que lhe outorgou diversas atribuições (LEP, arts. 81-A e 81-B). Afinal, à luz do
art. 134 da Carta Magna, com redação dada pela Emenda Constitucional n. 80/14,
a Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do
Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático,
fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a
defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coleti
vos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do
37 Para mais detalhes acerca da promoção de demandas coletivas pela Defensoria Pública, notadamente no
que diz respeito à possibilidade de impetração de habeas corpus coletivo, remetemos o leitor ao Capítulo
atinente ao Procedimento Judicial.
38 Grosso modo, as diversas atribuições outorgadas à Defensoria Pública (LEP, art. 81-B) constam como
matérias da competência do Juízo da Execução (LEP, art. 66). Tome-se, como exemplo, a possibilidade de
requerer a aplicação aos casos julgados de lei posterior que de qualquer modo favorecer o condenado
(LEP, art. 81-B, I, "b"), cuja competência recai sobre o Juízo da Execução (LEP, art. 66, I). Logo, de modo a
evitarmos repetições desnecessárias, remetemos o leitor ao tópico acima atinente às competências do Juízo
da Execução Penal. Aliás, o fato de a LEP outorgar à Defensoria Pública a possibilidade de requerer tais
providências não afasta a possibilidade de o juízo da execução agir de ofício, podendo fazê-lo, ademais,
mediante provocação do Ministério Público.
224 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
1. REGRAS GERAIS
1 LEP: "Art. 26. Considera-se egresso para os efeitos desta Lei: I - o liberado definitivo, pelo prazo de 1 (um)
ano a contar da saída do estabelecimento; II - o liberado condicional, durante o período de prova.
2 NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Execução Penal. 4a ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021. p. 141.
226 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
de uma seção para gestante e parturiente e de creche para crianças entre seis meses e
sete anos de idade, que deverão atender aos seguintes requisitos básicos: atendimento
por pessoal qualificado, de acordo com as diretrizes adotadas pela legislação educacional
e em unidades autônomas; horário de funcionamento que garanta a melhor assistência
à criança e à sua responsável (art. 89);
iv. Salas de aula: de acordo com o art. 83, §4°, da LEP, incluído pela Lei n.
12.245/10, serão instaladas salas de aulas destinadas a cursos do ensino básico e
profissionalizante. A existência dessas salas de aula no interior dos estabelecimentos
prisionais visa atender ao dever de assistência educacional previsto nos arts. 17 a
21-A da LEP;
v. Instalação destinada à Defensoria Pública: como exposto anteriormente, mais
precisamente no capítulo referente à assistência ao preso, as Unidades da Federação
deverão ter serviços de assistência jurídica, integral e gratuita, pela Defensoria Pública,
dentro e fora dos estabelecimentos penais. Para prestar assistência jurídica aos presos
e internados sem recursos financeiros para constituir advogado, todo estabelecimento
penal deverá dispor de local apropriado para atendimento pelo Defensor Público
(LEP, art. 16, §2°);
5 Ganhou notoriedade no Brasil, sob o ponto de vista negativo, um caso concreto ocorrido na cidade de Abaete
tuba/PA nos idos de 2007, no qual uma adolescente de 15 (quinze) anos foi presa e colocada em uma cela com
aproximadamente 20 (vinte) homens, ali permanecendo por aproximadamente 26 (vinte e seis) dias, período no
qual foi estuprada inúmeras vezes, muitas delas para que tivesse acesso à comida e materiais de higiene pessoal.
230 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
6 "A prisão não intimida nem regenera. Embrutece e perverte. Insensibiliza ou revolta. Descaracteriza e
desambienta. Priva de funções. Inverte a natureza. Gera cínicos e hipócritas. A prisão, fábrica e escola
de reincidência, habitualidade e profissionalidade, produz e reproduz criminosos". (LYRA, Roberto. Novo
Direito Penal. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1971, v. 3, p. 109).
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 231
§4° do art. 84 da LEP, segundo o qual o preso que tiver sua integridade física, moral
ou psicológica ameaçada pela convivência com os demais presos ficará segregado
em local próprio.
Sem embargo da remotíssima possibilidade de aplicação concreta dos critérios esta
belecidos pela Lei de Execução Penal e por outros diplomas normativos (v.g., Lei da Prisão
Temporária), incumbe apontar os diversos critérios legais para a separação de presos:
a. Separação do preso provisório do condenado por sentença transitada em
julgado: consoante disposto no art. 84, caput, da LEP, o preso provisório ficará
separado do condenado por sentença transitada em julgado. O dispositivo guarda
semelhança com o art. 300 do CPP, com redação dada pela Lei n. 12.403/11: “As
pessoas presas provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem definitiva
mente condenadas, nos termos da Lei de Execução Penal”. Ambos os dispositivos
visam evitar a promiscuidade resultante da convivência entre presos que já tenham
contra si sentença condenatória com trânsito em julgado e presos provisórios. Ora,
“enquanto a prisão do primeiro decorre do reconhecimento de sua responsabili
dade criminal, a do segundo justifica-se unicamente na necessidade de acautelar
a sociedade ou o processo criminal, podendo até mesmo sobrevir juízo posterior
de absolvição, já que não se sabe se é inocente ou culpado das acusações que lhe
são atribuídas”;7
b. Separação de acusados ou condenados pela prática de crimes hediondos
ou equiparados: quer se trate de acusado, ou seja, preso cautelar (LEP, art. 84, §1°,
I), quer se trate de condenado (LEP, art. 84, §3°, I), pela prática de um dos crimes
hediondos listados no art. Io da Lei n. 8.072/90 ou equiparados - tráfico de drogas,
terrorismo e tortura -, este deverá ficar separado dos demais reclusos. À semelhança
do critério anterior, o legislador visa evitar o contato entre acusados (e condenados)
dotados de graus de periculosidade diversos, de modo a proteger a integridade
física e moral dos próprios presos, além de reduzir “indesejáveis influências entre
criminosos de diferentes perfis criminógenos”;8
c. Separação de acusados, presos provisórios ou reincidentes condenados
pela prática de crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa: outro
critério de separação de presos previsto expressamente na Lei de Execução Penal
diz respeito àqueles acusados (LEP, art. 84, §1°, II) ou reincidentes condenados
(LEP, art. 84, §3°, II) pela prática de crimes cometidos com violência ou grave
ameaça à pessoa. Pelo menos em tese, tais indivíduos deverão permanecer sepa
rados não apenas dos acusados (e condenados) pela prática de crimes hediondos
ou equiparados, mas também de outros presos (LEP, art. 84, §1°, III, e §3°, IV),
notadamente daqueles primários condenados pela prática de crimes cometidos
com violência ou grave ameaça à pessoa (LEP, art. 84, §3°, III). De fato, quando
possível, o ideal é evitar o contato entre presos primários e reincidentes, pois
estes já demonstraram se tratar de verdadeiros criminosos habituais, muito mais
refratários à ressocialização almejada pela execução penal, ao passo que aquele que
delinquiu pela primeira vez talvez ainda tenha melhores condições de responder
ao processo de reabilitação social;
e. Separação de funcionário da Administração da Justiça Criminal à época
do fato: de acordo com o art. 84, §2°, da LEP, o preso que, ao tempo do fato,
era funcionário da Administração da Justiça Criminal ficará em dependência
separada. Como se pode notar, estamos diante de indivíduos que, em virtude
da função por eles exercidas antes de serem presos (v.g., Juizes, Promotores de
Justiça, Defensores Públicos, Oficiais de Justiça etc.), poderão ter sua integridade
física e moral ameaçadas quando colocados em convivência com outros reclusos.
Há, in casu, uma razão razoável para o discrimine.9 Mantê-las presas em celas
comuns equivalería a instituir, do ponto de vista prático, verdadeira pena de
morte. A despeito de o dispositivo fazer menção aos funcionários da Adminis
tração da Justiça Criminal, a jurisprudência consolidou o entendimento de que
o art. 84, §2°, da LEP, deve ser aplicado, por analogia, a agentes penitenciários
e a policiais civis ou militares.10 Diversamente dos §§1° e 3o do art. 84 da LEP,
que fazem uso, respectivamente, das expressões “presos provisórios” e “presos
condenados”, o §2° usa o termo preso, sem fazer qualquer distinção quanto à
sua natureza. Por consequência, o ideal é concluir que o dispositivo abrange não
apenas aquele que está preso cautelarmente, como também o que já foi conde
nado por sentença irrecorrível. Nesse contexto, como já se pronunciou o STJ,
“(...) este Tribunal Superior consagrou o entendimento de que o art. 82, §2°, da
LEP - destinado aos presos que eram funcionários da administração da justiça
criminal - deve ser aplicado, por analogia, aos ex-policiais, civis ou militares,
sendo irrelevante a condição de presos provisórios ou ostentarem condenação
definitiva. Assim, o recolhimento deles deve se dar em dependência própria,
isolada dos presos comuns, de modo a resguardar a integridade física e moral,
que ficaria comprometida com a hostilidade dos demais detentos. Tendo sido
o paciente transferido para um local do Presídio Estadual destinado a presos
ex-policiais - dependência separada e reservada dos demais presos comuns -,
estando atendidos, portanto, os requisitos legais exigidos para a hipótese, não
há falar em constrangimento ilegal”.11 Noutro giro, como o legislador é explícito
ao mencionar a condição de funcionário da Administração da Justiça Criminal
ao tempo do fato, revela-se indevida a aplicação do art. 84, §2°, da LEP, àquele
que, à época da infração penal, já não mais era funcionário público;12
f. Separação de preso que tiver sua integridade física, moral ou psicoló
gica ameaçada: se a própria Constituição Federal assegura aos presos o respeito
9 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3a ed. 8a tir. São Paulo:
Malheiros, 2000.
10 STJ, 6a Turma, HC 430.341-PR, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 17.04.2018, DJe 27.04.2018; STJ, 6a Turma, HC
158.994-RJ, Rei. Min. Vasco Delia Giustina - Desembargador convocado doTJ-RS -,j. 19.05.2011, DJe 15.06.2011.
11 STJ, 6a Turma, HC 158.994-RJ, Rei. Min. Vasco Delia Giustina - Desembargador convocado do TJ-RS -, j.
19.05.2011, DJe 15.06.2011.
12 MIRABETE. Op. cit. p. 270. Em sentido diverso: AVENA. Op. cit. p. 167.
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 233
à integridade física e moral (art. 5o, XLIX), nada mais razoável do que se evitar
a convivência do preso que tiver sua integridade física, moral ou psicológica
ameaçada, justamente com aqueles reclusos responsáveis por tal constrangimen
to. Ora, diante da possibilidade concreta de que esses outros presos queiram
concretizar sentimentos de vingança ou praticar atos de represália, é salutar que
fiquem segregados em locais diversos, como previsto, aliás, no art. 84, §4°, da
LEP;
g. Separação do preso temporário: dispõe o art. 3o, caput, da Lei n° 7.960/89,
que os presos temporários deverão permanecer, obrigatoriamente, separados dos
demais detentos. Pelo menos em tese, o preso temporário não poderá ser recolhido
com condenados ou mesmo com aqueles submetidos à prisão preventiva.
13 Nesse sentido: STJ, 6a Turma, HC 56.208/PE, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 14/04/2009, DJe
04/05/2009.
234 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
que tenham direito a prisão especial, o juiz, considerando a gravidade das circuns
tâncias do crime, ouvido o representante do Ministério Público, poderia autorizar
a prisão do réu ou indiciado na própria residência, de onde o mesmo não poderia
afastar-se sem prévio consentimento judicial. Somente a violação da obrigação de
comparecer aos atos policiais ou judiciais para os quais fosse convocado é que
poderia implicar na perda do benefício da prisão domiciliar, devendo o indivíduo
ser recolhido a estabelecimento penal, onde permanecesse separado dos demais
presos. No entanto, com a entrada em vigor da Lei n° 10.258/01, esse panorama foi
alterado. Isso porque, de acordo com os §§ Io e 2o do art. 295 do CPP, acrescenta
dos pelo referido diploma normativo, a prisão especial consiste exclusivamente no
recolhimento em local distinto da prisão comum e, não havendo estabelecimento
específico para o preso especial, este será recolhido em cela distinta do mesmo
estabelecimento. Na verdade, o que ocorre na prática é o recolhimento do preso
especial a um determinado distrito policial, especificamente destinado a abrigar
presos dessa espécie. A inexistência desse local distinto, todavia, não implica em
imediata prisão domiciliar, como dispunha o art. Io da Lei n° 5.256/67. Nesse caso,
o preso deverá ser colocado no mesmo estabelecimento prisional que os demais
presos, porém em cela distinta.14
Com a entrada em vigor da Lei n° 10.258/01, e diante do disposto no art. 295,
§ 2o, do CPP, somente na hipótese de inexistência de cela distinta para preso especial
é que poderá ocorrer a prisão domiciliar. Nessa última hipótese, por ato de ofício
do juiz, a requerimento do MP ou da autoridade policial, o beneficiário da prisão
domiciliar poderá ser submetido à vigilância policial, exercida sempre com discrição
e sem constrangimento para o réu ou indiciado e sua família (Lei n° 5.256/67, art.
3o). Ademais, a violação de qualquer das condições impostas na conformidade da
Lei n° 5.256/67 implicará na perda do benefício da prisão domiciliar, devendo o
réu ou indiciado ser recolhido a estabelecimento penal, onde permanecerá separado
dos demais presos.
A prisão especial pode consistir em alojamento coletivo, atendidos os requisitos
de salubridade do ambiente, pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e
condicionamento térmico adequados à existência humana (CPP, art. 295, § 3o).15
Caso seja necessário o traslado do preso especial ao fórum ou à delegacia, dispõe
o art. 295, § 4o, do CPP, que seu transporte não pode ser efetuado juntamente com
presos que não detenham o mesmo privilégio.
Mesmo estando recolhido à prisão especial, tal preso tem direito à progressão de
regimes. É esse o teor da súmula 717 do Supremo Tribunal Federal: “Não impede
a progressão de regime de execução da pena, fixada em sentença não transitada em
julgado, o fato de o réu se encontrar em prisão especial”.
O art. 295 traz um rol exemplificativo dos cidadãos com direito à prisão especial.
De acordo com o STF, o dispositivo comporta interpretação restritiva, não sendo
14 STJ, 5a Turma, HC 87.933/SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 15/05/2008, DJe 23/06/2008.
15 STJ, 5a Turma, HC 56.160/RN, Rei. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ 07/05/2007 p. 339.
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 235
possível estender o benefício excepcional da prisão especial por analogia. Por isso,
em caso concreto envolvendo parlamentar estrangeiro, foi indeferida a concessão
de prisão especial, já que o art. 295, III, do CPP, faz menção apenas aos membros
do Parlamento Nacional.16
O art. 295, V, do CPP também assegura prisão especial aos oficiais das
Forças Armadas17 e aos militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Ter
ritórios.18 A contrario sensu, aos militares que não forem oficiais das Forças
Armadas aplica-se a regra do art. 296, devendo ser custodiados em estabele
cimentos militares.19
Por sua vez, de acordo com o parágrafo único do art. 242 do Código de
Processo Penal Militar, a prisão de praças especiais e a de graduados atenderá aos
respectivos graus de hierarquia. Ademais, com as mudanças produzidas pela Lei
n° 12.403/11, o parágrafo único do art. 300 do CPP passou a dispor que o militar
preso em flagrante delito, após a lavratura dos procedimentos legais, será re
colhido a quartel da instituição a que pertencer, onde ficará preso à disposição
das autoridades competentes. Como adverte Og Fernandes, essa regra volta-se não
apenas para a prisão em flagrante delito, mas para toda e qualquer medida cautelar
privativa de liberdade, aplicando-se aos militares das Forças Armadas, dos Estados
e do Distrito Federal.20
O art. 295, X, do CPP, também conferia aos jurados o direito à prisão especial.
Apesar de a Lei n° 12.403/11 não ter revogado expressamente o art. 295, X, do CPP,
quando se compara o texto antigo do art. 439 do CPP e sua nova redação, fica evi
dente que o legislador deixou de prever o direito à prisão especial para aquele que
tenha exercido a função de jurado. Portanto, diante da nova redação emprestada ao
caput do art. 439, queremos crer que o art. 295, X, do CPP foi tacitamente revoga
do pela Lei n° 12.403/11. Logicamente, para aqueles que já exerceram efetivamente
a função de jurado antes do advento da Lei n° 12.403/11, deverá ser respeitado o
16 STF, Pleno, PPE 315 AgR/AU, Rei. Min. Octavio Gallotti, DJ 06/04/01.
17 Quando o inciso V do art. 295 do CPP se refere aos oficiais das forças armadas, está se referindo aos mi
litares da carreira, não aos que, atendendo à convocação obrigatória, se preparam, em curto espaço, nos
NPOR, ou CPOR, que compõem a reserva não remunerada (R-2). Nesse contexto: STJ - RHC 6.759/RS - 6a
Turma - Rei. Min. Anselmo Santiago - DJ 10/11/1997 p. 57.844).
18 Enquanto não excluído da força pública, tem o policial militar condenado, ainda que por crime comum, o
direito a ser mantido em prisão especial: STJ, 5aTurma, HC 12.173/MG, Rei. Min. Edson Vidigal, DJ 12/06/2000
p. 122. Porém, a superveniência do trânsito em julgado da condenação faz cessar o direito de policial
militar ser recolhido em prisão especial: STF, 1a Turma, HC 102.020/PB, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j.
23/11/2010, DJe 240 09/12/2010.
19 Como decidiu o STJ, "em hipóteses extremas e atento ao princípio constitucional que assegura a 'integri
dade física e moral dos presos' (Constituição Federal, artigo 5o, inciso XLIX), razão não há para negar, ao
praça reformado, a extensão do benefício da prisão especial disposto no artigo 296 da Lei Adjetiva Penal.
Ordem concedida para, convolando em definitiva a medida liminar deferida, determinar que o paciente
fique custodiado em estabelecimento militar até o trânsito em julgado de sua condenação". (STJ, 6a Turma,
HC 17.718/GO, Rei. Min. Hamilton Carvalhido, DJ 06/05/2002 p. 320).
20 Medidas cautelares no processo penal: prisões e suas alternativas - comentários à Lei 12.403, de
04/05/2011. Coordenação: Og Fernandes. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 76.
236 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
21 Na mesma linha: BADARÓ, Gustavo Henrique. Medidas cautelares no processo penal: prisões e suas
alternativas - comentários à Lei 12.403, de 04/05/2011. Coordenação: Og Fernandes. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2011. p. 300.
22 STJ, 5a Turma, RHC 1.916/SP, Rei. Min. Cid Flaquer Scartezzini, DJ 08/06/92 p. 8.624.
23 . STF, Pleno, Rcl 4.535/ES, Rei. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 15/06/2007 p. 21. Nos mesmos moldes: STF, 1a
Turma, HC 91.089/SP, Rei. Min. Carlos Britto, DJ 19/10/2007 p. 46; STF, Pleno, Rcl 4.713/SC, Rei. Min. Ricardo
Lewandowski, DJe 041 07/03/08.
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 237
24 . STF - HC-AgR 82.850/SP - 2a Turma - Rei. Min. Gilmar Mendes - DJ 28/09/2007 p. 65).
25 Embora os funcionários da Administração Criminal possuam direito à prisão especial mesmo após o trân
sito em julgado da condenação, a execução de suas penas dar-se-á em estabelecimento penal sujeito ao
mesmo sistema disciplinar e carcerário de outros presos com o mesmo regime prisional, em dependência
isolada dos demais reclusos, a teor do disposto no § 2o do art. 2o do art. 84 da Lei n° 7.210/84". (STJ - REsp
744.857/RN - 5a Turma - Relatora Ministra Laurita Vaz - DJ 06/02/2006 p. 304).
26 STF, Ia Turma, HC 91.150/SP, Rei. Min. Menezes Direito, DJ 31/10/2007 p. 91.
27 STF, 2a Turma, HC 93.391/RJ, Rei. Min. Cezar Peluso, j. 15/04/2008, DJe 83 08/05/2008. Na mesma linha:
STF, 2a Turma, Rcl 23.567/SP, Rei. Min. Cármen Lúcia, j. 07/06/2016, DJe 124 15/06/2016. Logicamente, se
238 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
sob comento não se aplica à prisão civil, pois, enquanto meio executivo por coerção
pessoal, sua natureza já é de prisão especial, pois o devedor de alimentos detido não
será segregado com presos comuns. É dizer, o regime de cumprimento da prisão
civil deve imprimir máxima coerção sobre o devedor exatamente para estimulá-lo
ao célere cumprimento da obrigação alimentar, diretamente ligada à própria sub
sistência do credor de alimentos.28 Outrossim, consoante disposto no art. 7°-B da
Lei n. 8.906/94, incluído pela Lei n. 13.869/19, a violação à prerrogativa em questão
pode caracterizar crime de abuso de autoridade.
Quanto aos jornalistas, dispunha o art. 66 da Lei n° 5.250/67 (Lei de Imprensa)
que o jornalista profissional não poderia ser detido nem recolhido preso antes de
sentença transitada em julgado; em qualquer caso, somente em sala decente, arejada
e onde encontre todas as comodidades. A pena de prisão de jornalistas, por sua vez,
devia ser cumprida em estabelecimento distinto dos que são destinados a réus de
crime comum e sem sujeição a qualquer regime penitenciário ou carcerário. Ocorre
que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da arguição de descumprimento
de preceito fundamental n° 130, julgou procedente o pedido ali formulado para o
efeito de declarar como não recepcionado pela Constituição Federal todo o conjunto
de dispositivos da Lei 5.250/67. Destarte, jornalistas deixaram de ter direito à sala
de Estado-Maior, subsistindo, todavia, o direito à prisão especial, mas desde que
o jornalista seja diplomado por qualquer das faculdades superiores da República
(CPP, art. 295, VII).29
o advogado estiver suspenso dos quadros da OAB, não fará jus ao recolhimento provisório em sala de
Estado-Maior. Nesse contexto: STJ, 6a Turma, HC 368.393/MG, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j.
20/09/2016, DJe 30/09/2016.
28 STJ, 3a Turma, HC 305.805-GO, Rei. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 23.10.2014, DJe 31.10.2014.
29 . Vale lembrar que, segundo decisão do Supremo Tribunal Federal, a exigência de diploma de curso superior
para a prática do jornalismo - o qual, em sua essência, é o desenvolvimento profissional das liberdades de
expressão e de informação - não está autorizada pela ordem constitucional, pois constitui uma restrição,
um impedimento, uma verdadeira supressão do pleno, incondicionado e efetivo exercício da liberdade
jornalística, expressamente proibido pelo art. 220, § Io, da Constituição. (STF, Pleno, RE 511.961/SP, Rei.
Min. Gilmar Mendes, DJe 213 12/11/2009).
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 239
30 STJ, 5a Turma, HC 124.622/PE, Rei. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 08/09/2009, DJe 13/10/2009. No
mesmo contexto: STJ, 5a Turma, HC 55.792/BA, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 29/06/2006, DJ 21/08/2006 p. 267.
31 STF, 1a Turma, HC 79.530/PA, Rei. Min. limar Galvão, j. 16/12/1999, DJ 25/02/2000, p. 53.
240 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
32 STJ, 3a Seção, AgRg no CC 137.281 -MT, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 23.09.2015, DJe 02.10.2015; STJ, 6a Turma,
AgRg no HC 620.826-SC, Rei. Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. 23.03.2021, DJe 30.03.2021.
33 STJ, 6a Turma, AgRg no AREsp 1.762.331-AM, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 09.03.2021, DJe 12.03.2021.
34 STJ, 5a Turma, RMS 19.385-RJ, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 26.04.2005, DJ 06.06.2005.
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 241
35 A controvérsia atinente à concessão de benefícios aos presos em caso de superlotação da unidade prisional
será objeto de análise na sequência.
242 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
ceira destinada à unidade federativa pela União para atender às despesas de execução
das penas e medidas de segurança (LEP, art. 203, §4°).
39 Paradigma: STJ, REsp 1.710.674/MG, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 22.08.2018, DJ 03.09.2018.
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 245
40 Paradigma: STF, Pleno, RE 580.252/MS, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 16.02.2017, DJ 11.09.2017.
246 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
41 Paradigma: STF, Pleno, RE 592.581/RS, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 13.08.2015, DJ 01.02.2016.
42 56 óbitos entre 2016 e o 1o trimestre de 2018.
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 247
2. PENITENCIÁRIAS
É possível afirmar, sem dúvida alguma, que certos condenados não fogem da
unidade prisional em que estão custodiados exclusivamente em virtude de todo
o aparato físico do estabelecimento e da constante vigilância exercida sobre eles.
Daí a importância de serem recolhidos a estabelecimentos de segurança máxima
ou média, ou seja, às penitenciárias. Outros condenados, todavia, seja pelo fato de
não serem reincidentes, seja pela menor gravidade dos delitos por eles praticados,
geralmente se submetem à disciplina da unidade prisional, sem maiores conflitos
e sem o objetivo constante de empreender fuga. Estão aptos, assim, diante da sua
autodisciplina e senso de responsabilidade, a cumprir sua pena em regime aberto
em casas de albergado ou estabelecimento adequado. No meio termo entre eles se
encontra o condenado ao regime semiaberto. Embora convencido de que deve ob
servar a disciplina e não fugir, algo evidenciado pelo fato de a própria lei autorizar
o trabalho externo, bem como a frequência a cursos supletivos e profissionalizantes,
de instrução de segundo grau ou superior (CP, art. 35, §2°), cuida-se de condenado
que ainda não tem o suficiente autodomínio para se submeter ao regime aberto. Por
47 STJ, 5a Turma, RHC 8.142-MG, Rei. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 17.12.1998, DJ 01.03.1999 p. 351.
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 251
isso, entre um extremo e outro, é dizer, entre a prisão fechada e a prisão aberta, há
de existir um meio-termo. Este é a prisão semiaberta, a ser cumprida em colônia
agrícola, industrial ou similar, nos termos do art. 91 da LEP, pouco importando se
esse regime foi aquele inicialmente aplicado ao sentenciado na decisão condenatória
ou se acaso se trata de condenado que a ele teve acesso em virtude da progressão
do regime fechado ou regressão do regime aberto.
Em comparação com as penitenciárias, as colônias agrícolas, industriais
ou similares são dotadas de configuração arquitetônica bem mais simples, já que,
pelo menos em tese, as precauções de segurança devem ser bem menores do que
as previstas para aqueles estabelecimentos penais. Afinal, fundamenta-se o regime
semiaberto no senso de responsabilidade do condenado, algo que traz consigo a
observância de certos deveres como o de trabalhar, estudar, submeter-se à disciplina
e não empreender fuga. Por isso, ao contrário do que ocorre nas penitenciárias, os
presos do regime semiaberto podem se movimentar com certa liberdade, a guarda
do presídio não necessariamente precisa estar armada, e a vigilância deve ser exer
cida de maneira mais discreta, estimulando e valorizando, assim, gradativamente,
o senso de responsabilidade e autodisciplina do condenado.
O ideal é que a execução da pena no regime semiaberto ocorra em colônia
agrícola ou industrial. A Lei de Execução Penal autoriza expressamente, todavia,
o cumprimento dessa pena em estabelecimento similar, a ser compreendido como
aquele que, embora não seja destinado exclusivamente à execução do trabalho agrí
cola ou industrial, atenda às características acima mencionadas e aos requisitos do
art. 82 da LEP.48 Aliás, por ocasião do julgamento do RE 641.320/RS, o Supremo
Tribunal Federal recomendou aos Juizes da Execução que procedam à avaliação dos
estabelecimentos penais para verificação de sua adequação ao regime semiaberto,
ainda na hipótese de não se qualificarem como colônia agrícola ou industrial. De
fato, por ocasião da consolidação do enunciado da súmula vinculante n. 56, restou
assentado que estabelecimentos que não se qualifiquem como colônia agrícola ou
industrial (regime semiaberto), ou casa de albergado (regime aberto) são aceitáveis,
desde que não haja alojamento conjunto de presos dos regimes semiaberto e aberto
com presos do regime fechado. Por isso, é firme a jurisprudência no sentido de
que, se o apenado se encontra alojado em pavilhão independente e autônomo do
estabelecimento destinado ao regime fechado, sem ligação física com o restante do
presídio, resguardando-se os direitos inerentes ao cumprimento da pena no modo
intermediário, não há falar em constrangimento ilegal.49
Diversamente do que ocorre em relação às penitenciárias, em que a LEP prevê
que o condenado será alojado em cela individual (art. 88, caput), o preso do regime
semiaberto recolhido à colônia agrícola, industrial ou similar, poderá ser colocado
em compartimento coletivo, conquanto observada a salubridade do ambiente pela
concorrência de fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado
4. CASA DO ALBERGADO
50 Nesse sentido, em caso concreto envolvendo a condenação de militar pela prática do crime de deserção:
STF, 1a Turma, HC 173.319 AgR-MS, Rei. Min. Alexandre de Moraes, j. 06.09.2019, DJe 20.09.2019.
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 253
53 Sem embargo da redação expressa do CP, a 1a Turma do Supremo Tribunal Federal tem precedentes
admitindo a fixação do regime inicial aberto em favor de agente condenado pela prática de crime de
furto, ainda que portador de maus antecedentes e reincidente. A propósito, confira-se: STF, 1a Turma, HC
135.164/MT, Rei. Min. Alexandre de Moraes, j. 23/04/2019.
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 255
para permitir que o Juízo da Execução Penal seja informado sobre o correto cum
primento da pena.
Justifica-se a localização da prisão albergue em centros urbanos por dois moti
vos. Primeiro, para facilitar o deslocamento do condenado para exercer as atividades
laborativas e educativas a que está sujeito. Segundo, para se evitar que essa proxi
midade entre condenados sujeitos a regimes diversos venha a colocar em risco o
processo de ressocialização dos albergados. Terceiro para se evitar que estes viessem
a ser utilizados para facilitar a intermediação dos condenados que cumprem pena
em regime fechado com o mundo exterior e o exterior, quer para fins de introdução
de substâncias ilícitas (v.g., drogas), quer para fins de “leva-e-traz” de informações
necessárias à continuidade das atividades delituosas.
Na prática, todavia, são raríssimas as comarcas dotadas de Casa de Albergado.
Por isso, a Administração Penitenciária acaba se valendo do permissivo constante
do art. 82, §2°, da LEP, de modo a usar um mesmo conjunto arquitetônico para
fins de abrir estabelecimentos de destinação diversa, desde que devidamente isola
dos. Por isso, nas comarcas que não dispõem de Casa de Albergado, algo que hoje
é praticamente a regra, alojamentos são improvisados em dependências de cadeias
públicas, distritos policiais e até mesmo complexos penitenciários, sendo ali aloca
dos os albergados, logicamente com a necessária separação em relação aos presos
cautelares, ou que estejam cumprindo pena em regimes diversos. Caso isso não seja
possível, os Tribunais têm admitido que o apenado cumpra sua pena em prisão
domiciliar. Cuida-se da denominada prisão albergue domiciliar. Nessa linha, como
já se pronunciou o STJ, “(...) é cabível, excepcionalmente, a concessão de regime
domiciliar aos apenados do regime aberto, quando constatada a ausência das con
dições necessárias ao cumprimento da pena, vale dizer, superlotação, precariedade
do estabelecimento, falta de vagas ou de estabelecimento compatível, até que sejam
sanadas as omissões do Poder Público”.54
De acordo com o art. 95, caput, Ia parte, da LEP, em cada região deverá haver,
pelo menos, uma Casa do Albergado. A LEP não esclarece o significado desse termo
região, que deverá contar com pelo menos uma prisão albergue. Por isso, há quem
entenda que este deve ser compreendido como sinônimo de Comarca, enquanto
outros sustentam que se trata do espaço físico abrangido por uma Circunscrição
Judiciária, que nada mais é do que o conjunto de diversas comarcas contíguas, uma
das quais será a sua sede.55
À semelhança das colônias agrícolas e industriais, os aposentos da Prisão
Albergue poderão ser coletivos. Não há necessidade, portanto, de acomodações
individuais para a acomodação de cada preso do regime aberto. Deverão dispor,
ademais, de local adequado para cursos e palestras, o que se justifica pelo fato de
54 STJ, 6a Turma, HC 288.026-RS, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 23.09.2014, DJe 09.10.2014. No mesmo
sentido: STJ, 6a Turma, AgRg no REsp 1.541,295-RJ, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 17.10.2017, DJe 23.10.2017;
STJ, 6a Turma, AgRg no REsp 1.533.942-RS, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 17.05.2016, DJe 25.05.2016; STJ, 6a
Turma, AgRg no REsp 1.503.605-RS, Rei. Min. Ericson Maranho - Desembargador convocado do TJ-SP -, j.
05.05.2015, DJe 14.05.2015.
55 MIRABETE. Op. cit. p. 295.
256 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
que, pelo menos no plano teórico, tais lugares também são utilizados para o reco
lhimento de presos condenados a cumprimento da pena restritiva de limitação de
final de semana, aos quais podem ser ministrados cursos e palestras ou atribuídas
atividades educativas (CP, art. 48, parágrafo único).
Por mais que as Casas de Albergado tenham como característica fundamental a
ausência de obstáculos físicos contra a fuga, daí não se pode afirmar que a disciplina
não seja de observância obrigatória. Prova disso, aliás, é que, ao tratar das faltas
disciplinares graves do condenado à pena privativa de liberdade, o art. 50 da LEP
em momento algum descarta a possibilidade de seu reconhecimento em relação aos
condenados do regime aberto. Por isso, é dizer, de modo a resguardar a preservação
da disciplina, as Casas de Albergado também deverão dispor de instalações para os
serviços de fiscalização e orientação dos condenados (LEP, art. 95, parágrafo único).
5. CENTROS DE OBSERVAÇÃO
De todo modo, como nem todos Estados da Federação dispõem desses Cen
tros de Observação, a própria Lei de Execução Penal (art. 98) já prevê que, em sua
falta, os exames poderão ser realizados pela Comissão Técnica de Classificação na
própria unidade prisional em que se encontrar o condenado. E é exatamente isso
o que ocorre, ou seja, diante das péssimas condições carcerárias encontradas Brasil
afora, o que deveria ser a exceção acaba funcionando como a regra.
56 Para mais detalhes acerca do assunto, remetemos o leitor ao capítulo atinente à execução das medidas de
segurança.
258 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
hospital prisional oficial, ressalvando-se que as perícias e laudos devem ser feitos
por médicos oficiais ou devidamente nomeados e compromissados pelo Juiz.
De acordo com a Exposição de Motivos da LEP (item n. 99), o Hospital de
Custódia e Tratamento Psiquiátrico não exige cela individual, já que a estrutura e as
divisões de tal unidade estão na dependência de planificação especializada, dirigida
segundo os padrões da medicina psiquiátrica. Sem embargo, aplica-se, ao hospital,
no que couber, o disposto no parágrafo único do art. 88 da LEP, ou seja, devem
ser asseguradas as garantias mínimas de salubridade do ambiente pela concorrência
dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência
humana e área mínima de 6,00 m2 (seis metros quadrados).
Os internados, em sua integralidade, deverão ser submetidos a exames psi
quiátricos e aos demais exames necessários de modo a aferir sua efetiva condição
mental (LEP, art. 100). Nesse ponto, a LEP não estabelece nenhuma periodicidade
para a realização desses exames, até mesmo porque incumbe aos próprios médicos
determiná-la. No tocante aos indivíduos sujeitos à medida de segurança, deve ser
realizado, ademais, o exame de cessação de periculosidade. Em tal hipótese, o art.
175 da LEP preceitua que a perícia seja realizada no final do prazo mínimo da
internação, sem prejuízo de que seja feita antes se acaso restar evidenciado que o
internado já teria se recuperado (LEP, art. 176). Constatada a cessação da periculosi
dade, o Juízo da Execução poderá determinar sua desinternação, sempre de maneira
condicional, já que a medida de segurança deverá ser restabelecida se o agente, antes
do decurso de um ano, vier a praticar algum fato indicativo da persistência da sua
periculosidade (CP, art. 97, §3°).
O Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico deverá ser utilizado não
apenas para fins de internação. De fato, o tratamento ambulatorial, espécie de me
dida de segurança reservada, pelo menos em tese, ao inimputável que praticou fato
punível com detenção, e até mesmo para aqueles dotados de menor periculosidade
que praticaram fatos puníveis com reclusão, também deverá ser realizado no Hos
pital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico ou em outro local com dependência
médica adequada. À semelhança do que ocorre com a internação, também se revela
possível a execução do tratamento ambulatorial em estabelecimentos particulares
devidamente credenciados junto ao Poder Público, conquanto resguardado o devido
controle da execução da medida de segurança pelo Estado.
7. CADEIA PÚBLICA
o STJ, “(...) a privação da liberdade dos alimentantes inadimplentes deverá ser efe
tivada em local próprio, diverso do destinado aos presos criminais, o que preserva
o devedor dos efeitos deletérios da convivência carcerária”.57
Ao direcionar o preso cautelar à cadeia pública, e não às penitenciárias, locais
destinados aos condenados à pena de reclusão, em regime fechado, o dispositivo em
apreço vem ao encontro das Regras de Mandela, que, como já visto, dispõem que
presos preventivos devem ser mantidos separados dos condenados (Regra n. 11). A
Convenção Americana sobre Direitos Humanos também dispõe que “os processados
devem ficar separados dos condenados, salvo em circunstâncias excepcionais, e ser
submetidos a tratamento adequado à sua condição de pessoas não condenadas” (art. 5o,
n. 4). Concilia-se, ademais, com o art. 300 do CPP, que dispõe que as pessoas presas
provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem definitivamente condenadas,
nos termos da LEP. Procura-se evitar, com essa separação, toda a influência negativa
que o condenado irrecorrivelmente possa vir a exercer em relação ao preso cautelar.
De se lembrar que a Lei de Execução Penal também é aplicável ao preso cau
telar (art. 2o, parágrafo único). Conquanto não esteja obrigado ao trabalho, que,
todavia, poderá ser por ele executado no interior do estabelecimento (LEP, art. 31,
parágrafo único), o preso cautelar igualmente se sujeita aos deveres do condenado
(LEP, art. 39, parágrafo único), sendo titular, ademais, dos mesmos direitos (LEP,
art. 42), no que couber, é dizer, no que não for incompatível com sua situação de
custodiado provisório, e não definitivo. Também está sujeito à disciplina carce
rária (LEP, art. 44, parágrafo único), daí por que deve tomar ciência das normas
disciplinares (LEP, art. 46), podendo, ademais, ser responsabilizado por falta leve,
média ou grave, sujeitando-se, por consequência, às respectivas sanções (LEP, art.
50, parágrafo único).
De acordo com a LEP, cada comarca deverá contar com pelo menos 1 (uma)
cadeia pública a fim de resguardar o interesse da Administração da Justiça Criminal
e a permanência do preso em local próximo ao seu meio social e familiar (LEP,
art. 103).58 Ora, se se trata de espécie de prisão decretada pelo juiz do processo de
conhecimento com o objetivo de resguardar a eficácia da persecução penal, nada
mais razoável do que se fixar, como regra, a sua permanência em estabelecimento
prisional relativamente próximo do local onde se desenvolve o inquérito policial
(ou o processo penal), eis que sua presença poderá ser necessária não apenas para
fins de realização de certos meios de prova (v.g., reconhecimento de pessoas), mas
também para ulterior exercício do direito de audiência (interrogatório) e presença
no curso da instrução criminal. Esta regra, todavia, não é absoluta. De fato, como
exposto anteriormente, nada impede a remoção do preso cautelar submetido ao re
gime disciplinar diferenciado para penitenciárias em localidades diversas (LEP, art.
57 STJ, 3a Turma, HC 181.231/RO, Rei. Min. Vasco Delia Giustina - Desembargador convocado do TJ/RS -, j.
05.04.2011, DJe 14.04.2011.
58 No sentido de que deve ser assegurado ao preso provisório, a princípio, a permanência em Cadeia Pública
próxima ao seu meio social e familiar: STJ, 5a Turma, RHC 11.227/MG, Rei. Min. Edson Vidigal, j. 21.08.2001,
DJ 01.10.2001 p. 229;
260 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
87, parágrafo único), bem como a sua transferência para estabelecimentos penais
federais de segurança máxima (Lei n. 11.671/08, art. 3o, caput).59
À semelhança da Casa de Albergado, e diversamente das penitenciárias, as cadeias
públicas deverão ser instaladas em local próximo do cento urbano, observando-se,
obviamente, os requisitos básicos da unidade celular de salubridade do ambiente pela
concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado
à existência humana, e área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados), conforme
disposto, aliás, no art. 104 da LEP. Na prática, todavia, e diante do permissivo cons
tante do art. 82, §2°, da LEP, é relativamente comum que as cadeias públicas sejam
instaladas no mesmo conjunto arquitetônico de outro de destinação diversa (v.g.,
penitenciárias), desde que dele devidamente isolado.
Partindo da premissa de que a cadeia pública destina-se exclusivamente ao
recolhimento de presos cautelares, é de rigor a conclusão no sentido de que,
uma vez transitando em julgado a respectiva sentença condenatória, o agora
condenado deverá ser transferido para o estabelecimento prisional adequado
(v.g., penitenciária, colônia agrícola ou industrial etc.). Na prática, todavia, isso
nem sempre ocorre rapidamente, dados os notórios problemas de insuficiência
de vagas nas unidades prisionais, permanecendo, então, o condenado definitivo
em uma cadeia pública. Desde que se trate de situação momentânea, devidamen
te motivada por força maior, os Tribunais Superiores têm tido certa tolerância
em relação à medida, conquanto se trate de condenação ao regime fechado, já
que não haveria qualquer homogeneidade na manutenção de preso do regime
semiaberto em uma cadeia pública.
Noutro giro, não é de todo incomum que um condenado, recolhido à determi
nada penitenciária, cumpra integralmente a pena privativa de liberdade imposta em
sentença condenatória irrecorrível, sendo, porém, obrigado a permanecer preso em
virtude de prisão preventiva decretada, por exemplo, em outro processo criminal em
curso. Em tal caso, justifica-se a sua imediata transferência para o estabelecimento
penal adequado para a custódia de presos cautelares, quais sejam, as cadeias públicas,
ou, em sua falta, que seja mantido no estabelecimento, porém obrigatoriamente em
pavilhão ou ala destinada a tal modalidade de presos, conforme disposto no art.
82, §2°, da LEP.60
Uma outra hipótese relativamente comum envolvendo presos cautelares ocorre
quando o Poder Judiciário se depara com a falta de vagas ou de estrutura carcerária
para assegurar a separação daquele em relação aos presos definitivos. Sobre o assunto,
há pelo menos 3 (três) correntes diversas:
a. Ia corrente: os arts. 84 da LEP e 300 do CPP são de observância
obrigatória. Logo, na eventualidade de não ser possível a separação do preso
62 No sentido de que não cabe ao Juízo Federal discutir as razões do Juízo Estadual, quando solicita a trans
ferência de preso para estabelecimento prisional de segurança máxima, assim quando pede a renovação
do prazo de permanência, porquanto este é o único habilitado a declarar a excepcionalidade da medida:
STJ, 3a Seção, AgRg no CC n. 153.692/RJ, Rei. Min. Ribeiro Dantas, DJe 1°.03.2018.
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 263
incapacidade do presídio de receber novos apenados. Neste último caso, uma vez
rejeitada a transferência, caberá ao juízo de origem suscitar o respectivo conflito
de competência perante o Tribunal competente,63 que deverá apreciá-lo em caráter
prioritário (Lei n. 11.671/08, art. 9o).
63 De se lembrar que ao Superior Tribunal de Justiça caberá dirimir eventual conflito de competência exis
tente entre Juiz Federal e Juiz Estadual, nos termos do art. 105, I, alínea "d", da Constituição Federal. Se,
por outro lado, o conflito envolver dois Juizes Federais vinculados ao mesmo Tribunal Regional Federal, a
ele caberá o julgamento do respectivo conflito de competência (CF, art. 108, I, "e").
64 Admitindo a transferência emergencial de custodiado para presídios federais em hipóteses específicas, em
que evidenciada a periculosidade concreta decorrente de participação em organização criminosa, poder
de mando, graduada hierarquia, o que possibilita a atuação em atos criminosos externos, assim como para
fins de prevenção de eventos que venham a colocar em risco a segurança pública, a integridade física e a
vida de autoridades, de internos e da população em geral, exigindo-se que, ato contínuo, seja garantida a
intimação da defesa do custodiado para manifestação, suprindo-se a exigência legal para a manutenção da
medida: STJ, 6a Turma, HC 389.493/PR, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 18/04/2017, DJe 26/04/2017. No mesmo
contexto: STJ, 5a Turma, AgRg no REsp 1.732.152/RN, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 17/05/2018,
DJe 30/05/2018.
264 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
carta precatória, pelo juízo de origem ao juízo federal competente, mantendo aquele
juízo a competência para o processo e para os respectivos incidentes.
Sem embargo de o Pacote Anticrime não ter revogado expressamente este §2°
do art. 4o, somos levados a acreditar que o dispositivo em questão foi tacitamente
revogado diante do novel parágrafo único do art. 2o da Lei n. 11.671/08, que ou
torgou ao juízo federal da execução penal competência para as ações de natureza
penal que tenham por objetos fatos ou incidentes relativos à execução da pena, sem
fazer qualquer distinção entre condenados definitivos e presos cautelares. Logo,
desde a vigência da Lei n. 13.964 no dia 23 de janeiro de 2020, também passou a
recair sobre o juízo federal da execução penal a competência para deliberar sobre
os incidentes da execução dos presos cautelares transferidos para presídios federais
(v.g., soma ou unificação de penas), subsistindo a competência do juízo de origem
(estadual, federal, militar ou eleitoral) tão somente para apreciar questões atinentes
exclusivamente ao processo de conhecimento, como, por exemplo, eventual pedido
de revogação da prisão cautelar (CPP, art. 316, caput), revisão da necessidade de
manutenção da medida extrema a cada 90 (noventa) dias (CPP, art. 316, parágrafo
único, incluído pela Lei n. 13.964/19) etc.
65 As características enumeradas nos incisos do §1° do art. 3o da Lei n. 11.671/08, com redação dada pelo
Pacote Anticrime, são muito semelhantes - senão idênticas - àquelas listadas pela Lei de Execução Penal
para o regime disciplinar diferenciado. Logo, de modo a evitarmos repetições desnecessárias, sugerimos
ao leitor que proceda à análise do art. 52 da LEP, também com redação dada pela Lei n. 13.964/19, antes
de estudar o presente tópico.
266 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
metidos ao RDD (LEP, art. 52, III). Diferenciam-se pelo fato de a LEP limitar o
número de 2 (duas) visitas a cada quinze dias, impondo, ademais, a necessidade de
autorização judicial para a visita de terceiros (v.g., amigos), restrições inexistentes
na Lei n. 11.671/08. Atualmente, o procedimento de visita social aos presos nos
estabelecimentos penais federais de segurança máxima encontra-se disciplinado pela
Portaria n. 157, de 12 de fevereiro de 2019, do Ministério da Justiça e Segurança
Pública. Entre outros dispositivos relevantes, seu art. 4o, caput, prevê que as visitas
sociais em parlatório deverão ter agendamento prévio e duração máxima de até
três horas, nos termos do §2° do art. 92 do Anexo do Decreto n. 6.049, de 2007,
e serão realizadas semanalmente, em dias úteis, no período vespertino, das 13h às
19h30, permitindo-se para cada preso o acesso de até 2 (dois) visitantes, sem contar
as crianças. Prevê, ademais, agora em seu art. 6o, que os visitantes deverão adotar
comportamento adequado ao estabelecimento penal, podendo ser interrompida
ou suspensa a visita, por tempo determinado, nas seguintes hipóteses: I - fun
dada suspeita de utilização de linguagem cifrada ou ocultação de itens vedados
durante a visitação; II - não observância das regras de segurança, dentre as quais,
a proibição de insinuações e conversas privadas com servidores e prestadores de
serviço; III - utilização de papéis e documentos falsificados para identificação do
visitante; IV - manifestação espontânea do próprio preso solicitando a interrupção
ou a suspensão da visita; V - assistência e apoio inadequados do responsável pela
criança ou interdito visitante; VI - posse de item vedado por Portaria do Diretor
do Departamento Penitenciário Nacional; VII - utilização de vestuário vedado
por Portaria do DEPEN; VIII - prática de ato obsceno; e IX - comunicação com
o preso ou com o visitante das demais cabines do parlatório. Em conclusão, é
de todo relevante destacar que o art. 3o, §4°, da Lei n. 11.671/08, incluído pela
Lei n. 13.964/19, dispõe que os diretores dos estabelecimentos penais federais de
segurança máxima ou o Diretor do Sistema Penitenciário Federal poderão sus
pender e restringir esse direito de visitas por meio de ato fundamentado. Andou
bem o legislador ao não fixar os motivos que podem dar ensejo à suspensão (ou
restrição) em apreço, haja vista a infinidade de situações que podem demandar a
aplicação da medida (v.g., rebeliões, risco de contaminação pelo “Coronavírus”,
etc.). De todo modo, com o objetivo de conferir sindicabilidade ao referido ato,
seja pelos órgãos da execução penal, seja pelos próprios presos, referido ato deve
ser obrigatoriamente fundamentado;
III - banho de sol de até 2 (duas) horas diárias: o regime disciplinar dife
renciado também possui característica semelhante. Porém, ao cuidar da matéria,
o art. 52, IV, da LEP, com redação dada pela Lei n. 13.964/19, assegura ao preso
o direito à saída da cela por duas horas diárias para banho de sol, em grupos
de até 4 (quatro) presos, desde que não haja contato com presos do mesmo
grupo criminoso. Sem embargo de o art. 3o, §1°, III, da Lei n. 11.671/08, não
fazer previsão semelhante, parece razoável trabalharmos com a mesma lógica
da LEP, impedindo, assim, o contato do preso com integrantes do seu grupo
criminoso de origem;
IV - monitoramento de todos os meios de comunicação, inclusive de corres
pondência escrita: como exposto nos comentários ao art. 52, VI, da LEP, incluído
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 267
66. Com esse entendimento: TRF4 5022904-28.2020.4.04.7000, SÉTIMA TURMA, Relator LUIZ CARLOS CANALLI,
juntado aos autos em 01/09/2020.
268 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
67 Mesmo antes do advento da Lei n° 12.694/12, alguns estados da federação, atendendo à Recomen
dação n° 3, de 30 de maio de 2006, do Conselho Nacional de Justiça, já haviam legislado sobre a
formação desses órgãos colegiados (v.g., Pará e Mato Grosso). A título de exemplo, por meio da Lei
n° 6.806/2007, o Estado de Alagoas criou a 17a Vara Criminal da Capital, atribuindo-lhe competência
exclusiva para processar e julgar delitos praticados por organizações criminosas dentro do território
alagoano. A constitucionalidade dessa Lei Estadual foi objeto de discussão na ADI 4.414 (Rei. Min. Luiz
Fux, j. 31/05/2012). Por se tratar de matéria relacionada à organização judiciária, concluiu o Supremo
ser válida a criação, pelos estados-membros, de varas especializadas em razão da matéria, haja vista
o quanto disposto no art. 74 do CPP, c/c art. 125 da Constituição Federal, desde que respeitadas as
competências previstas na própria Carta Magna (v.g., Tribunal do Júri), sem que se possa arguir eventual
afronta aos princípios do juiz natural, da vedação à criação de tribunais de exceção e da legalidade.
Especificamente em relação ao art. 2o da Lei n° 6.806/2007, segundo o qual esta Vara Especializada
teria titularidade coletiva, sendo composta por 5 (cinco) Juizes de Direito, o Supremo concluiu ser
possível que lei estadual instituísse órgão jurisdicional colegiado em 1o grau, nos mesmos moldes do
que já ocorre, por exemplo, com o Tribunal do Júri, Junta Eleitoral e Turma Recursal. A composição de
órgão jurisdicional inserir-se-ia na competência legislativa concorrente para versar sobre procedimentos
em matéria processual (CF, art. 24, XI). Assim, quando a norma criasse órgão jurisdicional colegiado,
isso significaria que determinados atos processuais seriam praticados mediante a chancela de mais
de um magistrado, questão meramente procedimental. Avaliou-se que a lei estadual teria atuado
em face de omissão de lei federal, relativamente ao dever de preservar a independência do juiz na
persecução penal de crimes a envolver organizações criminosas. Observou-se que o capítulo do CPP
referente à figura do magistrado não seria suficiente para cumprir, em sua inteireza, o mandamento
constitucional do juiz natural (CF, art. 5o, XXXVII e Llll), porque as organizações criminosas represen
tariam empecilho à independência judicial, na forma de ameaças e outros tipos de molestamentos
voltados a obstaculizar e desmoralizar a justiça.
270 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
-ia o próprio escopo da criação de um órgão colegiado. Como não deve haver
referência a votos divergentes, o conteúdo da decisão tomada no colegiado não
pode ser imputado a um único juiz. Isso torna difusa a responsabilidade de seus
membros, o que acaba por mitigar alguns riscos inerentes à transferência de
presos para estabelecimentos penais federais de segurança máxima. Esta reunião
sigilosa e a impossibilidade de se fazer referência a voto divergente assemelha-se,
um pouco, à própria garantia constitucional do sigilo das votações do Júri (CF,
art. 5o, XXXVIII, “b”): como os jurados são cidadãos leigos, pessoas comuns
do povo, que não gozam das mesmas garantias constitucionais da magistra
tura, susceptíveis a intimidações caso fossem obrigados a proferir seu voto na
presença do acusado e de populares, o que acabaria por afetar a necessária e
imprescindível imparcialidade do julgamento, a eles se confere a possibilidade
de proferir seu voto em segredo. De maneira semelhante, as decisões do órgão
colegiado também poderão ser adotadas em reuniões sigilosas, sempre que hou
ver risco de que a publicidade resulte em prejuízo à eficácia da decisão judicial,
assegurada, porém, a presença do órgão do Ministério Público e do defensor. A
diferença, porém, é que, no caso do órgão colegiado previsto no art. 11-A da Lei
n. 11.671/08 e nos arts. Io e 1°-A da Lei n. 12.694/12, as decisões tomadas pelo
respectivo órgão colegiado serão devidamente fundamentadas e subscritas por
todos os Magistrados, observando-se, assim, o quanto disposto no art. 93, IX,
da Constituição Federal. Por isso, cuidam-se, os §§ 4o e 6o do art. Io da Lei n°
12.694/12, de restrição legal à publicidade justificada pelo interesse público de
assegurar a tranquilidade, logo, a imparcialidade dos magistrados, no momento
da votação. Evidente, pois, a compatibilidade da reunião sigilosa do colegiado
com o princípio da publicidade (CF, art. 93, IX, c/c art. 5o, LX).68
68 Esse órgão colegiado criado pela Lei n° 12.694/12 e atualmente introduzido na Lei n. 11.671/08 não se
confunde com a polêmica figura do juiz sem rosto (ou juiz secreto): enquanto este se caracteriza pelo
fato de não ter seu nome divulgado, por não ter seu rosto conhecido, por ter sua formação técnica ig
norada, naquele, o nome e a assinatura de cada um dos 3 (três) magistrados que fazem parte do órgão
deverá constar de todas as decisões por ele proferidas, com a única ressalva de que só não devem ser
divulgadas eventuais divergências entre eles. A propósito, a Corte Interamericana de Direitos Humanos
eliminou o juiz sem rosto peruano em 1999 e em 2000 (respectivamente, nos casos Cantoral Benavides e
Castillo Petruzzi), porque ofensivo ao direito de defesa, que tem direito a juiz imparcial. A Corte Suprema
Colombiana aboliu essa excrescência no ano de 2000. Nessa linha: PIZA, Lia Verônica de Toledo; VILARES,
Fernanda Regina. Crime organizado no Peru. Crime organizado: aspectos processuais. Coordenação: FERNAN
DES, Antônio Scarance; ALMEIDA, José Raul Gavião de; ZANOIDE DE MORAES, Maurício. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009. p. 258.
Cap. VII • ESTABELECIMENTOS PENAIS 271
1. NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
2 Lei n. 13.869/19: "Art. 9o Decretar medida de privação da liberdade em manifesta desconformidade com
as hipóteses legais: Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa".
3 Em data de 16 de dezembro de 2019, o Ministro do STF Alexandre de Moraes, Relator da ADI 6259/2019,
deferiu liminar, determinando a suspensão da eficácia dos arts. 2o, 3o, 9o, 12 e 13 da Resolução CNJ n°
280/2019, que determinavam, a partir de 31/12/2019, que todos os processos de execução penal de tri
bunais brasileiros tramitassem obrigatoriamente pelo 'Sistema Eletrônico de Execução Unificado - SEEU',
sem que, até o momento, tenha sido a causa submetida a julgamento ou referendada pelo plenário.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 277
4 O dispositivo do art. 84, §2°, da LEP, foi objeto de análise no capítulo referente aos estabelecimentos penais,
para onde remetemos o leitor.
27Q MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
5 Ambas as hipóteses foram objeto de análise no capítulo introdutório deste livro, para onde remetemos o
leitor de modo a evitarmos repetições desnecessárias.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 279
6 STJ, 5a Turma, HC 218.098/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 08/05/2012, DJe 21/05/2012. E ainda: STJ, 5a Turma,
HC 227.960/MG, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 18/10/2012. STJ, 5a Turma, HC 89.018, Rei. Min. Arnaldo Esteves
Lima, j. 18/12/2007, DJe 10/03/2008. No sentido de que há compatibilidade entre a prisão cautelar mantida
pela sentença condenatória e o regime inicial semiaberto fixado nessa decisão, devendo o réu, contudo,
cumprir a respectiva pena em estabelecimento prisional compatível com o regime inicial estabelecido: STJ,
5a Turma, HC 289.636/SP, Rei. Min. Moura Ribeiro, j. 20/5/2014. Sob o argumento de que a prisão cautelar
tem como principal característica a segregação total da liberdade de locomoção do acusado, não admitindo
temperamento para ajustar-se a regime imposto na sentença diverso do fechado, a 5a Turma do STJ tem
precedente no sentido de que, na hipótese de o acusado ser condenado a pena que deva ser cumprida em
regime inicial diverso do fechado, não será admissível a decretação ou manutenção de prisão preventiva
na sentença condenatória. Na visão daquele órgão colegiado, estabelecido o regime aberto ou semiaberto
como o inicial para o cumprimento de pena, a decretação da prisão preventiva inviabiliza o direito de
recorrer em liberdade, na medida em que impõe a segregação cautelar ao recorrente, até o trânsito em
julgado, sob o fundamento de estarem presentes os requisitos ensejadores da prisão preventiva insertos
no art. 312 do CPP. Ao admitir essa possibilidade, chegar-se-ia ao absurdo de ser mais benéfico ao réu
renunciar ao direito de recorrer e iniciar imediatamente o cumprimento da pena no regime estipulado do
que exercer seu direito de impugnar a decisão perante o segundo grau. A propósito: STJ, 5a Turma, RHC
52.407/RJ, Rei. Min. Felix Fischer, j. 10/12/2014, DJe 18/12/2014.
7 Nesse contexto: STJ, 5a Turma, RHC 53.828/ES, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 14/4/2015, DJe 24/4/2015.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 281
a. soma de penas: pelo menos em regra, se uma pessoa pratica dois ou mais
crimes, todos eles deverão ser objeto de um simultaneus processus, haja vista a
possível existência de conexão ou continência entre eles, nos termos dos arts.
76 a 82 do Código de Processo Penal. Na eventualidade de serem instaurados
processos diversos, a despeito da existência de conexão ou continência, impõe-se
ao juiz dotado de força atrativa avocar os demais processos que correm perante
outros juizes, como previsto, aliás, no art. 82, Ia parte, do CPP. Se, todavia, já
houver sentença definitiva nesses outros processos, a unidade deverá ser feita
posteriormente, para o efeito da soma ou da unificação das penas. É nesse sen
tido, aliás, o teor do art. 82, 2a parte, do CPP: “Se não obstante a conexão ou
continência, forem instaurados processos diferentes, a autoridade de jurisdição
prevalente deverá avocar os processos que corram perante os outros juizes, salvo
se já estiverem com sentença definitiva. Neste caso, a unidade dos processos só
se dará, ulteriormente, para o efeito de soma ou de unificação das penas”. Ora,
considerando-se que o juiz do processo de conhecimento não pode exercer juris
dição após o trânsito em julgado da sentença, essa soma ou unificação das penas
compete ao juiz encarregado da execução, tal qual disposto no art. 66, inciso III,
alínea “a”, da Lei de Execução Penal. Quanto ao procedimento atinente à soma
das penas, convém lembrar que, uma vez transitando em julgado a sentença que
aplicar pena privativa de liberdade, se o condenado estiver ou vier a ser preso, o
Juiz ordenará a expedição e guia de recolhimento para a execução (LEP, art. 105).
Na eventualidade de haver várias condenações contra a mesma pessoa, o juiz
da execução deverá receber várias guias, registradas em livro especial segundo a
ordem cronológica do recebimento e anexadas ao prontuário do condenado (LEP,
art. 107, §2°). As penas, então, deverão ser somadas para fins de retificação das
guias de execução, observando-se, in casu, a ordem determinada pelas datas do
trânsito em julgado, sem prejuízo do disposto nos arts. 76 do CP e 681 do CPP.
Esse despacho em que o juiz homologa o cálculo de penas é denominado de
“cálculo de liquidação de penas”. Por se tratar de evidente ato jurisdicional, vez
que fixa a data em que haverá o fim da execução da pena privativa de liberdade,
o ideal é concluir que se sujeita ao duplo grau de jurisdição, mais precisamente
ao recurso de agravo em execução (LEP, art. 197);
b. unificação de penas: a unificação de penas é cabível em duas hipóteses
diversas. Vejamos ambas, separadamente: i. Unificação de penas nos casos de
concurso formal próprio e crime continuado: haverá concurso formal próprio
quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, praticar dois ou mais crimes,
desprovido de desígnios autônomos em relação a cada um deles. Suponha-se,
a título de exemplo, que, em alta velocidade, o agente perca o controle do seu
veículo, provocando a morte culposa de uma pessoa e lesões corporais culposas
em outra, hipótese em que deverá responder pelos crimes dos arts. 302 e 303 do
CTB (homicídio culposo e lesão corporal culposa na direção de veículo automotor,
respectivamente), na forma do art. 70, caput, Ia parte, do Código Penal. O crime
continuado, por sua vez, ocorre quando o agente, mediante mais de uma ação (ou
omissão), pratica dois ou mais crimes da mesma espécie com homogeneidade de
282 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
8 Voltaremos a tratar dessa hipótese de unificação de penas prevista no art. 75 do Código Penal mais adiante,
precisamente no capítulo atinente à execução da pena privativa de liberdade.
9 STJ, 3a Seção, REsp 1.557.461-SC, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 22.02.2018, DJe 15.03.2018; STJ, 6a
Turma, AgRg no HC 572.468-SP, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 16.06.2020.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 283
De se lembrar que, uma vez concluída a conta de liquidação das várias penas
a que o preso está submetido, surge um conjunto de penas que deve ser consi
derado como um “todo” para a concessão (ou não) de determinados benefícios
prisionais, como, por exemplo, a determinação do regime inicial (LEP, art. 111) e
da progressão (LEP, art. 112), e, por consequência, das saídas temporárias (LEP,
art. 122), do trabalho externo (LEP, arts. 34, §3°, e 36), da remição (LEP, arts. 111
e 126), do livramento condicional (CP, art. 84), da conversão da pena privativa de
liberdade em restritiva de direitos (LEP, art. 180), do limite das penas (CP, art. 75)
e da reabilitação (CP, art. 93). Aliás, mesmo na hipótese de unificação de penas
para atender ao limite máximo de cumprimento de 40 anos previsto no art. 75,
caput, do CP, com redação dada pela Lei n. 13.964/19, convém lembrar que será
o resultado da soma das penas, e não o quantum máximo de 40 (quarenta) anos,
que servirá de base de cálculo para a concessão de benefícios prisionais, conforme
previsto na Súmula n. 715 do STF (“A pena unificada para atender ao limite de
30 anos de cumprimento, determinada pelo art. 75 do Código Penal, não é consi
derada para a concessão de outros benefícios, como o livramento condicional ou
regime mais favorável de execução”). Cuidando-se, todavia, de causa extintiva da
punibilidade, não há que se considerar o quantum final resultante da soma das
penas, mas cada uma delas, isoladamente. Cite-se, como exemplo, a prescrição,
que, no caso de concurso de crimes, deverá incidir sobre a pena de cada um,
isoladamente (CP, art. 119).
À semelhança do que ocorre com a guia de recolhimento, sempre que houver
qualquer cálculo de liquidação, o Juízo da Execução deverá dar ciência ao Ministério
Público, ao condenado e à Defensoria Pública. Na eventualidade de o cálculo de
liquidação de penas vir a ser alterado (ou não) em virtude de algum requerimento
das partes, o preso deverá receber, na sequência, um atestado relativo à pena a
cumprir, anualmente emitido pelo Juízo da Execução (LEP, arts. 41, XVI, e 66, X).
10 No sentido de que, havendo mais de uma condenação, com penas diversas, executa-se primeiro a
pena de reclusão com precedência sobre a detenção, em ordem cronológica, sendo irrelevante se o
delito é comum ou hediondo: STJ, 6a Turma, AgRg no HC 600.716-MS, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz,
j. 13.10.2020, DJe 21.10.2020; STJ, 5a Turma, HC 325.645/MS, Rei. Min. Felix Fischer, j. 1°.09.2016, DJe
29/9/2016; STJ, 5a Turma, AgRg no HC n. 522.195/MS, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe 8/10/2019.
11 MIRABETE. Op. cit. p. 339.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 285
12 A pena de prisão simples, aplicável ao autor de contravenções penais, é sempre cumprida em regime
semiaberto ou aberto, em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum, sem rigor peni
tenciário (LCP, art. 6o). Portanto, devem ser aplicadas, quanto ao regime inicial, as regras referentes à pena
de detenção, seja ou não reincidente o condenado. Todavia, enquanto a lei penal permite a regressão ao
regime fechado do preso condenado à pena de detenção (CP, art. 33, caput), não admite, em hipótese
alguma, o cumprimento da prisão simples em tal regime. Ou seja, a regressão, em relação a tal pena
privativa de liberdade, só poderá ocorrer do aberto para o semiaberto.
13 Para mais detalhes acerca da possibilidade de a detração ser feita pelo juiz do processo de conhecimento
ao sentenciar o feito (CPP, art. 387, §2°), remetemos o leitor ao capítulo atinente à detração.
286 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
unificação de penas, deverá ser observada, quando for o caso, a detração ou remição
(LEP, art. 111, in fine). Logo, descontado o tempo em virtude da incidência de tais
benefícios, o condenado poderá ser destinado a regime menos severo do que aquele
que lhe seria imposto diante do total das penas.
Uma vez fixado o regime inicial de cumprimento da pena pelo juiz do pro
cesso de conhecimento, sem recurso das partes, a decisão terá o condão de produzir
coisa julgada forma e material a esse respeito. Logo, ao juízo da execução não será
dado modificá-la, nem mesmo na hipótese de eventual erro material. A propósito,
em caso concreto apreciado pelo STJ, determinado acusado fora condenado à pena
de 18 (dezoito) anos de reclusão em regime inicial aberto pela prática do crime
hediondo de latrocínio. O juízo da execução, todavia, determinou o início do cum
primento da pena em regime fechado ao argumento de que o regime aberto fora
fixado de forma equivocada, já que se trata de crime hediondo. Na visão do STJ, não
há dúvidas de que teria havido um erro material, porquanto o acusado condenado
à pena de 18 anos por latrocínio jamais poderia cumprir a pena em regime inicial
aberto. Todavia, se o Ministério Público, como fiscal da lei, não interpôs embargos
de declaração, a formação da coisa julgada impediría que o regime fixado na sen
tença condenatória, ainda que equivocado, viesse a ser modificado pelo juízo da
execução.14 Logicamente, na eventualidade de superveniência de fatos novos (v.g.,
condenação diversa que obrigue a fixação de regime mais severo), poderá o Juízo
da Execução, de ofício, modificar as condições estabelecidas na sentença quanto ao
regime inicial, desde que as circunstâncias assim o recomendem.
Discute-se o procedimento a ser adotado na hipótese em que a sentença penal
condenatória for omissa em relação ao regime inicial de cumprimento da pena. De
um lado, há quem entenda que, na eventualidade de as partes não oporem embar
gos declaratórios a fim de que seja sanado o vício pelo juiz prolator da decisão, o
Tribunal poderá fazê-lo. É nesse sentido a lição de Renato Marcão. Para o autor, “a
omissão da pena ou do regime na sentença pode ser suprida em grau de recurso
sem que tal decidir acarrete qualquer violação de princípios reguladores do devido
processo penal”.15 Prevalece, todavia, o entendimento no sentido de que ao Tribunal
não é dado proceder à fixação do regime inicial, sob pena de indevida supressão de
instância, daí por que deve determinar que a omissão seja suprida pelo próprio juiz
sentenciante, baixando os autos à instância originária. Nesse contexto, como já se
pronunciou o STJ, “(...) havendo omissão na sentença penal condenatória acerca do
regime de cumprimento de pena, não cabe ao Tribunal de Justiça fixar diretamente
o regime prisional, devendo os autos serem remetidos de volta ao juízo de primeiro
grau. Todavia, a supressão da omissão pelo Tribunal de Justiça que fixa diretamente
o regime configura mera irregularidade, prevalecendo o princípio do aproveitamento
dos atos jurídicos”.16 Mas e se a sentença já tiver transitado em julgado? Nesse caso,
a doutrina sustenta que o regime inicial de cumprimento deverá ser estabelecido
pelo Juízo da Execução, devendo ser imposto o regime mais brando, conquanto
adequado à normatização do art. 33, §2°, do CP.17
Os §§2° e 3o do art. 33 do Código Penal demonstram que três fatores são deter
minantes para fins de fixação do regime inicial de cumprimento da pena privativa de
liberdade: reincidência, quantidade da pena aplicada e circunstâncias judiciais. Para
além da observância das circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do CP, devem
ser observados os seguintes critérios fixados no art. 33, § 2o, do CP: a) o condenado
a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado; b) o
condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a
8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto; c) o condenado
não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o
início, cumpri-la em regime aberto.18
O fato de as alíneas “b” e “c” fazerem menção ao condenado não reincidente
como requisito para iniciar o cumprimento da pena nos regimes semiaberto e aber
to, respectivamente, não está, a contrario sensu, afirmando que o reincidente deverá
obrigatoriamente iniciar o cumprimento da pena em regime fechado. Na verdade, o
que a alínea “c” do § 2o do art. 33 do CP está dizendo é que o condenado reincidente
não poderá iniciar o cumprimento da pena em regime aberto, ainda que positiva a
análise das suas circunstâncias judiciais.19 Agora, se a pena de reclusão é de até 4
(quatro) anos e o condenado não é reincidente, o regime inicial pode ser o fechado
ou semiaberto, a depender da análise positiva ou negativa das circunstâncias judiciais
do art. 59 do Código Penal.20 Em síntese, o art. 33, § 2o, do CP, proíbe ao reinciden
te a fixação do regime inicial aberto em qualquer caso, e o semiaberto tão somente
quando a pena for superior a 4 (quatro) anos. É exatamente nesse sentido o teor da
Súmula n. 269 do STJ: “É admissível a adoção do regime prisional semiaberto aos
reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro anos se favoráveis as cir
cunstâncias judiciais”. Em síntese, podem ser fixadas as seguintes regras para fins de
fixação do regime prisional inicial:
Soares da Fonseca, j. 21.11.2017, DJe 29.11.2017; STJ, 5a Turma, HC 174.631-PE, Rei. Min. Jorge Mussi, j.
23.08.2011, DJe 02.09.2011.
17 AVENA. Op. cit. p. 207.
18 Sem embargo da redação expressa do CP, a 1a Turma do Supremo Tribunal Federal tem precedentes
admitindo a fixação do regime inicial aberto em favor de agente condenado pela prática de crime de
furto, ainda que portador de maus antecedentes e reincidente. A propósito, confira-se: STF, 1a Turma, HC
135.164/MT, Rei. Min. Alexandre de Moraes, j. 23/04/2019.
19 No sentido de que não é possível ao réu reincidente, condenado à pena inferior a 4 (quatro) anos, mesmo
quando favoráveis as circunstâncias judiciais, iniciar o cumprimento da pena privativa de liberdade no
regime aberto, revelando-se correta, portanto, a fixação do regime intermediário para cumprimento da
reprimenda (Súmula 269/STJ): STJ, 5a Turma, HC 285.428/RS, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 20/10/2015, DJe
26/10/2015.
20 Reconhecendo a possibilidade de fixação do regime semiaberto a condenados reincidentes cuja pena
seja igual ou inferior a quatro anos, consideradas as demais circunstâncias judiciais (art. 59) em plano
favorável: STJ, 6a Turma, REsp 203.584/SP, Rei. Min. Vicente Leal, j. 29/03/2000 p. 147; STJ, 6a Turma, REsp
175.207/SP, Rei. Min. Hamilton Carvalhido, j. 14/09/1999, DJ 17/12/1999; STJ, 3a Seção, EREsp 182.680/
SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 22/11/2000, DJ 18/12/2000 p. 155; STJ, 5a Turma, HC 309.521/SP, Rei. Min.
Felix Fischer, j. 22/09/2015, DJe 13/10/2015; STJ, 5a Turma, AgRg no HC 286.839/SP, Rei. Min. Reynaldo
Soares da Fonseca, j. 25/08/2015, DJe 01/09/2015.
288 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
21 Admitindo a fixação do regime inicial fechado para condenado reincidente portador de maus antecedentes
e dotado de circunstâncias judiciais desfavoráveis, ainda que a pena tenha sido fixada em patamar inferior
a 4 (quatro) anos de reclusão: STJ, 6a Turma, HC 331.376/SP, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j.
01/10/2015, DJe 22/10/2015.
22 Nesse contexto: STJ, 5a Turma, HC 123.216/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 16/04/2009, DJe 18/05/2009; STJ,
5a Turma, HC 99.366/SP, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 29/10/2009, DJe 14/12/2009; STJ, 5a Turma, HC 76.919/
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 289
crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que
o permitido segundo a pena aplicada”. Na mesma linha, confira-se o teor da Súmula n.
440 do STJ: ’ ‘Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime
prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sançaõ imposta, com base apenas
na gravidade abstrata do delito”. Exemplificando, por serem demasiadamente genéricas
e, portanto, passíveis de serem invocadas para qualquer conduta de tráfico de drogas,
afirmativas de que o delito de tráfico de drogas é grave, causa repulsa social, gera danos
à saúde, destrói a vida de jovens, desestrutura famílias e dá causa ao cometimento de
outros delitos, entre outras, não constituem motivação hábil a embasar a fixação de
regime prisional mais gravoso do que aquele compatível com a sanção imposta. Na
mesma linha, no crime de roubo, o emprego de arma de fogo não autoriza, por si só,
a imposição do regime inicial fechado se, primário o acusado, a pena tiver sido fixada
no mínimo legal.23
Desde que o julgador não se reporte apenas à gravidade abstrata do crime
(súmulas 718 do STF e 440 do STJ), admite-se a imposição em relação ao con
denado primário de um regime inicial mais rigoroso do que aquele permitido
exclusivamente pela quantidade da pena aplicada. Com efeito, eis o teor do art.
33, §3°, do Código Penal: “A determinação do regime inicial de cumprimento
da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Códi
go”. Por consequência, é perfeitamente possível, a título de ilustração, a fixação
do regime fechado a agente primário condenado a 5 (cinco) anos de reclusão,
conquanto as circunstâncias judiciais do art. 59, caput, do Código Penal, lhe
sejam completamente desfavoráveis. É exatamente nesse sentido, aliás, a Súmula
n. 719 do STF: “A imposição do regime de cumprimento mais severo do que
a pena aplicada permitir exige motivação idônea”. Não por outro motivo, em
caso concreto versando sobre crime de roubo circunstanciado no qual a vítima
e uma amiga foram privadas da liberdade por cerca de 40 minutos, tempo em
que permaneceram sendo ameaçadas de morte sob a mira de arma de fogo, a
6a Turma do STJ afastou o reconhecimento da ilegalidade da escolha do regime
inicial fechado, vez que apontados dados fáticos suficientes a indicar a gravi
dade concreta do crime - o emprego de arma de fogo, a restrição de liberdade
da vítima e o concurso de agentes, com periculosidade e destemor exacerbados
-, ainda que o agente seja primário e o quantum da pena - 5 (cinco) anos e 8
(oito) meses de reclusão - seja inferior a 8 anos.24
Antigamente, era comum que fosse negada ao estrangeiro em situação irregular
no país a possibilidade de fixação do regime inicial semiaberto ou aberto, sobretudo
quando instaurado procedimento expulsório ou se acaso já tivesse sido decretada
sua expulsão. Atualmente, porém, a nova Lei de Migração passou a dispor expressa
RJ, Rei. Min. Felix Fischer, j. 20/11/2007, DJ 17/12/2007 p. 247; STJ, 6a Turma, HC 90.915/SP, Rei. Min. Jane
Silva - Desembargadora convocada do TJ/MG -, j. 25/02/2008, DJe 10/03/2008.
23 A propósito, confira-se: STJ, 5a Turma, AgRg no HC 303.275/SP, Rei. Ministro Jorge Mussi, j. 03/02/2015; STJ,
6a Turma, HC 298.810/RJ, Rei. Ministro Sebastião Reis Júnior, j. 24/02/2015; STJ, 5a Turma, HC 309.939/SP,
Rei. Min. Newton Trisotto - Desembargador convocado do TJ/SC -, j. 28/04/2015, DJe 19/05/2015.
24 STJ, 6a Turma, HC 282.211 /SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 18.03.2014, DJe 07.04.2014.
290 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
3. PROGRESSÃO DE REGIMES
27 Por cautela, o STF conferiu efeito ex nunc a essa decisão. Consequentemente, é vedada a retroatividade
de seus efeitos para atingir condenados que, à época, já tivessem cumprido integralmente sua pena em
regime fechado, consoante entendimento jurisprudencial anterior. Assim, o Supremo busca evitar possíveis
ações cíveis indenizatórias.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 293
28 STJ, 5a Turma, HC 53.506/BA, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 18/02/2010, DJe 15/03/2010.
29 O §2° do art. 2o da Lei n. 8.072/90 foi revogado pelo Pacote Anticrime, que também estabeleceu novos
parâmetros objetivos para a progressão de regimes no art. 112 da LEP.
294 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
30 STF, 1a Turma, HC 94.025/SP, Rei. Min. Menezes Direito, j. 03/06/2008, DJe 142 31/07/2008. Na mesma
linha: STF, Ia Turma, HC 94.212/SP, Rei. Min. Carlos Britto, j. 03/06/2008, DJe 177 18/09/2008; STF, Pleno,
RE 579.167/AC, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 16/05/2013.
31 Paradigma: STF, Pleno, RE 579.167, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 16.05.2013, DJe 18.10.2013.
32 Nessa linha: STJ, 5a Turma, REsp 1.491.421/RS, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 04/12/2014, DJe 15/12/2014; STJ, 6a
Turma, HC 301.481/SP, Rei. Min. Ericson Maranho - Desembargador convocado do TJ/SP -, j. 02/06/2015,
DJe 11/06/2015. Para Alberto Silva Franco (op. cit. p. 376), tendo em conta que os crimes hediondos e os
crimes a eles assemelhados fazem parte, em verdade, de um subsistema constitucional penal fechado e
autônomo alavancado pelo inciso XLIII do art. 5o da Constituição Federal, o conceito de reincidência a que
se refere o art. 2o, § 2o, da Lei n° 8.072/90, deve ser buscado dentro desse subsistema e não no sistema
geral e aberto do Código Penal. Dessa forma, o cumprimento de 3/5 da pena no regime anterior só deve
ser exigido em relação aos condenados que pratiquem novo crime hediondo já tendo contra si sentença
condenatória irrecorrível por outro crime hediondo (ou equiparado).
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 295
33 Essa espécie de progressão especial para mulheres gestantes ou que sejam mãe ou responsável por crianças
ou pessoas com deficiência, prevista nos §§3° e 4o do art. 112 da LEP, será objeto de análise na sequência.
34 STF, Pleno, HC 111.840/ES, Rei. Min. Dias Toffoli, 27/06/2012.
35 Paradigma: STF, Pleno, ARE 1,052.700/MG, Rei. Min. Edson Fachin, j. 02.11.2017, DJ 01.02.2018.
36 STJ, 5a Turma, HC 286.925/PR, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 13/05/2014, DJe 21/05/2014.
296 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
37 STF, 1a Turma, HC 123.316/ES, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 09/06/2015, DJe 154 05/08/2015.
38 Admitindo a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e a fixação de regime
inicial aberto para o crime de tráfico de drogas: STF, 2a Turma, HC 111.844/SP, Rei. Min. Celso de Mello, j.
24/04/2012; STF, 2a Turma, HC 112.195/SP, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 24/04/2012. No mesmo contexto:
STJ, 3a Seção, EREsp 1.285.631/SP, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 24/10/2012; STF, 2a Turma, HC 133.308/
SP, Rei. Min. Cármen Lúcia, j. 29/03/2016.
39 STJ, 5a Turma, HC 218.558/RJ, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 11/12/2012, DJe 17/12/2012.
40 STJ, 5a Turma, HC 209.270/SP, Rei. Min. Campos Marques - Desembargador convocado do TJ/PR -, j.
11/12/2012, DJe 17/12/2012. Para a 1a Turma do STF (HC 130.411/SP, Rei. Min. Edson Fachin,j. 12/04/2016),
não se tratando de réu reincidente, ficando a pena no patamar de quatro anos e sendo as circunstâncias
judiciais positivas, deve ser aplicado o regime aberto, sem prejuízo de eventual substituição da pena priva
tiva de liberdade por restritiva de direitos. Admitindo a fixação do regime inicial semiaberto para indivíduo
condenado pela prática do crime de tráfico de drogas, conquanto se trate de pessoa não reincidente, com
pena superior a 4 e inferior a 8 anos, com circunstâncias judiciais favoráveis: STF, 2a Turma, HC 140.441/
MG, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 28/03/2017.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 297
de progressão será aquele previsto no inciso I do art. 112, é dizer, 16% (dezesseis
por cento); se reincidente, 20% (vinte por cento), ex vi do art. 112, inciso II, da LEP.
Ainda em relação ao crime de tráfico privilegiado previsto no art. 33, §4°,
da Lei n. 11.343/06, especial atenção deve ser dispensada ao Habeas Corpus
Coletivo n. 596.603/SP,41 impetrado pela Defensoria Pública do Estado de
São Paulo perante a 6a Turma do STJ para fins de impugnar a manutenção de
mais de 1.100 presos (homens e mulheres) pela prática do referido delito que
estariam cumprindo pena de um ano e oito meses em regime fechado, com
respaldo exclusivo no ultrapassado entendimento de que a conduta em questão
caracterizaria crime assemelhado a hediondo, no bojo do qual foram firmadas
as seguintes conclusões:
1. Firmada a premissa de que, nos exatos termos do art. 112, §5°, da LEP,
não é considerado hediondo o delito de tráfico de drogas, na modalidade pre
vista no art. 33, §4°, da Lei n. 11.343/06, fica desautorizada a prisão preventiva
sem a análise concreta dos requisitos do art. 312 do CPP, afasta-se a proibição
prevista no art. 44 da Lei de Drogas no sentido de vedação à substituição da
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, impondo-se, portanto,
tratamento penal com “contornos mais benignos, menos gravosos, notadamente
porque são relevados o envolvimento ocasional do agente com o delito, a não
reincidência, a ausência de maus antecedentes e a inexistência de vínculo com
organização criminosa”;42
2. Quanto ao regime inicial para o cumprimento da pena, é clara e reiterada
a dicção de enunciados sumulares dos Tribunais Superiores, segundo os quais “A
opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motiva
ção idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a
pena aplicada” (Súmula n. 718 do STF), “A imposição do regime de cumprimento
mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea” (Súmula
n. 719 do STF) e “Ê vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso
do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade do
delito” (Súmula n. 440 do STJ). Esses julgados, por força do art. 927, III e V, do
CPC, aplicável ao processo penal em razão da norma de abertura positivada no
art. 3o do CPP, devem ser observados por juizes e tribunais do país, em nome da
segurança jurídica, da estabilidade das decisões do Poder Judiciário, da coerência
sistêmica e da igualdade de tratamento dos jurisdicionados, que não podem ficar
à mercê de interpretações divergentes, sobre questões de cunho eminentemente
jurídico, das que lhes conferiram os órgãos de cúpula do Poder Judiciário, incum
bidos, por comando constitucional, da função de uniformizar a interpretação e a
aplicação da Constituição da República e das leis federais (arts. 102, III e 105, III).
Se o Código Penal determina que, fixada a sanção em patamar inferior a 4 anos
de reclusão, o regime inicial de pena há de ser o aberto quando as circunstâncias
forem todas favoráveis ao agente (art. 33, § 2o c/c 59, do CP), permitindo também
substituir a reprimenda privativa de liberdade por restritiva de direitos (art. 44
do CPB), não há razão para impor-se a condenados pela modalidade mais tênue
do crime de tráfico de entorpecentes o mesmo regime de pena que, ex vi lege, se
costuma impingir somente a quem é condenado por outros crimes, ou mesmo por
tráfico, a mais de 8 anos de pena, ou a reincidentes ou portadores de circunstân
cias desfavoráveis. Portanto, o condenado por tráfico privilegiado a pena inferior
a 4 (quatro) anos de reclusão faz jus a cumprir a reprimenda em regime inicial
aberto ou, excepcionalmente, em semiaberto, desde que, por motivação idônea,
não decorrente da mera natureza do crime, de sua gravidade abstrata ou da opi
nião pessoal do julgador. Nessas mesmas condições e ressalvas, o condenado pelo
crime de tráfico privilegiado também faz jus à substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos;
3. Levando-se em consideração que o Ministério Público, a par da função
exclusiva de exercitar a ação penal pública, também é constitucionalmente in
cumbido da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses
sociais e individuais indisponíveis, e deve agir de acordo com critérios de obje
tividade, compromissado, pois, com o direito e com a verdade, a acusação por
ele formulada há de consubstanciar uma imputação responsavelmente derivada
da realidade fático-jurídica evidenciada pelo simples exame do inquérito poli
cial, muitas vezes já indicativa de que não se cuida de hipótese de subsunção
da conduta do agente ao crime de tráfico de drogas previsto no caput do art.
33 da Lei n. 11.343/06;
4. O autor do crime previsto no art. 33, § 4o, da Lei de Drogas, não pode per
manecer preso preventivamente, após a sentença (ou mesmo antes, se a segregação
cautelar não estiver apoiada em quadro diverso), porque:
4.1. O Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal - e copiosa jurisprudência
das Cortes Superiores - afastou a vedação à liberdade provisória referida no art. 44
da LAD;
4.2. Não é cabível prisão preventiva por crime punido com pena privativa
máxima igual ou inferior a 4 anos, nos exatos termos do art. 313, inciso I, do CPP;
4.3. O tempo que o condenado eventualmente tenha permanecido preso
deverá ser computado para fins de determinação do regime inicial de pena
privativa de liberdade (art. 387, § 2o do CPP), o que, a depender do tempo da
custódia e do quantum da pena arbitrada, implicará imediata soltura do sen
tenciado, mesmo se fixado o regime inicial intermediário, ou seja, o semiaberto
(dado que, como visto, não se mostra possível a inflição de regime fechado ao
autor de tráfico privilegiado).
Com base em todos esses argumentos, a ordem foi concedida no referido writ
coletivo para fins de: a) fixar o regime aberto para aqueles presos que foram con
denados por tráfico privilegiado a pena de 1 ano e 8 meses em regime fechado; b)
em relação aos presos condenados pelo citado delito a penas menores do que 4 anos
300 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
de reclusão, para fins de determinar que os respectivos juizes das varas de execu
ção penal reavaliassem a situação de cada um, de modo a verificar a possibilidade
de progressão ao regime aberto em face de eventual eetração penal decorrente do
período em que permaneceram presos cautelarmente; c) no tocante aos condena
dos que estivessem cumprindo pena por crime de tráfico privilegiado, conquanto
favoráveis todas as circunstâncias, para fins de determinar que não fosse imposto
o regime inicial fechado de cumprimento da pena.
44 LEP: Art. 112. (...) §1° Em todos os casos, o apenado só terá direito à progressão de regime se ostentar
boa conduta carcerária, comprovada pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam
a progressão".
45 Supondo que determinado acusado tenha sido processado e condenado pela prática de um crime perma
nente, como, por exemplo, o delito de organização criminosa (Lei n. 12.850/13, art. 2o), se restar demonstrado
que, mesmo após a propositura da peça acusatória, o acusado continuou praticando a referida conduta
delituosa - no exemplo dado, mantendo-se associado de maneira estável e permanente ao referido grupo
-, esse novo fato delituoso pode ser objeto de novo processo penal, porquanto não protegido pelos limites
objetivos da coisa julgada. Posteriormente, reconhecida a hipótese de crime permanente continuado, já
que ambos os delitos podem ter sido praticados com homogeneidade de circunstâncias de tempo, lugar
e modus operandi, nada impede que as penas sejam unificadas durante o curso da execução penal.
46 STJ, 5a Turma, HC 41.606/SP, Rei. Min. Gilson Dipp, DJ 01/08/2005.
302 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
47 ARAS, Vladimir. Projeto de Lei "Anticrime" e o conceito de crime organizado. In Projeto de Lei Anticrime. Co
ordenadores: Antônio Henrique Graciano Suxberger; Renee do Ó Souza; Rogério Sanches Cunha. Salvador:
Juspodivm, 2019. p. 68.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 303
indivíduo, por exemplo, tiver sido condenado a 8 (oito) anos e 4 (quatro) meses de
pena privativa de liberdade em regime inicial fechado, poderá postular a progressão
para o semiaberto após o cumprimento de ao menos 1 (ano) e 4 (quatro) meses, o
que corresponde a 16% (dezesseis por cento) do total da pena imposta;
II - cumprimento de ao menos 20% (vinte por cento) da pena, se o apena
do for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça:
não se reclama a reincidência específica, ou seja, pelo mesmo tipo penal anterior.
Basta a presença de duas condenações por quaisquer crimes sem violência à pessoa
ou grave ameaça (v.g., apropriação indébita e furto). Na sistemática anterior ao
Pacote Anticrime, o quantum necessário para a progressão nesses casos era de 1/6
(um sexto), ou seja 16,66% da pena no regime anterior. Doravante, o patamar será
de 20%, o que equivale a 1/5 (um quinto). Trata-se, pois, o inciso II do art. 112
da LEP, com redação determinada pela Lei n. 13.964/19, de evidente exemplo de
novatio legis in pejus, de aplicação restrita, portanto, aos crimes cometidos após a
vigência do Pacote Anticrime (23/01/2020). O fato de a reincidência ser levada em
consideração para dificultar a progressão de regimes não caracteriza bis in idem,
nem tampouco viola o princípio da individualização da pena. Sobre o assunto, o
Plenário do Supremo concluiu ser constitucional a aplicação da reincidência não só
como agravante da pena em processos criminais (CP, art. 61, inciso I), mas também
como fator impeditivo para a concessão de diversos benefícios, sem que se possa
objetar a configuração de bis in idem Na visão da Corte, a reincidência não contraria
ria a individualização da pena. Ao contrário, levar-se-ia em conta, justamente, o
perfil do condenado, ao distingui-lo daqueles que cometessem a primeira infração
penal.50 De se notar que há precedentes do STJ no sentido de que, “consistindo a
reincidência em condição pessoal que, uma vez adquirida pelo sentenciado, influi
sobre o requisito objetivo dos benefícios da execução, em relação a todas as suas
condenações”.51 Logo, na eventualidade de o condenado cumprir pena por crime
por ele cometido enquanto primário, se vier a ser condenado definitivamente por
novo crime, agora reconhecido reincidente, deverá ser tratado como tal para fins
de progressão em relação a ambos os crimes após a unificação das reprimendas.
Em conclusão, convém ressaltar que é firme o entendimento jurisprudencial do STJ
no sentido de que o juízo da execução pode promover a retificação do atestado de
pena para constar a reincidência, com todos os consectários daí decorrentes, ainda
que não esta não tenha constado expressamente da sentença penal condenatória
transitada em julgado. Tratando-se de sentença penal condenatória, o juízo da exe
cução deve se ater ao teor do referido decisum, no que diz respeito ao quantum de
pena, ao regime inicial, bem como ao fato de ter sido a pena privativa de liberdade
substituída ou não por restritiva de direitos, fatores que evidenciam justamente o
comando emergente da sentença. Todavia, as condições pessoais do réu, da qual é
exemplo a reincidência, devem ser observadas na execução da pena, independente
de tal condição ter sido considerada na sentença condenatória, eis que também é
50 STF, Plenário, RE 453.000/RS, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 04/04/2013. Na mesma linha: STF, Plenário, HC
94.361/RS, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 04/04/2013.
51 STJ, 5a Turma, HC 468.756/RS, Rei. Min. Felix Fischer, j. 26/03/2019, DJe 03/04/2019.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 305
52 STJ, 3a Seção, EREsp 1.738.968/MG, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 27/11/2019, DJe 17/12/2019.
306 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
aplica-se a fração da progressão de 25% (vinte e cinco) por cento do inciso III do
art. 112 da LEP. Poder-se-ia objetar, contra tal entendimento, que o agente não seria
“primário”, como exige o inciso III, daí por que o patamar ali previsto não seria
aplicável. Porém, diante da lacuna involuntária da lei, a “primariedade” a que se
refere tal dispositivo deve ser interpretada não apenas à luz do art. 63 do CP, mas
também em contraposição ao inciso IV, que faz remissão à reincidência em crime
cometido com violência à pessoa ou grave ameaça. Por conseguinte, o “primário” do
inciso III deve abranger não apenas o apenado primário propriamente dito, mas
também o reincidente genérico; b) se o crime antecedente tiver sido cometido com
violência ou grave ameaça (v.g., roubo) e o subsequente não (v.g., furto qualificado),
tal indivíduo deve ser considerado reincidente em crime cometido sem violência à
pessoa ou grave ameaça, daí por que o quantum a ser observado é o do inciso II
do art. 112, qual seja, o de 20% (vinte por cento);
V - cumprimento de ao menos 40% (quarenta por cento) da pena, se o
apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for
primário: para os crimes cometidos após a vigência da Lei n. 11.464/07 (29/03/2007),
responsável pela nova redação então conferida ao revogado §2° do art. 2o da Lei n.
8.072/90, a progressão de regimes para condenados pela prática de crimes hediondos
e equiparados estava condicionada ao cumprimento de 2/5 (dois quintos), ou seja,
40% (quarenta por cento) da pena, se o indivíduo fosse primário. Logo, não houve
nenhuma mudança quantitativa decorrente da entrada em vigor do Pacote Anticrime.
Foi mantido o mesmo patamar de 40%, cuja aplicação, porém, está condicionada ao
fato de se tratar de apenado primário condenado pela prática de crime hediondo ou
equiparado53 sem resultado morte, eis que, neste caso, aplicar-se-á o quantum de 50%
(cinquenta por cento), ex vi do art. 112, inciso VI, alínea “a”, da LEP. Na eventuali
dade de o indivíduo ser condenado por crimes hediondos (ou equiparados) e crimes
comuns, a progressão de regime deve ser calculada, no tocante àqueles, com base no
percentual correspondente (40%, 50%, 60% ou 70%) para, somando-se ao restante
da pena imposta, verificar se já houve o implemento do percentual correspondente
ao delito não hediondo, sempre levando-se em consideração o total da pena apli
cada. Vejamos o exemplo citado por Masson:54 “João, primário, foi condenado a 10
(dez) anos de reclusão por estupro (crime hediondo), e a mais 14 (quatorze) anos,
por dois roubos com emprego de arma branca, em concurso material, totalizando
a pena de 24 (vinte e quatro) anos. Se presente o mérito, a progressão será possível
após 6 anos do início da execução da pena, pois ele terá cumprido ao menos 40%
da pena do crime hediondo (LEP, art. 112, V), ou seja, 4 anos, bem como 25% do
total da pena, percentual aplicável aos crimes cometidos com violência ou grave
ameaça (LEP, art. 112, III)”. Considerando-se que o inciso VII do art. 112 da LEP
exige o cumprimento de 60% da pena se o apenado for reincidente específico na
53 Os crimes hediondos, que serão objeto de análise na sequência, estão listados no art. 1o da Lei n. 8.072/90,
cuja redação foi sensivelmente alterada pelo Pacote Anticrime. Os delitos equiparados a hediondos são o
tráfico de drogas, a tortura e o terrorismo. Como será visto adiante, para fins de progressão de regimes,
o tráfico de drogas privilegiado previsto no art. 33, §4°, da Lei n. 11.343/06 não é considerado crime
equiparado a hediondo (LEP, art. 112, §5°, incluído pela Lei n. 13.964/19).
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 307
55 Paradigma: STJ, 3a Seção, REsp 1.910.240/MG, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 26.05.2021, DJe 31.05.2021.
56 Paradigma: STF, Pleno, ARE 1,327.963/SP, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 17.09.2021.
308 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
57 Lei n. 12.850/13: Art. 2o Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pes
soa, organização criminosa: Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas
correspondentes às demais infrações penais praticadas. (...) §3° A pena é agravada para quem exerce o
comando, individual ou coletivo, da organização criminosa, ainda que não pratique pessoalmente atos de
execução".
58 As mudanças produzidas pelo Pacote Anticrime no âmbito da Lei das Organizações Criminosas serão objeto
de análise mais adiante.
59 CP: Art. 288-A. Constituir, organizar, integrar, manter ou custear organização paramilitar, milícia particular,
grupo ou esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos crimes previstos neste Código: Pena - re
clusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos.
60 Ao contrário da alínea anterior ("b"), a alínea "c" do inciso VI do art. 112 da LEP não demanda o exercício
de posição de comando na organização paramilitar, na milícia particular ou no grupo de extermínio, nem
tampouco que tal associação esteja estruturada para a prática de crimes hediondos ou equiparados.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 309
já que é muito comum que seus integrantes sejam policiais ou militares (ou ex-
-policiais e militares da reserva ou reformados);61 ii) milícia particular: ante
a ausência de uma definição legal do conceito de “milícia privada”, a doutrina
costuma apontar algumas características peculiares a esses grupos, tais como o
controle de um território e da população que nele habita por parte de um grupo
armado irregular, o caráter coativo desse controle, o ânimo de lucro individual
como motivação central, um discurso de legitimação referido à proteção dos
moradores e à restauração da segurança, e a participação ativa e reconhecida
dos agentes do Estado;62 iii) grupo ou esquadrão: à primeira vista, como o art.
288-A do CP refere-se à formação de grupo ou esquadrão com a finalidade de
praticar qualquer dos crimes previstos neste Código, poder-se-ia concluir que
sua criação estaria relacionada à prática de qualquer crime previsto no Códi
go Penal. Fosse esta a melhor interpretação, o dispositivo seria esvaziado por
completo, já que seu conceito acabaria se confundindo com o próprio delito de
associação criminosa, com a única diferença de que, para fins de tipificação do
art. 288, caput, do CP, a associação tem o fim de cometer quaisquer crimes, não
necessariamente previstos no Código Penal, como ressalva o art. 288-A. Por isso,
o art. 288-A deve ser submetido a uma interpretação teleológica junto à Lei n°
12.720/12, para fins de se concluir que a finalidade da formação desse grupo
ou esquadrão está voltada à prática de crimes de extermínio de seres humanos.
Afinal, consta do enunciado da referida Lei que seu objetivo é dispor sobre o
crime de extermínio de seres humanos. Portanto, esse grupo ou esquadrão a que
se refere o art. 288-A deve ter como especial fim de agir o extermínio de seres
humanos, sendo formado por particulares e também por policiais autointitulados
de “justiceiros”. A palavra extermínio pode ser compreendida como a “chacina”,
o “aniquilamento”, a “destruição com mortandade de pessoas”. Esse extermínio
tem como característica principal a impessoalidade, isto é, mata-se uma pessoa
sem que o executor do delito sequer saiba seu nome. Na verdade, a vítima é
assassinada em virtude de alguma característica especial de natureza política,
social, religiosa, étnica, ou qualquer outro traço peculiar capaz de identificá-la
como membro de um grupo a ser exterminado (v.g., menores de rua, mendigos,
prostitutas etc.);
VII - cumprimento de ao menos 60% (sessenta por cento) da pena, se o
apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado: quando
ainda em vigor o §2° do art. 2o da Lei n. 8.072/90, o indivíduo condenado pela
61 Com entendimento semelhante: GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte especial. 9a ed. Niterói/RJ:
Editora Impetus, 2013. p. 224.
62 São essas as características peculiares às milícias apontadas pelo sociólogo Ignácio Cano, citado no Relatório
Final da Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Resolu
ção n° 433/2008), destinada a investigar a ação dessas milícias naquele Estado. Para Cleber Masson (op. cit.
p. 477), milícia privada "é o agrupamento armado e estruturado de civis - inclusive com a participação de
militares fora das suas funções - com a pretensa finalidade de restaurar a segurança em locais controlados
pela criminalidade, em face da inoperância e desídia do Poder Público, e como recompensa são remunerados
por empresários e pelas pessoas em geral".
310 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
63 Como destaca Masson (op. cit. p. 490), "se a mulher não for mãe da criança ou da pessoa com deficiên
cia, a situação de responsável deve ser interpretada ampliativamente, abrangendo a guarda, a tutela e a
curatela, bem como situações informais em que a condenada era a única pessoa que cuidava da criança
ou da pessoa com deficiência (exemplo: vizinha que assumiu os cuidados de criança cujos pais foram
assassinados)". O autor também destaca que a "condenada não terá direito à progressão especial se tiver
sido judicialmente decretada sua suspensão ou destituição do poder familiar, por qualquer motivo diverso
do cumprimento da pena".
64 Lei n. 8.069/90: "Art. 2o. Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa com até doze anos de
idade incompletos".
65 Lei n. 13.146/15 (Estatuto da Pessoa com Deficiência): "Art. 2o. Considera-se pessoa com deficiência
aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual,
em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdade de condições com as demais pessoas". Nesse caso, pouco importa a idade da pessoa com
deficiência, leia-se, se se trata de criança, adolescente ou adulto.
312 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
do art. 112 da Lei de Execução Penal. Conquanto o referido dispositivo tenha sido
revogado pela Lei n. 13.964/19, consideramos que o mesmo entendimento deve ser
mantido. A uma porque, ao promover a introdução dessa progressão especial na
LEP, a Lei n. 13.768/18 claramente estendeu sua abrangência aos crimes hediondos
e equiparados, tanto é que alterou a redação do então vigente §2° do art. 2o da Lei
n. 8.072/90. A duas porque não consta do art. 112, §3°, da LEP, qualquer ressalva
quanto à natureza hedionda ou equiparada do crime. Ao revogar o §2° do art. 2o da
Lei n. 8.072/90, o Pacote Anticrime não teve a intenção de alterar a sistemática até
então vigente, fazendo-o tão somente com o objetivo de expurgar do ordenamento
jurídico os critérios objetivos para a progressão de regimes em crimes hediondos e
equiparados até então vigentes - 2/5 (dois quintos), se primário; 3/5 (três quintos),
se reincidente. Quisesse a Lei n. 13.964/19 restringir a concessão da progressão es
pecial aos crimes hediondos e equiparados, deveria ter alterado a redação do §3° do
art. 112 da LEP. Se não o fez, ao intérprete não é dado fazê-lo, sob pena de odiosa
violação ao princípio da legalidade.66
66 Em sentido diverso, Masson (Op. cit. p. 491) entende que na hipótese de crime hediondo ou equiparado,
deverão ser respeitados os índices de 40%, 50%, 60% ou 70%, dependendo da primariedade ou reinci
dência, e de eventual resultado morte (LEP, art. 112, V, VI, "a", VII e VIII).
67 STF, Pleno, EP 22 ProgReg-AgR/DF, Rei. Min. Roberto Barroso, j. 17/12/2014, DJe 52 17/03/2015. Com en
tendimento semelhante: STJ, 5a Turma, AgRg no REsp 1.786.891/PR, Rei. Min. Felix Fischer, DJe 23/09/2020.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 313
Todavia, para que essa reparação do dano (ou devolução do produto do ilí
cito) prevista no art. 33, §4°, do CP faça parte da execução penal, condicionando
a progressão de regime, é indispensável que conste expressamente da sentença
condenatória, de forma individualizada e em observância ao princípios do devido
processo legal, da ampla defesa e do contraditório, sob pena de se ter verdadeira
revisão criminal contra o condenado. Partindo da premissa de que a execução penal
deve guardar relação com o título condenatório firmado no juízo de conhecimento,
ao Juízo da Execução Penal não é dado agregar como condição para a progressão
capítulo condenatório expressamente decotado.68
68 STJ, 5a Turma, HC 686.334/PE, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 14.09.2021, DJe 20.09.2021.
69 A título de exemplo de norma que veda a progressão, podemos citar o art. 2o, §9°, da Lei n. 12.850/13,
incluído pelo Pacote Anticrime. Para mais detalhes acerca do referido dispositivo, inclusive no tocante a
sua (in) constitucionalidade à luz do princípio da individualização da pena na fase da execução penal,
remetemos o leitor aos comentários ao tópico "vedação da progressão".
70 Negando a progressão de regimes a apenado com histórico prisional maculado pelo total de nove atos
de indisciplina, consistentes em tumultos, agressão a sentenciado, posse de celular, abandono, apreensão
de entorpecentes: STJ, 6a Turma, AgRg no HC 660.197-SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 17.08.2021, DJe
25.08.2021.
71 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 545.048-RJ, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 20.02.2020, Dje 05.03.2020; STJ, 6a
Turma, AgRg no HC 550.407-SC, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 18.02.2020, Dje 27.02.2020.
72 STJ, 5a Turma, HC 544.368-SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 05.12.2019, DJe 17.12.2019; STJ,
5a Turma, AgRg no REsp 1.834.964-RS, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 21.11.2019, DJe 29.11.2019; STJ, 6a
Turma, AgRg no HC 504.294-SP, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 03.09.2019, DJe 12.09.2019; STJ, 6a Turma, HC
505.302-SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 25.06.2019, DJe 01.07.2019.
314 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
ii. até mesmo antes desse período de 1 (um) ano, se acaso tiver havido o
cumprimento do requisito temporal exigível para a obtenção do direito: como
exposto anteriormente, ao dispor que o bom comportamento será readquirido
inclusive antes do decurso de 1 (um) ano após a ocorrência do fato, desde que
tenha havido o cumprimento do requisito temporal exigível para a obtenção do
direito, fica a impressão, à primeira vista, que sequer haveria a necessidade de
se aferir qualquer requisito subjetivo por parte do condenado. Afinal, o próprio
dispositivo prevê que o preenchimento dos requisitos objetivos necessários à
progressão - art. 112, incisos I a VIII, da LEP -, isoladamente considerado, já
teria o condão de outorgar ao condenado o “bom comportamento” necessário à
progressão de regime. Ter-se-ia, assim, uma presunção absoluta de que o preen
chimento dos requisitos objetivos, de per si, traria como consequência inexorável
a reabilitação do condenado. Essa interpretação, todavia, vem na contramão do
próprio Código Penal, cujo art. 33, §2°, prevê que as penas privativas de liberdade
deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado.
Atentaria, ademais, contra o próprio princípio da individualização da pena, em
sua fase executória, porquanto autorizaria, em tese, a progressão de regimes
diante do mero cumprimento do requisito temporal exigível para a obtenção do
direito (requisito objetivo), independentemente de uma efetiva e apurada análise
da presença de bom comportamento (requisito subjetivo). Destarte, sob pena de
esvaziamento do requisito subjetivo, inerente ao próprio sistema progressivo, o
ideal é interpretar o art. 112, §7°, in fine, da LEP, em conjunto com o §1° do
mesmo dispositivo normativo, o qual, como visto anteriormente, é categórico
ao dispor que o apenado só terá direito à progressão de regime se ostentar boa
conduta carcerária, comprovada pelo diretor do estabelecimento. Em síntese:
admite-se, mesmo antes do decurso do prazo de 1 (um) ano da ocorrência do
fato, na hipótese de cumprimento do requisito temporal exigível para a obtenção
da progressão de regime, a possibilidade de reaquisição do bom comportamento,
cuja presença no caso concreto, todavia, continua condicionada à manifestação
positiva do diretor do estabelecimento prisional (LEP, art. 112, §1°, com redação
dada pela Lei n. 13.964/19).
LEP é estabelecido na lei federal ou local para a prisão albergue ou outra espécie
de regime aberto. As condições impostas pelo juiz, por sua vez, subdividem-se
da seguinte forma:
a.l. Condições gerais ou obrigatórias: partindo da premissa de que, uma
vez deferida a progressão para o regime aberto, o condenado será colocado em
liberdade por várias horas por dia, é intuitivo que o legislador estabelecesse
certas condições de modo a permitir um maior e melhor controle do curso da
execução. Dentro desse contexto, para além de condições especiais que podem
ser fixadas, facultativamente, pelo Juízo da Execução, deverão ser fixadas as
seguintes condições gerais e obrigatórias: i. permanecer no local em que for
designado, durante o repouso e nos dias de folga; ii. sair para o trabalho e
retornar, nos horários fixados; iii. não se ausentar da cidade onde reside, sem
autorização judicial; iv. comparecer a Juízo, para informar e justificar as suas
atividades, quando for determinado: na visão do STJ, o período de suspensão
do dever de apresentação mensal em juízo, em razão da pandemia de Covid-19,
pode ser reconhecido como pena efetivamente cumprida.75 Ora, se a suspensão
do dever de apresentação mensal em Juízo foi determinada pelo magistrado em
cumprimento à Recomendação n. 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça (art.
5o, V), decorrentes da situação de pandemia, circunstância alheia à vontade do
paciente, não se mostra razoável o prolongamento da pena sem que tenha sido
evidenciada a participação do apenado em tal retardamento. Há de se computar,
portanto, o período de dispensa temporária do cumprimento de penas e medi
das alternativas de cunho pessoal e presencial - como a prestação de serviços à
comunidade, o comparecimento em juízo etc. - durante o período da pandemia,
como período de efetivo cumprimento, considerando que a sua interrupção
independe da vontade da pessoa em cumprimento, decorrendo diretamente de
imposição determinada por autoridades sanitárias;
a.2. Condições especiais ou facultativas: para além dessas condições gerais
e obrigatórias, o caput do art. 115 da LEP também autoriza a fixação de outras
condições especiais pelo magistrado, que deve se valer de sua discricionariedade
para adotar medidas adequadas ao fato e à situação pessoal do condenado. Al
guns exemplos podem ser citados: submeter-se a tratamento de desintoxicação;
frequentar cursos de reabilitação de alcoolismo; frequentar curso de habilitação
profissional ou de instrução escolar etc. Tais condições não podem excluir ou
restringir direitos constitucionais, nem tampouco permitir a imposição de con
dições vexatórias ou que atinjam a integridade física ou a dignidade da pessoa
humana. Por esse motivo, já se reconheceu a ilegalidade das seguintes condições:
proibição de frequentar cultos religiosos; doação de sangue a cada seis meses;
impor a um médico a obrigação de auxiliar na limpeza de Delegacia de Polícia
etc. Como denota a súmula n. 493 do STJ, não é possível a aplicação de penas
restritivas de direitos como condições especiais do regime aberto. As condições
76 No sentido de que não é possível impor a prestação de serviços à comunidade (pena substitutiva) como
condição especial à concessão do regime prisional aberto, sob pena de bis in idem: STJ, 5a Turma, HC
228.668/SP, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 15/03/2012, DJe 22/03/2012.
77 Paradigma: STJ, 3a Seção, REsp 1.107.314-PR, Rei. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 13.12.2020.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 319
aberto também não lhe era concedido quando havia decreto de expulsão, já que a
transferência poderia colocar em risco a execução do decreto e o próprio resgate
do restante da pena. Ocorre que a Lei n. 13.445/17 passou a dispor, expressamen
te, que o processamento da expulsão, em caso de crime comum, não prejudica o
cumprimento da pena, a progressão de regime e o gozo de quaisquer benefícios a
serem concedidos em igualdade de condições ao condenado nacional (art. 54, §3°).
A nova Lei de Migração também prevê que o estrangeiro tem autorização para
trabalhar quando se cuidar de exigência do regime prisional em que se encontrar,
e que é admissível a autorização de residência quando estiver no cumprimento
de pena (art. 30, II, “h”, e §2°);
c. Prognóstico de adaptação ao novo regime: em decorrência da liberdade
de locomoção concedida por várias horas por dia ao condenado que progride do
regime semiaberto para o aberto, há de se tomar extrema cautela. Por isso, para
além da aceitação do programa e das condições impostas pelo juiz, da comprova
ção de que está trabalhando ou que tem a possibilidade de fazê-lo imediatamente,
também se revela necessário que o condenado apresente, por seus antecedentes
ou pelo resultado dos exames a que foi submetido, fundados indícios de que irá
ajustar-se com autodisciplina e senso de responsabilidade, ao novo regime (LEP,
art. 114, II). Para tanto, não basta a comprovação de que o condenado não se
envolveu em outros inquéritos policiais ou processos penais, nem tampouco que
não foi punido por faltas disciplinares de natureza leve, média ou grave. Na ver
dade, a compatibilidade da progressão também precisa ser comprovada a partir
da análise dos resultados dos exames a que o condenado foi submetido no curso
da execução da pena.
progressão deve ser feito com base na reprimenda aplicada, e não sobre o máximo
de 40 (quarenta) anos de que trata o art. 75 do Código Penal, que se refere ao li
mite de tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade. É nesse sentido,
aliás, o teor da súmula n. 715 do STF (“A pena unificada para atender ao limite
de trinta anos de cumprimento, determinado pelo art. 75 do Código Penal, não é
considerada para a concessão de outros benefícios, como o livramento condicional
ou regime mais favorável de execução”), cujos fundamentos continuam válidos,
cabendo tão somente interpretá-la em sintonia com o novo limite de 40 (quarenta)
anos fixado pelo Pacote Anticrime.80
80 STF, 2a Turma, HC 84.766/SP, Rei. Min. Celso de Mello, j. 11/09/2007, DJe 74 24/04/2008.
81 MASSON, Cleber. Direito penal: parte geral (arts. 1o a 120). 14a ed. São Paulo: Método, 2020. p. 488.
82 Como já havia se pronunciado o STF em momento anterior ao Pacote Anticrime, "a nova progressão no
regime de cumprimento da pena se fará, ante o critério, considerado o percentual de um sexto a incidir
sobre os anos que restam a cumprir" (STF, RHC 89.031/RS, Rei. Min. Carlos Britto, j. 28/11/2006, DJe 092
30/08/2007.
322 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
casos de punição disciplinar, o STJ determina que a data-base para nova progressão
de regime será contada a partir do dia da falta grave, e não do dia em que for pu
blicada a decisão que a reconhece judicialmente. Logo, na situação de progressão de
regime, a regra deverá ser a mesma. O sistema progressivo da execução penal não
pode ser erigido em detrimento do apenado em casos específicos de mora judiciária.
A teor de julgados do Supremo Tribunal Federal, a decisão do Juízo das Execuções
que defere a progressão de regime é meramente declaratória, e não constitutiva.
Primeiramente o reeducando preenche os requisitos objetivo e subjetivo e, depois,
pronunciamento judicial reconhece seu direito ao benefício. Embora a análise célere
do pedido seja o ideal, é cediço que a providência jurisdicional não ocorre dessa
forma e, por vezes, pode demorar meses ou anos para ser implementada. Por tais
motivos, o período de permanência no regime mais gravoso, por mora do Judiciário
em analisar requerimento de progressão ao modo intermediário de cumprimento
da pena, deverá ser considerado para o cálculo de futuro benefício, sob pena de
ofensa ao princípio da dignidade do apenado, como pessoa humana (art. Io, III,
CF) e prejuízo ao seu direito de locomoção. Portanto, o marco para a subsequente
progressão deve ser a data em que o reeducando preencher os requisitos legais do
art. 112 da LEP, e não aquele da efetiva inserção no regime intermediário.83
83 STJ, 5a Turma, AgRg no RESp 1,582.285/MS, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 09.08.2016, DJe 24.08.2016; STJ, 6a
Turma, HC 369.774/RS, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 22/11/2016, DJe 07/12/2016; STJ, 5a Turma, HC
414.156/SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 21.11.2017, DJe 29.11.2017.
84 STF, 1a Turma, HC 100.499/RS, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 26/10/2010, DJe 228 26/11/2010. No mesmo
contexto: STF, Ia Turma, HC 96.824/RS, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 12/04/2011, DJe 86 09/05/2011.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 323
putado sobre a soma do restante da pena em cumprimento com a nova sanção; se,
no entanto, ocorrer a regressão, o percentual adequado deverá ser contado a partir
da transferência, tendo como base para o cálculo o que resta da soma das penas a
serem cumpridas.85
Há, todavia, precedentes do STJ no sentido da inadmissibilidade de alteração
da data-base para a concessão de benefícios durante a execução penal, inclusive a
progressão de regime prisional, em face da superveniência do trânsito em julgado
de sentença condenatória. A propósito, confira-se: “(•••) A superveniência de nova
condenação no curso da execução penal enseja a unificação das reprimendas im
postas ao reeducando. Caso o cpiantum obtido após o somatório torne incabível o
regime atual, está o condenado sujeito a regressão a regime de cumprimento de
pena mais gravoso, consoante inteligência dos arts. 111, parágrafo único, e 118, II,
da Lei de Execução Penal. A alteração da data-base para concessão de novos bene
fícios executórios, em razão da unificação das penas, não encontra respaldo legal.
Portanto, a desconsideração do período de cumprimento de pena desde a última
prisão ou desde a última infração disciplinar, seja por delito ocorrido antes do iní
cio da execução da pena, seja por crime praticado depois e já apontado como falta
disciplinar grave, configura excesso de execução. Caso o crime cometido no curso da
execução tenha sido registrado como infração disciplinar, seus efeitos já repercutiram
no bojo do cumprimento da pena, pois, segundo a jurisprudência consolidada do
Superior Tribunal de Justiça, a prática de falta grave interrompe a data-base para
concessão de novos benefícios executórios, à exceção do livramento condicional, da
comutação de penas e do indulto. Portanto, a superveniência do trânsito em julgado
da sentença condenatória não poderia servir de parâmetro para análise do mérito
do apenado, sob pena de flagrante bis in idem. O delito praticado antes do início
da execução da pena não constitui parâmetro idôneo de avaliação do mérito do
apenado, porquanto evento anterior ao início do resgate das reprimendas impostas
não desmerece hodiernamente o comportamento do sentenciado. As condenações
por fatos pretéritos não se prestam a macular a avaliação do comportamento do
sentenciado, visto que estranhas ao processo de resgate da pena”.86
não poderá ser agravada (CPP, art. 617, infine). Logo, estando o cidadão submetido
à prisão cautelar, justificada pela presença dos requisitos dos arts. 312e313do CPP,
afigura-se possível a incidência da progressão de regime.87
Nessa hipótese de custódia cautelar, o termo inicial para a contagem do per
centual de cumprimento da pena necessário para a progressão de regime será a data
do cumprimento do mandado de prisão preventiva, e não a data da publicação da
sentença condenatória. É nesse sentido a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal,
senão vejamos: “(...) A custódia cautelar necessariamente deve ser computada para
fins de obtenção de progressão de regime e demais benefícios da execução, desde
que não ocorra condenação posterior apta a configurar falta grave, não se limitando,
de toda sorte, o período de prisão provisória à detração. (...) Destarte, partindo-se
da premissa de que, diante da execução de uma única condenação, o legislador
não impôs qualquer requisito adicional além dos estabelecidos no artigo 112 da Lei
de Execução Penal, impende considerar a data da prisão preventiva como marco
inicial para obtenção de benefícios em sede de execução penal, desde que não se
tenha notícia do cometimento de falta grave pelo reeducando, servindo a senten
ça condenatória como parâmetro acerca do quantum de pena que deverá ter sido
cumprido e não como marco interruptivo para obtenção de benefícios relacionados
à progressão de regime. (...)”.88
87 A concessão antecipada de benefícios prisionais aos presos cautelares foi objeto de análise no capítulo
introdutório, para onde remetemos o leitor.
88 STF, Ia Turma, RHC 142.463/MG, Rei. Min. Luiz Fux, j. 12/09/2017, DJe 225 02/10/2017.
89 STJ, 5a Turma, HC 191.223/SP, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 01/03/2012, DJe 08/03/2012. No mesmo contexto:
STJ, 5a Turma, AgRg no HC 243.901/SP, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 11/12/2012, DJe 17/12/2012.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 325
3.5.8. Remição pelo trabalho (ou pelo estudo) para fins de progressão de
regimes
Consoante disposto no art. 128 da LEP, com redação dada pela Lei n. 12.433/11,
o tempo remido pelo trabalho (ou pelo estudo) do preso deve ser computado como
pena cumprida para todos os efeitos, inclusive para fins de progressão de regime
prisional. Por consequência, os dias remidos hão de ser somados ao total da pena
já cumprido, para fins de integrar o lapso necessário à obtenção de benefícios em
sede de execução penal.91
90 STF, Pleno, EP 12 ProgReg-AgR/DF, Rei. Min. Roberto Barroso, j. 08/04/2015, DJe 93 19/05/2015.
91 AVENA. Op. cit. p. 226.
326 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
atestam que, naquele momento, o condenado não tem mérito para progredir de
regime. Observou que a transferência seria cabível no interesse da segurança pública
ou do próprio preso (Lei n. 11.671/08, art. 3o)”.94
94 STF, 2a Turma, HC 131.649/RJ, Rei. Min. Dias Toffoli, j. 06/09/2016, noticiado no informativo n. 838.
95 Lei n. 13.445/17:"Art. 54. A expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante
ou visitante do território nacional, conjugada com o impedimento de reingresso por prazo determinado.
(...) §3° O processamento da expulsão em caso de crime comum não prejudicará a progressão de regime,
o cumprimento da pena, a suspensão condicional do processo, a comutação da pena ou a concessão de
pena alternativa, de indulto coletivo ou individual, de anistia ou de quaisquer benefícios concedidos em
igualdade de condições ao nacional brasileiro".
96 STF, 2a Turma, HC 104.174/RJ, Rei. Min. Ayres Britto, j. 29/03/2011, DJe 93 17/05/2011.
328 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
4. REGRESSÃO DE REGIME
97 Com esse entendimento: STJ, 6aTurma, HC 259.261 -SP, Rei. Min. Og Fernandes, j. 21.02.20133, DJe 01.03.2013;
STJ, 5a Turma, HC 231.383-SP, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 26.06.2012, DJe 01.08.2012.
98 STJ, 3a Seção, AgRg no EREsp 1.238.180/SP, Rei. Min. Regina Helena Costa, j. 27/11/2013, DJe 09/12/2013.
Na mesma linha: STJ, 3a Seção, REsp 1.364.192/RS, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 12/02/2014, DJe
17/09/2014.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 329
car como causa de regressão a prática de fato definido como crime doloso ou falta
grave. Isso porque, conforme exposto no capítulo atinente à disciplina, a prática
de fato previsto como crime doloso, de per si, já constitui falta grave à luz do art.
52, caput, Ia parte, da LEP. De todo modo, referindo-se o dispositivo à prática
de fato definido como crime doloso, seja ele comum ou hediondo, punido com
detenção ou reclusão, praticado com violência ou grave ameaça, pode-se concluir,
a contrario sensu, que a prática de crime culposo ou de contravenção penal não
enseja a regressão, pelo menos à luz do art. 118, I, da Lei n. 7.210/84, sob pena
de indevida analogia in malam partem e consequente violação ao princípio da
legalidade. O reconhecimento da prática desse fato definido como crime dolo
so no curso da execução penal dispensa o trânsito em julgado da condenação
criminal no juízo de conhecimento, desde que a apuração do ilícito disciplinar
ocorra com observância do devido processo legal, do contraditório e da ampla
defesa (Súmula n. 526 do STJ e Tese de Repercussão Geral fixada no tema n.
758)." Sem embargo, exige-se um mínimo de certeza quanto à ocorrência desse
fato definido como crime doloso e de sua autoria, o que se tem por atendido
quando, por exemplo, recebida a peça acusatória ou até mesmo quando o juízo
da execução é comunicado acerca da prisão em flagrante do apenado.99 100 Aplica-
-se o mesmo raciocínio em relação à prática de falta grave, é dizer, desde que
ouvido previamente o condenado pelo Juízo da Execução nas hipóteses do art.
118, I, e §1°, da LEP, a regressão também não está condicionada à conclusão do
respectivo procedimento administrativo disciplinar. Quanto às faltas graves, con
vém lembrar que estão listadas nos incisos I a VIII do art. 50 da Lei de Execução
Penal, sem contar aa prática de fato previsto como crime doloso (LEP, art. 52,
caput, Ia parte).101 Mais uma vez, como o legislador faz menção apenas às faltas
dessa natureza, não se pode admitir a regressão quando os fatos imputados ao
condenado caracterizarem faltas médias ou leves;
b. Condenação, por crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena
em execução, torne incabível o regime: o art. 118, inciso II, da LEP, guarda
relação com o disposto no art. 111, parágrafo único, do mesmo diploma norma
tivo, segundo o qual sobrevindo condenação no curso da execução, somar-se-á
a pena ao restante da que está sendo cumprida, para determinação do regime.
A título de exemplo, suponha-se que determinado indivíduo, primário, e autor
99 A discussão em torno da (des) necessidade do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, para
fins de reconhecimento, no âmbito administrativo carcerário, de falta grave decorrente do cometimento
de fato definido como crime doloso, já foi objeto de ampla análise no capítulo atinente à disciplina, para
onde remetemos o leitor.
100 Nessa linha: AVENA. Op. cit. p. 241. Ainda segundo o autor, na eventualidade de haver ulterior absolvição
no processo criminal instaurado para apuração desse crime doloso, é evidente que o apenado deverá re
tornar ao regime a que estava sujeito antes da regressão, mesmo porque a decisão que ordena a regressão
tem natureza administrativa e, como tal, não pode se sobrepor à sentença absolutória proferida pelo juiz
criminal.
101 No sentido de que o cometimento de falta grave enseja a regressão para regime de cumprimento de pena
mais gravoso: STJ, 6a Turma, HC 259.417/SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 12.11.2013, DJe 29.11.2013;
STJ, 5a Turma, HC 230.659/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 05.11.2013, DJe 19.11.2013.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 331
102 STF, Pleno, EP 8 ProgReg-AgR/DF, Rei. Min. Roberto Barroso, j. 01.07.2016, DJ 20.09.2017.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 333
103 STJ, 5aTurma, AgRg no REsp 1,773.347/RO, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 27.11.2018, DJe 10.12.2018;
STJ, 6a Turma, AgRg no HC 471.732/SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 18.10.2018, DJe 08.11.2018; STJ,
6a Turma, AgRg nos EDcl no REsp 1.703.504/RO, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 22.05.2018, DJe
04.06.2018; STJ, 6a Turma, Aglnt no REsp 1.632.060/MS, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 08.05.2018, DJe 21.05.2018.
Em sentido contrário, negando a possibilidade de regressão per saltum: MARCÃO, Renato. Op. cit. p. 197.
104 STJ, 5a Turma, AgRg no Resp 1,778.649/PA, Rei. Min. Ribeiro DAntas, j. 18.02.2020, DJe 28.02.2020; STJ, 6a
Turma, AgRg no HC 525.652/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 19.11.2019, DJe 05.12.2019; STJ, 6a Turma, AgRg
no REsp 1,789.438/RO, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 06.08.2019, DJe 13.08.2019; STJ, 6a Turma, AgRg
no REsp 1.743.956/RO, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 27.11.2018, DJe 06.12.2018.
105 CP: "Art. 33. A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. A de de
tenção, em regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado".
106 Com esse entendimento: MASSON. Op. cit. p. 506.
334 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
Por fim, interpretando-se a contrario sensu o art. 118, §2°, da Lei n. 7.210/84,
denota-se que, na hipótese de condenação, por crime anterior, cuja pena, somada
ao restante da pena em execução, tornar incabível o regime (LEP, art. 118, II), não
há necessidade de oitiva prévia da defesa. Ora, se houve uma decisão definitiva a
respeito desse outro fato, inócua seria sua oitiva antes de se decretar a regressão,
sobretudo porque o apenado já teria tido a oportunidade de se defender no curso
da instrução desse outro processo penal do qual resultou sua condenação, que, aliás,
está protegida pela própria coisa julgada.
109 No sentido de que a prática de falta grave pode ensejar a regressão cautelar do regime prisional sem a
prévia oitiva do condenado, que somente é exigida na regressão definitiva: STJ, 6a Turma, HC 184.988-RJ,
Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 05.02.2013, DJe 18.02.2013; STJ, 5a Turma, HC 240.643-SP, Rei.
Min. Laurita Vaz, j. 06.11.2012, DJe 16.11.2012; STJ, 5a Turma, AgRg no HC 249.110-MG, Rei. Min. Marco
Aurélio Bellizze, j. 09.10.2012, DJe 17.10.2012.
110 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 675.358-SC, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 10.08.2021, DJe 17.08.2021. Com entendi
mento semelhante: STJ, 6aTurma, AgRg no HC 644.900-SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 27.04.2021, DJe 05.05.2021;
STJ, 6a Turma, AgRg no HC 622.757-SC, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 06.04.2021, DJe 12.04.2021.
336 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
5. PRISÃO DOMICILIAR
5.1. Distinção entre a prisão domiciliar cautelar (CPP, arts. 317 e 318) e a
prisão domiciliar penal (LEP, art. 117)
O recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular nas
hipóteses previstas nos incisos I a IV do art. 117 da LEP não se confunde com a
possibilidade de substituição da prisão preventiva pela domiciliar, introduzida nos
arts. 317e318do CPP pela Lei n. 12.403/11. Enquanto estes dispositivos cuidam da
substituição da prisão preventiva, espécie de prisão cautelar, pela prisão domiciliar,
a prisão albergue domiciliar prevista no art. 117 da LEP funciona como modalidade
de prisão aberta, ou seja, hipótese de cumprimento de prisão penal, que tem como
pressuposto, como é sabido, o trânsito em julgado da sentença condenatória (STF,
ADC’s 43, 44 e 54).
Destarte, enquanto a prisão domiciliar prevista na LEP tem natureza penal,
aquela prevista no CPP é dotada de natureza cautelar, ou seja, trata-se de instru
mento passível de utilização no curso da persecução penal (investigação e processo
judicial), sempre que se revelar necessário para assegurar a aplicação da lei penal, a
investigação ou instrução criminal, e, nos casos expressamente previstos, para evitar
a prática de infrações penais (CPP, art. 281, I).
Para além dessa diferença quanto à natureza jurídica, as hipóteses que autorizam
uma e outra não são exatamente idênticas, como será visto mais adiante.
5.2. Beneficiários
Pelo menos à luz da redação expressa do art. 117 da Lei de Execução Penal,
a prisão domiciliar deveria ser concedida exclusivamente àqueles condenados em
regime aberto. É dizer, o benefício não seria cabível para apenados no cumprimen
to de pena em regime semiaberto ou fechado.112 Em situações excepcionalíssimas,
111 STJ, 6a Turma, HC 138.986/DF, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 17/11/2009, DJe 07/12/2009. Sobre
o princípio da dignidade da pessoa humana e a prisão domiciliar: STF, 2a Turma, HC 98.675/ES, Rei. Min.
Eros Grau, j. 09/06/2009, DJe 20/08/2009.
112 Sob o argumento de que a aplicação do art. 117 da LEP - cumprimento da sanção em regime domici
liar - pressupõe o enquadramento em uma das situações jurídicas nele contempladas, dentre eles o de
se tratar o condenado beneficiário de regime aberto, a 1a Turma do STF (HC 177.164/PA, Rei. Min. Marco
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 337
todavia, os Tribunais Superiores têm admitido que, mesmo no caso de regime pri
sional diverso do aberto (semiaberto ou fechado), é possível a concessão de prisão
domiciliar, desde que se trate de condenado portador de doença grave e que seja
comprovada a impossibilidade de assistência médica pelo estabelecimento prisional
em que se encontra custodiado.113
São recorrentes os julgados no sentido de que, na falta de vagas em estabele
cimento compatível ao regime a que faz jus o apenado (v.g, semiaberto), configura
constrangimento ilegal a sua submissão ao cumprimento de pena em regime mais
gravoso, devendo o mesmo cumprir a reprimenda em regime aberto, ou em prisão
domiciliar, na hipótese de inexistência de Casa de Albergado.114115A propósito, eis o
teor da Tese de Repercussão Geral fixada no tema n. 423: “I - A falta de estabeleci
mento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional
mais gravoso; II - Os juizes da execução penal poderão avaliar os estabelecimentos
destinados aos regimes semiaberto e aberto, para qualificação como adequados a
tais regimes. São aceitáveis estabelecimentos que não se qualifiquem como “colônia
agrícola, industrial” (regime semiaberto) ou “casa de albergado ou estabelecimento
adequado” (regime aberto) (art. 33, §1°, alíneas “b” e “c”); III - Havendo déficit de
vagas, deverá determinar-se: (i) a saída antecipada de sentenciado no regime com
falta de vagas; (ii) a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai
antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas; (iii) o cum
primento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado que progride ao
regime aberto. Até que sejam estruturadas as medidas alternativas propostas, poderá
ser deferida a prisão domiciliar ao sentenciado” .ns
A inexistência de casa de albergado na localidade da execução da pena não
gera, todavia, o reconhecimento automático de direito ao benefício da prisão do
miciliar quando o paciente estiver cumprindo a reprimenda em local compatível
com as regras do regime aberto. É bem verdade que os Tribunais Superiores têm
admitido, excepcionalmente, a concessão da prisão domiciliar quando não houver
Aurélio, j. 18/02/2020) denegou o cumprimento de sanção penal em regime domiciliar à paciente que fora
condenada à pena de 26 anos em regime fechado, conquanto comprovada a existência de filho menor.
113 STJ, 5a Turma, HC 133.287-SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 02.03.2010, DJe 03.05.2010; STJ, 6aTurma, HC 228.408-
PR, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 26.06.2012, DJe 01.08.2012; STJ, 5a Turma, HC 240.518-RS,
Rei. Min. Marilza Maynard - Desembargadora convocada do TJ-SE -, j. 05.03.2013, DJe 08.03.2013; STJ, 6a
Turma, HC 323.074-BA, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 25.08.2015, DJe 11.09.2015.
114 STJ, 5a Turma, REsp 1.187.343/RS, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 17/03/2011, DJe 04/04/2011. E ainda: STJ, 6a
Turma, HC 158.783/RS, Rei. Min. Celso Limongi, Desembargador Convocado do TJ/SP, j. 31/08/2010, DJe
20/09/2010. No sentido de que o condenado em regime semiaberto que faz jus à progressão tem direito
a cumprir a pena em prisão domiciliar pelo menos enquanto não surgir vaga em estabelecimento prisional
com as condições necessárias ao adequado cumprimento da pena em regime aberto: STJ, 6a Turma, HC
216.828/RS, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 02/02/2012. Constatada pelo juízo da execução a
inexistência, no Estado-membro, de estabelecimento prisional para cumprimento de pena em regime aberto,
nos termos da sentença, permite-se o início do cumprimento em prisão domiciliar, até ser disponibilizada
vaga no regime adequado: STF, 1a Turma, HC 113.334/RS, Rei. Min. Rosa Weber, j. 18/02/2014). Na visão
da 5a Turma do STJ, a superlotação carcerária e a precariedade das condições da casa de albergado não
são justificativas suficientes para autorizar o deferimento de pedido de prisão domiciliar. Nessa linha: STJ,
5a Turma, HC 240.715/RS, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 23/04/2013.
115 Paradigma: STF, Pleno, RE 641.320, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 11.05.2016, DJ 01.08.2016.
338 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
116 STJ, 5a Turma, HC 299.315/RS, Rei. Min. Gurgel de Faria, j. 18/12/2014, DJe 2/2/2015.
117 STJ, 3a Turma, RHC 86.842-SP, Rei. Min. Nancy Andrighi, j. 17.10.2017, DJe 19.10.2017.
118 STF, 1a Turma, HC 83.358-SP, Rei. Min. Carlos Britto, j. 04.05.2004, DJ 04.06.2004.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 339
ciliar. Nesse sentido, como já se pronunciou o STJ, “(...) conquanto esteja recluso
no regime fechado, verifica-se que o paciente possui mais de 70 (setenta) anos de
idade e é portador de câncer de próstata, trombose e aneurisma abdominal, bem
como apresenta quadro depressivo, conforme comprovado nos autos. Assim, embora
o estabelecimento prisional seja dotado de estrutura para atendimentos emergen-
ciais, as enfermidades descritas necessitam de cuidados específicos e continuados,
ensejando a concessão da prisão domiciliar como medida, até mesmo de cunho
humanitário. Ordem concedida a fim de determinar a transferência do paciente
para a prisão domiciliar, em virtude do seu comprovado estado de saúde debilitado
e da sua idade avançada”;119
II. Condenado acometido de doença grave: não basta que o condenado esteja
extremamente debilitado por motivo de doença grave para que faça jus, automa
ticamente, à prisão domiciliar. Há necessidade de se demonstrar, ademais, que o
tratamento médico do qual necessita não pode ser ministrado de maneira adequada
no estabelecimento prisional, o que estaria a recomendar que seu tratamento fosse
prestado na sua própria residência. Nessa linha, como já se pronunciou o STJ, “(...)
ser portador de doença crônica incurável não garante, por si só, o direito à prisão
domiciliar, sendo indispensável a prova incontroversa de que o custodiado depende
efetivamente de tratamento médico que não pode ser ministrado no estabelecimento
prisional”. 120Por outro lado, evidenciada a impossibilidade de tratamento médico no
local em que o apenado se encontra, há de se conceder o benefício. A propósito,
em caso concreto referente a acusado que foi submetido à cirurgia para a retirada
de câncer da próstata e, em razão disso, necessitava de tratamento radioterápico
sob risco de morte, além de precisar ingerir medicamentos específicos, entendeu
o STJ que, excepcionalmente, poder-se-ia conceder ao preso provisório o benefício
119 STJ, 6a Turma, HC 138.986/DF, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 17/11/2009, DJe 07/12/2009.
120 STJ, 5a Turma, HC 47.115/SC, Rei. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 18/10/2005, DJ 05/12/2005 p. 349. E ainda:
STJ, 5a Turma, HC 66.702/MT, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 12/12/2006, DJ 05/02/2007 p. 309. No sentido de
que a substituição depende de comprovação da imprescindibilidade do tratamento externo, o que não
deflui de quadro de diabete e hipertensão, males que podem ser, medicamentosamente, controlados no
interior da unidade penitenciária: STJ, 6a Turma, HC 120.121/SC, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura,
j. 03/09/2009, DJe 21/09/2009. No sentido de que, não obstante o fato de o apenado efetivamente apre
sentar limitações físicas, tendo sido acometido por acidente vascular encefálico isquêmico, não restou
demonstrada a impossibilidade de prestação da devida assistência médica no estabelecimento penal
em que se encontra recolhido, bem como a precariedade do seu estado de saúde, daí por que lhe foi
negada a substituição da prisão penal pela domiciliar: STJ, 5a Turma, HC 84.685/RS, Rei. Min. Jane Silva -
Desembargadora convocada doTJ/MG, j. 27/09/2007, DJ 15/10/2007. Em caso concreto no qual o agente
sofria de diabetes tipo II, hipertensão arterial sistêmica e histórico de obesidade mórbida, além de ter sido
submetido à cirurgia oncológica para a remoção de parte do pâncreas, o Supremo indeferiu o pedido de
substituição da prisão penal por prisão domiciliar humanitária. Primeiro, por conta da ausência de doença
grave atestada por junta médica oficial. Segundo, porque o sistema penitenciário teria condições de
oferecer a dieta e o acompanhamento médico e nutricional prescritos para o tratamento do sentenciado.
Destarte, apesar de o estado clínico do preso exigir o uso contínuo de medicamentos, sua situação não
demandaria permanência em prisão domiciliar fixa, até mesmo porque a família poderia encaminhar à
unidade prisional eventuais medicamentos ou gêneros alimentícios que integrassem a prescrição médica
e não estivessem disponíveis no sistema carcerário (STF, Pleno, EP 23 AgR/DF, Rei. Min. Roberto Barroso,
DJe 222 11/11/2014).
340 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
121 STJ, 6a Turma, HC 202.200/RJ, Rei. Min. Og Fernandes, j. 21/6/2011, DJe 24/08/2011. Em sentido semelhante:
STF, 2a Turma, HC 153.961/DF, Rei. Min. Dias Toffoli, j. 27/03/2018.
122 A Resolução n. 369/21 do Conselho Nacional de Justiça estabelece procedimentos e diretrizes para a
substituição da privação de liberdade de gestantes, mães, pais e responsáveis por crianças e pessoas com
deficiência, nos termos dos arts. 318 e 318-A do CPP, e em cumprimento às ordens coletivas de habeas
corpus concedidas pela 2a Turma do STF nos HC's 143.641/SP e 165.704/DF.
123 STJ, 5a Turma, AgRg no RHC 128.660/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 18.08.2020, DJe 24.08.2020.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 341
outro lado, caso os cuidados especiais de que necessitam o filho menor ou deficiente
possam ser dispensados pelo agente no próprio estabelecimento penal, não há falar em
aplicação do art. 117, III, da LEP. Nessa linha, o STJ já teve a oportunidade de concluir
que, firmada a possibilidade de se assegurar o direito à amamentação contínua na prisão,
não há por que se conceder à mulher o direito à prisão domiciliar previsto na LEP;124
IV. Condenada gestante: o art. 117, IV, da LEP, permite o cumprimento da
pena em regime domiciliar quando se trata de condenada gestante, sem fazer qual
quer ressalva quanto ao momento da gestação, nem tampouco ao fato de se tratar
de gravidez de alto ou baixo risco. À semelhança da hipótese prevista no art. 117,
I, da LEP, há de se entender que o deferimento do benefício só deverá ocorrer na
hipótese em que o estabelecimento prisional não puder conceder tratamento adequa
do à gestante. Nesse sentido, como já se pronunciou o STJ, referindo-se, todavia, à
prisão domiciliar de natureza cautelar prevista no CPP, “(...) não há ilegalidade na
negativa de substituição da preventiva por prisão domiciliar quando não comprovada
a inadequação do estabelecimento prisional à condição de gestante ou lactante da
condenada, visto que asseguradas todas as garantias para que tivesse a assistência
médica devida e condições de amamentar o recém-nascido”.125 A despeito do silên
cio do legislador acerca do termo ad. quem dessa prisão domiciliar, conclui-se que
o direito à substituição cessa com o nascimento ou, ao menos, findo o puerpério,
que se estende, em média, por cerca de três meses após o parto. Findo esse lapso
temporal, a manutenção da prisão domiciliar será possível à luz do art. 117, III, da
LEP, leia-se, condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental.
São estas, enfim, as 4 hipóteses previstas nos incisos do art. 117 da Lei de
Execução Penal para fins de substituição da prisão penal em regime aberto pela
prisão domiciliar. Nesse ponto, a Lei de Execução Penal diferencia-se do Código
de Processo Penal, que prevê pelo menos outras 3 hipóteses de substituição da
prisão preventiva pela domiciliar: a) mulher com filho de até 12 (doze) anos de
idade incompletos (CPP, art. 318, V, incluído pela Lei n. 13.257/16); b) homem,
caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de
idade incompletos (CPP, art. 318, VI, incluído pela Lei n. 13.257/16); c) a prisão
preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças
ou pessoas com deficiência será substituída por prisão domiciliar, desde que não
tenha cometido crime com violência ou grave ameaça à pessoa, e conquanto não
tenha cometido o crime contra seu filho ou dependente (CPP, art. 318-A, incluído
pela Lei n. 13.769/18).
124 STJ, 5a Turma, HC 133.287/SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 02/03/2010, DJe 03/05/2010. No sentido de que não
há constrangimento ilegal no indeferimento de prisão domiciliar à apenada em caso concreto em que o
estabelecimento prisional em que se encontrava recolhida possuía berçário, tendo em vista que o juízo da
execução havia deferido a permanência de seus filhos gêmeos no estabelecimento por um período de 6
(seis) meses, e tudo isso sem contar o fato de que teria sido ela condenada por praticar tráfico de drogas
em sua residência, mesmo local em que pretendia executar a pena com o benefício da prisão domiciliar:
STJ, 6a Turma, RHC 45.434-SC, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 27.06.2014, DJe 04.08.2014.
125 STJ, 5a Turma, HC 328.813/SP, Rei. Min. Leopoldo de Arruda Raposo - Desembargador convocado do TJ/PE
-, j. 1°/10/2015, DJe 08/10/2015. Na mesma linha: STJ, 5a Turma, HC 231.265/RJ, Rei. Min. Gurgel de Faria,
j. 18/12/2014, DJe 02/02/2015.
342 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
126 STJ, 5a Turma, HC 487.763/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 02/04/2019, DJe 16/04/2019.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 343
127 Com esse entendimento: STJ, 5a Turma, AgRg no RHC 128.660-SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j.
18.08.2020, DJe 24.08.2020. No sentido de que a crise sanitária decorrente do novo coronavírus é insufi
ciente a autorizar recolhimento domiciliar ou progressão antecipada de regime: STF, Ia Turma, HC 188.85/
ES, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 15.09.2020, DJe 29.09.2020.
344 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
128 Nesse sentido, referindo-se, todavia, à prisão domiciliar de natureza cautelar prevista no CPP: STJ, 3a Seção,
CC 174.482-MG, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 14.10.2020, DJe 20.10.2020.
346 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
6. AUTORIZAÇÕES DE SAÍDA
129 STJ, 6a Turma, Resp 1,788.562-TO, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 17.09.2019, DJe 23.09.2019.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 347
130 STJ, 6a Turma, RHC 35.940/MG, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 07.05.2013, DJe 16.05.2013. Na mesma
linha: STJ, 5a Turma, HC 170.197/RJ, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 12.06.2012, DJe 20.06.2012.
348 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
art. 14, §2°). Esse atendimento poderá ser prestado em qualquer estabelecimento
hospitalar, inclusive da rede privada, hipótese, todavia, em que o condenado deverá
arcar com os custos do atendimento, sem prejuízo das cautelas necessárias de modo
a se evitar possível fuga.
A permissão de saída tem como destinatários o condenado que cumpre pena
em regime fechado ou semiaberto e o preso cautelar, diferenciando-se, nesse ponto,
da saída temporária, que pode ser concedida apenas àqueles que cumprem pena em
regime semiaberto, pelo menos à luz do teor do art. 122, caput, da LEP. Não há
previsão de concessão da permissão de saída para os presos do regime aberto, até
porque estes, pelo menos em tese, devem se recolher à casa do albergado apenas no
período noturno e nos dias de folga. Isso sem contar no fato de que o beneficiário
do regime aberto terá direito à prisão domiciliar se acaso acometido de doença
grave, ex vi do art. 117, II, da LEP.
Por estarmos diante de uma medida de caráter administrativo, incapaz de alterar
a forma de execução da pena privativa de liberdade, a atribuição para a concessão
das permissões de saída recai sobre o diretor do estabelecimento prisional onde se
encontra o preso, dispensando-se, assim, qualquer intervenção judicial prévia. É nesse
sentido, aliás, o teor do art. 120, parágrafo único, da Lei n. 7.210/84. Logicamente,
diante de eventual constrangimento ilegal perpetrado pela autoridade administrativa,
indeferindo, por exemplo, permissão de saída manifestamente cabível, nada impede
que o preso suscite a instauração do procedimento de excesso ou desvio perante o
Juízo da Execução (LEP, arts. 185, 186 e 194).
Em conclusão, convém destacar que a permanência do preso fora do estabeleci
mento terá a duração necessária à finalidade da medida (LEP, art. 121). Trabalhando-se,
assim, com o exemplo do inciso II do art. 120 da LEP, infere-se que a permissão de
saída deverá perdurar pelo lapso temporal necessário à melhora do quadro médico
do preso, ainda que parcial, ou até que seja possível que a assistência médica seja
retomada no interior do próprio estabelecimento penal.
6.2.3. Beneficiários
Pelo menos à luz do art. 122, caput, da LEP, a saída temporária só pode ser
concedida aos condenados que cumprem pena em regime semiaberto. Não há falar,
portanto, em concessão do benefício àqueles condenados que cumprem pena em
regime fechado.131
Quanto ao preso do regime aberto, a despeito do teor do art. 122, caput, da
LEP, parte da doutrina132 e da jurisprudência admite a concessão do benefício. Em
primeiro lugar porque, levando-se em consideração que o benefício visa proporcionar
um retorno gradual do apenado à sociedade, não haveria lógica em se excluir de seu
espectro aqueles que se encontram no regime aberto, o que, em tese, poderia permitir
que permanecessem determinado número de dias sem regresso à casa do albergado
após o cumprimento da jornada de trabalho. Em segundo lugar, porque seria por
demais contraditório conceder o benefício àqueles condenados que cumprem pena
em regime mais grave - semiaberto -, negando-o, todavia, para os presos albergados,
ou seja, justamente aqueles que já demonstraram possuir condições pessoais mais
favoráveis de reintegração à vida em sociedade.
Por fim, diversamente do que ocorre em relação à permissão de saída, não
há previsão legal de concessão da saída temporária aos presos cautelares, o que se
justifica pelo fato de o denominado carcer ad custodiam acarretar o recolhimento
do acusado à prisão em circunstâncias absolutamente semelhantes ao cumprimento
da pena em regime fechado, pelo menos em regra. Não obstante, considerando-se
que os Tribunais Superiores vêm entendendo que é desproporcional determinar
que o acusado aguarde o julgamento de apelação exclusiva da defesa em regime
mais gravoso que aquele fixado no decreto condenatório, daí por que, fixado o re
gime inicial semiaberto para cumprimento da pena, o acusado já teria o direito de
aguardar o julgamento do recurso no mesmo regime,133 aplicando-se, desde já, as
131 STJ, 6a Turma, HC 213.575-MG, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 11.10.2011, DJe 03.11.2011.
132 AVENA. Op. cit. p. 250.
133 STJ, 5a Turma, HC 218.098/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 08/05/2012, DJe 21/05/2012; STJ, 5a Turma, HC
227.960/MG, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 18/10/2012; STJ, 5a Turma, HC 89.018, Rei. Min. Arnaldo Esteves Lima,
j. 18/12/2007, DJe 10/03/2008. No sentido de que há compatibilidade entre a prisão cautelar mantida
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 351
6.2.4. Prazo
De acordo com o art. 124, caput, da LEP, “a autorização será concedida por
prazo não superior a 7 dias, podendo ser renovada por mais 4 (quatro) vezes du
rante o ano”. Interpretando-se literalmente o dispositivo, poder-se-ia concluir que
o preso poderá obter até 5 (cinco) autorizações de saída temporária por ano, não
podendo cada uma delas exceder a 7 (sete) dias e nem o total superar a 35 (trinta
e cinco) dias durante o ano.134 Prevalece, todavia, a orientação de que, respeitado o
limite anual de 35 (trinta e cinco) dias, é cabível a concessão de maior número de
autorizações de curta duração. Enfim, atenta às peculiaridades da execução penal,
é possível à autoridade judiciária conceder maior número de saídas temporárias -
mais de 5 (cinco) vezes durante o ano -, de menor duração - inferior a 7 (sete)
dias -, desde que respeitado o limite de 35 dias no ano, porquanto o fracionamento
do benefício é coerente com o processo reeducativo e com a reinserção gradativa
do apenado ao convívio social.
As autorizações de saída temporária para visita à família e para participação
em atividades que concorram para o retorno ao convívio social, se limitadas a cin
co vezes durante o ano, deverão observar o prazo mínimo de 45 dias de intervalo
entre uma e outra (LEP, art. 124, §3°). Todavia, na hipótese de maior número de
saídas temporárias de curta duração, já intercaladas durante os doze meses do ano
e muitas vezes sem pernoite, não se faz necessária a observância desse intervalo, na
medida em que tal exigência criaria verdadeira dificuldade à fruição dos 35 dias de
saídas temporárias anuais, além de ir de encontro ao objetivo de solidificação dos
laços familiares, essencial para a recuperação do reeducando.
A contagem do prazo do benefício da saída temporária deve ser feito em dias
(CP, art. 10), e não em horas. Logo, não se pode admitir a contagem de tal benesse
a partir da 00:00 hora do primeiro dia, sob pena, inclusive, de se colocar em risco
a própria segurança do estabelecimento prisional.135
A limitação temporal de 35 (trinta e cinco) dias durante o ano e o intervalo
mínimo de de 45 (quarenta e cinco) dias entre uma saída e outra não são aplicáveis
pela sentença condenatória e o regime inicial semiaberto fixado nessa decisão, devendo o réu, contudo,
cumprir a respectiva pena em estabelecimento prisional compatível com o regime inicial estabelecido:
STJ, 5a Turma, HC 289.636/SP, Rei. Min. Moura Ribeiro, j. 20/5/2014.
134 É nesse sentido a lição de Renato Marcão (Op. cit. p. 214). Para o autor, não há compensação de dias, é
dizer, não se trata de direito adquirido a estar fora do ambiente carcerário por 35 dias a cada ano. Logo,
se uma saída for autorizada por prazo inferior a 7 (sete) dias não haverá como computar a diferença até
este total para crédito em outra saída.
135 No sentido de que o prazo máximo de sete dias previsto no art. 124 da Lei n° 7.210/84 tem natureza penal,
haja vista que se imbrica com a própria execução da pena, incluindo-se o dia do começo, portanto, no
computo do prazo da saída temporária (art. 10, CP): STF, 2a Turma, HC 130.883/SC, Rei. Min. Dias Toffoli, j.
31/05/2016, DJe 125 16/06/2016.
352 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
6.2.5. Requisitos
A saída temporária não pode ser concedida de maneira automática pelo Juízo
da Execução como mera consequência do fato de o condenado ter progredido do
regime fechado para o semiaberto, ou por ter iniciado o cumprimento da sua pena
nesse regime. Na verdade, diante dos elevados riscos inerentes à concessão da saída
temporária diante da inexistência de vigilância direta, é de rigor o preenchimento
de determinados requisitos objetivos e subjetivos. Consta, assim, do art. 123 da LEP,
que a saída temporária deve ser concedida, se acaso atendidos, cumulativamente, os
seguintes requisitos:
a) comportamento adequado: por meio desse primeiro requisito, dotado
de caráter subjetivo, a ser aferido sobretudo a partir das informações prestadas
pela administração penitenciária, o condenado deve demonstrar que não sofreu
nenhuma sanção disciplinar em momento recente, que desempenha com proprie
dade as tarefas que lhe são atribuídas, e que não se mostra refratário em relação
às obrigações decorrentes do cumprimento das penas previstas no art. 39 da LEP.
Considerando-se que o indivíduo será colocado em liberdade por até 7 (sete) dias
sem vigilância direta, o benefício só deve ser concedido quando se puder fazer
um prognóstico de que o apenado não irá se furtar às obrigações decorrentes
da condenação, evitando-se, assim, que lhe seja indevidamente concedida uma
oportunidade de fuga livre, sobretudo em se tratando de indivíduos com longas
penas a cumprir;
b) cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena, se o condenado for
primário, e % (um quarto), se reincidente: na hipótese de progressão do regi
me fechado para o semiaberto, a LEP não exige que o tempo mínimo de pena
exigido tenha sido cumprido integralmente no regime semiaberto, podendo ser
computado o período em que esteve no regime fechado. É nesse sentido o teor
da súmula n. 40 do STJ: “Para obtenção dos benefícios de saída temporária
e trabalho externo, considera-se o tempo de cumprimento da pena no regime
fechado”.136 Exemplificando, suponha-se que determinado indivíduo primário
tenha sido condenado ao cumprimento de 8 (oito) anos e 4 (quatro) meses de
reclusão no regime inicial fechado pela prática de crime não hediondo cometi
do sem violência ou grave ameaça. Após o cumprimento de 16% (dezesseis por
cento) da pena no regime fechado, é beneficiado com a progressão. Nesse caso,
136 STJ, 6a Turma, RHC 1.926/RJ, Rei. Min. Carlos Thibau, j. 05/05/1992, DJ 01/06/1992; STJ, 5aTurma, HC 134.102/
RJ, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 29/09/2009, DJe 26/10/2009.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 353
desde que presente uma das situações elencadas nos incisos I, II e III do art.
122 da LEP, poderá, desde já, pleitear o benefício da saída temporária, indepen
dentemente de satisfazer mais 1/6 (um sexto) da pena no regime semiaberto,
conquanto preenchidos os demais requisitos. Noutro giro, diante do silêncio da
LEP acerca do assunto, prevalece o entendimento de que a prática de falta grave
durante o cumprimento da pena não acarreta a alteração da data-base para fins
de saída temporária;137
c) compatibilidade do benefício com os objetivos da pena: os objetivos da
pena são, fundamentalmente, a reeducação e a ressocialização do condenado. O
disposto no art. 123, III, da LEP, guarda relação, portanto, com o art. 122, inciso
III, do mesmo diploma normativo, no sentido de que a saída temporária só deve
ser autorizada pelo juízo da execução quando restar evidenciado que tem como
objetivo proporcionar sua participação em atividades que concorram para o re
torno ao convívio social. Destarte, se ficar evidenciado que o preso não possui
autodisciplina e responsabilidade suficientes, impõe-se a denegação do benefício.138
Nesse sentido, como já se pronunciou a 5a Turma do STJ, “(...) não obstante a
destinatária da visita ser prima do apenado, a questão é o risco de contato do ora
recorrente com a vítima, mesmo que esta e a parente a ser visitada não residam
juntas, uma vez que a vítima também faz parte da família. Esse detalhe foi bem
analisado pelo Tribunal a quo, ressaltando-se que a longa pena a ser cumprida
pelo crime de estupro de vulnerável, no ambiente doméstico, contra a sobrinha,
desautoriza a concessão do benefício por implicar em contato com a vítima. Incide,
na espécie, mutatis mutandis, o seguinte entendimento: O Juízo das Execuções
Criminais apresentou elementos concretos que justificam o indeferimento da
saída temporária para fins de visita familiar e para trabalho externo, sobretudo
a ausência de demonstração do requisito subjetivo pelo Paciente, condenado por
estupro”.139 Eventual indeferimento de pedido de saída temporária com base no
art. 123, III, da LEP, deve ser fundamentado em dados objetivos, não sendo su
ficientes alegações genéricas relacionadas, por exemplo, à gravidade em abstrato
do delito ou à quantidade de pena que resta a ser cumprida.
137 STJ, 5a Turma, HC 557.783/RS, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 18.02.2020, DJe 28.02.2020; STJ, 6a
Turma, AgRg no REsp 1,744.448/RS, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 10.12.2019, DJe 16.12.2019; STJ, 6a
Turma, AgRg no REsp 1.755.715/RS, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 15.10.2019, DJe 25.10.2019.
138 STJ, 6a Turma, AgRg no HC 581.645/SC, Rei. Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. 24.11.2020, DJe 07.12.2020.
139 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 546.976/RJ, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 13.04.2020, DJe 15.04.2020.
354 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
6.2.6. Condições
De acordo com o art. 124, §1°, da LEP, incluído pela Lei n. 12.258/10, ao
conceder a saída temporária, o juiz imporá ao beneficiário as seguintes condições,
entre outras que entender compatíveis com as circunstâncias do caso e a situação
140 No sentido de que a saída temporária não é um direito absoluto do preso, mas estrita faculdade outor
gada ao magistrado, daí por que pode ser indeferida em decisão devidamente fundamentada pelo juízo
da execução se acaso ausentes os requisitos de índole objetiva e subjetiva necessários à concessão do
referido benefício: STF, 1a Turma, HC 104.870/RJ, Rei. Min. Luiz Fux, j. 04/10/2011, DJe 206 25/10/2011.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 355
6.2.7. Competência
Diversamente da permissão de saída, que é autorizada pelo diretor do esta
belecimento prisional (LEP, art. 120, parágrafo único), a saída temporária só pode
ser autorizada pelo juízo da execução por meio do respectivo procedimento judicial
(LEP, art. 194). O art. 66, IV, da LEP, dispõe expressamente que compete ao juiz
da execução autorizar saídas temporárias. Na mesma linha, o art. 123 da LEP dis
põe expressamente que a autorização será concedida por ato motivado do juiz da
execução, ouvidos o Ministério Público e a administração penitenciária.
Percebe-se, à evidência, que a autorização das saídas temporárias é ato jurisdi-
cional da competência do Juízo das Execuções Penais, que deve ser motivado com
a demonstração da conveniência da medida. É o que preceitua o art. 124 da Lei
de Execução Penal, que expressa a necessidade de autorização do Magistrado, após
Manifestação do Ministério Público e da Autoridade Penitenciária. Desse modo, é
indevida a delegação do exame do pleito à Autoridade Penitenciária, impedindo
o Parquet de se manifestar quanto à concessão do benefício e, ainda, de exercer a
sua função fiscalizadora no tocante à ocorrência de excesso, abuso ou mesmo de
irregularidade na execução da medida. É nesse sentido a orientação consolidada na
súmula n. 520 do STJ: “O benefício de saída temporária no âmbito da execução
penal é ato jurisdicional insuscetível de delegação à autoridade administrativa do
estabelecimento prisional”. Incumbe, pois, ao diretor do estabelecimento prisional
tão somente manifestar-se acerca da concessão do benefício, favorável ou desfavo
ravelmente ao seu deferimento, conforme presentes (ou não) os requisitos objetivos
e subjetivos necessários a sua concessão. Idêntico raciocínio é válido em relação ao
órgão ministerial, implicando em nulidade absoluta a decisão proferida pelo Juízo
da Execução em relação à saída temporária sem prévia oitiva do Ministério Público.
142 No sentido de que um único ato judicial que analisa o histórico do sentenciado e estabelece um calendário
de saídas temporárias, com a expressa ressalva de que as autorizações poderão ser revistas em caso de
cometimento de falta, é suficiente para fundamentar a saída mais próxima e as futuras: STF, 2a Turma, HC
128.763/RJ, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 04/08/2015, DJe 18 29/01/2016.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 357
de curta duração, já intercaladas durante os doze meses do ano e muitas vezes sem
pernoite, não se exige o intervalo previsto no art. 124, § 3o, da LEP”.
6.2.9. Revogação
Consoante disposto no art. 125, caput, da LEP, o benefício da saída temporária
será automaticamente revogado quando o condenado praticar fato definido como
crime doloso, for punido por falta grave, desatender as condições impostas na au
torização ou revelar baixo grau de aproveitamento do curso.
Diante da literalidade do dispositivo, é firme o entendimento doutrinário143
no sentido de que, presente uma das hipóteses legais, a revogação pelo Juízo da
Execução será automática, ou seja, deverá ser decretada tão logo o magistrado
tome conhecimento da causa da revogação, não se exigindo, portanto, a oitiva
prévia do condenado, nem tampouco o exaurimento do respectivo procedimento
administrativo disciplinar, sem que se possa objetar suposta violação ao princí
pio da presunção de inocência.144 Nesse ponto, a revogação da saída temporária
diferencia-se da regressão definitiva de regime prisional, já que, nesse caso, a Lei
de Execução Penal prevê expressamente a necessidade de oitiva prévia do con
denado na hipótese de prática de fato definido como crime dolos ou falta grave
(LEP, art. 118, §2°).
Na parte que se refere à prática de fato definido como crime doloso e pu
nição por falta grave, o dispositivo vem ao encontro do art. 118, I, da LEP, que
prevê que a prática de fato definido como crime doloso ou falta grave dão ensejo
à regressão de regime. Isso se justifica pelo fato de que a saída temporária é con
cedida àqueles condenados quem cumprem pena em regime semiaberto. Logo,
se a prática de fato definido como crime doloso ou de falta grave, isoladamente
considerada, já é causa de regressão do regime semiaberto para o fechado (LEP,
art. 118, I), deve igualmente provocar a revogação do benefício sob comento, o
qual é incompatível com o regime fechado. Como exposto anteriormente, o re
conhecimento da prática desse fato definido como crime doloso dispensa o trân
sito em julgado da condenação criminal no juízo de conhecimento, desde que a
apuração do ilícito disciplinar ocorra com observância do devido processo legal,
do contraditório e da ampla defesa (Súmula n. 526 do STJ e Tese de Repercussão
Geral fixada no tema n. 758).
Na visão dos Tribunais Superiores, o fato de o apenado não ter retornado à
colônia penal após o término da saída temporária sem a apresentação de qualquer
justificativa razoável caracteriza a falta grave prevista no art. 50, II, da LEP (“fuga”),145
e, por consequência, a revogação do benefício e a regressão de regime. O atraso no
retorno da saída temporária igualmente configura falta grave, porém aquela prevista
no art. 50, inciso VI, da LEP, eis que o apenado não estaria cumprindo as ordens
recebidas (LEP, art. 39, V),146 sujeitando-se, portanto, às mesmas consequências.
A saída temporária também deverá ser revogada quando o condenado desa-
tender às condições obrigatórias ou facultativas impostas pelo Juízo da Execução.
Na hipótese de concessão do benefício para fins de frequência a curso supletivo
profissionalizante, bem como de instrução do 2o grau ou superior (LEP, art. 122,
II), impõe-se sua revogação na eventualidade de o condenado revelar baixo grau de
aproveitamento do curso, pouco importando se por conta da desídia do apenado
ou despreparo intelectual, já que, em tal hipótese, sua saída temporária não estaria
contribuindo para o processo de reintegração social desejado. Por fim, o descum
primento dos deveres relativos ao monitoramento eletrônico, quando determinado
pelo juiz, também deverá dar ensejo à revogação da saída temporária, nos termos
do art. 146-C, parágrafo único, inciso II, da LEP, incluído pela Lei n. 12.258/10,
caso não se revele suficiente a simples advertência escrita a que se refere o art. 146,
parágrafo único, VII, da Lei n. 7.210/84.
Presente uma das causas acima delimitadas, a revogação da saída temporária
deverá ser obrigatoriamente determinada pelo Juízo da Execução, podendo fazê-lo
inclusive de ofício, o que, à evidência, não impede que a medida seja requerida pelo
Ministério Público em sua atividade de fiscalização da regularidade da execução da
pena (LEP, art. 67).
6.2.10. Recuperação
À luz do art. 125, parágrafo único, da Lei n. 7.210/84, a recuperação do direito
à saída temporária dependerá da absolvição no processo penal, do cancelamento da
punição disciplinar ou da demonstração do merecimento do condenado.
No caso de a revogação da saída temporária ter ocorrido em virtude da prática
de crime doloso, a recuperação do direito deverá ocorrer diante de eventual absol
vição no processo penal. A despeito da omissão do texto legal, o ideal é concluir
que apenas a absolvição transitada em julgado será capaz de produzir esse efeito.
Igual raciocínio deverá ser aplicado, a nosso juízo, na eventualidade de o inquérito
policial instaurado para a apuração desse fato definido como crime doloso ser ob
jeto de arquivamento pelo órgão ministerial. Se acaso a saída temporária tiver sido
revogada devido à punição por falta grave, a recuperação do benefício dar-se-á na
hipótese de cancelamento da sanção disciplinar, seja por meio de decisão administra
tiva em grau recursal, seja diante do reconhecimento de nulidade no procedimento
administrativo disciplinar (v.g., ausência de defesa técnica). Por fim, o condenado
também fará jus à recuperação da saída temporária se lograr êxito em demonstrar
145 STJ, 6a Turma, HC 175.254-RS, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 18.10.2011, DJe 17.11.2011.
146 STJ, 6a Turma, HC 390.313-SP, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 24.10.2017, DJe 06.11.2017.
360 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
que passou a merecê-lo novamente. Nesse caso, o ideal é concluir que, por um
período de tempo considerável, o condenado reestruturou seu comportamento no
interior do estabelecimento prisional, evidenciando mérito para poder usufruir mais
uma vez do benefício.
Por se tratar, a recuperação do direito ao benefício, de verdadeira nova autori
zação para a saída temporária, impõe-se novamente a observância do procedimento
acima delimitado, leia-se, decisão do Juízo da Execução, ouvidos o Ministério Público
e a administração penitenciária, e conquanto observados os requisitos constantes
dos incisos I, II, e III do art. 123 da LEP. Não há, todavia, necessidade de que o
condenado cumpra mais 1/6 (um sexto) da pena, se primário, ou (um quarto), se
reincidente, já que a lei não exige tal requisito para a recuperação, diferenciando-se,
nesse ponto, da progressão de regimes.147
7. REMIÇÃO
148 STJ, 5a Turma, HC 206.313-RJ, Rei. Min. Moura Ribeiro, j. 05.12.2013, DJe 11.12.2013; STJ, 5a Turma, HC
277.885-MG, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 15.10.2013, DJe 25.10.2013; STJ, 5a Turma, AgRg no REsp 1.354.316-RS,
Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 07.03.20113, DJe 13.03.2013.
149 STJ, 5aTurma, HC 277.885-MG, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 15.10.2013, Dje 25.10.2013; STJ, 5a Turma, RHC 034.455-
MG, Rei. Min. Marilza Maynard - Desembargadora convocada doTJ-SE -, j. 23.04.2013, DJe 26.04.2013; STJ,
5a Turma, AgRg no REsp 1.354.316-RS, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 07.03.2013, DJe 13.03.2013.
150 STJ, 6a Turma, REsp 1,804.266/RS, Rei. Min. Nefi Cordeiro, DJe 25/06/2019.
151 STJ, 6a Turma, AgRg no HC 534.260/RS, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 30.06.2020.
152 STF, 2a Turma, HC 144.393-RS, Rei. Min. Cármen Lúcia, j. 03.12.2013, DJ 10.12.2013; STJ, 6a Turma, AgRg no
HC 289.635-MG, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, DJe 03.02.2015.
153 STJ, 5a Turma, AgRg no REsp 1.546.982/MG, Rei. Min. Felix Fischer, j. 22.09.2015, DJe 02.10.2015; STJ, 5a
Turma, HC 351.951/MG, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 17.05.2016, DJe 24.05.2016.
362 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
154 STF, 2a Turma, RHC 136.509/MG, Rei. Min. Dias Toffoli, j. 04.04.2017, DJ 27.04.2017.
155 STJ, 5a Turma, HC 346.948/RS, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 21/06/2016, DJe 29/06/2016.
156 STJ, 3a Seção, REsp 1.381.315/RJ, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 13/5/2015, DJe 19/5/2015; STJ, 5a Turma,
HC 206.313/RJ, Rei. Min. Moura Ribeiro, j. 05.12.2013, DJe 11.12.2013; STJ, 5a Turma, HC 239.498/RJ, Rei.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 363
Min. Laurita Vaz, j. 22.10.2013, DJe 05.11.2013; STJ, 6a Turma, HC 219.772/RJ, Rei. Min. Maria Thereza de
Assis Moura, j. 15.08.2013, DJe 26.08.2013.
157 STJ, 6a Turma, HC 420.257/RS, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 19/04/2018, DJe 11/05/2018.
158 STJ, 5a Turma, REsp 758.364/SP, Rei. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 28/09/2005, DJ 07/11/2005; STJ, 5a
Turma, HC 30.623/SP, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 15/04/2004, DJ 24/05/2004 p. 306.
364 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
normativo alterou alguns dispositivos da LEP, dentre eles o art. 126, cujo caput pas
sou a dispor: “O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto
poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena”.
A qualidade da formação pode envolver desde o ensino fundamental e médio até
o profissionalizante, superior ou de requalificação profissional, presencial ou à distância.
A proporção de abatimento da pena pelo estudo foi fixada pelo próprio legislador: 1
(um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar, divididas, no mínimo,
em 3 (três) dias, não havendo qualquer ressalva sobre a consideração apenas dos dias
úteis para a realização da referida contagem.159
Mas e se o apenado ultrapassar esse limite legal de 12 horas a cada 3 dias?
Seria possível levar em consideração esse tempo excedido para fins de remição da
pena? Aos olhos da jurisprudência, é certo que, para fins de remição da pena pelo
trabalho, a jornada não pode ser superior a 8 (oito) horas.160 No entanto, no caso
de superação da jornada máxima de 8 horas, o STJ firmou o entendimento de que
eventuais horas extras devem ser computadas quando excederem a oitiva hora diária,
hipótese em que se admite o computo do excedente para fins de remição de pena.161
O inciso II do art. 126 da LEP limita-se a referir que a remição ali regrada ocorre
à razão de “1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho”. Diferentemente,
para o caso de estudo, a jornada máxima está prevista na LEP, ao descrever que
a remição é de 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar,
divididas, no mínimo, em 3 dias”, o que resulta em uma média máxima de 4 horas
por dia. Todavia, a circunstância de a LEP limitar apenas as horas de estudos não
pode impedir a equiparação com a situação da remição por trabalho. A mens legis
que mais se aproxima da intenção ressocializadora da LEP é a de que tal detalha
mento, no inciso II, seria na verdade despiciendo, porque o propósito da norma
foi o de reger-se pela jornada máxima prevista pela legislação trabalhista. Não é
possível interpretar o art. 126 como se o legislador tivesse diferenciado as hipóteses
de remição para impedir que apenas as horas excedentes de estudo não pudessem
ser remidas, o que, a propósito, não está proibido expressamente para nenhuma das
duas circunstâncias. Com base nesse entendimento, a 6a Turma do STJ concluiu que
o tempo excedido, na frequência escolar, ao limite legal de 12 horas a cada 3 dias,
deve ser considerado para fins de remição da pena.162
Ante o silêncio da Lei, não se pode impor como requisitos para a concessão da
remição a assiduidade e o aproveitamento escolar no curso em que o apenado estiver
matriculado. A conclusão do curso também não é necessária para fins de remição
da pena pelo estudo. Logo, não cabe ao intérprete estabelecer ressalvas relativas à
assiduidade e ao aproveitamento do estudo como sendo requisitos necessários para
o deferimento da remição.163 Na verdade, se o condenado lograr êxito em concluir o
159 STJ, 6a Turma, AgRg no REsp 1.487.218/DF, Rei. Min. Ericson Maranho - Desembargador convocado do TJ/
SP -, j. 05/02/2015, DJe 24/02/2015.
160 STF, 1a Turma, HC 136.701, Rei. Min. Marco Aurélio, DJe 31.07.2018.
161 STJ, 5a Turma, HC 462.464/SP, Rei. Min. Felix Fischer, DJe 28.09.2018.
162 STJ, 6aTurma, HC 461.047/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 04.08.2020, DJe 14.08.2020.
163 STJ, 6a Turma, HC 289.382/RJ, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 08/04/2014, DJe 28/04/2014; STJ, 5a Turma,
RHC 034.455-MG, Rei. Min. Marilza Maynard - Desembargadora convocada do TJ-SE -, j. 23.04.2013, DJe
26.04.2013.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 365
164 STJ, 5a Turma, AgRg no REsp 1,673.847-SC, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 18.09.2018, DJe 26.09.2018.
165 STJ, 5a Turma, REsp n. 744.032/SP, Rei. Min. Felix Fischer, DJe 5/6/2006.
166 STJ, 6a Turma, HC 312.486/SP, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 09/06/2015, DJe 22/06/2015.
167 Nesse contexto: STJ, 5a Turma, HC 353.689/SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 14/06/2016, DJe 01/08/2016.
366 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
168 STJ, 6a Turma, REsp 1.666.637/ES, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 26/09/2017, DJe 09/10/2017.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 367
Para o cálculo de dias remidos pelo estudo, a Resolução n. 391 do CNJ (revogada
Recomendação 44/2013 do CNJ) orienta-se pelos parâmetros previstos na Resolução
3/2010 do Conselho Nacional de Educação (CNE), a qual, todavia, deve ser conju
gada com a carga horária prevista na Lei 9.394/1996, por se tratar de interpretação
mais benéfica ao réu. Com efeito, é manifestamente mais adequado e justo aplicar as
orientações da Resolução n. 391 do CNJ, a partir de uma interpretação in bonam partem
das demais leis que regulamentam a situação, para determinar ao cálculo da remição
da carga horária mínima do ensino fundamental regular, 800 horas anuais, totalizando
3.200 horas para os quatro anos finais de curso. A Resolução do CNE fixa a duração
mínima de 1.600 horas, de forma global, para todos os quatro anos finais do ensino
fundamental, sobre a qual deverá incidir os 50% estipulados pelo Conselho Nacional
de Justiça, parâmetro que, de fato, não atende aos fatores essenciais do princípio da
proporcionalidade. Ademais, ainda que a Educação de Jovens e Adultos (EJA) seja a
modalidade de ensino ofertada nos estabelecimentos prisionais, regida pelas diretrizes
e carga horária fixadas na Resolução 3/2010 do CNE, é justamente por propiciar aos
seus aderentes novas inserções no mundo do trabalho, na vida social e na abertura
dos canais de participação, fixando-se como instrumento para a educação ao longo da
vida, na linha do que preceitua o art. 205 da Constituição Federal, é que se deve tomar
como parâmetro, para fins de remição de pena pelo estudo, a carga horária prevista
na Lei 9.394/1996. Essa solução homenageia, de modo mais adequado e proporcional,
o educando que, mesmo sem orientação de um profissional da educação e recluso em
local totalmente desfavorável para tanto, colocou-se a estudar e, por esforço próprio,
concluiu uma das etapas do ensino (o fundamental). Com base nesse entendimento, a
2a Turma do STF determinou que fosse aplicado, em benefício de determinada apenada,
o total de 1.600 horas de estudo por aprovação no Exame Nacional para Certificação
de Competências de Jovens e Adultos - ENCCEJA, o qual deve ser dividido por 12
horas, encontrando-se o resultado de 133 dias. Em seguida, considerando o acréscimo
de 1/3 decorrente da incidência do § 5o do art. 126 da Lei 7.210/1984 (Lei de Execução
Penal), pois a condenada concluiu o ensino fundamental, determinou que a ela fosse
concedido o direito ao desconto total de 177 dias de sua reprimenda.169
A jurisprudência do STJ também estava pacificada no sentido da interpretação
mais benéfica ao apenado. Contudo, a Sexta Turma alterou seu entendimento, pas
sando a considerar que os 50% deveríam incidir sobre a carga horária de 1.600h
para o ensino fundamental e 1.200h para o ensino médio, resultando 800h/600h,
que seriam a base de cálculo para remição. Mais recentemente, porém, em decisão
da 3a Seção daquela Corte, concluiu-se que asl.200 hs ou 1.600 horas já equivalem
aos 50% da carga horária definida legalmente para cada nível de ensino, com base
nas quais serão calculados os dias a serem remidos.170
169 STF, 2a Turma, HC 190.806 AgR/SC, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 30.3.2021.
170 STJ, 3a Seção, HC 602.425-SC, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 10.03.2021.
368 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
171 STF, 1a Turma, RHC 124.775/RO, Rei. Min. DiasToffoli, j. 11/11/2014, DJe 250 18/12/2014. Com entendimento
semelhante: STF, 1a Turma, HC 124.520/RO, Rei. Min. Roberto Barroso, j. 15.05.2018, DJ 27.06.2018; STJ, 5a
Turma, AgRg no REsp 1,305.450/RO, Rei. Min. Gurgel de Faria, j. 30/06/2015, DJe 04/08/2015; STJ, 6a Turma,
HC 175.718-RO, Rei. Min. Marilza Maynard - Desembargadora convocada do TJ-SE -, j. 05.12.2013, DJe
16.12.2013.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 369
174 STJ, 6a Turma, HC 116.840/MG, Rei. Min. Jane Silva - Desembargadora convocada do TJ/MG -, j. 06.02.2009,
DJe 02.03.2009.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 371
feriados, pois são dias em que não estaria desempenhando nenhuma atividade
laborativa. Há precedentes do STJ no sentido de que o acidente em questão não
necessariamente precisa guardar relação com as atividades laborativas do apenado.
A título de exemplo, já se entendeu que o acidente in itinere, aquele classificado
como sendo o ocorrido no deslocamento para o local de trabalho, autoriza a
concessão da remição.175
175 STJ, 5a Turma, Resp 783.247/RS, Rei. Min. Felix Fischer, j. 12.09.2006, DJ 12.09.2006.
176 No sentido de que a decisão que reconhece a remição da pena, em virtude de dias trabalhados, não faz
coisa julgada nem constitui direito adquirido: STJ, 6a Turma, REsp 1.417.326-RS, Rei. Min. Marilza Maynard
- Desembargadora convocada doTJ-SE -, j. 25.02.2014, DJe 14.03.2014; STJ, 5a Turma, HC 280.020-SP, Rei.
Min. Laurita Vaz, j. 17.12.2013, DJe 03.02.2014; STJ, 6a Turma, HC 177.176-SP, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior,
j. 18.10.2011, DJe 17.11.2011.
177 STF, 1a Turma, HC 89.784/RS, Rei. Min. Cármen Lúcia, j. 21/11/2006, DJ 02/02/2007 p. 115.
372 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
178 STF, Pleno, RE 452.994/RS, Rei. Min. Sepúlveda Pertence, j. 23/06/2005, DJ 29/09/2006; STF, 2a Turma, HC
100.953/RS, Rei. Min. Ellen Gracie, j. 16/03/2010, DJe 62 08/04/2010.
179 STF, 2a Turma, HC 110.566/SP, Rei. Min. Ayres Britto, j. 28/02/2012, DJe 111 06/06/2012. No mesmo contexto:
STF, 2a Turma, HC 110.317/MS, Rei. Min. Ayres Britto, j. 07/02/2012, DJe 73 13/04/2012; STF, 2a Turma, HC
110.040/RS, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 08/11/2011, DJe 226 28/11/2011; STJ, 5a Turma, HC 230.659-SP, Rei.
Min. Laurita Vaz, j. 05.11.2013, Dje 19.11.2013; STJ, 5a Turma, Edcl nos EDcl no REsp 1,238.276-SP, Rei. Min.
Marilza Maynard - Desembargadora convocada do TJ-SE -, j. 13.08.20113, DJe 30.08.2013; STJ, 5a Turma,
HC 426.740-SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 15.05.2018, Dje 24.05.2018; STJ, 5a Turma, HC 210.062-SC, Rei. Min.
Gurgel de Faria, j. 19.03.2015, Dje 06.04.2015.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 373
remidos em virtude de falta grave. Porém, essa perda não mais poderá atingir a
integralidade dos dias remidos, devendo ser observado o limite máximo de 1/3 (um
terço) desse montante.
O reconhecimento de falta grave no curso da execução penal justifica a per
da de até 1/3 (um terço) do total de dias trabalhados pelo apenado até a data do
ato de indisciplina carcerária, ainda que não haja declaração judicial da remição,
consoante a interpretação sistemática e teleológica do art. 127 da LEP.180 Por outro
lado, uma vez reconhecida a falta grave, a perda de até 1/3 do tempo remido (art. 127
da LEP) pode alcançar dias de trabalho anteriores à infração disciplinar e que ainda
não tenham sido declarados pelo juízo da execução no computo da remição. Como
exposto anteriormente, a remição na execução da pena constitui benefício submetido
à cláusula rebus sic stantibus. Assim, o condenado possui apenas a expectativa do
direito de abater os dias trabalhados do restante da pena a cumprir, desde que não
venha a ser punido com falta grave. Nesse sentido, quanto aos dias de trabalho a
serem considerados na compensação, se, por um lado, é certo que a perda dos dias
remidos não pode alcançar os dias trabalhados após o cometimento da falta grave, sob
pena de criar uma espécie de conta corrente contra o condenado, desestimulando o
trabalho do preso, por outro lado, não se deve deixar de computar os dias trabalha
dos antes do cometimento da falta grave, ainda que não tenham sido declarados pelo
juízo da execução, sob pena de subverter os fins da pena, culminando por premiar
a indisciplina carcerária.181
Apesar de o art. 127 da LEP dizer que o juiz poderá revogar até 1/3 (um
terço) do tempo remido, doutrina e jurisprudência entendem que não se trata de
mera faculdade conferida ao juízo da execução, que pode ser afastada em face da
imposição de outras sanções, a exemplo da regressão de regime. Na verdade, ante
a existência de punição por falta grave, é obrigatória a declaração da perda dos
dias remidos. A discricionariedade que o magistrado possui recai exclusivamente
sobre a fixação do quantum de tempo a ser perdido, observado, logicamente, o
limite máximo de 1/3 (um terço).182 Enfim, cabe ao juízo da execução, portanto,
fixar a fração aplicável de perda dos dias remidos na hipótese de cometimento
de falta grave, observando o limite máximo de 1/3 (um terço) do total e a neces
sidade de fundamentar a decisão em elementos concretos, conforme o art. 57 da
Lei de Execução Penal.183
Por fim, convém lembrar que a falta grave, por si só, não acarreta a perda de
até 1/3 (um terço) dos dias remidos. Na verdade, é imprescindível a efetiva punição
pela falta grave, imposta ao final de procedimento administrativo disciplinar regu
larmente instaurado no âmbito do estabelecimento prisional, resguardando-se, assim,
180 STJ, 6a Turma, REsp 1.672.643-RS, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 03.10.2017, DJe 09.10.2017; STJ, 6a Turma,
REsp 1.517.936-RS, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 01.10.2015, DJe 23.10.2015.
181 STJ, 6a Turma, REsp 1.517.936/RS, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 01/10/2015, DJe 23/10/2015.
182 STJ, 6a Turma, AgRg no REsp 1.424.583/PR, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 03/06/2014, DJe
18/06/2014; STJ, 5a Turma, AgRg no REsp 1,430.097/PR, Rei. Min. Felix Fischer,j. 19/03/2015, DJe 06/04/2015.
183 STJ, 6a Turma, HC 248.232-RJ, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 03.04.2014, DJe 15.04.2014; STJ, 5a
Turma, HC 242.634-SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 18.03.2014, DJe 28.03.2014.
374 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
o exercício da mais ampla defesa. A propósito, eis o teor da Súmula n. 533 do STJ:
“Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal,
é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do esta
belecimento prisional, assegurado o direito de defesa, a ser realizado por advogado
constituído ou defensor público nomeado”.
184 CP: Art. 32. As penas são: I - privativas de liberdade; II - restritivas de direitos; III - de multa.
185 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 16a ed. São Paulo: Saraiva, 2011. P. 730.
186 STJ, 5a Turma, HC 309.535/SP, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 22/08/2017, DJe 04/09/2017.
376 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
187 Súmula n. 337 do STJ: "É cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na
procedência parcial da pretensão punitiva".
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 377
8.3. Espécies
A doutrina costuma apontar a existência de pelo menos 4 (quatro) espécies dis
tintas de sursis:
a) sursis simples (CP, art. 78, §1°): deverá ser aplicado na hipótese em que
o condenado não tiver reparado o dano injustificadamente, e/ou as circunstâncias
do art. 59 do CP não lhe forem completamente favoráveis;
b) sursis especial (CP, art. 78, §2°): deverá ser aplicado quando o condenado
tiver reparado o dano, salvo impossibilidade de fazê-lo, e se as circunstâncias do
art. 59 do CP lhe forem inteiramente favoráveis;
c) sursis etário: de acordo com o art. 77, §2°, Ia parte, do CP, a execução da
pena privativa de liberdade, não superior a 4 (quatro) anos, poderá ser suspensa,
por quatro a seis anos, desde que o condenado seja maior de 70 (setenta) anos de
idade. Embora não haja referência expressa ao momento a ser considerado, o ideal
é concluir que o dispositivo se refere à idade do condenado por ocasião da sentença,
seja pelo fato de o legislador fazer uso da palavra “condenado”, seja por conta de
uma necessária analogia com os arts. 65, I, e 115, ambos do Código Penal;188
d) sursis humanitário: é aquele aplicável quando razões de saúde do condenado
justificarem a concessão do benefício. Há necessidade, portanto, que o sentenciado
seja portador de moléstia incurável em estado avançado, como, por exemplo, a
Aids, ou grave, inabilitante, etc. À semelhança do sursis etário, a pena privativa de
liberdade não poderá ser superior a 4 anos, e o período de prova deverá variar de
4 (quatro) a 6 (seis) anos.
8.4. Requisitos
Os requisitos para a concessão da suspensão condicional da pena constam, gros
so modo, do art. 77 do Código Penal, e subdividem-se em objetivos e subjetivos.
188 CP: "Art. 65. São circunstâncias que sempre atenuam a pena: I - ser o agente menor de 21 (vinte e um), na
data do fato, ou maior de 70 (setenta) anos, na data da sentença; (...)"; "Art. 115. São reduzidos de metade
os prazos de prescrição quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um) anos, ou,
na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos".
378 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
189 STF, 1a Turma, HC 72.697/RJ, Rei. Min. Celso de Mello, j. 19/03/1996, DJ 21/05/1999; STJ, 5a Turma, HC
31.656/SP, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 06/05/2004, DJ 07/06/2004 p. 251; STJ, 5a Turma, HC 28.227/RJ, Rei. Min.
Jorge Scartezzini, j. 16/10/2003, DJ 19/12/2003 p. 524.
190 No sentido de que a interpretação sistemática dos textos relativos aos crimes hediondos e à suspensão
condicional da pena conduz à conclusão sobre a compatibilidade entre ambos: STF, Ia Turma, HC 84.414/
SP, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 14/09/2004, DJ 26/11/2004.
191 Para o Supremo, "o óbice, previsto no artigo 44 da Lei n° 11.343/06, à suspensão condicional da pena imposta
ante tráfico de drogas mostra-se afinado com a Lei n° 8.072/90 e com o disposto no inciso XLIII do artigo
5o da Constituição Federal": STF, Ia Turma, HC 101.919/MG, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 06/09/2011, DJe 206
25/10/2011. Com entendimento semelhante: STJ, 5a Turma, HC 197.268/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 26/02/2013,
DJe 06/03/2013.
380 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
denados por tráfico privilegiado, já que a conversão é norma mais benéfica e que
tem aplicação com juízo de precedência sobre o sursis. É desproporcional e carece
de razoabilidade a negativa de concessão de sursis em sede de tráfico privilegiado
se já restou superada a própria vedação legal à conversão da pena, mormente após
o julgado do Pretório Excelso que decidiu não se harmonizar a norma do parágrafo
4o com a hediondez do delito definido no caput e parágrafo Io do artigo 33 da Lei
de Tóxicos. A obrigatoriedade do regime inicial fechado prevista na Lei de Crimes
Hediondos foi superada pelos Tribunais Superiores de modo que a mera natureza
do crime não configura fundamentação idônea a justificar a fixação do regime mais
gravoso para os condenados, haja vista que, para estabelecer o regime prisional, deve
o Magistrado avaliar o caso concreto de acordo com os parâmetros estabelecidos
pelo art. 33 e parágrafos do Código Penal.192
192 STJ, 6a Turma, REsp 1626436/MG, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 08/11/2016, DJe 22/11/2016.
193 STF, 2a Turma, HC 72.605/SP, Rei. Min. Néri da Silveira, j. 17/10/1995, DJ 07/12/1995.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 381
194 Lei n. 13.445/17:"Art. 54. A expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante
ou visitante do território nacional, conjugada com o impedimento de reingresso por prazo determinado.
(...) §3° O processamento da expulsão em caso de crime comum não prejudicará a progressão de regime,
o cumprimento da pena, a suspensão condicional do processo, a comutação da pena ou a concessão de
pena alternativa, de indulto coletivo ou individual, de anistia ou de quaisquer benefícios concedidos em
igualdade de condições ao nacional brasileiro".
195 Nesse sentido: MIRABETE. Op. cit. p. 751.
382 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
196 STF, 1a Turma, RHC 128.515/BA, Rei. Min. Luiz Fux,j. 30/06/2015, DJ 01/10/2015. Em sentido semelhante:"(...)
Tendo em vista que o período de prova do sursis não é computado como tempo de efetivo cumprimento
de pena, a paciente não faz jus à concessão de indulto, por ausência do requisito objetivo. (...)". (STJ, 5a
Turma, HC 350.345/RS, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 06/10/2016).
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 383
8.11. Condições
O próprio nome do instituto em análise é bastante elucidativo: suspensão
condicional da pena. Isso significa dizer que a concessão do sursis é condicional,
ou seja, sujeita o condenado ao cumprimento de certas condições. Portanto, não
há mais como se falar em sursis incondicionado, ou seja, um sursis sem condi
ções, como existia, aliás, antes da Reforma da Parte Geral do Código Penal pela
Lei n. 7.209/84.
Embora as condições sejam definidas na decisão condenatória, sua obser
vância somente será necessária depois do trânsito em julgado da condenação
e tão somente após a realização da audiência de advertência das condições
(audiência admonitória), prevista no art. 160 da LEP: “Transitada em julgado
a sentença condenatória, o juiz a lerá ao condenado, em audiência advertindo-o
das consequências de nova infração penal e do descumprimento das condições
impostas”. Há precedentes do STJ no sentido de que a ausência do defensor
do condenado na audiência admonitória não configura nulidade, notadamente
quando o condenado tiver aceitado o benefício e estiver cumprindo-o regu
larmente. Afinal, tal ato não constitui atividade jurisdicional, mas sim admi
nistrativa, de competência do Juízo da Execução. De mais a mais, a Defesa
poderá, a qualquer momento, formular pedido de revogação do benefício da
suspensão condicional da pena.197
As condições podem ser classificadas da seguinte forma:
197 STJ, 5a Turma, HC 469.638/DF, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 27/11/2018, DJe 10/12/2018; STJ,
6a Turma, HC 451.172/DF, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 04/09/2018, DJe 14/09/2018; STJ, 5a Turma, AgRg no HC-
459.033/DF, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 7/11/2018.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 385
198 MASSON, Cleber. Direito Penal: parte geral (arts. Io a 120). 14a ed. São Paulo: Método, 2020. p. 680.
199 As causas de revogação obrigatória e facultativa do sursis serão objeto de análise na sequência.
200 STF, 1a Turma, RE 92.916, Rei. Min. Antônio Neder, j. 19/05/1981, DJ 26/06/1981.
386 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
pensão condicional da pena, seja para fins de beneficiar o condenado, seja para fins
de prejudicá-lo. Não há falar em coisa julgada no tocante às condições, mas apenas
em relação à concessão (ou não) do benefício, eis que a própria Lei de Execução
Penal estabelece a possibilidade de modificação das regras do sursis sem se limitar
à alteração favorável ao condenado.
Para tanto, porém, é indispensável a oitiva prévia do condenado, que poderá
apresentar ao magistrado sua versão sobre os fatos, justificar eventual descumprimento
das condições que lhe foram impostas, apontar as justificativas para a modificação
pretendida ou o cancelamento de uma condição judicial, etc.
Na eventualidade de recrudescimento das condições, revela-se perfeitamente
possível que o condenado desista do benefício, hipótese em que lhe restará o cum
primento integral da pena privativa de liberdade, nos moldes constantes da sentença
condenatória transitada em julgado.
7.209 e 7.210 de 1984 não se admite que o juiz conceda a suspensão condicional
‘sem condições especiais’ tendo em vista o que está expressamente previsto nas
aludidas leis. Todavia, se o juiz se omite em especificar as condições na sentença,
cabe ao réu ou ao Ministério Público opor embargos de declaração, mas se a de
cisão transitou em julgado, nada impede que, provocado ou de ofício, o juízo da
execução especifique as condições. Aí não se pode falar em ofensa à coisa julgada,
pois esta diz respeito à concessão do sursis e não às condições, as quais podem
ser alteradas no curso da execução da pena”.201
201 STJ, 5a Turma, REsp 15.368/SP, Rei. Min. Jesus Costa Lima, j. 09/02/1994, DJ 28/02/1994 p. 2.906.
202 STJ, 5aTurma, AgRg no REsp 1772104/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 06/12/2018, DJe 19/12/2018.
Ainda no sentido de que somente após o trânsito em julgado e designada audiência admonitória pelo
juízo da execução penal é que poderá o apenado renunciar ao sursis, caso não concorde com as condições
estabelecidas e entenda ser mais benéfico o cumprimento da pena privativa de liberdade: STJ, 6a Turma,
REsp 1.384.417/DF, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, DJe 6/4/2015; STJ, 5a Turma, AgRg no AREsp 1428394/
SP, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 19/05/2020, DJe 29/05/2020.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 389
duas porque o acusado já teria exercido a mais ampla defesa no curso do processo
penal do qual resultou sua condenação.
203 STJ, 5a Turma, RHC 18.521/MG, Rei. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 03/04/2007, DJ 07/05/2007 p. 335.
204 STJ, 5a Turma, HC 175.758/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 04/10/2011, DJe 14/10/2011.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 391
obrigatória (crime doloso), seja para fins de revogação facultativa (crime culposo
ou contravenção penal), o Código Penal demanda a existência de uma sentença
condenatória transitada em julgado (CP, art. 81,1, e §1°, infine, respectivamente).
Logo, nada mais razoável do que se aguardar o término do respectivo processo
criminal para que se tenha certeza se haverá necessidade de revogação do benefí
cio, se acaso sobrevier uma decisão condenatória irrecorrível, ou se, na verdade,
a hipótese seria de declaração da extinção da pena privativa de liberdade, caso o
agente venha a ser absolvido em tal processo. Exatamente por tal motivo, ou seja,
para se aguardar a decisão definitiva nesse outro processo criminal, é que o art.
81, §2°, do CP, prevê a prorrogação do período de prova do sursis. Na visão dos
Tribunais Superiores, esta prorrogação é automática, isto é, independe de decisão
judicial expressa nesse sentido. Para tanto, basta o recebimento da peça acusatória
nesse outro processo criminal. Como já se pronunciou o STJ, “o período de pro
va do sursis fica automaticamente prorrogado quando o beneficiário está sendo
processado por outro crime ou contravenção, bem como que a superveniência de
sentença condenatória irrecorrível é caso de revogação obrigatória do benefício,
mesmo quando ultrapassado o período de prova”.206 Levando-se em consideração
que o dispositivo sob comento faz referência ao processamento do beneficiário
por outro crime ou contravenção, sem fazer qualquer referência ao momento em
que tal infração penal fora praticada, prevalece o entendimento de que o processo
penal em questão tanto pode versar sobre crime ou contravenção penal praticados
durante o período de prova, quanto sobre infração penal cometida antes daquela
cuja condenação resultou na concessão do sursis cujo período de prova foi pror
rogado. Por fim, convém destacar que a mera instauração de investigação policial
não autoriza a prorrogação do período de prova. Isso porque o dispositivo é claro
ao fazer referência ao fato de o beneficiário ser processado por outro crime ou
contravenção;
b) quando facultativa a revogação (CP, art. 81, §3°): em ambas as hipóteses
de revogação facultativa, o juízo da execução poderá, ao invés de fazê-lo, pror
rogar o período de prova até o máximo, se este não foi o fixado. Diversamente
da hipótese anterior de prorrogação do período de prova, prevalece o enten
dimento de que, nesse caso do art. 81, §3°, do CP, há necessidade de decisão
judicial expressa nesse sentido, é dizer, o período de prova não é prorrogado
automaticamente.
206 STJ, 5a Turma, HC 175.758/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 04/10/2011, DJe 14/10/2011.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 393
9. DETRAÇÃO
207 A propósito, confira-se: "(...) O período de prova do sursis fica automaticamente prorrogado quando o
beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção. E a superveniência de sentença
condenatória irrecorrível é caso de revogação obrigatória do benefício, mesmo quando ultrapassado o
período de prova (STJ, 5a Turma, REsp 723.090/MG, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 19/09/2006, DJ 16/10/2006
p. 417).
394 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
feita, ulteriormente, pelo juiz da execução, nos termos do art. 66, III, “c”, da LEP,
que não foi revogado expressa ou tacitamente pela Lei n° 12.736/12. Explica-se: se
a regra, desde a entrada em vigor do referido diploma normativo, é que a detração
seja feita na própria sentença condenatória (CPP, art. 387, § 2o), não se pode olvi
dar que, em certas situações, é praticamente inviável exigir-se do juiz sentenciante
tamanho grau de aprofundamento em relação à situação prisional do condenado.
Basta supor hipótese de acusado que tenha contra si diversas prisões cautelares
decretadas por juízos diversos, além de inúmeras execuções penais resultantes de
sentenças condenatórias com trânsito em julgado. Nesse caso, até mesmo como
forma de não se transformar o juiz do processo de conhecimento em verdadeiro
juízo da execução, o que poderia vir de encontro ao princípio da celeridade e à
própria garantia da razoável duração do processo (CF, art. 5o, LXXVIII), haja vista
a evidente demora que a análise da detração causaria para a prolação da sentença
condenatória na audiência una de instrução e julgamento, é possível que o juiz sen
tenciante se abstenha de fazer a detração naquele momento, o que, evidentemente,
não causará maiores prejuízos ao acusado, já que tal benefício será, posteriormente,
analisado pelo juízo da execução. Para tanto, deverá o juiz do processo de conhe
cimento apontar, fundamentadamente, os motivos que inviabilizaram a realização
da detração na sentença condenatória.
210 STJ, 3a Seção, HC 455.097/PR, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 14.04.2021. Na mesma linha: STJ, 5a Turma, AgRg no
HC 565.899/SP, Rei. Min. João Otávio de Noronha, j. 27.10.2020, DJe 12.11.2020.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 397
211 . STF, 2a Turma, HC 81.886/RJ, Rei. Min. Maurício Corrêa, j. 14/05/2002, DJ 21/06/2002. Na mesma linha:
STJ, 6a Turma, RHC 17.501/SP, Rei. Min. Paulo Medina, j. 23/08/2005, DJ 06/03/2006 p. 442. No sentido
de que a consideração do tempo para fins de contagem de detração penal deve ser aquela em que o
condenado esteve sob efetiva custódia ou submetido a medida restritiva de direito, sendo descabida a
soma do tempo em que o paciente esteve em liberdade provisória, por ausência de expressa previsão
398 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
legal: STJ, 6a Turma, HC 25.183/CE, Rei. Min. Hamilton Carvalhido, j. 27/04/2004, DJ 28/06/2004 p. 419. E
ainda: STJ, 6a Turma, RHC 17.697/ES, Rei. Min. Hamilton Carvalhido, j. 18/08/2005, DJ 14/11/2005 p. 407.
Com o entendimento de que não se vislumbra restrição ao direito de locomoção na simples condição
de comparecimento quinzenal a Juízo, sem qualquer outra formalidade, que autorize sua inclusão no
rol do art. 42 do Código Penal, mesmo se adotando posicionamento liberalizante: STJ, 6a Turma, HC
16.048/RJ, Rei. Min. Fernando Gonçalves, j. 22/11/2001, DJ 04/03/2002 p. 297.
212 Com entendimento semelhante, referindo-se à possibilidade de acréscimo de regulamentação legal que
previsse uma espécie de remição relativa, permitindo o desconto parcial do tempo final de pena se a cau
telar for distinta da prisão, sob pena de a jurisprudência, com base no princípio da igualdade, ser obrigada
a construir um caminho alternativo: BOTTINI, Pierpaolo. As reformas no processo penal: as novas Leis
de 2008 e os projetos de reforma. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 486.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 399
213 STJ, 5a Turma, HC 11.225/CE, Rei. Min. Edson Vidigal, j. 06/04/2000, DJ 02/05/2000 p. 153.
214 STJ, 6a Turma, REsp 1.853.916-PR, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 04.08.2020, DJe 13.08.2020.
400 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
215 No sentido de que o tempo de prisão provisória não pode ser computado para efeito da prescrição, mas
tão somente para o cálculo de liquidação da pena: STF, 1a Turma, RHC 85.026-SP, Rei. Min. Eros Grau,
j. 26.04.2005, DJ 27.05.2005; STJ, 6a Turma, AgRg no HC 181.711-ES, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j.
05.04.2016, DJe 18.04.2016.
216 No sentido de que o tempo de prisão cautelar, ocorrida em processo diverso daquele cujo delito ensejou
a condenação criminal, somente pode ser considerado para fins de detração da pena, se a data do come-
timento do crime a que se refere a execução for anterior ao período requerido: STJ, 5a Turma, HC 262.586/
RS, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 28.05.2013, DJe 10.06.2013; STJ, 6a Turma, HC 178.129/RS, Rei. Min.
Og Fernandes, j. 07.06.2021; STJ, 6a Turma, REsp 1.557.408/DF, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j.
16.02.2016, DJe 24.02.2016, noticiado no Informativo n. 577 do STJ.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 401
217 STF, 1a Turma, HC 93.979/RS, Rei. Min. Cármen Lúcia, j. 22.04.2008, DJ 20.06.2008.
218 MASSON, Cleber. Op. cit. p. 697.
219 STJ, 6a Turma, Aglnt no REsp 1.651.383/MS, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 09.05.2017, DJe 15.05.2017;
STJ, 3a Seção, REsp 1,544.036-RJ, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 14.09.2016, DJe 19.09.2016.
402 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
220 "A jurisprudência do STF já não reclama o trânsito em julgado da condenação nem para a concessão do
indulto, nem para a progressão de regime de execução, nem para o livramento condicional". (STF, Ia Turma,
HC 87.801/SP, Rei. Min. Sepúlveda Pertence, j. 02.05.2006). Na mesma linha: STF, 1a Turma, HC 90.813/SP,
Rei. Min. Cármen Lúcia, j. 24.04.2007; STJ, 5a Turma, REsp 1.154.726/RS, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j.
08.05.2014.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 403
10.4. Requisitos
À semelhança de tantos outros benefícios previstos no Código Penal e na Lei
de Execução Penal, a concessão do livramento condicional também está sujeita ao
preenchimento de certos pressupostos, ora de natureza objetiva, ora de natureza
subjetiva.
Antes de analisarmos tais requisitos, é de rigor ressaltar que a concessão do
livramento condicional independe da progressão de regimes, ou seja, o condenado
não precisa progredir ao regime semiaberto, por exemplo, para fazer jus ao livra
mento condicional. Logo, ainda que se encontre no regime fechado, poderá obter
o livramento condicional, desde que preenchidos os requisitos objetivos e subjeti
vos a seguir detalhados. Enfim, para fins de obtenção do livramento condicional,
pouco importa o regime de pena a que está submetido o condenado, podendo ele
encontrar-se no regime fechado, semiaberto, ou aberto.
221 STJ, 5a Turma, HC 125.958/SP, Rei. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 01.10.2009, DJe 03.11.2009. Na mesma
linha: STJ, 5a Turma, HC 235.480/SP, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 26.06.2012, DJe 01.08.2012.
404 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
222 A questão atinente à (im) possibilidade de interrupção do prazo para obtenção do livramento condicional
em virtude da prática de falta grave será objeto de análise mais adiante.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 405
Logo, em tal hipótese, a regra a ser aplicada é a do art. 83, I, do CP, que impõe o
cumprimento de mais de 1/3 (um terço) da pena;
c.2. Livramento condicional qualificado: de acordo com o art. 83, inciso
II, do Código Penal, se o condenado for reincidente em crime doloso, impõe-se
o cumprimento de mais da metade da pena. Na eventualidade de haver crimes
diversos, o requisito objetivo é o cumprimento de mais da metade do total das
penas somadas, conforme disposto no art. 84 do CP. Pouco importa, portanto, que
a agravante da reincidência não tenha sido reconhecida pelo juiz sentenciante em
algumas das condenações, já que a reincidência é uma circunstância pessoal que
interfere na execução como um todo, e não somente nas penas em que ela foi
reconhecida.223 Logo, ao sentenciado reincidente em crime doloso, deve ser adotado
o lapso preconizado no art. 83, II, do Código Penal, impondo-se, pois, o transcurso
do patamar de metade da sanção para a obtenção da liberdade clausulada, não
havendo de se cogitar na aplicação concomitante do patamar de 1/3 (um terço)
para a execução de pena aplicada ao tempo em que o acusado ostentava a prima-
riedade e de x/i (um meio) para as demais execuções.224 Noutro giro, referindo-se
os incisos I e II do art. 83 do Código Penal, respectivamente, ao condenado não
reincidente em crime doloso com bons antecedentes, e ao apenado reincidente em crime
doloso, há controvérsias acerca do tratamento a ser dispensado àquele indivíduo
não reincidente em crime doloso, porém dotado de maus antecedentes. De um lado,
parte da doutrina sustenta que tal condenado deve receber o mesmo tratamento
dispensado ao reincidente em crime doloso - inciso II -, daí por que o livramento
condicional ficará sujeito ao cumprimento de mais da metade da pena. Ora, por se
tratar de apenado dotado de maus antecedentes, revela-se inadmissível a aplicação
do inciso I do art. 83 do Código Penal, que exige a presença de dois requisitos
cumulativos (não reincidência em crime doloso e bons antecedentes). Em sentido
diverso, todavia, prevalece o entendimento, ao qual nos filiamos, de que, diante da
imprecisão normativa e da vedação do emprego da analogia in malam partem, o
mais correto é interpretar a norma de maneira favorável ao condenado (princípio
do favor rei). Logo, como se trata de apenado não reincidente em crime doloso,
jamais seria possível a aplicação do inciso II do art. 83 do Código Penal de modo
a exigir o cumprimento de mais da metade da pena. Na dúvida, então, admite-
-se a aplicação do inciso I, ou seja, o cumprimento de apenas 1/3 (um terço) da
pena. Nessa linha, como já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça, “(...) no
caso de paciente primário, de maus antecedentes, como o Código não contemplou
tal hipótese, ao tratar do prazo para concessão do livramento condicional, não se
admite a interpretação em prejuízo do réu, devendo ser aplicado o prazo de um
223 No sentido de que a condição de reincidente, uma vez adquirida pelo sentenciado, estende-se sobre a
totalidade das penas somadas, não se justificando a consideração isolada de cada condenação e tampouco
a aplicação de percentuais diferentes para cada uma das reprimendas: STJ, 5a Turma, AgRg nos EDcl no
HC 588.529-PR, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 06.10.2020.
224 STJ, 5a Turma, EDcl no HC 267.328/MG, Rei. Min. Moura Ribeiro, j. 03.06.2014; STJ, 5a Turma, HC 307.180/
RS, Rei. Min. Felix Fischer, j. 16.04.2015.
406 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
terço. O paciente primário com maus antecedentes não pode ser equiparado ao
reincidente, em seu prejuízo”;225
c. 3. Livramento condicional específico:226 nos casos de condenação por crime
hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico
de pessoas e terrorismo, dispõe o art. 83, inciso V, do Código Penal, incluído pela
Lei n. 13.344/16, que a concessão do livramento condicional está condicionada ao
cumprimento de mais de 2/3 (dois terços) da pena, conquanto o apenado não seja
reincidente específico em crimes dessa natureza. Por razões didáticas, essa espécie
de livramento condicional será objeto de estudo na sequência;
d. Reparação do dano: consoante disposto no art. 83, inciso IV, do Código
Penal, a concessão do livramento condicional também depende da reparação do
dano causado pela infração, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo. Para demons
trar o estado de insolvência, não basta a simples juntada de atestado de pobreza.
É necessário que a insolvabilidade seja estreme de dúvidas. A propósito, como
já se pronunciou o STJ, “(...) demonstrada a hipossuficiência do paciente, que
foi representado por defensor público, não se justifica a exigência da reparação
do dano para a concessão do livramento condicional, em decorrência da im
possibilidade de sua realização”.227 Na visão da doutrina, esse requisito também
poderá ser dispensado quando se tratar de delito em que não haja dano a ser
reparado (v.g., tráfico de drogas), quando a vítima não for encontrada para ser
indenizada, assim como quando renunciar à dívida ou relevar desinteresse em
obter o ressarcimento do prejuízo. Na hipótese de condenação por mais de um
crime, a reparação dos danos deve se dar em relação a todos os delitos, alcan
çando, assim, as diversas vítimas;
e. Não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses: de acordo
com o art. 83, inciso III, alínea “b”, do Código Penal, incluído pela Lei n. 13.964/19,
a concessão do livramento condicional também está subordinada ao não cometi
mento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses.228 O requisito em questão será
objeto de análise mais adiante;
225 STJ, 6a Turma, HC 102.278/RJ, Rei. Min. Jane Silva - Desembargadora convocada do TJ/MG -, j. 03.04.2008,
DJe 22.04.2008.
226 Para além do livramento condicional simples, qualificado e específico, há doutrinadores que ainda se re
ferem ao livramento condicional humanitário. Como destaca Avena (Op. cit. p. 297),"(...) trata-se de uma
analogia ao sursis humanitário que permitiría ao condenado a obtenção da liberdade antecipada mesmo
ainda não tendo cumprido o lapso mínimo de pena exigido no art. 83, I, II e V, do Código Penal. Sem
embargo, prevalece na quase unanimidade da doutrina o entendimento de que essa forma de liberdade
condicional não pode ser permitida, tendo em vista a ausência de previsão legal".
227 STJ, 5a Turma, HC 47.492/SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 01.06.2006.
228 No sentido de que o requisito previsto no art. 83, III, b, do Código Penal, inserido pela Lei n. 13.964/2019,
consubstanciado no não cometimento de falta grave nos últimos 12 meses, é pressuposto objetivo para a
concessão do livramento condicional, não limitando a avaliação de conduta satisfatória durante o período
de resgate da pena: STJ, 6a Turma, AgRg no HC 660.197-SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 17.08.2021,
DJe 25.08.2021.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 407
229 Em momento anterior à vigência da Lei n. 13.964/19, havia diversos precedentes do STJ no sentido de
que, por ausência de previsão legal, a prática de falta disciplinar de natureza grave não tinha o condão de
provocar a interrupção do lapso temporal para aferição do tempo devido ao deferimento de livramento
condicional: STJ, 6a Turma, HC 145.217/SP, Rei. Min. Og Fernandes, j. 02/02/2010, DJe 22/02/2010; STJ, 5a
Turma, HC 141.241/SP, Rei. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 29/10/2009, DJe 30/11/2009; STJ, 5a Turma,
HC 139.090/SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 06/10/2009, DJe 07/12/2009; STJ, 5a Turma, AgRg no Ag 763.184/
RS, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 10/10/2006, DJ 13/11/2006 p. 289.
230 No sentido de que a falta disciplinar grave impede a concessão do livramento condicional, por evidenciar
a ausência de requisito subjetivo relativo ao comportamento satisfatório durante o resgate da pena, nos
termos do art. 83, III, do Código Penal: STJ, 5aTurma, HC 554.833-SP, Rei. Min. Joel llan Paciornik,j. 03.03.2020,
Dje 16.03.2020; STJ, 6a Turma, AgRg no HC 545.427-SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 17.12.2019, Dje
19.12.2019; STJ, 5a Turma, AgRg no HC 536.450-SP, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 05.12.2019, DJe 13.12.2019;
STJ, 6a Turma, AgRg no AREsp 1.467.632-MS, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 03.10.2019, DJe 08.10.2019.
231 Nessa linha: STF, IaTurma, HC 103.733/SP, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 26/10/2010, DJe 222 18/11/2010;
STF, 1a Turma, HC 100.062/SP, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 20/04/2010, DJe 81 06/05/2010.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 409
232 STJ, 6a Turma, HC 612.296/MG, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 20.10.2020, Dje 26.10.2020. No sentido de
que a modificação legislativa não afastou a necessidade de comprovação do comportamento satisfatório
durante a execução da pena previsto no art. 83, III, do Código Penal: STF, 2a Turma, HC 192.170 AgR/SP,
Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 04.11.2020, DJe 06.11.2020.
410 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
233 STJ, 6a Turma, HC 378.502/SP, Rei. Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. 21.02.2017, DJe 02.03.2017; STJ, 5a
Turma, HC 267.328/MG, Rei. Min. Moura Ribeiro, j. 25.02.2014.
234 STJ, 5a Turma, HC 139.511 /RJ, Rei. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 06.10.2009.
235 STJ, 5a Turma, HC 84.189/RJ, Rei. Min. Felix Fischer, j. 18.12.2007, DJe 14.04.2008.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 411
236 STJ, 6a Turma, REsp 229.206/DF, Rei. Min. Vicente Leal, j. 28/06/2001, DJ 20/08/2001 p. 544. Logicamente,
em relação ao acréscimo do tráfico de pessoas ao inciso V do art. 83 do CP pela Lei n. 13.344/16, referida
restrição também só poderá ser aplicada aos crimes cometidos após sua vigência, sob pena de violação
ao princípio da irretroatividade da lex gravior.
237 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 566.686-SP, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 18.08.2020; STJ, 6a Turma, AgRg no
RHC 117.816-SP, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 12.05.2020.
412 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
terior que passou a regulamentar inteiramente a matéria de que tratava a Lei dos
Crimes Hediondos, a reincidência específica a que se refere o art. 44, parágrafo
único, da Lei n° 11.343/06, refere-se exclusivamente aos crimes ressalvados pelo
art. 44, caput. Por isso, se o acusado for reincidente, porém em crimes de outra
natureza, ainda que hediondos, subsiste a possibilidade de concessão do livramento
condicional. Exemplificando, se o acusado já tiver sido condenado por um crime
de estupro e, posteriormente, for condenado pelo delito de tráfico de drogas,
não será considerado reincidente específico para fins de impedir a concessão do
livramento condicional.
Nesse ponto, se comparado com o art. 83, V, do Código Penal, com redação
dada pela Lei n° 8.072/90, o art. 44, parágrafo único, da Lei n° 11.343/06, é exemplo
de novatio legis in mellius, vez que autoriza a concessão de livramento condicional
ainda que o acusado seja reincidente em virtude de condenação anterior irrecorrí
vel pela prática de crimes hediondos e equiparados, desde que não seja o próprio
tráfico de drogas.238
Importante ressaltar que, por se tratar de norma especial, o disposto no art. 44,
parágrafo único, da Lei n° 11.343/06, tem aplicação restrita ao reincidente específico
de tráfico de drogas. Por consequência, subsiste a aplicação do disposto no art. 83,
V, do Código Penal, aos demais crimes hediondos e equiparados, em relação aos
quais continua em vigor a proibição da concessão do livramento condicional aos
reincidentes específicos em crimes desta natureza.
Em síntese, para os fins do art. 44, parágrafo único, da Lei n° 11.343/06, apesar
de não ser necessário que os dois crimes de tráfico de drogas estejam previstos no
mesmo tipo penal (v.g., será considerado reincidente específico aquele que tiver
contra si condenação irrecorrível anterior pelo crime do art. 33, caput, e, posterior
mente, for condenado pelo crime do art. 36), a reincidência específica que impede
a concessão de livramento condicional em processo referente a tráfico de drogas é
apenas aquela referente a anterior condenação irrecorrível pela prática dos crimes
de tráfico de drogas previstos nos arts. 33, caput e § Io, 34 a 37, da Lei de Drogas.
Lado outro, para os demais crimes hediondos e equiparados, continua válida a regra
do art. 83, V, do CP, figurando como óbice à concessão do livramento condicional
o fato de haver sentença condenatória irrecorrível pretérita referente à prática de
crimes da mesma natureza, inclusive o próprio tráfico de drogas, que, por se tratar
de crime equiparado a hediondo, ainda pode ser considerado como primeiro delito
para fins de impedir a concessão do referido benefício.
O condenado por associação para o tráfico (art. 35 da Lei 11.343/2006),
caso não seja reincidente específico, deve cumprir 2/3 da pena para fazer jus
ao livramento condicional. Isso porque a própria Lei 11.343/2006, no parágrafo
único do art. 44, prevê requisito objetivo específico para a concessão do livra
mento condicional ao delito de associação para o tráfico. Assim, em observância
238 Com entendimento semelhante: GOMES, Luiz Flávio. Nova lei de drogas comentada: Lei n° 11.343, de
23/08/2006 - artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p. 199.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 413
239 Nesse contexto: STJ, 5a Turma, HC 311,656/RJ, Rei. Min. Felix Fischer, j. 25/8/2015, DJe 2/9/2015. Ambas as
Turmas do STJ têm precedentes no sentido de que o parágrafo único do art. 44 da Lei de Drogas exige
o cumprimento de 2/3 da pena para a obtenção do livramento condicional nos casos de condenação
por associação para o tráfico (art. 35), ainda que este não seja hediondo, sendo vedado o benefício ao
reincidente específico: STJ, 5a Turma, AgRg no REsp 1.469.504/RJ, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j.
01/09/2015, DJe 08/09/2015; STJ, 6a Turma, AgRg no REsp 1.484.138/MS, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j.
02/06/2015, DJe 15/06/2015.
240 STJ, 5a Turma, HC 589.287-RJ, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 06.10.2020.
414 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
prestação de trabalho interno pelo preso, é intuitivo que a regra também abrange
o trabalho externo, é dizer, aquele prestado extramuros pelo condenado;
c. Aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho hones
to: para que o agente seja colocado em liberdade, é de rigor que demonstre ser
capaz de prover à própria subsistência mediante trabalho honesto. Por razões
óbvias, não se exige a apresentação de uma proposta de emprego devidamente
formalizada, mas tão somente que o condenado demonstre aptidão ao trabalho.
De fato, em um país assolado pela miséria e pelo desemprego, se nem mesmo
indivíduos que jamais se envolveram com práticas delituosas têm facilidade de
conseguir um emprego, o que dizer, então, em relação àqueles que foram con
denados à pena privativa de liberdade e que, agora, buscam sua ressocialização
através do trabalho?
d. Condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a
delinquir, nos casos de condenação por crime doloso cometido com violência
ou grave ameaça à pessoa: de acordo com o art. 83, parágrafo único, do Código
Penal, exclusivamente para o condenado por crime doloso, cometido com violência
ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento também ficará subordinada
à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não vol
tará a delinquir. Dada a literalidade do dispositivo, esse requisito não é exigido
quando se trata de condenação por crime culposo, nem tampouco para conde
nados por crimes dolosos cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa. Na
verdade, cuida-se de verdadeiro juízo de prognose de que o egresso não voltará
a delinquir. Conquanto a Lei n. 10.792/03 tenha suprimido a previsão de exame
criminológico para a concessão dos benefícios da execução penal, os Tribunais
Superiores vêm entendendo que o juiz da execução pode, fundamentadamente,
determinar a sua realização, já que se trata de importante instrumento de prog
nóstico da vida futura do condenado, especialmente a partir de considerações
sobre a introjeção da terapêutica prisional, presença de consciência crítica sobre
os atos criminosos praticados, sentimento de culpa perante os danos causados a
terceiros, vulnerabilidade à patologia delitiva etc. Nessa linha, como já se pronun
ciou a Ia Turma do STF, “(...) a partir das modificações determinadas pela Lei n.
10.792/03, a realização do exame criminológico, apesar de não mais considerada
obrigatória, permanece viável, nos casos em que justificada sua relevância para
melhor elucidação das condições subjetivas do apenado na concessão do benefício.
O Supremo Tribunal Federal, por jurisprudência consolidada, admite que pode ser
exigido fundamentadamente o exame criminológico pelo juiz para avaliar pedido
de livramento condicional”.241 A propósito, eis o teor da súmula n. 439 do STJ:
“Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em
decisão motivada”;
241 STF, 1a Turma, RHC 125.279 AgR/SP, Rei. Min. Rosa Weber, j. 26.05.2015. Na mesma linha: STF, 2a Turma, Rcl
28.044 AgR-SP, Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 17.08.2018.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 415
242 A vedação introduzida no art. 2o, §9°, da Lei n. 12.850/13 pelo Pacote Anticrime foi objeto de minuciosa
análise no tópico relativo à progressão de regimes, para onde remetemos o leitor.
416 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
243 No sentido de que não se verifica qualquer ilegalidade em acórdão que anula decisão que deferiu o
livramento condicional sem previa manifestação do Ministério Público: STJ, 5aTurma, HC 204.921/MS, Rei.
Min. Gilson Dipp, j. 27.03.2012, DJe 09.04.2012.
244 Com o entendimento de que não se exige a previa oitiva do Conselho Penitenciário para fins de conces
são do livramento condicional: STJ, 5a Turma, HC 350.902/SP, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 21.06.2016, DJe
28.06.2016.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 417
245 STJ, 5a Turma, HC 125.383/SP, Rei. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 29.04.2009, DJe 01.06.2009; STJ, 5a
Turma, HC 57.459/SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 03.10.2006, DJ 20.11.2006.
418 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
De acordo com o art. 138, caput, da Lei de Execução Penal, ao sair do estabe
lecimento prisional, deverá ser entregue ao apeando, além do saldo de seu pecúlio
e do que lhe pertencer, uma caderneta, que será exibida à autoridade judiciária ou
administrativa, sempre que lhe for exigida. Deverá constar dessa caderneta a iden
tificação do liberado, o texto impresso das normas do livramento condicional e as
condições impostas pelo Juízo da Execução. Na falta de caderneta, será entregue ao
egresso um salvo conduto, em que constem as condições do livramento, podendo
substituir-se a ficha de identificação ou o seu retrato pela descrição dos sinais que
possam identificá-lo.
10.6. Condições
Como exposto anteriormente, a liberdade concedida ao egresso é condicional
porquanto o sujeitará, ao longo do período restante da pena (período de prova
ou período de experiência), ao cumprimento de certas condições, que deverão ser
especificadas pelo Juízo da Execução na decisão que conceder o benefício (CP, art.
85). Subdividem-se em duas espécies:
i. Condições obrigatórias ou legais (LEP, art. 132, §1°): obtenção de ocu
pação lícita, dentro de prazo razoável, se for apto para o trabalho; comunicar pe
riodicamente ao juiz sua ocupação; não mudar do território da comarca do juízo
das execuções sem autorização deste. Se for permitido ao liberado residir fora da
comarca do Juízo da Execução, remeter-se-á cópia da sentença do livramento ao
Juízo do lugar para onde ele se houver transferido e à autoridade incumbida da
observação cautelar e de proteção (LEP, art. 133).246 Essa transferência do conde
nado para comarca diversa e subsequente remessa de cópia da decisão concessiva
do livramento ao juízo do lugar em que vier a residir o liberado, todavia, não
implicará mudança de competência para a execução. É dizer, transfere-se para o
outro juízo apenas o acompanhamento do liberado e a fiscalização das condições
pactuadas, cabendo ao juízo de origem decidir sobre eventuais alterações poste
riores (v.g., revogação do benefício);247
ii. Condições facultativas ou judiciais (LEP, art. 132, §2°): para além das
condições obrigatórias acima citadas, o juiz das execuções também poderá es
pecificar, em caráter facultativo, as obrigações de não mudar de residência sem
comunicação ao Juiz e à autoridade incumbida da observação cautelar e de prote
ção, de recolher-se à habitação em hora fixada, e de não frequentar determinados
lugares. Conquanto adequadas ao fato e à situação pessoal do condenado, o juiz
da execução também pode fixar outras obrigações, vedadas aquelas de natureza
vexatória ou que ofendam direitos individuais do egresso (v.g., dever de frequentar
determinado culto religioso).
246 Há precedentes do STJ no sentido de que não é possível o cumprimento do período de prova do livra
mento condicional no estrangeiro. A propósito, confira-se: STJ, 5a Turma, RHC 28.196/CE, Rei. Min. Gilson
Dipp, j. 13.12.2011, DJe 19.12.2011.
247 STJ, 5a Turma, HC 87.895/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 16.09.2008, DJe 13.10.2008.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 419
248 As causas de revogação (obrigatória e facultativa) do livramento condicional serão objeto de análise na
sequência.
420 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
249 STJ, 5a Turma, REsp 1.922.012/RS, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 05.10.2021, Dje 08.10.2021.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 421
que o juiz da execução, diante da simples prática da infração penal (v.g., prisão em
flagrante), determine a suspensão do livramento condicional, determinando a prisão
do liberado, haja vista a contraindicação de permanência do livramento condicional.
Ou seja, enquanto a revogação é definitiva, a suspensão é provisória, ficando no
aguardo da decisão final sobre o novo crime, que, na eventualidade de ser conde
natória, determinará, então, a obrigatória revogação do benefício.
Cuida-se de verdadeira medida de natureza cautelar,250 fundada na prova da
existência do crime (fumus comissi delicti) e na existência de perigo à sociedade
decorrente da manutenção do egresso em liberdade (periculum libertatis). Nesse
sentido, dispõe o art. 145 da Lei de Execução Penal: “Praticada pelo liberado outra
infração penal, o Juiz poderá ordenar a sua prisão, ouvidos o Conselho Penitenci
ário e o Ministério Público, suspendendo o curso do livramento condicional, cuja
revogação, entretanto, ficará dependendo da decisão final”.
De se notar que, ao tratar da suspensão do livramento condicional, o art. 145 da
Lei de Execução Penal aponta, como causa determinante, a prática de outra infração
penal pelo liberado. Não faz nenhuma ressalva acerca de sua natureza. Destarte,
firmada a premissa de que tal dispositivo é válido tanto às causas de revogação
obrigatória (CP, art. 86) quanto às causas de revogação facultativa do livramento
condicional (CP, art. 87), o ideal é concluir que a infração penal a que se refere
o art. 145 da LEP pode ser um crime ou contravenção penal, de natureza dolosa
ou culposa, praticada na vigência do período de prova ou em momento anterior.
Aliás, muito embora a leitura isolada do art. 145 da LEP conduza ao entendimento
de que somente a prática de novo delito poderia dar ensejo à suspensão cautelar
do livramento condicional, esta não tem sido a posição adotada pelos Tribunais
Superiores. Na visão do Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, a interpretação
do mencionado artigo deve ser feita em conjugação com o art. 87 do Código Penal,
que dá poder geral de cautela ao juiz das execuções, facultando-lhe a tomada de
medidas quando as circunstâncias fáticas assim autorizarem.251
Conquanto se trate, a suspensão do livramento condicional, de medida que
acarreta o recolhimento do condenado à prisão, cabível diante da prática de outra
infração penal pelo liberado (v.g., indiciamento em inquérito policial), pouco im
portando a inexistência de sentença condenatória transitada em julgado pelo novo
delito praticado, é firme o entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido
de que não há, in casu, violação ao princípio da presunção de inocência. Como já
se pronunciou a 5a Turma do STJ, “(...) a providência de natureza cautelar busca
resguardar a escorreita execução da pena e a aplicação meritória dos benefícios a
ela inerentes, até o trânsito em julgado da ação penal relativa ao delito praticado no
período de prova, impedindo a extinção da punibilidade do preso pelo transcurso
do tempo. Dessa forma, não há que se falar em ofensa ao princípio constitucional
da não-culpabilidade, porquanto, comprovada a inocência do sentenciado naquele
feito, restitui-se a ele o gozo da liberdade condicional, anteriormente suspensa,
250 STF, 1a Turma, HC 81.879-SP, Rei. Min. Sepúlveda Pertence, j. 06.08.2002, DJ 20.09.2002.
251 STJ, 5a Turma, HC 241.540/RJ, Rei. Min. Moura Ribeiro, j. 20.03.2014.
422 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
252 STJ, 5a Turma, HC 145.583/RS, Rei. Min. Campos Marques - Desembargador convocado do TJ/PR -, j.
04.12.2012, DJe 10.12.2012.
253 STJ, 5a Turma, RHC 75.353/MG, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 06.12.2016, DJe 16.12.2016.
254 STF, 2a Turma, RHC 86.317/RJ, Rei. Min. Joaquim Barbosa, j. 18.10.2005, DJ 16.12.2005.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 423
de prova no quinquênio depurador da reincidência (CP, art. 64, I), isto é, no prazo
de cinco anos em que a condenação anterior deixa de gerar a recidiva; c) a veda
ção do computo do período de prova no prazo mínimo para pleitear a reabilitação
criminal (CP, art. 94, caput).
da nova infração penal cometida durante o período de prova, e, então, se for o caso,
revogar o benefício”.256
Vejamos, então, à luz do art. 86 do Código Penal, as duas hipóteses em que
deve ser determinada a revogação obrigatória do livramento condicional de liberado
que vem a ser condenado à pena privativa de liberdade em sentença irrecorrível:
I - crime cometido durante a vigência do benefício: referindo-se o inciso I
ao crime cometido durante a vigência do benefício, pode-se concluir que eventual
condenação irrecorrível por contravenção penal não autoriza a revogação obrigatória
do livramento condicional, pouco importando o momento da sua prática, assim
como se houve (ou não) a aplicação de pena privativa de liberdade. Prova disso,
aliás, é o fato de o art. 87 do CP elencar, dentre as causas de revogação facultativa
do livramento condicional, a hipótese de o agente ser condenado irrecorrivelmente
por crime ou contravenção a pena que não seja privativa de liberdade. O fato de
o liberado ter cometido um crime durante a vigência do benefício, sendo, poste
riormente, condenado definitivamente à pena privativa de liberdade, demonstra, à
evidência, que houve uma total quebra da confiança estatal nele depositada. Por
isso, as consequências decorrentes da revogação do benefício são mais gravosas (CP,
art. 88; LEP, art. 142): i. não se computa como pena cumprida o tempo em que o
condenado esteve solto;257 ii. não poderá ser concedido novo livramento condicio
nal, pelo menos em relação à mesma pena, o que, por outro lado, não impede a
concessão do benefício em relação à outra pena; iii. é vedada a soma do restante da
pena aplicada à nova pena para fins de concessão de novo livramento condicional.
Em conclusão, é firme a jurisprudência no sentido de que os efeitos da prática de
outra infração penal, no curso do livramento condicional, submetem-se às regras
próprias deste benefício e, portanto, não se confundem com os consectários legais
da falta grave;258
II - crime anterior, observado o disposto no art. 84 do Código Penal:
por crime anterior se compreende aquele praticado a qualquer momento, mas
desde que antes da vigência do livramento condicional. O art. 84 do CP, por sua
vez, determina que as penas que correspondem a infrações diversas devem ser
somadas para efeito do livramento. Portanto, na hipótese do art. 86, inciso II, do
CP, o objetivo do legislador é determinar a revogação obrigatória do livramento
condicional na hipótese em que a nova pena privativa de liberdade, somada ao
restante da pena anterior - leia-se, aquela que deu origem ao livramento -, re
sultar na impossibilidade de manutenção do benefício. Diversamente da hipótese
anterior, nesta o liberado se viu condenado irrecorrivelmente à pena privativa de
259 No sentido de que a condenação irrecorrível à prisão simples inviabiliza a manutenção do livramento
condicional: ESTEFAM, André. Direito Penal: Parte Geral. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 399.
260 AVENA. Op. cit. p. 315.
428 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
261 No sentido de que a suspensão do livramento condicional não é automática, daí por que, uma vez de
corrido o prazo do período de prova sem ter havido a suspensão cautelar do benefício, tampouco sua
revogação, deve ser declarada a extinção da pena privativa de liberdade: STF, 1a Turma, HC 119.938-RJ, Rei.
Min. Rosa Weber, j. 03.06.2014, DJe 25.06.2014. No mesmo contexto: STJ, 6a Turma, AgRg no HC 277.161/
SP, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 01/10/2013, DJe 10/10/2013; STJ, 5a Turma, AgRg no HC 350.006/MS,
Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 18/08/2016, DJe 26/08/2016; STJ, 6a Turma, AgRg no HC 372.575/
PR, Rei. Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. 06/06/2017, DJe 13/06/2017; STJ, 5a Turma, HC 370.004/SP, Rei.
Min. Felix Fischer, j. 02/02/2017, DJe 10/02/2017.
262 É nesse sentido a lição de Guilherme de Souza Nucci: Curso de Direito Penal. Vol. 1. 4a ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2020. p. 789.
263 No sentido de que a concessão de livramento condicional cautelar para condenado beneficiado com a
progressão para o regime aberto, ante a inexistência de casa de albergado, não constitui constrangimento
ilegal: STJ, 5a Turma, HC 26.537/SP, Rei. Min. Jorge Scartezzini, j. 17.02.2004, DJ 03.05.2004.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 429
264 STJ, 5a Turma, HC 324.231/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 03.09.2015, DJe 10.09.2015.
265 A expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante ou visitante do território
nacional, conjugada com o impedimento de reingresso por prazo determinado.
430 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
266 Razões dos vetos: "A adoção do monitoramento eletrônico no regime aberto, nas penas restritivas de direito,
no livramento condicional e na suspensão condicional da pena contraria a sistemática de cumprimento de
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 431
pena prevista no ordenamento jurídico brasileiro e, com isso, a necessária individualização, proporcionali
dade e suficiência da execução penal. Ademais, o projeto aumenta os custos com a execução penal sem
auxiliar no reajuste da população dos presídios, uma vez que não retira do cárcere quem lá não deveria
estar e não impede o ingresso de quem não deva ser preso".
267 A distinção dos sistemas front-door e back-door é trabalhada por Carlos Eduardo Ariano Japiassú e Celina
Maria Macedo. O Brasil e o monitoramento eletrônico. Monitoramento eletrônico: uma alternativa
à prisão? Experiências internacionais e perspectivas no Brasil. Brasília: Conselho Nacional de Política
Criminal e Penitenciária, 2008. p. 15.
432 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
268 Com entendimento semelhante: BADARÔ, Gustavo Henrique. Medidas cautelares no processo penal:
prisões e suas alternativas - comentários à Lei 12.403, de 04/05/2011. Coordenação: Og Fernandes. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 259. E ainda: Nuno Caiado. Notas sobre a admissibilidade
ética do monitoramento eletrônico. Boletim IBCCRIM. Ano 19, n° 225, Agosto/2011, p. 5.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 433
11.2. Finalidades
Como forma de acompanhamento, e a depender da tecnologia disponível, o
monitoramento eletrônico pode ser utilizado pelo juiz com a imposição de zonas de
inclusão e exclusão, isto é, locais em que o monitorado poderá/deverá permanecer
(zonas de inclusão) ou lugares onde não poderá comparecer ou frequentar (zonas
de exclusão). Assim, o monitoramento eletrônico pode ser utilizado para a obtenção
de 3 (três) finalidades:
a) Detenção: o monitoramento tem como objetivo manter o indivíduo em
lugar predeterminado, normalmente em sua própria residência;
b) Restrição: o monitoramento é usado para garantir que o indivíduo não
frequente certos lugares, ou para que não se aproxime de determinadas pessoas,
em regra testemunhas, vítimas e coautores;
c) Vigilância: o monitoramento é usado para que se mantenha vigilância con
tínua sobre o agente, sem restrição de sua movimentação.
11.4. Cabimento
Como exposto anteriormente, em virtude dos vetos que recaíram sobre o Projeto
que deu origem à Lei n. 12.258/10, o monitoramento eletrônico somente poderá ser
aplicado, no âmbito da execução penal, nas duas hipóteses taxativamente previstas
no art. 146-B da LEP:
a. Saída temporária no regime semiaberto: de acordo com o art. 122 da LEP,
os condenados que cumprem pena em regime semiaberto, salvo se condenados pela
prática de crime hediondo com resultado morte, poderão obter autorização para saída
temporária do estabelecimento, sem vigilância direta, para visitar a família, frequentar
curso supletivo profissionalizante, bem como de instrução do 2o grau ou superior,
na Comarca do Juízo da Execução, ou participar em atividades que concorram para
o retorno ao convívio social. Com o objetivo de auxiliar na fiscalização das diversas
condições impostas ao condenado por ocasião da concessão do referido benefício
(v.g., recolhimento domiciliar no período noturno, proibição de frequentar bares,
casas noturnas etc.), a Lei n. 12.258/10 alterou a Lei de Execução Penal para fins de
dispor expressamente que a ausência de vigilância direta não impede a utilização de
equipamento de monitoração eletrônica pelo condenado, quando assim determinar
o juiz da execução (art. 122, §1°).
b. Prisão domiciliar: como exposto anteriormente, o art. 117 da LEP autoriza
o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quan
do se tratar de condenado maior de 70 anos, condenado acometido de doença
grave, condenada com filo menor ou deficiente físico ou mental, ou condena
da gestante. É intuitivo que se se trata de medida de difícil, senão impossível
fiscalização. Logo, de modo a auxiliar na identificação do espaço geográfico
onde o condenado se encontra, permitindo a fiscalização da medida pelo Juízo
da Execução Penal, a Lei n. 7.210/84 também passou a admitir a monitoração
eletrônica em tal hipótese.269
Na visão dos Tribunais Superiores, também se admite a utilização do monito
ramento eletrônico em relação ao apenado agraciado com a progressão ao regime
aberto, sem que se possa objetar suposto constrangimento ilegal, pois a medida
atende aos parâmetros referenciados na súmula vinculante n. 56. Para o STJ, não
há falar em ofensa ao sistema progressivo, pois a observância desse princípio se
dá mediante a análise das condições às quais o apenado estaria submetido caso
cumprisse a pena em estabelecimento prisional adequado, sendo certo que a prisão
domiciliar monitorada não se afigura mais penosa do que aquela que o Executando
vivenciaria no cumprimento da pena em regime aberto. No caso, as circunstâncias
permitem o deslocamento até o trabalho e o monitoramento estabelecido traduz a
vigilância mínima necessária para aferir o cumprimento de pena fora de estabele
cimento prisional, não constituindo meio físico apto a impedir a fuga do apenado,
269 STJ, 5a Turma, AgRg no AREsp 1,200.204-MG, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 03.04.2018, DJe
13.04.2018.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 435
razão pela qual não destoa dos parâmetros estabelecidos para o cumprimento da
pena em Casa de Albergado; ao contrário, não há dúvida de que é mais benéfico,
já que permite usufruir de um conforto maior do que experimentaria no interior
de estabelecimento prisional. Por fim, cumpre rememorar que se a solução jurídica
estabelecida no julgamento do RE 641.320/RS e replicada na Súmula Vinculante 56/
STF buscou, de um lado, evitar o excesso na execução, de outro, acabou por equipa
rar, em muitos casos, as condições de cumprimento da pena em regime semiaberto
e aberto, consequência essa inarredável.270
270 STJ, 6a Turma, AgRg no HC 691.963/RS, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 19.10.2021, DJe 22.10.2021.
436 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
275 Considerando o rompimento da tornozeleira eletrônica como verdadeira hipótese de fuga em caso concreto
em que o condenado permaneceu sem fiscalização por aproximadamente 3 (três) anos e 6 (seis) meses,
quando, enfim, foi recapturado: STJ, 5a Turma, HC 527.117/RS, Rei. Min. Leopoldo de Arruda Raposo - De
sembargador convocado do TJ/PE -, j. 03.12.2019, DJe 10.12.2019.
276 STJ, 6a Turma, RHC 129.485/MG, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 15.09.2020, Dje 23.09.2020.
2T7 Note o leitor que os incisos lll, IV e V do parágrafo único do art. 146-C da LEP foram vetados.
438 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
278 Em sentido diverso, Avena (Op. cit. p. 319) sustenta a possibilidade excepcional de dupla punição (revo
gação da prisão domiciliar e regressão do regime prisional) em hipóteses de extrema gravidade, como,
por exemplo, a fuga do condenado após violar o equipamento de monitoração.
Cap. VIII • EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE 439
279 STJ, 5a Turma, AgRg no AREsp 1.376.443-GO, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 06.12.2018, DJe
19.12.2018.
280 Com entendimento semelhante: MARCÃO. Op. cit. p. 276.
281 STJ, 5a Turma, AgRg no AREsp 1.569.684/TO, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 10.03.2020, DJe 06.08.2020.
EXECUÇÃO DAS PENAS
RESTRITIVAS DE DIREITOS
1. NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
partir do esgotamento dos recursos ordinários junto aos Tribunais de Apelação (HC
126.292/SP e ARE 964.246/SP), surgiu acirrada controvérsia acerca da (im) possibi
lidade de aplicação de idêntico raciocínio em relação às penas restritivas de direitos.
De um lado, parte da doutrina passou a admitir a execução provisória de
penas restritivas de direitos, sobretudo nas hipóteses em que restasse comprovado
o intuito meramente protelatório do acusado (ou de seu defensor) no exercício
do direito recursal, buscando tão somente o retardamento do trânsito em julgado
da condenação. Em sentido diverso, todavia, era firme o entendimento, sobretudo
jurisprudencial, no sentido de que a execução das penas restritivas de direitos
estaria condicionada ao trânsito em julgado da sentença condenatória. Isso por
que o art. 147 da LEP é explícito nesse sentido, senão vejamos: “Transitada em
julgado a sentença que aplicou a pena restritiva de direitos, o juiz de execução, de
ofício ou a requerimento do Ministério Público, promover a execução, podendo,
para tanto, requisitar, quando necessário, a colaboração de entidades públicas ou
solicitá-las a particulares”. Logo, considerando-se que o Supremo Tribunal Federal
havia admitido tão somente a execução provisória da pena privativa de liberdade
no julgamento do HC 126.292/SP e do ARE 964.246/SP, nada dispondo sobre as
penas restritivas de direitos, revelar-se-ia indevida qualquer tipo de “interpretação
conforme”, ou de “inconstitucionalidade por arrastamento”, para fins de se negar
vigência ao texto expresso do art. 147 da LEP, até mesmo porque, ao tempo em
que vigorava o entendimento de ser possível a execução provisória da pena (até
05/02/2009, com o julgamento do HC 84.078/MG), como a partir da decisão pro
ferida nos precedentes acima citados, a Suprema Corte não a autorizava para as
penas restritivas de direito. É exatamente nesse sentido, aliás, o teor da súmula
n. 643 do STJ: “A execução da pena restritiva de direitos depende do trânsito em
julgado da condenação”.2
Toda essa controvérsia deixou de existir com a mudança da orientação
jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal em relação à possibilidade de exe
cução provisória da pena privativa de liberdade. De fato, a partir do momento
em que a Suprema Corte julgou procedente os pedidos formulados nas ADC’s
43, 44 e 54 (Rei. Min. Marco Aurélio, j. 07.11.2019), para fins de declarar a
constitucionalidade do art. 283 do CPP e condicionar o cumprimento da pena
privativa de liberdade ao trânsito em julgado da sentença condenatória, tal qual
preconizado pelo art. 5o, LVII, da Constituição Federal, seria ilógico não aplicar
a mesma sistemática às penas restritivas de direitos, sob pena de patente viola
ção não apenas à regra de tratamento que deriva do princípio da presunção de
inocência, mas também ao próprio princípio da isonomia, porquanto dar-se-ia
tratamento diverso ao condenado a depender da espécie de pena que lhe fosse
aplicada. Nesse contexto, como se pronunciou o Supremo Tribunal Federal,
2 STJ, 3a Seção, j. 10.02.21, DJe 17.02.21. No mesmo contexto: STJ, 3a Seção, AgRg no HC 435.092/SP, Rei.
Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 24.10.2018, DJe 26.11.2018; STJ, 3a Seção, Embargos de Divergência em
REsp n. 1.619.087/SC, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 14.06.2017; STJ, 3a Seção, AgRg nos Embargos de Divergência
em REsp n. 1,699.768/SP, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 13.03.2019; STJ, 3a Seção, AgRg no HC 435.092/SP, Rei.
Min. Rogério Schietti Cruz, j. 24.10.2018, DJe 26.11.2018.
Cap. IX • EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS 443
“(...) O art. 147 da Lei de Execuções Penais determina que a pena restritiva de
direitos será aplicada somente após o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória. O Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou procedente as
Ações Diretas de Constitucionalidade 43/DF e 44/DF, ambas de relatoria do
Ministro Marco Aurélio, para assentar a constitucionalidade do art. 283 do
Código de Processo Penal”.3
Enfim, o início da execução das penas restritivas de direitos deverá ocorrer a
partir do trânsito em julgado da decisão que as aplicou, tal qual previsto no art.
147 da LEP. A despeito do silêncio da LEP a respeito do assunto, a execução das
penas restritivas de direitos também depende da expedição prévia de um documento
que permita ao juiz promovê-la. Cuida-se da denominada guia de execução de pena
restritiva de direitos, que, por analogia, deverá conter as mesmas formalidades da
guia de recolhimento prevista no art. 106 da LEP para fins de execução da pena
privativa de liberdade.
As penas restritivas de direitos têm natureza jurídica de sanção penal, por mais
que não haja a privação da liberdade de locomoção. Prova disso, aliás, é que o art.
5o, XLVI, da Constituição Federal, ao apresentar um rol exemplificativo de penas
passíveis de aplicação, dispõe expressamente que a lei regulará a individualização da
pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b)
perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição
de direitos. Como se pode notar, consta do dispositivo menção explícita à perda de
bens e à prestação social alternativa como espécies de pena.
As penas restritivas de direitos são dotadas de duas características fundamentais:
a. substitutividade: costuma-se dizer que as restritivas são substitutivas porquanto
substituem a pena privativa de liberdade. Destarte, ainda que o juiz do processo de
conhecimento vislumbre o cabimento das penas alternativas, deverá, primeiro, fixar
o montante da pena privativa de liberdade e o seu regime inicial de cumprimento
de pena (fechado, semiaberto ou aberto), para, na sequência, substituí-la por uma
ou mais penas restritivas de direitos. Isso porque, pelo menos em regra, consta do
preceito secundário dos diversos tipos penais existentes menção expressa apenas em
relação à pena privativa de liberdade (v.g., pena - reclusão, de um a quatro anos, e
multa, no caso do furto simples), e não quanto às restritivas de direitos, que estão
previstas na Parte Geral do Código Penal;
b. autonomia: uma vez realizada a substituição, as penas restritivas de direitos
ganham autonomia, sendo executadas, portanto, como espécie de sanção principal, e
não como sanções acessórias à pena privativa de liberdade. Logo, não se pode admitir
que alguém seja condenado a cumprir determinada pena privativa de liberdade e,
simultaneamente, ao cumprimento de penas restritivas de direito. A propósito, eis o
3 STF, 2a Turma, ARE 1.235.057 AgR/SC, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 27.03.2020, DJ 12.05.2020.
444 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
4. DURAÇÃO
Pelo menos em regra, a pena restritiva de direitos deverá ter a mesma duração
da pena privativa de liberdade por ela substituída. É nesse sentido, aliás, o teor do
art. 55 do Código Penal, segundo o qual as penas restritivas de direitos de prestação
de serviços à comunidade ou a entidades públicas, interdição temporária de direitos
e limitação de fim de semana têm a mesma duração da pena privativa de liberdade
substituída. Exemplificando, fixada na sentença condenatória uma pena de 1 (um)
ano de detenção, a qual alcança a monta de 365 dias, a fixação da pena de prestação
de serviços à comunidade aplicada em substituição deverá se dar em 365 horas.
Há, todavia, importantes exceções à regra geral do art. 55 do Código Penal:
i. Prestação de serviços à comunidade: nesse caso, se a pena a ser substituída
for superior a 1 (um) ano, é facultado ao condenado cumprir a pena substitutiva
Cap. IX • EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS 445
bem como os motivos e as circunstâncias do fato indicam que a medida seja sufi
ciente, pouco importando o quantum de pena cominado ao delito e que o delito em
questão envolva violência contra a pessoa (v.g., homicídio culposo). A reincidência,
por si só, não impede a aplicação do benefício no caso de crime culposo, já que tal
circunstância somente figura como óbice à substituição se o agente for reincidente
específico em crime doloso (CP, art. 44, II). Evidentemente, se o juiz concluir que a
reincidência demonstra que a substituição poderá não se mostrar medida suficiente,
por revelar conduta social ou personalidade incompatível com o benefício, poderá
denegar a substituição por restritiva de direitos.
Em se tratando de crimes dolosos (ou preterdolosos),4 alguns requisitos
cumulativos devem ser preenchidos pelo acusado, a saber:
1) Pena não superior a 4 (quatro) anos: nos crimes dolosos, admite-se a
substituição se a pena privativa de liberdade aplicada não for superior a 4 (quatro)
anos. É nesse sentido, aliás, o teor do art. 44, I, Ia parte, do CP, com redação dada
pela Lei n. 9.714/98. Operou-se, pois, a revogação tácita do art. 54 do Código Penal,
que previa, desde a entrada em vigor da Lei n. 7.209/84, que as penas restritivas
de direitos seriam aplicáveis nos crimes dolosos se acaso fixada pena privativa
de liberdade em quantidade inferior a 1 (um) ano. Perceba-se que é irrelevante
a pena in abstrato fixada no tipo penal. O que releva é a pena concretizada na
decisão condenatória. Outrossim, na hipótese de concurso de crimes, o parâmetro
a ser utilizado é o total das sanções somadas - no caso de concurso material e de
concurso formal impróprio -, ou exasperadas (concurso formal próprio e crime
continuado), e não aquela aplicada a cada delito isoladamente, não sendo possível
a aplicação da regra do art. 119 do CP, referendada pela súmula n° 497 do Supre
mo, que se refere apenas ao cálculo da prescrição.5 Especificamente em relação ao
concurso material, especial atenção deve ser dispensada a duas regras constantes
do art. 69 do CP: a) de acordo com o art. 69, §1°, do CP, na eventualidade de ser
negada a suspensão condicional da pena para um dos delitos, a substituição por
restritiva de direitos não seria cabível para os demais. Para a doutrina majoritária,
o dispositivo em questão foi tacitamente revogado pelo art. 44, §5°, do CP, in
cluído pela Lei n. 9.714/98, daí por que se revela possível que o juiz aplique para
um dos crimes pena privativa de liberdade e, quanto aos remanescentes, realize a
substituição por pena restritiva de direitos, desde que esta seja compatível com o
cumprimento da pena privativa de liberdade;6 b) quando forem aplicadas penas
restritivas de direitos, o condenado cumprirá simultaneamente as que forem com
patíveis entre si (v.g., prestação pecuniária e prestação de serviços à comunidade)
e sucessivamente as demais (CP, art. 69, §2°);
13 STJ, 5aTurma, AgRg no REsp 1.842.235/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 05.12.2019, DJe 17.12.2019.
14 STJ, 6a Turma, AgRg no REsp 1.873.041-SP, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 04.08.2020, DJe 13.08.2020. Com
raciocínio semelhante: STJ, 5a Turma, AgRg no AgRg no AREsp 1.276.547/RS, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j.
20.09.2018, DJe 26.09.2018.
15 STJ, 3a Seção, AREsp 1.716.664/SP, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 25.08.2021.
Cap. IX • EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS 449
liberdade por restritiva de direitos. A título de exemplo, em seu art. Io, § 5o, a Lei
de Lavagem de Capitais permite, entre outros benefícios, a substituição da pena
privativa por restritiva de direitos nas hipóteses de colaboração premiada, inde
pendentemente do quantum da sanção imposta ao condenado, quando o autor,
coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando
esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais e de sua autoria ou
à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.
Verificada a presença dos requisitos que autorizam a substituição da pena de
prisão pela restritiva de direitos, deve o magistrado escolher a mais adequada, assim
como fixar a quantidade de restritivas que serão aplicadas no caso concreto. Caso
a pena de prisão substituída não seja superior a um ano, o juiz poderá aplicar uma
pena restritiva de direitos ou multa. Se a pena for superior a um ano, a lei faculta
ao juiz substituí-la por duas penas restritivas de direitos ou uma pena restritiva de
direito cumulada com multa (CP, art. 44, § 2o). Na hipótese de não ser cabível a
substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, deve o juiz
analisar a possibilidade de concessão da suspensão condicional da pena, nos termos
dos arts. 77 e 78 do Código Penal.
6. QUESTÕES CONTROVERSAS
20 STF, Pleno, HC 97.256/RS, Rei. Min. Ayres Britto, j. 01/09/2010, DJe 247 15/12/2010. Na visão da 6a Turma
do STJ, o fato de o tráfico de drogas ser praticado com o intuito de introduzir substâncias ilícitas em es
tabelecimento prisional não impede, por si só, a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas
de direitos, devendo essa circunstância ser ponderada com os requisitos necessários para a concessão do
benefício: STJ, 6a Turma, AgRg no REsp 1.359.941/DF, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 4/2/2014.
21 Paradigma: STF, Pleno, ARE 663.261 RG/SP, Rei. Min. Luiz Fux, j. 13.12.2012, DJ 06.02.2013.
452 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
XLIII), admite essa possibilidade, não há como não a estender às demais infrações
do mesmo gênero. De mais a mais, removida a vedação legal à progressão de regime
aos condenados pela prática de crime hediondo em virtude do julgamento do HC
82.959/SP, também restou ultrapassada a argumentação que era utilizada para vedar
a substituição da reprimenda corporal por restritiva de direitos. Logo, desde que
preenchidos os requisitos do art. 44 do CP, é plenamente possível a substituição da
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, pouco importando, ademais,
o fato de se tratar de acusado estrangeiro.22
A partir do momento em que se entende cabível, pelo menos em tese, a
concessão de penas restritivas de direitos aos crimes hediondos e equiparados, se
acaso presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, não há por que se negar
tal benefício ao denominado tráfico privilegiado previsto no art. 33, §4°, da Lei
n. 11.343/06, haja vista que tal delito não tem natureza hedionda.23 Prova disso,
aliás, é o teor do art. 112, §5°, da LEP, incluído pelo Pacote Anticrime: “Não se
considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico
de drogas previsto no §4° do art. 33 da Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006”.
Não por outro motivo, por ocasião do julgamento do Habeas Corpus Coletivo n.
596.603/SP,24 impetrado pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo perante
a 6a Turma do ST) para fins de impugnar a manutenção de mais de 1.100 presos
(homens e mulheres) pela prática do crime de tráfico privilegiado que estariam
cumprindo pena de um ano e oito meses em regime fechado, com respaldo ex
clusivo no ultrapassado entendimento de que a conduta em questão caracterizaria
crime assemelhado a hediondo, a ordem foi concedida para, dentre outras fina
lidades, reconhecer ser possível a substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos aos condenados por tal delito que foram condenados à pena
não superior a 4 (quatro) anos, desde que devidamente preenchidos os demais
requisitos previstos no art. 44 do Código Penal.
22 No sentido de que o fato de se tratar de estrangeiro condenado pelo crime de tráfico ilícito de drogas
não pode ser utilizado como óbice à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos,
desde que, logicamente, preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos do art. 44 do CP: STF, 1a Turma,
HC 103.311/PR, Rei. Min. Luiz Fux, j. 07/06/2011, DJe 123 28/06/2011.
23 STF, Pleno, HC 118.533/MS, Rei. Min. Cármen Lúcia, j. 23/06/2016, DJe 199 16/09/2016. Com base nesse
entendimento, o STJ (3a Seção, Pet 11.796/DF, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 23/11/2016, DJe
29/11/2016) deliberou pelo cancelamento da sua súmula de n. 512: "A aplicação da causa de diminuição
de pena prevista no art. 33, §4°, da Lei n. 11.343/06 não afasta a hediondez do crime de tráfico de drogas".
24 STJ, 6a Turma, EDcl no HC 596.603-SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 08.09.2020, DJe 22.09.2020.
Cap. IX • EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS 453
Em relação aos crimes de lesão corporal dolosa leve (CP, art. 129, caput) e
ameaça (CP, art. 147), que têm, como elementares, a violência real e a grave ameaça,
prevalece o entendimento de que, por conta do princípio da especialidade, é possível
a substituição da pena de prisão por restritiva de direitos. Afinal, tais crimes são
considerados infrações de menor potencial ofensivo, submetendo-se aos institutos
despenalizadores da Lei n° 9.099/95, que expressamente admite a aplicação de penas
não privativas de liberdade (art. 62).
Todavia, não se admite substituição da pena privativa de liberdade por restritiva
de direitos no caso de condenação pelo crime de lesão corporal previsto no art. 129,
§ 9o, do Código Penal, já que se trata de infração penal praticada com violência no
âmbito familiar, sendo de todo irrelevante o fato de se tratar de violência domés
tica com requintes de crueldade extrema ou que se restrinja às vias de fato (tapas,
empurrões, socos, etc.).25
Em outras palavras, o termo “violência” a que faz menção o art. 44, I, do CP,
não comporta quantificação ou qualificação, abrangendo a violência praticada em
maior ou menor grau de intensidade. Aliás, há precedente da Ia Turma do STF26
considerando indevida a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva
de direitos até mesmo no caso de contravenção penal envolvendo violência domés
tica. Por isso, em caso concreto em que um indivíduo fora condenado por vias de
fato (LCP, art. 21), o referido Colegiado fez uso de interpretação extensiva do art.
44, I, do CP, para concluir que, no caso de violência doméstica e familiar contra
a mulher, a noção de crime teria o condão de abarcar qualquer conduta delituosa,
inclusive contravenção penal.
Consolidando essa linha de orientação, a 3a Seção do STJ deliberou pela apro
vação do enunciado da súmula n. 588 do STJ: “A prática de crime ou contravenção
penal contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico im
possibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos”.27
25 No sentido de que eventual interpretação que pretenda equiparar os crimes praticados com violência
doméstica contra a mulher aos delitos submetidos ao regramento previsto na Lei dos Juizados Especiais,
a fim de permitir a conversão da pena, não encontra amparo no art. 41 da Lei 11.340/2006: STF, 2a Turma,
HC 129.446/MS, Rei. Min.Teori Zavascki, j. 20/10/2015, DJe 221 05/11/2015. Na mesma linha: STJ, 6a Turma,
HC 192.104/MS, Rei. Min. Og Fernandes, j. 09/10/2012.
26 STF, Ia Turma, HC 137.888/MS, Rei. Min. Rosa Weber, j. 31/10/2017. Quanto à impossibilidade de se afastar
a substituição da pena privativa de liberdade quanto às contravenções penais, notadamente nas hipóteses
de violência no âmbito doméstico, o Superior Tribunal de Justiça também tem manifestado entendimento
acerca da ampliação dos efeitos do art. 44, I, do Código Penal, por força do art. 17 da Lei n. 11.340/2006.
A propósito, confira-se: STJ, 6a Turma, AgRg no REsp 1.607.382 MS, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j.
27/09/2016, DJe 13/10/2016.
27 Interpretando extensivamente a vedação constante do art. 44, inciso I, do Código Penal, em relação às
contravenções penais para vedar a substituição da pena por restritiva de direitos em relação a crime anão
de vias de fato (Dec.-Lei n. 3.688/41, art. 21) cometido no contexto de violência doméstica e familiar contra
a mulher: STF, Ia Turma, HC 137.888-MS, Rei. Min. Rosa Weber, j. 31.10.2017, DJ 21.02.2018. Com enten
dimento diametralmente oposto, a 2a Turma do STF já teve a oportunidade de concluir que, tratando-se
de condenação pela prática de contravenção de vias de fato, e não pela prática de crime, não incide o
óbice previsto no art. 44, I, do Código Penal, mesmo em se tratando de delito cometido no contexto da
violência doméstica e familiar contra a mulher, daí por que se revela cabível a substituição da pena corporal
454 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
por restritiva de direitos, conquanto não consista no pagamento de cesta básica, prestação pecuniária ou
multa (Lei n. 11.340/06, art. 17). A propósito, confira-se: STF, 2a Turma, HC 132.342, Rei. Min. Dias Toffoli, j.
30.08.2016; STF, 2a Turma, HC 131.160-MS, Rei. Min.Teori Zavascki, j. 18.10.2016.
Cap. IX • EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS 455
em relação a tais crimes não vinha atendendo aos fins de prevenção geral e especial
da pena, houve por bem o legislador em afastar a possibilidade de substituição da
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Cria-se, assim, uma regra es
pecial, legítima e aplicável unicamente aos crimes dos arts. 302, §3°, e 303, §2°, do
CTB, excepcionando-se, assim, a regra geral constante do art. 44, inciso I, do CP.28
Por se tratar de evidente exemplo de novatio legis in pejus, o novo regramento há
de ser aplicado exclusivamente aos crimes cometidos após a entrada em vigor da
Lei n. 14.071/20.
Outrossim, como em ambos os preceitos secundários consta, de maneira ex
pressa, cumulativamente à pena privativa de liberdade, a suspensão ou proibição
do direito de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor,
subsiste a aplicação destas penas restritivas de direitos, eis que, nesse caso, não terão
caráter substitutivo, já que estão previstas diretamente nos próprios tipos penais
incriminadores.
28 Com entendimento semelhante: MASSON. Op. cit. p. 626. Em sentido diverso, Alves (Op. cit. p. 568) sustenta
que continua sendo admissível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos nos
crimes previstos no §3° do art. 302 e no §2° do art. 303 do CTB. Para o autor, é inócuo o afastamento do
inciso I do art. 44 do Código Penal em relação a tais delitos. Isso porque as vedações à substituição previstas
nesse inciso (quando aplicada pena privativa de liberdade superior a 4 anos ou o crime for cometido com
violência ou grave ameaça) dizem respeito apenas aos crimes dolosos.
29 Nesse contexto: STF, Ia Turma, HC 136.718 AgR/MS, Rei. Min. Roberto Barroso, j. 06.02.2017, DJ 17.02.2017;
STJ, 5a Turma, HC 286.802/RJ, Rei. Min. Felix Fischer, j. 23/10/2014.
456 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
8. CRITÉRIOS DE SUBSTITUIÇÃO
32 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 638.821-SC, Rei. Min. João Otávio de Noronha, j. 10.08.2021, DJe 13.08.2021;
STJ, 5a Turma, AgRg no HC n. 456.224/SC, Rei. Min. Joel llan Paciornik, DJe de 1°/4/2019.
458 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
33 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 549.629/SP, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 04.08.2020, DJe 25.08.2020.
460 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
34 Em sentido um pouco diverso, Bitencourt (Op. cit. p. 171-172) sustenta que a pena de prisão simples, uma
vez substituída por restritiva de direitos, não mais poderá ser convertida em privativa de liberdade, mesmo
havendo descumprimento das condições impostas, por ausência de previsão legal e impossibilidade de
interpretatio in malam partem.
Cap. IX • EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS 461
35 Em caso concreto envolvendo duas condenações subsequentes a penas privativas de Liberdade a serem
cumpridas em regime aberto, ambas substituídas por penas restritivas de direito (prestação de serviços
à comunidade), concluiu a 6a Turma do STJ (HC 193.041/DF, Rei. Min. Alderita Ramos de Oliveira - De-
sembargadora convocada do TJ/PE -, j. 15.08.2013, DJe 19.12.2013) ser plenamente possível a execução
sucessiva das penas alternativas aplicadas.
36 STJ, 5a Turma, AgRg no AgRg no HC 545.924-SP, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 28.04.2020. No sentido de que a
superveniência de condenação à pena privativa de liberdade que foi substituída por restritiva de direitos
em relação a condenado que já cumpria outra pena restritiva de direitos não é causa obrigatória de recon
versão desta em pena privativa de liberdade, já que se afigura possível a execução sucessiva das restritivas:
STJ, 5a Turma, RHC 96.829-RS, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 24.04.2018, DJe 07.05.2018; STJ, 5a
Turma, HC 304.328-DF, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 10.05.2016, DJe 18.05.2016.
37 STJ, 5a Turma, HC 624.161/MG, Rei. Min. Felix Fischer, j. 09.12.2020, DJe 15.12.2020; STJ, 5a Turma, HC
528.001/MG, Rei. Min. Leopoldo de Arruda Raposo - Desembargador convocado do TJ/PE -, j. 17.12.2019,
DJe 19.12.2019.
462 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
38 Na visão do STJ (6a Turma, HC 493.068-RS, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 16.05.2019, DJe 30.05.2019), frustrado
o início do cumprimento das penas restritivas de direitos e a realização da audiência de justificação em
razão de desídia do condenado, que não informou outro endereço diverso daquele declinado nos autos
- ônus legal que lhe compete -, deverá ocorrer a reconversão em sanção privativa de liberdade.
Cap. IX • EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS 463
deverá cumprir a pena de limitação de fim de semana. Logo, nada mais razoável
do que se operar a reconversão dessa sanção em pena privativa de liberdade se o
condenado, devidamente intimado, simplesmente deixar de atender à obrigação
de recolhimento. Conquanto o art. 181, §2°, da LEP, não faça uso da locução
injustificadamente, como o fazem, por exemplo, algumas alíneas do parágrafo
anterior, o ideal é concluir que se admite a apresentação de eventual justificativa
do condenado para sua omissão (v.g., internação hospitalar), caso em que não
deverá ser determinada a reconversão;
b. Recusa do condenado em exercer a atividade determinada pelo juiz: durante
o período em que o condenado encontra-se recolhido para fins de cumprimento da
limitação de fim de semana, é possível que lhe sejam ministrados cursos e palestras
ou atribuídas atividades educativas (CP, art. 48, parágrafo único). Destarte, se o
condenado se recusar, injustificadamente, a participar dessas atividades, sujeitar-
-se-á à reconversão da restritiva em pena privativa de liberdade, já que, ao fim e
ao cabo, descumpriu injustificadamente a restrição que lhe fora imposta (CP, art.
44, §4°, Ia parte);
c. Ocorrência de qualquer das hipóteses do art. 181, §1°, letras “a”, “d” e
“e”, da LEP: a limitação de fim de semana também deverá ser objeto de reconversão
quando o condenado não for encontrado, por estar em lugar incerto e não sabido,
ou desatender a intimação por edital, quando praticar falta grave, e quando sofrer
condenação por outro crime à pena privativa de liberdade, cuja execução não tenha
sido suspensa. Tais hipóteses foram objeto de análise no item anterior, para onde
remetemos o leitor.
privativa de liberdade. Mais uma vez, havendo qualquer justificativa plausível para
o descumprimento da restritiva, não há falar em reconversão. Mirabete39 cita, por
exemplo, a situação do médico que se vê na contingência de atender pessoa na via
pública com grave risco de vida, e a do motorista que transporta ao hospital, em
automóvel, pessoa gravemente enferma;
b. Ocorrência de qualquer das hipóteses do art. 181, §1°, alíneas “a” e “e”, da
LEP: a interdição temporária de direitos também deverá ser objeto de reconversão
quando o condenado não for encontrado, por estar em lugar incerto e não sabido,
ou desatender a intimação por edital, e quando sofrer condenação por outro crime
à pena privativa de liberdade, cuja execução não tenha sido suspensa. Tais hipóteses
foram objeto de análise no item anterior, para onde remetemos o leitor.
40 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 582.302/SC, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 03.11.2020, DJe 16.11.2020; STJ, 5a
Turma, AgRg no REsp 1,843.809/SC, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 03.12.2019; DJe 12.12.2019.
41 Nessa linha: GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 18a ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2016. p.
655.
Cap. IX • EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS 467
42 No sentido de que a prestação pecuniária prevista no art. 45, §1°, do Código Penal pode ser compensada
com o montante fixado com fundamento no art. 387, IV, do Código de Processo Penal, ante a coincidência
de beneficiários: STJ, 5a Turma, REsp 1,882.059/SC, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 19.10.2021.
43 ROIG. Op. cit. p. 397.
468 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
44 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 516.321/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 24.09.2019, DJe 04.10.2019;
STJ, 5a Turma, HC 366.442/SC, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 18.04.2017, DJe 25.04.2017.
45 STJ, 6a Turma, REsp 1.699.665/PR, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 07/08/2018, DJe 15/08/2018.
46 É nesse sentido a lição de Renato Marcão (Op. cit. p. 284).
Cap. IX • EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS 469
47 A título de exemplo de ressalva constante da legislação especial, o art. 244-A do Estatuto da Criança e do
Adolescente, que versa sobre o crime de submeter criança ou adolescente à prostituição ou à exploração
sexual, prevê uma pena de reclusão de 4 a 10 anos e multa, além da perda de bens e valores utilizados
na prática criminosa em favor do Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente da Unidade da Federação
(Estado ou Distrito Federal) em que foi cometido o crime, ressalvado o direito de terceiro de boa-fé.
470 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
de direito, mas sim como uma das condições não privativas de liberdade passíveis de
fixação por ocasião da celebração do acordo de não persecução penal.
Não é possível confundi-la com a pena de trabalhos forçados, que é proibida
expressamente pela Constituição Federal (art. 5o, XLVII, c). A uma porque a própria
Constituição Federal faz referência expressa à prestação social alternativa como uma
das espécies de pena passíveis de aplicação (art. 5o, XLVI, d). A duas porque, por mais
que se trate de espécie de sanção penal, logo, dotada de caráter imperativo, é certo
afirmar que o condenado é livre, pelo menos em tese, para decidir pelo cumprimento
(ou não) das tarefas que lhe forem atribuídas, sujeitando-se, logicamente, em caso
de descumprimento injustificado, à reconversão à pena privativa de liberdade. Não
há falar, pois, em trabalhos forçados.48
De acordo com o art. 46, §3°, Ia parte, do Código Penal, incluído pela Lei n.
9.714/98, as tarefas devem ser atribuídas conforme as aptidões do condenado. Isso
significa dizer que não podem ser usadas de modo a expor o condenado a situações
vexatórias, degradantes ou constrangedoras. Logo, se, de um lado, revela-se perfei-
tamente possível e razoável a sujeição do autor de um crime de trânsito à presta
ção de serviços à comunidade em atividades relacionadas ao resgate, atendimento
e recuperação de vítimas de acidentes de trânsito (Lei n. 9.503/97, art. 312-A, IV,
incluído pela Lei n. 13.281/16), o que, em tese, o levaria à reflexão sobre seu ato
ilícito, facilitando o propósito pessoal de ressocialização, do outro, é de todo evi
dente que a imposição a um médico condenado pela prática de um crime qualquer
de serviços de limpeza no hospital local não atendería à finalidade última da pena.
As tarefas deverão ser cumpridas à razão de uma hora de tarefa por dia de
condenação (sistema da hora-tarefa), fixadas de modo a não prejudicar a jornada
normal de trabalho. O trabalho a que está obrigado o condenado terá a duração de
oito horas semanais e será realizado aos sábados, domingos e feriados, ou em dias
úteis. Impor que a prestação de serviços à comunidade seja executada durante a
jornada normal de trabalho não contribuirá com o processo de reintegração social,
pois acabará interferindo negativamente na estrutura profissional, familiar e social
do condenado, dificultando, na maioria das vezes, sua sobrevivência e o susten
to de sua família. A coincidência de horários geraria fatalmente um desconforto
absolutamente desnecessário, que acabaria tendo reflexos negativos na pretendida
ressocialização do sentenciado.
Essa duração diária de uma hora das tarefas deve ser compreendida como o
mínimo exigido do condenado. Isso porque, havendo interesse de sua parte, é perfei-
tamente possível que a execução de sua pena seja abreviada. Prova disso, aliás, é o
fato de o art. 46, §4°, do CP, dispor que se a pena substituída for superior a 1 (um)
ano, será facultado ao condenado cumprir a pena substitutiva em menor tempo,
nunca inferior a % (metade) da pena privativa de liberdade fixada. Perceba-se que
essa antecipação da finalização da pena é uma faculdade do condenado, daí por que
não pode ser imposta pelo juiz. Porém, só será admissível se a pena privativa de
48 MASSON, Cleber. Direito Penal: parte geral (arts. Io a 120). Vol. 1. 15a ed. Rio de Janeiro: Método, 2021. p.
642.
472 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
liberdade a ser substituída pela prestação de serviços for superior a 1 (um) ano. Po
rém, de modo a não transformá-la em uma pena meramente simbólica, e igualmente
não prejudicar a jornada normal de trabalho do condenado, a antecipação nunca
poderá ocorrer em período inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada.
Diversamente do que ocorre em relação à prestação pecuniária e à perda de
bens e valores, o procedimento executório da prestação de serviços à comunidade
ou a entidades públicas, a ser deflagrado após o trânsito em julgado da sentença
condenatória, é objeto de previsão expressa na Lei de Execução Penal (arts. 149 e
150), podendo ser sintetizado nos seguintes termos:
i. A prestação de serviços à comunidade deve ser aplicada pelo juiz do pro
cesso de conhecimento. Ao Juízo da Execução caberá, todavia, designar a entidade
ou programa comunitário ou estatal, devidamente credenciado ou conveniado,
junto ao qual o condenado deverá trabalhar gratuitamente, de acordo com as suas
aptidões, já que é ele que conhece a situação das entidades adequadas e fiscalizará
a execução da pena;
ii. Ao juízo da execução também caberá determinar a intimação do condena
do, cientificando-o da entidade, dias e horário em que deverá cumprir a pena. Se
o condenado não for encontrado, por estar, por exemplo, em lugar incerto e não
sabido, e deixando de atender à intimação por edital, deverá haver a reconversão
da restritiva em pena privativa de liberdade. O mesmo deverá ocorrer quando o
condenado não comparecer injustificadamente à entidade ou programa em que
deva prestar serviço; recusar-se injustificadamente a prestar o serviço que lhe foi
imposto; praticar falta grave e sofrer condenação por outro crime à pena privativa
de liberdade, cuja execução não tenha sido suspensa (LEP, art. 181, §1°);
iii. Em qualquer fase da execução, poderá o juízo, motivadamente, alterar a
forma de cumprimento da prestação de serviços à comunidade ou a entidades pú
blicas, ajustando-a às condições pessoais do condenado (v.g., eventuais modificações
ocorridas em sua jornada de trabalho), e às características do estabelecimento, da
entidade ou do programa comunitário ou estatal;
iv. A execução terá início a partir da data do primeiro comparecimento do
condenado, devendo a entidade beneficiada com a prestação de serviços encaminhar
ao juízo da execução relatório circunstanciado das atividades do condenado, bem
como, a qualquer momento, comunicação sobre ausência ou falta disciplinar;
v. Durante o curso da prestação de serviços, é possível que o condenado mani
feste interesse em mudar de domicílio, hipótese em que o juízo da execução deverá
expedir carta precatória para a localidade da sua nova residência para que lá seja
realizada a fiscalização do cumprimento da pena restritiva de direitos. Não haverá,
todavia, a transferência de competência, que continuará sendo do juízo responsá
vel pela execução do local da condenação, a quem caberá praticar atos decisórios,
como, por exemplo, a reconversão em privativa de liberdade. Nesse sentido, como
já se pronunciou o STJ, “(...) a competência para a execução penal cabe ao Juízo
da condenação, sendo deprecada ao Juízo do domicílio do apenado somente a
Cap. IX • EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS 473
49 STJ, 3a Seção, CC 172.445/RJ, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 24.06.2020, DJe 29.06.2020; STJ, 3a Seção, CC
113.112/SC, Rei. Min. Gilson Dipp, DJe 17.11.2011.
50 É nesse sentido a lição de Jamil Chaim Alves (Manual de Direito Penal: Parte Geral e Parte Especial. 2a ed.
Salvador: Editora Juspodivm, 2021. p. 581). Em sentido diverso, Bitencourt (Tratado de Direito Penal: parte
geral. Vol. 1. 16a ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 575) sustenta que o juiz da execução não detém com
petência para alterar a modalidade de pena restritiva aplicada, ou seja, substituir a limitação de fim de
semana, por exemplo, por prestação e serviços à comunidade ou por prestação pecuniária, porque isso
representaria alterar a pena aplicada na decisão condenatória, que transitou em julgado.
474 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
51 STJ, 6a Turma, HC 258.471/SP, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 02.08.2016, DJe 15.08.2016.
Cap. IX • EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS 475
pela Lei n. 7.209/84) era aplicada como espécie de pena restritiva de direitos exclu
sivamente em relação aos crimes culposos de trânsito. Ocorre que, posteriormente,
tais crimes foram deslocados em sua maioria para o Código de Trânsito Brasileiro
(Lei n. 9.503/97), cujo art. 292 prevê que a suspensão ou a proibição de se obter a
permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor pode ser imposta isolada
ou cumulativamente com outras penalidades. Por se tratar de norma especial e
posterior, houve a revogação tácita do art. 47, III, do CP, que, atualmente, deve ser
compreendido nos seguintes termos: i. Em relação à permissão e à habilitação52 para
dirigir veículos automotores, aplica-se o quanto disposto no art. 292 do CTB; ii. No
tocante à autorização para dirigir ciclomotores (CTB, art. 141),53 subsiste a aplicação
do art. 47, III, do CP, vez que tal situação não foi regulamentada pelo Código de
Trânsito Brasileiro; iii. Subsiste a interdição como pena substitutiva da liberdade
em relação aos delitos não previstos no Código de Trânsito Brasileiro, como, por
exemplo, aqueles decorrentes de acidentes motonáuticos;54
IV - Proibição de frequentar determinados lugares: é sabido que certos
locais, por sua natureza, finalidade, localização ou tipo de frequência, acabam por
favorecer a prática de infrações penais. Por esse motivo, esta pena deve ser utilizada
para os casos em que a vedação se mostrar necessária ou conveniente para prevenir
a prática de novos ilícitos. A lei não dispõe sobre a espécie de lugar cujo acesso ou
frequência poderá ser objeto da medida. Logo, poderá ser determinada a restrição ao
acesso a locais públicos (v.g., parques em que há venda de drogas), locais privados
abertos ao público (v.g., casas noturnas) e até mesmo locais privados (v.g., casa do
ofendido). De todo modo, deve haver uma relação entre o local cujo acesso está
proibido e a prática do ilícito (v.g., impedir que um integrante de torcida organi
zada frequente estádios de futebol). Além disso, por ocasião de sua adoção, deve o
magistrado especificar quais os lugares que o acusado não pode frequentar, sendo
inadmissível a proibição de frequência a determinados locais em termos genéricos,
sem especificá-los. A fim de assegurar a operacionalidade e eficácia da medida, devem
ser pensados instrumentos idôneos para a sua fiscalização. A despeito do silêncio
da lei, queremos crer que a sua adoção deve ser comunicada de imediato à Polícia
Judiciária e à própria Polícia Militar, a fim de que deem apoio ao seu cumprimento;
V - Proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exames públicos: a
pena de interdição temporária de direitos sob comento foi introduzida no Código
Penal pela Lei n. 12.550/11, mesmo diploma normativo responsável pela criação do
delito de fraude em certame de interesse público (CP, art. 311-A). Esse detalhe é de
fundamental importância para se concluir que a mencionada interdição temporária de
direitos não poderá ser aplicada em relação a todo e qualquer delito. Pelo contrário.
52 De acordo com o art 148, §2°, do CTB, ao candidato aprovado será conferida permissão para dirigir, com
validade de um ano. Por sua vez, consoante disposto no art. 148, §3°, do CTB, a Carteira Nacional de
Habilitação será conferida ao condutor no término de um ano, desde que o mesmo não tenha cometido
nenhuma infração de natureza grave ou gravíssima ou seja reincidente em infração média.
53 Na dicção do Anexo I do CTB, ciclomotor é "o veículo de duas ou três rodas, provido de um motor de
combustão interna, cuja cilindrada não exceda a cinquenta centímetros cúbicos (3,05 polegadas cúbicas)
e cuja velocidade máxima de fabricação não exceda a cinquenta quilômetros por hora".
54 Com esse entendimento: AVENA. Op. cit. p. 333.
476 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
Para tanto, a infração penal deverá guardar relação com fatos que, de alguma forma,
traduzam a sua finalidade de beneficiar-se, por exemplo, fraudulentamente, com sua
aprovação em concurso, avaliação ou exame público, processo seletivo para ingresso
no ensino superior, exame ou processo seletivo previsto em lei. Cuida-se, pois, de
pena restritiva de direitos específica (ou especial). Supondo, assim, que alguém seja
condenado por utilizar o gabarito de questões que seriam usadas em determinado
concurso público (CP, art. 311-A, inciso I, incluído pela Lei n. 12.550/11), como a
sanção cominada ao referido delito é de reclusão, de 1 a 4 anos, e multa, a pena
privativa de liberdade poderá ser substituída por restritiva de direitos, mais preci
samente pela proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exames públicos
(CP, art. 47, V, incluído pela Lei n. 12.550/11).55
55 Em sentido diverso, Masson sustenta a tese de que se trata de pena restritiva de direitos genérica, pois
seu raio de incidência não se limita ao crime definido no art. 311-A do CP. Para o autor (Op. cit. p. 647),
"a condenação por delitos diversos recomenda a vedação do acesso às funções e cargos públicos, pela
ausência de lisura e de idoneidade moral do agente, a exemplo do que se dá no estelionato, nos crimes
contra a Administração Pública, nos crimes em licitações e contratos administrativos, entre tantos outros".
56 STJ, 5a Turma, HC 60.919/DF, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 10.10.2006.
Cap. IX • EXECUÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS 477
nas hipóteses ditadas pelo art. 117 da Lei de Execução Penal, muitos juizes optam
por deixar de aplicá-la.
Sem embargo, diante da remota possibilidade de aplicação, caberá ao Juízo da
Execução determinar a intimação do condenado, cientificando-o do local, dias e
horário em que deverá cumprir a pena. A execução terá início a partir da data do
primeiro comparecimento (LEP, art. 151). O estabelecimento designado encaminhará,
ao Juízo da Execução, relatório, bem assim comunicará, a qualquer tempo, a ausência
ou falta disciplinar do condenado, hipótese em que poderá ocorrer a reconversão
em pena privativa de liberdade. Se o condenado não for encontrado por estar em
lugar incerto e não sabido, não atender à intimação por edital, a limitação de fim
de semana será reconvertida em pena privativa de liberdade. Idêntica providência
deverá ser adotada se o condenado não comparecer ao estabelecimento designado
para o cumprimento da pena, recursar-se a exercer a atividade determinada pelo
juiz, praticar falta grave e sofrer condenação por outro crime à pena privativa de
liberdade cuja execução não tenha sido suspensa (LEP, art. 181, §2°).
EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA
1. NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
Com status constitucional (art. 5o, XLVI, “c”), a multa pode ser conceituada
como uma espécie de sanção penal, de cunho patrimonial, consistente no pagamento
de determinado valor em dinheiro em benefício do Fundo Penitenciário.
Criado pela Lei Complementar n. 79/941, o Fundo Penitenciário Nacional
(FUNPEN) foi instituído no âmbito do Ministério da Justiça, e é gerido pelo Depar
tamento Penitenciário Nacional (Depen), tendo a finalidade de proporcionar recursos
e meios para financiar e apoiar as atividades e os programas de modernização e
aprimoramento do sistema penitenciário nacional. Uma das fontes de receita do
FUNPEN são exatamente as multas decorrentes de sentenças penais condenatórias
com trânsito em julgado (LC 79/94, art. 2o, inciso V).
Nada dispõe a Lei Complementar n. 79/94 acerca da origem das multas, é
dizer, não especifica se as condenações em questão seriam oriundas do Poder
Judiciário da União ou da Justiça Estadual, do Código Penal ou de alguma lei
extravagante. Por isso, ressalvada a hipótese em que houver lei federal conferin
do destinação específica ao valor arrecadado, é dominante o entendimento no
sentido de que os Estados podem legislar sobre o tema, direcionando a quantia
para um fundo sob sua administração, sobretudo porque a própria Constituição
Federal estabelece que a União, os Estados e o Distrito Federal podem legislar
concorrentemente sobre direito penitenciário (art. 24,1). Cite-se, a título de exem
plo o Fundo Penitenciário do Estado de Minas Gerais, criado pela Lei Estadual
n. 11.402/94, que tem por objetivo possibilitar a obtenção e a administração de
recursos financeiros destinados ao sistema penitenciário mineiro e à construção,
à manutenção, à reforma e à ampliação de unidades destinadas ao cumprimento
de medida socioeducativa de internação.
1 Altera a Lei Complementar 79, de 7 de janeiro de 1994, para dispor sobre o percentual mínimo do repasse
obrigatório da União aos fundos dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
480 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
2 Há exceções previstas na Legislação Especial: a) o crime de abandono material previsto no art. 244 do
Código Penal prevê uma pena de detenção, de 1 a 4 anos e multa, de um a dez vezes o maior salário
mínimo vigente no País; b) a contravenção penal descrita no art. 43 da Lei de Locações (Lei n. 8.245/91) é
punida com multa de 3 a 12 meses do valor do último aluguel atualizado, revertida em favor do locatário.
3 No sentido de que, na primeira fase de fixação da pena de multa, o número de dias-multa deve ser fixado
com base nas circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, ao passo que na segunda, o valor de cada dia-
-multa deve levar em conta a situação econômica do acusado: STJ, 5a Turma, REsp 897.876/RS, Rei. Min.
Felix Fischer, j. 12/06/2007, DJ 29/06/2007 p. 711.
Cap. X • EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA 481
Como a situação econômica do acusado deve servir tão somente para fins de
fixação do valor de cada dia-multa (CP, art. 60, caput), o juiz do processo de conhe
cimento não pode deixar de aplicar a sanção pecuniária em virtude da precariedade
da condição financeira do apenado. O que existe, no âmbito da legislação especial,
é a possibilidade de o juiz reduzir o valor da pena de multa. De fato, consoante
disposto no art. 76, §1°, da Lei n. 9.099/95, na hipótese de ser a pena de multa a
única aplicável, o juiz pode reduzi-la até a metade. Em sentido semelhante, nos
crimes contra a propriedade industrial, a pena de multa poderá ser reduzida em até
10 vezes, em virtude das condições pessoais do agente e da magnitude da vantagem
auferida (Lei n. 9.279/96, art. 197, parágrafo único).
Também há controvérsias acerca da necessidade ou não de cobrança de multa
irrisória, assim compreendida como aquela de valor extremamente reduzido. De
um lado, há quem entenda que tal multa jamais deveria ser objeto de execução,
eis que o custo necessário para tanto certamente seria bem maior que aquele que
seria arrecado ao final. Prevalece, todavia, o entendimento de que, por se tratar de
espécie de pena, sua cobrança em juízo é obrigatória, seja à luz do princípio da
imperatividade da aplicação das penas, seja em virtude da inderrogabilidade de seu
cumprimento. Em reforço a esse entendimento, aliás, o art. Io, §1°, da Portaria do
Ministério da Fazenda n. 75/2012, que estabelece os valores mínimos para inscrição
e execução da Dívida Ativa da União, contempla uma ressalva expressa à pena de
multa, o que, em tese, demonstra não existir um valor mínimo para legitimar a sua
execução forçada.4
Quanto à possibilidade de fixação do valor do dia-multa atrelado ao do
salário mínimo, não há falar em suposta violação ao art. 7o, IV, da Constituição
Federal, que prevê que é vedada a vinculação do salário mínimo para qual
quer fim. Na verdade, como bem observa a doutrina,5 a norma constitucional
em questão visa evitar que o salário mínimo seja utilizado como indexador
econômico, impedindo que, a cada aumento do piso salarial, subissem, pro
porcionalmente, os preços de produtos e serviços, tornando inócua a elevação
do mínimo. Essa a finalidade da regra (interpretação teleológica), a qual não
resulta vulnerada com a determinação de que o dia-multa seja calculado a
partir do salário mínimo.
Especificamente em relação à correção monetária, parte da doutrina sustenta
que o valor da multa deveria ser corrigido apenas a partir do trânsito em julgado
da sentença penal condenatória, eis que o montante seria exigível tão somente a
partir de então. Prevalece, todavia, sobretudo na jurisprudência, a orientação de que
o valor da multa deve ser corrigido a partir da data da infração, sem que se possa
4 MASSON, Cleber. Direito Penal: parte geral (arts. 1o a 120). Vol. 1. 15a ed. Rio de janeiro: Forense; MÉTODO,
2021. p. 653.
5 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal comentado. 4a ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2003. p. 250. Nesse contexto, a súmula vinculante n° 4 dispõe: "Salvo nos casos previstos na Constituição,
o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público
ou de empregado, nem ser substituído por decisão judicial".
482 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
6 STJ, 6a Turma, AgRg no REsp 1.063.031/PR, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 14.02.2012, DJe
27.02.2012.
7 Paradigma: STF, Pleno, RE 1.347.158, Rei. Min. Luiz Fux, j. 05.11.2021.
Cap. X • EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA 483
8 A propósito, confira-se: STJ, 5a Turma, REsp 459.750/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, DJ 15/09/2003 p. 351; STJ, 6a
Turma, AgRg no REsp 1,027.204/MG, Rei. Min. Hamilton Carvalhido, DJe 18/08/2008.
484 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
11 STJ, 3a Seção, REsp n. 1.519.777/SP, Rei. Ministro Rogério Schietti, DJe 10/9/2015.
Cap. X • EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA 487
as desigualdades sociais e regionais” (CF, art. 3o, III). Por tais motivos, a 3a Seção
do STJ deliberou pela revisão do enunciado em questão. Confira-se, nesse sentido,
a nova redação da Tese de Recurso Especial Repetitivo fixada no tema n. 931:
“Na hipótese de condenação concomitante a pena privativa de liberdade e multa, o
inadimplemento da sanção pecuniária, pelo condenado que comprovar impossibili
dade de fazê-lo, não obsta o reconhecimento da extinção da punibilidade”.14
O tema foi objeto de análise no capítulo atinente à execução das penas restritivas
de direitos.
O remédio constitucional do habeas corpus não pode ser utilizado como sucedâ
neo de outras ações judiciais, notadamente naquelas hipóteses em que o direito-fim
não se identificar com a própria liberdade de locomoção física. Assim, não havendo
risco efetivo de constrição à liberdade de locomoção física, não se revela pertinente
o remédio do habeas corpus, cuja utilização supõe, necessariamente, a concreta confi
guração de ofensa, atual ou iminente, ao direito de ir, vir e permanecer das pessoas.
Destarte, caso a pretensão do impetrante não esteja relacionada à tutela da liberdade
de locomoção, faltará interesse de agir por inadequação do pedido, acarretando o
não conhecimento do habeas corpus.
Em se tratando de persecução penal referente à infração penal à qual seja
cominada tão somente a pena de multa, é de todo relevante destacar que o não
pagamento da multa não autoriza mais a conversão em pena privativa de liberdade
14 Paradigma: STJ, 3a Seção, Resp 1.785.383/SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 24.11.2021, Dje 30.11.2021.
15 STF, Pleno, EP 12 ProgReg-AgR/DF, Rei. Min. Roberto Barroso, j. 08/04/2015, DJe 93 19/05/2015.
16 A controvérsia foi objeto de análise no capítulo atinente à execução da pena privativa de liberdade, mais
precisamente no tópico referente à progressão de regimes, para onde remetemos o leitor.
Cap. X • EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA 489
(CP, art. 51, com redação determinada pela Lei n. 9.268/96). Logo, na medida em
que não é possível a conversão em prisão, não há risco à liberdade de locomoção,
revelando-se inadequada a utilização do habeas corpus. Daí os dizeres da súmula n.
693 do STF (“Não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa,
ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária seja
a única cominada”). A título de exemplo, considerando-se que, com o advento da
Lei n. 11.343/06, deixou de ser possível a aplicação de pena privativa de liberdade
ao crime de porte de drogas para consumo pessoal (art. 28), sequer por conversão,
forçoso é concluir que eventual persecução penal instaurada em relação a este delito
não terá o condão de expor a liberdade ambulatorial do agente a risco de ameaça.
Por conseguinte, nos mesmos moldes que um processo penal referente à infração
penal à qual seja cominada exclusivamente pena de multa, não se admite a utilização
do habeas corpus para impugnar eventual decisão que impuser as penas previstas
no art. 28, o que, no entanto, não impede a utilização do mandado de segurança
quando estivermos diante de ilegalidades ou abuso de poder.17
Embora a pena de multa possua natureza de sanção penal (STF, ADI n. 3.150/
DF), subsiste a impossibilidade de sua conversão em pena privativa de liberdade
em caso de inadimplemento, por ser dívida de valor (CP, art. 51). Logo, sem em
bargo de o STJ ter firmado entendimento no sentido de que o não pagamento da
pena de multa, de natureza penal, inviabiliza a extinção da punibilidade em caso
de cumprimento apenas da pena privativa de liberdade, os respectivos reflexos são
extrapenais ou apenas acidentais e não atuais, o que, portanto, continua a inviabilizar
a utilização do habeas corpus, que pressupõe coação ou iminência direta de coação
à liberdade de ir e vir.18
A infração penal de porte de droga para consumo pessoal está prevista no art.
28, caput, da Lei n. 11.343/06, nos seguintes termos: “Quem adquirir, guardar, tiver
em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem
autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, será subme
17 Na mesma linha: MENDONÇA, Andrey Borges; CARVALHO, Paulo Roberto Galvão de. Lei de drogas: Lei n.
11.343, de 23 de agosto de 2006 - comentada artigo por artigo. 3a ed. São Paulo: Editora Método, 2012. p.
86. Estranhamente, no entanto, há precedente isolado do STF admitindo a impetração de habeas corpus
em relação ao crime de porte ou cultivo de drogas para consumo pessoal, apesar de o cabimento do
writ não ter sido diretamente apreciado pela Corte. Nesse sentido, determinando o trancamento de
processo em relação ao art. 28 da Lei n. 11.343/06 com fundamento no princípio da insignificância: STF,
Ia Turma, HC 110.475/SC, Rei. Min. Dias Toffoli, j. 14/02/2012, DJe 054 14/03/2012. Em sentido diverso,
concluindo pela impropriedade da impetração de habeas corpus em relação ao crime do art. 28 da Lei
de Drogas, haja vista não haver cominação de pena privativa de liberdade: STF, 1a Turma, HC 127.834/
MG, Rei. Min. Alexandre de Moraes, j. 05/12/2017.
18 Com esse entendimento: STJ, 5a Turma, AgRg no HC 595.701/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j.
20.10.2020, DJe 26.10.2020.
490 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
19 MENDONÇA, Andrey Borges; CARVALHO, Paulo Roberto Galvão de. Lei de drogas: Lei n° 11.343, de 23 de agosto
de 2006 - comentada artigo por artigo. 3a ed. São Paulo: Editora Método, 2012. p. 79. Segundo os autores,
se o descumprimento das penas restritivas não caracteriza o crime de desobediência, a multa coercitiva,
que visa dissuadir o agente da ideia de não cumprir a pena, não tem caráter penal. Outro argumento
apontado pelos autores no sentido de que esta multa não tem natureza penal diz respeito ao momento
de sua aplicação. Como esta multa sequer consta da sentença condenatória, já que sua aplicação ocorre
por meio de decisão proferida em incidente da execução, seria inconcebível emprestar a ela a natureza
de pena, a não ser que se admita que uma pena possa ser imposta durante o curso da execução penal,
o que, à evidência, viria de encontro ao princípio segundo o qual não há pena sem o devido processo
legal.
Cap. X • EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA 491
20 De se lembrar que, em virtude de a Convenção Americana sobre Direitos Humanos admitir exclusivamente
a prisão civil do devedor de alimentos (Dec. 678/92, art. 7o, § 7o), o próprio Supremo Tribunal Federal
passou a considerar incabível a prisão do depositário infiel. A propósito, eis o teor da súmula vinculante
n° 25: "É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito".
492 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
Juizados Especiais Criminais, sua execução deve se dar à luz dos arts. 84 e 85 da Lei
n° 9.099/95. Portanto, a pena de multa deve ser cumprida mediante pagamento na
Secretaria do próprio Juizado Especial Criminal. Caso não seja efetuado o pagamento
voluntário da multa, esta deverá ser objeto de execução, nos exatos termos do art.
51 do CP, com redação determinada pela Lei n. 13.964/19.21
Por fim, se considerarmos que a multa coercitiva prevista no art. 28, § 6o, II,
da Lei de Drogas, não tem natureza penal, é certo dizer que, na hipótese de morte
do agente, é perfeitamente possível que o montante devido seja cobrado dos su
cessores do de cujus. À evidência, o herdeiro não poderá responder por encargos
superiores às forças da herança, tal qual disposto no art. 1.792 do Código Civil.
Nesse caso, não se pode objetar que a transmissão da cobrança da multa coercitiva
aos herdeiros implique em violação ao princípio da intranscedência da pena, já que
a medida pecuniária sob comento tem natureza extrapenal.
21 Para o STJ, se o acusado não paga a multa aplicada em virtude de transação penal, esta deve ser cobrada
em execução penal, nos moldes do art. 51 do CP, não sendo admissível o oferecimento de denúncia: STJ,
5a Turma, REsp 612.411/PR, Rei. Min. Felix Fischer, DJ 30/08/2004 p. 328.
Cap. X • EXECUÇÃO DA PENA DE MULTA 493
Antes do advento da Lei Maria da Penha, quando ainda era possível a aplicação
da Lei dos Juizados às hipóteses de violência doméstica e familiar contra a mulher,
esta espécie de violência era mensurada de acordo com o valor da pena de multa
ou consoante a quantidade de cestas básicas a que o acusado havia sido condenado.
Essa transformação da violência doméstica e familiar contra a mulher em pecúnia
era muito questionada, porquanto permitia que eventual agressão física, psicológica,
patrimonial, sexual ou moral contra o sexo feminino fosse absurdamente sancionada
com o simples pagamento de determinada quantia em dinheiro.
Com o objetivo de pôr fim ao princípio absurdo de que, “para bater na esposa
ou na companheira, bastava pagar”, o art. 17 da Lei Maria da Penha passou a dispor
que, nos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, é
vedada a aplicação de penas de cesta básica ou outra que implique somente o pa
gamento de pecúnia, a exemplo do que ocorre com a pena restritiva de direito de
prestação pecuniária (CP, art. 45, §§ Io e 2o), bem como a substituição de pena que
implique o pagamento isolado de multa.
Especificamente em relação à pena de multa, é importante notar que o dis
positivo veda apenas a substituição de pena que implique o pagamento isolado de
multa. É o que ocorre, por exemplo, na hipótese do art. 44, § 2o, primeira parte,
que prevê que “na condenação igual ou inferior a 1 (um) ano, a substituição pode
ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos”. Essa possibilidade de
aplicação isolada de multa também tem previsão legal no art. 60, § 2o, do CP:
“A pena privativa de liberdade aplicada, não superior a 6 (seis) meses, pode ser
substituída pela de multa, observados os critérios dos incisos II e III do art. 44
deste Código”.
22 MASSON, Cleber. Crimes em licitações e contratos administrativos. Rio de Janeiro: Forense, 2021. p. 6.
494 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
1. NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
sua previsão legal for anterior à prática da infração penal (CF, art. 5o, XXXIX),
incidindo, ademais, o princípio constitucional da irretroatividade da lei penal mais
gravosa (CF, art. 5o, XL).
3. PRESSUPOSTOS
1 As controvérsias atinentes aos prazos mínimo e máximo de duração da medida de segurança serão objeto
de análise na sequência.
Cap. XI • EXECUÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA 497
sumariamente (CPP, art. 397, III), seja ao final do processo (CPP, art. 386, III). Na
mesma linha, reconhecido que agente inimputável praticou determinado fato típico
sob o amparo de causa excludente da ilicitude (v.g., legítima defesa), deve o juiz
absolvê-lo, quer sumariamente (CPP, art. 397, I), quer por ocasião da prolação da
sentença absolutória (CPP, art. 386, VI, Ia parte). Em ambos os exemplos, como se
trata de sentença absolutória própria, ao acusado não será imposto o cumprimento
de medida de segurança.
Portanto, para que seja cabível a aplicação de medida de segurança, é indis
pensável que a absolvição do agente decorra exclusivamente da inimputabilidade,
e não de uma causa justificante ou exculpante de outra natureza. Na verdade,
somente será possível a aplicação de medida de segurança ao inimputável ou
ao semi-imputável quando, na mesma hipótese, houvesse fundamento para a
condenação de agente imputável. Nesse contexto, como destaca Bitencourt, a
aplicação de medida de segurança depende do preenchimento dos seguintes
pressupostos:2
a. Prática de fato típico, antijurídico e punível: é indispensável que o agente
inimputável tenha praticado fato típico e ilícito (injusto penal), e que não estejam
presentes causas excludentes da culpabilidade diversas da inimputabilidade, tais como
o erro de proibição inevitável, a coação moral irresistível, a obediência hierárquica.
A propósito, como dispõe o art. 96, parágrafo único, do Código Penal, extinta a
punibilidade, não se impõe medida de segurança nem subsiste a que tenha sido im
posta. Logo, presente uma causa extintiva da punibilidade qualquer (v.g., prescrição),
não poderá ser aplicada uma medida de segurança, ainda que disfarçadamente sob
o rótulo de interdição civil;3
b. Periculosidade do agente: deve ser compreendida como um estado subjetivo
mais ou menos duradouro de antissociabilidade, ou seja, um juízo de probabilida
de de que o agente voltará a delinquir. Reclama-se, assim, um juízo de prognose,
calcado em conjecturas razoáveis de que o indivíduo tornará a cometer infrações
penais. Subdivide-se em duas espécies:
b.l. Periculosidade presumida: se o agente é inimputável (CP, art. 26, caput),
a lei o considera automaticamente perigoso. Daí por que se diz que sua periculosi
dade seria presumida ou ficta. Por consequência, o juiz deverá absolvê-lo ao final
do processo, impondo, todavia, medida de segurança. Cuida-se de uma absolvição
que resulta na imposição de uma sanção, sendo, por tal motivo, denominada de
absolvição imprópria;
b.2. Periculosidade real (ou judicial): é aquela que deve ser comprovada no
caso concreto, pois não é presumida pela lei. Aplica-se aos semi-imputáveis do art.
2 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral. Vol. 1. 16a ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
783.
3 Nesse sentido, em caso concreto em que se optou pela restrição de uma garantia fundamental - a liberda
de - pela via da interdição civil de quem teve a punibilidade extinta e possuía laudo psiquiátrico favorável
à desinternação: STF, 2a Turma, HC 151.523-SP, Rei. Min. Edson Fachin, j. 27.11.2018.
498 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
26, parágrafo único, do Código Penal. Destarte, quando tal indivíduo cometer uma
infração penal, deverá ser tratado como culpável, a não ser que o exame de sani
dade mental que constatar a diminuição da sua responsabilidade também concluir
pela sua periculosidade, recomendando, assim, a substituição da pena por especial
tratamento curativo, leia-se, por medida de segurança;
c. Ausência de imputabilidade plena: o agente imputável não pode sofrer
medida de segurança, somente pena. O agente semi-imputável só estará sujeito
à medida de segurança excepcionalmente, e desde que comprovado que necessita
de especial tratamento curativo, caso contrário, também ficará sujeito somente
à pena.
Antes da reforma da Parte Geral pela Lei n. 7.209/84, o Código Penal dispunha
que a medida de segurança poderia ser imposta na sentença de condenação ou
de absolvição (art. 79, caput). Por sua vez, consoante disposto na redação original
do art. 79, parágrafo único, inciso II, do CP, depois da sentença, a medida de
segurança poderia ser imposta enquanto não decorrido tempo equivalente ao da
duração mínima da medida de segurança, a indivíduo que, embora absolvido, a
lei presumisse perigoso. É dentro desse contexto que surge a Súmula n. 422 do
STF: “A Absolvição criminal não prejudica a medida de segurança, quando couber,
ainda que importe privação da liberdade. À época em que o referido enunciado
foi aprovado - Io de junho de 1964 -, desde que reconhecida a periculosidade
do agente, eventual absolvição não era óbice à aplicação de medida de segurança,
ainda que houvesse a privação da sua liberdade de locomoção. No entanto, com
a reforma da Parte Geral em 1984, o imputável que praticar uma conduta punível
passou a se sujeitar tão somente à pena correspondente; o inimputável, à medida
de segurança, e o semi-imputável, também chamado de “fronteiriço”, à pena ou
medida de segurança, é dizer, ou uma ou outra, jamais as duas, como ocorria no
sistema do duplo binário (duplo trilho ou dupla via). O Código Penal passou
a adotar, assim, o chamado sistema vicariante (ou unitário), por meio do qual
o juiz aplica pena ou medida de segurança (alternatividade). São duas, então, as
possibilidades:
1. Inimputável: comprovada a autoria e materialidade de injusto penal atri
buído a um agente inimputável (CP, art. 26, caput), cuja punibilidade não esteja
extinta por uma causa qualquer, a ele não se impõe a aplicação de pena, haja vista
a ausência de seu pressuposto básico, a culpabilidade. Deverá ser determinado,
portanto, o cumprimento de medida de segurança, nos termos do art. 386, pará
grafo único, inciso III, do CPP, naquilo que se convencionou chamar de sentença
absolutória imprópria;
2. Semi-imputável: raciocínio diverso deverá ser aplicado em relação ao
semi-imputável (CP, art. 26, parágrafo único). Nesse caso, a sentença será con
denatória. Embora diminuída, a culpabilidade autoriza a aplicação de uma pena,
Cap. XI • EXECUÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA 499
4 STJ, 6a Turma, HC 275.635/SP, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 08.03.2016, DJe 15.03.2016.
5 STJ, 6a Turma, REsp 1.802.845/RS, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 23.06.2020, DJe 30.06.2020.
500 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
6 Há precedentes do STJ no sentido de que o juiz sumariante pode efetivar a absolvição imprópria do acu
sado inimputável, na hipótese em que, além da tese de inimputabilidade, a defesa apenas sustentar por
meio de alegações genéricas que não há nos autos comprovação da culpabilidade e do dolo do réu, sem
qualquer exposição dos fundamentos que sustentariam esta tese. A propósito, confira-se: STJ, 5a Turma,
RHC 39.920/RJ, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 6/2/2014.
Cap. XI • EXECUÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA 501
7 Nesse sentido, como já se pronunciou o STJ,"(...) o art. 149 do Código de Processo Penal não estabelece o
momento processual para a realização do exame médico legal, devendo ele ser realizado com o surgimento
de dúvida razoável sobre a integridade mental do acusado. Não constitui reformatio in pejus o fato de o
Tribunal substituir a pena privativa de liberdade por medida de segurança, com base em laudo psiquiátrico
que considerou o acusado inimputável, vez que a medida de segurança é mais benéfica do que a pena, vez
que objetiva a proteção da saúde do acusado. Não se aplica a Súmula 525/STF ao caso, vez que a referida
súmula foi editada quando vigia o sistema duplo binário, isto é, quando havia possibilidade de aplicação
simultânea de pena privativa de liberdade e de medida de segurança. A reforma penal de 1984 autoriza a
substituição da pena privativa de liberdade por medida de segurança ao condenado semi-imputável que
necessitar de especial tratamento curativo, aplicando-se o mesmo regramento da medida de segurança
para inimputáveis (art. 97 e 98)". (STJ, 5a Turma, HC 187.051/SP, Rei. Min. Gilson Dipp, j. 06/10/2011, DJe
14/10/2011).
502 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
Nos exatos termos do art. 96 do Código Penal, são duas as espécies de medidas
de segurança:
I - Detentiva: é a internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico,
ou, à falta, em outro estabelecimento adequado. Como se pode notar, há privação
da liberdade de locomoção do indivíduo. É firme a jurisprudência dos Tribunais
Superiores no sentido de que inimputável (ou semi-imputável) submetido a medida
de segurança de internação não pode cumpri-la em estabelecimento prisional;9
II - Restritiva: consiste em sujeitar o agente a tratamento ambulatorial. Ou
seja, o indivíduo continua em liberdade, mas se vê obrigado a se sujeitar ao tra
tamento médico adequado, comparecendo, regularmente, por exemplo, a consultas
com psiquiatra, e fazendo uso de medicação adequada.
Pela letra expressa do Código Penal, a aplicação de uma ou outra espécie de
medida de segurança estaria diretamente relacionada à natureza da pena cominada ao
delito. A propósito, eis o teor do art. 97, caput, do CP: “Se o agente for inimputável,
o juiz determinará sua internação (art. 26). Se, todavia, o fato previsto como crime
for punível com detenção, poderá o juiz submetê-lo a tratamento ambulatorial”.
Como se pode notar, a gravidade do fato praticado teria o condão de determinar a
medida de segurança adequada: se o fato delituoso é punível com pena de reclusão,
o juiz estaria obrigado a determinar sua internação. Caso, todavia, o delito fosse
punível com pena de detenção, poderia escolher entre a internação e o tratamento
ambulatorial.
Essa obrigatoriedade de sujeitar o inimputável autor de crime punido com
reclusão à medida de segurança detentiva sempre foi alvo de críticas por parte da
doutrina, sobretudo nas hipóteses em que o laudo de insanidade mental recomendasse
a sujeição a tratamento ambulatorial. A uma por desconsiderar o próprio caráter
terapêutico da medida de segurança. Ora, se os próprios experts apontaram que o
tratamento adequado para o agente consistiría, por exemplo, no uso de determinado
medicamento, o que poderia ser feito em meio aberto, e conquanto houvesse seu
comparecimento mensal ao estabelecimento de saúde para acompanhamento de sua
evolução clínica, qual a justificativa para determinar sua internação? A duas porque
a obrigatória internação do inimputável resultaria em odiosa violação ao princípio da
isonomia, quando comparada sua situação com a de um agente imputável. Explica-
-se: enquanto este dificilmente seria recolhido à prisão pela prática, por exemplo, de
um crime de estelionato, o qual é punido com pena de reclusão, de 1 a 5 anos, e
multa, eis que, a depender do caso concreto, poderia ser beneficiado com diversos
institutos que evitariam a privação da sua liberdade de locomoção (v.g., suspen
são condicional do processo, acordo de não persecução penal, penas restritivas de
direito, sursis etc.), o inimputável seria inevitavelmente submetido à internação,
porquanto punido com reclusão o crime por ele praticado. Some-se a isso o fato
de que a Lei n. 10.216/01, conhecida como Lei Antimanicomial, que dispõe sobre a
proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona
o modelo assistencial em saúde mental, estabelece expressamente a subsidiariedade
da internação, indicada apenas quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem
insuficientes (art. 4o).10
Esse entendimento vem sendo acolhido pelos Tribunais Superiores. Nessa
linha, como já se pronunciou o STF, “(...) em casos excepcionais, admite-se a
substituição da internação por medida de tratamento ambulatorial quando a
pena estabelecida para o tipo é a reclusão, notadamente quando manifesta a
desnecessidade da internação”.11 Com entendimento semelhante, por ocasião do
julgamento dos Embargos de Divergência n. 998.128-MG,12 a 3a Seção do STJ
firmou o entendimento de que, à luz dos princípios da adequação, da razoabi-
lidade e da proporcionalidade, em se tratando de delito punível com reclusão, é
facultado ao magistrado a escolha do tratamento mais adequado ao inimputável,
nos termos do art. 97 do CP, não devendo ser considerada a natureza da pena
privativa de liberdade aplicável, mas sim a periculosidade do agente. Aliás, não
por outro motivo, em caso concreto em que a internação foi aplicada a agente
primário, sem qualquer envolvimento anterior com práticas delitivas, tão somen
te em virtude da gravidade do delito praticado e do fato de a pena corporal a
ele imposta ser de reclusão, sem que nada de concreto tivesse sido explicitado
acerca de sua periculosidade social, a 5a Turma do STJ concluiu ser suficiente
o tratamento ambulatorial.13
10 Em sentido semelhante, a Resolução n. 113 do Conselho Nacional de Justiça preconiza em seu art. 17 que
"o juiz competente para a execução da medida de segurança, sempre que possível, buscará implementar
políticas antimanicomiais, conforme sistemática da lei n. 10.216, de 6 de abril de 2001".
11 STF, 2a Turma, HC 85.401/RS, Rei. Min. Cezar Peluso, j. 04.12.2009.
12 STJ, 3a Seção, EREsp 998.128/MG, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 27.11.2019, DJe 18.12.2019.
13 STJ, 5a Turma, HC 617.639/SP, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 09.02.2021, DJe 12.02.2021.
504 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
14 STJ, 5a Turma, HC 236.985/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 26.06.2012, DJe 01.08.2012. No sentido de que a desídia
do agente em submeter-se ao tratamento ambulatorial, revelada pelo fato de não ter sido localizado para
realização de perícia médica, bem como histórico de sucessivos abandonos, revela a incompatibilidade da
medida, justificando, assim, a conversão em internação, nos termos do art. 184 da LEP e do art. 97, §4°,
do CP: STJ, 6a Turma, HC 404.448/SC, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 02.08.2018.
15 ROIG. Op. cit. p. 399.
16 AVENA. Op. cit. p. 397.
Cap. XI • EXECUÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA 505
17 STJ, 6a Turma, HC 284.520-SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 03.04.2014, DJe 22.04.2014. Com entendi
mento semelhante: STJ, 5a Turma, HC 243.636-SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 25.09.2012, DJe 02.10.2012.
506 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
ambulatorial, será por prazo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada,
mediante perícia médica, a cessação da periculosidade do agente (arts. 97, § Io, e 98).
Sem embargo do texto legal, como se trata, a medida de segurança, de espécie
do gênero sanção penal, ao lado da pena privativa de liberdade, porquanto dotada do
caráter de retribuição ao delito cometido e o de prevenção a possível cometimento de
novos crimes, a ela também se aplica a vedação da pena de prisão perpétua constante
da Constituição Federal (art. 5o, XLVII, “b”). De mais a mais, também fere o princípio
da isonomia o fato de a lei fixar o período máximo de cumprimento de pena para o
imputável, pela prática de um crime, e determinar que o inimputável cumprirá medida
de segurança por prazo indeterminado, condicionando o seu término à cessação da
periculosidade. Em razão da incerteza da duração máxima da medida de segurança,
está-se claramente tratando de forma mais severa o infrator inimputável quando com
parado ao imputável, para o qual a lei limita o poder de atuação do Estado.
Firmada a premissa de que a medida de segurança não pode se eternizar, haja
vista a vedação às penas de caráter perpétuo (CF, art. 5o, XLVII, “b”), discute-se, então,
qual seria o limite máximo de sua duração. Há, fundamentalmente, duas posições
acerca do assunto:
a. Limite máximo de 40 (quarenta) anos (CP, art. 75, caput, com redação
determinada pela Lei n. 13.964/19): na visão do Supremo Tribunal Federal, nos
mesmos moldes fixados pelo art. 75 do Código Penal em relação ao cumprimento
da pena privativa de liberdade, a medida de segurança não pode ultrapassar o limite
máximo de 40 (quarenta) anos;18
b. Máximo da pena abstratamente cominada ao delito (nossa posição): em
sentido diverso, parte da doutrina entende que deve ser adotado como limite o
máximo da pena abstratamente cominada ao delito perpetrado, estabelecendo-se,
assim, à luz dos princípios da isonomia, proporcionalidade e razoabilidade, um
certo paralelismo entre as duas espécies de sanção penal. Trata-se de entendimento
consolidado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça. A propósito, eis o teor de
sua Súmula n. 527: “O tempo de duração da medida de segurança não deve ultra
passar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado.”19 Nessa
linha, há vários precedentes do STJ no sentido de que a medida de segurança, para
além de limitada ao máximo pela pena abstratamente cominada à infração penal
praticada pelo agente, também não pode ultrapassar o limite estabelecido no art. 75
do CP, com redação dada pelo Pacote Anticrime (40 anos).20
18 No sentido de que o prazo máximo de duração da medida de segurança é o previsto no art. 75 do CP: STF,
1a Turma, HC 107.432/RS, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 24/05/2011, DJe 110 08/06/2011; STF, 1a Turma,
RHC 100.383, Rei. Min. Luiz Fux, j. 18.10.2011, DJ 04.11.2011.
19 Com idêntico raciocínio: STJ, 6aTurma, HC 143.315/RS, Rei. Min. Og Fernandes, j. 05/08/2010, DJe 23/08/2010;
STJ, 6a Turma, AgRg no AREsp 357.508/DF, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 16/12/2014, DJe 03/02/2015; STJ, 6a Turma,
HC 91.602/SP, Rei. Min. Alderita Ramos de Oliveira - Desembargadora convocada do TJ/PE -, j. 20/09/2012,
DJe 26/10/2012; STJ, 6a Turma, HC 286.733/RS, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 25/11/2014, DJe
15/12/2014.
20 STJ, 5a Turma, HC 297.897-RS, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 10.12.2015, DJe 17.12.2015.
Cap. XI • EXECUÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA 507
Mas o que deve ser feito se, atingido esse limite máximo, for constatado que
subsiste a periculosidade do indivíduo? Nesse caso, devem ser extraídas cópias dos
autos e enviadas ao juízo cível. Neste, em procedimento próprio instaurado pelos
familiares ou pelo Ministério Público, nos termos da Lei 10.261/2001, deve ser veri
ficada a possibilidade de internação do indivíduo, internação esta que terá natureza
civil, não mais de medida de segurança.
Em sua redação original, o art. 80 do Código Penal dispunha que, durante o pro
cesso, o juiz podería submeter os inimputáveis e os ébrios habituais ou toxicômanos às
medidas de segurança que lhes fossem aplicáveis. Essa aplicação provisória da medida
de segurança era referendada pelo art. 378 do Código de Processo Penal. Com as mu
danças produzidas pela reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei n° 7.209/84,
aí incluída a revogação do art. 80 do CP, doutrina e jurisprudência concluíram que o
art. 378 do CPP também fora revogado, já que ambos tratavam da mesma matéria.
De modo semelhante, em virtude da exclusão das denominadas penas acessórias,
dentre as quais se encontrava a interdição de direitos, os dispositivos do CPP que
versavam sobre a matéria (arts. 373 a 380) também foram tacitamente revogados,
porquanto lei posterior tratou da matéria de forma diferente. Ademais, essas moda
lidades de interdições temporárias de direitos e as medidas de segurança provisórias
previstas até então no CPP não haviam sido recepcionadas pela Constituição Federal,
mormente diante do princípio da presunção de inocência.
Portanto, apesar de o art. 152, § Io, do CPP, dispor que o juiz poderá, na hipótese
de doença mental superveniente à infração penal, ordenar a internação do acusado
em manicômio judiciário ou em outro estabelecimento adequado, estabelecendo ver
dadeira imposição automática da internação quando verificada a presença de doença
mental, sempre se entendeu que esse dispositivo não fora recepcionado pela Consti
tuição Federal, por estabelecer indevida antecipação do resultado final da ação penal
condenatória, em flagrante violação ao princípio da presunção de não culpabilidade.
Com efeito, à semelhança do que ocorre com a pena privativa de liberdade aplicada
aos imputáveis, também não se pode admitir a execução provisória de medida de
segurança, que também é uma espécie de sanção penal, cujo cumprimento está con
dicionado, pois, ao trânsito em julgado de sentença absolutória imprópria.21
Apesar de não ser possível que a internação provisória fosse decretada como
efeito automático da constatação da inimputabilidade do acusado, entendia-se
possível que, presentes os pressupostos da prisão preventiva, e comprovada a pe
riculosidade do agente, fosse decretada sua prisão preventiva, a ser cumprida em
hospital de custódia.22
21 Nesse sentido: STJ, 5a Turma, HC 226.014/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 19/04/2012.
22 STJ, 6a Turma, RHC 11.329/BA, Rei. Min. Vicente Leal, DJ 10/09/2001 p. 414. Com entendimento semelhante:
CRUZ, Rogério Schietti Machado. Prisão cautelar: dramas, princípios e alternativas. Rio de Janeiro: Editora
Lumen Juris, 2006, p. 165.
508 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
23 Com esse entendimento: MENDONÇA, Andrey Borges. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São
Paulo: Editora Método, 2011. p. 453.
Cap. XI • EXECUÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA 509
De acordo com o art. 319, VII, do CPP, a aplicação dessa medida cautelar
está condicionada à conclusão dos peritos no sentido de ser o acusado inimputável
ou semi-imputável (CP, art. 26). Há necessidade, portanto, de prévio incidente de
insanidade mental, cuja realização só pode ser determinada pela autoridade judi
ciária, jamais pela autoridade policial (CPP, art. 149). No entanto, embora a regra
seja a existência de prévio exame de insanidade mental, não se pode concluir que
referido laudo funcione como condição sine qua non para a imposição da medida.
Como há excessiva demora para a elaboração desse laudo, e tendo em conta que essa
medida também pode ser aplicada aos inimputáveis e semi-imputáveis cuja doença
mental sobreveio à infração, podem ser utilizadas outras provas do estado mental
do acusado, pelo menos enquanto tal exame não for concluído. Nessa linha, como
destaca Nucci, apesar de se exigir a conclusão pericial de inimputabilidade ou semi-
-imputabilidade para a adoção da medida, conforme o caso, deve o juiz valer-se de
seu poder geral de cautela, determinando a internação provisória, antes mesmo do
laudo ficar pronto, pois é incabível manter-se em cárcere comum o doente mental,
que exiba nítidos sinais de sua enfermidade.24
O art. 319, inciso VII, do CPP, faz menção à conclusão dos peritos no sentido
da inimputabilidade ou semi-imputabilidade do acusado. Apesar de o dispositivo
usar a palavra peritos no plural, isso não significa que o exame tenha que ser feito
por dois peritos. Na verdade, tal dispositivo deve ser lido à luz do art. 159, caput,
do CPP, que prevê que os exames de corpo de delito e outras periciais devem ser
feitos apenas por 1 (um) perito, salvo na hipótese de falta de perito oficial, em que
o exame será realizado por 2 (duas) pessoas idôneas.
A internação provisória deve ser cumprida em estabelecimento hospitalar ade
quado, ou seja, em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, nos termos do art.
96, I, do Código Penal. De acordo com o art. 99 da LEP, o acusado inimputável ou
semi-imputável deve ficar no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico. Caso
não haja referido hospital, deve ser mantido em outro estabelecimento adequado.
Na hipótese de não haver vaga em estabelecimento público ou em estabelecimento
adequado, caso o acusado esteja enquadrado no art. 318, II, do CPP, encontrando-se
extremamente debilitado por motivo de doença grave, é possível que a internação
provisória seja substituída por uma prisão domiciliar, a ser aplicada cumulativamente
com tratamento ambulatorial.
Todavia, é certo que haverá situações em que a prisão domiciliar será insufi
ciente para impedir a reiteração delituosa. Nesses casos, indaga-se: o que fazer? O
STJ tem precedentes no sentido de que caracteriza constrangimento ilegal manter o
acusado em presídio comum em razão da falta de hospital de custódia e tratamento
psiquiátrico ou outro estabelecimento adequado, devendo, diante de sua ausência,
submeter-se a tratamento ambulatorial. Não obstante, considerando que a interna
ção provisória do art. 319, VII, está voltada para impedir a reiteração delituosa de
crimes praticados com violência ou grave ameaça, seria de todo temerário colocar
em liberdade agente inimputável que possa voltar a cometer delitos de tal natureza.
24 NUCCI, Guilherme de Souza. Prisão e liberdade. As reformas processuais penais introduzidas pela Lei 12.403,
de 4 de maio de 2011. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 85.
510 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
Não por outro motivo, em caso concreto envolvendo a prática de atentado violento
ao pudor com violência presumida, concluiu o STJ que, não obstante houvesse falta
de vagas em estabelecimento adequado, não seria possível a concessão simples de
liberdade ao acusado inimputável, em razão de sua periculosidade. Portanto, a úni
ca solução que se pode aventar para situações de notória periculosidade de agente
inimputável seria determinar sua permanência em ala hospitalar do estabelecimento
prisional, com tratamento adequado, pelo menos até que seja encontrada vaga em
local adequado.25
Além da finalidade precípua inerente a essa medida, no sentido de se evitar a
reiteração delituosa de crimes praticados com violência ou grave ameaça, a inter
nação provisória também visa à recuperação do agente, já que este será colocado à
disposição médica. Como finalidade permanente, esse tratamento visa à reinserção
social do paciente em seu meio e será estruturado de forma a oferecer assistência
integral à pessoa portadora de transtornos mentais, incluindo serviços médicos, de
assistência social, psicológicos, ocupacionais, de lazer, e outros - vide Lei n° 10.216/01,
que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos
mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental.
A este indivíduo internado provisoriamente, portador de transtorno mental,
são assegurados os seguintes direitos: ter acesso ao melhor tratamento do siste
ma de saúde, consentâneo às suas necessidades; ser tratado com humanidade e
respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua
recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade; ser protegi
do contra qualquer forma de abuso e exploração; ter livre acesso aos meios de
comunicação disponíveis; receber o maior número de informações a respeito de
sua doença e de seu tratamento; ser tratado em ambiente terapêutico pelos meios
menos invasivos possíveis.
Por acarretar restrição da liberdade de locomoção, o lapso temporal em que
o acusado inimputável ou semi-imputável ficar submetido à internação provisória
deve ser levado em consideração para fins de detração penal, seja no tocante à
eventual quantum de pena privativa de liberdade (quando houver recuperação das
faculdades mentais daquele cuja doença mental sobreveio à infração), seja quanto
ao prazo mínimo de aplicação da medida de segurança.
176). E mais: conquanto não haja previsão legal, doutrinariamente tem sido admitido
que o juiz ordene a realização antecipada do exame ex officio, quando tiver ciência
de fato relevante capaz de justificar sua atuação.26 Destarte, com a revogação tácita
do art. 777 do CPP, cujo conteúdo foi transportado para o art. 176 da LEP, a súmula
n. 520 do Supremo continua válida, desde que lida dessa forma: “Não exige a lei que,
para requerer o exame a que se refere o art. 176 da Lei de Execução Penal, tenha o
sentenciado cumprido mais de metade do prazo da medida de segurança imposta”.
Na eventualidade de o laudo pericial atestar a persistência da periculosidade, o
exame deverá ser repetido de ano em ano, ou a qualquer tempo, se o determinar o juiz
da execução (CP, art. 97, §2°). Em sentido diverso, se restar evidenciada a cessação da
periculosidade do agente, o juiz deverá determinar a suspensão da execução da medi
da de segurança, quer por meio da desinternação, reservada para a espécie detentiva,
quer por meio de liberação, quando o agente estiver submetido a tratamento ambu-
latorial. O recurso adequado para impugnar tal decisão é o agravo em execução (LEP,
art. 197), com a ressalva de que se trata da única hipótese em que tal recurso é dotado
de efeito suspensivo, na medida em que o art. 179 da LEP é explícito ao fazer referên
cia à desinternação ou liberação tão somente quando ocorrer o trânsito em julgado da
decisão proferida pelo juiz da execução.
Tanto a desinternação quanto a liberação são condicionadas, cabendo ao juiz
da execução impor ao agente as mesmas condições do livramento condicional, as
quais, como visto anteriormente, subdividem-se em 2 (duas) espécies: a. obrigatórias:
a.l. obter ocupação lícita, dentro de prazo razoável se for apto para o trabalho; a.2.
comunicar periodicamente ao juiz sua ocupação; a.3. não mudar do território da
comarca do Juízo da Execução, sem prévia autorização deste; b. facultativas: b.l.
não mudar de residência sem comunicação ao juiz e à autoridade incumbida da
observação cautelar e de proteção; b.2. recolher-se à habitação em hora fixada; b.3.
não frequentar determinados lugares.
A desinternação, ou a liberação, será sempre condicional, devendo ser resta
belecida a situação anterior se o agente, antes do decurso de 1 (um) ano, praticar
fato indicativo de persistência de sua periculosidade (CP, art. 97, §3°).
26 Admitindo a antecipação do exame para fins de verificação de possível cessação de periculosidade: STF, 2a
Turma, HC 46.290/SP, Rei. Min. Adalício Nogueira, j. 12/11/1968, DJ 11/04/1969; STF, 3a Turma, HC 46.239/
SP, Rei. Min. Hermes Lima, j. 31/10/1968, DJ 28/02/1969.
Cap. XI • EXECUÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA 513
27 STJ, 5a Turma, HC 383.687/SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 27.06.2017, DJe 01.08.2017. Admitindo a desinternação
progressiva em caso concreto em que o laudo psiquiátrico informara que, apesar de persistir a periculo
sidade do agente, esta se encontraria atenuada, de modo a indicar ser cabível a adoção da medida: STF,
Ia Turma, HC 98.360/RS, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 04.08.2009.
28 Com esse entendimento: STF, 2a Turma, HC 77.873/CE, Rei. Min. Nelson Jobim, j. 07/12/1998, DJ 06/08/1999.
514 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
que seja a finalidade assinada à pena, esta será imprestável e aquela inatingida se o
réu for insano de mente”.29
Sobre o assunto, dispõe o art. 154 do CPP que se a insanidade mental so
brevier no curso da execução da pena, observar-se-á o disposto no art. 682 do
CPP. Esse art. 682 do CPP encontra-se localizado no Livro IV do CPP, referente
à execução da pena. Apesar de não ter havido revogação expressa do Livro IV, é
certo que a Lei n° 7.210/84 (Lei de Execução Penal) regulou toda a matéria ali
tratada. Logo, os arts. 668 a 779 do CPP foram tacitamente revogados pela LEP. A
Lei de Execução Penal passou a dispor acerca do assunto no seu art. 183, o qual
prevê que, quando, no curso da execução da pena privativa de liberdade, sobrevier
doença mental ou perturbação da saúde mental, o juiz, de ofício, a requerimento
do Ministério Público, da Defensoria Pública ou da autoridade administrativa,
poderá determinar a substituição da pena por medida de segurança. De seu tur
no, o art. 108 da LEP prevê que o condenado a quem sobrevier doença mental
será internado em Hospital de Custódia e tratamento psiquiátrico. Por sua vez, o
Código Penal dispõe que o condenado a quem sobrevêm doença mental deverá
ser recolhido a hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, a outro
estabelecimento adequado (art. 41).
São 2 (duas), portanto, as possíveis soluções outorgadas ao Juízo da Execução
(LEP, art. 66, V, “d”), quando, no curso da execução da pena privativa de liberdade,
sobrevier ao condenado doença mental ou perturbação da saúde mental que o torne
total ou parcialmente incapaz:
a) doença transitória: aplica-se o art. 41 do CP, ou seja, o condenado deve
ser transferido para hospital penitenciário, sem necessidade de substituição da
pena por medida de segurança. Com a recuperação de sua higidez mental, o
acusado deverá voltar a cumprir o restante da pena, computando-se como tem
po de cumprimento da pena o período de internação. Destarte, em se tratando
de perturbação momentânea, a internação temporária e o tratamento médico
adequado poderão restabelecer a capacidade do condenado, que seguirá, então,
cumprindo sua pena regularmente. Caso a constatação médica indique a super-
veniência relevante de doença mental, hipótese a ser analisada na sequência,
poderá ensejar a instauração do procedimento de conversão, que se, ao final,
concluir por esta, modificará irreversivelmente o regime de execução, já que o
sujeito passará a ser considerado um doente.30 Não por outro motivo, quando
o Juízo da Execução toma conhecimento de que o apenado encontra-se com
algum tipo de perturbação da saúde mental, é relativamente comum que, inicial
mente, determine a internação a que se refere o art. 41 do CP na tentativa de
recuperá-lo. Atingido esse objetivo, o executado retornará ao cumprimento da
pena. Se, todavia, a partir de novos exames, constatar-se a impossibilidade (ou
improbabilidade) da sua recuperação, aí sim deverá ser ordenada a conversão do
29 MUCCIO, Hidejalma. Curso de processo penal. 2a ed. São Paulo: MÉTODO, 2011, p. 735.
30 BRITO. Op. cit. p. 547.
Cap. XI • EXECUÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA 515
saldo da pena em medida de segurança, nos moldes preconizados pelo art. 183
da LEP, o que, logicamente, não impede que o juiz o faça de imediato, quando,
por exemplo, já se puder constatar desde o início que a recuperação da saúde
mental do executado seria praticamente impossível;
b) doença de caráter duradouro ou permanente: quando se revelar imprová
vel a recuperação da saúde mental do condenado, sua pena privativa de liberdade
deverá ser convertida em medida de segurança, ex vi do art. 183 da LEP. Ao con
trário da transferência prevista no art. 41 do CP, a conversão do saldo da pena em
medida de segurança prevista na LEP é uma medida de natureza irreversível. Com
a substituição da pena pela medida de segurança de internação ou de tratamento
ambulatorial, a depender do grau de periculosidade do agente, seu cumprimento
passará a ser regido pelas normas do cumprimento desta espécie de sanção penal, e
não mais pelas normas referentes à execução da pena privativa de liberdade. Logo,
sobrevindo a recuperação do agente e a cessação da periculosidade antes do decurso
do tempo correspondente ao saldo da pena convertida, deverá ser determinada a
desinternação ou a liberação condicional (CP, art. 97, §3°), sendo vedada a reversão
e retomada do cumprimento da pena privativa de liberdade. Por outro lado, caso
não haja a recuperação do agente, prevalece o entendimento de que a medida de
segurança objeto da conversão deverá perdurar somente pelo prazo restante da pena
imposta na sentença condenatória. Nesse caso, esgotado o lapso temporal fixado na
sentença condenatória e não havendo a plena recuperação das faculdades mentais do
agente, este deverá ser colocado à disposição do juízo cível competente.31 Portanto,
esta medida de segurança aplicada em substituição à pena privativa de liberdade
a que se refere o art. 183 da LEP limita-se ao término da pena estabelecida na
sentença, sob pena de ofensa à coisa julgada e ao princípio da proporcionalidade.
Extrapolado o prazo de cumprimento da pena privativa de liberdade, deve cessar a
intervenção do Estado na esfera penal, ainda que não cessada a periculosidade do
agente. Caberá ao Parquet, nesse caso, perante o juízo cível, verificar a possibilidade
de internação civil, com fundamento na Lei n. 10.216/01.32
31 É nesse sentido a lição de Alexis Couto de Brito (Execução penal. 2a ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2011. p. 367), para quem, expirado o período da pena e permanecendo o condenado em situa
ção de inimputabilidade, deve ser entregue aos cuidados da família, ou removido ao estabelecimento de
saúde competente na inexistência daquela.
32 STJ, 6a Turma, HC 373.405-SP, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 06.10.2016; STJ, 6a Turma, HC
130.162/SP, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 02/08/2012.
516 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
caso, dispõe o art. 152 do CPP que o processo penal, que já estava suspenso, deve
assim permanecer até que o acusado se restabeleça.
Essa suspensão do processo visa proteger o acusado, resguardando os princípios
do contraditório e da ampla defesa, que poderíam ser maculados caso o acusado
fosse julgado mesmo sem estar em plenas condições psíquicas de compreender o
teor da imputação que pesa sobre sua pessoa.
Apesar de o processo penal permanecer suspenso até o restabelecimento do
acusado, nada diz a lei acerca da suspensão da prescrição. Portanto, é de se concluir
que a prescrição não terá seu curso suspenso ou interrompido durante esse período
em que o processo permanecer suspenso. Trata-se, portanto, de caso típico de crise
de instância, em que o processo fica paralisado, sem ser extinto, porém com a pres
crição em curso. Logo, durante o período de suspensão do processo, verificando-se
o advento da prescrição, deverá o juiz declarar extinta a punibilidade.
Enquanto subsistir o problema de saúde mental do acusado, o processo per
manecerá suspenso, pelo menos até o advento da extinção da punibilidade (v.g.,
prescrição da pretensão punitiva). Com o restabelecimento do acusado, o processo
retomará seu curso normal, prevendo o art. 152, § 2o, do CPP, a faculdade de a
defesa reinquirir as testemunhas que houverem prestado depoimento sem a sua
presença. Ao final, poderá ser prolatada sentença absolutória ou condenatória.
Determinada a suspensão do processo em virtude de superveniência de doença
mental, nos casos em que houver conexão e/ou continência (CPP, arts. 76 e 77), deve
ser determinado o desmembramento do feito, cessando a unidade do processo, que
voltará a fluir normalmente em relação aos demais acusados, ficando a persecução
penal suspensa exclusivamente em relação àquele que padece de doença mental,
pelo menos até o seu restabelecimento.
Durante o período de suspensão da pretensão punitiva decorrente da super
veniência de doença mental, dispõe o CPP que o juiz poderá ordenar a internação
do acusado em manicômio judiciário ou em outro estabelecimento adequado (art.
152, § Io). A nosso ver, para que esse dispositivo seja considerado constitucional,
não se afigura possível a decretação automática da internação, sob pena de viola
ção à regra de tratamento que deriva do princípio da presunção de inocência, que
veda a adoção de quaisquer medidas que impliquem antecipação de culpa ou dos
resultados finais do processo.
Portanto, a internação provisória do acusado a que se refere o art. 152, § Io, do
CPP, só pode ser decretada mediante ordem escrita e fundamentada da autoridade
judiciária competente, nos termos do art. 319, VII, do CPP. Além da presença do
fumus comissi delicti e do periculum libertatis, a internação provisória do acusado
acometido de doença mental durante o curso da persecução penal somente pode
rá ser decretada se o crime tiver sido praticado com violência ou grave ameaça e
houver risco de reiteração. Essa internação provisória não só assegura a proteção
devida ao doente mental, tido como perigoso não somente à sociedade, mas também
a si mesmo, se não tiver tratamento adequado e continuar solto, como também se
Cap. XI • EXECUÇÃO DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA 517
revela mais benéfica que a decretação da prisão preventiva do acusado, haja vista
seu caráter curativo.33
De todo modo, como o processo penal permanecerá suspenso enquanto não
houver a melhora do estado de saúde mental do acusado (CPP, art. 152, caput),
essa internação provisória não pode perdurar por prazo indeterminado, sob pena
de o acusado vir a cumprir uma medida de segurança maior do que a pena que
possivelmente ser-lhe-ia aplicada ao final do processo. Logo, nos mesmos moldes
que o entendimento jurisprudencial acerca da duração da medida de segurança
aplicada ao final do processo, pensamos que, a despeito do silêncio da lei, a inter
nação provisória não pode perdurar por tempo superior à pena máxima abstrata
mente cominada ao delito praticado pelo acusado, independentemente da cessação
da periculosidade, não podendo ainda ser superior a 40 (quarenta) anos, conforme
o art. 75 do CP. Superado esse limite, se o acusado ainda padecer de enfermidade
mental e subsistir a periculosidade, a solução deste problema deixa de ser objeto do
sistema penal, passando a funcionar como problema de saúde pública, daí por que
o acusado deve ser submetido a tratamento psiquiátrico, interditado e até mesmo
internado em medida extrapenal. Outrossim, como a suspensão do processo em
virtude da superveniência de doença mental após a prática do delito não acarreta
a suspensão da prescrição, é perfeitamente possível que sobrevenha a prescrição da
pretensão punitiva abstrata, com a consequente extinção da punibilidade. Nesse caso,
a questão da internação provisória deve ser transferida ao cível, devendo o órgão
ministerial propor a interdição do acusado para que seja mantido o seu tratamento.34
1. NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
1 BRITO. Op. cit. p. 539. Para o autor, há outros incidentes além das conversões, excesso ou desvio, anistia e
indulto. A estes devem ser acrescentados a graça, a comutação da pena, a colaboração premiada, a remição,
o RDD, a unificação de penas e o reconhecimento de novatio legis in mellius.
2 CPC: "Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito
do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre
a qual deva decidir de ofício".
520 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
ampla defesa, daí por que é obrigatória, pelo menos em regra, a oitiva prévia do
condenado, devidamente assistido por seu Defensor, e do Ministério Público (LEP,
art. 67), sob pena de nulidade.3
São 3 (três) os capítulos integrantes do Título da LEP referente aos incidentes
da execução: Capítulo I (“Das conversões”), Capítulo II (“Do excesso ou desvio”)
e o Capítulo III (“Da anistia e do induto”). Vejamos, então, cada um deles, sepa
radamente.
2. CONVERSÕES
4 Para Roig (Op. cit. p. 396), a conversão do art. 180 da LEP também deve ser permitida às penas de até 4
anos. Por sua vez, Renato Marcão (op. cit. p. 332) entende que o art. 180 foi derrogado pela Lei n. 9.714,
de 25 de novembro de 1998, que passou a permitir, no art. 44 do CP, a substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos a penas não superiores a 4 anos.
5 STF, 1a Turma, HC 91.709-CE, Rei. Min. Cármen Lúcia, j. 16.12.2008, DJ 13.03.2009; STJ, 5a Turma, HC 102.603-
RS, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 02.12.2010, DJe 17.12.2010.
6 BITENCOURT, Cezar Roberto. Novas penas alternativas. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 166.
522 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
execução da pena etc. Pelo menos em tese, para aferir a presença do requisito sob
comento, nada impede que o Juízo da Execução determine fundamentadamente a
realização de exame criminológico, à semelhança, aliás, do que ocorre para fins de
progressão de regimes.
Como destaca a doutrina, se, após a conversão da pena, sobrevier qualquer
das hipóteses previstas no art. 181 e parágrafos da LEP, a pena restritiva de direitos
deverá ser reconvertida em privativa de liberdade, hipótese em que se computa na
duração da pena o tempo de prisão anteriormente cumprido.7
A Execução Penal deve ser regida por diversos princípios, destacando-se, dentre
eles, o da legalidade, em virtude do qual o cumprimento da pena (ou da medida
de segurança) deve observar os limites ditados pela respectiva sentença condena
tória (ou absolutória imprópria) transitada em julgado, assim como as prescrições
estabelecidas em lei. Daí dispor a LEP, em seu art. Io, que a “execução penal tem
por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal (...)” e que “ao
condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela
sentença ou pela lei” (art. 3o).
8 Se o paciente foi condenado a pena de multa, não se afigura possível, por ausência de critério legal aplicá
vel, a conversão da pena pecuniária na de restrição de direito. Portanto, deve o juiz se limitar a promover
a inserção da dívida para cobrança judicial. Nesse sentido: STF, 1a Turma, HC 78.200/SP, Rei. Min. Octavio
Gallotti, DJ 27/08/1999.
9 MIRABATE. Op. cit. p. 878.
524 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
Sem embargo, não é de todo incomum que esses limites sejam ultrapassados
no curso da execução penal, violando-se não apenas o princípio da legalidade, como
também diversos direitos do preso (LEP, art. 41). É aí que surge o denominado ex
cesso ou desvio da execução, conceituado pelo art. 185 da LEP nos seguintes termos:
“Haverá excesso ou desvio de execução sempre que algum fato for praticado além
dos limites fixados na sentença, em normas legais ou regulamentares”. O excesso
ou desvio será considerado individual quando se referir a um único indivíduo. Na
eventualidade de atingir diversos sentenciados, será considerado coletivo. Por mais
que o art. 185 da LEP não estabeleça nenhuma diferença entre excesso e desvio, a
doutrina10 costuma fazê-lo da seguinte forma:
a. Excesso de execução: como o próprio nome já sugere, haverá excesso
sempre que na execução da pena (ou da medida de segurança) se cons
tatar algo que vá além, que exceda ao decidido na decisão irrecorrível, de
maneira que o excesso sempre será prejudicial ao executado. Portanto, o
excesso é quantitativo em relação ao título que está sendo executado, pois
vai além do que deveria. Tome-se como exemplo a hipótese de aplicação
da sanção disciplinar de isolamento na própria cela por prazo superior a
30 (trinta) dias, contrariando, assim, o quanto disposto no art. 58, caput,
da LEP. Também haverá excesso quando o indivíduo permanecer preso,
apesar de já ter cumprido sua pena em virtude de remição anteriormente
concedida;
b. Desvio de execução: nesse caso, o constrangimento ilegal ao sentenciado
não é quantitativo, mas sim qualitativo. É dizer, a execução destoa-se dos
parâmetros fixados legalmente ou por decisão judicial. O desvio abrange
não apenas possível violação aos direitos do apenado, como também a
concessão indevida de benefícios prisionais, daí por que pode ser favorá
vel ou desfavorável ao executado. Cite-se, como exemplo, a manutenção
de condenado a cumprir pena no regime inicial fechado que é mantido,
todavia, em regime mais brando (semiaberto ou aberto), ou que recebe
benefícios indevidos, como a saída temporária ou o trabalho externo sem
escolta. Também haverá desvio quando o apenado, embora tenha sido
beneficiado pela progressão para o semiaberto, permanecer no regime
fechado em virtude da ausência de vaga em colônia agrícola, industrial
ou similar.
Recai sobre o Juízo da Execução Penal a competência para decidir sobre os
incidentes de excesso e desvio (LEP, art. 66, III, “f”). Consoante disposto no art.
186 da LEP, poderão suscitá-lo o Ministério Público, o Conselho Penitenciário,
o sentenciado, qualquer dos demais órgãos da execução penal, o que abrange o
Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, os Departamentos Peni
tenciários, o Patronato, o Conselho da Comunidade e a Defensoria Pública (LEP,
art. 61). Considerando-se que o Juízo da Execução também é um dos órgãos da
execução (LEP, art. 61, II), e que, uma vez instaurado o incidente, o procedimento a
ser observado é aquele constante dos arts. 194 e seguintes da LEP, não há qualquer
óbice à sua deflagração de ofício pelo magistrado. Contra a decisão proferida por
ele proferida no incidente de excesso ou desvio caberá o agravo em execução, nos
termos do art. 197 da LEP. Compreende-se que o rol de legitimados para suscitar
o incidente é taxativo, de modo que não se admite a sua instauração, por exemplo,
em virtude do pedido do assistente da acusação, já que sua função se exaure com
o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
4. ANISTIA E INDULTO
4.2. Anistia
Espécie de indulgência soberana, a anistia deve ser compreendida como o es
quecimento jurídico da infração penal e tem por objeto fatos definidos como crimes,
e não pessoas, embora se possa exigir condições subjetivas para ser aplicada. A
abdicação do poder de punir diz respeito a fatos ocorridos, em períodos certos, e
não à conduta em abstrato, o que equivalería a abolitio criminis. Ou seja, as condu
tas em questão, embora mantenham a pecha de criminosas, não mais poderão ser
punidas. Por se tratar de espécie de causa extintiva da punibilidade, não se poderá
impor ao beneficiado medida de segurança, nem pode ser executada a que lhe foi
imposta (CP, art. 96, parágrafo único).
Opera efeitos ex tunc, ou seja, para o passado, apagando o crime e extinguindo
todos os efeitos penais do crime e da sentença (pena pecuniária, sursis, pressupos
to da reincidência, inscrição do nome do acusado no rol dos culpados etc.). Não
abrange, todavia, os efeitos civis (v.g., dever de indenizar, confisco de bens etc.), já
que o legislador não pode estender seus efeitos em detrimento de direitos estranhos
ao Estado. Prova disso, aliás, é o fato de que o art. 67, II, do CPP, é explícito ao
prever que não impede a propositura da ação penal a decisão que julgar extinta a
punibilidade.
Recai sobre o Congresso Nacional, por meio de lei federal, a competência para
a concessão da anistia (CF, art. 48, VIII), que terá o condão de extinguir a punibili
dade (CP, art. 107, II), sendo certo que, uma vez concedida, não pode ser revogada,
diante do disposto no art. 5o, XXXVI, da Constituição Federal (“A lei não prejudicará
o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”).
Geralmente, a anistia é concedida pelo Congresso Nacional apenas em relação a
crimes políticos, militares ou eleitorais. Nesse sentido, basta ver o exemplo da Lei n°
12.505/11, que concedeu anistia aos crimes militares e infrações disciplinares conexas
praticados por policiais e bombeiros militares de diversos Estados da Federação que
participaram de movimentos reivindicatórios por melhorias de vencimentos e de
condições de trabalho. No entanto, não há vedação à concessão da anistia a todo e
qualquer delito, inclusive crimes de natureza comum. Por isso mesmo, o constituinte
originário teve o cuidado de vedar a concessão da anistia aos crimes hediondos e
equiparados (CF, art. 5o, XLIII), vedação esta que, obviamente, também consta da
Lei dos Crimes Hediondos (art. 2o, I).
A anistia pode ser classificada da seguinte forma:12
a) anistia especial e comum: especial é aquela que beneficia agentes que pra
ticaram crimes políticos; comum é aquela que alcança os agentes que praticaram
crimes de natureza comum;
b) anistia própria e imprópria: se concedida antes do trânsito em julgado, é
denominada anistia própria, cabendo ao juiz da causa ou do julgamento do recurso,
o seu reconhecimento; se lhe é posterior, anistia imprópria, recaindo sobre o Juízo
da Execução a competência para declará-la, podendo fazê-lo inclusive de ofício;
c) anistia geral e parcial: geral é a anistia que beneficia todas as pessoas que
participaram de determinados fatos criminosos; parcial é aquela que exclui do bene
fício alguns infratores, ao exigir, por exemplo, a observância de requisitos pessoais;
d) anistia condicionada e incondicionada: será condicionada quando exigir a
aceitação de obrigações por parte do beneficiário, hipótese em que poderá ser por
ele recusada; incondicionada, por sua vez, quando não impuser qualquer restrição,
situação em que não poderá ser recusada;
13 STJ, 6a Turma, Resp 1,828.409-MS, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 01.10.2019, Dje 08.10.2019.
14 No sentido de que a comutação nada mais é do que uma espécie de indulto parcial (em que há apenas
a redução da pena), daí por que a vedação à concessão de indulto em favor daqueles que praticaram
crime hediondo (Lei n. 8.072/90, art. 2o, I) também abrange a comutação: STF, 1a Turma, HC 103.618-RS,
Rei. Min. Dias Toffoli, j. 24.08.2010, DJ 08.11.2010.
15 STJ, 5a Turma, AgRg no AREsp 682.331/MG, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 07/11/2017, DJe 14/11/2017; STJ,
6a Turma, AgRg no HC 409.588/SP, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 12/12/2017, DJe 19/12/2017; STJ, 5a
Turma, HC 186.375/MG, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 21/06/2011, DJe 01/08/2011; STJ, 5a Turma, HC 438.408/
SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 20/03/2018, DJe 02/04/2018.
16 Nessa linha: STJ, 6a Turma, AgRg no HC 409.588/SP, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 12/12/2017, DJe
19/12/2017; STJ, 5a Turma, AgRg no AREsp 682.331/MG, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 07/11/2017, DJe
14/11/2017; STJ, 5a Turma, HC 186.375/MG, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 21/06/2011, DJe 01/08/2011. No
sentido de que a concessão de indulto em relação às condenações anteriores não indica o retorno do
condenado à condição de primário nem afasta a presença de maus antecedentes: STJ, 5a Turma, HC 438.408/
SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 20/03/2018, DJe 02/04/2018.
17 No sentido de que o indulto da pena privativa de liberdade não alcança a pena de multa que tenha sido
objeto de parcelamento espontaneamente assumido pelo sentenciado: STF, Pleno, EP11 IndCom-AgR-DF,
Rei. Min. Roberto Barroso, j. 08.11.2017, noticiado no informativo n. 884.
530 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
18 STJ, 6a Turma, AgRg no AREsp 1.155.670-MS, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 24.04.2018, DJe 11.05.2018; STJ, 5a
Turma, AgRg no HC 421.877-SP, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 24.04.2018, DJe 04.05.2018; STJ, 6a Turma, RHC
87.697-RJ, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 14.11.2017, DJe 21.11.2017.
19? MIRABETE. Op. cit. p. 912.
20 STJ, 5a Turma, HC 174.871-SP, Rei. Min. Gilson Dipp, DJe 27.05.2011; STJ, 5a Turma, REsp 669.574-DF, Rei.
Min. Gilson Dipp, DJ 09.02.2005.
Cap. XII • INCIDENTES DA EXECUÇÃO 531
24 STJ, 3a Seção, REsp 1.364.192/RS, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 12/02/2014, DJe 17/09/2014; STJ, 6a
Turma, HC 180.460/RS, Rei. Min. Alderita Ramos de Oliveira - Desembargadora convocada do TJ/PE -, j.
16/08/2012, DJe 27/08/2012; STJ, 3a Seção, EREsp 1.176.486/SP, Rei. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j.
28/03/2012, DJe 01/06/2012.
Cap. XII • INCIDENTES DA EXECUÇÃO 533
grave não interrompe o prazo para fim de comutação de pena ou indulto”, salvo se
o Decreto Presidencial contemplar restrição nesse sentido (nosso acréscimo).25
Na eventualidade de o Decreto Presidencial afastar a possibilidade de con
cessão do indulto em relação aos condenados que sofreram punição pela prática
de falta disciplinar de natureza grave, é imprescindível que tenha havido a ho
mologação expressa da sanção em audiência de justificação, garantido o direito
ao contraditório e à ampla defesa. Logo, sem a homologação da sanção pelo
juiz competente, não será possível obstar o indulto ou a comutação da pena.26
Acrescente-se, ademais, que esta homologação deverá ter ocorrido ainda dentro
do período aquisitivo constante do Decreto Presidencial, ou seja, a homologação
da falta após o Decreto não poderá servir como óbice ao indulto ou comutação.27
Por outro lado, se o diploma normativo concessivo do indulto for expresso ao
fazer referência à inexistência de aplicação de sanções disciplinares nos 12 (doze)
meses anteriores à sua publicação, eventual transgressão após a publicação do
Decreto não terá o condão de obstar a concessão do benefício. Afinal, dada a
natureza declaratória da decisão judicial que reconhece o indulto, o requisito
subjetivo necessário para a sua concessão deve ser aferido no momento da pu
blicação do Decreto.28
25 Tese de Recurso Especial Repetitivo fixada no tema n. 709. Paradigma: STJ, 3a Seção, REsp 1.364.192-
RS, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 12.02.2014.
26 No sentido de que viola a legalidade o entendimento de que a homologação da sanção pode ser tácita,
bastando que a sanção produza qualquer consequência no cumprimento da pena e seja decidida pelo
Juízo: ROIG. Op. cit. p. 410.
27 STJ, 5a Turma, HC 350.195-SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 23.08.2016, DJe 30.08.2016; STF, ARE
964.969-RS, Rei. Min. Edson Fachin, j. 25.04.2016, DJe 85 29.04.2016.
28 STJ, 5a Turma, HC 223.188-SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 16.02.2012, DJe 02.03.2012.
29 Paradigma: STF, Pleno, RE 628.658/RS, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 05.11.2015, DJ 01.04.2016.
534 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
30 No sentido de que o instituto da graça, previsto no art. 5o, XLIII, da Constituição Federal, engloba o indulto
e a comutação de pena, estando a competência privativa do Presidente da República para a concessão
desses benefícios limitada pela vedação estabelecida no referido dispositivo constitucional: STJ, 5a Turma,
AgRg no HC 486.603-SP, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 20.08.2019, DJe 30.08.2019; STJ, 5a Turma, AgRg no
HC 4468.008-SC, Rei. Min. Felix Fischer, j. 27.11.2018, DJe 03.12.2018; STJ, 6a Turma, HC 458.735-MG, Rei.
Min. Laurita Vaz, j. 04.10.2018, DJe 23.10.2018.
31 STF, 1a Turma, HC 81.565/SC, Rei. Min. Sepúlveda Pertence, j. 19/02/2002, DJ 22/03/2002.
32 No sentido de que o inciso I do art. 2o da Lei 8.072/90 retira seu fundamento de validade diretamente do
art. 5o, XLIII, da Constituição Federal, destacando, ademais, que o art. 5o, XLIII, da Constituição, que proíbe
a graça, gênero do qual o indulto é espécie, nos crimes hediondos definidos em lei, não conflita com o
art. 84, XII, da Lei Maior: STF, Pleno, HC 90.364/MG, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 31/10/2007, DJe 152
29/11/2007.
Cap. XII • INCIDENTES DA EXECUÇÃO 535
ilícito de droga ou por crime hediondo (art. 8o, I, II, e III). Ora, como a concessão
de indulto aos condenados a penas privativas de liberdade insere-se no exercício do
poder discricionário do Presidente da República (CF, art. 84, XII), haveria evidente
usurpação dessa atribuição constitucional se acaso o Poder Judiciário ampliasse a
concessão da referida benesse a tais delitos.33
Partindo da premissa de que é vedada a concessão do indulto em relação a
crimes hediondos e equiparados, há controvérsias acerca da possibilidade de sua
concessão em relação a delitos que não tinham essa natureza à época de sua prática.
De um lado, parte da doutrina sustenta que deve ser analisada a natureza do delito
à época do decreto presidencial. Com a devida vênia, partilhamos do entendimento
no sentido de que a vedação ao indulto só atinge os delitos que já eram considerados
hediondos quando da sua prática, sob pena de violação ao princípio da irretroati-
vidade da lex gravior.34 No âmbito do Supremo Tribunal Federal, ora se delibera
em um sentido, ora se delibera em outro. De fato, por ocasião do julgamento do
HC 94.679-SP,35 compreendeu-se que “a natureza dos crimes não contemplados
pelo Decreto Presidencial que concede o benefício do indulto e comutação de pena
deve ser aferida à época da edição do respectivo ato normativo, pouco importando
a data em que tais delitos foram praticados”. Ocorre que, ao deliberar sobre o HC
101.238-SP,36 a mesma Corte concluiu que, sob pena de ofensa ao princípio da ir-
retroatividade da lei penal mais gravosa, a vedação do indulto deve atingir apenas
os delitos cometidos após o advento da lei que os considerou hediondos. Na visão
do STJ, não dispondo o decreto autorizador de forma contrária, os condenados por
crimes de natureza hedionda têm direito aos benefícios de indulto ou de comutação
de pena, desde que as infrações penais tenham sido praticadas antes da vigência da
Lei n. 8.072/90 e suas modificadoras.37
Outrossim, na medida em que a comutação de pena (diminuição da pena) é
tida como espécie de indulto - indulto parcial -, também se revela inadmissível sua
aplicação a crimes hediondos e equiparados. Nessa linha, como já se pronunciou a
Ia Turma do Supremo, “a comutação nada mais é do que uma espécie de indulto
parcial (em que há apenas a redução da pena). Daí por que a vedação à concessão
de indulto em favor daqueles que praticaram crime hediondo - prevista no art. 2o,
I, da Lei n° 8.072/90 - abrange também a comutação”.38
33 No sentido de que anistia, indulto, graça e comutação de pena constituem objeto do exercício do poder
discricionário do Presidente da República, cujo Decreto pode, observando as limitações constitucionais,
prever a concessão do benefício apenas a condenados que preencham certas condições ou requisitos:
STF, 2a Turma, HC 96.431/RJ, Rei. Min. Cezar Peluso, j. 14/04/2009, DJe 089 14/05/2009.
34 Para Masson (Op. cit. p. 787), a natureza dos crimes abrangidos pelo indulto deve ser analisada à época
da sua prática, e não no momento da concessão do benefício. Logo, se quando cometido o delito não
era hediondo, e depois passou a ostentar esta característica, em tese será cabível o indulto.
35 STF, 2a Turma, HC 94.679-SP, Rei. Min. Joaquim Barbosa, j. 18.11.2008, DJ 19.12.2008.
36 STF, 2a Turma, HC 101.238-SP, Rei. Min. Eros Grau, j. 02.02.2010, DJ 21.05.2010.
37 STJ, 6a Turma, AgRg no HC 370.983-SP, Rei. Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. 12.02.2019, DJe 01.03.2019;
STJ, 5a Turma, HC 362.286-SP, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 13.09.2016, DJe 22.09.2016; STJ, 6a Turma, HC
327.861-SP, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 23.02.2016, Dje 07.03.2016.
38 STF, 1a Turma, HC 103.618/RS, Rei. Min. Dias Toffoli, j. 24/08/2010, DJe 213 05/11/2010. E ainda: STF, 1a
Turma, HC 81,567/SC, Rei. Min. limar Galvão, j. 19/02/2002, DJ 05/04/2002; STF, 2a Turma, HC 81,402/SC, Rei.
536 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
Min. Nelson Jobim, j. 18/12/2001, DJ 31/05/2002; STF, 1a Turma, HC 81.410/SC, Rei. Min. Sydney Sanches,
j. 19/02/2002, DJ 21/06/2002.
39 Nesse sentido: GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Crimes hediondos, tóxicos, terrorismo, tortura. 3a ed.
São Paulo: Editora Saraiva, 2004. p. 106.
40 No sentido da inconstitucionalidade da possibilidade de que o indulto seja concedido aos condenados
por crimes hediondos, de tortura, terrorismo ou tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, indepen
dentemente do lapso temporal da condenação: STF, Pleno, ADI 2.795 MC/DF, Rei. Min. Maurício Corrêa, j.
08/05/2003, DJ 20/06/2003.
41 STF, Pleno, HC 118.533/MS, Rei. Min. Cármen Lúcia, j. 23/06/2016.
42 Tese de Recurso Especial Repetitivo fixada no tema n. 600. Paradigma: STJ, 3a Seção, Pet 11.796/DF,
Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 23.11.2016.
43 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 498.531-MS, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 19.09.2019, DJe 30.09.2019; STJ, 6a Turma,
AgRg no HC 478.806-SP, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 15.08.2019, DJe 30.08.2019; STJ, 3a Seção, Rcl
37.592-SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 22.05.2019, DJe 30.05.2019.
Cap. XII • INCIDENTES DA EXECUÇÃO 537
hipótese à qual não seria aplicável a vedação do art. 2o, I, da Lei n° 8.072/90.44 Por
força do princípio da humanidade, até mesmo condenados por crimes de especial
gravidade têm o direito de padecer seu estado doentio em sossego ou de preparar-
-se para a morte com dignidade, notadamente nas hipóteses em que os cuidados
médicos não possam ser prestados no próprio estabelecimento penal.45 A título de
exemplo, o Decreto n° 7.873/12 autorizou expressamente a concessão do indulto
natalino às pessoas com paraplegia, tetraplegia ou cegueira, desde que tais condições
não fossem anteriores à prática do delito, mesmo que a condenação fosse referente à
prática de crime de tortura, terrorismo, tráfico de drogas e crimes hediondos (Dec.
7.873/12, art. Io, inciso X, alínea “a”, c/c art. 8o, parágrafo único).
44 STJ, 5a Turma, HC 117.689-SP, Rei. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 09.03.2010, DJe 12.04.2010. Com
entendimento semelhante: ROIG. Op. cit. p. 412.
45 LEAL, João José. A Lei n° 8.072/90 - LCH e a proibição do indulto humanitário, Boletim IBCCrim, n° 147,
fevereiro de 2005.
46 STJ, 5a Turma, HC 82.184-SP, Rei. Laurita Vaz, j. 28.06.2007, DJ 06.08.2007.
47 No sentido de que a sentença que concede o indulto ou a comutação de pena tem natureza declaratória,
não havendo como impedir a concessão dos benefícios ao sentenciado, se cumpridos todos os requisitos
exigidos no decreto presidencial: STJ, 5a Turma, HC 486.272-SP, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 04.06.2019,
DJe 17.06.2019; STJ, 5a Turma, AgRg no Resp 1,744.552-PE, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j.
25.09.2018, DJe 03.10.2018; STJ, 5a Turma, AgRg no REsp 1.744.552-PE, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fon
seca, j. 25.09.2018, DJe 03.10.2018; STJ, 6a Turma, AgRg no HC 436.841-SP, Rei. Min. Maria Thereza de Assis
Moura, j. 21.06.2018, DJe 01.08.2018.
48 STJ, 5a Turma, AgRg no HC 498.531-MS, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 19.09.2019, DJe 30.09.2019; STJ, 6a Turma,
AgRg no HC 478.806-SP, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 15.08.2019, DJe 30.08.2019; STJ, 3a Seção, Rcl
37.592-SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 22.05.2019, DJe 30.05.2019.
538 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
49 STJ, 6a Turma, AgRg no HC 450.324-ES, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 12.03.2019, DJe 28.03.2019; STJ, 5a Turma,
AgRg no HC 437.220-ES, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j. 19.03.2019, DJe 25.03.2019; STJ, 5a Turma, AgRg no
REsp 1,756.386-ES, Rei. Min. Felix Fischer, j. 02.10.2018, DJe 08.10.2018.
50 STJ, 5a Turma, HC 496.402-SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 11.04.2019, Dje 22.04.2019; STJ, 5a Turma, AgRg no
HC 441.553-ES, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 19.03.2019, DJe 08.04.2019; STJ, 5a Turma, AgRg
no REsp 1.616.339-RS, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 27.11.2018, DJe 05.12.2018.
51 STJ, 6a Turma, AgRg no HC 519.296-SP, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 01.10.2019, DJe 08.10.2019; STJ, 6a Turma,
AgRg no HC 482.585-SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 25.06.2019, DJe 02.08.2019; STJ, 5a Turma, AgRg
no HC 463.456-SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 20.09.2018, DJe 01.10.2018.
52 ROIG. Op. cit. p. 403.
53 STJ, 6a Turma, AgRg no HC 454.365-SP, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 07.02.2019, DJe 27.02.2019; STJ, 6a Turma,
AgRg no HC 429.125-SP, Rei. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 19.04.2018, DJe 11.05.2018; STJ, 6a Turma,
AgRg no HC 257.607-DF, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 07.02.2017, DJe 16.02.2017; STJ, 5a Turma, HC
362.016-RJ, Rei. Min. Joel llan Paciornik, j. 25.10.2016, DJe 07.11.2016.
54 STJ, 5a Turma, HC 179.236-RJ, Rei. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 04.12.2012, DJe 10.12.2012.
55 STJ, 6a Turma, AgRg no AREsp 1.450.613-GO, Rei. Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. 15.08.2019, DJe
29.08.2019; STJ, 6a Turma, AgRg no HC 409.107-PR, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 25.09.2018, DJe 09.10.2018;
STJ, 5a Turma, EDcl no AgRg no AREsp 298.957-SC, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 10.04.2018, DJe 20.04.2018.
Cap. XII • INCIDENTES DA EXECUÇÃO 539
56 No sentido de que é possível a concessão de comutação de pena aos condenados por crime comum
praticado em concurso com crime hediondo, desde que o apenado tenha cumprido as frações referentes
aos delitos comum e hediondo, exigidas pelo respectivo decreto presidencial: STJ, 6a Turma, AgRg no
HC 406.582-SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 06.08.2019, DJe 12.08.2019; STJ, 5a Turma, AgRg no HC
420.184-SP, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 25.06.2019, DJe 01.07.2019; STJ, 5a Turma, HC 506.165-DF, Rei. Min. Felix
Fischer, j. 28.05.2019, Dje 04.06.2019; STJ, 3a Seção, Rcl 37.592-SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca,
j. 22.05.2019, Dje 30.05.2019.
57 ROIG. Op. cit. p. 413-414.
58 STJ, 6aTurma, HC 234.363-SP, Rei. Min. Ericson Maranho - Desembargador convocado doTJ-SP -, j. 25.08.2015,
DJe 22.09.2015; STJ, 5a Turma, HC 264.927-SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 01.10.2013, DJe 10.10.2013.
540 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
59 Súmula n. 521 do STJ: "A legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta
em sentença condenatória é exclusiva da Procuradoria da Fazenda".
60 Compete ao Juízo da Execução Fiscal a apreciação do pedido de indulto em relação à pena de multa
convertida em dívida de valor. STJ, 6a Turma, EDcl no AgRg no REsp 1.806.025-SP, Rei. Min. Sebastião Reis
Júnior, j. 22.10.2019, DJe 05.11.2019; STJ, 5a Turma, AgRg no HC 441.809-SP, Rei. Min. Ribeiro Dantas, j.
30.05.2019, DJe 04.06.2019; STJ, 6a Turma, Aglnt no REsp 1.753.653-SC, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 12.03.2019,
DJe 29.03.2019.
61 Nesse sentido: FREIRE JR., Américo Bedê. Qual o meio processual para requerer a delação premiada após
o trânsito em julgado da sentença penal condenatória? In: Revista Síntese de Direito Penal e Processual
Cap. XII • INCIDENTES DA EXECUÇÃO 541
Nessa linha, especial atenção deve ser dispensada ao art. Io, § 5o, da Lei n°
9.613/98, com redação dada pela Lei n° 12.683/12, que passou a dispor expressamente
acerca da possibilidade de o juiz deixar de aplicar apena ou substituí-la, a qualquer
tempo, por pena restritiva de direitos. O dispositivo deixa evidente que o que realmente
interessa não é o momento em que a colaboração premiada é celebrada, mas sim a
eficácia objetiva das informações prestadas pelo colaborador. Em sentido semelhante,
o art. 4o, § 5o, da Lei n° 12.850/13, também prevê expressamente que, na hipótese -
de a colaboração ser posterior à sentença, a pena poderá ser reduzida até a metade
ou ser admitida a progressão de regime ainda que ausentes os requisitos objetivos.
À primeira vista, pode parecer um pouco estranho que tais dispositivos se refi
ram à celebração do acordo de colaboração premiada após a sentença condenatória
irrecorrível (a qualquer tempo). Todavia, na hipótese de o produto direto ou indireto
da infração penal antecedente do crime de lavagem de capitais não ter sido objeto de
medidas assecuratórias durante o curso da persecução penal, inviabilizando ulterior
confisco, não se pode descartar a possibilidade de que as informações prestadas pelo
agente mesmo após o trânsito em julgado de sentença condenatória ainda sejam obje
tivamente eficazes no sentido da recuperação de tais bens, o que, em tese, lhe assegura
a concessão dos prêmios legais inerentes à colaboração premiada prevista no art. 4o, §
5o, da Lei n° 12.850/13.
Firmada a premissa de que o acordo de colaboração premiada pode ser cele
brado a qualquer momento, inclusive após o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória, discute-se na doutrina qual seria o meio adequado para se requerer
o reconhecimento da colaboração na fase de execução.
Parte da doutrina entende ser possível o ajuizamento de revisão criminal. Isso
porque uma das hipóteses de rescisão de coisa julgada ocorre quando, após a senten
ça condenatória com trânsito em julgado, se descobrem novas provas de inocência
do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial
da pena (CPP, art. 621, III). O argumento de que não seria cabível sua concessão
em fase de execução, por ser a sentença o momento de concessão dos benefícios
(redução de pena, regime penitenciário brando, substituição de prisão por pena
alternativa ou extinção da punibilidade) não parece convincente. Como assevera
Jesus,62 o art. 621 do CPP autoriza explicitamente desde a redução da pena até a
absolvição do réu em sede de revisão criminal, de modo que este também deve ser
considerado um dos momentos adequados para exame de benefícios aos autores de
crimes, inclusive em relação à colaboração premiada. Exigir-se-á, evidentemente,
o preenchimento de todos os requisitos legais, inclusive o de que o ato se refira à
delação dos coautores ou partícipes do(s) crime(s) objeto da sentença rescindenda.
Será preciso, ademais, que esses concorrentes não tenham sido absolvidos defini
tivamente no processo originário, uma vez que, nessa hipótese, formada a coisa
julgada material, a colaboração, ainda que sincera, jamais seria eficaz, diante da
impossibilidade de revisão criminal pro societate.
A nosso juízo, considerando que a revisão criminal é meio para reparação de
erro judiciário, e tendo em conta que a incidência da colaboração premiada em sede
de execução não pressupõe erro do juiz que exija a rescisão da sentença original, o
meio processual adequado para que seja reconhecida a colaboração após o trânsito
em julgado de sentença condenatória é submeter o acordo à homologação perante o
juiz da vara de execuções penais, nos mesmos moldes de outros incidentes da exe
cução. Não se trata, a colaboração premiada após o trânsito em julgado de sentença
condenatória, de prova nova da inocência do acusado para fins de ajuizamento de
revisão criminal (CPP, art. 621, III). Cuida-se de fato novo que deve ser levado à
consideração do juiz da execução penal, nos mesmos moldes que os demais fatos
novos que surgem ao longo da execução, tal qual o surgimento de lei nova mais
benigna (LEP, art. 66, I). Aplica-se, pois, por analogia, o raciocínio constante da
súmula n° 611 do STF: “Transitada em julgado a sentença condenatória, compete
ao juízo das execuções a aplicação da lei mais benigna”.63 Logo, na eventualidade de
colaboração premiada no curso da execução penal, deverá ser instaurado o respectivo
incidente,64 ao final do qual, verificado o cumprimento de todas as condições pac
tuadas, deverá o Juízo da Execução conceder ao condenado os respectivos prêmios
legais (v.g., diminuição da pena, perdão judicial, substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos, progressão de regimes etc.).
1. PROCEDIMENTO JUDICIAL
1 No sentido de que a iniciativa conferida pelo art. 195 da LEP ao Juízo da Execução não implica em ofensa
ao princípio da imparcialidade: AVENA. Op. cit. p. 409.
Cap. XIII • PROCEDIMENTO JUDICIAL 545
de que tais sujeitos processuais não tÊm interesse para intervir na fase executória,
já que sua atuação exaure-se com o trânsito em julgado da sentença condenatória
(ou absolutória imprópria).
Quando o procedimento judicial tiver sido instaurado de ofício, deverá o Juízo
da Execução baixar a competente portaria. Se for provocado nesse sentido, deverá
sê-lo por meio de requerimento do Ministério Público, do interessado, de quem o
represente, de seu cônjuge, parente ou descendente, ou mediante representação do
Conselho Penitenciário ou da autoridade administrativa.
3. ITER PROCEDIMENTAL
provas periciais, bem como designar a realização de audiência para fins de produção
da prova oral. Colhida essa prova, não há por que se negar às partes a possibilidade
de se manifestarem, a exemplo do que ocorre em sede judicial (v.g., alegações orais
ou memoriais), exarando o juiz, na sequência, sua decisão.
Por se tratar de procedimento judicial referente ao processo de execução, a decisão
judicial deve atender a todos os requisitos exigidos para as sentenças judiciais (CPP,
art. 381 e seus incisos), em especial a fundamentação. Afinal, é a própria Constitui
ção Federal que dispõe que toda e qualquer decisão judicial deve ser fundamentada,
sob pena de nulidade (art. 93, IX). Nesse contexto, aliás, a Lei de Execução Penal é
explícita ao dispor que a decisão do juiz que determinar a progressão de regime será
sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do Defensor,
procedimento que também será adotado na concessão de livramento condicional,
indulto e comutação de penas, respeitados os prazos previstos nas normas vigentes
(art. 112, §2°). Ausente a fundamentação, ou incorrendo o juiz da execução em um
dos vícios de fundamentação listados pelo art. 315, §2°, do CPP, incluído pela Lei
n. 13.964/19 (v.g., emprego de conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o
motivo concreto de sua incidência no caso), deverá ser declarada a nulidade da de
cisão, nos termos do art. 564, V, do CPP, igualmente incluído pelo Pacote Anticrime.
Não há previsão legal expressa de prazo para a conclusão desse procedimento
judicial. Sem embargo, partindo da premissa de que não se pode admitir que este
se estenda eternamente, sob pena de patente violação ao princípio da razoável
duração do processo (CF, art. 5, LXXVIII), o qual também é aplicável à execução
penal, boa parte da doutrina aplica, por analogia, o quanto disposto no §1° do art.
196 da LEP, que prevê que, não havendo a necessidade de provas, o juiz decidirá de
plano, no prazo de 3 (três) dias. Ressalte-se, todavia, e especificamente em relação
à inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado, que a decisão judicial em
questão deverá ser prolatada no prazo máximo de 15 (quinze) dias (LEP, art. 54,
§2°, da LEP, incluído pela Lei n. 10.792/03).
Caracterizado, assim, um excesso de prazo injustificado, prejudicando, por
exemplo, a concessão de benefícios prisionais, como, por exemplo, a progressão
de regimes, o condenado poderá impetrar habeas corpus, conquanto não haja ne
cessidade de dilação probatória para se comprovar o constrangimento ilegal à sua
liberdade de locomoção. Sob a ótica ministerial, é dizer, em se tratando de demora
injustificada no andamento de procedimentos destinados à supressão de benefícios
prisionais (v.g., regressão), admite-se a impetração de mandado de segurança pelo
Ministério Público. Em ambos os casos, também não se pode descartar a possibilidade
de utilização da correição parcial, dado o manifesto error in procedendo decorrente
da paralisação injustificada do procedimento judicial.3
3 BRITO, Alexis Couto. Execução penal. 6a ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. p. 578. Segundo o autor,
"havendo turbação da ordem dos procedimentos judiciais durante a execução penal, ou mesmo dos
incidentes, nada impede a interposição de correição parcial. Atos do juiz como a não expedição da guia
de recolhimento, ou a não oitiva do condenado em procedimentos de revogação de direito ou benefício
seriam passíveis de correição parcial" (Op. cit. p. 584).
Cap. XIII . PROCEDIMENTO JUDICIAL 547
4. AGRAVO EM EXECUÇÃO
De acordo com o art. 197 da Lei de Execução Penal (Lei n° 7.210/84), das de
cisões proferidas pelo juiz caberá recurso de agravo, sem efeito suspensivo. Portanto,
tratando-se de decisão proferida pelo juízo das execuções, o recurso adequado será
o agravo em execução.
Como se trata de espécie de recurso, aplicam-se ao agravo em execução os
diversos princípios recursais (v.g., fungibilidade, voluntariedade, non reformatio in
pejus, dialeticidade etc.). Não por outro motivo, em caso concreto de agravo em
execução interposto pelo órgão ministerial em virtude de alegado erro de mérito
da decisão recorrida - indevida concessão de progressão de regimes -, concluiu
o Supremo que não poderia o Juízo ad quem provê-lo, contra o condenado, por
nulidade não aventada pela acusação, in casu, a falta de exame criminológico, à
época necessário para o deferimento do referido benefício prisional, sob pena
de ofensa à súmula n. 160 do STF (“É nula a decisão do Tribunal que acolhe,
contra o réu, nulidade não arguida no recurso da acusação, ressalvados os casos
de recurso de ofício”).4
6 STF, 1aTurma, RHC 92.872/MG, Rei. Min. Cármen Lúcia, Dje 26 14/02/2008. Ainda no sentido da competência
do juízo da execução para processar e julgar pedido de progressão de regime feito por preso cautelar:
STJ, 5a Turma, HC 89.711/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, DJe 09/06/2008. Em sentido diverso: STJ, 6a Turma, HC
7.955/MT, Rei. Min. Fernando Gonçalves, DJ 17/02/1999 p. 167.
Cap. XIII • PROCEDIMENTO JUDICIAL 549
concessão (ou negativa) do sursis tiver sido proferida pelo juiz da execução penal,
o recurso cabível não será o RESE do art. 581, XI, do CPP, mas sim o agravo em
execução previsto no art. 197 da Lei n° 7.210/84, impugnação adequada contra
qualquer decisão prolatada em sede de execução criminal. O mesmo raciocínio se
aplica à revogação do sursis, cuja competência é exclusiva do Juízo das Execuções,
já que compete a ele fiscalizar o cumprimento das condições fixadas na suspensão
condicional da pena (LEP, art. 66, III, “d”);
c. Decisão que conceder, negar ou revogar o livramento condicional (CPP,
art. 581, XII): considerando-se que o livramento condicional só pode ser concedido
ao condenado à pena privativa de liberdade que tiver cumprido um certo quantum
de sua pena - em regra, 1/3 (um terço) da pena (CP, art. 83, I) -, conclui-se que
essa decisão só pode ser proferida pelo juízo da execução. Logo, o recurso adequado
será o agravo em execução;
d. Decisão que decidir sobre a unificação de penas (CPP, art. 581, XVII): caso
haja conexão ou continência entre infrações penais, deve haver, em regra, a reunião
dos processos. Porém, se houver a instauração de feitos distintos, a unidade dos
processos ocorrerá posteriormente para o efeito da soma ou da unificação de penas
(CPP, art. 82, in fine). Assim, reconhecendo-se que as penas aplicadas nos proces
sos devem ser unificadas, por haver concurso formal próprio ou crime continuado,
o juízo encarregado da execução deve proceder à sua unificação, ajustando-as ao
disposto nos arts. 70, Ia parte, e 71, ambos do Código Penal. Se a Lei de Execução
Penal atribui ao juiz da execução competência para decidir sobre soma ou unificação
de penas (Lei n° 7.210/84, art. 66, III, “a”), conclui-se que a hipótese de cabimento
do RESE prevista no art. 581, XVII, do CPP, foi tacitamente revogada pelo art. 197
da LEP, que passou a prever agravo em execução contra as decisões proferidas pelo
juízo das execuções criminais;
e. Incidentes da execução envolvendo o cumprimento de medidas de segurança
(CPP, art. 581, XIX, XX, XXI, XXII e XXIII): o art. 581 do CPP também prevê
o cabimento do recurso em sentido estrito contra diversas decisões envolvendo o
cumprimento de medida de segurança. São elas: i. decisão que decretar medida de
segurança, depois de transitar a sentença em julgado (XIX); ii. decisão que impuser
medida de segurança por transgressão de outra (XX); iii. decisão que mantiver ou
substituir a medida de segurança, nos termos do art. 774 (XXI); iv. decisão que
revogar a medida de segurança (XXII); v. decisão que deixar de revogar a medida
de segurança, nos casos em que a lei admitir a revogação (XXIII). Ocorre que todas
essas decisões dizem respeito a matérias disciplinadas na Lei de Execução Penal (arts.
175 a 179, 183 e 184). Logo, há de se concluir que tais hipóteses de cabimento do
recurso em sentido estrito foram tacitamente revogadas pelo art. 197 da LEP, que
passou a prever agravo em execução contra as decisões proferidas pelo juízo das
execuções criminais.
A Lei de Introdução ao Código de Processo Penal (Decreto-Lei n. 3.931, de
11 de dezembro de 1941, art. 13) prevê o cabimento de recurso em sentido estrito
para os casos de aplicação da lei posterior ao trânsito em julgado, durante o pro
550 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
4.3. Procedimento
O art. 197 da LEP nada diz acerca do procedimento recursal do agravo em
execução. À época em que a Lei n° 7.210/84 entrou em vigor, houve certa contro
vérsia acerca do procedimento a ser observado. Parte da doutrina entendia que o
procedimento a ser utilizado seria aquele do agravo de instrumento. Prevalece, no
entanto, o entendimento no sentido de que devem ser aplicadas, subsidiariamente,
as normas procedimentais pertinentes ao recurso em sentido estrito. Afinal, antes
de utilizarmos subsidiariamente o Código de Processo Civil, devemos verificar se
não há, no próprio Código de Processo Penal, procedimento que possa ser utiliza
do, tal como ocorre nesta hipótese. Prova disso, aliás, é o teor da súmula 700 do
STF: “É de cinco dias o prazo para interposição de agravo contra decisão do juiz
da execução penal”.
Destarte, se o procedimento a ser observado é semelhante ao do RESE, con
clui-se que o agravo em execução pode ser interposto por petição ou por termo
nos autos, facultando-se ao recorrente a apresentação das razões em momento
subsequente à interposição, ou, se preferir, sua imediata juntada, com subsequente
possibilidade de retratação pelo juízo a quo. Nos mesmos moldes que o RESE,
o agravo em execução deve subir para o Tribunal competente por meio de ins
trumento. Daí por que a parte deve indicar, no ato da interposição, as peças dos
autos que pretende traslado.
Partindo da premissa de que o agravo em execução está sujeito ao mesmo
procedimento do recurso em sentido estrito, algumas observações devem ser feitas:
a. sustentação oral: se o agravo em execução está sujeito ao mesmo rito proce
dimental do recurso em sentido estrito, o qual expressamente autoriza a realização
de sustentação oral (CPP, art. 610, parágrafo único), não há por que não se aplicar
o mesmo regramento ao agravo;8
b. embargos infringentes ou de nulidade: se o julgamento do agravo, previsto
no art. 197 da LEP, for desfavorável ao condenado e não unânime, são cabíveis
embargos infringentes ou de nulidade, face ao que dispõem os arts. 609, parágrafo
único, e 581 do CPP;9
c. Denegação ou óbice ao processamento do agravo em execução: na even
tualidade de o Juízo da Execução denegar o agravo, ou eventualmente obstar seu
processamento, caberá ao interessado interpor a carta testemunhável, nos exatos
termos do art. 639 do Código de Processo Penal.
4.4. Prazo
O prazo do agravo em execução é semelhante ao RESE: 05 (cinco) dias para
interposição (CPP, art. 586, caput) e 02 (dois) dias para apresentação de razões e
contrarrazões (CPP, art. 588, caput). Nessa linha, eis o teor da Súmula n. 700 do
STF: “É de cinco dias o prazo para interposição de agravo contra decisão do juiz
da execução penal”.
4.5. Efeitos
Em relação aos efeitos, é sabido que, como todo e qualquer recurso, o agravo
em execução também é dotado de efeito devolutivo. Como é aplicável, subsidiaria-
mente, o mesmo procedimento do RESE, conclui-se que o agravo também é dotado
de efeito regressivo (diferido ou iterativo), permitindo que o juiz da execução possa
se retratar de sua decisão.
No tocante ao efeito suspensivo, o art. 197 da LEP é categórico ao dizer que
o agravo em execução não o possui. Especial atenção, todavia, deve ser dispensada
ao quanto disposto no art. 179 da LEP, que dispõe que “transitada em julgado a
sentença, o juiz expedirá ordem para a desinternação ou a liberação”. Como se
percebe, a partir do momento que o dispositivo condiciona a desinternação ou a
liberação do agente inimputável ou semi-imputável cuja periculosidade tenha cessado
ao trânsito em julgado da referida decisão, é de se concluir que, nesse caso, o agravo
em execução é dotado de efeito suspensivo,10 visto que sua simples interposição terá
o condão de impedir o trânsito em julgado, ao qual está condicionada a produção
dos efeitos da referida decisão.11
10 STJ, 6a Turma, RMS 11.695-SP, Rei. Min. Vicente Leal, j. 10.10.2000, DJ 30.10.2000.
11 Para Avena (Op. cit. p. 411), o agravo em execução interposto contra a decisão que determina a extinção
da medida de segurança não é dotado de efeito suspensivo, até mesmo porque o art. 197 da LEP, que o
disciplina, é categórico em afirmar que tal recurso não possui efeito suspensivo, sem fazer qualquer res
salva. Na visão do autor, "o máximo que se pode ver na espécie é um efeito suspensivo indireto, ou seja,
impossibilidade de execução daquela decisão pelo fato da interposição do agravo, diante da ausência do
trânsito em julgado provocada pela dedução do recurso".
552 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
não tiver que permanecer presos. Seria cabível, então, a impetração de mandado de
segurança de maneira concomitante ao agravo em execução, de modo a lhe atribuir
efeito suspensivo?
A nosso juízo, em situações teratológicas, abusivas, que possam gerar dano
irreparável devido ao fato de o recurso adequado não ser dotado de efeito suspen
sivo, há de se admitir que a parte se utilize do mandamus, levando-se em conta que
a Constituição Federal, em seu art. 5o, LXIX, não faz restrição quanto a seu uso,
desde que evidenciada a plausibilidade de provimento do recurso e o perigo de dano
irreversível. Ora, se o condenado tem a sua disposição o habeas corpus, que pode
ser impetrado com pedido de medida liminar, e ser manejado a qualquer momento
da execução penal para pôr fim a eventual constrangimento ilegal à liberdade de
locomoção, e inclusive para atribuir efeito suspensivo a agravo em execução ante
riormente interposto,12 não se pode negar ao Ministério Público, ainda que somente
em casos excepcionais, instrumento de natureza semelhante, a ser utilizado para
conferir eficácia, em última análise, aos próprios recursos criminais interpostos pelo
órgão ministerial. Deveras, de que adianta, no exemplo acima citado, o Tribunal
de Justiça dar provimento ao agravo em execução interposto pelo Parquet, se é de
todo evidente que, quando isso ocorrer, o agente não mais será encontrado para ser
recolhido novamente à prisão? É dizer, a negativa de efeito suspensivo em hipóte
ses absurdas e teratológicas como essa acabaria inviabilizando a própria utilidade e
eficácia do recurso criminal interposto pelo órgão ministerial.13
A própria Lei n° 12.016/09 confirma essa possibilidade ao prever que não será
concedido mandado de segurança quando se tratar de decisão judicial da qual caiba
recurso com efeito suspensivo (art. 5o, II). Ora, interpretando-se a contrario sensu
esse dispositivo, é de se concluir que é possível a impetração do mandamus quando
o recurso cabível contra a decisão judicial não for dotado de efeito suspensivo. Nessa
linha, como já se pronunciou o STJ em precedente mais antigo, “(...) não obstante
a legitimidade do Ministério Público para impetrar Mandado de Segurança com
vistas a suspender a eficácia da decisão impugnada (obtenção de efeito suspensivo),
tal só se efetiva se o ato judicial questionado se mostrar manifestamente ilegal (te-
ratológica) ao ponto de ensejar tal medida extrema; se, ao contrário, reveste-se de
juridicidade, como no caso sub judice, em que se deu ao pedido de progressão de
regime prisional a solução adequada, calcada, inclusive, na orientação do colendo
STF, por óbvio, não será conferido efeito suspensivo ao Agravo”.14
Não é essa, todavia, a orientação dominante nos Tribunais Superiores. Prova
disso, aliás, é o teor da súmula n. 604 do STJ: “O mandado de segurança não se
presta para atribuir efeito suspensivo a recurso criminal interposto pelo Ministério
Público”. Na visão daquela Corte, se a própria Lei - Código de Processo Penal, Lei
de Execução Penal, etc. - não atribui efeito suspensivo a determinado recurso, não
haveria direito líquido e certo a ser tutelado através do mandado de segurança.15
Resta, então, apenas a possibilidade de medida cautelar inominada, que deve ser
admitida em casos excepcionais, como tem decidido o próprio STJ quando ao efeito
suspensivo no Recurso Especial.16
5. REVISÃO CRIMINAL
15 Com esse entendimento: STJ, 6a Turma, AgRg no HC 148.623/SP, Rei. Min. Alderita Ramos de Oliveira, j.
18/06/2013, DJe 01/07/2013; STJ, 6a Turma, AgRg no HC 354.095/SP, Rei. Min. Nefi Cordeiro, j. 01/09/2016,
DJe 13/09/2016; STJ, 5a Turma, AgRg no HC 369.841/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 02/02/2017,
DJe 10/02/2017; STJ, 5a Turma, AgRg no HC 377.712/SP, Rei. Min. Jorge Mussi.j. 02/05/2017, DJe 09/05/2017;
STJ, 6a Turma, AgRg no HC 388.235/SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 18/05/2017, DJe 30/05/2017.
16 STJ, 5a Turma, HC 351.114/SP, Rei. Min. Jorge Mussi, j. 21/06/2016, DJe 29/06/2016.
17 MIRABETE. Op. cit. p. 953.
18 STJ, 5a Turma, HC 134.321-RS, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 01.09.2009, DJe 28.09.2009.
554 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
21 Nesse ponto, o habeas corpus aparta-se do mandado de segurança. Afinal, segundo o art. 5o, inciso II, da
Lei n° 12.016/09, não se concederá mandado de segurança quando se tratar de decisão judicial da qual
caiba recurso com efeito suspensivo.
22 STF, 1a Turma, HC 108.715/RJ, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 07/08/2012. Na mesma linha: STF, 1a Turma, HC
109.956/PR, Rei. Min. Marco Aurélio, j. 07/08/2012. Há precedentes de ambas as Turmas do STJ no sentido
de que o remédio constitucional não pode ser utilizado em substituição ao recurso próprio (apelação,
agravo em execução, recurso especial), tampouco à revisão criminal, ressalvadas as situações em que, à
vista da flagrante ilegalidade do ato apontado como coator, em prejuízo da liberdade da paciente, seja
cogente a concessão, de ofício, da ordem de habeas corpus. A propósito: STJ, 6a Turma, HC 306.677/RJ,
Rei. Min. Ericson Maranho, j. 19/05/2015, DJe 28/05/2015; STJ, 5a Turma, HC 245.963/RJ, Rei. Min. Gurgel
de Faria, j. 12/05/2015, DJe 28/05/2015;; STJ, 5a Turma, HC 239.550/RJ, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 18/09/2012.
23 STJ, 3a Seção, HC 482.549/SP, Rei. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 11/03/2020, DJe 03/04/2020.
556 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
não apenas de modo a otimizar a tramitação de tais demandas, mas também com o
objetivo de conferir uma tutela jurisdicional mais célere e eficiente. Ora, se a tutela
de direitos individuais não tão importantes quanto a liberdade de locomoção pode
ser feita de maneira coletiva, seria desarrazoado não admitir a via multitudinária
do remédio heroico justamente para a proteção do direito de ir e vir dos cidadãos,
coletivamente considerados, sobretudo diante da doutrina brasileira do habeas corpus,
que sempre conferiu ao writ a máxima eficácia possível no sentido da proteção da
liberdade ambulatorial.24
Para tanto, todos os requisitos constitucionais e legais para a impetração do
habeas corpus deverão ser observados. De maneira semelhante ao que ocorre em
outras ações coletivas, há necessidade de adequada delimitação do grupo favo
recido, por meio da especificação de uma questão objetiva de natureza comum,
demonstrando que todos estão em uma situação fática e jurídica semelhante, o
que, em tese, autorizaria uma decisão unitária da lide.25 Com efeito, não havendo
uma adequada delimitação desse grupo, corre-se o sério risco de eventual ordem
vir a beneficiar pacientes que não estavam na mesma situação, o que poderia se
tornar um verdadeiro “salvo-conduto” genérico, colocando em liberdade pessoas
que deveriam permanecer presas. É firme a jurisprudência no sentido de que o
fato de os pacientes não terem sido identificados individualmente na petição ini
cial do habeas corpus coletivo não constitui justificativa para o seu indeferimento
liminar. Na verdade, desde que se revele possível, por ocasião da execução de
eventual ordem judicial concedida, a identificação daqueles que sofrem ou estão
na iminência de sofrer violência ou coação ilegal em sua liberdade de locomoção,
seus direitos individuais homogêneos podem, em tese, ser tutelados pela via da
impetração coletiva sem a necessidade de identificação de cada um dos indivíduos
na petição de impetração.26 Para além disso, de modo a se determinar o juízo
competente para o julgamento do writ multitudinário, também se faz mister de
limitar a autoridade coatora, sob pena de se conferir a determinado juízo, muito
provavelmente o Supremo Tribunal Federal, uma competência que não está prevista
na Constituição Federal, o que poderia inclusive implicar em indevida supressão
do primeiro grau de jurisdição (habeas corpus per salturn).
O Supremo Tribunal Federal tem admitido a utilização do habeas corpus co
letivo, sob o fundamento de que a ação coletiva funcionaria como um dos únicos
instrumentos capazes de garantir o acesso à justiça dos grupos mais vulneráveis
socioeconomicamente, conferindo a maior amplitude possível ao remédio heroi
co (doutrina brasileira do habeas corpus). Ora, partindo da premissa de que a
Suprema Corte tem admitido com maior amplitude a utilização da ADPF e do
mandado de injunção coletivo, seria no mínimo contraditório não admitir essa
24 É nesse sentido a lição de Daniel Sarmento. O cabimento do Habeas Corpus na Ordem Constitucional Bra
sileira. Disponível em: http:// http://www.ttb.adv.br/artigos/parecer-hc-coletivo.pdfAcesso em: 20/12/2018.
25 Por não identificar uma similitude entre os constrangimentos ilegais, o Min. Alexandre de Moraes negou,
monocraticamente, seguimento ao habeas corpus coletivo n. 148.459/DF (j. 19/02/2018, DJe 31 20/02/2018),
impetrado pela Defensoria Pública da União em favor de todos os presos que se encontravam em esta
belecimentos penais federais há mais de 2 (dois) anos.
26 STJ, 5a Turma, HC 583.967/SP, Rei. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 27.10.2020, DJe 03.11.2020.
558 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Uma
27 "Art. 12. O mandado de injunção coletivo pode ser promovido: I - pelo Ministério Público, quando a tutela
requerida for especialmente relevante para a defesa da ordem jurídica, do regime democrático ou dos
interesses sociais ou individuais indisponíveis; II - por partido político com representação no Congresso
Nacional, para assegurar o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas de seus integrantes ou relacio
nados com a finalidade partidária; III - por organização sindical, entidade de classe ou associação legal
mente constituída e em funcionamento há pelo menos 1 (um) ano, para assegurar o exercício de direitos,
liberdades e prerrogativas em favor da totalidade ou de parte de seus membros ou associados, na forma
de seus estatutos e desde que pertinentes a suas finalidades, dispensada, para tanto, autorização especial;
IV - pela Defensoria Pública, quando a tutela requerida for especialmente relevante para a promoção dos
direitos humanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos dos necessitados, na forma do inciso LXXIV
do art. 5o da CF. Parágrafo único. Os direitos, as liberdades e as prerrogativas protegidos por mandado de
injunção coletivo são os pertencentes, indistintamente, a uma coletividade indeterminada de pessoas ou
determinada por grupo, classe ou categoria".
28 STF, 2a Turma, HC 143.641/SP, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 20/02/2018. No sentido do cabimento da
análise da violação de direitos coletivos determinados ou determináveis das pessoas presas por meio de
habeas corpus coletivo: STJ, 3a Seção, HC 568.693/ES, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 14.10.2020, DJe
16.10.2020; STJ, 2a Seção, HC 568.021/CE, Rei. p. Acórdão Min. Nancy Andrighi, j. 24.06.2020, DJe 31.08.2020;
STJ, 6a Turma, HC 575.495/MG, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 02.06.2020, DJe 08.06.2020; STF, 2a Turma,
HC 143.641, Rei. Min. Ricardo Lewandowski, j. 20.02.2018, DJe 215, 08.10.2018; STF, 2a Turma, HC 165.704,
Rei. Min. Gilmar Mendes, j. 20.10.2020.
29 STJ, 6a Turma, HC 575.495/MG, Rei. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 02.06.2020, DJe 08.06.2020.
Cap. XIII • PROCEDIMENTO JUDICIAL 559
1. CONCEITO
2. NATUREZA JURÍDICA
Antes da reforma da Parte Geral do Código Penal pela Lei n. 7.209/84, a reabi
litação funcionava como causa extintiva da punibilidade. Desde então, a reabilitação
passou a funcionar como medida de política criminal assecuratória do sigilo sobre
os antecedentes criminais do condenado e, ainda, causa suspensiva condicional de
certos efeitos secundários de natureza extrapenal e específicos da condenação. A
propósito, eis o teor da Exposição de Motivos da Parte Geral do Código Penal:
“A reabilitação não é causa extintiva da punibilidade e, por isso, em vez de estar
disciplinada naquele Título, como no Código vigente, ganhou Capítulo próprio, no
Título V. Trata-se de instituto que não extingue, mas tão-somente suspende alguns
efeitos penais da sentença condenatória, visto que, a qualquer tempo, revogada a
reabilitação, se restabelece o statu quo ante. Diferentemente, as causas extintivas da
562 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
1 STJ, 5a Turma, RMS 25.096/SP, Rei. Min. Laurita Vaz, j. 28/02/2008, DJe 07/04/2008.
Cap. XIV • REABILITAÇÃO 563
sição do juiz criminal. Quando solicitadas para fins civis, as certidões emitidas
pelos órgãos de identificação estaduais (ou federais) não deverão fazer qualquer
referência a respeito de condenações irrecorríveis do reabilitado, que tem direito
líquido e certo à proteção dessas informações, passível de ser tutelado pela via do
mandado de segurança. Nesse contexto, o STJ tem entendimento firme no sentido
de que, por analogia ao que dispõe o art. 748 do CPP, que assegura ao reabilitado
o sigilo das condenações criminais anteriores na sua folha de antecedentes, devem
ser excluídos dos terminais dos Institutos de Identificação Criminal os dados re
lativos a inquéritos arquivados e a processos em que tenha ocorrido a reabilitação
do condenado, a absolvição do acusado por sentença penal transitada em julgado,
ou tenha sido reconhecida a extinção da punibilidade do acusado pela prescrição
da pretensão punitiva do Estado, de modo a preservar a intimidade do mesmo.
Tais dados, entretanto, não deverão ser excluídos dos arquivos do Poder Judiciário,
tendo em vista que, nos termos do dispositivo acima citado, pode o Juiz Criminal
requisitá-los, de forma fundamentada, a qualquer tempo, mantendo-se, entretanto,
o sigilo quanto às demais pessoas.2
2 STJ, 5a Turma, RMS 19.501/SP, Rei. Min. Felix Fischer, j. 07/06/2005 p. 571. No sentido de que devem ser
mantidos nos registros criminais sigilosos os dados relativos a inquéritos arquivados e a processos, em
que tenha ocorrido a absolvição do acusado por sentença penal transitada em julgado, com o devido
cuidado de preservar a intimidade do cidadão: STJ, 2a Turma, RMS 28.838/SP, Rei. Min. Humberto Martins,
j. 1°/10/2009, DJe 04/11/2009; STJ, 2a Turma, RMS 31.756/SP, Rei. Min. Eliana Calmon, j. 08/06/2010, DJe
18/06/2010.
564 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
6. PRESSUPOSTO DA REABILITAÇÃO
7. REQUISITOS DA REABILITAÇÃO
4 STJ, 5a Turma, REsp 665.531/SP, Rei. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 03/02/2005, DJ 07/03/2005 p. 337.
566 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
dade jurídica (crime vago). A falta de interesse da vítima, deixando, por exemplo, de
ajuizar uma ação civil ex delicto em face do condenado, não pode ser utilizada como
indicativo de renúncia de sua parte. Não obstante, se tiver havido o decurso do prazo
prescricional para a pretensão de reparação civil pelos danos causados pelo delito, não
se pode exigir do reabilitado o cumprimento de obrigação destituída de força. Por
consequência, uma vez prescrita a ação civil ex delicto, o condenado interessado na
reabilitação não precisa comprovar a reparação do dano causado pelo crime.
9. DECISÃO JUDICIAL
A sentença que concede ou nega a reabilitação pode ser impugnada por meio
de recurso de apelação, na forma do art. 593, II, do CPP.
Consoante disposto no art. 94, parágrafo único, do CP, negada a reabilitação,
esta poderá ser requerida, a qualquer tempo, desde que o pedido seja instruído com
novos elementos comprobatórios dos requisitos necessários. Referido dispositivo
revela o caráter rebus sic stantibus da reabilitação, pois, uma vez negada, poderá
ser novamente requerida, a qualquer tempo, conquanto presentes novos elementos
probatórios.
5 STJ, 5a Turma, REsp 46.538/RJ, Rei. Min. Cid Flaquer Scartezzini, j. 21/05/1995, DJ 24/06/1996 p. 22.784.
Cap. XIV • REABILITAÇÃO 567
6 STJ, 6a Turma, REsp 43.799/RJ, Rei. Min. Pedro Acioli, j. 18/10/1994, DJ 12/12/1994.
7 STF, Ia Turma, HC 90.554/RJ, Rei. Min. Cármen Lúcia, j. 06/03/2007, DJ 23/03/2007.
568 MANUAL DE EXECUÇÃO PENAL - Renato Brasileiro de Lima
8 STJ, 6a Turma, HC 32.372/SC, Rei. Min. Hamilton Carvalhido, j. 18/10/2005, DJ 05/12/2005 p. 379.
9 STJ, 5a Turma, HC 14.202/SP, Rei. Min. Edson Vidigal, j. 24/04/2001, DJ 13/08/2001 p. 182.
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